A Zoologia no ensino médio de escolas estaduais do município de Itapipoca, Ceará

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Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016

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A ZOOLOGIA NO ENSINO MÉDIO DE ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNICÍPIO DE ITAPIPOCA, CEARÁ. Maria Erli Oliveira Azevedo (Universidade Estadual do Ceará – FACEDI-UECE) Mário Cézar Amorim de Oliveira (Universidade Estadual do Ceará – FACEDI-UECE) Daniel Cassiano Lima (Universidade Estadual do Ceará – FACEDI-UECE)

Resumo A Zoologia é o estudo científico da vida animal e é integrada ao ensino de Ciências e Biologia do ensino fundamental e médio, respectivamente. Essa pesquisa teve como principal objetivo investigar como estão sendo empregadas as metodologias de ensino com relação aos conteúdos de Zoologia em escolas estaduais do município de Itapipoca, Ceará. Os dados foram coletados através de entrevistas semiestruturadas, sendo estas analisadas a partir da metodologia de análise de conteúdo. Os resultados indicam alguns sérios problemas referentes à transposição didática do conteúdo, principalmente no que diz respeito à utilização de metodologias alternativas; entretanto, um importante aspecto positivo foi a verificação da preocupação docente na sensibilização dos estudantes acerca da importância da preservação da fauna. Palavras-chave: Fauna. Didática. Metodologias de Ensino. Biologia Escolar. 1 INTRODUÇÃO Há um consenso na literatura educacional acerca da necessidade de inovação nas práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores no sentido de potencializar o interesse discente e possibilitar um incremento na qualidade do processo de ensino-aprendizagem, percebendo-se no contexto sociocultural contemporâneo a importância do domínio de conhecimentos técnico-científicos, para se posicionar mais criticamente diante das demandas sociais e participar mais ativamente nas tomadas de decisões que interferem no cotidiano. Nesse contexto, a escola, vista como uma das principais instituições transmissora e produtora de conhecimentos, assume papel de destaque, pois os contatos iniciais com questões científicas geralmente acontecem nesse ambiente, em aulas de Ciências e Biologia. Portanto, tornam-se relevantes discussões e reflexões sobre as práticas docentes exercidas em sala de aula. (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2002; CARVALHO; GILPÉREZ, 2006) Desse modo, algumas áreas das Ciências Biológicas que compõem a Biologia Escolar, entendida como a disciplina componente curricular da educação básica, merecem maiores reflexões quanto às suas perspectivas de ensino-aprendizagem, devido a algumas

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questões específicas que dificultam sua abordagem no processo de educação científica, consequentemente, causando dúvidas e desinteresse. Destaca-se dentre essas, a Zoologia, área que necessita de discussões mais efetivas com relação às práticas exercidas pelo professor em sala de aula, sendo o estudo dessa temática importante para compreender as intervenções do homem na biodiversidade. (SANTOS, 2010) A Zoologia é o estudo científico da vida animal e é integrada ao ensino de Ciências e Biologia do ensino fundamental e médio, respectivamente. O conteúdo geralmente é abordado no 7° ano do ensino fundamental e no 2° ano do ensino médio, sendo o estudo dessa temática importante para compreender as intervenções do homem na biodiversidade e para conhecer a importância dos animais na natureza. (SANTOS, 2010) Verifica-se, entretanto, que a abordagem na educação básica dessa importante área das Ciências Biológicas mantem-se estagnada teórica e metodologicamente; persistindo estratégias de memorização de conceitos, a falta de contextualização do assunto, a priorização na abordagem de aspectos morfofisiológicos e a falta de interligação do conteúdo com processos evolutivos. Esses fatores podem contribuir negativamente para que os estudantes compreendam esses assuntos de forma superficial ou até mesmo os tratem como irrelevantes. Este trabalho é parte da pesquisa de conclusão de curso da primeira autora e foi desenvolvida visando responder ao seguinte questionamento: Que metodologias estão sendo utilizadas no ensino de Zoologia em escolas estaduais do município de Itapipoca-CE? A investigação possibilitou diagnosticar quais as contribuições e limitações das metodologias de ensino utilizadas em Zoologia, contribuindo para promover discussões e reflexões quanto à necessidade da diversificação das práticas tradicionais, visando à melhoria do processo de ensino-aprendizagem dessa área. Nessa perspectiva, essa pesquisa teve como principal objetivo investigar como estão sendo empregadas as metodologias de ensino com relação aos conteúdos de Zoologia em escolas estaduais do município de Itapipoca-CE.

2 ENSINO DE ZOOLOGIA Apesar de identificarmos poucas investigações da área de ensino de Ciências e Biologia voltadas para a análise da transposição didática de conhecimentos zoológicos na educação básica, é consensual a relevância de promover discussões e reflexões sobre essa abordagem, considerando a importância da disseminação de saberes que priorizem não apenas o assunto em sua especificidade, mas também, promovendo-se a inserção de conhecimentos voltados à sensibilização para preservação dos animais, colaborando para a construção de um meio ambiente saudável e equilibrado.

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Diante das intensas transformações que a sociedade vem passando ao longo dos anos, cobra-se cada vez mais dos professores maior diversificação das metodologias utilizadas no ensino de Zoologia, no intuito de promover melhorias no processo de ensinoaprendizagem. (SANTOS, 2010) Na contemporaneidade, os educadores são cada vez mais cobrados a lecionar conteúdos que garantam aos seus alunos bons resultados em diferentes testes avaliativos. Contudo, mais do que ensinar visando à aprendizagem de conteúdos, se faz necessário educar para a vida, formando-se cidadãos críticos e aptos a tomarem decisões considerando o meio em que estão inseridos. O professor, ao abordar conteúdos de Zoologia, deveria apresentar ao seu aluno a importância dos animais e das interações estabelecidas entre eles; no entanto, Santos (2010) afirma que o ensino de Zoologia vem sendo negligenciado nas escolas, apontando-se a falta de contextualização e o desconhecimento por parte dos docentes das temáticas atuais relacionadas ao assunto. Carneiro (2009) destaca ainda como problemática emergente do ensino de Zoologia na educação básica, a demonstração dos grupos de animais separadamente, sem articulação das relações de parentesco entre eles, focando tão somente, nas características individuais de cada grupo e esquecendo-se a orientação dos PCN (BRASIL, 1999, 2002), que indicam a evolução e a ecologia como eixos integradores do conhecimento biológico no ensino médio. Nessa perspectiva, o assunto é visto de forma desfragmentada, muitas vezes não se apontando as reais contribuições que o estudo dessa temática tem na sociedade e na compreensão do processo de origem da vida e das espécies biológicas.

3 METODOLOGIA A investigação foi realizada em três escolas de ensino médio da rede pública estadual do município de Itapipoca-CE, localizadas na sede do município, que é composto por doze distritos. As escolas em estudo foram denominadas „A‟, „B‟ e „C‟, por questões éticas e para não comprometer a identidade dos professores participantes da pesquisa, tendo sido feito um levantamento das condições físicas dessas instituições, visando conhecer as especificidades de cada uma. A pesquisa é de caráter qualitativo e quanto aos seus objetivos é de natureza exploratória. Os dados foram coletados através de uma entrevista semiestruturada, que “[...] é muito utilizada quando se deseja delimitar o volume das informações, obtendo assim um

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direcionamento maior para o tema, intervindo a fim de que os objetivos sejam alcançados”. (BONI; QUARESMA 2005, p.75) As entrevistas foram realizadas com oito (8) professores de Biologia que ministravam aulas no 2° ano, que tradicionalmente é a série em que os conteúdos de ensino relacionados à Zoologia são abordados, sendo os professores participantes da pesquisa identificados por nomes fictícios relacionados a animais (Prof. Aguiar, Profa. Barata, Profa. Carneiro, Profa. Dourado, Profa. Falcão, Prof. Leitão, Profa. Lobo e Prof. Raposo). Na análise dos dados e interpretação dos resultados se utilizou elementos da metodologia de análise de conteúdo, do tipo categorial, que consiste em um conjunto de técnicas que visa interpretar o conteúdo de mensagens, utilizando-se procedimentos sistemáticos (BARDIN, 2004). Seguiram-se as etapas de pré-análise, exploração do material e criação de categorias temáticas.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados serão apresentados a partir das categorias construídas a porteriore, apresentando-se trechos de falas dos entrevistados, destacando-se que as transcrições foram fieis às respostas apresentadas pelos professores, não sendo realizadas correções ou adequações de qualquer natureza, levando em consideração a metodologia de análise adotada nesta pesquisa.

4.1. O ENSINO DE ZOOLOGIA E OS PROFESSORES DAS ESCOLAS ESTADUAIS DO MUNÍCIPIO DE ITAPIPOCA-CE Os professores entrevistados são formados em Licenciatura em Ciências Biológicas, condição que pode contribuir na melhoria da qualidade do ensino-aprendizagem, destacando-se a importância dos docentes alinharem os conhecimentos aprendidos durante seu processo formativo com as práticas desenvolvidas em sala de aula. Ao serem questionados quanto a sua afinidade com os conteúdos de Zoologia, 1 dos 8 professores entrevistados disse não se sentir atraído pelos assuntos da área. Destacandose dentre aqueles que falaram gostar dessa temática, o fascínio visto nos alunos, por se tratar de um tema do cotidiano deles, sendo mais fácil abordá-lo durante as aulas. Eu gosto muito de trabalhar Zoologia. Percebo que pros alunos é uma coisa mais do cotidiano deles, ou seja, Zoologia eles veem a maioria dos filos dos animais e é bem aceito pelos alunos esse conteúdo. (Trecho 1 - Professora Lobo)

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No entanto, houve um relato demostrando a falta de afinidade pelo conteúdo específico de Zoologia, o que pode ser caracterizado como um fator limitante para que as aulas não fluam de maneira satisfatória e se alcance os objetivos esperados durante essa abordagem. Não tenho afinidade com o conteúdo de Zoologia. Minha afinidade mesmo é com o conteúdo do primeiro ano. Na verdade, é um conteúdo que geralmente nunca dá tempo a gente trabalhar muita coisa. (Trecho 2 - Professora Falcão)

Verifica-se a preferência da professora por conteúdos específicos das ciências biológicas experimentais, denominados por “conteúdos do primeiro ano” (tradicionalmente a bioquímica, a citologia e a histologia), o que é comum e não é, a princípio, um problema, levando em consideração que as preferências pessoais variam entre os indivíduos. Contudo, outro fator que também é citado e que pode ser uma das causas, ou consequência, da pequena afinidade da entrevistada, são as poucas experiências didáticas relacionadas ao ensino de Zoologia, levando em consideração o apontamento feito, em que é destacado o tempo didático insuficiente para se abordar esse assunto com mais profundidade. Como esse assunto geralmente é trabalhado no último bimestre do segundo ano do ensino médio, já no final do ano letivo, nota-se alguns fatores que interferem na sua abordagem, como exemplo, cita-se a preocupação dos educadores na preparação dos alunos para provas tanto internas como externas, contribuindo negativamente para que o assunto seja abordado de forma superficial, não havendo tempo para trabalhar esse conteúdo de forma mais abrangente. 4.1.1 Metodologias utilizadas no ensino de Zoologia As aulas de Zoologia realizadas pelos professores da rede pública estadual do município de Itapipoca-CE são mais caracterizadas por eles como teóricas, utilizando-se principalmente a modalidade didática das aulas expositivas para a abordagem desse assunto. Foram apontadas algumas estratégias utilizadas pelos educadores para dinamizar e atrair a atenção dos alunos para abordagem dessa temática, conforme se pode verificar nos trechos a seguir. As minhas metodologias no caso é o quadro, faço esquemas no quadro, esquematizo os animais no quadro, estrutura corporal, desenvolvimento e quando tem ilustração no livro. [...] Ai quando tem algum desenho da estrutura corporal do animal ai eu exponho com o livro pra que eles possam visualizar melhor. (Trecho 3 - Professor Leitão) Além da aula expositiva, a questão das imagens né, dos slides. Eu me preocupo muito com a questão da etimologia das palavras né, os termos. Não que seja uma coisa essencial, assim... fundamental, nem mais importante do que a compreensão dos processos. Mas eu acho que quando eles compreendem o significado de

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abertura dos termos, protostômios, deuterostômios né, por exemplo, fica mais fácil. [...] utilizo além dessa questão dos slides com imagens e estruturas, a questão dos termos né, dos termos técnico-científicos da Zoologia. (Trecho 4 - Professor Aguiar)

Rodrigues (2012) destaca que a postura do docente em sala de aula e a forma como ele se articula para transmitir a teoria imposta por sua disciplina, buscando estratégias mais dinâmicas viabiliza ao aluno melhor aproveitamento do conteúdo. Nesse sentindo, o desenho no quadro, as imagens nos slides, a preocupação em mostrar para os alunos os termos técnicos científicos da Zoologia são estratégias que podem atrair a atenção do aluno. A utilização de vídeos de curta duração e documentários trazendo curiosidades sobre os animais também são recursos utilizados durante as práticas como estratégias para dinamizar o ensino dos diversos grupos de animais. Sempre tento trazer vídeo né, nessa parte da Zoologia tem muito vídeo bom trazendo abordagens como alimentação, habitat, também tem várias curiosidades, então eu sempre tento levar isso para a sala de aula, quando eu consigo o data show da escola. (Trecho 5 - Professora Barata) [...] Eu trouxe vídeo mostrando os grupos de animais e algumas curiosidades, teve documentário também, eu trouxe um documentário da Discovery channel introduzindo ao reino animal e ele fazia um apanhado geral sobre a vida animal na terra, acho importante mostrar essa relação da evolução das espécies. (Trecho 6 Professor Raposo)

A questão dos recursos disponibilizados na escola é um aspecto relevante na melhoria da qualidade do ensino, pois mesmo que os professores atentem para a necessidade de diversificação das suas práticas pedagógicas, muitas vezes não encontram subsídios e contrapartidas institucionais necessárias para realizá-las de maneira mais atrativa. O ensino de Zoologia ligado a aspectos evolutivos é um fator muito importante, sendo citado no trecho 6 pelo Prof. Raposo como subsídio pedagógico utilizado nas suas aulas para abordar os grupos de animais, sendo essa visão corroborada por Oliveira et al (2011) quando mencionam que o educador, ao priorizar o estudo sobre as relações de parentesco existentes entre as espécies, proporciona aos alunos conhecimentos mais significativos sobre a vida animal. O Prof. Aguiar, no trecho 7, citou a utilização de aulas práticas no laboratório e aulas de campo como metodologias desenvolvidas na sua prática docente; contudo, de forma esporádica, pois somente as desenvolve quando encontra mecanismos que viabilizam o uso dessas estratégias educacionais. Minhas aulas são predominantemente teóricas, quando possível faço prática no laboratório e dependendo da estrutura, se tiver um ônibus, também faço campo, esse ano já fiz campo. [...] não adianta também, planejar práticas mirabolantes e quando chegar na hora não dispor dos recursos, das condições. (Trecho 7 Professor Aguiar)

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As questões estruturais são apontadas como o principal empecilho para a elaboração de metodologias ativas, tais como as aulas laboratoriais e de campo, pois como enfatizado pelo Prof. Aguiar, muitas vezes o educador projeta a utilização dessas estratégias, esbarrando, todavia, em uma série de problemáticas, aliadas principalmente a falta de recursos. 4.1.2 Concepções sobre as metodologias utilizadas Quando indagados sobre as contribuições das metodologias utilizadas por eles em sua prática de ensino e consequentemente na aprendizagem do conteúdo pelos alunos, os professores afirmaram que as suas aulas ainda deixam muito a desejar; no entanto, a despeito das limitações, percebem que os estudantes gostam do conteúdo e a maioria deles tem um bom rendimento. Assim a contribuição eu acho que não é muita né, por que só ver foto, só ver esquema no livro, poderia ser muito mais, assim Zoologia né. (Trecho 8 - Professor Leitão)

A contextualização é destacada pelos profissionais como uma estratégia utilizada em suas práticas docentes visando integrar as vivências cotidianas dos alunos com as práticas desenvolvidas em sala de aula, sendo utilizados fatos comuns do dia-a-dia relacionados aos animais para demostrar como esses assuntos estão presentes em suas vidas, conforme se verifica nos trechos 9 e 10 a seguir. É porque assim, geralmente eu gosto de trabalhar o conteúdo mais levando pra vivência deles, como eles poderiam utilizar isso no dia-a-dia deles. (Trecho 9 Professora Falcão) [...] eu até brinco com eles, eu falo muito do desenho bob esponja. - O bob esponja pessoal; são os poríferos, ai tem o Patrick que é uma estrela do mar, né? E assim vai né. É difícil, mas o conteúdo é interessante. A questão é que o professor deve dispor de um leque de metodologias e opções de técnicas pra tentar despertar aquele interesse, que influencie o processo de aprendizagem. (Trecho 10 - Professor Aguiar)

Nessa perspectiva, percebe-se a importância dada pelos entrevistados à contextualização no ensino de Zoologia, pois muitas vezes esse assunto é ministrado de forma tão distanciada da realidade dos alunos que não permite a estes perceber o vínculo existente entre esse conteúdo e o seu cotidiano, esvaziando de significados sua aprendizagem. Outro aspecto levantado pelos professores e que, na sua visão, é fundamental para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem de Zoologia é o interesse do aluno, pois mesmo com o docente se desdobrando para dar sua aula de forma dinâmica e inovadora, o discente precisa querer aprender, caso contrário, mesmo com a utilização das melhores e mais

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adequadas estratégias, nenhuma delas surtirá o efeito desejado. Como se verifica no trecho 11 da fala do Prof. Leitão. Só se aprende, não... só é exagero, mas acho que só se aprende melhor estando literalmente com interesse de verdade, aquele interesse pessoal, aquela curiosidade. (Trecho 11 - Professor Leitão)

O professor tem como função proporcionar a formação de indivíduos que se posicionem mais criticamente sobre questões sociais, devendo ser capazes de participar de forma ativa das tomadas de decisões que interferem no seu dia-a-dia e refletir sobre os diversos aspectos que permeiam o trabalho docente possibilita compreender melhor as problemáticas que influenciam na qualidade do ensino-aprendizagem. 4.1.3 Dificuldades no uso de metodologias alternativas Os professores citam uma série de fatores que inviabilizam melhorar suas práticas e diversificar suas metodologias, destacando a falta de recursos no laboratório, a grande quantidade de alunos por turma, a falta de transporte para levar os alunos para aulas de campo, o pouco tempo para preparar outras propostas educacionais e mesmo a escassez do tempo didático destinado ao ensino de Zoologia como as principais dificuldades que interferem na utilização de práticas diferenciadas. As falas a seguir retratam essas problemáticas. [...] Aulas de campo tem que deslocar uma turma pra outro local, ai requer mexer em várias instâncias. Aulas no laboratório não têm material, poríferos não tem, cnidários não tem, platelmintos não tem e vários representantes de outros filos também não têm. (Trecho 12 - Professora Carneiro) Em aula de Zoologia... aqui a gente tem o laboratório com algumas espécies de animais, só que em pouca variedade, ai o laboratório daqui é pequeno pra mim levar os alunos pra lá, eu tenho dificuldade, por que é uma turma de quase 40 alunos, não cabe. O máximo que cabe de alunos no laboratório é 15 pessoas, então eu pego lá os animais que tem lá e levo pra sala pra mostrar pra eles e de vez em quando eu preparo mais slides pra mostrar as imagens mesmo, porque é o mais... Como é que se diz? facilita mais meu trabalho. (Trecho 13 - Professora Dourado) [...] Para aulas de campo geralmente não tem transporte. É bem complicado você tentar trabalhar uma aula de campo, levar os meninos pra praia, pra gente ter lá a convivência com esses animais, é bem complicado, tu vai ver na prática, quando tu tiver em sala de aula. Esse ano foi bem corrido a gente não teve muito tempo, a gente praticamente não entrou na Zoologia, a gente só trabalhou: poríferos, cnidários, platelmintos e nematoides, só esses quatro filos. (Trecho 14 - Professora Falcão)

A responsabilidade delegada ao professor com relação a possíveis acidentes que poderiam acontecer em espaços não formais de aprendizagem foi um dos fatores assinalados para a não realização de aulas de campo. [...] tu vai ver toda a burocracia que tem para você tirar um aluno desses, levar pra uma aula de campo, tem que assinar e você vai ter que deixar sua cabeça numa

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“guilhotina” né. Se acontecer alguma coisa com algum aluno você vai ser o responsável. (Trecho 15 - Professora Falcão)

Muitas questões permeiam a falta de utilização dessas estratégias na educação básica. Os fatores financeiros e burocráticos são os principais, pois muitas vezes a escola não dispõe de um professor extra para ministrar as aulas de um educador que deseja trabalhar individualmente com uma turma fora do espaço escolar, sendo essas práticas muitas vezes encaradas pela gestão da escola como uma “fuga” do professor para não dar sua aula. “Além disso, a responsabilidade que o professor tem que assumir com relação aos alunos, ao sair da escola, também pesa desfavoravelmente.” (VIVEIRO, 2009, p.8) O livro didático (LD) utilizado na escola também é citado como um aspecto negativo e é nesse sentido que a escolha periódica desse material, no contexto do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) deve ser realizada com bastante atenção, cabendo ao professor participar ativamente desse processo, uma vez que certamente o LD deverá ser o recurso mais utilizado por seus alunos no decorrer do ano letivo. [...] O livro didático também deixa muito a desejar, não tem boas imagens. (Trecho 16 - Professor Leitão)

Nesse sentido, reforça-se a importância do LD utilizado no processo de ensinoaprendizagem na educação básica, levando em consideração que muitas vezes os alunos, principalmente os mais carentes, têm dificuldade de acesso a outras fontes de estudo. “Por isso, tanto na escolha quanto no uso do livro, o professor tem o papel indispensável de observar a adequação desse instrumento didático à sua prática pedagógica e ao seu aluno.” (BRASIL, 2007, p.12) Percebe-se, através dos relatos dos professores, a enorme dificuldade em trabalhar com metodologias alternativas e a falta de recursos é o principal fator citado, desfavorecendo a melhoria da qualidade educacional. Contudo, convém destacar também que em alguns casos, mesmo quando a escola dispõe dos recursos necessários, os professores não se sentem seguros em utilizá-los e isso está intimamente ligado ao seu processo formativo. As escolas públicas da rede de educação básica se ressentem da falta de muitos recursos, da infraestrutura a recursos humanos e materiais; entretanto, uma observação mais atenta às mudanças ocorridas nos últimos anos proporcionar a verificação de avanços que possibilita se sonhar com um ensino de Zoologia atrativo e significativo nesse nível de ensino.

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4.1.4 Visão sobre o interesse e aprendizado dos estudantes No que diz respeito ao interesse e aprendizado dos alunos com relação ao conteúdo de Zoologia, os educadores apontam que isto varia de acordo com cada individuo, mas que de maneira geral eles gostam dessa temática, contudo o aprendizado segundo eles é insatisfatório em grande parte devido ao próprio desinteresse dos estudantes. Assim, no geral as turmas têm uma parte assim desmotivada, desinteressada e outra parte realmente interessada, focada nos estudos, ai esses alunos, você pode colocar esquemas bem simples no quadro que eles ficam ali fixos, [...] Poderia ter mais recurso né? Como um exemplar animal ali na sala pros alunos ver, acho que eles poderiam pegar, ver a cor deles, o tamanho na realidade que ele é. Com certeza complementaria mais o aprendizado deles. (Trecho 17 - Professor Leitão) Com relação aos conceitos, eles tem algumas dificuldades, porque eles dizem que as vezes parece que eu to falando grego e eu to falando grego mesmo, taxonomia, termo cientifico, é grego, latim. Eles têm um pouquinho de dificuldades na questão mesmo conceitual. Mas eu acho que essa questão é superada porque eles gostam da matéria. Com certeza quando chegasse na parte de aves, de répteis, de mamíferos, eles não teriam nenhuma dificuldade, mais a gente nunca chega nessa parte. A maioria eu percebo que gosta, mas é claro que também tem aqueles que não gostam. (Trecho 18 - Professor Raposo)

Através dos relatos feitos pelos docentes, percebemos que o interesse e o aprendizado variam entre os alunos. Nem sempre o professor consegue atingir o objetivo proposto nas suas aulas, o que se aponta é a desmotivação de parte da turma, contudo, convém refletir se as propostas utilizadas estão sendo benéficas para o aprendizado dos estudantes. Segundo Krasilchik (2008, p.183), “todo professor, em algum momento da carreira, já pensou nas transformações necessárias para melhorar suas condições de trabalho, permitindo-lhes realizar suas aspirações de ensinar de forma que os alunos realmente aprendam com prazer”; no entanto, devido às situações adversas encontradas no espaço escolar acabam se desmotivando, não promovendo melhorias nas suas práticas educacionais. No entanto, mesmo diante das dificuldades encontradas diariamente no espaço escolar é necessário que os professores tentem buscar alternativas que priorizem a inserção de novas práticas a serem adotadas no ensino básico, levando em consideração o fato de haver grupos heterogêneos e, portanto, com diferentes demandas de aprendizado.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Mediante a investigação realizada, percebemos o quanto as metodologias utilizadas em sala de aula são importantes para a compreensão dos conteúdos escolares e, consequentemente, para proporcionar uma aprendizagem significativa aos alunos.

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Através da análise dos resultados verificou-se uma série de problemáticas referentes à transposição didática do conteúdo de Zoologia no ensino médio do município de Itapipoca, interior do Ceará. Ressalta-se que mesmo a região de Itapipoca, conhecida como cidade dos três climas por apresentar biomas característicos de litoral, serra e sertão, ter uma diversidade faunística abundante e potencialmente enriquecedora das aulas de zoologia na educação básica, as metodologias utilizadas no ensino médio das escolas investigadas ainda são mais voltadas à transmissão de conteúdos teóricos, sendo a aula expositiva a modalidade didática mais utilizada. Confirmaram-se as lacunas existentes na abordagem do conteúdo de Zoologia, percebendo-se as dificuldades na aplicação de metodologias alternativas, sendo a falta de recursos nas escolas o principal fator apontado pelos docentes para a ausência de outras estratégias educacionais, dando-se mais ênfase à decoração de termos e processos, caracterizando um ensino enciclopédico. No entanto, visualizou-se como fator positivo a preocupação dos educadores em mostrar para os alunos o papel fundamental que os animais desempenham na natureza, abordando-se durante suas aulas a importância de sua preservação. Nessa perspectiva, o assunto discutido lança possibilidades para a construção de outros trabalhos voltados a inserção de metodologias diferenciadas para o ensino de Zoologia. Propõe-se ainda, a realização de pesquisas voltadas para o diagnóstico das metodologias que estão sendo utilizadas no ensino fundamental e que os professores, mesmo diante das dificuldades vivenciadas na educação básica, procurem mecanismos para a melhoria de suas práticas, levando em consideração as diferentes demandas encontradas no espaço escolar.

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