Adaptação ao 1º ano do ensino superior privado: retrato psicológico numa instituição

September 12, 2017 | Autor: A. Revista Interd... | Categoria: Psicología, Saúde, Salud, Ensino Superior, Psicologia
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Adaptação ao 1º ano do ensino superior privado: retrato psicológico numa instituição Isabel Silva Rute F. Meneses Faculdade de Ciências Humanas e Sociais / Centro de Estudos Culturais, da Linguagem e do Comportamento – Universidade Fernando Pessoa (Portugal)

Objectivos: Pretendeu-se: descrever a adaptação de estudantes universitários do 1º ano, a sua percepção de saúde, transição de saúde, afectos positivo e negativo; e analisar a existência de diferenças nestes indicadores psicológicos entre alunos deslocados e não deslocados. Enquadramento teórico: A entrada na Universidade, uma das mudanças de vida mais esperadas pelos estudantes, constitui um importante desafio desenvolvimental. Muitas das expectativas em relação a esta nova experiência são extremamente positivas, mas raramente satisfeitas, e, para além disso, existem várias exigências de natureza pessoal, académica, vocacional, social, económica, entre outras, associadas. Assim, a entrada na Universidade pode constituir o ponto de partida para uma trajectória mais ou menos (in)adaptativa neste período de desenvolvimento. Como quanto mais tempo um indivíduo continuar num percurso inadaptativo, mais difícil é retomar ou recuperar o funcionamento a um nível adaptativo, urge o diagnóstico de situações de inadaptação e consequente intervenção logo nesta fase inicial de entrada na Universidade (promoção da saúde). Metodologia: Foram estudados 82 alunos do 1º ano do 1º Ciclo de Medicina Dentária (adaptado a Bolonha; amostra de conveniência); 72,7% do sexo feminino; 56,1% deslocados; com idades entre 17 e 46 anos (M=20,11; DP=5,07). Os alunos responderam ao Questionário de Vivências Académicas (QVA-r), a dois itens de percepção de saúde e de transição de saúde e à Positive and Negative Affect Schedule (PANAS). Resultados/Conclusão: Os alunos apresentavam uma adaptação razoável nas dimensões Interpessoal e Carreira, ainda que existissem algumas dificuldades nas dimensões Estudo/Curso, Institucional e Pessoal; uma percepção de saúde e transição de saúde positivas; e afecto positivo frequente; não havendo diferenças estatisticamente significativas em função da residência. Segundo os indicadores utilizados, os estudantes avaliados não careciam de especial atenção, ainda que pudessem beneficiar de intervenção, particularmente ao nível do Estudo/Curso, Institucional e Pessoal (não/deslocados). Objectives: This study aims: to describe the adaptation of 1st year university students, their health status and health transition perceptions, and positive and negative affects; and to examine the existence of differences in these psychological indicators between displaced and not displaced students. Theoretical background: Being an university student, one of the students’ most expected life changes, constitutes an important developmental challenge. Although expectations concerning this new experience are very positive, they are rarely fulfilled, and, moreover, there are several personal, academic, vocational, social, economic, and other demands associated. Thus, this new experience can be the starting point for a more or less (mal)adaptive period of development. As the longer a person continues in a maladaptive path, the harder it is to recover a level of adaptive functioning, early diagnosis and intervention are urgent. Methods: We studied a convenience sample consisting of 82 students in the 1st year of the 1st cycle of Dental Medicine, 72.7% female, 56.1% being displaced students, aged between 17 and 46 years of age (M=20.11, SD=5.07). Students answered to the AGIR - Revista Interdisciplinar de Ciências Sociais e Humanas. Ano 1, Vol. 1, n.º 4, out 2013

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Academic Experiences Questionnaire (QVA-r), to two items of health status and health transition perceptions, and to the Positive and Negative Affect Schedule (PANAS). Results/Conclusion: Students reported a reasonable adaptation concerning Interpersonal and Career dimensions, although they also reported some difficulties in the Study/Course, Institutional, and Personal dimensions. Students not only presented positive health status and health transition perceptions, but they also reported frequent positive affect. There were no statistically significant differences between displaced and not displaced students in psychological scores. According to the scores used, the sample had no special needs, even though (displaced and not displaced) students could benefit from intervention, specially focusing on Study/Course, Institutional, and Personal dimensions. Palavras-chave: Adaptação; Ensino Superior; Afecto; Saúde. Key words: Adaptation; University; Affect; Health.

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1. INTRODUÇÃO A entrada na Universidade, uma das mudanças de vida mais esperadas pelos estudantes (Fernandes, Maia, Meireles, Rios, Silva e Feixas, 2005), constitui um importante desafio desenvolvimental para os alunos recém-chegados. Muitas das expectativas em relação a esta nova experiência são extremamente positivas, mas raramente satisfeitas, e, para além disso, existem várias exigências de natureza pessoal, académica, vocacional, social, económica, entre outras, associadas a esta entrada no Ensino Superior (Fernandes et al., 2005; Fernandes e Almeida, 2005). De acordo com Soares (2000, p.14), “no decurso do desenvolvimento, a adversidade constitui um desafio especialmente crítico, pondo em jogo processos de risco e pondo à prova a resiliência do indivíduo através de mecanismos protectores”. Assim, a entrada na Universidade pode constituir o ponto de partida para uma trajectória mais ou menos (in)adaptativa neste período de desenvolvimento. Como quanto mais tempo um indivíduo continuar num percurso inadaptativo, mais difícil é retomar ou recuperar o funcionamento a um nível adaptativo (Soares, 2000), urge o diagnóstico de situações de inadaptação e consequente intervenção psicossocial logo nesta fase inicial de entrada na Universidade. De acordo com Almeida (2001), os alunos do 1º ano podem apresentar dificuldades de adaptação ao Ensino Superior por razões relacionadas com o próprio estudante, relacionadas com a instituição, com o curso, etc. A nível individual estas dificuldades podem surgir porque a entrada na Universidade muitas vezes representa o afastamento de relações securizantes da infância (família, amigos) e a necessidade de estabelecer novas relações interpessoais. Para além disso, o período inicial de entrada no Ensino Superior pode ser acompanhado por sintomas de ansiedade, depressão, mal-estar ou solidão. Almeida (2001) acrescenta também que a praxe académica, que até poderá representar para alguns alunos uma forma de integração e socialização, dificulta a integração de muitos alunos. Para além disso, o 1º ano do Ensino Superior representa AGIR - Revista Interdisciplinar de Ciências Sociais e Humanas. Ano 1, Vol. 1, n.º 4, out 2013

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uma ruptura com as formas de organização do processo de ensino-aprendizagem adoptadas nos níveis de ensino anteriores, com maior autonomia e responsabilização dos alunos, bem como o confronto com unidades curriculares básicas (geralmente sem uma relação directa com a profissão almejada) (Almeida, 2001). Santos (2001), a partir da revisão da literatura por si efectuada, concluiu que, quando os níveis de desafio provocados pela transição para o ensino superior são percepcionados como demasiado elevados, geram problemas a nível académico (incluindo ao nível do sucesso escolar), pessoal e social, bem como ao nível da identidade e do desenvolvimento vocacional do estudante. Alguns estudos realizados em Portugal sugerem que a fase de transição para o Ensino Superior poderá constituir uma fase de crise nos recursos pessoais dos estudantes, recursos esses que são fundamentais para a manutenção do seu equilíbrio psicológico (Fernandes, et al., 2005). A investigação realizada com alunos portugueses sugere, ainda, que uma elevada percentagem de estudantes apresenta dificuldades na resolução de problemas de vida em geral, bem como sugere a existência de uma correlação negativa e altamente significativa entre a presença de sintomatologia psicopatológica e as competências de resolução de problemas em alunos recém-entrados na Universidade (Fernandes et al., 2005). O presente estudo exploratório, de natureza transversal, pretendeu descrever a adaptação dos estudantes universitários do 1º ano de uma instituição de Ensino Superior privada, assim como a sua percepção de saúde, de transição de saúde, afectos positivo e negativo. Para além disso, pretendeu também analisar se existem diferenças ao nível destes indicadores psicológicos entre alunos deslocados e não deslocados.

2. MÉTODO 2.1 PARTICIPANTES Foi estudada uma amostra de conveniência constituída por 82 alunos do 1º ano do 1º Ciclo de Medicina Dentária (adaptado a Bolonha); 72,7% do sexo feminino; sendo

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56,1% alunos deslocados; com idades compreendidas entre 17 e 46 anos de idade (M=20,11; DP=5,07).

2.2 MATERIAL Foram administrados os seguintes instrumentos de avaliação: - Questionário de Vivências Académicas (QVA-r): este instrumento foi desenvolvido a partir do Questionário de Vivências Académicas (QVA) (Ferreira e Almeida, 1997), constituindo uma versão reduzida deste. Trata-se de um questionário de auto-relato que procura avaliar a forma como os jovens se adaptam a algumas das exigências da vida académica mais referenciadas na bibliografia. O QVA-r é constituído por 60 itens redistribuídos numa estrutura de cinco dimensões (Almeida, Ferreira e Soares, 1999): (1) a dimensão Pessoal, que inclui itens essencialmente associados ao self e às percepções de bem-estar físico e psicológico por parte do estudante; (2) a dimensão Interpessoal, que avalia o relacionamento com os pares e o estabelecimento de relações mais íntimas, assim como questões relacionadas com o envolvimento em actividades extracurriculares; (3) a dimensão Curso-Carreira, que inclui itens que avaliam a adaptação ao curso, as aprendizagens no curso e as perspectivas de carreira; (4) a dimensão Estudo, cujos itens avaliam as competências de estudo do aluno, os hábitos de trabalho, a gestão do tempo, a utilização da biblioteca e de outros recursos de aprendizagem; (5) e a dimensão Institucional, que avalia domínios como o interesse pela instituição, o desejo de nela prosseguir os seus estudos, o conhecimento e a percepção da qualidade dos serviços e estruturas existentes. Os resultados são interpretados seguindo a lógica de que quanto mais elevado for o valor obtido em cada subescala, melhor é a adaptação ao Ensino Superior. O QVA-r demonstrou propriedades psicométricas aceitáveis (Almeida et al., 1999); - Itens de percepção de saúde e de transição de saúde: estes dois itens foram retirados da versão portuguesa do SF-36 versão 1.0 (Ribeiro, 2005) - um pretende avaliar a forma como a pessoa percebe a sua saúde ao longo do último mês (item 1 do SF-36), apresentando 5 opções de resposta tipo Likert, sendo que quanto mais elevado o valor AGIR - Revista Interdisciplinar de Ciências Sociais e Humanas. Ano 1, Vol. 1, n.º 4, out 2013

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obtido, melhor é a percepção de saúde; e, o outro item, pretende avaliar a percepção de saúde actual comparativamente com o que acontecia há um ano atrás (item 2 do SF-36), apresentando também 5 opções de resposta tipo Likert, mas com interpretação inversa, isto é, quanto maior o valor obtido, pior a percepção de transição de saúde; - Positive Affect and Negative Affect Schedule (PANAS): A PANAS foi desenvolvida por Watson, Clarck e Tellegen, em 1988, com o objectivo de avaliar o afecto positivo e o afecto negativo (Galinha e Pais-Ribeiro, 2005). Este instrumento foi adaptado para a população portuguesa por Galinha e Pais-Ribeiro (2005), sendo esta versão constituída por 20 itens, avaliados numa escala de Likert de 5 pontos – Nada ou muito ligeiramente; Um pouco; Moderadamente; Bastante; Extremamente – e organizados em duas subescalas – Afecto Positivo e Afecto Negativo. Quanto mais elevado o valor obtido em cada uma das duas subescalas, maior o afecto correspondente, sendo o valor mínimo que é possível obter para cada subescala 10 e o máximo 50. Este instrumento revelou boas qualidades psicométricas, nomeadamente boa consistência interna (Galinha e Ribeiro, 2005).

2.3 PROCEDIMENTO Foi solicitada autorização à instituição de Ensino Superior privada para realização do estudo e administração dos instrumentos aos alunos desta instituição. Foi também solicitada autorização aos autores do QVAr e da PANAS para a sua utilização no presente estudo. Os alunos foram avaliados no final do 1º ano do 1º Ciclo do Curso de Medicina Dentária, no contexto de sala de aula, após o seu consentimento livre, informado e esclarecido. Foram assegurados o anonimato e confidencialidade dos dados recolhidos. Os dados foram alvo de análise estatística através do programa informático SPSS. Os valores do QVA-r foram transformados em percentagens, de modo a permitir uma comparação entre as distintas dimensões que este instrumento avalia, uma vez que cada uma delas é constituída por um número diferente de itens.

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3. RESULTADOS A análise dos valores médios sugere que, na dimensão Interpessoal e na dimensão Carreira, os alunos encontram-se razoavelmente adaptados. Por sua vez, nas dimensões Estudo/Curso, Institucional e Pessoal, os alunos que frequentam o 1º ano do 1º ciclo apresentam menor adaptação (Quadro 1). Porém, também se destaca a grande amplitude das respostas em todas das dimensões estudadas. Os resultados sugerem, ainda, que os alunos alvo do presente estudo apresentam um afecto positivo médio acima do ponto médio da escala e um afecto negativo abaixo do ponto médio da escala (Quadro 1). Quadro 1: A adaptação ao Ensino Superior, afecto negativo e afecto positivo – análise descritiva M

DP

Min

Max

Dimensão Interpessoal

67,34 13,46

42,31

98,08

Dimensão Carreira

62,68 18,04

13,46

100

24,62

69,23

Dimensão Estudo/Curso 45,29

9,24

Dimensão Institucional

47,09 10,90

20

67,50

Dimensão Pessoal

49,37 11,98

24,62

73,85

Afecto Negativo

20,63

7,46

10

42

Afecto Positivo

30,50

5,30

19

43

Procedeu-se também a uma análise da percepção de saúde nos jovens inquiridos (Quadro 2) e da transição de saúde (Quadro 3).

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Quadro 2: Percepção de saúde nos participantes – resultados apresentados em percentagem Percepção de saúde – Em geral, como diria que a sua saúde é?

%

Óptima

26,4

Muito Boa

41,7

Boa

30,6

Razoável

1,4



0

A análise do Quadro 2 permite constatar que apenas uma minoria dos alunos avaliados considera ter uma saúde razoável, sendo que a maioria a avalia de forma muito positiva (entre boa e óptima). Quadro 3: Transição de saúde nos participantes – resultados apresentados em percentagem Transição de saúde – Comparado com o que acontecia há um ano, como descreve

%

o seu estado de saúde geral actual? Muito melhor

19,4

Com algumas melhoras

29,2

Aproximadamente igual

41,7

Um pouco pior

8,3

Muito pior

1,4

Por sua vez, a análise do Quadro 3 permite constatar que também apenas para uma minoria de alunos, a saúde piorou no último ano. Assim, de uma forma geral, a percepção de saúde e de evolução desta é positiva entre os inquiridos. A análise dos dados sugere a não existência de diferenças estatisticamente significativas entre estudantes deslocados e não deslocados quanto à adaptação ao Ensino Superior AGIR - Revista Interdisciplinar de Ciências Sociais e Humanas. Ano 1, Vol. 1, n.º 4, out 2013

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quando consideradas as distintas dimensões: Interpessoal, t(63)=-0,45; p>0,05; Carreira, t(64)=0,68; p>0,05; Institucional, t(69)=0,43; p>0,05; Pessoal, t(62)=0,76; p>0,05; Estudo/Curso,

t(66)=1,89;

p>0,05.

Também

não

se

encontraram

diferenças

estatisticamente significativas entre estes dois grupos quanto ao afecto positivo, t(69)=1,64; p>0,05, e ao afecto negativo, t(68)=1,23; p>0,05 (Quadro 4). Quadro 4: Comparação entre alunos deslocados e não deslocados quanto à adaptação à universidade e aos afectos positivo e negativo Alunos não deslocados

Alunos deslocados

(n=33)

(n=46)

M

DP

M

DP

Dimensão Interpessoal

66,07

13,00

67,57

13,38

Dimensão Carreira

63,17

21,80

61,25

15,36

Dimensão Estudo/Curso

47,69

8,92

43,50

9,10

Dimensão Institucional

47,77

9,73

46,63

11,60

Dimensão Pessoal

48,32

12,51

49,23

11,55

Afecto Negativo

19,46

7,02

21,73

7,69

Afecto Positivo

29,19

5,63

31,32

5,15

Finalmente, os resultados do teste Qui-Quadrado revelaram não existir diferenças estatisticamente significativas entre os alunos deslocados e não deslocados quanto à sua percepção de saúde, χ2(6, 72)=3,22; p>0,05, nem quanto à transição de saúde, χ2(8, 72)=4,81; p>0,05 (Quadro 5).

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Quadro 5: Comparação entre alunos deslocados e não deslocados quanto à percepção de saúde e à transição de saúde Alunos não deslocados Alunos deslocados Percepção de saúde Óptima

25,9%

26,2%

Muito Boa

40,7%

40,5%

Boa

29,6%

33,3%

Razoável

3,7%

0%

0%

0%

Muito melhor

14,8%

21,4%

Com algumas melhoras

22,2%

33,3%

Aproximadamente igual

48,1%

38,1%

0%

4,8%

0%

2,4%

Má Transição de saúde

Um pouco pior Muito pior

Quer os alunos não deslocados, quer os deslocados revelam uma percepção de saúde e de transição de saúde positiva.

4. DISCUSSÃO De uma forma geral, os resultados do presente estudo sugerem que os alunos do 1º ano do 1º Ciclo de Estudos em Medicina Dentária de uma instituição privada apresentam uma adaptação razoável nas dimensões Interpessoal (dimensão que se debruça sobre o relacionamento com os pares e o estabelecimento de relações mais íntimas, e com o envolvimento em actividades extracurriculares) e Carreira (dimensão relacionada com a adaptação ao curso, às aprendizagens no curso e às perspectivas de carreira). Para a adaptação nesta última dimensão poderão contribuir estruturas disponibilizadas pela

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Universidade privada em que foi desenvolvido o presente estudo, como a facilidade de contacto com os docentes, o fomento de sessões tutoriais e o Gabinete de Estágios. No entanto, os resultados também sugerem que se deverá estar atento a possíveis dificuldades ao nível das dimensões Estudo/Curso, Institucional e Pessoal. Relativamente às competências de estudo dos alunos, aos hábitos de trabalho, à gestão do tempo, à utilização da biblioteca e de outros recursos de aprendizagem, os resultados sugerem que será importante o Gabinete de Psicologia da instituição, juntamente com outras das suas unidades, promover iniciativas com vista à melhoria destas competências/comportamentos. A entrada em vigor do Plano Curricular adaptado a Bolonha veio colocar mais um desafio considerável aos alunos do Ensino Superior, exigindo-lhes uma rápida mudança do sistema a que estavam habituados ao longo de todo o Ensino Secundário, impelindo-os a assumir maior autonomia e responsabilidade no processo de ensino-aprendizagem. A intervenção psicológica no sentido de promover as competências de estudo e de gestão de tempo poderá ser de extrema utilidade. Para além disso, muitos são os alunos que não usufruem das sessões de esclarecimento sobre os recursos disponibilizados pela Biblioteca, sejam estes os recursos tradicionais (livros, revistas científicas, instrumentos de avaliação), sejam recursos electrónicos (bases de dados electrónicas e repositório institucional). A Associação de Estudantes poderia desempenhar um papel motivador, que promovesse o envolvimento dos alunos neste tipo de iniciativas, divulgando-as e estimulando os alunos a participar activamente. Por outro lado, a dimensão Institucional, relacionada com o interesse pela instituição, o desejo de nela prosseguir os seus estudos, o conhecimento e a percepção da qualidade dos serviços e estruturas existentes também deverá ser alvo de atenção por parte da instituição de Ensino Superior estudada. Um dos maiores problemas apresentados pelos alunos ao longo dos últimos anos lectivos prende-se com a dificuldade no pagamento das propinas para frequentar o curso numa instituição de Ensino Superior privada, sendo frequente os alunos colocarem a hipótese de terminarem apenas o 1º Ciclo de estudos na instituição que frequentam e tentarem a mudança para uma Universidade pública quando transitarem para o 2º Ciclo de estudos.

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No que diz respeito à dimensão Pessoal, que está associada à percepção de bem-estar físico e psicológico por parte do estudante, será importante explorar em estudos futuros se recursos como a Consulta de Psicologia gratuita e ginásio, onde os alunos podem praticar actividade física programada e supervisionada, estruturas disponibilizadas aos alunos alvo do presente estudo, estarão a ser utilizados e se necessitarão de ser ajustados aos interesses daqueles. A maioria dos alunos do 1º ano do 1º Ciclo de estudos tem a percepção de ter uma boa saúde e desta não ter piorado ao longo do último ano, bem como apresentam afecto positivo acima do ponto médio do instrumento e afecto negativo abaixo do ponto médio, o que vem reforçar a ideia de adaptação nesta etapa do seu desenvolvimento. Os resultados sugerem não existirem diferenças estatisticamente significativas ao nível dos indicadores de adaptação (adaptação ao Ensino Superior, percepção de saúde, transição de saúde, afecto positivo e afecto negativo) entre alunos deslocados e alunos não deslocados, o que poderá ter que ver com o facto de, neste período da vida, os jovens iniciarem um processo de maior autonomização das famílias e de estabelecimento de laços mais fortes com os seus pares. O presente estudo, de natureza transversal, constitui uma primeira etapa num projecto de carácter longitudinal, em que se pretende contribuir para uma maior compreensão sobre as variáveis que contribuem para o processo de ajustamento dos alunos recémentrados no Ensino Superior e para a sua adaptação ao longo do tempo. O primeiro passo consistiu numa caracterização da adaptação destes estudantes em alguns domínios apontados pela literatura como relevantes, sendo que o projecto tem como intenção explorar outras variáveis e tentar compreender como estas influenciam o processo de adaptação a esta fase de transição.

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REFERÊNCIAS Almeida, L. S. (2001). Prefácio. In: Santos, L. (Ed.). Adaptação académica e rendimento escolar: Estudo com alunos universitários do 1º ano. Braga, Universidade do Minho, pp. 13-15. Almeida, L. S., Ferreira, J. A. G. e Soares, A. P. C. (1999). Questionário de Vivências Académicas: Construção e validação de uma versão reduzida (QVA-r). In: Revista Portuguesa de Pedagogia, 33, nº3, pp. 181-207. Fernandes, E., Maia, A., Meireles, C., Rios, S., Silva, D., e Feixas, G. (2005). Dilemas implicativos e ajustamento psicológico: Um estudo com alunos recém-chegados à Universidade do Minho. In: International Journal of Clinical and Health Psychology, 5, nº2, pp. 285-304. Fernandes, E. P., e Almeida, L. (2005). Expectativas e vivências académicas: Impacto no rendimento dos alunos do 1º ano. In: Psychologica, 40, pp. 267-278. Ferreira, J. A., e Almeida, L. (1997). Questionário de Vivências Académicas (QVA): Fundamentação e procedimentos preliminares de construção. In: Gonçalves, M., Ribeiro, I., Araújo, S., Machado, C., Almeida, L., e Simões, M. (Eds.). Avaliação psicológica: Formas e contextos, vol. 5. Braga, Associação dos Psicólogos Portugueses, pp. 441-452. Galinha, I. C., e Pais-Ribeiro, J. L. (2005). Contribuição para o estudo da versão portuguesa da Positive and Negative Affect Schedule (PANAS): II – Estudo psicométrico. In: Análise Psicológica, 2, nº23, pp. 219-227. Ribeiro, J. (2005). O importante é a saúde: Estudo de adaptação de uma técnica de avaliação do estado de saúde – SF-36. Fundação Merck Sharp & Dohme. Santos, L. (2001). Adaptação académica e rendimento escolar: Estudo com alunos universitários do 1º ano. Braga, Universidade do Minho. Soares, I. (2000). Introdução à psicopatologia do desenvolvimento: Questões teóricas e de investigação. In: Soares, I. (Ed.). Psicopatologia do desenvolvimento: Trajectórias (in)adaptativas ao longo da vida. Coimbra, Quarteto, pp. 11-42.

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