AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE E A PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE: UM ESTUDO DE CASO

June 2, 2017 | Autor: Luciola Cabral | Categoria: Political Economy, Political Theory, Political Science
Share Embed


Descrição do Produto

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE E A PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE: UM ESTUDO DE CASO

Lucíola Maria de Aquino Cabral1 Márcio Augusto Diniz de Vasconcelos2

RESUMO

Este trabalho aborda questão relacionada a propositura de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Ministério Público do Estado do Ceará, junto ao Tribunal de Justiça, visando a suspensão de todos os artigos da Lei municipal nº 8.915, de 23.12.2004, (DOM 04.01.2005), que estabelece diretrizes para a realização da operação urbana consorciada na área denominada “Dunas do Cocó”. Trata-se de estudo de caso concreto que tramita na justiça estadual, cuja análise resultou na realização desta pesquisa.

Palavras – chave: Inconstitucionalidade. Lei municipal. Meio Ambiente. Dunas. Operação urbana consorciada.

1

Procuradora do Município de Fortaleza. Doutora em Direito Constitucional. Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais. Mestre em Direito Constitucional. Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública - IBAP. 2 Procurador do Município de Fortaleza. Chefe da Procuradoria Judicial da PGM. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor da Universidade Federal do Ceará.

1

UNCONSTITUTIONALITY DIRECT ACTION AND THE ENVIRONMENT PROTECTION: A CASE STUDY

ABSTRACT

This paper focuses on na issue related to the proposal of direct action of unconstitutionality taken by the Public Ministry of the State of Ceará – Brazil, before the Justice Court, aiming at suspending all the articles of the 8.915 municipal Law, published on the Municipal Official Journay of april, 1st of 2005, which establishes directives to be observed as the consorciated urban operation is carried out in the area called “Dunes of the Coco River”. This analysis presented is based on a real case study which is current under consideration in the State Justice sphere.

Key words: Unconstitutionality. Municipal Law. Environment. Dunes. Consorciated urban operation.

2

INTRODUÇÃO Trata o presente trabalho da análise de uma ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Ministério Público Estadual perante o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, em desfavor da Lei municipal nº. 8.915, de 23.12.2004, (DOM 04.01.2005), que estabelece diretrizes para a realização da operação urbana consorciada na área denominada “Dunas do Cocó”. Em seus argumentos, o Ministério Público Estadual, doravante simplesmente MPE, alega que a lei municipal – violentamente hostilizada – ofende as regras contidas nos artigos 23, 26, 154, caput, 259, caput, 288 e 289, todos da Constituição do Estado do Ceará, buscando, assim, a declaração total da inconstitucionalidade da norma municipal vergastada. Observa-se, no entanto, que os argumentos utilizados pelo Autor são bem acacianos, amplos, muito gerais até; mesmo quando observados sob o aspecto de uma “clínica jurídica” que procura expor, consoante se pode verificar nos seguintes exemplos: - a norma traz em si “... o bacilo de inconstitucionalidade por conspirar contra o já combalido ecossistema de Fortaleza”...; - a operação consorciada não assegura “... o prodígio de um desenvolvimento urbano sustentável”, nem favorece “... a manutenção das bases vitais do ecossistema”... ; - o meio ambiente está “... ameaçado pela cobiça humana”; - a legislação “alvo” da presente ADIN “... despudoradamente lança a pedra fundamental da devastação dos últimos mananciais na área urbana de Fortaleza”.

A simples análise da peça vestibular assume uma singular importância quando explicita o seu nítido propósito: combater os termos da lei municipal objurgada sob a ótica da inconstitucionalidade material, conforme se pode observar adiante: - Mencionada legislação padece de vícios incontornáveis de inconstitucionalidade sob o ângulo material, vulnerando ostensivamente a supremacia da Carta do Estado do Ceará...”.

Em um primeiro momento, indaga-se onde reside a ofensa, do ponto-de-vista material? No entendimento do MPE a ofensa existe “... tanto a princípios nominados, quanto a princípios implícitos”. Indaga-se, em seguida, quais os princípios jurídicos efetivamente “fraturados” pelo legislador municipal?: a) aparentemente, o princípio da legalidade, uma vez que toda a Lei Municipal 8.915/2004 afrontaria a Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto da Cidade). O MPE aduziu, ainda, que a Lei Municipal 8.915/2004 “avançou imprudentemente sobre a intenção da Lei Federal que rege o Estatuto da Cidade”, porque não atende aos requisitos do art. 33, incs. III e IV, da mencionada Lei Federal 10.257/2001, com violação, ipso facto, do princípio da separação de poderes, delegando ao administrador tarefa que caberia, a princípio, ao legislador. Onde estaria à ofensa a Carta da República?

3

b) aparentemente, nos princípios da moralidade e da impessoalidade (CF, art. 37 e CE art. 154). Neste item específico, a inconstitucionalidade existiria por inferência, vem a ser, à vista das alegadas violações aos artigos 23 (proteção às dunas, bens de uso comum do Povo), 26 (o município reger-se-á por sua própria Lei Orgânica); 154, caput (a administração pública direta e indireta obedecerá aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência), 288 e 289 da Constituição Estadual (caráter social da política urbana), onde o espaço público fortalezense teria sido transformado pelo legislador municipal em “quintais empresariais”, “sangrando” o “conteúdo axiológico” das disposições constitucionais destacadas. O mais grave, porém, verifica-se na assertiva do autor quando se refere a questão da inconstitucionalidade material: “In casu, o vício de inconstitucionalidade é material, porque não diz respeito ao procedimento com que a Lei foi feita, mas sim com o específico conteúdo de suas disposições”.

Ressalta-se que foi requerida medida cautelar para que seja suspenso “o inteiro teor” da Lei Municipal nº. 8.915/2004. Estes os fatos brevemente historiados para possibilitar melhor compreensão da matéria enfocada neste trabalho.

1 ASPECTOS PROCESSUAIS RELEVANTES Será demonstrado adiante, que a ADI proposta pelo Ministério Público Estadual é descabida, uma vez que a análise da peça inicial permite aferir, pelo menos, as seguintes impropriedades: i) inépcia da inicial; ii) impropriedade da via eleita: pelo conteúdo da inicial, pela causa de pedir e pelo pedido formulado, considerando-se que a questão constitucional é reflexa, uma que o conflito, se existente, seria entre a Lei municipal nº 8.915/2004 e a Lei federal nº 10.257/2001; iii) violação ao art. 3º, I, da Lei federal nº 9.868/1999; iv) descabimento da ação direta de inconstitucionalidade. O vigente modelo constitucional de competências jurisdicionais relativas ao controle concentrado da constitucionalidade das leis prevê apenas duas hipóteses de fiscalização judicial in abstracto: a) ADI contra lei ou ato normativo federal ou estadual por ofensa à Constituição Federal de competência do STF (CF, art. 102, I, a); b) ADI contra lei ou ato normativo estadual ou municipal por ofensa à Constituição do Estado-Membro (CF, art. 125, par. 2o.). A Constituição Federal não dá aos Tribunais de Justiça nem ao próprio Supremo Tribunal Federal competência para conhecer e julgar ações diretas de inconstitucionalidade contra leis municipais tendo como parâmetro a Constituição Federal, vez que não há qualquer previsão constitucional que abra a possibilidade de decisões judiciais válidas a respeito. O único controle da constitucionalidade possível das leis municipais em face da Constituição 4

Federal é o controle difuso, incidenter tantum. Nesse sentido, é a tradição consolidada no Supremo Tribunal Federal. Esta questão foi suscitada, pelo Ministro Moreira Alves, em voto proferido no RE 92.169-SP (Rel. Min. Cunha Peixoto): (...) se fosse possível aos Tribunais de Justiça dos Estados o julgamento de representações dessa natureza, com relação a leis municipais em conflito com a Constituição Federal, poderia ocorrer a seguinte situação esdrúxula. É da índole dessa representação – e isso hoje é matéria pacífica nesta Corte – que ela, transitando em julgado, tem eficácia erga omnes, independentemente da participação do Senado Federal, o que só se exige para a declaração incidenter tantum. O que implica dizer que se transitasse em julgado a decisão nela proferida por Tribunal de Justiça, esta Corte Suprema estaria vinculada à declaração de inconstitucionalidade de Tribunal que lhe é inferior; mesmo nos casos concretos futuros que lhe chegassem por via de recurso extraordinário. O absurdo da conseqüência, que é da índole do instrumento, demonstra o absurdo da premissa.

Veja-se também a seguinte passagem do voto do Min. Leitão de Abreu: Gostaria de deduzir, com o desenvolvimento que o alto relevo dessa questão constitucional comportaria, as razões que, a meu sentir, militariam a favor da tese perfilhada pelo acórdão recorrido, se superáveis, em relação ao presente caso, todos os óbices que se levantam acerca do cabimento da representação proposta perante o Tribunal local, para a declaração de inconstitucionalidade da lei municipal, de que na hipótese se trata, por incompatibilidade com a Constituição Federal. Não achei meios jurídicos, todavia, que me habilitassem a vencer o obstáculo, levantado pelo Ministro Moreira Alves, no que diz respeito à situação que se criaria no caso de se declarar, pelo Tribunal de Justiça, inconstitucionalidade de lei municipal, por denotar conflito com a Carta Federal, sem que dessa decisão se manifeste recurso extraordinário. Transitada em julgado decisão dessa natureza, ficaria, na verdade, o Supremo Tribunal vinculado à declaração de inconstitucionalidade pronunciada pelo Tribunal de Justiça e, por via de conseqüência, impossibilitado de julgar casos concretos futuros que, em recursos extraordinários, se trouxessem à sua apreciação. Como essa conseqüência, que seria inelutável, se me afigura, também, inadmissível, não há senão concluir, a meu ver malgrado a elegante construção jurídica do Tribunal paulista, pela inconstitucionalidade das expressões “inconstitucionalidade” do artigo 54, I, e, da Constituição do Estado de São Paulo. Conhecendo, pois, do recurso, lhe dou provimento para que a inconstitucionalidade assim fique pronunciada.

Também nesse sentido, o julgado proferido na ADI 409, de que foi Relator o em. Min. Sepúlveda Pertence (DJU 26.04.2002, p. 65): Controle abstrato de constitucionalidade de leis locais (CF, art. 125, § 2º): cabimento restrito à fiscalização da validade de leis ou atos normativos locais - sejam estaduais ou municipais -, em face da Constituição estadual: invalidade da disposição constitucional estadual que outorga competência ao respectivo Tribunal de Justiça para processar e julgar ação direta de inconstitucionalidade de normas municipais em face também da Constituição Federal: precedentes.3

O Min. Gilmar Mendes demonstra a consolidação do pensamento da Corte na Reclamação 383/SP, a respeito da coexistência das jurisdições constitucionais, federal e estadual, em se tratando de leis e atos normativos estaduais e municipais:

3

POLETTI, Ronaldo. Controle da Constitucionalidade das Leis. 2a. Ed., RJ: Forense, 2001, pp. 204-209.

5

Tal como já apontado, essa decisão forneceu as novas bases do sistema de controle direto de constitucionalidade do direito estadual e municipal perante o Tribunal de Justiça, assentando a autonomia dos parâmetros de controle e a possibilidade de que a questão suscitada perante o Tribunal local se converta numa questão constitucional federal, especialmente nos casos de aplicação das chamadas normas de reprodução obrigatória por parte do Estado-membro. 4

Correndo o risco da redundância, mas apenas para que a questão fique conclusivamente posta neste trabalho, transcreve-se decisão proferida pelo em. Min. Cezar Peluso na Reclamação 4955/MC/RJ (DJU 08.03.2007, p.37): 2. O caso é de liminar. A este juízo prévio e sumário aparece consistente a alegação de a decisão liminar, proferida na Representação por Inconstitucionalidade nº 2006.007.00161, ter usurpado competência desta Corte. É que a competência para o controle abstrato da constitucionalidade de leis estaduais, conferida pela Constituição da República aos tribunais estaduais, se restringe à estima de compatibilidade delas com a Constituição do respectivo Estado (CF, art. 125, § 2º), não se lhes admitindo confronto com a Carta da República, como é de inveterado entendimento da Corte: "Controle abstrato de constitucionalidade de leis locais (CF, art. 125, § 2º): cabimento restrito à fiscalização da validade de leis ou atos normativos locais - sejam estaduais ou municipais -, em face da Constituição estadual (...)" (ADI nº 409, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 26.04.2002) . "Argüição da inconstitucionalidade de leis estaduais, mediante invocação da Carta local, mas também em contraste com preceitos e princípios da Constituição Federal. Controvérsia acerca da competência para o julgamento da correspondente ação direta. Reclamação tida como procedente" (Rcl nº 370, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI, DJ de 29.06.2001). ... omissis ... Tudo inculca, pois, que se não está diante de argüição de ofensa a norma constitucional estadual de reprodução obrigatória, o que desencadearia a competência do tribunal local para julgamento do feito (cf. Rcl nº 596-AgR, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ de 14.11.1996; Rcl nº 383, Rel. Min. MOREIRA ALVES, DJ de 21.05.1993), mas de autêntica alegação de insulto de lei estadual à Constituição da República. Daí, a consistência do pedido de liminar. (...) Ministro CEZAR PELUSO, Relator.

Aqui, um importantíssimo aspecto: é possível constatar sem muito esforço, que o MPE aponta, na vestibular, um inexistente conflito entre a Lei Municipal 8.915/2004 e a Lei Federal 10.157/2001 (Estatuto da Cidade). A análise dessa matéria, que retrata e alega uma aparente antinomia entre duas normas de hierarquia infra-constitucional não expõe, à Corte Estadual, uma questão constitucional, pois não existe afronta direta entre a lei municipal vergastada e a Constituição do Estado do Ceará. Nesse caso, eventual questionamento jamais poderia ser levado ao Poder Judiciário mediante processo objetivo, pois a verificação da compatibilidade entre lei municipal e lei federal não justifica, pelos termos do art. 125/CF, a abertura da jurisdição constitucional e da competência do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará para conhecer e julgar a mencionada ação direta de inconstitucionalidade. Dito de outro modo: a prevalecer como verdadeiros, os frágeis argumentos da inicial da ADI, o exame da matéria estaria restrito, ad argumentandum, ao âmbito da legalidade e não ao da constitucionalidade da norma municipal questionada, o que não abre a via do controle concentrado. 4

MENDES, Gilmar Ferreira. O controle de constitucionalidade do direito estadual e municipal na Constituição Federal . Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=122>. Acesso em: 22 jun. 2007.

6

Mais ainda: a Lei Municipal 8.915/2004 é pura, única e exclusivamente de natureza local; é relativa ao Município de Fortaleza. Nunca teve - nem tem - o intuito de estabelecer quaisquer tipos de normas gerais, não invadindo nenhuma competência da União para editar estas normas; também não invadiu a competência do Estado do Ceará para as normas de caráter regional. Desse modo, não se afigura, por esse prisma, o menor indício de inconstitucionalidade formal. A inconstitucionalidade que justifica o ajuizamento da ADI é aquela de natureza direta, que decorre de ofensa direta à Constituição, não se podendo admitir a fiscalização do vício da ilegalidade, que apenas atinge, por via oblíqua, preceitos constitucionais. O STF não admite, para fins de ADI, norma intermediária entre o ato normativo fiscalizado e a Constituição, situação que origina, quando muito, um problema de ilegalidade, o qual não se reconduz ao conceito de inconstitucionalidade. No caso de que se cuida, é clarividente, a partir dos fatos e fundamentos jurídicos da inicial e dos pressupostos acima expostos, que o confronto primeiro, a que deve se submeter o ato normativo municipal impugnado será em relação à Lei Federal 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), o que jamais poderia ocorrer em sede de ação direta de inconstitucionalidade; o exame quanto à constitucionalidade da lei municipal não atrai nenhuma consideração em torno da supremacia da Constituição do Estado do Ceará quanto à lei fiscalizada – o que, demonstra a impossibilidade de conhecimento da aludida ação. Em conclusão: não existe nenhuma norma paramétrica estadual que viabilize o trânsito da aludida ADI: para que as normas da constituição estadual invocadas pelo autor pudessem ser consideradas paramétricas em relação à legislação municipal posta em destaque, seria preciso, preliminarmente, definir se o Estado do Ceará poderia validamente, segundo os termos da Constituição Federal, editar normas de caráter compulsório para o Município de Fortaleza, a respeito da concretização do Estatuto da Cidade, Lei Federal 10.257/2001. Desse modo, a mencionada ADI não possui condições que possam propiciar o desenvolvimento válido e regular do processo, pela simples e tautológica razão de que não há violação de nenhuma regra constitucional estadual. Portanto, a petição inicial é inepta. A equivocada inserção da Constituição do Estado do Ceará nesta ADI foi apenas um ardil processual para justificar a competência desta Corte, provocação inútil da função jurisdicional. Há manifesta impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que não há norma constitucional estadual a ser confrontada para fins de exame da validade da legislação municipal5. Diante das razões alinhadas acima, conclui-se, por fácil ilação, que a via processual eleita é manifestamente inadequada; a ADI objeto deste estudo foi equivocadamente ajuizada perante a Corte Estadual de Justiça, e deve ser extinta sem apreciação de mérito, uma vez que a lei municipal hostilizada não viola, nenhuma norma da Constituição do Estado do Ceará. Destaca-se, ainda, que a ADI ora analisada descumpriu o comando expresso do art. 3º., I, da Lei Federal 9.868/99: Art. 3o A petição indicará: I - o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações; No caso vertente, uma perfunctória leitura da petição inicial mostra um confuso e desordenado ataque aos termos da Lei municipal nº. 8.915/2004, sem identificar, expor e mostrar onde e em quais artigos, parágrafos ou incisos, a lei municipal se mostra em conflito 5

Cf. STF. ADIN 1.803/SP. Rel. Min. Moreira Alves. DJU, I, 24.04.1998, p. 4.

7

com artigos, parágrafos e/ou incisos da Constituição Estadual, o que acarreta a extinção do feito sem resolução de mérito e arquivamento da ação, por ausência de desenvolvimento válido e regular do processo e por inépcia da inicial. Eis a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a respeito: ADI 2561 / MG - MINAS GERAIS Relator: Min. EROS GRAU Julgamento: 15/12/2004 Publicação DJ 01/02/2005 PP-73 DECISÃO: O Governador do Estado de São Paulo, com fundamento no inciso V do artigo 103 da Constituição do Brasil, propõe ação direta de inconstitucionalidade dos seguintes textos normativos do Estado de Minas Gerais: - Lei n. 11.393, de 6 de janeiro de 1994; - Lei n. 12.281, de 1º de agosto de 1996; - Decreto n. 35.435, de 9 de março de 1994; - Decreto n. 38.106, de 2 de julho de 1996; - Decreto n. 39.563, de 30 de abril de 1998; - Decreto n. 40.884, de 26 de janeiro de 2000; - Decreto n. 41.176, de 11 de julho de 2000; - Decreto n. 41.587, de 14 de março de 2001 (todas relacionadas ao Fundo de Incentivo à Industrialização). - Lei n. 12.228, de 4 de julho de 1996; - Lei n. 13.431, de 28 de dezembro de 1999; - Decreto n. 38.290, de 16 de novembro de 1996; - Decreto n. 39.217, de 10 de novembro de 1997; - Decreto n. 40.558, 3 de agosto de 1999; Decreto n. 40.848, de 29 de dezembro de 1999; - Decreto n. 40.982, de 30 de março de 2000; Decreto n. 41.021, de 24 de abril de 2000; - Decreto n. 41.311, de 19 de outubro de 2000; Decreto n. 41.532, de 1º de fevereiro de 2001; - Decreto n. 41.840, de 21 de agosto de 2001 (todas relacionadas ao Fundo de Desenvolvimento de Indústrias Estratégicas). 2. O requerente aduz, em síntese, que os mencionados preceitos afrontariam os arts. 150, § 6º, e 155, II, e § 2º, XII, "g" da Constituição do Brasil por instituírem planos de incentivos e benefícios que prevêem estímulos fiscais com base na arrecadação do ICMS, sem autorização consensual de todos os Estadosmembros da Federação. 3. A Advocacia-Geral da União opina pelo não-conhecimento da ação por entender que "o requerente não especificou os dispositivos das leis ou dos atos administrativos impugnados em confronto com preceptivos constitucionais" (fls. 185/191). 4. O Ministério Público Federal, no parecer de fls. 193/200, manifestou-se pelo acolhimento da argüição de inépcia da exordial, por vislumbrar que o interessado deixou de "demonstrar de forma específica quais os dispositivos das leis estaduais eivados de inconstitucionalidade, ou seja, que configurem a alegada guerra fiscal, bem como qual o fundamento jurídico do seu pedido em relação às impugnações. 5. O Procurador-Geral da República aduz ainda que os decretos impugnados objetivaram regulamentar as Leis Estaduais ns. 11.393/94 e 12.228/96, razão pela qual não poderiam ter a constitucionalidade aferida em sede de ação direta. Esclarece também que a ocorrência de eventual vício seria caracterizada pela ilegalidade, porque os decretos referidos são "atos meramente regulamentadores" (fl.197). 6. Por fim, opina no sentido de ser declarada a improcedência da ação. 7. É o relatório. Decido. 8. Da leitura e análise da petição inicial, observa-se que o requerente não demonstra quais preceitos dos textos normativos estariam em confronto com a Constituição do Brasil nem os analisa de forma correlacionada aos artigos constitucionais supostamente violados. 9. Necessário lembrar que a Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 1999, preconiza que a peça inaugural das ações diretas indicará o dispositivo da lei ou do ato normativo atacado e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações (art. 3º). 10. Por não observar essa determinação legal, o requerente deixa de obedecer à técnica imprescindível ao conhecimento da ação. A inicial não se reveste das formalidades a ela inerentes. Enseja a declaração da inépcia da peça por faltarlhe requisitos essenciais. 11. No caso específico, a exordial não foi elaborada segundo as regras e o estilo constantes em lei própria, destinada a disciplinar o processo e julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade. Ao contrário, tem-se pedido genérico e inespecífico. 12. A situação descrita não é nova no âmbito desta Corte. Em caso similar, foi proferido o seguinte entendimento: "EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. IMPUGNAÇÃO ABSTRATA E GENÉRICA DE LEI COMPLEMENTAR. IMPOSSIBILIDADE DE COMPREENSÃO EXATA DO PEDIDO. NÃO CONHECIMENTO. 1. Argüição de inconstitucionalidade de lei complementar estadual. Impugnação genérica e abstrata de suas normas. Conhecimento. Impossibilidade. 2. Ausência de indicação dos fatos e fundamentos jurídicos do pedido com suas especificações. Não observância à norma processual. Conseqüência: inépcia da inicial. Ação direta não conhecida. Prejudicado o pedido de concessão de liminar". (ADI n. 1.775, Relator o Ministro

8

Maurício Corrêa, DJ de 18/05/2001) Em face das circunstâncias mencionadas, não conheço da ação direta de inconstitucionalidade por inépcia da petição inicial. Intime-se. Arquive-se. Brasília, 15 de dezembro de 2004. Ministro Eros Grau Relator.

ADI 3340 / DF - DISTRITO FEDERAL Relator: Min. MARCO AURÉLIO Relator p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES Julgamento: 03/11/2005 Órgão Julgador: Tribunal Pleno Publicação: DJ 09-03-2007 PP-25 EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Decreto no 4.346/2002 e seu Anexo I, que estabelecem o Regulamento Disciplinar do Exército Brasileiro e versam sobre as transgressões disciplinares. 2. Alegada violação ao art. 5o, LXI, da Constituição Federal. 3. Voto vencido (Rel. Min. Marco Aurélio): a expressão ("definidos em lei") contida no art. 5o, LXI, refere-se propriamente a crimes militares. 4. A Lei no 6.880/1980 que dispõe sobre o Estatuto dos Militares, no seu art. 47, delegou ao Chefe do Poder Executivo a competência para regulamentar transgressões militares. Lei recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Improcedência da presente ação. 5. Voto vencedor (divergência iniciada pelo Min. Gilmar Mendes): cabe ao requerente demonstrar, no mérito, cada um dos casos de violação. Incabível a análise tão-somente do vício formal alegado a partir da formulação vaga contida na ADI. 6. Ausência de exatidão na formulação da ADI quanto às disposições e normas violadoras deste regime de reserva legal estrita. 7. Dada a ausência de indicação pelo decreto e, sobretudo, pelo Anexo, penalidade específica para as transgressões (a serem graduadas, no caso concreto) não é possível cotejar eventuais vícios de constitucionalidade com relação a cada uma de suas disposições. Ainda que as infrações estivessem enunciadas na lei, estas deveriam ser devidamente atacadas na inicial. 8. Não conhecimento da ADI na forma do artigo 3º da Lei no 9.868/1999. 9. Ação Direta de Inconstitucionalidade não-conhecida.

Diante de tais considerações, não restam dúvidas quanto à flagrante inobservância, por parte do autor, de aspectos processuais relevantes para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei municipal nº 8.915/2004.

2 ANÁLISE DAS QUESTÕES DE MÉRITO As razões de mérito expostas na ADI e apresentadas neste trabalho, permitem concluir que o pedido não merece amparo do judiciário, devendo o mesmo decidir pela improcedência e impertinência da Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo MP Estadual. O advento da Lei Municipal n. 8.915, de 23 de dezembro de 2004, que estabelece diretrizes para a realização da Operação Urbana Consorciada na área que indica trouxe várias inovações em termos de planejamento urbano municipal: Uma intervenção na Área de Interesse Ambiental Dunas Praia do Futuro e na Área de Preservação do Rio Cocó, cortadas por uma via coletora, prolongamento da Avenida Antônio Sales, por uma via paisagística (que delimita a Área de Preservação do Rio Cocó) e diversas vias locais. Nos termos dos artigos. 4º, 5º e 6º, todos da Lei Municipal nº. 8.915/2004, as intervenções serão realizadas mediante a implantação de um condomínio residencial de casas térreas ou assobradadas, autônomas entre si, e do Parque Linear do Rio Cocó, em função da modificação do zoneamento da área integrante da Operação Urbana Consorciada Dunas de Fortaleza. Em primeiro lugar, ressalta-se que a legislação urbanística nacional e municipal reconhecem a operação urbana consorciada como valioso instrumento de planejamento 9

municipal, previsto nos artigos 32 e 33, da Lei nº. 10.257, de 10 de julho de 2001, Estatuto da Cidade, que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal brasileira, que estabelecem as diretrizes gerais da política urbana. A realização da operação urbana consorciada Dunas de Fortaleza, fundamenta-se nas disposições constantes dos artigos 10 e 11, V, da Lei municipal nº. 7.061, de 16 de janeiro de 1992, Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Fortaleza (PDDUFOR), combinado com o art. 11 da Lei municipal nº. 7.987, de 20 de dezembro de 1996, Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), Lei municipal nº. 8.915, de 23 de dezembro de 2004, além dos mencionados artigos 32 e 33, da Lei Federal nº. 10.257, de 10 de julho de 2001, Estatuto da Cidade. Em princípio, a Lei que estabelece as diretrizes para a implantação da Operação Urbana Consorciada Dunas de Fortaleza não viola as normas do ordenamento nacional, vez que o aludido instrumento encontra-se previsto na legislação federal e municipal, prevendo um ajuste celebrado entre o poder público municipal e o empreendedor, em conformidade com as regras estabelecidas na Lei municipal nº. 8.915, de 23 de dezembro de 2004 e com base na norma evidenciada no art. 182, caput, da Constituição de 1988: Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes.

Oportuno lembrar que o Estado brasileiro é signatário de várias convenções e declarações internacionais que tratam sobre a sadia qualidade do meio ambiente e de novas bases para o desenvolvimento sustentável, destacando-se, por exemplo, a Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano (1972), a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986), a Convenção sobre a Biodiversidade e da Declaração sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992), além da Agenda 21 e do Programa Habitat II, os quais recomendam que seja observado o paradigma internacional relacionado ao desenvolvimento sustentável para a criação de diretrizes e a realização de políticas públicas de desenvolvimento urbano. 6 A norma constitucional citada acima possui forte densidade principiológica, indicando claramente os vetores elegidos para a realização das políticas públicas municipais referenciadas ao desenvolvimento urbano: i) o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade; ii) o bem estar dos habitantes da cidade. Segundo o relatório Nosso Futuro para Todos, também conhecido como relatório Brundtland, a necessidade de uma política de desenvolvimento que respeitasse os limites ecológicos do planeta, utilizando adequadamente os recursos ambientais, deu origem a expressão desenvolvimento sustentável, cunhada em 1987, contemplando a necessidade de satisfação das necessidades da geração presente sem sacrificar as futuras gerações, deixando antever também o sentimento de solidariedade.7 Constata-se, portanto, a inevitável influência da matéria ambiental na questão do planejamento urbano, tendo em vista que o equilíbrio ambiental constitui modernamente um dos fatores condicionantes do uso da propriedade urbana.8 Não há como dissociar a questão urbana da questão ambiental, resultando daí que a implantação de uma política urbana na atualidade não pode desconsiderar fatores ambientais, valendo lembrar que o Estatuto da 6

DIAS, Daniela S. Desenvolvimento Urbano: Princípios Constitucionais. Curitiba: Editora Juruá, 2002, p. 47. FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Curso de Direito Ambiental: Interesses Difusos, Natureza e Propriedade. Rio de Janeiro: Gazeta Júris, 2006, p. 206. 8 MEDAUAR, Odete. Estatuto da Cidade: Lei 10.257, de 10.07.2001, Comentários. (Org.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.16. 7

10

Cidade introduziu o conceito de cidades sustentáveis em nosso ordenamento jurídico, conforme se verifica no art. 2º, I daquela Lei. Tal a relevância do conceito de desenvolvimento sustentável que este adquiriu status de princípio do direito internacional contemporâneo, enfatizando que o meio ambiente e o desenvolvimento hão de ser considerados conjuntamente, tanto em regiões desenvolvidas como naquelas em desenvolvimento, criando obrigações para todos, ou seja, para a comunidade internacional como um todo.9 Por outro lado, para que se possa assegurar a realização do desenvolvimento urbano e o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade, se afigura indispensável compreender em toda sua extensão a expressão utilizada pelo legislador constituinte: ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade. Os princípios das cidades abertas, democráticas, surgiram em Esparta, na Grécia. Desde então as cidades vêm passando por transformações – a polis não designava um lugar geográfico, mas uma prática política exercida pela comunidade de seus cidadãos. Para os romanos a civitas representava a forma de participação dos cidadãos na vida pública. A instituição cidade consolida-se como construção física somente na era do renascimento, acompanhada de todos os agregados sociais, políticos, jurídicos e religiosos. No século XX surgiu a idéia de planejamento urbano, que traduzia inicialmente a forma de o Estado manter o controle sobre a cidade. A expressão urbanismo, por sua vez, nasce em 1910, cunhada pelos franceses. Por essa época somente 10% (dez por cento) da população mundial vivia em cidades, todavia, a expansão das estradas de ferro, o aparecimento do automóvel, o desenvolvimento do transporte urbano e as novas redes de serviços urbanos impulsionaram seu crescimento. O modelo universal de cidade funcional foi proposto no IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna, através da Carta de Atenas. Tratava-se de se definir as quatro funções básicas das cidades: habitar, trabalhar, lazer e circulação, constituindo estas, atualmente, as funções sociais da cidade a que se refere a norma constitucional. Tais funções decorrem do efetivo resultado da prestação dos serviços públicos necessários para que os cidadãos possam trabalhar, habitar, circular e desfrutar de atividades recreativas e de lazer nos espaços urbanos.10 O Estatuto da Cidade preceitua em seu art. 2º que: Art. 2º. A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais: I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.

Primeiramente, deve-se ressaltar que a parceria que se firma entre o Poder Público municipal e a iniciativa privada para a realização de operação urbana consorciada, por óbvio não tem por finalidade alcançar uma única e isolada ação. A lei é clara a esse respeito, estatuindo expressamente que a operação urbana é constituída por um conjunto de intervenções e medidas, pressupondo uma multiplicidade de ações a serem desenvolvidas pelos parceiros, sob a coordenação do Município. Curial dizer-se também que a Lei Municipal n. 8.915/2004, com supedâneo no art. 32 da Lei n. 10.257/2001, possibilitou estabelecer-se regras diversas para o “parcelamento, uso e ocupação do solo” na área integrante da Operação Urbana Consorciada Dunas de Fortaleza, 9

TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direitos Humanos e Meio Ambiente: Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1993, p. 166. 10 DIAS, Daniela S. Ob. cit., p. 150/151.

11

implicando, em síntese, na exigência de contrapartidas ao proprietário dos imóveis/investidores, inseridos na referida área. Transcrevo, em seguida, o disposto no art. 33, inc. VI e seu 1º, do Estatuto da Cidade, com vistas a estabelecer a distinção entre as expressões recursos e contrapartida mencionados pelo legislador ordinário nos citados dispositivos: Art. 33. Da lei específica que aprovar a operação urbana consorciada constará o plano de operação urbana consorciada, contendo, no mínimo: VI – contrapartida a ser exigida dos proprietários, usuários permanentes e investidores privados em função da utilização dos benefícios previstos nos incisos I e II do § 2 o do art. 32 desta Lei; § 1o Os recursos obtidos pelo Poder Público municipal na forma do inciso VI deste artigo serão aplicados exclusivamente na própria operação urbana consorciada.

Usualmente associa-se a expressão recursos ao fator financeiro, concluindo-se, de regra, que tal expressão refere-se com exclusividade a recursos financeiros. Todavia, é sabido que a palavra recursos poderá relacionar-se também a recursos humanos ou a recursos patrimoniais, por exemplo. Portanto, equivocada e precipitada a conclusão de que a expressão recursos remete sempre ao termo finanças. Igualmente equivocada é a conclusão no sentido de compreender que a expressão contrapartida inserida no inciso VI do art. 33 transcrito acima se restringe a compensação pecuniária. Diferentemente do que se pensa, a contrapartida é uma espécie de recurso pago pelos proprietários, usuários permanentes e investidores privados ao governo municipal, em decorrência da implantação da operação urbana consorciada. A expressão, entretanto, comporta outras formas de entendimento e modalidades de cumprimento, não se traduzindo apenas em pecúnia, merecendo ser destacada a tese sustentada por Carvalho Filho: Dispõe o art. 33, § 1º, do Estatuto, que os recursos obtidos pelo Poder Público municipal devem ser aplicados exclusivamente na própria operação urbana consorciada. Recursos, no dispositivo, são os valores pagos por proprietários, usuários permanentes e investidores privados à título de contrapartida pela operação. Ora, se a participação de tais setores é voltada para fins a que se destina a ação urbanística, nada mais razoável que o produto da arrecadação dos recursos seja mesmo alocado em prol da operação. Vimos, todavia, que pode ser admitida outra espécie de contrapartida. Assim dependendo da hipótese, não poderia ser exigida a aplicação dessa contrapartida somente na respectiva operação urbana. Por exemplo, se for admitida a doação de imóveis para o governo municipal, nada impedirá que uma área, situada fora da circunscrição onde se realiza a operação urbana, seja doada ao Município. É claro que o imóvel não será usado para a operação urbana, mas poderá representar uma contrapartida a ser oferecida por algum participante, isso, é óbvio, quando o Poder Público municipal também tiver interesse em dar ao imóvel doado determinado fim de interesse público.11

Sopesadas tais circunstâncias, parece incontroversa a distinção entre recursos e contrapartida, assim como a obrigatoriedade da aplicação dos recursos financeiros na área da operação urbana consorciada, nos moldes estabelecidos no inciso IX do art. 7°, da Lei Municipal nº. 8.915/2004. A alcunha de privatização em torno da execução dos termos da lei municipal questionada parece tingir-se das cores do absurdo. Com efeito, em muitos pontos onde se concretizam empreendimentos, mais correto, na verdade, seria falar não em privatização, mas 11

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Comentários ao Estatuto da Cidade: Lei nº 10.257, de 10.07.2001 e Medida Provisória nº 2.220, de 04.09.2001. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005, p. 222.

12

em outorga a particular, de uso privativo ou uso especial de bem público constituído pelo sistema viário. Consoante Di Pietro, os bens públicos obtiveram a primeira classificação metódica através do Código Civil de 1916, a qual foi mantida pelo estatuto atual. O art. 99 do vigente Código Civil classifica os bens públicos em três categorias distintas: I – os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas, ruas e praças; II – os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias; III – os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal, ou real, de cada uma dessas entidades. 12

O critério utilizado para a classificação dos bens, entretanto, é o da destinação ou afetação, como salienta Di Pietro: Os da primeira categoria são destinados, por natureza ou por lei, ao uso coletivo; os da segunda ao uso da Administração, para consecução de seus objetivos, como os imóveis onde estão instaladas as repartições públicas, os bens móveis utilizados na realização dos serviços públicos, os mercados públicos, os cemitérios públicos etc.; existindo uma terceira, os quais não têm destinação pública definida, razão pela qual podem ser aplicados pelo Poder Público, para obtenção de renda; é o caso das terras devolutas, dos terrenos de marinha, dos imóveis não utilizados pela Administração, dos bens móveis que se tornem inservíveis. 13

Acresce a autora que o bem público poderá ainda ter destinação de uso privativo, ou de uso especial, “[...] quando a Administração Pública confere, mediante título jurídico individual, a pessoa ou grupo de pessoas determinadas, para que o exerçam, com exclusividade, sobre parcela de bem público”. Nesta hipótese, guardará as seguintes características: a) a exclusividade na utilização da parcela dominial, para a finalidade consentida; b) a exigência de título jurídico individual, pelo qual a Administração outorga o uso e estabelece as condições em que será exercido.14 Esclarece ainda a citada autora que o título jurídico individual poderá ser público ou privado, sendo o primeiro inerente e obrigatório para o uso privativo de bens de uso comum e de uso especial. Os bens de uso comum do povo e uso especial constituem bens fora do comércio jurídico de direito privado, portanto, as relações jurídicas deles decorrentes sujeitam-se as regras de direito público, resultando daí que, para fins de uso privativo são possíveis apenas três instrumentos: a) a autorização; b) a permissão; c) a concessão de uso. O título jurídico privado, por outro lado, é passível de utilização somente sob expressa previsão legal e abrange: a locação, o arrendamento, a enfiteuse, o comodato e a concessão de direito real de uso. Feitas estas considerações, pode-se concluir com facilidade que a outorga do direito de uso privativo ou especial do sistema viário, portanto, poderá ser efetuada por meio de concessão de uso.

12

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 15ª edição, 2003, p. 541. 13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Ob. cit., p. 541. 14 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Ob. cit., p. 562.

13

É que, em princípio, todos os bens públicos são passíveis de uso especial por particulares, independentemente de sua natureza, desde que a utilização consentida pelo poder público não acarrete sua inutilização ou destruição, ensejando sua conversão em alienação. Esclarece Hely Lopes Meirelles que: Ninguém tem direito natural a uso especial de bem público, mas qualquer indivíduo ou empresa pode obtê-lo mediante contrato ou ato unilateral da Administração, na forma autorizada por lei ou regulamento ou simplesmente consentida pela autoridade competente. Assim sendo, o uso especial do bem público será sempre uma utilização individual – uti singulli – a ser exercida privativamente pelo adquirente desse direito. O que tipifica o uso especial é a privatividade da utilização de um bem público, ou de parcela desse bem, pelo beneficiário do ato ou do contrato, afastando a fruição geral e indiscriminada da coletividade ou do próprio Poder Público. Esse uso poderá ser consentido gratuita ou remuneradamente, por tempo certo ou indeterminado, consoante o ato ou contrato administrativo que o autorizar, permitir ou conceder.15

No mesmo sentido se manifesta Floriano de Azevedo Marques Neto em seu parecer, conforme se pode observar em seguida: 5. A hipótese de cessão de uso privativo e condicionado de bem público. A segunda hipótese de que cogitamos é mais simples, mas nem por isto menos polêmica. Em gênero, ela se revelaria na outorga aos particulares proprietários de imóveis do direito de uso privativo dos bens públicos integrantes do loteamento, incluindo o viário. Tal outorga seria condicionada ao atendimento de uma série de cláusulas-obrigação que iriam desde a conservação dos bens e preservação do meio ambiente nativo até o impedimento de restrição de acesso de turistas desde que não motorizados e respeitantes das normas de utilização da área ambiental. Essa atribuição genérica de uso privativo desdobrar-se-ia em duas alternativas de instrumento jurídico, a saber: a) a concessão administrativa dos bens; b) a permissão de uso dos mesmos. Dado o enquadramento da hipótese cogitada, parece-nos totalmente recomendável no caso a adoção da hipótese de concessão. E por admitir a LOM a hipótese de concessão de bem público de uso comum para a finalidade aqui premente, afasta-se o problema da desafetação prévia do bem, pois que não será a mesma necessária. Como é sabido, a desafetação é a mudança da destinação do bem. De regra, a desafetação visa a incluir bens de uso comum do povo ou bens de uso especial na categoria de bens dominicais para possibilitar a alienação. Como na hipótese cogitada estar-se-ia concedendo o bem de uso comum – afetado portanto – e como não se trata de alienação, mas apenas de outorga de uso privativo, não há porque se falar em desafetação. Apenas deve ser ressalvado que o particular concessionário estaria obrigado, entre outras coisas, a não alterar, jamais, a destinação do bem, sob pena de caducidade da concessão e consequente retomada imediata do bem pelo Poder Concedente. 16

Além disso, decorrem da própria lei municipal as seguintes obrigações: i) garantir o acesso, ainda que restrito, ao recurso hídrico inserido no âmbito na operação urbana; ii) preservação do ambiente natural; iii) incumbências, atividades e melhorias que deverão ser mantidas ou implementadas pelo concessionário; iv) não alterar a destinação e a condição do bem concedido, além do dever de preservá-lo; v) forma da outorga, ou seja, gratuita ou remunerada.

15

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 13ª edição, 2003, p. 293. 16 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. A Possibilidade de Restrição de Acesso a Bens Públicos de Uso Comum por Questões Ambientais e Urbanísticas. Parecer. Forum de direito Urbano e Ambiental – FDUA, Belo Horizonte, ano 3, jan./fev.2004, p. 1388/1389.

14

3 IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR Não obstante o autor não tenha demonstrado o atendimento aos requisitos da Lei federal nº 9.868/1999 e o ajuizamento da ADI tenha ocorrido há quase 10 (dez) anos depois da publicação da Lei municipal nº 8.915/2004, necessário tecer alguns comentários sobre o pedido de liminar. No que concerne ao pedido de concessão de liminar formulado pelo autor, cabe destacar que a matéria passa antes pelo teste da verificação do fumus boni iuris e do periculum in mora; devendo o autor demonstrar, de forma extreme de dúvidas, que a vigência e a eficácia da lei hostilizada ou dos dispositivos atacados acarreta graves transtornos, com lesão de difícil reparação, verbis: Para a concessão de liminar não é bastante a evidência do fumus boni juris, sendo indispensável a demonstração do periculum in mora (RT 125-56). Ação Direta de Inconstitucionalidade, pedido de suspensão liminar da eficácia do parágrafo único do artigo 6°, bem como do artigo 53, ambos do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado da Paraíba, promulgada em 05.10.89. Ausência, na inicial, de qualquer justificativa que permita avaliar, no caso, a necessidade da suspensão liminar, pela ocorrência de “periculum in mora” ou de manifesta conveniência administrativa. Pedido de liminar indeferido.. (ADIMC – 345/PB, STF, Pleno, Min. Relator Moreira Alves, acórdão publicado no DJ, edição de 05.10.90, pág. 10714).

A jurisprudência do STF no que tange à concessão de liminar em ações diretas de inconstitucionalidade é bem analisada por Ronaldo Poletti: Na verdade, a concessão de liminar é condicionada a requisitos muitos rígidos. A Constituição inseriu na competência do Supremo o processo de julgamento de pedido de medida cautelar das ações diretas de inconstitucionalidade (art. 102, I, p), mas ela somente é cabível quando a vigência imediata do texto contra o qual se representou poderá ocasionar dano irreparável ao Erário ou criar situação de difícil desfazimento. A suspensão liminar é medida de caráter excepcional que pressupõe seja demonstrada, além da relevância jurídica do fundamento da argüição, a ocorrência de interesse público prevalente, aferível pela iminência de dano irreparável ou de difícil reparação, que recomende o imediato retorno à situação anterior.17

Em que pesem os argumentos colacionados pelo Ministério Público Estadual em sua peça vestibular, é notório que o perigo da demora não foi demonstrado com clareza, até mesmo porque esbarra no óbice do tempo de vigência da norma questionada, vem a ser, a Lei municipal 8.915/2004 é de 23.12.2004 (DOM 04.01.2005). Na realidade, há verdadeiro periculum in mora inverso: a liminar, se concedida, acarretaria mais prejuízos à coletividade, e aos sub-sistemas ordem social, ordem jurídica e ordem pública municipal do que benefícios à integridade da ordem jurídica. No caso de que se cuida, se deferida a medida liminar o Município de Fortaleza, enquanto Pessoa Jurídica de Direito Público sofrerá abusiva e ilegal violação de sua esfera 17

POLETTI, Ronaldo. Ob. cit., p. 130-131.

15

jurídica e de sua autonomia constitucional, uma vez que não poderá exercer, em sua plenitude, as suas prerrogativas constitucionais e legais, máxime sua função executiva. Não se configuram, desse modo, nenhum dos requisitos autorizadores da concessão da medida cautelar, a teor da jurisprudência do STF, especialmente quando uma das normas impugnadas está em vigor há quase dez anos:

ADI-MC 534 / DF - DISTRITO FEDERAL Relator: Min. CELSO DE MELLO Julgamento: 27/06/1991 Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO Publicação DJ 08-04-1994 PP-07239 EMENTA: ADIN - LEI N. 8.024/90 - PLANO COLLOR - BLOQUEIO DOS CRUZADOS AUSÊNCIA DO PERICULUM IN MORA - LIMINAR INDEFERIDA. - O tardio ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade, quando ja decorrido lapso temporal considerável desde a edição do ato normativo impugnado, desautoriza - não obstante o relevo jurídico da tese deduzida - o reconhecimento da situação configuradora do periculum in mora, o que inviabiliza a concessão da medida cautelar postulada." (Ministro CELSO DE MELLO, Relator). Ação direta de inconstitucionalidade. Liminar. Pressupostos da concessão da liminar são a relevância jurídica da matéria e o risco de manter-se com plena eficácia o preceito atacado. (ADI 1.175-MC, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 19-12-94, DJ de 26-4-02) A suspensão liminar da eficácia e execução de leis e atos normativos, inclusive de preceitos consubstanciados em textos constitucionais estaduais, traduz medida cautelar cuja concretização deriva do grave exercício de um poder jurídico que a Constituição da República deferiu ao Supremo Tribunal Federal. A excepcionalidade dessa providência cautelar impõe, por isso mesmo, a constatação, hic et nunc, da cumulativa satisfação de determinados requisitos: a plausibilidade jurídica da tese exposta e a situação configuradora do periculum in mora. Precedente: ADIN 96 (Medida Liminar, DJ de 10-11-89). (ADI 127-MC-QO, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 20-11-89, DJ de 4-12-92)

CONCLUSÃO A ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Ministério Público Estadual em face da Lei municipal nº 8.915/2004 é de 23.12.2004 (DOM 04.01.2005), além de inepta e despropositada, já que ajuizada depois de quase 10 (dez) anos de vigência da citada lei municipal, não atende aos requisitos processuais estabelecidos pela legislação processual vigente, ademais de não se enquadrar nas hipóteses previstas pelo texto constitucional. Não existem elementos aptos a sustentar a tese argüida pelo autor, especialmente se considerados os seguintes fatos: i) a Lei municipal nº 8.915 foi publicada no Diário Oficial do Municipal em 04 de janeiro de 2005, não tendo sofrido, até o momento, qualquer questionamento; ii) em sua petição inicial o autor deixou de indicar, com precisão, os dispositivos que, supostamente, estariam maculados com vício de inconstitucionalidade, não tendo especificado também os fundamentos de sua tese; iii) a Constituição Federal de 1988 prevê o controle concentrado da constitucionalidade das leis in abstracto, ou seja, por via de ADI, somente em duas hipóteses: a) ADI contra lei ou ato normativo federal ou estadual por ofensa à Constituição Federal de competência do STF, conforme art. 102, I, “a”; b) ADI contra lei ou ato normativo estadual ou municipal por ofensa à Constituição do EstadoMembro, conforme art. 125, § 2º; iv) a peça vestibular, além de tratar de forma genérica e subjetiva dos supostos vícios de inconstitucionalidade da Lei municipal nº 8.915/2004, refere16

se objetivamente a um caso concreto, cuja discussão acerca da inconstitucionalidade da aludida norma municipal estaria sujeita ao controle difuso, incidenter tantum. Tardio e desarrazoado, portanto, o ajuizamento da ADI em comento, notadamente porque a lei municipal relacionada a operação urbana consorciada “Dunas do Cocó”, além de não violar as normas do ordenamento jurídico, possibilitará a criação de um parque linear urbano, de inegável importância para a preservação dos recursos naturais encontrados naquela área, sem, no entanto, ocasionar um crescimento desequilibrado. O que há de se proteger, acima de tudo, é o interesse público subjacente na atividade administrativa e no planejamento municipal, com o fim de propiciar um crescimento equilibrado e sustentável, com especial destaque ao equilíbrio ambiental, abordado de forma ampla, onde o meio ambiente deve ser entendido no seu aspecto natural e artificial, dando lugar a uma cidade em que se ofereça as condições mínimas de vida saudável e bem estar dos seus habitantes. Entendemos, portanto, que os vícios relatados neste estudo justificam o pedido de indeferimento da inicial e conseqüente arquivamento dos autos, bem como, se apreciado o mérito, a improcedência da ação em todos os seus termos, mantendo-se válida e incólume a legislação municipal indevidamente questionada.

17

REFERÂNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Comentários ao Estatuto da Cidade: Lei nº 10.257, de 10.07.2001 e Medida Provisória nº 2.220, de 04.09.2001. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2005. DIAS, Daniela S. Desenvolvimento Urbano: Princípios Constitucionais. Curitiba: Editora Juruá, 2002.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Editora Atlas, 15ª edição, 2003. FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de. Curso de Direito Ambiental: Interesses Difusos, Natureza e Propriedade. Rio de Janeiro: Gazeta Júris, 2006. MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. A Possibilidade de Restrição de Acesso a Bens Públicos de Uso Comum por Questões Ambientais e Urbanísticas. Parecer. Forum de direito Urbano e Ambiental – FDUA, Belo Horizonte, ano 3, jan./fev.2004. MEDAUAR, Odete. Estatuto da Cidade: Lei 10.257, de 10.07.2001, Comentários. (Org.). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 13ª edição, 2003. MENDES, Gilmar Ferreira. O controle de constitucionalidade do direito estadual e municipal na Constituição Federal. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=122>. Acesso em: 22 jun. 2007. POLETTI, Ronaldo. Controle da Constitucionalidade das Leis. 2a. Ed., RJ: Forense, 2001. TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direitos Humanos e Meio Ambiente: Paralelo dos Sistemas de Proteção Internacional. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1993.

18

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.