ABUSOS E VIOLAÇÕES DE DIREITOS EM COMUNIDADES TERAPÊUTICAS: RELATOS DE UMA REALIDADE ANUNCIADA

June 23, 2017 | Autor: G. Fernandes de Melo | Categoria: Drugs And Addiction, Mental Health
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FÓRUM MINEIRO DE SAÚDE MENTAL Rua Nicarágua, 410, apto. 701 – Sion – CEP 30.120-050 Belo Horizonte – MG CNPJ: 00.077.375/0001-50.

ABUSOS E VIOLAÇÕES DE DIREITOS EM COMUNIDADES TERAPÊUTICAS: RELATOS DE UMA REALIDADE ANUNCIADA

Belo Horizonte 2014 1- Introdução

Alguns estudiosos do tema sugerem que as comunidades terapêuticas surgiram na 2ª metade do século XIX, através de grupos religiosos, ao agregarem usuários abusivos de álcool em espaços comuns. Em 1921, na Inglaterra, Frank Buckman, ministro luterano funda a Missão Oxford, organizada em instituições que tinham por objetivo o renascimento espiritual dos cristãos, cuja lógica e projeto de tratamento incluía a ética do trabalho, o cuidado mútuo, orientação partilhada, o reconhecimento dos defeitos, a reparação de danos e o trabalho conjunto, além dos valores evangélicos da honestidade, altruísmo e amor. Esta experiência inspirou o surgimento, em 1935, dos Alcoólicos Anônimos (AA) e o modelo dos “12 passos para a abstinência”, utilizado também para usuários abusivos de outras drogas. Na década de 50 do século passado, a primeira comunidade terapêutica propriamente dita, chamada Synanon, é fundada nos Estados Unidos. Aproximadamente no mesmo período, o psiquiatra Maxwell Jones propôs um novo modelo de comunidade terapêutica para portadores de transtornos mentais. Tal proposta objetivava estimular a comunicação entre todos os membros da comunidade, considerando inclusive o ambiente no processo terapêutico, a democratização das relações entre pacientes e profissionais, através da realização de assembléias com a participação dos internos. A comunidade terapêutica é uma abordagem de autoajuda, inscrita em um modelo de reforma da instituição manicomial, que buscou humanizar as relações com o doente sem questionar seu lugar na sociedade, nem tampouco propor a superação do hospital psiquiátrico como local de tratamento e exclusão social (AMARANTE, 1995a. 136 p). No Brasil, as comunidades terapêuticas se constituíram como iniciativas da sociedade civil, marcadamente por ação de grupos religiosos, tanto espíritas, evangélicos quanto católicos e funcionam, via de regra, em sítios ou fazendas, nos quais são internadas pessoas com problemas decorrentes do uso de álcool e outras drogas. Quanto à metodologia adotada prevalece, em grande parte deste conjunto de lugares e práticas, o modelo religioso-espiritual, associado a atividades laborais. Em algumas, menor número neste universo, associa-se a este binômio o modelo médico e psicológico (DIP, 2014). O público atendido nas comunidades terapêuticas varia bastante. Algumas são especializadas em determinado tipo de dependência, outras focam em grupos etários, como adolescentes ou de gênero, atendendo apenas mulheres ou apenas homens. Mas, encontra-se em várias destas instituições, especialmente em relação à faixa etária, uma composição mista

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do público atendido, ou seja, crianças e adolescentes são internados junto com adultos, sem qualquer distinção nas estratégias de cuidado (DIP, 2014). Apesar de não haver consenso de qual seria o público para internação em comunidade terapêutica no Brasil, na prática, os que mais procuram ou são encaminhados pela família, Justiça, Ministério Público, serviços de saúde, polícia, são aqueles que apresentam um padrão de dependência, na maioria das vezes associada a problemas de ordem social como pobreza, baixa escolaridade, subemprego, desemprego ou baixa qualificação profissional, problemas em suas comunidades e familiares, envolvimento com tráfico, entre outros. Embora o número de comunidades terapêuticas tenha crescido, ainda não há evidência científica suficiente que sustente uma superioridade do método desses espaços em relação a outras formas de tratamento, exceto se comparado a modelos carcerários (FIESTA, PONCE 2012 p. 12-20). Diante de um crescente número de denúncias de maus tratos e violações de direitos ocorridas nas comunidades terapêuticas de várias localidades brasileiras, divulgadas através da imprensa, e recebidas pelo Observatório de Saúde Mental e Direitos Humanos da Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial – RENILA e do Conselho Federal de Psicologia - CFP e pela Coordenação de Saúde Mental e Combate à Tortura da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, foi organizado, em 2011, um dossiê (CFP, RENILA, 2011) elencando essas situações e encaminhadas ao Governo Federal, com ampla divulgação. No mesmo ano, os Conselhos de Psicologia (Federal e Regionais), em parceria com as entidades antimanicomiais, realizaram uma inspeção em 68 comunidades terapêuticas em todo o país. É importante destacar, conforme consta no Relatório da IV Inspeção Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP, 2011) que, em todas as instituições inspecionadas, verificou-se a ocorrência de violação de direitos humanos, variando de violência, agressão física à violação de privacidade, correspondência, maus tratos, castigos físicos e humilhações. A despeito de tais evidências, neste mesmo ano, foi lançado no Brasil o Programa “Crack, é possível vencer”, propondo ações conjuntas entre os Ministérios da Justiça, Saúde e do Desenvolvimento Social e Combate à fome para “enfrentamento ao crack e outras drogas” com investimentos no valor de R$ 4 bilhões até 2014. Entre as inúmeras medidas polêmicas contidas neste plano, destaca-se o financiamento público das comunidades terapêuticas, proposta rejeitada pela IV Conferência Nacional de Saúde Mental Intersetorial/2010 3 | 37

IVCNSMI - (SUS, CNS, 2010) e XIV Conferência Nacional de Saúde/2011 - XIV CNS (BRASIL, MINISTÉRIO DA SAÚDE, CNS, 2012), e considerada um retrocesso no processo da Reforma Psiquiátrica por retomarem a lógica da internação – inclusive a compulsória e involuntária, como estratégia primeira e exclusiva de cuidado, conduzindo, portanto, à segregação e estigmatização dos usuários. Vale dizer que a política antimanicomial vem lutando para superar a exclusão como resposta ao sofrimento, dada a inegável história de produção de mortes, violências e tortura que caracterizaram o tratamento dos portadores de sofrimento mental nos hospitais psiquiátricos brasileiros. A Reforma Psiquiátrica, com a criação dos serviços substitutivos, é reconhecida internacionalmente por respeitar a autonomia e os direitos dos indivíduos, considerando que os modelos fundados na privação de liberdade respondem à demanda imediatista da sociedade e se apresentam ineficazes à proposta de produção de vida e reinserção social.

2- Leis e Regulamentações

No Brasil, assim como muitos países, infelizmente, as políticas sobre drogas têm sido marcadas pelo preconceito, moralismos e tabus. A ausência de cuidados que atinge, de forma histórica e contínua, aqueles que sofrem de exclusão e desigualdade pelos serviços de saúde, aponta para a necessidade da revisão de modelos assistenciais que contemplem as reais necessidades de uma população, o que implica em disposição para atender, pensando na singularidade de cada sujeito. Hoje, no Brasil, temos uma legislação que assegura o tratamento em liberdade. Segundo a Lei Federal nº 10216, de 6 de abril de 2001, no Art. 2, parágrafo único (BRASIL, 2004, p.17-19) :

São direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas;

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V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.

Em 23 de dezembro de 2011, foi instituída, através da Portaria ministerial nº 3088, a RAPS – Rede de Atenção Psicossocial. Dentre outros pontos relevantes esta portaria define as diretrizes para o funcionamento da Rede de Atenção Psicossocial (BRASIL, 2011a):

I - respeito aos direitos humanos, garantindo a autonomia e a liberdade das pessoas; II – promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde; III – combate a estigmas e preconceitos; VII - desenvolvimento de atividades no território, que favoreça a inclusão social com vistas à promoção de autonomia e ao exercício da cidadania; VIII - desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos; IX - ênfase em serviços de base territorial e comunitária, com participação e controle social dos usuários e de seus familiares; XII – desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com transtornos mentais e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas, tendo como eixo central a construção do projeto terapêutico singular.

A IV Conferencia Nacional de Saúde Mental Intersetorial - IV CNSMI - realizada em 2010, reafirma o caráter efetivamente público da Política de Saúde Mental e recusa todas as formas de terceirização da gestão da rede de serviços assistenciais (SUS, CNS, 2010). Nesse sentido, responsabiliza os gestores, nos três níveis de governo, nacional, estadual e municipal pelo desenvolvimento e sustentabilidade da Política de Saúde Mental, com garantia de dotação específica, espaços físicos próprios, condições materiais e técnicas adequadas, para a viabilização

do

novo

modelo

assistencial.

(Eixo

1:

Políticas Sociais e Políticas de Estado: pactuar caminhos intersetoriais/ 1.1 Organização e Consolidação da Rede – Princípios e diretrizes gerais): 5 | 37

Além disso, determina a proibição do credenciamento pelo SUS de serviços especializados em alcoolismo e drogadição que preconizem internação de longa permanência ou que não submetam seu projeto terapêutico a assessoria de saúde mental do estado, ouvindo os Conselhos Nacional, Estadual e Municipal de Saúde. ( Eixo 1: Políticas Sociais e Políticas de Estado: pactuar caminhos intersetoriais/ 1.1: Organização e Consolidação da Rede – Álcool e Outras Drogas).

2.1- Quanto ao financiamento de comunidades terapêuticas Apesar da IV CNSMI proibir o financiamento público das comunidades terapêuticas (Eixo 1: Políticas Sociais e Políticas de Estado: pactuar caminhos intersetoriais/ 1.9. Reforma Psiquiátrica, Reforma Sanitária e o SUS – Garantia dos Avanços das Reformas Sanitária e Psiquiátricas) o Ministério da Saúde publicou a Portaria nº 131, de 26 de Janeiro de 2012, que regulamenta o financiamento de comunidades terapêuticas (BRASIL, 2012). Tal portaria aponta nas disposições gerais que as comunidades terapêuticas são entendidas como espécie do gênero Serviços de Atenção em Regime Residencial e que o incentivo financeiro de custeio instituído será da ordem de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) mensais para cada módulo de 15 (quinze) vagas de atenção em regime de residência, até um limite de financiamento de 2 (dois) módulos por entidade beneficiária. Esta mesma portaria aponta que o número total de residentes na entidade beneficiária não pode ultrapassar 30 (trinta). É importante salientar que de acordo com o artigo 4º da referida portaria, os gestores públicos estaduais e municipais não poderão receber o incentivo federal instituído para financiamento de uma comunidade terapêutica sem uma rede com os seguintes serviços: (a) Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), preferencialmente tipo III (24 horas), (b) Unidade de Acolhimento Adulto, (c) Serviço Hospitalar de referência para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool, crack e outras drogas e (d) retaguarda de urgência (SAMU). Desta forma, sabe-se que a maioria das comunidades terapêuticas no Brasil não poderia receber o financiamento regulamentado. A portaria dispõe ainda sobre a proibição, em qualquer circunstância, do uso de contenção e espaços que impeçam a livre circulação do usuário residente pelos ambientes da entidade prestadora do serviço de atenção em regime residencial. Quanto ao ingresso de residentes no serviço de atenção em regime residencial, este será condicionado ao consentimento expresso do usuário e dependerá de avaliação prévia pelo 6 | 37

CAPS de referência. Estando ainda garantido o direito à interrupção, a qualquer momento, de sua permanência no serviço de atenção em regime domiciliar.

2.2- Resolução da Diretoria Colegiada – RDC/Agência Nacional de Vigilância Sanitária/ANVISA - RDC nº 29, de 30 de junho de 2011 A RDC nº 29 dispõe sobre os requisitos de segurança sanitária para o funcionamento de instituições que prestem serviços de atenção a pessoas com transtornos decorrentes do uso, abuso ou dependência de substâncias psicoativas (BRASIL, 2011b). Entre outras exigências, a resolução prevê a permanência voluntária e proíbe a admissão de pessoas cuja situação requeira a prestação de serviços de saúde não disponibilizados pela instituição e, assim como a Portaria nº 131/2012, garante ao usuário o direito de interromper o tratamento a qualquer momento, resguardadas as exceções de risco imediato de vida para si e/ou para terceiros ou de intoxicação por substâncias psicoativas, avaliadas e documentadas por profissional médico.

2.3- Os Projetos em tramitação que alteram a Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 Em maio de 2013, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 7663/2010 do deputado Osmar Terra (PMDB/RS), atualmente PLC 37/2013 (BRASIL, 2013b) em tramitação no Senado Federal, que acrescenta e altera dispositivos à Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006 (BRASIL, 2006). Segundo o parecer do Conselho Federal de Psicologia sobre o Projeto de Lei nº 7663/2010, datado de 12 de março de 2013: “A eventual aprovação desta proposição, por conseqüência, potencializará os efeitos perversos das abordagens tradicionais e conservadoras na área, aumentando o número de prisões e o tempo de privação da liberdade, aumentando as possibilidades de condenações de usuários como se traficantes fossem, degradando ainda mais as condições já inaceitáveis de execução penal no Brasil, criando uma indústria de internações compulsórias, regredindo nas iniciativas de redução de danos, aumentando de forma exponencial a despesa pública e violando os direitos elementares de pessoas em situação de fragilidade social”

(CFP, 2013).

3- Centros de Internação para usuários de álcool e outras drogas, em números

Existem atualmente 1.848 comunidades terapêuticas espalhadas pelo território brasileiro, presentes em todos os estados da Federação (BRASIL, 2013a) Estes números da 7 | 37

Secretaria Nacional de Políticas de drogas (SENAD), órgão do Ministério da Justiça responsável por “articular e coordenar as atividades de prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas” (BRASIL, 2007) fazem parte de um censo realizado em 2013 com o objetivo de catalogar as instituições que atuam no campo das políticas de drogas no país. A SENAD também financia as comunidades, tendo no momento 301 comunidades terapêuticas recebendo dinheiro público federal, totalizando 6.868 leitos, segundo os números da própria SENAD. Desse total, a maioria dos usuários é composta de adultos: 5.653 homens, 629 mulheres, além de 65 gestantes. Entre os adolescentes, existem 405 homens e 105 mulheres. Esses dados foram calculados pesquisando apenas as 301 comunidades financiadas pela SENAD. O número total de leitos em comunidades terapêuticas é de difícil mensuração, visto que inexistem estudos nacionais sobre o assunto, controle e fiscalização e muitas delas funcionam de maneira clandestina, fugindo a qualquer tipo de vistorias ou normatizações. Mas, por uma equiparação matemática simples, podemos supor que o número de leitos total, levando em consideração as 1.848 comunidades terapêuticas encontradas no censo, esteja próximo dos 40.000. No Estado de Minas Gerais, local onde realizamos o nosso Projeto, encontramos um dos números mais altos de comunidades terapêuticas em todo país, abrangendo cerca de 290, número estipulado a partir do censo da SENAD (BRASIL, 2013) e de nosso próprio levantamento. É também o Estado com o maior número de comunidades terapêuticas financiadas pela SENAD, totalizando 48 instituições.

3.1- Internações de usuários de álcool e outras drogas em hospitais psiquiátricos e nas chamadas “clínicas para dependentes químicos” Com a diminuição da demanda aos hospitais psiquiátricos de sua maior e principal clientela, os psicóticos e neuróticos graves, em decorrência da abertura dos serviços substitutivos, os leitos passaram a ser ocupados, em especial, pelos usuários de álcool e outras drogas.

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Além desses leitos, proliferaram também no atual cenário, as chamadas “clínicas para dependentes químicos”: um misto de hospital psiquiátrico e comunidade terapêutica, travestidas como serviços de saúde por possuírem alguns profissionais da área e equipamentos sanitários. É comum vermos panfletos/propagandas desses espaços garantindo a possibilidade de internações involuntárias e compulsórias. Ainda quase que desconhecidas pelo poder público, que finge ignorar esses “simulacros modernos de tratamento”, a sociedade é testemunha de mais uma perversão do modelo que vem privilegiando a violência, a pseudociência, o preconceito e a discriminação. Em levantamentos preliminares feitos em 3 hospitais psiquiátricos de Minas Gerais constatamos dados preocupantes e estarrecedores: 1- Hospital de Toxicômanos Padre Wilson Valle da Costa, localizado em Juiz de

Fora e ligado à Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais.Apesar de constar no Cadastro Nacional de Estabelecimento de Saúde (CNES – DATASUS) como Centro de Saúde/Unidade Básica é, na realidade, um hospital psiquiátrico, com 100 leitos para “exames de sanidade mental e dependência química, assim como para o “tratamento das pessoas em medida de segurança” seja portador de sofrimento mental ou usuários de drogas. 36% dos leitos do hospital, que atende a todo o Estado de Minas Gerais, estão ocupados por usuários de Juiz de Fora. O número chama a atenção pois o percentual é muito alto, tendo em vista que a população carcerária deste município corresponde a 3,5% do total do estado.

2- Hospitais Galba Veloso e Instituto Raul Soares, ambos localizados em Belo

Horizonte e ligados à Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG). Impressiona o grande número de solicitações de internações compulsórias, em especial de usuários de drogas, que vêm ocorrendo nestes hospitais, a pedido do Judiciário, Ministério Público e Defensoria. No Instituto Raul Soares, no período de 25/09/2012 a 12/08/2013 foram encaminhados compulsoriamente 170 pessoas e encontram-se em “lista de espera” outras 67.

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No Hospital Galba Veloso, no ano de 2012 foram feitos 31 pedidos de internação compulsória e em 2013, até o mês de agosto, foram feitos 183. Nos anos de 2013 e 2014, foram encaminhados a ambos hospitais, em torno de 1.100 solicitações de internações compulsórias, constatando-se, portanto, um vertiginoso e alarmante aumento de pedidos desse tipo de internações no Estado de Minas Gerais.

Tais internações compulsórias acontecem à revelia do que dispõe a Lei Federal nº 10.216/2001 e a Lei Estadual nº 11.802/1995 (MINAS GERAIS, 1995), que propõem que a internação psiquiátrica seja utilizada como último recurso terapêutico, esgotadas todas as outras formas e possibilidades terapêuticas prévias e só poderá acontecer com laudo de médico especializado. Além disso, percebemos uma banalização da internação de usuários de álcool e outras drogas em hospitais psiquiátricos que não apresentam estrutura e nem função para atender tal clientela, colocando-a em risco de morte. O parágrafo segundo, do artigo 9º, da Lei Estadual nº 11.802/1995 (MINAS GERAIS, 1995), deixa claro que “a internação de pessoas com diagnóstico principal de síndrome de dependência alcoólica dar-se-á em leito de clínica médica em hospitais e prontos-socorros gerais.”

4- Serviços Substitutivos para os usuários de álcool e outras drogas

A Portaria Ministerial nº 3088, de 23 de dezembro de 2011(BRASIL, 2011a), que institui a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) elenca os diversos serviços substitutivos direcionados à clientela descrita acima. Destes serviços, destacamos aqueles que são direcionados exclusivamente ou também atendem aos usuários de drogas, a saber: unidades básicas, consultórios de rua, centros de convivência, centros de atenção psicossocial (CAPS AD – álcool e outras drogas/CAPS III – 24 horas de funcionamento/CAPS i – infanto-juvenil), unidades de acolhimento (UA), leitos em hospital geral. Apesar de previstos em portaria, a rede e os recursos financeiros para o tratamento em liberdade dos usuários de drogas ainda são insuficientes. 10 | 37

Segundo dados do “Observatório Crack, é possível vencer” (BRASIL, 2015), existem no Brasil 308 CAPS AD, sendo apenas 59 com funcionamento 24 horas; 129 consultórios de rua; 34 unidades de acolhimento adulto; 26 unidades de acolhimento infanto-juvenil e 800 leitos em enfermarias especializadas. Comparada ao imenso número de comunidades terapêuticas existentes e ao discrepante e faraônico financiamento público que as três esferas de governo direcionam a estas instituições, a rede substitutiva pública, apesar de todo o esforço e combatividade de seus trabalhadores, permanece incompleta em sua implantação, sucateada e incapaz de garantir acesso e qualidade aos usuários de álcool e outras drogas.

5-

Drogas e Proibicionismo no Brasil A história da proibição das drogas no Brasil guarda estreita relação com o processo

internacional de proibição das mesmas no início do século XX. Uma série de conferências internacionais com o objetivo de interditar o comércio, a produção e o uso de diversas drogas aconteceu ao longo da primeira metade do século XX culminando com a Convenção Única sobre Narcóticos, de 1961, na qual a proibição das drogas é universalizada. O Brasil tem papel importante nessa conferência por levar a discussão da questão da maconha. Conforme comenta Elisaldo Carlini:

Foi também na década de 1930 que a repressão ao uso da maconha ganhou força no Brasil. Possivelmente essa intensificação das medidas policiais surgiu, pelo menos em parte, devido à postura do delegado brasileiro na II Conferência Internacional do Ópio, realizada em 1924, em Genebra, pela antiga Liga das Nações. Constava da agenda dessa conferência discussão apenas sobre o ópio e a coca. E, obviamente, os delegados dos mais de 40 países participantes não estavam preparados para discutir a maconha. No entanto o nosso representante esforçou-se, junto com o delegado egípcio, para incluí-la também (CARLINI, 2006)

A socióloga venezuelana Rosa del Olmo e o filósofo e historiador espanhol Antônio Escohotado em textos clássicos sobre a história da proibição das drogas nos alertam para um aspecto fundamental das políticas de proibição: a ideologia proibicionista tem um sentido 11 | 37

bastante claro de controle e repressão de grupos marginalizados nas sociedades do início do século XX. A associação entre as drogas e determinados grupos sociais, especialmente imigrantes no caso dos estadunidenses, é sempre destacada. O ópio tinha seu uso associado aos chineses, a maconha aos mexicanos e a cocaína aos negros. No caso do Brasil, o foco da proibição está na maconha que não por acaso era a droga mais consumida entre os escravos vindos da África para trabalhar na então colônia. No ano de 1830 já temos uma legislação, que na cidade do Rio de Janeiro, proíbe a venda e o consumo do pito do pango, nome pelo qual a maconha era conhecida entre os escravos. Essa proibição se revela um claro mecanismo de controle dessa população escrava na cidade, que era nesse momento a maior população escrava do mundo. Após a conferência de 1961, a repressão às drogas ganha novo impulso e se consolida e expande com a política de Guerra às Drogas implementada pelos EUA nos anos 1970, a partir da emblemática declaração de guerra às substâncias ilegais. No Brasil, o consumo cresce na segunda metade do século XX e se amplia de maneira substancial nos anos 1960 e 1970, aliás uma tendência mundial observada por Del Olmo. Nesse momento, em 1976, entrou em vigor a lei nº 6368 (BRASIL, 1976) que distinguia o consumidor do traficante, estabelecendo, para o primeiro, uma pena máxima de 2 anos de detenção, enquanto, para o segundo, de 15 anos de reclusão. Em 2006, temos uma nova mudança na legislação: a Lei nº 11.343 (BRASIL, 2006) despenaliza o porte para consumo pessoal e aumenta a pena mínima para o crime de tráfico. Tal mudança poderia representar um avanço quando pensamos na despenalização dos usuários; no entanto, na aplicação prática, a legislação apresenta um grande retrocesso. Em análise sobre a lei de drogas, Luciana Boiteux nos alerta para um gigantesco aumento do número de encarcerados após a aprovação da lei:

É bastante representativo verificarmos que o grande crescimento da população carcerária no Brasil, superior até, em termos percentuais, àquela verificada no mesmo período nos Estados Unidos, considerado o país com a maior população encarcerada do mundo, que teve um aumento (entre 1992 e 2007) cerca de 51,3 por cento da sua taxa de encarceramento por cem mil habitantes.Caso se considere o crescimento do número de presos no Brasil entre 1992 e 2011, o número relativo de presos mais do que triplicou. Em termos de superpopulação carcerária, a estadunidense é menos

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expressiva (110,1%), especialmente se comparada com Bolívia (185,1%), Peru (179,6%) e Brasil (165,7%) ((BOITEUX, PÁDUA, 2013, p.22)

Thiago Rodrigues corrobora tal interpretação, mas avança na crítica ao pensar a institucionalização da seletividade penal gerada pela lei. Na tentativa de separar os usuários dos traficantes a lei não especifica quantidades para tais categorizações, o que acaba por dar aos agentes da lei o poder de tal decisão: Nesse sentido, a nova lei brasileira sobre drogas – aprovada em 2006 e que segue proibicionista – estabelece que a quantidade de droga flagrada com alguém determinaria se a pessoa é “usuária” ou “traficante”. Como essa lei não define esses números, no dia-a-dia fica a cargo dos policiais e do delegado registrar a categoria. Nessa brecha, segue a prática da seletividade penal, marcando a diferença social e de cor entre “usuários” e “traficantes”. Hoje, é provável que aquele que não se enquadre no estereótipo de “usuário” ou “traficante” não tenha problemas com a polícia. Para quem não tem essa sorte ou recursos (para eventuais subornos ou advogados), o proibicionismo funciona. E funciona seletivamente, sustentando a violência e grandes negócios (RODRIGUES, 2009)

O perfil do encarcerado por crimes relacionados às drogas no Brasil reflete o viés racista do proibicionismo em nosso país. Cerca de um terço de nossa população carcerária hoje em torno de 750 mil pessoas - é composto por presos que cumprem pena por crimes relacionados ao tráfico. São, em sua grande maioria, jovens, negros, pobres e moradores das periferias das grandes cidades. Esse também é o perfil majoritário dos jovens mortos em confrontos com a polícia. Segundo a Anistia Internacional dos 30 mil jovens vítimas de homicídios todos os anos, 77% são negros. Os debates sobre a alteração dessa legislação seguem também nos meios institucionais. Em maio de 2013, o Projeto de Lei do Deputado Osmar Terra (PMDB-RS) foi aprovado pela Câmara dos Deputados e atualmente tramita como PLC 37/2013 no Senado Federal. Tal projeto, já citado e comentado no item 2.3 deste relatório, representa para os defensores dos direitos humanos, militantes antimanicomiais e ativistas da legalização um enorme retrocesso, pois aumenta a já alta pena por tráfico, não faz distinção entre usuários e traficantes e facilita o repasse de verbas para as comunidades terapêuticas, reforçando o processo de privatização e precarização dos serviços de saúde ao preterir a rede substitutiva. 13 | 37

O projeto propõe o aumento dos repasses públicos de verbas para instituições privadas que possuem sua eficácia, no cuidado ao uso abusivo de drogas, extremamente questionada. No entanto, os movimentos sociais e ativistas pró-legalização vêm ganhando força, especialmente no ano de 2014, devido à grande expressão atingida pelo debate sobre o uso medicinal da maconha que culminou com a reclassificação do Canabidiol (CBD) pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), deixando de ser proscrito. O poder mobilizador do tema repercutiu na grande mídia brasileira tornando a questão um debate público. Um ponto essencial também a ser mencionado é a resistência representada pelo movimento Marcha da Maconha que desde 2002 sai às ruas no Brasil pedindo a legalização do uso, produção e venda da planta. A manifestação já chegou a ser proibida durante alguns anos e sofreu forte repressão pelo Estado sob o argumento de que fazia apologia ao crime. Apenas em 2011, por decisão do Supremo Tribunal Federal, a Marcha da Maconha recebeu amparo legal. É necessário lembrar que em nenhum dos anos durante a proibição os ativistas deixaram de se reunir e marchar. No ano de 2014 as marchas aconteceram em dezenas de cidades no Brasil reunindo milhares de pessoas nas grandes cidades e capitais. Ainda que pequenas, essas mudanças nos mostram que o debate sobre as drogas ilícitas começa a ser desinterditado, permitindo reflexões e ações que fujam às recorrentes políticas e assistenciais repressivas e proibicionistas.

6- Metodologia do Projeto

O Projeto apresentado e executado pelo Fórum Mineiro de Saúde Mental consistiu na coleta de denúncias sobre violações de direitos em comunidades terapêuticas através de entrevistas realizadas com treze usuários, no Estado de Minas Gerais. Inicialmente os entrevistadores foram treinados e orientados sobre os procedimentos e técnicas para a entrevista. Os dados foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas a partir de um roteiro amplamente discutido e previamente elaborado (APENDICE I).

As entrevistas

tiveram duração aproximada de 30 minutos e foram gravadas em fotografia e vídeo ou áudio. Todos entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (APENDICE II) e foram esclarecidos sobre os objetivos do projeto bem como dos métodos de

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coleta dos dados. Um vídeo e o presente relatório foram feitos a partir do relato dos entrevistados.

7-

Histórico de Violações em Locais de internação De setembro a outubro de 2014, o Fórum Mineiro de Saúde Metal (FMSM) entrevistou 14 pessoas que passaram por centros de internação para usuários de drogas, sobretudo pelas comunidades terapêuticas, onde o tratamento é comumente realizado no Brasil. Os relatos colhidos pelo FMSM confirmam os resultados encontrados pelo Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: “Há claros indícios de violação de direitos humanos em todos os relatos. De forma acintosa ou sutil, esta prática social tem como pilar a banalização dos direitos dos internos. Exemplificando a afirmativa, registramos: interceptação e violação de correspondências, violência física, castigos, torturas, exposição a situações de humilhação, imposição de credo, exigência de exames clínicos, como o teste de HIV − exigência esta inconstitucional −, intimidações, desrespeito à orientação sexual, revista vexatória de familiares, violação de privacidade, entre outras, são ocorrências registradas em todos os lugares. Percebe-se que a adoção dessas estratégias, no conjunto ou em parte, compõe o leque das opções terapêuticas adotadas por tais práticas sociais. O modo de tratar ou a proposta de cuidado visa forjar − como efeito ou cura da dependência − a construção de uma identidade culpada e inferior. Isto é, substitui-se a dependência química pela submissão a um ideal, mantendo submissos e inferiorizados os sujeitos tratados. Esta é a cura almejada” (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2011, p.200).

Em todas as entrevistas realizadas, encontramos descrições de violações, que vão desde pequenas interdições ao cigarro, às visitas íntimas, ao lazer, até relatos de tortura, castigos físicos, discriminação a identidades sexuais e de gênero. As denúncias contra as comunidades terapêuticas são constantes, mas poucas vezes resultam em medidas efetivas por parte do Estado para combater essas violações. Se por um lado, em alguns momentos, as instituições públicas cumprem com sua função - no mês de agosto de 2014, 8 comunidades terapêuticas foram fechadas pelo Ministério Público, na região de Uberaba (MG), por apresentarem condições sanitárias inadequadas para o seu funcionamento (ROCHA, 2014) – por outro, revela-se a continuidade das práticas exaustivamente denunciadas pelas entidades antimanicomiais e de direitos humanos. 15 | 37

O descaso do Estado quanto a esta dramática situação evidencia o pouco que foi feito para alterar a realidade vivida pelos usuários, que infelizmente se assemelha, em muitos casos, com a dos internos em manicômios do século XX e ainda presente nestes locais e em grande parte do sistema carcerário brasileiro.

8.0 - Violações em comunidades terapêuticas A partir das 13 entrevistas realizadas, colhemos uma série de relatos que confirma a inadequação das comunidades terapêuticas para a realização de um possível “tratamento” aos usuários de drogas e a ocorrência de violações, desde as físicas até as mais subjetivas. São elas: internação forçada, laborterapia, castigos físicos, impedimento de circulação e comunicação com o ambiente externo, alimentação precária, ausência de atendimento médico, imposição de credo religioso e desrespeito à identidade sexual e de gênero. As violações de cunho mais subjetivo tem grande presença nas entrevistas, ainda que muitas vezes os próprios internos não percebam pequenas interdições ou comportamentos dos funcionários das comunidades terapêuticas como violações aos seus direitos. Essa não percepção é muito reveladora dos efeitos da própria instituição de internação, pois nos mostra a construção de uma identidade culpada, inferiorizada, que às vezes parece culminar com o esfacelamento da individualidade do interno. Ao não perceber que está sendo vítima de determinada ação violadora, o mesmo demonstra que tal ação pode não ser uma ofensa notável ou excepcional em uma vida já marcada por violências, interdições e sofrimento. Por outro lado, nos revela a perversidade latente dos locais de internação que, com o discurso do cuidado, transformam aquele que demanda atenção em um sujeito apagado de si, de seus direitos e de seu próprio corpo.

8.1- Tipos de internação Apesar de sustentado firmemente pelos proprietários ou diretores das comunidades terapêuticas, em especial através de pronunciamentos oficiais de suas federações, vários relatos publicados pela mídia, descritos em consultórios ou em conversas informais nos apontam que o tipo de internação mais comum nesses espaços não é a voluntária. Conforme relata recente reportagem do jornal O Tempo, a internação compulsória, aquela feita mediante 16 | 37

ordem judicial e contra a vontade do usuário, cresceu 327% em Minas Gerais. Segundo dados da Subsecretaria de Políticas sobre Drogas, no período de 2012 a setembro de 2014, teriam ocorrido no Estado de Minas Gerais 857 internações compulsórias (CÂMARA, 2014) Entre os nossos entrevistados, quase todos passaram por mais de uma internação e a maioria foi internada por familiares ou amigos, não ficando claro, contudo, o grau de consentimento dessas internações, pois a prática mais comum nos casos das internações involuntárias ou compulsórias é serem feitas a partir de pedidos da família.

8.2- Estrutura Física e Funcionamento Quanto às acomodações das comunidades terapêuticas, há situações relatadas bem diversas. Algumas, mesmo em espaços com restrição de área física, comportam um número de internos muito maior que sua capacidade. Alex, um dos entrevistados, relata ter ficado com mais de 100 pessoas em umas das comunidades terapêuticas na qual esteve internado. Nesse local, os usuários ficavam todos juntos em um galpão, conforme nos conta: “na fase um, era um galpão gigante… tinha cama para tudo que era lugar”. A fase a que se refere é do período de triagem empregado por muitas instituições na qual os internos vão migrando de etapa em etapa para diferentes locais e com diferentes direitos como um processo de recompensa pelo grau de comprometimento com o tratamento e seu avanço no tempo. Alex também relata como se organizava o funcionamento dessas instituições. Por ter passado por várias internações, em diferentes locais do país, foi um interlocutor privilegiado ao contar suas experiências. Em todas as comunidades terapêuticas pelas quais passou só observou a presença de funcionários para serviços gerais em uma. Nesse sentido nos diz: “tudo, absolutamente tudo que é feito dentro da maioria dos centros de recuperação é feito pelos internos… é muito difícil você ter funcionário”. Serviços de manutenção das casas realizados pelos internos são frequentemente relatados por vários entrevistados: dos serviços de cozinha citados por Luiz Carlos, até a manutenção da horta, conforme mencionado por Sinval. Ângelo também relata o uso do trabalho dos internos, sem remuneração, em atividades de manutenção e ampliação das comunidades terapêuticas.

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8.3- Comunicação A restrição da comunicação dos internos é relatada exaustivamente pelos entrevistados que passaram por comunidades terapêuticas. A prática é justificada, no período inicial da internação, pela necessidade de se afastar de informações relativas às drogas e aos contextos de uso, e com o objetivo de que o interno possa “focar” no tratamento. Luiz Carlos diz ter ficado três meses sem poder se comunicar com sua família, pois estava no primeiro estágio “em três meses não podia receber carta, não podia receber visita, a gente ficava praticamente isolado do mundo” e conta que nesse período "ninguém recebia visita, ninguém recebia carta, ninguém recebia telefonema”. Além do período inicial, a restrição à comunicação com a família e com o mundo externo, também é utilizada como forma de punição por comportamentos julgados inadequados, conforme relata Bruna, que teve a comunicação com sua mãe e sua filha impedidas no dia de seus respectivos aniversários por descumprimento de ordens disciplinares. Ângelo, por outro lado, aponta que o direito de se comunicar era utilizado como “premiação” em consequência de bons comportamentos relativos aos processos organizativos da comunidade. Ângelo, Bruna e Luiz Carlos falam que a comunicação era limitada por dias específicos da semana. Carlos Augusto e Bruna relatam que havia violação do conteúdo das correspondências enviadas e recebidas pelos internos, assim como averiguação e restrição de pertences, tanto na entrada quanto ao longo da permanência, fato indicado também por Alex e Marco Aurélio. Luiz Carlos nos explica: “quando a gente entra tem uma revista horrível, eles tiram tudo da bolsa, revistam bolso. Quem faz (a revista) é a diretora da clínica com os monitores”. As visitas recebidas pelos internos também eram cerceadas por monitores e outros agentes das instituições, diz Alex. A comunicação entre os internos também é mediada, fato exemplificado nas falas de Luiz Carlos, "a gente era vigiado o tempo todo, os monitores ficavam sempre atrás da gente pra saber o que a gente estava falando, conversando”.

8.4- Alimentação

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Os relatos sobre a alimentação apontam que as comunidades terapêuticas pelas quais alguns entrevistados passaram ofereciam comida em quantidade insuficiente e de má qualidade. Luiz Carlos fala que as refeições eram preparadas pelos internos e diz ter trabalhado nessa função durante sua permanência. Alex e Bruna falam sobre a irregularidade das refeições, sendo as comunidades terapêuticas por que passaram dependentes de doações externas para a oferta de alimentos aos internos. Ângelo aponta uma divergência de discursos por parte da comunidade terapêutica na qual foi internado sobre a procedência dos alimentos: “eles falaram para gente que nessa clínica iria ter leite da vaca e pão da Pão e Companhia, mas era tudo mentira. Não tinha vaca nem leite. Eu nunca bebi leite, lá. E o pão era da Pão e Companhia mesmo…. Mas o pão vinha verde, por que era o pão que sobrava da padaria....tudo mofado”. O entrevistado também nos relatou ter passado fome nessa mesma instituição.

8.5- Atendimento à saúde A ausência de funcionários para os serviços em geral também ocorre para os atendimentos de saúde. Na quase totalidade das comunidades terapêuticas descritas em nossas entrevistas não havia médicos e outros profissionais de saúde e onde havia o atendimento era realizado no mínimo, semanalmente. Levando em conta que a maioria das comunidades terapêuticas situa-se em locais afastados das cidades, e que as mesmas recebem, temerariamente, com grande frequência, usuários em quadros de intoxicação e/ou abstinência graves, a falta de profissionais de saúde e de estrutura adequada expõe a vida dos internos a grandes riscos, muitas vezes fatais. Marco Aurélio nos fala da negligência das comunidades terapêuticas ao se defrontarem com quadros de abstinência, situação sempre imposta como condição de permanência no local. Alex relata realização de contenção física frente a crises de abstinência, momentos em que eram feitas “orações fortes” em resposta ao quadro clínico apresentado. Luiz Carlos endossa a afirmação de intervenções espirituais também em outras situações clínicas graves. Na entrevista, Alex conta sobre o episódio vivido por um amigo interno, alérgico, que sofreu uma picada de inseto e teve como tratamento oferecido a oração. O interno começou a manifestar diversos sintomas e foi logo socorrido por Alex, pois o pastor insistia em resolver a 19 | 37

situação orando. Ao se deparar com a ausência de socorro médico, o próprio Alex levou o amigo para receber atendimento externo. Por outro lado, a entrada nas comunidades terapêuticas muitas vezes é dependente de exames realizados anteriormente, impedindo a admissão de pessoas com problemas crônicos de saúde, como também relata Ângelo. A obrigatoriedade de realização do teste de HIV é citada por Alex e Marco Aurélio e a consequente restrição de entrada de pessoas com resultado positivo. Sobre o uso de medicações, Bruna relata que os internos entravam na comunidade terapêutica com a medicação em uso, mas durante a internação a "medicação era dada para outros internos” por obreiros e monitores. A fala de Roberto Carlos ilustra algumas das situações que nos foram contadas pelos entrevistados:

“- Tomava remédio para ansiedade. - Quem dava? - entrevistadora - Os obreiros mesmo - Mas não tinha médico, enfermeiro? - entrevistadora - Médico não tinha não, só os obreiros mesmo”

A promoção à saúde e orientação sobre cuidados referentes ao uso de drogas e contextos de exposição a riscos e danos não é abordada. Bruna, Luiz Carlos e Ângelo afirmam não ter recebido informações e orientações sobre sexo seguro e estratégias de redução de danos.

8.6- Circulação e Rotina A rotina no interior de uma comunidade terapêutica segue uma disciplina comum em instituições de longa internação/permanência. Horários rígidos, obrigação de exercícios físicos e trabalhos braçais fazem parte do cotidiano, com pequenas variações, de todas as comunidades terapêuticas mencionadas pelos usuários entrevistados. "As regras eram muito rígidas", confirma a fala de Luiz Carlos. A impossibilidade da circulação fora da instituição, especialmente no início do tratamento é frequente. No entanto, ainda durante a permanência na instituição a circulação 20 | 37

dos internos é restrita a espaços específicos como indicado por Marco Aurélio, Ângelo e Luiz Carlos. Segundo alguns entrevistados a interdição do deslocamento dentro da clínica era utilizada como estratégia de punição, restringindo aos internos a circulação já limitada. Carlos Augusto nos conta “o castigo é que não podia sair, não podia ir a lugar nenhum, só podia ficar no pátio”. Sinval, internado em uma comunidade evangélica, gerida por um ex-policial militar e atualmente deputado estadual, compara a instituição com um quartel tal era a lógica disciplinar do local. O tempo restrito e controlado também é relatado por Luiz Carlos quando se refere ao tempo dos banhos “no máximo cinco minutos”. Além do tempo controlado havia um obreiro (como são chamados os internos que se tornam funcionários) do lado de fora regulando os tempos e avisando dos horários. Essa disciplina é muito destacada por Luiz Carlos, que nos conta de uma vigilância constante nas instituições pela qual passou “tem sempre alguém atrás da gente…. você não vai a lugar nenhum sozinho”. Carlos Augusto relata semelhante vigilância “lá tinha gente olhando a gente o tempo todo, em todo lugar que a gente ia". A interdição das relações entre internos e as visitas é fato comum lembrado por todos. Geralmente, no primeiro mês, as visitas são impedidas, enquanto a possibilidade de visitas íntimas não foi sequer citada pelos entrevistados quando perguntados. Alex nos relata ter sido chamado à atenção por ter beijado sua namorada em uma das visitas “minha namorada me deu um beijo na boca e o cara me botou para lavar as panelas tudo…. imagina, a minha namorada veio me visitar e me deu um beijo”.

8.7- Religiosidade As comunidades terapêuticas evangélicas ou católicas têm como “método terapêutico” o uso da religiosidade. No entanto, essa prática é, na maioria das vezes, compulsória, o que desrespeita o livre exercício das identidades religiosas. Desde 1891, o país é constitucionalmente um Estado Democrático de Direito, o que significa que o Estado brasileiro é laico, ou seja, tem suas funções separadas de quaisquer opções e orientações religiosas. Esse caráter laico tem como objetivo o respeito e o reconhecimento de nossa diversidade, sendo que os serviços e estabelecimentos públicos 21 | 37

devem zelar e seguir tal legislação. No âmbito do cuidado à saúde tal preceito é fundamental, pois para garantirmos o amplo atendimento e acesso aos serviços é imprescindível que o acolhimento e tratamento não discriminem ou imponham qualquer tipo de credo ou orientação religiosa. No caso das comunidades terapêuticas o princípio da laicidade é frontalmente desrespeitado. Essas instituições, que são em sua maioria ligadas a grupos religiosos, foram e seguem sendo constantemente denunciadas por suas práticas de exclusão e desrespeito às identidades religiosas dos internos. A obrigação do culto ou da oração aparece recorrentemente nos depoimentos, sendo que o não cumprimento dessas obrigações poderia, inclusive, gerar sanções ou castigos. Para Ângelo existia uma troca: “em troca do tratamento é como se você fosse obrigado a ser inserido naquela religião…. Você é forçado a ter uma religião que muitas vezes a pessoa não tem”. O serviço oferecido tem como contrapartida a total subserviência do interno à ideologia da instituição, ainda que isso contrarie seus próprios preceitos religiosos ou morais. Roberto Carlos também nos revela algo parecido: sendo católico, foi internado em instituições evangélicas que proibiam imagens religiosas, inclusive o crucifixo que usava, por contrariar os dogmas protestantes. Há uma incompatibilidade das comunidades terapêuticas com os princípios da laicidade do Estado e do pleno atendimento do Sistema Único de Saúde. A necessidade de concordância compulsória com os dogmas das instituições limita e constrange o atendimento de usuários que não comunguem com tais preceitos. Nesse sentido, tais instituições são claramente inconstitucionais.

8.8- Castigos e Torturas A lógica disciplinar mantida pelas comunidades terapêuticas que tanto é revelada pelos entrevistados tem seu auge nas sanções aos internos. Essas ocorrem de diversas maneiras: obrigando-os a fazer os serviços de cozinha ou de higienização dos espaços, perdendo direito à comunicação com parentes, ficando privados da alimentação ou sendo expostos à humilhação perante os outros internos e até de familiares. A partir dos relatos identificam-se diversas formas de violência física e psicológica que acontecem nas comunidades terapêuticas. Roberto nos conta de uma prática muito 22 | 37

comum em locais de internação: o uso de medicação parenteral para manter os pacientes calmos e dopados. Roberto nos relata também que os internos, após tomarem essas injeções eram amarrados nas camas “uma injeção que dá…. dá sono né? Se estiver amarrado, lá você mija e caga amarrado que eles não te desamarram não”. O entrevistado também nos relata o que acontecia com os que descumpriam as normas da instituição onde foi internado: “se você fizesse alguma coisa de errado tinha que pegar uma ordem de disciplina de joelho…. Se você não ficasse uma hora lá eles amarravam e jogavam num quartinho escuro cheio de ratos”. Outro relato de violência é contato por Alex, quando nos diz de um interno que foi levado pela família à comunidade terapêutica e o mesmo encontrava-se alcoolizado. No final da tarde “ ele deu uma de doido pra fugir” e foi amarrado e colocado numa despensa durante a noite. No outro dia, “quando eu abri a porta, a mão dele estava inchada….a mão e o pé….parecia uma luva de boxe..... acho que devemos ter amarrado forte demais”. Nesse caso, o interno foi amarrado pelo gerente da clínica com ajuda de internos. Outra forma de castigo comum era, conforme nos conta Ângelo, cavar um buraco de três metros de profundidade por três metros de largura. O uso do trabalho como punição é muito relatado pelos internos, e aqui não falamos da terapia pelo trabalho, chamada laborterapia que será desenvolvida em tópico específico, mas do trabalho enquanto sanção por descumprimento de regras, que muitas vezes tem como função a manutenção da infraestrutura e do funcionamento da instituição. O entrevistado Sinval também nos trouxe um relato de castigo que tem como sentido a humilhação dos internos. Segundo o entrevistado aqueles que descumprissem as normas eram obrigados a “pagar física”, ou seja, realizar exercícios físicos no meio da quadra de esportes no domingo, que era o dia das visitas. Portanto, os castigos tinham como adicional de humilhação serem realizados na presença de todos os outros internos e familiares que visitavam seus parentes. A lógica das humilhações é muito comum em alguns meios nos quais a conquista da disciplina mediante o medo e o autoritarismo é o objetivo do discurso. Não é estranho que a lógica militarista dos quartéis seja transposta para locais que deveriam oferecer tratamento.

8.9- Homofobia 23 | 37

As comunidades terapêuticas no Brasil são, geralmente, orientadas ou ligadas a algum grupo religioso. As igrejas cristãs católicas e neopentecostais são a maioria nesse universo. Para além da obrigação religiosa já mencionada em outro tópico deste relatório, um problema muito relatado pelos entrevistados é o comportamento homofóbico dos funcionários ou gestores das instituições. Obviamente, não se pode dizer que tal comportamento é causado pela orientação religiosa, mas as denúncias dão conta de práticas por parte dessas comunidades terapêuticas, em especial de orientação evangélica, que violam os direitos à livre expressão da identidade sexual e de gênero. Luiz Carlos nos relata como foi expulso de uma comunidade terapêutica por estar no mesmo local que outro homem com o qual já havia tido um relacionamento. Como os internos eram constantemente vigiados ele é levado ao diretor da clínica e imediatamente expulso. Alex nos conta também ter presenciado um espancamento de um homossexual em uma das clínicas pelas quais passou. O interno teria tentado ter relações sexuais com outro e ao receber a negativa foi gerado um grande alarde no dormitório fazendo com que o usuário homossexual fosse espancado e amarrado numa árvore pelos outros internos e pelo pastor responsável. Segundo Alex “amarrou o cara assim numa árvore, rasgou a roupa dele, raspou o bigode do cara só a metade, passou um batom... uma tinta... Bateu, bateu e mandou o cara embora... todo rasgado”. A homofobia aparece também na admissão às comunidades terapêuticas, pois conforme nos conta Alex, em muitas delas não aceitam homossexuais. Como não é possível identificar um homossexual por características que não sejam a autodeterminação, tais instituições se utilizam de estereótipos sociais que são atribuídos a homens e mulheres que se declaram gays ou lésbicas.

8.10- Laborterapia A laborterapia ou terapia pelo trabalho é um dos instrumentos “terapêuticos” mais utilizados pelas comunidades terapêuticas no Brasil. Essa pretensa metodologia entende que a realização de atividades sem objetivo ou fim específico ajudaria na melhora do paciente. Não falamos aqui de trabalhos na manutenção física do espaço, mas sim de trabalho sem sentido, como cavar e tampar buracos, buscar água em locais distantes ou capinar grandes terrenos.

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Tão grave quanto o uso não remunerado do trabalho dos internos, e que muitas vezes é usado para justificar a ausência de funcionários, a laborterapia é uma completa alienação da pessoa e da sua subjetividade, pois a mera repetição de uma ação sem objetivo não cria significado para o usuário. O que temos é um castigo ou a construção de uma lógica da culpa, entendendo o trabalho alienado e o consequente cansaço do corpo como uma expiação de algum mal interno, natural ou proveniente de algum carma metafísico que justifique sua situação de sofredor e refém da droga. Tal lógica nos parece ser o contrário de uma política que pretenda a garantia de direitos e o entendimento da questão do uso abusivo de drogas como algo complexo e que deve ser pensado e resolvido no meio social e não no isolamento.

9- Considerações finais Finalizando o nosso projeto, com a conclusão do vídeo e do relatório, um outro efeito, para além dos objetivos elencados na proposta inicial, se evidenciou. Ao elaborar instrumentos que possibilitassem a visualização e a escuta daquilo que nos traziam os usuários, conseguimos perceber e sentir, de maneira ímpar, a força e a potência de suas falas e corpos. Seus depoimentos vívidos, legítimos e corajosos, reforçam e reafirmam toda a potencialidade que possa advir da voz e da organização daqueles a quem mais diretamente interessa uma política de drogas digna e cidadã. Construir tal política nos leva a pactuar compromissos, entre eles, o de não recuar frente às dificuldades e empecilhos. O Estado brasileiro, em suas 3 esferas de poder, mostrase omisso e conivente com as práticas impostas aos usuários pelas comunidades terapêuticas. Para além das mais diversas violações e privações relatadas pelos internos entrevistados, denunciadas sistematicamente na grande imprensa e presente em vasta revisão bibliográfica, as comunidades terapêuticas se constituem como um instrumento imediatista e simplista para lidar com a complexa questão do abuso de drogas em nosso país. Agravando ainda mais a situação, no ano de 2014, o governo brasileiro buscou, por meio do CONAD (Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas), regulamentar a atividade dessas instituições para torná-las interligadas aos serviços públicos de saúde. Tal atitude poderia parecer benéfica quando entendida como maior fiscalização e controle, entretanto o que se observa é um forte atrelamento aos interesses das comunidades terapêuticas. Parecenos que o objetivo de tal regulamentação é aumentar a presença dessas instituições junto aos serviços públicos, legitimando-as e garantindo, por mais outra via, o seu financiamento. 25 | 37

O repasse público de verbas para instituições de eficácia tão contestada e que apresentam claros indícios de violações de direitos humanos é um retrocesso na vitoriosa luta pela Reforma Psiquiátrica no Brasil, contrariando os objetivos e resoluções formuladas na 14ª Conferência Nacional de Saúde e na IV Conferência Nacional de Saúde Mental - Intersetorial construídas com ampla participação de trabalhadores, usuários e gestores. Nesse sentido, entendemos de fundamental importância a elaboração de trabalhos, pesquisas e iniciativas que busquem desvelar os porões dessas instituições de internação que não se apresentam, a nosso ver, como alternativas para o tratamento do uso abusivo de drogas. Reafirmamos nossa posição em defesa da saúde pública e da rede substitutiva de saúde mental, pensada na lógica da redução de danos e regida pelos princípios da luta antimanicomial e da reforma psiquiátrica. O cárcere e a privação de liberdade e direitos não podem se sobrepor ao potencial terapêutico e emancipador da clínica baseada na liberdade e na cidadania. Essa lição nos foi lembrada, a todo momento, durante o processo de entrevistas, pelos próprios usuários, ao nos afirmarem sucessivamente a diferença fundamental entre o cuidado individualizado e em liberdade oferecido pela rede pública substitutiva de saúde mental e o apagamento de subjetividades e a violação de direitos engendrado nos centros de internação.

10 - Referencias bibliográficas:

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da IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial, 27 de junho a 1 de julho de 2010. Brasília: Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, 2010.

Agradecimentos Agradecemos ao Programa Internacional de Desenvolvimento de Redução de Danos da Open Society Foundations (OSF), parceiro que possibilitou a realização deste projeto. 30 | 37

Agradecemos também a todos que cederam seus testemunhos sobre suas experiências nas comunidades terapêuticas. Agradecemos aos trabalhadores, militantes e gestores que nos apoiaram e viabilizaram seu apoio a este projeto. APENDICE I ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS USUÁRIOS Sugestão de pergunta genérica inicial: Conte um pouco sobre sua história, como chegou até aqui e sobre seu cotidiano na instituição. SITUAÇÃO DA INTERNAÇÃO 

A internação na instituição foi uma decisão sua? ( ) Sim ( ) Não Se não, quem decidiu? ( ) família ( ) justiça ( )MP ( ) Defensoria ( ) CT ( ) outro.



A internação foi compulsória? ( ) Sim

( ) Não



A internação foi involuntária? ( ) Sim

( ) Não.

Se sim, quem autorizou/solicitou? ( ) juiz ( ) promotor de justiça ( ) político ( ) família ( ) profissional da saúde ( ) pastor/padre da igreja ( ) CT ( ) Outro. 

Há quanto tempo você (esteve) está internado?



Você ou sua família pagam (pagaram) por esta internação? Se sim, quanto? De que forma?



Houve algum tipo de preparação para você e sua família antes da internação?



Você recebe algum tipo de benefício (INSS, outros)? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, quem recebe e administra estes recursos?



Você já foi internado em outra instituição antes? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, quantas vezes? Onde?



Seus pertences são preservados junto a você durante o período de internação? CUIDADO/VIOLAÇÃO DE DIREITOS



Você sofreu, nesta internação, algum tipo de castigo ou constrangimento? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, de que tipo? Qual o motivo?



Você sofreu, em internações anteriores, algum tipo de castigo ou constrangimento? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, de que tipo? Qual o motivo?



Que tipo de infrações geram punições nesta instituição?



Quais são as punições mais freqüentes nesta instituição? 31 | 37



Você viu algum usuário ser constrangido/castigado/ punido nesta instituição? ( ) sim ( ) não. Se sim, qual constrangimento/castigo/punição foi imposta? Qual o motivo? ▪ No período desta internação você quis sair da instituição? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, como sua proposta foi recebida pela instituição? ▪ Quais são os motivos que justificariam a expulsão da instituição? COMUNICAÇÃO



A instituição permite que você se comunique com sua família e amigos? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, a partir de quando e qual a frequência? Se não, quem controla a comunicação?



Quais os meios de comunicação que você pode usar? ( ) telefone ( ) correio ( ) internet ( ) visitas ( ) outros



As correspondências dos usuários são lidas pela equipe sem a autorização dos mesmos? ( ) Sim ( ) Não



Você tem acesso à internet? ( ) Sim ( ) Não. Se sim, qual a frequência?



Você tem acesso ao seu celular? ( ) Sim ( ) Não Se sim, qual a frequência? ALIMENTAÇÃO



Como você avalia a alimentação fornecida pela instituição? ( ) boa ( ) ruim



Quem prepara a alimentação?



Quantas refeições são fornecidas aos usuários por dia?



Como são guardados os alimentos?



A alimentação é suficiente?



Em decorrência de alguma situação, a alimentação é suspensa ou obriga-se a fazer jejum? ESTRUTURA FÍSICA



Como você avalia as dependências da instituição?



Quem faz a limpeza das dependências da instituição?



Os quartos são limpos e ventilados? ( ) Sim ( ) Não



As roupas de camas são fornecidas por quem? ( ) CT



Qual a qualidade das roupas de cama? ( ) boa ( ) ruim



O que você acha dos banheiros da instituição? ( ) bons ( ) ruins.



Quantos banheiros existem na instituição?

( ) família ( ) doações

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Este número é suficiente para atender os usuários? ( ) Sim ( ) Não



Quem faz a limpeza dos banheiros?



A área externa e de lazer é ampla e bem cuidada? SAÚDE



Quais são os principais problemas de saúde dos usuários internados?



Quais as principais queixas dos usuários na área de saúde?



Como a instituição cuida das necessidades de saúde dos usuários?



Qual a sua avaliação sobre o tratamento que a instituição oferece?



Os usuários são obrigados a fazer exame para diagnóstico de HIV?AIDS?



Você faz uso de algum medicamento? ( ) sim ( ) não Qual?



Você é informado de qual medicamento faz uso? ( ) sim ( ) não



Você tem conhecimento se outros internos fazem uso de medicamentos?



Sabe onde e como são guardados seus medicamentos? ( ) sim ( ) não



Quem é o responsável pela dispensação dos medicamentos?



O que é feito nos casos de abstinência, fissura e intoxicação? RELIGIÃO ▪

O ingresso do usuário à instituição é condicionado ao credo religioso professado pela

instituição? 

A instituição impõe práticas religiosas? ( ) sim ( ) não Se sim, quais?



Caso não sejam praticadas pelos usuários, o que é feito pela instituição?



São permitidas outras práticas religiosas diferentes da “indicada” pela instituição? METODOLOGIA DA INSTITUIÇÃO



Você saberia descrever quais são as práticas/métodos considerados “de tratamento ou terapêuticos” da instituição?



Esta instituição tem relação com outros grupos de ajuda, como por exemplo, “Amor Exigente”?



É exigido de você abstinência?



Você sabe o que é redução de danos? ( ) sim ( ) não



Esta instituição trabalha com redução de danos? ( ) sim ( ) não Quais estratégias adota?



O que acontece caso seja feito uso de drogas dentro da instituição? 33 | 37

LAZER/ATIVIDADES/TRABALHO 

Você exerce (exerceu) alguma atividade (tipo laborterapia) nas dependências da instituição? ( ) sim ( ) não. Se sim, é imposto? Qual a carga horária e a natureza das atividades exercidas?



Você ou os demais usuários realizam trabalhos como: venda de canetas, balas e outros materiais? ( ) sim ( ) não



Você ou os demais usuários realizam alguma outra forma de trabalho? ( ) sim

( ) não. Se

sim, é imposto? ( ) sim ( ) não 

Recebem alguma remuneração pelo trabalho imposto pela instituição?



Você já atuou na instituição como monitor/obreiro? Se sim, conte um pouco sobre sua experiência neste caso.



Vocês utilizam equipamentos de proteção e segurança para realização dos trabalhos na instituição?



É permitido ver qualquer canal de televisão, ouvir qualquer estação de rádio? ( ) sim ( ) não



São permitidos quaisquer livros, jornais e revistas nesta instituição?



O horário de lazer é restrito e controlado pela instituição? SEXUALIDADE



Você tem direito a receber visita íntima nesta instituição? ( ) sim ( ) não



A CT recebe homossexuais, lésbicas, travestis? ( ) sim ( ) não Se sim, essa identidade é respeitada?



Você recebeu orientação sobre sexo seguro e preservativo nesta instituição? ( ) sim ( ) não



É permitido namoro dentro da instituição, entre internos?



Você sofreu ou presenciou ou teve noticias de algum tipo de abuso/violência sexual nesta instituição? MULHERES, CRIANÇA E ADOLESCENTE



Esta instituição recebe adolescentes e crianças? ( ) sim ( ) não. Se sim, há espaço espaços específicos para estes?



Esta instituição recebe público feminino para internação? ( ) sim ( ) não. Se sim, há espaço espaços específicos para estes? 34 | 37



Esta instituição aceita a internação de usuárias gestantes? ( ) sim ( ) não. Se sim, a gestante recebe cuidados adequados a sua condição como o acompanhamento clinico?



Esta instituição aceita internação de usuárias com seu bebe? ( ) sim ( ) não. Neste caso, como se dá o atendimento a este publico?



Você tem conhecimento de casos de gravidez dentro da instituição? Neste caso, qual foi a postura da instituição diante do caso? CIRCULAÇÃO



Em algum momento ou situação os usuários ficam trancados nos quartos ou em algum outro espaço? ( ) sim



( ) não. Caso sim, em que situação?

Os usuários ficam amarrados/contidos fisicamente? ( ) sim ( ) não. Caso sim, em quais momentos ou situações?



Os usuários podem circular livremente pelas dependências da instituição? ( ) sim ( ) não



Os usuários podem sair temporariamente da área da instituição? ( ) sim ( ) não Caso sim, o que acontece se retornam tendo feito uso de drogas?



É possível os usuários abandonarem a instituição fora do prazo determinado? ( ) sim ( ) não. Se não, e o usuário insistir, o que pode acontecer?



Em caso de abandono ou fuga, é possível o retorno à instituição? ( ) sim ( ) não Se sim, quais condições são impostas?

ATENÇÃO: O roteiro deve ser adaptado de acordo com o público entrevistado, egresso de instituição, em situação de internação atual, usuário CAPS ad, usuário de comunidade terapêutica, etc. Para fins desta entrevista, entendemos por instituição as comunidades terapêuticas, os hospitais psiquiátricos e as clinicas especializadas.

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APENDICE II TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Convidamos você para participar do projeto desenvolvido pelo Fórum Mineiro de Saúde Mental através do “Programa Internacional de Desenvolvimento de Redução de Danos da Open Society Foundations (OSF)”. Esse projeto tem a finalidade de documentar abusos em centros de “tratamento” para pessoas que usam drogas em cidades da região metropolitana de Belo Horizonte, norte de Minas Gerais e Triângulo Mineiro. Esta documentação consta de entrevista aberta, oral, com roteiro prévio, gravação de voz e vídeo, e duração aproximada de sessenta (60) minutos. Consentimento Eu,_________________________________________________________,

declaro

que li entendi as informações contidas acima. Todas as minhas dúvidas foram esclarecidas e recebi uma cópia do formulário de consentimento do projeto supracitado. Concordo com a minha participação e permito, sem restrições, de forma permanente e irrevogável ao Fórum Mineiro de Saúde Mental, a Open Society Foundation e demais parceiros, utilizar minhas declarações e permito reproduzi-las, exibi-las e transmiti-las por qualquer meio de comunicação, seja agora ou no futuro conhecido, em todo o mundo. Autorizo a coleta e o uso de minhas declarações através da: __Gravação de voz e identificação de minha pessoa. Rubrica:_________________________ __ Gravação de vídeo e identificação de minha pessoa. Rubrica:_______________________ __ Fotografia e identificação de minha pessoa. Rubrica: _____________________________ __ Apenas gravação de voz. Rubrica: ____________________________________________ __ Apenas gravação de vídeo. Rubrica: __________________________________________ __Apenas fotografia e depoimento escrito. Rubrica: ________________________________ __Apenas depoimento escrito. Rubrica: __________________________________________ Reconheço que estou ciente dos riscos e que as fotos, áudio, vídeo serão usados para informar ao público sobre as violações dos direitos humanos sofridas pelos usuários de drogas.

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Desisto sem limitação de qualquer reclamações ou ação judicial por difamação ou violação de quaisquer direitos de publicidade ou privacidade. ________________________________________ Assinatura do participante – data Nome legível e documento de identificação: Telefone e/ou endereço:

Coordenação do Projeto: Fórum Mineiro de Saúde Mental - E-mail: [email protected]

Belo Horizonte, Janeiro de 2015 FÓRUM MINEIRO DE SAÚDE MENTAL

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