Artigo de revisão
Acurácia diagnóstica das doenças respiratórias em unidades primárias de saúde
Acurácia diagnóstica das doenças respiratórias em unidades primárias de saúde Bruno Piassi de São José1*, Paulo Augusto Moreira Camargos2, Álvaro Augusto Souza da Cruz Filho3, Ricardo de Amorim Corrêa4 Mestre e Doutorando da Pós-graduação de Infectologia e Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Médico do Ambulatório de Pneumologia do Hospital das Clínicas
1
da UFMG, Belo Horizonte, MG. 2
Professor Titular Convidado do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG, Belo Horizonte, MG. ProAr – Núcleo de Excelência em Asma, Universidade Federal da Bahia (UFBA), Salvador, BA.
3
Professor-associado do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, Belo Horizonte, MG.
4
Resumo
Trabalho realizado no Programa de Pós-graduação de Infectologia e Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG Artigo recebido: 8/3/2014 Aceito para publicação: 24/3/2014 *Correspondência: Rua Nunes Vieira, 304/1303 Santo Antonio Belo Horizonte – MG CEP 30350-120
[email protected] http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.60.06.020
Conflito de interesse: nenhum
As doenças respiratórias acometem 15% da população do planeta e respondem por 1/5 dos óbitos no mundo. Espera-se que a atenção primária à saúde (APS), primeira instância da assistência médica, solucione até 85% dos problemas de saúde em geral. Pouco se sabe a respeito da habilidade de médicos generalistas da APS em relação ao diagnóstico das doenças respiratórias. Esta revisão refere-se à habilidade diagnóstica de médicos generalistas que atuam na APS em relação às doenças respiratórias mais prevalentes, como doenças respiratórias agudas (IRA), tuberculose, asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Dentre 3.913 artigos, 30 foram selecionados após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão. Ficou demonstrada a carência de dados consistentes sobre a acurácia dos diagnósticos de doenças respiratórias elaborados por generalistas. Em relação à asma e à DPOC, os estudos demonstram erros diagnósticos que levam ao sobrediagnóstico ou ao subdiagnóstico, dependendo da metodologia usada. A imprecisão do diagnóstico de asma variou de 54% de subdiagnóstico a 34% de sobrediagnóstico; para DPOC, houve variação de 81% de subdiagnóstico a 86,1% de sobrediagnóstico; para IRA, verificou-se que a inclusão de exame complementar de auxílio diagnóstico melhora sua acurácia. Os estudos demonstram um baixo nível de conhecimento sobre tuberculose por parte dos generalistas. De acordo com esta revisão, a APS, na figura do médico generalista, necessita aprimorar sua capacidade de diagnóstico e o manejo desse grupo de pacientes, que constitui uma de suas principais demandas. Palavras-chave: doenças respiratórias; atenção primária à saúde; diagnóstico; médicos de atenção primária; revisão.
Introdução Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 20% das 59 milhões de mortes anuais por todas as causas se devem a doenças respiratórias.1,2 Dentre estas, infecções respiratórias agudas (IRA) ocupam o 3º lugar (3,46 milhões de mortes; 6,1% do total), enquanto a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) ocupa a 4ª colocação, com 3,28 milhões de mortes (5,8% do total), e será, segundo projeções, a 3ª causa de morte em 2030.3-5 Mais de 1 bilhão de pessoas no mundo – 15% da população mundial – sofrem de alguma doença respirató-
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ria crônica, sendo que metade delas é acometida de uma das duas condições mais prevalentes: a asma (235 milhões)6 ou a DPOC (210 milhões).7 Por esse conjunto de razões, cerca de 1/3 dos atendimentos nas unidades da atenção primária (APS) em todo o mundo se devem às doenças respiratórias.1 Dentre as dificuldades encontradas na APS em relação a esse grupo de doenças, podem-se citar a imprecisão no diagnóstico da asma e da DPOC8-10 e a excessiva prescrição de antibióticos para o tratamento das doenças res-
603
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São José BP et al.
piratórias agudas.1,11,12 De maneira geral, pouco se sabe sobre a habilidade diagnóstica e de elaboração de planos de tratamento para essas condições pelos médicos da APS, bem como os fatores que as influenciam. Este artigo apresenta uma revisão da literatura a respeito da acurácia diagnóstica de médicos generalistas da APS em relação às doenças respiratórias mais prevalentes e de maior interesse para a saúde pública, como as IRA, a tuberculose, a asma e a DPOC.
Métodos Realizou-se uma busca na literatura por artigos que avaliaram a concordância entre diagnósticos efetuados por médicos da APS e por especialistas em doenças respiratórias para as principais enfermidades respiratórias nos serviços de APS. Consideraram-se, ainda, estudos que utilizaram exames subsidiários de referência (espirometria) para asma e DPOC; pesquisa de bacilo álcool-ácido-resistente (BAAR) para tuberculose; proteína C-reativa (PCR)
e procalcitonina para IRA ou para tomada de decisão clínica, como prescrição de antibióticos. A revisão da literatura foi realizada a partir da base de dados Pubmed®, abrangendo o período compreendido entre 1/1/1992 e 1/8/2012, limitada por estudos realizados em humanos e publicados nos idiomas português, inglês e espanhol. Na seleção, realizaram-se cruzamentos entre três grupos de descritores MeSH e termos livres (TL) de relevância para a pesquisa: “diagnosis” (MeSH), “underdiagnosis” (TL) e “diagnostic concordance” (TL) com “respiratory tract infections” (MeSH), “asthma” (MeSH), “COPD” (MeSH) e “tuberculosis” (MeSH) com “primary health care” (MeSH) e “general practitioners” (MeSH) (Figura 1). Em função da carência de estudos sobre o tema na literatura, diferenças metodológicas ou de definições das condições não foram usadas como critérios de exclusão e serão comentadas adiante. As doenças incluídas nesta revisão foram IRA, asma, DPOC e tuberculose. Artigos que incluíam demais doen951 4
Primary health care Diagnosis
2
Respiratory tract infections
226 4 0
General practitioners 953 Primary health care
5 14
Asthma
235 70 60
General practitioners Diagnostic concordance Primary health care COPD
675 7 19
General practitioners
Primary health care Underdiagnosis
118 7 1 505 1 1
Tuberculosis General practitioners
55 0 0
Figura 1 Sistemática de busca de artigos segundo os descritores, e número de artigos encontrados em cada cruzamento. COPD: chronic obstructive pulmonary disease.
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ças, como síndrome da apneia do sono, câncer de pulmão e outras, foram excluídos.
Resultados Dentre os 3.913 artigos encontrados, 30 foram selecionados de acordo com o fluxograma mostrado na Figura 2. Não foram encontrados artigos que avaliassem as enfermidades de interesse em conjunto. A heterogeneidade metodológica observada não preenchia os critérios para a realização de metanálise. Os resultados serão apresentados na seguinte organização: IRA, tuberculose, asma, DPOC, e asma e DPOC conjuntamente. Infecções respiratórias agudas (IRA) Infecções das vias aéreas superiores Dentre os estudos sobre as infecções de vias aéreas superiores (Ivas), dois usaram PCR como auxílio diagnóstico ou como método de referência para avaliação de acurácia diagnóstica. Um único estudo verificou a acurácia do diagnóstico de Ivas. Os autores avaliaram a acurácia do diagnósti-
co clínico de faringite usando como referência a dosagem de PCR e a contagem de leucócitos nas duas fases do estudo.13 Outro estudo também utilizou PCR como ferramenta auxiliar no diagnóstico de rinossinusite bacteriana aguda e na prescrição de antibióticos.14 Apenas um estudo avaliou a concordância entre generalistas e especialistas (pediatras e otorrinolaringologistas) por meio de questionário padronizado no manejo de crianças com amigdalite recorrente. Verificou-se discordância entre os sinais e sintomas avaliados pelos otorrinolaringologistas e generalistas no diagnóstico de amigdalite, faringite ou infecção do trato respiratório superior.15 Infecções das vias aéreas inferiores Não foram encontrados estudos que avaliassem a concordância ou comparassem os diagnósticos e condutas de médicos generalistas e de especialistas para infecções das vias aéreas inferiores. Os poucos estudos encontrados compararam os diagnósticos dos generalistas com um exame de referência e estão agrupados na Tabela 1.11
Artigos recuperados pela estratégia de busca: n = 3.913
Artigos repetidos: n = 117
Artigos excluídos após leitura do título: Infecções respiratórias = 1.128 Asma = 1.124 DPOC = 723 Tuberculose = 529
Artigos excluídos após leitura do resumo: Infecções respiratórias = 26 Asma = 50 DPOC = 49 Tuberculose = 21
Artigos excluídos após leitura do artigo: Infecções respiratórias = 28 Asma = 38 DPOC = 42 Tuberculose = 8
Artigos selecionados para o estudo: n = 30
Figura 2 Fluxograma da seleção de artigos segundo os critérios adotados na revisão.
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inferiores
IRA Vias
Superiores
IRA Vias
11
15
14
13
prescrevem menos antibióticos
Dinamarca
gistas sobre a conduta entre crianças com amigdalite
sinais, sintomas, VHS e PCR para pneumonia
al., 2002,
Holanda
Avaliar o valor diagnóstico dos
recorrente
médicos
pediatras e otorrinolaringolo-
Unido
Hopstaken et
respondido pelos
médicos generalistas,
2001, Reino
tórax
Radiografia de
validado previamente,
Avaliar concordância entre
Questionário não
PCR
sangue
de leucócitos no
PCR e contagem
referência
Método de
Capper et al.,
generalistas que não usam
para sinusite que os
usam PCR em sua prática
2004,
Bjerrum et al., Avaliar se os generalistas que
melhora a acurácia do diagnóstico de faringite
Alemanha
Avaliar se a medida de PCR
Objetivo principal
1999,
Gulich et al.,
país
Ref. Autor, ano,
Transversal
Transversal
Transversal
Transversal
Delineamento
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC
52
246; 18-89;
Não se aplica
40
1.444; 31-53;
16-75; 34,3
2ª fase 161;
1ª fase 179,
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
25
gologistas
otorrinolarin-
pediatras, 42
tas, 57
generalis-
71 médicos
367
2ª fase 14
1ª fase 15
médicos
N. de
(continua)
receberam prescrição desnecessária de antibióticos
com diagnóstico provável de bronquite aguda, que
poderiam ter sido evitadas em 80 (41%) pacientes
pacientes. Os autores concluíram que as prescrições
Antibióticos foram prescritos em 193 (78,4%)
pacientes, usando apenas o exame clínico.
Generalistas diagnosticaram pneumonia em 21
radiografia compatível com pneumonia.
Dos 246 pacientes incluídos, 32 (13%) tinham
amigdalite e indicação de amigdalectomia
e otorrinolaringologistas sobre o diagnóstico da
Pequena concordância entre generalistas, pediatras
antibióticos para sinusite
PCR tiveram forte influência sobre a prescrição de
20% menos antibióticos. A solicitação e o nível de
Os médicos que solicitaram o exame prescreveram
0,68)
contagem de leucócitos (área sob a curva = 0,85 vs.
que o valor diagnóstico da PCR foi melhor do que a
tinham acesso aos exames. A curva ROC mostrou
Melhora da acurácia de 70% para 81% quando
Resultados
São José BP et al.
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Tuberculose
inferiores
superiores e
IRA Vias
19
18
17
16
12
profissionais
especialistas em pneumologia sobre diagnóstico e
Turquia
tuberculose por clínicos generalistas de unidades de
al., 2008,
Omã
e práticas de generalistas
e práticas de médicos do sistema privado
Avaliar conhecimento, atitudes
Singla et al.,
1998, Índia
do Sul
Avaliar conhecimento, atitudes
Hong et al.,
1995, Coreia
saúde públicas e privadas
Avaliar a suspeição de
Al-Maniri et
tratamento de tuberculose
preenchido pelos
médicos generalistas e
questionário
Respostas a
questionário
Respostas a
casos clínicos
relacionado a 5
Questionário
questionário
Avaliar o conhecimento de
Análise de
PCT
referência
Método de
Cirit et al.,
em relação à guiada por PCT
Avaliar a abordagem habitual
Objetivo principal
2003,
2008, Suíça
Briel et al.,
país
Ref. Autor, ano,
Transversal
Transversal
Transversal
Transversal
203
Não se aplica
Não se aplica
Não se aplica
204
923
257
regular (continua)
contatos e 39 (19,5%) orientam o tratamento
para diagnóstico. Apenas 66 (18%) investigam
(12%) dos generalistas solicitam BAAR de escarro
Na suspeita de casos de tuberculose, apenas 22
recomendados e 16%, regimes inaceitáveis
de 73% estavam usando regimes de tratamento não
acordo com as orientações governamentais. Mais
tuberculose ativa, apenas 11% prescreviam de
tratamento. Para o tratamento inicial de
consideram no monitoramento da resposta ao
essencial na busca do diagnóstico e 75% não o
Mais de 50% não consideram o exame de escarro
privadas (27,3% vs. 53,4%, p=0,001)
de suspeição melhor em relação aos de unidades
os generalistas de unidades públicas tiveram grau
O índice de suspeição geral foi de apenas 37,7% e
da infecção e conduta em casos de resistência
combinação de drogas para tratamento, duração
primária. As principais diferenças foram entre
entre especialistas e generalistas da atenção
diagnóstico e tratamento de casos de tuberculose
Diferença significativa sobre o conhecimento do
grupo
prescreveu 72% menos antibióticos do que o outro
relação à avaliação clínica, o grupo que a utilizou
médicos generalistas como fator discriminante em
resultado da PCT. Quando a PCT foi usada pelos
randomizados em um grupo de cuidados habituais
médicos, necessitavam de antibióticos foram
Os 458 pacientes com IRA que, na opinião dos
Resultados
e em um grupo cujos cuidados eram guiados pelo
Não se aplica
53
médicos
N. de
zado
48
458; 33-63;
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
randomi-
clínico
Ensaio
Delineamento
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
Acurácia diagnóstica das doenças respiratórias em unidades primárias de saúde
607
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Asma
10
9
21
20
de asma era causada pelo subdiagnóstico nos cuidados
Suécia
diagnóstico e o possível subdiagnóstico de asma
1994,
Estados
com espirometria
Austrália
Descrever a epidemiologia do
clínico de asma por generalista
Hahn et al.,
Comparar o diagnóstico
3.422; ≥ 18
questionário
Respostas a um
Transversal
etárias; 15
as faixas
14.127; todas
relato
anos; sem
Não
59
informado
asma (subdiagnóstico) (continua)
tinham sibilância não tinham diagnóstico prévio de
asma. O estudo revelou que 6,5% dos pacientes que
10,3% relataram ter diagnóstico médico prévio de
questionário de forma adequada. Desse total,
Da amostra total, 13.542 (95,5%) responderam ao
(19,2%) não tinham diagnóstico anterior de asma
diagnosticado com asma pela espirometria, 56
critérios espirométricos. Assim, do grupo
foram definidos como portadores de asma por
(2,3%) não tinham conhecimento do diagnóstico e
diagnóstico de asma prévio autorrelatado e 56
espirométricos. Desse total, 236 (9,3%) tinham
292 (11,6%) tinham asma pelos critérios
concordaram em participar da avaliação clínica e
Dos 3.422 indivíduos entrevistados, 2.523 (74%)
dos pacientes foram considerados asmáticos pelos generalistas sem que realmente tivessem a doença
primários
2003,
0,99-1,00). Esses resultados indicaram que 23,5%
(76,5%); a sensibilidade foi de 0,59 (IC 95%
diagnóstico de asma foi validado em 52 casos
foram reavaliados por pneumologistas. O
99 pacientes receberam o diagnóstico de asma e
generalistas nos cuidados
Adams et al.,
Unidos
100
0,31-0,81) e a especificidade, de 0,99 (IC 95%
Transversal
relato
anos; sem
3.025; ≥ 18
validade do primeiro
Espirometria
pneumologia
especialista em
Avaliação de
diagnóstica
em caso de dúvida
broncoprovocação
tinham asma, 6 (7%) associação asma-DPOC e 29 (34%) não tinham asma
e foram convidados para nova consulta. Destes, 86 (70%) atenderam ao convite. Ao final, 51/86 (59%)
123 pacientes completaram os critérios de inclusão
Resultados
relato
6
médicos
N. de
anos; sem
123; > 18
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
teste de
Transversal
Transversal
Delineamento
espirometria e
alergia,
especialista em
Revisão por
referência
Método de
diagnóstico de asma por
primários. Avaliar também a
Avaliar se a baixa prevalência
segundo generalistas
et al., 2002,
de diagnósticos para asma
al., 1999,
Suécia
Montnémery
Estimar a frequência de erros
Objetivo principal
Marklund et
país
Ref. Autor, ano,
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
São José BP et al.
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23
DPOC
27
26
24
22
Asma
fluxo aéreo de acordo com
Holanda
Respostas a um
1.144; 40-80;
56
preditivo positivo do diagnóstico de DPOC nos
diagnóstico segundo o Gold
compatível com DPOC, ou seja, nesse estudo houve
primária com espirometria
pacientes eram tratados desnecessariamente
cerca de 40% de sobrediagnóstico e muitos (continua)
aceitaram participar realizando uma espirometria. Desses, 257 (57,8%) possuíam espirometria
generalistas da atenção
Austrália
Dos 1.144 pacientes identificados, 445 (38,9%)
clínico de DPOC de
65
Comparar o diagnóstico
Zwar et al.,
2011,
para pacientes referenciados para teste diagnóstico
referenciados para avaliação de gravidade e 0,56
cuidados primários foi de 0,62 para pacientes
possuíam obstrução de fluxo aéreo e possível DPOC segundo os critérios do Gold estádio 2. O valor
espirométricos para o
Transversal
espirometria normal. Os restantes 302/503 (60%)
pacientes com critérios
Espirometria
gravidade da doença, 141 (28%) tiveram
clínico e foram encaminhados para avaliação da
Dos 503 pacientes que possuíam diagnóstico
detectado previamente
(29,9%) possuíam um padrão obstrutivo não
possuíam espirometria aceitável e reprodutível, 201
Dentre os 702 pacientes que responderam e
possuíam diagnóstico prévio
um questionário e espirometria, apenas 34 (18,6%)
diagnósticos de DPOC se basearam em resposta a
Dos 183 (9,3% do total) pacientes cujos
suspeita de DPOC nos
informado
Não é
informado
Não é
2
cuidados primários de
define; 63,8
677; não
50
3.985; 40-65;
56,7
2.250; 40-93;
de fato, asmático
um paciente com o diagnóstico no prontuário seja,
autores concluíram que há chance de 89,4% de que
acordo com a revisão de seus prontuários. Os
(190/260) foram considerados asmáticos de
Unido
Transversal
Transversal
Transversal
sintomas de hiper-reatividade brônquica; dentre aqueles sem hiper-reatividade brônquica, 73,1%
os que responderam, 60,5% (399/659) tinham
A taxa de resposta foi de 79,1% (659/833). Dentre
Resultados
e 831 controles;
8
médicos
N. de
16-55; 34,3
833 pacientes
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
diagnóstico clínico ou da
Espirometria
espirometria
questionário e
Respostas a um
espirometria
questionário e
Transversal
Delineamento
2009, Reino
Roberts et al., Definir o valor preditivo do
critérios do Gold
subdetecção da obstrução de
2005,
unidades primárias
Polônia Determinar a prevalência da
gravidade de DPOC em
Geijer et al.,
Investigar a prevalência e a
al., 2008,
por pacientes
idade na atenção primária
Bednarek et
autorrespondido
pacientes de 16 a 55 anos de
Unido
questionário
sobrediagnóstico de asma em
2004, Reino
Análise de
referência
Método de
Avaliar o sub e o
Objetivo principal
Ward et al.,
país
Ref. Autor, ano,
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
Acurácia diagnóstica das doenças respiratórias em unidades primárias de saúde
609
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DPOC
Asma e
DPOC
32
31
30
29
28
Objetivo principal
primárias
Não é
espirometria, 94 (66%) possuíam diagnósticos
Dos 142 (44,9%) pacientes que realizaram
risco para DPOC e determinar
Não é
aplicado pela enfermagem
clínica no diagnóstico de doenças das vias aéreas
Unido
Espirometria e questionário
espirometria e a avaliação
2003, Reino
Transversal
espirométricos para DPOC segundo Gold 2, VEF1/
Pearson et al., Analisar o impacto da
Desses, 208 (20,7%) possuíam critérios
66,7
61.191; ≥ 40;
1.003
em 14% de DPOC e 63% de outras condições (continua)
com mudança em 54% dos diagnósticos de asma,
A avaliação mostrou diagnósticos indevidos de base
possuíam diagnóstico prévio de DPOC
CVF < 0,70 e VEF1 < 0,80). Apenas 67 (32,7%)
espirometria e responderam a um questionário.
tabagismo
informado
anos de idade com história de
60
Canadá
avaliação clínica
em pacientes maiores de 40
2010,
Dos 1.459 pacientes elegíveis, 1.003 realizaram
Medir a prevalência de DPOC
Hill et al.,
tabagismo atual ou pregresso
associadas com solicitação de espirometria que
espirometria 1.459; ≥ 40;
segundo os mesmos critérios. Verificou-se também que tosse crônica ou dispneia estavam mais
DPOC em pacientes com
pacientes identificados com DPOC, 93 (58,5%) se
a acurácia diagnóstica de
Transversal
diagnóstico de DPOC, 93 (25,7%) possuíam DPOC
primária com aumento do
Unidos
Espirometria e
enquadravam nos critérios do Gold. Dos 362 sem
espirometria na atenção
Um total de 1.052 pacientes foram identificados e 527 (50%) tinham uma espirometria. Dos 159
Estados
informado
associadas ao uso da
57
Examinar as características
falso-positivos
diagnosticados pelos generalistas, e 21 eram
DPOC pela espirometria e não foram
(34%) restantes eram discordantes: 27 tinham
Joo et al.,
1.052; ≥ 35;
34
diagnósticos foram constatados
diagnóstico confirmado. Em 31% dos casos, erros
realizaram espirometria e 234 (69%) tiveram o
Dos 1.200 pacientes identificados, 341 (58%)
Resultados
com DPOC confirmada e 85 sem DPOC. Os 48
anos; 46,8
350; ≥ 15
31
médicos
N. de
diagnóstico de DPOC
Coorte
Transversal
informa; 65
1.200; não
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
concordantes com os generalistas (kappa = 0,55): 9
Espirometria
Espirometria
Transversal
Delineamento
primária em relação ao
generalista da atenção
Espirometria
referência
Método de
2011,
2006, Brasil
Hamers et al., Avaliar a competência de
de DPOC em unidades
2011,
Austrália
Walters et al., Avaliar os erros de diagnóstico
país
Ref. Autor, ano,
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
São José BP et al.
610Rev Assoc Med Bras 2014; 60(6):603-616
12/2/14 9:10 PM
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DPOC
Asma e
Rev Assoc Med Bras 2014; 60(6):603-616
36
35
34
33
1.449
possuíam uma doença mista, mas não diferenciou
generalistas 9.931; ≥ 18;
espirometria ajudou a confirmar pacientes que
nos diagnósticos de
Transversal
com o diagnóstico espirométrico foi de 0,50. A
da espirometria se enquadram
DPOC
diagnóstico prévio de asma ou
em pacientes com o
especialistas em pneumologia
atenção primária e
pneumologia
interpretação da espirometria e PFE entre generalistas da
al., 2006,
Reino Unido
informado
informado
anos; não
102; ≥ 45
DPOC
faixas etárias;
623; todas as não
Coorte
Transversal
Suécia de asma e Especialistas em
com asma e DPOC
Suécia
nacionais da
Diretrizes
Avaliar as diferenças na
atenção primária em pacientes
Raghunath et
Avaliar adesão às diretrizes na
al., 2009,
informado
Não é
informado
Não é
pacientes com mais de 40 anos de idade com
atenção primária
Weidinger et
tinham diagnósticos não identificáveis. Dos
de exames foi de 0,20
(continua)
generalistas e dos especialistas (kappa) na avaliação
A concordância entre os diagnósticos dos
DPOC
(28%) dos pacientes com diagnóstico inicial de
pacientes com diagnóstico inicial de asma e 35/124
A adesão foi encontrada em 130/499 (26%) dos
critérios do Gold
(50,9%), apenas 13,9% se enquadravam nos
diagnósticos de DPOC e que tinham espirometria
(42,8%) tinham diagnóstico de DPOC e 1.389
medicações inalatórias na
Espanha
4.188 (42,9%) tinham diagnóstico de asma, 4.175
de pacientes que receberam
al., 2010,
58,3
Analisar a acurácia diagnóstica
Izquierdo et
asma de DPOC em todos os casos
foram confirmados em 17,1%. A concordância kappa entre o diagnóstico de DPOC do prontuário
e descrever como os resultados
espirometria e de acordo com os critérios Gold em
Os diagnósticos de DPOC foram confirmados por
Resultados
DPOC nos cuidados primários
Espirometria
informado
Não é
médicos
N. de
68,1% dos pacientes, e os diagnósticos de asma
367; ≥ 40; 62
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
pulmonar em pacientes
Transversal
Delineamento
diagnosticados com asma ou
Espirometria
referência
Método de
Noruega
Descrever sintomas e função
Objetivo principal
2011,
Melbye et al.,
país
Ref. Autor, ano,
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
Acurácia diagnóstica das doenças respiratórias em unidades primárias de saúde
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39
38
37
Transversal
353; ≥ 50; 63
73
experiente e um especialista em pneumologia
de asma ou DPOC em pessoas com mais de 50 anos de idade que consultam seu generalista com tosse persistente
et al., 2010,
Holanda
generalista
Determinar qual a frequência
Broekhuizen
centro de referência
influencia o diagnóstico do
suas hipóteses diagnósticas
os generalistas justifiquem
generalistas e se fazer com que
previamente realizados pelos generalistas assistentes
eram novos, ou seja, não foram diagnósticos
de doença mista. Ressalta-se que esses diagnósticos
diagnóstico de DPOC, 7% de asma e 4% diagnóstico
médicos, concluiu-se que 29% dos pacientes tinham
discussão dos dados clínicos em um painel de dois
Após avaliação dos exames de função pulmonar e da
especialistas provocam
Painel de um
generalistas não influenciaram os resultados
se as avaliações pelos mudança nos diagnósticos dos
frequentemente (62%) que as de DPOC (40%). As justificativas sobre as hipóteses diagnósticas dos
diagnósticas de asma e DPOC,
confirmadas pelo serviço especializado. As hipóteses sobre asma foram confirmadas mais
pneumologia
justificar suas hipóteses
Apenas 50% das hipóteses diagnósticas foram
estavam incorretos (161/445; 36%)
dos diagnósticos sugeridos pelos generalistas
causa mais comum (445/666; 66,8%); mais de 1/3
Dos 1.156 pacientes referenciados, DPOC foi a
Resultados
generalistas usam para
17
28
médicos
N. de
Holanda
284; 2-88; 51
etárias; 61,3
as faixas
1.156; todas
idade média
faixa etária;
pacientes;
N. de
2012,
Transversal
Transversal
Delineamento
Avaliar quais critérios os
Especialistas em
pneumologia
Especialistas em
referência
Método de
Lucas et al.,
generalistas
encaminhamentos de
diagnósticos dos
meio da revisão dos
uma unidade de referência em condições respiratórias por
Unido
Verificar o funcionamento de
2012, Reino
Starren et al.,
Objetivo principal
Ref.: referência; PCR: proteína C-reativa; ROC: receiver operating characteristics; VHS: velocidade de hemossedimentação; PCT: procalcitonina; BAAR: bacilo álcool-ácido-resistente; Gold: Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease; VEF1: volume expiratório forçado no primeiro segundo; CVF: capacidade vital forçada; PFE: pico de fluxo expiratório; IRA: infecção aguda das vias aéreas; Ivas: infecções de vias aéreas superiores.
DPOC
Asma e
país
Ref. Autor, ano,
Tabela 1 Sinopse dos artigos referentes a IRA, tuberculose, asma, DPOC e asma + DPOC (continuação)
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Tuberculose pulmonar Foram encontrados poucos estudos sobre tuberculose que preenchiam os critérios de inclusão (Tabela 1). Apenas um relatou grau de suspeição de diagnóstico ou conhecimento de generalistas e de especialistas, ainda que fora do desfecho principal do artigo e sem avaliação direta,16 enquanto os demais estudos avaliaram apenas conhecimento ou grau de suspeição de tuberculose por parte dos médicos generalistas.17-19 Asma No caso da asma, apenas dois estudos avaliaram a habilidade diagnóstica de médicos generalistas por meio de uma reavaliação posterior feita por especialistas (Tabela 1).20,21 O primeiro, realizado na Suécia em 1994, incluiu pacientes com idade superior a 18 anos que visitaram seus generalistas em APS selecionadas e verificou a frequência dos erros quanto ao diagnóstico de asma. Os pacientes com esse diagnóstico firmado nos prontuários médicos foram convidados para serem examinados por alergologistas. Os diagnósticos eram discutidos por um grupo que incluía, além destes últimos, um generalista e uma enfermeira. Cento e vinte e três pacientes cumpriram os critérios de inclusão e foram convidados para nova consulta. Destes, 86 (70%) atenderam ao convite. Ao final, 51/86 (59%) tiveram o diagnóstico de asma confirmado, 6 (7%) foram diagnosticados com associação asma-DPOC e 29 (34%) não tinham asma, ou seja, foram diagnosticados erroneamente.20 O segundo, também realizado na Suécia, investigou se o baixo registro do diagnóstico de asma se devia ao subdiagnóstico na APS e avaliou também a validade do primeiro diagnóstico de asma por generalistas. Durante 3 meses, em 1997, todos os pacientes que buscaram atendimento médico nas unidades da APS do distrito de Lund com infecção de vias aéreas superiores ou inferiores, tosse prolongada, rinite alérgica, dispneia ou um primeiro diagnóstico positivo de asma foram registrados (n=3.025). Noventa e nove receberam o diagnóstico de asma e foram reavaliados por pneumologistas. Os resultados indicaram que 23,5% dos pacientes foram considerados asmáticos erroneamente pelos generalistas.21 Outros três artigos foram avaliados: um analisou a concordância entre o diagnóstico clínico de asma, feito previamente por um médico generalista, e o resultado da espirometria;9 os outros dois verificaram o subdiagnóstico de asma e usaram como ferramenta de diagnóstico um questionário não validado e sem avaliação clínica especializada ou espirometria.10,22
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Dentre esses cinco estudos selecionados, o sobrediagnóstico variou de 10,6%22 a 34%,20 e o subdiagnóstico variou de 6,5%10 a 19,2%.9 Doença pulmonar obstrutiva crônica Para essa condição, não foram encontrados estudos cujos desfechos principais fossem avaliação de concordância diagnóstica entre médicos da APS e especialistas. Os estudos selecionados, que compararam os diagnósticos feitos por generalistas com os resultados da espirometria, revelaram equívocos, caracterizados tanto pelo subdiagnóstico quanto pelo sobrediagnóstico. Dentre os oito estudos selecionados,23-31 o sobrediagnóstico variou de 28%26 a 40%,23 e o subdiagnóstico variou de 25,7%30 a 81,4%.23 Um estudo realizado no Brasil avaliou a concordância dos diagnósticos realizados por generalistas da atenção primária com aqueles da espirometria de acordo com os critérios estabelecidos pela iniciativa Gold. Dos 142 (44,9%) pacientes que realizaram espirometria, 94 (66%) tinham diagnósticos concordantes com os generalistas (kappa = 0,55), sendo 9 com diagnóstico confirmado e 85 sem DPOC. Os restantes (48; 34%) eram discordantes: 27 tinham DPOC pela espirometria e não foram diagnosticados pelos generalistas e 21 eram falso-positivos. Nesse estudo, as variáveis associadas ao diagnóstico espirométrico de DPOC foram sexo masculino, procedência de área rural, presença de dispneia e tosse, tabagismo atual, idade superior a 55 anos e exposição à fumaça de fogão a lenha.29 Asma e DPOC Os estudos encontrados que avaliaram asma e DPOC conjuntamente são heterogêneos quanto às metodologias empregadas. Dentre os oito estudos recuperados,32-39 a variação de sobrediagnóstico em DPOC foi de 36%37 a 86,1%34 e asma de 38%38 a 74%,35 e a variação de subdiagnóstico em DPOC foi de 14%32 a 29%39 e asma de 7%39 a 54%.32 A maioria partiu da avaliação de banco de dados, seguida de reavaliação dos pacientes, com exceção de um, que partiu de sintomas de pacientes de demanda espontânea a uma unidade primária.39 Como exemplo, o estudo COPD and Asthma Diagnostic/Management Reassessment (Cadre), realizado no Reino Unido, envolveu mais de mil generalistas e incluiu mais de 60 mil pacientes que haviam sido tratados para alguma condição respiratória e que foram reavaliados por meio de questionário padronizado, aplicado por enfermeiros, e de uma espirometria. Em seguida, um generalista experiente avaliava o questionário, a espirometria e elaborava os diagnósticos. Essa nova avaliação mostrou
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diagnósticos de base incorretos, tendo havido aumento de 54% dos diagnósticos de asma, 14% de DPOC e 63% de outras doenças.32 Broekhuizen et al.39 avaliaram pacientes com mais 50 anos de idade com tosse persistente há mais de 14 dias e sem diagnóstico prévio de asma ou DPOC. Após avaliação dos exames de função pulmonar e da discussão dos dados clínicos em um painel de dois médicos, concluiu-se que 29% dos pacientes tinham diagnóstico de DPOC, 7% de asma e 4% diagnóstico de doença sobreposta. Ressalte-se que esses diagnósticos eram novos, ou seja, não havia diagnósticos previamente realizados pelos generalistas assistentes (Tabela 1).39
Discussão Esta ampla revisão da literatura constatou que, a despeito da heterogeneidade metodológica dos estudos encontrados, é baixa a acurácia dos diagnósticos de doenças respiratórias, agudas e crônicas, elaboradas por generalistas nos cuidados primários de saúde. Mesmo os estudos que abordaram as condições separadamente apresentaram diferentes delineamentos e aspectos metodológicos, o que dificultou as interpretações e a elaboração de conclusões. Como exemplo, a imprecisão do diagnóstico de asma variou de 54% de subdiagnóstico a 34% de sobrediagnóstico,20,32 enquanto, na DPOC, houve 81% de subdiagnóstico a 86,1% de sobrediagnóstico.23,34 A heterogeneidade pode ter ocorrido, pelo menos em parte, por não terem sido aleatorizados, pela diversificação da amostragem e das definições de cada doença e das variáveis consideradas na população de cada estudo analisado. Quanto à IRA, a utilização de um exame de auxílio diagnóstico quase sempre redundou em melhora da acurácia diagnóstica e, consequentemente, em diminuição da prescrição de antibióticos.12,14 Em relação à tuberculose, os melhores resultados dos especialistas sobre os generalistas da atenção primária parecem óbvios e naturais, mas, por se tratar de uma condição de interesse da saúde pública nacional e internacional, esperava-se melhor desempenho por parte dos generalistas.16 Os estudos encontrados comprovam o baixo conhecimento sobre tuberculose por generalistas que atuam na atenção primária.18,19
O subdiagnóstico e, consequentemente, o subtratamento podem ter um impacto significativo no aumento da morbidade e mortalidade das doenças respiratórias.40,41 Da mesma maneira, o sobrediagnóstico pode levar a aumento de gastos e possíveis efeitos colaterais relacionados a tratamentos desnecessários. A literatura revisada coloca a figura do médico generalista como ator central no contexto dos erros diagnósticos, seja por falta, seja por excesso. Em ambos os casos, não se pode precisar qual o grau de responsabilidade dos pacientes pelos erros. Também fica difícil precisar qual proporção pode ser definida como erro sistemático, relativo a dificuldades de acesso a exames pelos generalistas, ou erro cognitivo dos médicos – erros decorrentes da interpretação dos sinais e sintomas quando um paciente se apresenta. Em outras palavras, alguns autores interrogam se os erros diagnósticos se devem à interpretação inapropriada dos sinais e sintomas pelo médico ou ao paciente que deixa de expressar seus sintomas ao médico.42-45 Outro ponto a se considerar é que a natureza lenta e progressiva de doenças como asma e DPOC parece levar à percepção diminuída de suas manifestações. Tosse e diminuição da tolerância a exercícios podem ser vistos como fenômenos normais em determinadas faixas etárias. Como resultado, os pacientes não procuram os generalistas e, em uma eventual visita, deixam de relatar esses sintomas aos seus médicos.46 Há cerca de 50 anos, pensava-se que não seria possível aferir a pressão arterial por enfermeiros ou técnicos de enfermagem. Atualmente, reconhece-se a importância desses profissionais nos programas oficiais de controle da pressão arterial. Dessa forma, uma estratégia multiprofissional na detecção de doenças de alta prevalência deve ser posta em prática em oposição às abordagens centradas exclusivamente em especialistas, comuns nos dias atuais.46 Por exemplo, a incorporação de questões simples na rotina dos profissionais da área da saúde, como “O sr(a). fuma? O sr(a). deseja parar de fumar?”, como parte de um programa, poderia aumentar de forma significativa o diagnóstico de DPOC e a efetividade do programa de cessação de tabagismo. Parece incorreto o senso comum de que o contexto da APS seja menos complexo do que aquele de média e alta complexidade. Na APS, situa-se a prática clínica mais ampliada, onde devem ser feitas intervenções de alta complexidade, como aquelas relativas a mudanças de
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comportamentos e estilos de vida em relação à saúde: cessação do hábito de fumar, adoção de comportamentos de alimentação saudável e de atividade física, entre outras. Os níveis de atenção secundário e terciário compõem-se de práticas de maior densidade tecnológica, mas não necessariamente de maior complexidade. Essa visão distorcida de complexidade leva, de forma pontual ou sistemática, políticos, gestores, profissionais de saúde e população como um todo, a uma supervalorização das práticas que são realizadas nos níveis secundário e terciário de atenção à saúde e, por consequência, a uma banalização da APS.47 Nos casos das doenças mais prevalentes e de maior interesse da gestão da saúde pública, espera-se que os médicos das APS obtenham altos índices de detecção, no mínimo maiores níveis de sensibilidade, considerando-se que eles estão na linha de frente da atenção médica, em que a falta do diagnóstico implicará aumento da morbidade ou da ocorrência de complicações agudas e crônicas. Aos especialistas caberia o papel de auxiliar no diagnóstico e seguimento de casos mais complexos. O processo de detecção deve ser, prioritariamente, de responsabilidade da atenção primária, o que pressupõe capacitação adequada do generalista e implementação de um programa horizontal de atenção, incluindo a disponibilização dos medicamentos e dos exames subsidiários aos diagnósticos, para que as doenças respiratórias sejam identificadas e tratadas em fase precoce. Esta revisão apresenta algumas limitações que devem ser ressaltadas. Alguns estudos sobre IRA compararam apenas prescrições de antibióticos e não verificaram a qualidade ou a acurácia do diagnóstico.11,12,14 Outros avaliaram a acurácia como desfecho secundário.15 As diferenças metodológicas dentro de um mesmo grupo podem ter comprometido, pelo menos em parte, esses resultados. Várias diferenças podem ser destacadas, desde os critérios de inclusão – revisões de banco de dados ou de demanda espontânea, idade, história de tabagismo –, passando por definição de diagnóstico de DPOC, sendo que alguns usaram o critério Gold 1 (VEF1/CVF < 70), outros Gold 2 (VEF1/CVF < 70 e VEF1 < 80%) e, em outros, os critérios não foram claramente definidos. Outra limitação a ser citada é a extração dos dados por apenas um pesquisador, o que pode ter afetado a reprodutibilidade dos resultados.
Conclusão Os resultados comprovam, de maneira geral, que há erros diagnósticos, e o nível de conhecimento das doenças respiratórias pelos generalistas em vários países é inferior ao desejado. Para a melhor compreensão da realidade da assistência médica na APS, novos estudos com metodologias mais bem definidas quanto aos critérios de inclusão e ferramentas de avaliação deverão ser realizados. Seus resultados poderão sustentar a adoção de políticas consistentes para aprimoramento da assistência à saúde como um todo.
Summary Diagnostic accuracy of respiratory diseases in primary health units Respiratory diseases are responsible for about a fifth of all deaths worldwide and its prevalence reaches 15% of the world population. Primary health care (PHC) is the gateway to the health system, and is expected to resolve up to 85% of health problems in general. Moreover, little is known about the diagnostic ability of general practitioners (GP) in relation to respiratory diseases in PHC. This review aims to evaluate the diagnostic ability of GP working in PHC in relation to more prevalent respiratory diseases, such as acute respiratory infections (ARI), tuberculosis, asthma and chronic obstructive pulmonary disease (COPD). 3,913 articles were retrieved that summed to 30 after application of inclusion and exclusion criteria. They demonstrated the lack of consistent evidence on the accuracy of diagnoses of respiratory diseases by generalists. Regarding asthma and COPD, studies show diagnostic errors leading to overdiagnosis or underdiagnosis depending on the methodology used. For example, the lack of precision for the diagnosis of asthma varied from 54% underdiagnosis to 34% overdiagnosis, whereas for COPD it ranged from 81% underdiagnosis to 86.1% overdiagnosis. As for the ARI, it was found that the inclusion of a complementary test for diagnosis led to an improvement in diagnostic accuracy. Studies show a low level of knowledge about tuberculosis by the generalist. According to this review, PHC represented by its GP needs to improve its ability for the diagnosis and management of this group of patients that are one of their main demands. Keywords: respiratory tract diseases, primary health care, diagnosis, general practitioners, review.
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