Ação de dissolução parcial de sociedade no novo CPC

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Ação de dissolução parcial de sociedade no novo CPC

Paulo Roberto Pegoraro Junior Doutorando em Direito pela PUC/RS. Mestre em Direito pela UNIPAR. Professor de Direito Processual Civil da graduação e pós-graduação da UNIVEL. Advogado. E-mail [email protected]. Capítulo da obra “Comentários ao Código de Processo Civil”, organizado por Angélica Arruda Alvim, Araken de Assis, Eduardo Arruda Alvim e George Salomão Leite, publicado pela Editora Saraiva. CAPÍTULO V DA AÇÃO DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE Art. 599. A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter por objeto: I - a resolução da sociedade empresária contratual ou simples em relação ao sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; e II - a apuração dos haveres do sócio falecido, excluído ou que exerceu o direito de retirada ou recesso; ou III - somente a resolução ou a apuração de haveres. § 1º A petição inicial será necessariamente instruída com o contrato social consolidado. § 2º A ação de dissolução parcial de sociedade pode ter também por objeto a sociedade anônima de capital fechado quando demonstrado, por acionista ou acionistas que representem cinco por cento ou mais do capital social, que não pode preencher o seu fim. O novo Código de Processo Civil inseriu entre os procedimentos especiais a ação de dissolução parcial de sociedade, de vasta aplicação no âmbito do direito societário, e que vinha sendo regulado na vigência do CPC de 1973 pelas disposições do CPC de 1939 (cf. art. 1.218, VII, CPC/73, e arts. 655/674 do CPC/39). O procedimento se presta a dissolução societária relativamente a um ou mais sócios, com a dissolução do vínculo em relação aos demais, mas não a resilição do contrato social por inteiro, ou seja, a sociedade persiste após o desligamento do sócio. Enquanto na dissolução total o objetivo é extinção da sociedade, com a liquidação de seu patrimônio; na dissolução parcial a atividade empresarial é preservada, operando-se apenas a alteração em seu quadro social e a redução do patrimônio coletivo, com a apuração dos haveres do sócio retirante: “Em relação à extensão de seus efeitos, a doutrina concorda com a divisão clássica: total e parcial. A dissolução é total se leva à liquidação e extinção da sociedade e parcial se opera a retirada de sócio, com apuração parcial de seus haveres” (Negrão,

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Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. v. 1. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 469). São três as hipóteses previstas pelo CPC/2015 para dissolução parcial: 1) em decorrência do falecimento de sócio; 2) em razão da exclusão de sócio ou de sócios pelos demais sócios, que permanecerão vinculados ao contrato social; ou 3) pela retirada ou recesso por um ou mais sócios. Há uma clara opção por assegurar a continuidade da sociedade em relação aos sócios remanescentes, de forma a pacificar pontualmente o quadro agudo conflituoso que envolve a sociedade, restaurando o affectio societatis (vide Enunciado 67, Jornadas CJF). A pretensão pode se dar tanto para dissolução da sociedade ou para apuração de haveres, quanto também para a cumulação de ambos os pedidos, havendo vasto campo para o manejo do negócio jurídico processual, em que as partes estipulem ajustes no contrato social que contemplem os ônus, poderes, faculdades e deveres processuais para o caso de dissolução parcial, conforme art. 190 do CPC/2015. O Código Civil admite a retirada motivada (recesso) do sócio, caso ocorra fusão, incorporação ou modificação do contrato social da sociedade limitada (art. 1.029 e 1.077, CC), na sociedade por prazo determinado, se o sócio provar justa causa (art. 1.029, CC), e também imotivadamente, no regime da sociedade simples de prazo indeterminado (art. 1.029, CC). Já a exclusão do sócio pode ser extrajudicial (art. 1.085, CC) ou judicial (art. 1.030, CC), caso em que se fará uso do procedimento previsto no art. 599 do CPC/2015, exigindo, para tanto, a falta grave no cumprimento das obrigações societárias e dependendo da iniciativa e decisão da maioria dos demais sócios, por incapacidade superveniente (art. 1.030, CC) ou pela falta de integralização total da quota de capital (art. 1.004, CC). No caso de falência ou de liquidação da cota social é dispensada a ação de dissolução parcial, pois a exclusão se dará de pleno direito (art. 1.030, p. ún., CC), restando apenas a apuração de haveres no caso de controvérsia quanto ao montante. Na morte do sócio a liquidação da cota se dará com exceção dos casos nos quais o contrato dispuser diferentemente, se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade ou se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido (art. 1.028, CC). Como documento indispensável à propositura da ação (art. 320, CPC/2015), inclui-se a cópia do contrato social consolidado, autenticado eletrônica ou fisicamente. O objeto da dissolução pode contemplar tanto as sociedades simples (art. 997, CC), as sociedades empresárias (art. 1.039 a 1.092, CC), como também as sociedades anônimas de capital fechado, quando um ou mais sócios, representantes de pelo menos 5% do capital social, comprovem não poder a sociedade preencher o seu fim, tal como consta da previsão do art. 206, II, “b”, da Lei nº 6.404/1976. “Pelas peculiaridades da espécie, em que o elemento preponderante, quando do recrutamento dos sócios, para a constituição da sociedade anônima envolvendo pequeno grupo familiar, foi a afeição pessoal que reinava entre eles, a quebra da affecttio societatis conjugada à inexistência

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de lucros e de distribuição de dividendos, por longos anos, pode se constituir em elemento ensejador da dissolução parcial da sociedade, pois seria injusto manter o acionista prisioneiro da sociedade, com seu investimento improdutivo, na expressão de Rubens Requião. O princípio da preservação da sociedade e de sua utilidade social afasta a dissolução integral da sociedade anônima, conduzindo à dissolução parcial” (REsp 111.294/PR, Rel. Min. Barros Monteiro, Rel. p/ Acórdão Min. Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, j. 19/09/2000, DJU 28/05/2001, p. 161; vide ainda SOLER, Jonathas. A quebra da affectio societatis na exclusão de sócios e dissolução parcial de sociedades. RT 957/177). No caso da penhora de quota social por dívida do sócio também se dará a dissolução parcial da sociedade, caso os demais sócios não exerçam o direito de preferência, mas neste caso se aplica o disposto no art. 861 do CPC/2015. Como se trata de ação de natureza condenatória, cujo objeto é a liquidação de débito reconhecido pelas partes, porém controverso em seu montante, aplica-se o prazo prescricional decenal previsto no art. 205 do CC/02 (REsp 1139593/SC, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 22/04/2014, DJe 02/05/2014). Art. 600. A ação pode ser proposta: I - pelo espólio do sócio falecido, quando a totalidade dos sucessores não ingressar na sociedade; II - pelos sucessores, após concluída a partilha do sócio falecido; III - pela sociedade, se os sócios sobreviventes não admitirem o ingresso do espólio ou dos sucessores do falecido na sociedade, quando esse direito decorrer do contrato social; IV - pelo sócio que exerceu o direito de retirada ou recesso, se não tiver sido providenciada, pelos demais sócios, a alteração contratual consensual formalizando o desligamento, depois de transcorridos 10 (dez) dias do exercício do direito; V - pela sociedade, nos casos em que a lei não autoriza a exclusão extrajudicial; ou VI - pelo sócio excluído. Parágrafo único. O cônjuge ou companheiro do sócio cujo casamento, união estável ou convivência terminou poderá requerer a apuração de seus haveres na sociedade, que serão pagos à conta da quota social titulada por este sócio. O art. 600 do CPC/2015 elenca os legitimados para propositura da ação de dissolução parcial de sociedade. No falecimento do sócio, a legitimação se opera tanto em relação ao espólio, no caso de que todos os sucessores não ingressem na sociedade, ou diretamente pelos sucessores, após a partilha. A sociedade também é legitimada ativa na hipótese de inadmissão do ingresso do espólio ou dos sucessores do sócio falecido, em razão de disposição do contrato social. Além disso, pode a ação ser proposta em nome da sociedade nos casos em que não se admita a exclusão extrajudicial do sócio. Quando o sócio exercer o direito de retirada ou excesso, a legitimação e interesse decorrem tanto da recusa pela sociedade, ainda que tácita, quanto à alteração

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contratual consensual formalizando o desligamento, como também o decurso do prazo de 10 dias do exercício do direito, contados da comunicação da decisão. Por fim, o sócio excluído da sociedade também poderá requerer por meio da ação a apuração de haveres, quando esta não se der de forma extrajudicial. Em se configurando hipótese de exclusão de sócio em face da quebra do intento societário há que se assegurar ao sócio excluído o recebimento do real valor da apuração de haveres de sua contribuição social mediante perícia contábil, caso em que se admite o ajuste extrajudicial: “Direito Comercial. Sociedade Comercial por cotas de responsabilidade limitada. Exclusão de sócio dissidente por deliberação da maioria. Ocorrendo ruptura do elemento subjetivo do vínculo societário (‘Affectio Societatis’) e inexistindo cláusula de unanimidade para a alteração do contrato social, é válida a decisão da maioria pela exclusão do sócio dissidente. Desnecessidade de utilização da via judicial para a medida, preservando-se a harmonia interna como condição de sobrevivência da sociedade. Assegurando do direito do dissidente ao recebimento, após perícia contábil com rigorosa avaliação patrimonial, do valor efetivo da apuração de haveres de sua participação societária. Apelo provido” (TJRJ, 3ª Câm. Cív., ApCiv 6702/00, 0003004-46.2000.8.19.0000, Rel. Des. Luiz Fernando de Carvalho, j. 13/02/2001, publ. 22/02/2001). “Em verdade a exclusão de um sócio do quadro societário, face à desarmonia com a maioria societária que caracteriza a quebra da affectio societatis, é consequência natural, em se tratando de sociedade de pessoas. A prevalência da vontade da maioria é, inegavelmente, um valor da organização democrática das relações entre os homens, produto da evolução racional da espécie humana, conquista da história. Entre os sócios de sociedade empresária não deve prevalecer o interesse do maior número deles, mas sim a vontade do sócio que mais contribui para a formação do capital social da sociedade limitada. É claro que, diante da mudança das condições originais do contrato social, o minoritário terá sempre a faculdade de se retirar da sociedade limitada e receber o reembolso de suas quotas” (ZVEITER, Luiz. Dissolução de sociedade empresarial. Sentença que determinou a dissolução parcial da sociedade com a apuração dos haveres. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, vol. 37, p. 298, jul/2007). O parágrafo único do art. 600 do CPC/2015 confere ainda legitimidade ao cônjuge ou ao companheiro para pedir a apuração de haveres (art. 1.027, CC), tendo como marco temporal o fim da comunhão de esforços para constituição do patrimônio comum, e equiparando a prerrogativa em razão da união estável, desde que esta já tenha sido declarada ou reconhecida previamente. Não há espaço, no procedimento especial, para cumular o pedido de declaração da união estável e de apuração de haveres, eis que envolve objeto e partes legitimadas distintas. Art. 601. Os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 (quinze) dias, concordar com o pedido ou apresentar contestação. Parágrafo único. A sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada.

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Como a dissolução parcial atingirá tanto os sócios quanto a sociedade, é forçoso reconhecer o litisconsórcio passivo que deve se formar entre estes (REsp 1371843/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, j. 20/03/2014, DJe 26/03/2014), para que apresentem contestação ou concordem com o pedido, no prazo de 15 dias. Tratando-se de prazo comum próprio, não se aplica a regra do prazo em dobro do art. 229 do CPC/2015. O parágrafo único do art. 601 do CPC/2015 tratou de dispensar a citação da sociedade caso todos os sócios tenham sido citados, o que a despeito de se admitir por conta do fato de que o interesse da mesma restar preservado pela presença daqueles, relativiza a condição da distinção entre a existência da pessoa jurídica e da pessoa física, e, ainda, demonstra que os efeitos da coisa julgada atinjam terceiros que não tenham participado da lide. Se trata assim, em essência, de litisconsórcio passivo facultativo, e não necessário, já que os atos não serão acoimados de nulidade caso todos os sócios tenham sido citados: “citados todos os sócios, a pessoa jurídica estará amplamente defendida e a eventual nulidade invocada, em face deste aspecto, não resultará em prejuízo para qualquer dos litigantes” (AgRg no REsp 751.625/RN, Rel. Min. Massami Uyeda, Quarta Turma, j. 04/03/2008, DJe 24/03/2008). Art. 602. A sociedade poderá formular pedido de indenização compensável com o valor dos haveres a apurar. No ajuizamento da ação de dissolução parcial (hipótese de cumulação) quanto em reconvenção (art. 343, CPC/2015), a sociedade pode pleitear a indenização em relação ao sócio, ao espólio ou aos sucessores, em decorrência de atos de gestão praticados em prejuízo à sociedade, quando participar de deliberação que aprove graças a seu voto na qual resulte operação contrária ao interesse da sociedade (art. 1.010, § 3º, CC), quando o administrador realizar operações “sabendo ou devendo saber que estava agindo em desacordo com a maioria” (art. 1.013, § 2º, CC), entre outros, e desde que o exerça no prazo prescricional de três anos contados do dano, conforme art. 206, V, CC. Admite-se ainda, expressamente, a compensação entre os haveres e o valor apurado da indenização (arts. 368/380, CC). O pedido reconvencional pode ser formulado também pelos sócios excluídos, como já reconheceu o STJ: “Nada impede os acionistas minoritários de apresentarem, em sede de defesa, reconvenção, caso concordem com a dissolução parcial mas entendam que os acionistas majoritários é que devem se afastar. Todavia, o que não se pode admitir é que, numa sociedade intuito personae com ruptura da affectio societatis, os sócios minoritários se postem contrários à dissolução parcial mas não demonstrem interesse em assumir o controle da empresa” (REsp 1128431/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 11/10/2011, DJe 25/10/2011). Art. 603. Havendo manifestação expressa e unânime pela concordância da dissolução, o juiz a decretará, passando-se imediatamente à fase de liquidação.

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§ 1º Na hipótese prevista no caput, não haverá condenação em honorários advocatícios de nenhuma das partes, e as custas serão rateadas segundo a participação das partes no capital social. § 2º Havendo contestação, observar-se-á o procedimento comum, mas a liquidação da sentença seguirá o disposto neste Capítulo. A incontrovérsia dos sócios quanto à dissolução da sociedade, manifestada de forma unânime e expressa, autoriza a decretação de imediato da dissolução (art. 356, CPC/2015), caracterizando o reconhecimento do pedido e permitindo que se passe desde logo à fase de liquidação. Como não se verifica pretensão resistida, não há que se impor a fixação de honorários advocatícios, em regra de exceção ao disposto no art. 90 do CPC/2015, com o rateio das custas de acordo com a participação de cada um dos sócios no capital social. A participação de cada sócio que deve ser ponderada para o rateio é aquela com base na situação societária à data da resolução, ou seja, quando da decretação judicial da dissolução parcial (art. 1.031, CC). “A lei não prevê a participação da sociedade no rateio das custas, devendo-se supor que ela não contribui, especialmente porque, do contrário, poderia haver desequilíbrio na repartição pretendida pela lei” (MARINONI, Luiz Guilherme. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 631). Pela regra estatuída pelo § 1º, e ante a aplicação do princípio da causalidade, se uma parte dos sócios concordar com a dissolução, e um ou mais discordarem, os que se opuserem à dissolução ficarão sujeitos à condenação em honorários: “Sociedade comercial. Dissolução parcial. I - A ação de dissolução parcial deve ser promovida pelo sócio retirante contra a sociedade e os sócios remanescentes, em litisconsórcio necessário. (...) IV - Estabelecido o litígio entre as partes, embora concordem os réus com a retirada dos autores, cabe a imposição dos ônus da sucumbência sobre os réus, que reconheceram parte do pedido dos autores, e ficaram vencidos quanto ao restante” (REsp 77.122/PR, Rel. Min. Ruy Rosado De Aguiar, Quarta Turma, j. 13/02/1996, DJ 08/04/1996, p. 10475). Caso oferecida contestação ao pedido, ainda que por um único sócio, deve ser observado o procedimento comum (art. 318, CPC/2015), mas a liquidação não seguirá o rito do art. 509/512 CPC/2015, mas sim a do art. 604/608 do CPC/2015. Art. 604. Para apuração dos haveres, o juiz: I - fixará a data da resolução da sociedade; II - definirá o critério de apuração dos haveres à vista do disposto no contrato social; e III - nomeará o perito. § 1º O juiz determinará à sociedade ou aos sócios que nela permanecerem que depositem em juízo a parte incontroversa dos haveres devidos. § 2º O depósito poderá ser, desde logo, levantando pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores. § 3º Se o contrato social estabelecer o pagamento dos haveres, será observado o que nele se dispôs no depósito judicial da parte incontroversa.

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A liquidação da apuração dos haveres na dissolução parcial da sociedade dependerá do levantamento preciso do valor da quota do sócio retirante. Deve ser fixado judicialmente, em primeiro lugar, como marco temporal referencial, a data em que se verificou o fato ou ato de resolução da sociedade, na forma do art. 605 do CPC/2015. O contrato social pode regular de forma soberana disposições particulares e concretas acerca do procedimento para apuração dos haveres, caso em que sua prevalência é inquestionável (art. 190 e 604, II, CPC/2015, e art. 1.031, CC), embora já tenha o STJ relativizado a regra: “1. Na dissolução parcial de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, o critério previsto no contrato social para a apuração dos haveres do sócio retirante somente prevalecerá se houver consenso entre as partes quanto ao resultado alcançado. 2. Em caso de dissenso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que o balanço de determinação é o critério que melhor reflete o valor patrimonial da empresa” (REsp 1335619/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Min. João Otávio De Noronha, Terceira Turma, j. 03/03/2015, DJe 27/03/2015). A existência de parte incontroversa dos haveres impõe o depósito judicial do montante pelos sócios remanescentes ou pela sociedade, que poderá ser levantado desde logo pelo ex-sócio, pelo espólio ou pelos sucessores, mas o contrato social, uma vez mais, pode regular de forma diversa o pagamento, cf. § 3º, em especial quanto às condições de parcelamento. Caso os sócios ou a sociedade não providenciem o depósito, e como se trata de obrigação quanto ao pagamento de quantia certa, cabe a execução provisória (art. 520/522, CPC/2015), com incidência da multa de 10% e honorários, também de 10% (art. 523, CPC/2015). Art. 605. A data da resolução da sociedade será: I - no caso de falecimento do sócio, a do óbito; II - na retirada imotivada, o sexagésimo dia seguinte ao do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio retirante; III - no recesso, o dia do recebimento, pela sociedade, da notificação do sócio dissidente; IV - na retirada por justa causa de sociedade por prazo determinado e na exclusão judicial de sócio, a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade; e V - na exclusão extrajudicial, a data da assembleia ou da reunião de sócios que a tiver deliberado. A fixação da data da resolução da sociedade deve levar em conta, primeiramente, o que tenha sido ajustado pelo contrato social. Subsidiariamente, por ser regra anterior, o Código Civil também regula a fixação da data (arts. 1.028, 1.004, 1.029, 1.030), mas em caso de conflito deve prevalecer o disposto no Código de Processo Civil de 2015 Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação,

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tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma. Parágrafo único. Em todos os casos em que seja necessária a realização de perícia, a nomeação do perito recairá preferencialmente sobre especialista em avaliação de sociedades. Nada dispondo o contrato social, a apuração deve levar em conta a situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado (art. 1031, CC). O parágrafo único do art. 606 alude a possibilidade, e não necessidade, da realização da perícia, embora altamente recomendável diante da complexidade usualmente envolvida na apuração. Se realizada, a perícia deve concluir pelo valor da quota em moeda corrente, para que ele seja pago pela pessoa jurídica, salvo estipulação em contrário. A avaliação deve contemplar os bens tangíveis e intangíveis, além do passivo. O STJ já teve oportunidade de reconhecer o valor da marca deve ser levado em consideração, ainda que não conste de registro junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial: “IV - Na dissolução de sociedade comercial, a apuração de haveres no caso de sócio retirante deve ser feita como se de dissolução total se tratasse, evitando locupletamento indevido dos sócios remanescentes. V - Declarando o perito judicial que mencionou a marca HSM como componente de fundo de comércio, não há como se fazer ilação para afirmar que, não registrada no INPI a referida marca, direito a ela não teria o sócio-retirante” (REsp 453.476/GO, Rel. Min. Antônio De Pádua Ribeiro, Terceira Turma, j. 01/09/2005, DJ 12/12/2005, p. 369). Os tribunais vêm reconhecendo há bastante tempo que a dissolução da sociedade por quotas e a respectiva apuração de haveres se devem amparar na mais ampla base “para a exata verificação, física e contábil” dos bens (STF, RE 89464, Rel. Min. Cordeiro Guerra, Rel. p/ Ac. Min. Décio Miranda, Segunda Turma, julgado em 12/12/1978, DJ 04-05-1979 PP-3521; STF, RE 92773, Rel. Min. Cordeiro Guerra, j. 25/08/1981, Segunda Turma, DJU 23/10/1981, p. 10630). O STJ, do mesmo modo, tem insistido que a apuração dos bens deve ser a mais detalhada possível por meio da “exata verificação física e contábil”, representada pelo balanço de verificação, como expresso no voto do Min. Waldemar Zveiter, que entende: “Em casos tais, consoante iterativa jurisprudência, inobstante parcial a dissolução, deve haver a apuração real e efetiva dos haveres dos sócios dissidentes, com o conhecimento pleno do valor de mercado da universalidade dos bens que compunham o patrimônio da sociedade, na época do fato (…) utilizando-se, para tanto, todos os meios de prova aplicáveis, não se limitando a apuração, pois, a mera perícia contábil” (REsp 35.702/SP, Rel. Min. Waldemar Zveiter, Terceira Turma, j. 27/09/1993, DJ 13/12/1993, p. 27454). Por outro lado, o STJ também reconheceu que o fluxo de caixa descontado, “por representar a metodologia que melhor revela a situação econômica e a capacidade de geração de riqueza de uma empresa, pode ser aplicado juntamente com o balanço de determinação na apuração de haveres do sócio dissidente” (REsp 1335619/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. p/ Acórdão Min. João Otávio De Noronha, Terceira Turma, j. 03/03/2015, DJe 27/03/2015).

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Para se evitar locupletamento ilícito em favor da sociedade ou dos sócios remanescentes, o STF editou a Súmula 265, dispondo que “na apuração de haveres, não prevalece o balanço não aprovado pelo sócio falecido, excluído, ou que se retirou”. Diante da necessidade de perícia, a escolha deve recair preferencialmente em especialista em avaliação de sociedades, o que se confirmará pela apresentação curriculum na forma do art. 465, § 2º, inc. II, CPC/2015 podendo as partes escolher o expert em comum acordo (art. 471, CPC/2015). Art. 607. A data da resolução e o critério de apuração de haveres podem ser revistos pelo juiz, a pedido da parte, a qualquer tempo antes do início da perícia. Até o início da perícia, e a pedido da parte, admite-se a revisão da data da resolução da sociedade e do critério de apuração, em exceção à regra de preclusão das questões decididas (art. 507, CPC/2015), exigindo a presença de elementos novos, capazes de influir na determinação dos critérios já estabelecidos. Com o início da perícia, contudo, o balizamento judicial torna-se imutável neste aspecto, pois inclusive inviabilizaria a continuidade do trabalho pericial. Art. 608. Até a data da resolução, integram o valor devido ao ex-sócio, ao espólio ou aos sucessores a participação nos lucros ou os juros sobre o capital próprio declarados pela sociedade e, se for o caso, a remuneração como administrador. Parágrafo único. Após a data da resolução, o ex-sócio, o espólio ou os sucessores terão direito apenas à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais. O art. 608 do CPC/2015 estabelece três espécies de remuneração que podem ser percebidas pelo sócio de uma sociedade: participação nos lucros, remuneração como administrador e juros sobre capital próprio declarados pela sociedade. Assim, além da quota social propriamente, tem o ex-sócio, seu espólio ou seus sucessores direito à percepção de tais verbas, até a data fixada da resolução parcial. Depois da data da resolução, remanesce apenas o direito à correção monetária dos valores apurados e aos juros contratuais ou legais. Art. 609. Uma vez apurados, os haveres do sócio retirante serão pagos conforme disciplinar o contrato social e, no silêncio deste, nos termos do § 2o do art. 1.031 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). A regra primordial para o pagamento dos haveres do sócio se encontra no contrato social. Apenas subsidiariamente, por aplicação do art. 1.031 do Código Civil, o pagamento deverá ser feito pela pessoa jurídica, “no prazo de noventa dias, contado do término da apuração contábil. Como consequência, o capital social, naturalmente, será

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diminuído, a não ser que os sócios remanescentes recomponham os valores endereçados àquele que se retirou, devendo, em todo caso, ser formalizado alteração do contrato social e averbada nos assentamentos mantidos Oficial de Registro Civil de Pessoa Jurídica”, ou na Junta Comercial (BARBOSA FILHO, Marcelo Fortes. Código civil comentado. Coord. Cezar Peluso, 2ª ed., Barueri: Manole, 2008, p. 960). No entanto, para Teresa Arruda Alvim Wambier et al, o prazo para o pagamento deve se dar a partir do trânsito em julgado da decisão que os fixar, e não nos 90 dias estabelecidos pelo Código Civil, por se tratar de liquidação fixada judicialmente (Primeiros comentários ao novo código de processo civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 964). Seja como for, findo o prazo, incidem as regras relacionadas ao cumprimento de sentença, inclusive com incidência de multa coercitiva e honorários (art. 523, § 1º, CPC/2015).

Como citar este artigo: PEGORARO JUNIOR, Paulo Roberto. Da ação de dissolução parcial de sociedade. In Comentários ao código de processo civil. Coordenadores Angélica Arruda Alvim... [et al.]. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 711-718.

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