ADOÇÃO INTERNACIONAL: A EFICÁCIA DA COMISSÃO ESTADUAL JUDICIÁRIA DE ADOÇÃO INTERNACIONAL NO ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA BRASILEIRA ADOTADA POR CASAL ESTRANGEIRO

June 30, 2017 | Autor: Cynthia Carneiro | Categoria: International Law, International Migration, Private International Law (Conflict of Laws)
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1 ADOÇÃO INTERNACIONAL: A EFICÁCIA DA COMISSÃO ESTADUAL JUDICIÁRIA DE ADOÇÃO INTERNACIONAL NO ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA BRASILEIRA ADOTADA POR CASAL ESTRANGEIRO Artigo publicado na Revista da Faculdade Mineira de Direito, v.12, n. 23, jan./jun. 2011 ISSN 1808-9429 http://periodicos.pucminas.br/index.php/Direito/search/results Resumo: A partir de uma abordagem qualitativa e da utilização dos métodos descritivo e bibliográfico, o presente estudo tem por finalidade analisar a adoção de criança brasileira por estrangeiros. O direito à filiação é previsto constitucionalmente. A nova lei de adoção, Lei 12.010/09, conforme já fora estabelecido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, prevê a adoção por estrangeiros como exceção à regra. O escopo do legislador, ao criar requisitos rigorosos e declará-la como exceção, é coibir práticas ilícitas e fraudulentas, comuns no passado e ainda existentes, tais como o tráfico de menores. Ocorre que muitos magistrados denegam requerimentos de adoção feitos por casais estrangeiros, lastreando-se neste aludido caráter excepcional. No entanto, a adoção internacional não deve ser vista necessariamente como prejudicial à criança. Para conferir segurança ao instituto, o Decreto 3.087/99 incorporou ao ordenamento jurídico brasileiro a Convenção de Haia Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, que estabeleceu Autoridades Centrais responsáveis pelo encaminhamento e supervisão das adoções internacionais. Assim, as Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção – CEJA`s, foram transformadas em Autoridades Centrais Estaduais, com funções reguladas pelo artigo 52 do ECA, exercendo papel essencial nesse processo. São essas Comissões que buscam, juntamente com o Juiz da Infância e Juventude e os membros do Ministério Público, salvaguardar crianças que não puderam encontrar um lar substituto no Brasil da opressão relacionada ao abandono ou orfandade. As CEJA’s também são responsáveis pelo acompanhamento da criança brasileira já instalada em lar estrangeiro. Esse seu relevante papel será analisado neste artigo. Palavras-chave: Adoção Internacional. Dignidade da pessoa humana. Interesse da Criança. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei 12.010/09. Comissão Estadual Judiciária de Adoção. Abstract: From a qualitative approach and use of methods and descriptive literature, this study is to analyze the adoption of Brazilian children by foreigners. The right to membership is constitutionally provided. The new law on adoption, Law 12.010/09, as already established by the Children and Youth - ECA provides for the adoption by foreigners as an exception to the rule. The scope of the legislature to create strict requirements and declare it as an exception, is curb malpractices and fraudulent practices, common in the past and still exist, such as trafficking in minors. It happens that many judges deny adoption applications made by foreign couples, backed alluded to this exceptional character. However, international adoption should not necessarily be seen as harmful to the child. To give security to the Office, Decree 3.087/99 incorporated into the Brazilian legal system to the Hague Convention on Protection of Children and Cooperation in Respect of Intercountry Adoption, which established the Central Authorities responsible for routing and supervision of international adoptions. Thus, the State Commissions of Judicial Adoption - CEJA `s were transformed into State Central Authorities, whose functions are regulated by Article 52 of the ECA, playing key role in this process. These committees are seeking, along with Judge's Children and Youth and prosecutors to safeguard children who could not find a foster home in Brazil oppression related to abandonment or orphanhood. The CEJA's are also responsible for monitoring the Brazilian child already installed in homes abroad. This role will be its relevance discussed here. Keywords: Intercountry Adoption. Human dignity. Child interest. Children and Adolescents Law. Law 12.010/09. Judicial Commission for Intercountry Adoption.

2 ADOÇÃO INTERNACIONAL: A EFICÁCIA DA COMISSÃO ESTADUAL JUDICIÁRIA DE ADOÇÃO INTERNACIONAL NO ACOMPANHAMENTO DA CRIANÇA BRASILEIRA ADOTADA POR CASAL ESTRANGEIRO

1- DA IMPORTÂNCIA DA ADOÇÃO E DA ADOÇÃO INTERNACIONAL

A adoção é uma forma humanitária de combater o abandono e a institucionalização de milhares de crianças e adolescentes. Recria a família para eles e lhes atribui a condição de filho, com os mesmos direitos e deveres. Dessa forma, a adoção é um dos meios eficazes da política de proteção à infância e à juventude. Ela coloca no centro das atenções a criança em situação de abandono, fenômeno que marca o início do processo de marginalização. Deve ser privilegiado o direito da criança em ter uma família e não o interesse do adulto em ter um filho e na adoção se evidencia a relação afetiva como base segura na ligação que se estabelece entre os adotantes e o adotado. A reintegração da criança no contexto familiar interrompe o processo de marginalização e possibilita a retomada das fases normais do desenvolvimento pessoal. Assim, a adoção, mais que um instrumento, representa um direito do menor ao acolhimento familiar, seja em lares nacionais ou estrangeiros. A adoção de menores e adolescentes abandonados, tanto no plano nacional quanto no internacional, é um ato generoso e benéfico, pois os retira de condições desumanas, concedendo-lhe cidadania, no desfrute da proteção e segurança familiar, com o estabelecimento do parentesco civil entre a família do adotante e o adotado. Instituto de ordem pública, tem como característica a transferência do pátrio poder dos pais de sangue para os adotantes mediante um ato solene (ocorre mediante sentença judicial), voluntário (exige manifestação de vontade dos adotantes e do adotado maior de 12 anos), sinalagmático (bilateral) e irrevogável. Estabelece-se entre adotante e adotado um vínculo de paternidade e filiação legítimas. Criam-se

3 direitos e deveres recíprocos que favorecem o desenvolvimento integral do adotado. De acordo com o artigo 51

1

do Estatuto da Criança e do

Adolescente (Lei 8069, de 13 de julho de 1990 – ECA), terá natureza de adoção internacional, aquela na qual a pessoa ou o casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil. Se reconhecermos a importância da adoção, não só para a criança abandonada, mas também e, principalmente para o desenvolvimento da própria humanidade, precisamos realizá-la para todas as crianças e adolescentes que dela necessitam, ainda que se busquem os interessados em outros países, até porque os valores são inscritos na essência do ser humano, na sua personalidade e na sua alma, nunca na sua nacionalidade. Devemos analisar a adoção internacional de forma científica e racional, ou seja, precisamos entender que a adoção nada mais é do que a possibilidade de se dar uma família a quem não a tem, sempre com o entendimento de que se busca a melhor família para a criança e não a melhor criança para a família. Considerá-la como “adoção-exílio” onde as crianças brasileiras são

expatriadas,

sufocando-lhes

o

direito

essencial

de

optar

pela

nacionalidade, o idioma e a terra em que nasceram, é absolutamente um equívoco. A nossa realidade não permite discussão a este respeito.

1 “Considera-se adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no art. 2º da Convenção de Haia , de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo n. 1, de 14 de janeiro de 1999, e promulgada pelo Decreto n.3.087, de 21 de junho de 1999.”

4

2- EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DOS INSTITUTOS DA ADOÇÃO E DA ADOÇÃO INTERNACIONAL NO DIREITO BRASILEIRO

2.1- Da adoção em geral

Atualmente, a legislação que cuida da adoção no Brasil é a Lei 12.010

2

de 03 de agosto de 2009, a qual será detalhada mais adiante em

capítulo específico. No entanto, para se chegar ao que temos hoje em matéria de legislação sobre o instituto da adoção, foram necessárias várias reformulações nos diplomas que tratavam do assunto. No Brasil, o primeiro diploma que cuidou da adoção foi a Consolidação das Leis Civis aprovada pelo Imperador em 1858, que tratou apenas de forma superficial a adoção nos seus artigos 1.635 a 1.640. Posteriormente, em 1916, o Antigo Código Civil

3

, na redação originária,

transferia o pátrio poder para o adotante, apenas se este não tivesse filhos legítimos, se fosse mais velho pelo menos dezoito anos que o adotado e, ainda, se tivesse mais de cinqüenta anos (artigos 368 a 378). O instituto era feito por escritura pública, registrado na circunscrição competente de Registro Civil. Na forma primitiva do Código Civil de 1916, “o filho adotivo era equiparado ao legítimo, mas em concorrência à herança com o filho legítimo superveniente, visto que o primeiro recebia metade da cota atribuída ao segundo”. Assim, a princípio, filho adotivo e legítimo eram equiparados, mas caso o adotante viesse a falecer e este tivesse filho legítimo superveniente à adoção, o filho adotado recebia metade da cota da herança do filho legítimo.

2 Dispõe sobre adoção. 3 Lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916.

5 Em 08 de maio de 1957, a Lei nº 3.133 4 é publicada e reformula a adoção. Isso significou, na época, um avanço, já que trouxe substanciais modificações que tornaram mais fácil a aplicação do instituto. Essa lei reduziu para trinta anos a idade mínima para o adotante. Este, se casado, deveria ter pelo menos cinco anos de vida conjugal e ser no mínimo dezoito anos mais velho que o adotado. Com exceção de marido e mulher, apensa uma pessoa poderia adotar. Também o tutor ou curador poderiam, após prestar contas da administração dos bens do pupilo ou do curatelado, adotá-lo. A adoção era feita mediante consentimento do adotado ou do seu representante legal (se menor ou incapaz). Além disso, cessada a menoridade ou a interdição, o adotado poderia desligar-se desse vínculo através de acordo com o adotante ou nas formas em que a lei permitia a deserdação. Mantida a forma de escritura pública como exigível para o ato de adoção, o parentesco limitava-se apenas às partes (adotante e adotado). A única exceção referia-se a impedimentos matrimoniais entre o adotante e o cônjuge do adotado ou entre o adotado e o cônjuge do adotante, ou, ainda, entre o adotado e o filho superveniente do adotante (artigos 376 e 183, III e V, do CC revogado). Essa limitação trouxe dúvidas com relação aos direitos dos descendentes do adotado: eles teriam direito à herança do adotante no caso do genitor já estar morto? A doutrina e jurisprudência não tratavam do assunto de forma pacífica e apenas o Código de Menores iria solucionar esse impasse jurídico. Quanto ao parentesco natural, à exceção do pátrio-poder, que passava para a pessoa do adotante, os direitos e deveres permaneciam os mesmos. Isso significa, por exemplo, que, no caso do pai adotante não poder manter o adotado, este poderia pedir alimentos ao pai natural. Após vários projetos tentarem resolver a questão da adoção no Brasil, é publicada, em 02 de junho de 1965, a Lei 4.655 5. Essa lei finalmente legitima a adoção, o que era um anseio da parte da população interessada no tema, ou seja, dos casais interessados em adotar.

4 Atualiza o instituto da adoção prescrita no Código Civil de 1916. 5 Dispõe sobre a legitimidade adotiva.

6 A partir de então, a legitimação passou a ocorrer por decisão judicial e com acompanhamento do Ministério Público. De forma irrecorrível, a sentença provocava a averbação do registro da família natural. Outra modificação foi a possibilidade da adoção por pessoas com menos de trinta anos, desde que casadas há mais de cinco anos, provando ser estéril e ter vida conjugal estável, ou seja, ininterrupta e duradoura. Atualmente, tanto no direito brasileiro, quanto na maioria das legislações dos países ocidentais que serviram de inspiração ao legislador nacional, há a primazia do “interesse da criança” (princípio do melhor interesse da criança). É ela quem aparece como grande beneficiária das adoções. Durante o período de vigência do antigo Código Civil (até 1979), entretanto, o principal favorecido do direito não é a criança, mas a linhagem, o casal, a família. O objetivo primeiro é encontrar uma criança párea um casal e não o inverso. Em 1979, entra em vigor no Brasil o “Código de Menores”, Lei 6.697 6. O novo Código é da alçada do direito público (contrariamente ao Código Civil, que legisfera sobre o direito privado) e, apesar de não anular o Código Civil, começa a destacar a importância do “interesse do menor” para a justiça. Assim, através da nova lei, a menoridade passa a ser preocupação do Estado brasileiro no que tange à adoção. Como a lei posterior não revogou a adoção simples, regida pelo Código Civil, passaram a coexistir duas formas de adoção: a plena, com legitimação adotiva, e a simples, pelo Código Civil e pelo Código de Menores (artigos 27 e 28). O que particulariza a adoção plena é que, além de manter a legitimação adotiva, atinge, além do adotante, a família deste. Isso resolve a questão dos direitos sucessórios do adotado e de seus descendentes. A adoção simples não rompe os laços entre os adotados e seus pais biológicos. O adotante pode desistir da adoção e devolver a criança adotada. A adoção plena, por sua vez, confere total vinculação do adotado a sua nova família e rompe definitivamente seus laços com a família consangüínea. Ela é irrevogável e, consequentemente, não deixa espaço para a devolução da criança.

6 Institui o Código de Menores.

7 No ano de 1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069

7

), no seu artigo 267

8

, revogou expressamente a Lei nº 6.697.

Fundamentado na “Doutrina Jurídica de Proteção Integral”, regulamentou a adoção de menores, ao passo que manteve as regras do Código Civil para a adoção de maiores, de acordo com o artigo 227, parágrafo 5º da Constituição Federal 9. Assim, no que diz respeito à adoção de menores, o Estatuto revogou também o disposto no Código Civil de 1916 e passou a reger sozinho todas as disposições acerca do assunto. A única forma de adoção prevista é agora irrevogável e transfere o pátrio poder dos pais biológicos para a família adotante. O adotado entra em linha de filiação direta com sua nova família (até a quarta geração). Há uma mudança de perspectiva quanto aos interesses na adoção: o principal é a realização

da

personalidade

dos

filhos,

bem

como

sua

proteção,

independentemente de suas origens. Na Seção III, o ECA estatue as regras aplicáveis à família substituta. Na Seção IV, nos artigos 39 a 52, todos os aspectos relativos à adoção de menores de dezoito anos são regulamentados minuciosamente. 2.2 – Da adoção internacional

Quanto

à

adoção

internacional,

sua

disciplina

legal

é

relativamente recente. Por volta do início dos anos 1970, começam as primeiras adoções internacionais no Brasil. De 1973 até 1979 não havia no país outra lei, senão aquelas do Código Civil de 1916 que legisferassem sobre as práticas adotivas internacionais. Não era feita pelo antigo Código Civil qualquer distinção entre o adotante brasileiro, o estrangeiro aqui residente ou o estrangeiro que vivia em seu país natal. 7 Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e dá outras providências. 8 “Revogam-se as Leis ns. 4.513, de 1964 e 6.697, de 10 de outubro de 1979 (Código de Menores), e as demais disposições em contrário.” 9 “A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”.

8 As primeiras adoções internacionais ocorridas no Brasil não foram pois realizadas diante de um juiz ou de um promotor. O que se buscava não era a colocação da criança abandonada em um novo lar e sim encontrar uma criança para um casal estrangeiro. Já o Código de Menores, em seu art. 20

10

, contrariamente ao

Civil, traz uma série se especificações quanto à adoção de crianças brasileiras por estrangeiros (tanto para os residentes quanto aos que moram em outros países). O dito artigo dispõe, por exemplo, que o estrangeiro poderá pleitear colocação familiar somente para fins de “adoção simples” e se o adotando brasileiro estiver na situação irregular não eventual, ou seja, abandonado. O Estatuto da Criança e do Adolescente representou um marco evolutivo de nossa legislação, pelos enormes avanços que introduziu no campo específico das adoções internacionais. Este novo diploma reconheceu o interesse do menor como o principal objetivo da adoção (art. 43

11

). Entre as

principais garantias estabelecidas pelo legislador pátrio estão a vedação de adoções por procuração (art.39, §2º

12

), a proibição da saída do adotando do

território nacional antes de consumada a adoção (art. 51, §8º

13

), a instituição

do registro centralizado de estrangeiros interessados na adoção (art. 50, §6º 14) e a punição dos atos destinados ao envio de criança ou adolescente ao exterior com a inobservância das formalidades legais ou com a finalidade de obter lucro (art. 239 15). Além do ECA, a adoção internacional é também regida pela Convenção de Haia de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto 10 “O estrangeiro residente ou domiciliado fora do País poderá pleitear colocação familiar somente para fins de adoção simples e se o adotando brasileiro estiver na situação irregular, não eventual, descrita na alínea a, inciso I, do art. 2º desta Lei.” 11 “A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos.” 12 “É vedada a adoção por procuração.” 13 “Antes de transitada em julgado a decisão que concedeu a adoção internacional, não será permitida a saída do adotando do território nacional.” 14 “Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais residentes fora do País, que somente serão consultados na inexistência de postulantes nacionais habilitados nos cadastros mencionados no § 5o deste artigo.” 15 “Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa. Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência.”

9 Legislativo 1/1999 e promulgada pelo Decreto 3.087/1999

16

. Esse documento

internacional respeita a legislação interna de cada país, principalmente no que tange aos requisitos para a adoção e disciplina a cooperação entre os Estados para maior controle e ética na sua efetivação. Ocorre que, por vezes, tornava-se confusa a conciliação entre o Estatuto e as normas advindas da Convenção, exigindo-se um esforço desnecessário por parte dos aplicadores da lei, especialmente pelos juízes das Varas da Infância e da Juventude. Por esse motivo o Estatuto da Criança e do Adolescente foi alterado, passando a incorporar as normas existentes na Convenção de Haia, tornando-se, na medida do possível, um documento completo sobre adoção internacional.

16 Promulga a Convenção Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, concluída em Haia, em 29 de maio de 1993.

10

3- A NOVA LEI DE ADOÇÃO

A adoção no Brasil foi reformulada pela nova Lei de Adoção, Lei 12.010 17

de 03 de agosto de 2009. As principais novas regras, em síntese, são as

seguintes: - Foi criado o Cadastro Nacional de Adoção, o qual reúne os dados das pessoas que querem adotar e das crianças e adolescentes aptos para a adoção, de modo a impedir a “adoção direta” (em que o interessado comparece no Juizado da Infância e Juventude com a pessoa que quer adotar); estabelece também uma preparação psicológica, de modo a esclarecer sobre o significado de uma adoção e promover a adoção de pessoas que não são normalmente preferidas (mais velhas, com problemas de saúde, indígenas, negras, pardas, etc.). - Traz o conceito de família extensa (ou ampliada), pelo qual se deve esgotar as tentativas de a criança ou adolescente ser adotado por parentes próximos com os quais o mesmo convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade. Assim, por exemplo, tios, primos e cunhados têm prioridade na adoção (não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando). - Estabelece a idade mínima de 18 (dezoito) anos para adotar, independentemente do estado civil. - A adoção dependerá de concordância, em audiência, do adotado se este possuir mais de 12 (doze) anos. - A gestante que queira entregar seu filho (nascituro) à adoção terá assistência psicológica e jurídica do Estado, devendo ser encaminhada à Justiça da Infância e Juventude.

17 Idem 2.

11 - A lei estabelece também como medida protetiva a figura do acolhimento familiar, a qual a criança ou adolescente é encaminhado para os cuidados de uma família acolhedora, que cuidará daquele de forma provisória. - A lei ainda determina que crianças e adolescentes que vivam em abrigos terão sua situação reavaliada de 06 (seis) em 06 (seis) meses, tendo como prazo de permanência máxima no abrigo de 02 (dois) anos, salvo exceções. - O adotado tem direito de conhecer sua origem biológica e de obter acesso irrestrito ao processo de adoção após completar 18 (dezoito) anos. - Em se tratando de adoção internacional, esta somente ocorrerá se não houver, em primeiro lugar, alguém da família extensa habilitado para adotar, ou, em segundo, foram esgotadas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira. Por fim, os brasileiros que vivem no exterior têm preferência aos estrangeiros. Assim, percebe-se que, especificamente em relação à adoção internacional, a nova lei não trouxe mudanças, pelo contrário, reafirmou o princípio da excepcionalidade, dificultando ainda mais as adoções por estrangeiros. Na avaliação do promotor de Justiça aposentado Wilson Donizeti Liberati, a nova Lei passa a dificultar a adoção de crianças por estrangeiros, público que geralmente se interessa pela adoção de crianças mais velhas. O prazo de habilitação para casais residentes no exterior adotarem após conseguirem autorização tanto em seu país quanto no Brasil foi reduzido de dois para um ano. Além disso, a nova Lei de Adoção traz inovações que já eram adotadas pelo Judiciário brasileiro. Medidas como não separar irmãos ou autorizar os adotados a terem acesso ao seu processo já eram praticadas. No entanto, a estrutura do Judiciário brasileiro atual impede a completa aplicação da lei. Segundo o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e professor de Direitos Humanos da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), “a nova lei, entre outras coisas, obriga que os juízes julguem um processo entre sete e oito meses. O prazo é razoável, mas os juízes estão todos atolados de trabalho. Há muita demanda. Como atender este novo padrão com tão poucos juízes?”.

12 Assim, a chamada Lei de Adoção, que busca reduzir o tempo de crianças e adolescentes institucionalizados, está cheia de propósitos, mas poucos são os avanços e quase nulas as chances de se esvaziarem os abrigos onde se encontram depositados 80 mil seres humanos à espera de um lar. Maria Berenice Dias (2010), em seu artigo intitulado “O lar que não chegou”, tece várias críticas a respeito da nova lei de adoção, que não consegue alcançar seus propósitos. A autora argumenta que não há dúvidas de que o ideal é que as crianças e adolescentes cresçam junto a quem lhes trouxe ao mundo. No entanto, quando a convivência com a família natural de revela impossível ou é desaconselhável, melhor atende ao interesse da criança, ser entregue aos cuidados de quem sonha reconhecê-la como filha. A celeridade deste processo é o que garante a convivência familiar, direito constitucionalmente preservado com absoluta prioridade no art.227

18

da Constituição. Infelizmente, para este

fim, não se presta a nova legislação, que nada mais fez do que burocratizar e emperrar o direito à adoção de quem não teve a sorte de ser acolhido no seio de sua família. Aliás, a lei traz um novo conceito, o de família extensa, já explicado anteriormente. Além disso, Maria Berenice Dias explica que a habilitação à adoção transformou-se em um processo, inclusive com petição inicial que deve ser acompanhada de uma série de documentos, entre eles: comprovante de renda e de domicílio, atestado de sanidade física e mental, certidão de antecedentes criminais e negativa de distribuição cível. O Ministério Público pode requerer a designação de audiência para a ouvida dos postulantes e de testemunhas. Argumenta a autora que, com todas essas cautelas, se afigura uma demasia condicionar a inscrição dos candidatos a um período de preparação psicossocial e jurídica, mediante a freqüência obrigatória a programa de preparação psicológica, orientação e estímulo à adoção inter-racial, de crianças maiores ou de adolescentes, com necessidades específicas de saúde ou com deficiências e de grupos de irmãos. Aliás, é imposta a todos os figurantes no 18 “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”

13 cadastro, no prazo máximo de um ano, a obrigação de se sujeitarem à preparação psicossocial e jurídica, sob pena de cassação da inscrição. Assim, a partir da entrada em vigor da nova lei, nenhuma adoção poderá ser deferida enquanto não se submeterem as pessoas já habilitadas ao procedimento preparatório. E, caso não seja disponibilizado dito programa pela justiça, no prazo legal, simplesmente todas as inscrições estarão automaticamente canceladas. Ainda para a respeitada autora, diante de todos esses tropeços, de nada ou de muito pouco adianta impor aos dirigentes das entidades que desenvolvem programas de acolhimento familiar ou institucional que, a cada seis meses, encaminhem a juízo relatório elaborado por equipe interprofissional ou interdisciplinar, para a reavaliação judicial das crianças e adolescentes em programas de acolhimento. Também não há como se tornar efetiva a limitação de permanência institucional em dois anos. Esclarece ainda, que é óbvio que não haverá como o juiz fundamentar que atende ao melhor interesse da criança a necessidade de permanecer institucionalizada por prazo superior. A justificativa só será uma: não há onde colocá-las. Por fim, a autora explica que a adoção internacional, de fato, carecia de regulamentação. Mas foi tão exaustivamente disciplinada, impondo-se tantos entraves e exigências que, dificilmente, alguém conseguirá obtê-la. Até porque o laudo de habilitação tem validade de, no máximo um ano. E, como só de dará a adoção internacional depois de esgotadas todas as possibilidades de colocação em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros nacionais, havendo a preferência de brasileiros residentes no exterior, parece que a intenção foi de vetá-la. Maria Berenice Dias ressalta, por fim, que é claro que a lei também tem méritos. Assegurar ao adotado o direito de conhecer sua origem biológica e acesso ao processo de adoção é um deles, apesar de que isto já vinha sendo assegurado judicialmente. A manutenção de cadastros estaduais e nacional, tanto de adotantes, como de crianças aptas à adoção, o que já havia sido determinado pelo Conselho Nacional de Justiça, é outro mecanismo que visa agilizar a adoção. Também é salutar assegurar preferência ao acolhimento familiar do que ao institucional, bem como garantir aos pais o direito de visitas

14 e a mantença do dever de prestar alimentos aos filhos quando colocados sob a guarda de terceiros. O fato é que, de acordo com Maria Berenice Dias, posicionamento que também defendemos, a adoção, inclusive a nacional, transformou-se em medida excepcional, a qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança e do adolescente na família natural ou extensa. Assim, a chamada lei da adoção não consegue alcançar seus propósitos. Ao invés de agilizar a adoção, acaba por impor mais entraves para sua concessão.

15

4- REQUISITOS E PROCEDIMENTO DA ADOÇÃO INTERNACIONAL

4.1- Dos requisitos De acordo com o art. 51, §1º 19 da nova lei de adoção, Lei 12.010, de 29 de julho de 2009, a adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro

ou

domiciliado

no

Brasil

somente

terá

lugar

mediante

o

preenchimento de três requisitos: a) Primeiramente, a colocação em família substituta deve ser a solução adequada ao caso concreto, ou seja, deve ser analisado se não é mais possível a reintegração da criança ou do adolescente na sua família de origem; b) Em segundo lugar, deve restar comprovado que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros estaduais e nacional de pessoas ou casais habilitados brasileiros. c) Finalmente, em se tratando de adoção de adolescente, deve restar comprovado que este foi consultado por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante parecer elaborado por equipe interprofissional.

19 “A adoção internacional de criança ou adolescente brasileiro ou domiciliado no Brasil somente terá lugar quando restar comprovado: I - que a colocação em família substituta é a solução adequada ao caso concreto; II - que foram esgotadas todas as possibilidades de colocação da criança ou adolescente em família substituta brasileira, após consulta aos cadastros mencionados no art. 50 desta Lei; III - que, em se tratando de adoção de adolescente, este foi consultado, por meios adequados ao seu estágio de desenvolvimento, e que se encontra preparado para a medida, mediante parecer elaborado por equipe interprofissional, observado o disposto nos §§ 1o e 2o do art. 28 desta Lei.”

16 Tratando-se de maior de 12 (doze) anos de idade, será necessário seu consentimento, colhido em audiência.

4.2- Do procedimento

Quanto ao procedimento, a adoção internacional deverá observar as regras dispostas no art. 52 da Lei 12.010/09. A pessoa ou casal estrangeiro, interessado em adotar criança ou adolescente brasileiro, deverá formular pedido de habilitação à adoção perante a Autoridade Central em matéria de adoção internacional no país de acolhida, assim entendido aquele onde está situada sua residência habitual. Se a Autoridade Central do país de acolhida considerar que os solicitantes estão habilitados e aptos para adotar, emitirá um relatório que contenha informações sobre a identidade, a capacidade jurídica e adequação dos solicitantes para adotar, bem como sua situação pessoal, familiar e médica, seu meio social, os motivos que os animam e sua aptidão para assumir uma adoção internacional. A Autoridade Central do país de acolhida enviará o relatório à Autoridade Central Estadual, com cópia para a Autoridade Central Federal Brasileira

20

.O relatório será instruído com toda a documentação necessária,

incluindo estudo psicossocial elaborado por equipe interprofissional habilitada e cópia autenticada da legislação pertinente, acompanhada da respectiva vigência.

Os

documentos

em

língua

estrangeira

serão

devidamente

autenticados pela autoridade consular, observados os tratados e convenções internacionais, e acompanhados da respectiva tradução, por tradutor público juramentado, que pode ser estrangeiro ou nacional. A Autoridade Central Estadual poderá fazer exigências e solicitar complementação sobre o estudo psicossocial do postulante estrangeiro à adoção, já realizado no país de acolhida. Verificada, após estudo realizado pala Autoridade Central Estadual, a compatibilidade da legislação estrangeira com a nacional, além do

20 O Decreto 3.174 de 16 de setembro de 1999 designa as Autoridades Centrais encarregadas de dar cumprimento às obrigações impostas pela Convenção de Haia. Dispõe no art.1º que fica designada como Autoridade Central Federal a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça e no art. 4º que as CEJA’s funcionarão como Autoridades Centrais Estaduais.

17 preenchimento por parte dos postulantes dos requisitos objetivos e subjetivos necessários ao seu deferimento, tanto à luz do que dispõe a Lei 12.010/09 quanto a legislação do país de acolhida, será expedido laudo de habilitação à adoção internacional, que terá validade por, no máximo, 1 (um) ano. A compatibilidade da legislação estrangeira com a nacional é verificada observando-se se aquela adota os mesmos princípios que esta, sempre visando o melhor interesse do menor. Caso contrário, a legislação estrangeira será considerada incompatível com a nacional, hipótese em que não poderá ocorrer a adoção. De posse do laudo de habilitação, o interessado será autorizado a formalizar pedido de adoção perante o Juízo da Infância e da Juventude do local em que se encontra a criança ou adolescente, conforme indicação efetuada pela Autoridade Central Estadual. Assim, o processo da adoção internacional inicia-se com o deferimento do juízo para que sejam citadas as crianças e adolescentes em condições de serem adotados e as pessoas interessadas na adoção. Este procedimento é uno tanto para a adoção nacional quanto para a adoção internacional e é a partir dele que o procedimento judicial de fato se instaurará. Além do laudo de habilitação expedida pela Autoridade Central Estadual, as CEJA’s, há outros documentos essenciais que devem ser juntados ao pedido de adoção, tais como: comprovação de estar o casal estrangeiro devidamente habilitado para a adoção segundo as leis de seu país, mediante declaração expedida pela autoridade competente; estudo psicossocial elaborado por agência especializada e credenciada no país de origem; apresentação do texto legal autorizativo da adoção no país de origem, comprovada sua vigência; certidão de nascimento do adotando, se possível; atestado de sanidade física e mental; atestado de antecedentes criminais (não serve atestado de boa conduta); atestado de residência expedido por órgão oficial; declaração de rendimentos, com valores convertidos em dólar americano; certidão de casamento, passaporte e cópia; autorização expedida no país de origem, para a realização de adoção de brasileiros; fotografia dos requerentes, de sua residência e de seus familiares; autorização específica para atuação de seu representante no Brasil e declaração de ciência de que a adoção é totalmente gratuita, irrevogável e irretratável.

18 Depois de juntados todos os documentos e tendo sido a inicial recebida, proceder-se-á à citação a que acima se referiu. No caso da adoção internacional, após o regular trâmite processual em que se deferirá o pedido de adoção, o casal estrangeiro é avisado para vir ao Brasil para cumprir o estágio obrigatório de convivência. Conforme o art. 46, §3º 21 da Lei de Adoção, em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido em território nacional, será de, no mínimo, 30 (trinta) dias. Somente poderá ser dispensado se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que seja possível avaliar a conveniência da constituição do vínculo. Como o processo de adoção garante todos os direitos previstos da filiação, seu deferimento prevê a destituição do poder familiar. Caso os genitores não venham a concordar com a adoção, o normal é exigir com antecedência a desconstituição do poder familiar. Inicialmente,

quando

se

configurava

a

situação

da

não

concordância do processo de destituição do poder familiar, o processo de adoção era extinto por se caracterizar numa impossibilidade jurídica do pedido. Atualmente, contudo, há entendimento no sentido de seguir simultaneamente com as demandas dos processos de adoção e destituição do poder familiar. Segundo Cury, Garrido e Marçura 22: A destituição do poder familiar não pode ser decretada incidenter tantum nos procedimentos de adoção, reclamando o devido processo legal, que obviamente não prescinde de inicial na qual fatos ensejadores do pedido sejam devidamente descritos, a possibilitar o exercício da ampla defesa. Nada obsta, contudo, a cumulação objetiva, porquanto “os dois pedidos, ainda que um deles (destituição do pátrio poder) esteja implicitamente vinculado ao outro (adoção), podem ser tratados num único processo, posto que compatíveis entre si, para ambos é competente o mesmo juízo e o tipo de procedimento é adequado para todos” (RT 692/58).

Dessa forma, uma vez que o processo de adoção implica na perda do poder familiar, não há a necessidade de se ingressar como uma ação específica de destituição de poder, sendo que este pleito pode ser considerado 21 “Em caso de adoção por pessoa ou casal residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de, no mínimo, 30 (trinta) dias.” 22 Estatuto da Criança e do Adolescente Anotado, 3ª edição, Editora Revista dos Tribunais, 2002 (p.37).

19 implícito no processo de adoção, sendo a destituição do poder familiar reconhecida como resultado da sentença homologatória do processo de adoção. Nesse caso, é exigida somente a citação dos genitores, configurando, assim, o litisconsórcio necessário, exigível somente quando não ocorrer uma das condições em que a concordância dos genitores é dispensável. No entanto, é importante deixar claro que, no caso das adoções internacionais, é obrigatório que se exija com antecedência a desconstituição do poder familiar. O vínculo da adoção é processado através de sentença judicial que dispõe sobre a eficácia do ato e seus efeitos a partir de seu trânsito em julgado. Somente na hipótese de falecimento do adotante, durante o decorrer do processo de adoção, a sentença disporá de efeito retroativo à data do óbito, considerando já ter havido manifestação de vontade por parte do mesmo. Dessa forma, a sentença será inscrita mediante mandado judicial no registro civil, sem que seja indicada qualquer referência à origem do ato. Antes de transitada em julgado a decisão que concedeu a adoção internacional, não será permitida a saída do adotando do território nacional. Por fim, transitada em julgado a decisão, a autoridade judiciária determinará a expedição de alvará com autorização de viagem, bem como para obtenção de passaporte, constando, obrigatoriamente, as características da criança ou adolescente adotado, como idade, cor, sexo, eventuais sinais ou traços peculiares, assim como foto recente e a aposição da impressão digital do seu polegar direito, instruindo o documento com cópia autenticada da decisão e certidão de trânsito em julgado.

20

5- DOS ORGANISMOS ESTRANGEIROS

Importante destacar que, de acordo com o §1º do art. 52

23

, se a

legislação do país de acolhida assim o autorizar, admite-se que os pedidos de habilitação à adoção internacional sejam intermediados por organismos credenciados. O Decreto 5.491 de 18 de julho de 2005 regulamenta a atuação dos organismos estrangeiros e nacionais de adoção internacional. Todos os organismos deverão ser credenciados no âmbito da Autoridade Central Administrativa Federal de seu país. Tal credenciamento é requisito obrigatório para posterior credenciamento junto a Autoridade Central do país de origem da criança (as entidades e associações internacionais voltadas para adoção de crianças e adolescentes brasileiros devem promover sua habilitação perante a ACAF/DF – Autoridade Central Administrativa Federal, órgão ligado à Secretaria de Estado dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça), bem como para efetuar quaisquer procedimentos junto às Autoridades Centrais dos Estados Federados e do Distrito Federal (CEJAs). Entende-se

como

organismos

estrangeiros

associações

estrangeiras sem fins lucrativos, que atuem em adoção internacional de crianças e adolescentes brasileiros, no Estado brasileiro. Tais organismos deverão solicitar à Coordenação Geral de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação, da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, autorização para funcionamento no Brasil, para fins de reconhecimento da personalidade jurídica às organizações estrangeiras. Além disso, o organismo deverá prestar, a qualquer tempo, todas as informações que lhe forem solicitadas; apresentar a cada ano contado da data de publicação da portaria de credenciamento, à Autoridade Central 23 “Se a legislação do país de acolhida assim o autorizar, admite-se que os pedidos de habilitação à adoção internacional sejam intermediados por organismos credenciados.”

21 Administrativa Federal de seu país relatório geral das atividades desenvolvidas bem como relatório de acompanhamento das adoções internacionais efetuadas no período e por fim, requerer a renovação do credenciamento a cada dois anos de funcionamento, no período de trinta dias que antecede o vencimento do prazo. O art. 17 do Decreto 5.491 estabelece ainda outras obrigações dos organismos estrangeiros que atuam no Estado brasileiro. São elas: I- comunicar à Autoridade Central Administrativa Federal em quais Estados da Federação estão atuando os seus representantes, assim como qualquer alteração de estatuto ou composição de seus dirigentes e representantes; II- tomar medidas necessárias para garantir que a criança ou adolescente brasileiro saia do País com o passaporte brasileiro devidamente expedido e com visto de adoção emitido pelo consulado do país de acolhida; III- tomar as medidas necessárias para garantir que os adotantes encaminhem cópia à Autoridade Central Administrativa Federal da certidão de registro de nascimento estrangeira e do certificado de nacionalidade tão logo olhes sejam concedidos; IV- apresentar relatórios semestrais à Autoridade Central Administrativa Federal de acompanhamento do adotado, até que se conceda a nacionalidade no país de residência dos adotantes; V- apresentar relatórios semestrais de acompanhamento do adotado às Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção – CEJAs pelo período mínimo de dois anos, independentemente da concessão da nacionalidade do adotado no país de residência dos adotantes. Por fim, somente será permitido o credenciamento de organismos estrangeiros de adoção internacional oriundos de países que ratificaram a Convenção de Haia e estejam devidamente credenciados pela Autoridade Central do país de origem para atuar em adoção internacional no Brasil. São países que ratificaram a Convenção de Haia de 29 de maio de 1993: México, Romênia, Sri-Lanka, Chipre, Polônia, Espanha, Equador, Peru, Costa Rica, Burkina Faso, Filipinas, Canadá, Venezuela, Finlândia, Suécia, Dinamarca, Noruega, Holanda, França, Colômbia, Austrália, El Salvador, Israel, Brasil, Áustria, Chile, Panamá, Itália e República Tcheca.

22 Portanto, somente poderão ser credenciados no Brasil os organismos estrangeiros oriundos de algum dos países acima citados e desde que estejam credenciados em seu país para atuarem em adoção internacional no Brasil. De acordo com o último relatório enviado pela ACAF à CEJA/MG, atualizado em 05/10/2009, estão credenciados atualmente as seguintes associações estrangeiras: 

Alemanha: AdA Adoptionsberatung e.V



Canadá: Sunrise Familiy Services Society



Espanha: - AAiM (Associació d’Ajuda als Infants del Món) - ASEFA (Associació Española de Atención y Apoyo a Família y Adopción) - Bradopta (Associació per a Adopcions al Brasil)



França: - APC (Adoption et Parrainage de la Charente Oeuvre de l’Adoption – Comitê de Cognac) - Association Arc Em Ciel France – Brésil - Edelweiss – Accueil - L’adoption dês Tout-Petits – L’Oeuvre d’Adoption – Comité de Lille - Médecins du Monde



Itália: - AFN (Ação para Famílias Novas) - AiBi (Asociazione Amici dei Bambini) - AIPA (Associazione Italiana Pro Adozione) - AMI (Amici Missioni Indiane Onlus) - Associação I Cinque Pani - Associazione II Conventino -

AVSI(Associazione

Volontari

per

il

Servizio

Internazionale) - CIFA Onlus (Centro Internazionale per L’Infanzia e la Famiglia) - II Mantello (Associazione di Volontariato per la Famiglia e L’Adozione) - Instituto La Casa

23 - NOVA (Nuovi Orizzonti per Viver ela Adozione) - Progetto São José - Rete Speranza - Senza Frontiere Onlus 

Noruega: Inor Adopt



Suécia: Adoptionscentrum



Suíça: Brás Kind – Família para Crianças

Dentre estes organismos estrangeiros, os que mais atuam em adoção internacional perante à CEJA/MG são os seguintes: ASEFA, APC, Edelweiss-Accueil, AiBi, Associação I Cinque Pani, AVSI, CIFA Onlus, II Mantello, NOVA e Progetto São José.

24

6- DAS CEJA’S (COMISSÕES ESTADUAIS JUDICIÁRIAS DE ADOÇÃO) E SUA

IMPORTÂNCIA

NO

ACOMPANHAMENTO

DAS

CRIANÇAS

ADOTADAS POR CASAIS ESTRANGEIROS

6.1- Introdução

A CEJA

24

, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, foi

elevada à categoria de Autoridade central no âmbito do Estado de Minas Gerais por força do Decreto Federal nº 3.174 de 16.09.99 e tem como objetivo principal a prestação de auxílio aos juízes da infância e da Juventude nos procedimentos relativos à adoção nacional e principalmente internacional. As Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção buscam colocar crianças, consideradas adotáveis, a salvo da negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. A sua finalidade é garantir que as adoções internacionais sejam feitas segundo o interesse superior da criança e com respeito ao direito fundamental de convivência familiar e comunitária que lhe reconhece o direito internacional, participando do sistema de cooperação de que trata a Convenção de Haia. A CEJA apóia a adoção internacional, mas os arts. 31 do ECA e 50, §10

25

26

da Lei 12.010/09 consagram o princípio da excepcionalidade da

adoção internacional, ou seja, trata-se de medida excepcional, que deve merecer a tutela jurisdicional apenas quando esgotadas todas as possibilidades de adoção por nacional.

24 A Comissão Estadual Judiciária de Adoção – CEJA, no estado de Minas Gerais, foi instituída em 1992. Sua criação e regulamentação foram atualizadas e consolidadas pela Resolução nº557/2008, com a redação dada pela Resolução nº592/2009, da Corte Superior do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. 25 “A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção.” 26 “A adoção internacional somente será deferida se, após consulta ao cadastro de pessoas ou casais habilitados à adoção, mantido pela Justiça da Infância e da Juventude na comarca, bem como aos cadastros estadual e nacional referidos no §5º deste artigo, não for encontrado interessado com residência permanente no Brasil.”

25 A CEJA exerce atividade subsidiária e complementar ao Poder Judiciário, na medida em que analisa a capacidade dos pretendentes à adoção internacional, fornecendo-lhes o respectivo laudo de habilitação. A CEJA-MG reunir-se-á ordinariamente duas vezes por mês, com a presença da maioria absoluta de seus membros e, extraordinariamente, por convocação do seu Presidente.

6.2- Composição

Quanto à sua composição, a Comissão Estadual Judiciária de Adoção de Minas Gerais é composta por nove membros, sendo eles: - Membro nato: Presidente – Corregedor-Geral de Justiça - Membros Temporários: 

Dois Desembargadores indicados pelo Corregedor-Geral de Justiça e submetidos à aprovação da Corte Superior do Tribunal de Justiça, sendo que um deles exerce a VicePresidência;



Juiz de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Belo Horizonte, indicada pelo CorregedorGeral de Justiça;



Juiz de Direito da Circunscrição Judiciária Metropolitana de Belo Horizonte, indicada pelo Corregedor-Geral de Justiça;



Juiz Auxiliar da Corregedoria, indicado pelo CorregedorGeral de Justiça;



Procurador de Justiça, indicado pelo Procurador-Geral de Justiça;



Promotor de Justiça, indicado pelo Procurador-Geral de Justiça;



Representante da Comunidade, detentor de reconhecida experiência na problemática do menor exposto à adoção e compromissado com sua causa, indicado pelo CorregedorGeral

de

Justiça.

Atualmente,

o

representante

da

26 comunidade perante a CEJA/MG é o Desembargador Dr. Rubens Xavier Ferreira. A equipe de apoio à CEJA é composta atualmente por seis servidores, incluindo uma coordenadora e duas técnicas. 6.3- Atribuições

A

Comissão

Estadual

Judiciária

de

Adoção

tem

como

atribuições27: - promover o estudo prévio e análise dos pedidos de habilitação à adoção formulados por pretendentes estrangeiros, residentes ou domiciliados fora do país. Nesta análise, são verificados se todos os documentos necessários estão presentes28: 1) estudo psicossocial, elaborado por agência especializada e credenciada no país de origem ou por determinação de autoridade judiciária competente; 2) atestado de sanidade física e mental do(s) requerente(s); 3) certidão criminal negativa do(s) requerente(s); 4) autorização expedida no país de origem, por autoridade competente, para realização de adoção de brasileiro; 5) texto da legislação específica do país interessado; 6) comprovante de renda; 7) certidão de casamento; 8) passaporte do(s) requerente(s); 9) atestado de residência do(s) requerente(s); 10) comprovante de vigência da legislação específica; 11) declaração firmada de próprio punho de ter ciência de que a adoção no Brasil é gratuita e tem caráter irrevogável; 12) Fotografias do(s) interessado(s), da família, etc; 13) Em caso de envio dos documentos diretamente através da Autoridade Central do país de origem, ou seja, sem intermediação de organismos estrangeiros, é necessária a remessa de uma declaração do(s) interessado(s) se comprometendo a enviar semestralmente, durante dois anos, os relatórios pós adotivos da(s) criança(s) adotada(s). - fornecer o respectivo laudo de habilitação, para instruir o processo judicial de adoção, após o exame da aptidão e capacidade do pretendente e a verificação de que a validade jurídica da adoção seja assegurada no país de origem do interessado, resguardados os direitos do adotado segundo a legislação brasileira. O laudo de habilitação terá validade 27 Art. 11 do Regimento Interno da CEJA/MG. 28 Art. 12, §1º do Regimento Interno da CEJA/MG

27 de 1(um) ano, sendo expedido em 4(quatro) vias, devendo conter os seguintes requisitos: numeração, qualificação dos pretendentes à adoção e da criança ou adolescente pretendidos, data de habilitação, prazo de validade, ressalva sobre a excepcionalidade estabelecida no art. 31 do ECA, anotação de sua validade no Estado e assinatura do Presidente da Comissão. - indicar aos pretendentes estrangeiros, depois de aprovada a sua habilitação, as crianças e adolescentes cadastrados, em condições de serem adotados, quando não houver pretendentes nacionais, ou estrangeiros residentes no país, interessados na adoção. Tal indicação é feita através da publicação de editais contendo a inicial nos nomes das crianças, data de nascimento e comarca de abrigamento. Após 30 dias, todos os estrangeiros habilitados poderão protocolizar requerimento informando o interesse na adoção, reservando os primeiros 15 dias do edital aos brasileiros interessados. (ver item 6.4) - organizar, para uso de todas as comarcas do Estado, cadastro geral unificado: de crianças e adolescentes, na situação prevista no art. 98

29

do ECA, que necessitem de colocação em lar substituto, sob a forma de adoção (sobre o cadastro de crianças e adolescentes, ver o item 6.4); de pretendentes estrangeiros, residentes ou domiciliados fora do país; de pedidos de habilitação à adoção de pretendentes nacionais e estrangeiros residentes no país, sem prejuízo do disposto no art. 50 30 do ECA. 29 “As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I- por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II- por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III- em razão de sua conduta.” 30 “A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção.§ 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público. § 2º Não será deferida a inscrição se o interessado não satisfazer os requisitos legais, ou verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 29. § 3º A inscrição de postulantes à adoção será precedida de um período de preparação psicossocial e jurídica, orientado pela equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, preferencialmente com apoio dos técnicos responsáveis pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar. § 4º Sempre que possível e recomendável, a preparação referida no § 3o deste artigo incluirá o contato com crianças e adolescentes em acolhimento familiar ou institucional em condições de serem adotados, a ser realizado sob a orientação, supervisão e avaliação da equipe técnica da Justiça da Infância e da Juventude, com apoio dos técnicos responsáveis pelo programa de acolhimento e pela execução da política municipal de garantia do direito à convivência familiar. § 5º Serão criados e implementados cadastros estaduais e nacional de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas ou casais habilitados à adoção. § 6º Haverá cadastros distintos para pessoas ou casais residentes fora do País, que somente serão consultados na inexistência de postulantes nacionais habilitados nos cadastros mencionados no § 5º deste artigo. § 7º As autoridades estaduais e federais em matéria de adoção terão acesso integral aos cadastros,

28 - manter intercâmbio com órgãos e instituições especializadas internacionais, públicas e privadas, estas últimas desde que credenciadas no país de origem, inclusive para estabelecer sistemas

de controle e

acompanhamento pós adoção no exterior (sobre as entidades estrangeiras, ver capítulo 5). - admitir a colaboração de agências ou entidades especializadas nacionais e estrangeiras, cadastradas na CEJA/MG, desde que idôneas, estas últimas regularmente credenciadas no país de origem (sobre as entidades estrangeiras, ver capítulo 5).

6.4- Da habilitação dos estrangeiros e do cadastro das crianças e adolescentes na CEJA

Quanto ao procedimento de habilitação na CEJA, os estrangeiros interessados em adotar uma criança ou adolescente neste Estado deverão protocolizar na secretaria da CEJA o pedido de habilitação, instruído dos documentos indispensáveis, já citados no item 6.3, em original ou cópias autenticadas e acompanhados das respectivas traduções juramentadas. Caso haja intermediação por entidade ou associação estrangeira, a esta incumbirá a apresentação do pedido de habilitação para adoção posterior. incumbindo-lhes a troca de informações e a cooperação mútua, para melhoria do sistema. § 8º A autoridade judiciária providenciará, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a inscrição das crianças e adolescentes em condições de serem adotados que não tiveram colocação familiar na comarca de origem, e das pessoas ou casais que tiveram deferida sua habilitação à adoção nos cadastros estadual e nacional referidos no § 5º deste artigo, sob pena de responsabilidade. § 9º Compete à Autoridade Central Estadual zelar pela manutenção e correta alimentação dos cadastros, com posterior comunicação à Autoridade Central Federal Brasileira. § 10 A adoção internacional somente será deferida se, após

º

consulta ao cadastro de pessoas ou casais habilitados à adoção, mantido pela Justiça da Infância e da Juventude na comarca, bem como aos cadastros estadual e nacional referidos no § 5º deste artigo, não for encontrado interessado com residência permanente no Brasil § 11º Enquanto não localizada pessoa ou casal interessado em sua adoção, a

.

criança ou o adolescente, sempre que possível e recomendável, será colocado sob guarda de família cadastrada em programa de acolhimento familiar. § 12º A alimentação do cadastro e a convocação criteriosa dos postulantes à adoção serão fiscalizadas pelo Ministério Público § 13º Somente poderá ser deferida adoção em favor de candidato domiciliado no Brasil não cadastrado previamente nos termos desta Lei quando: I - se tratar de pedido de adoção unilateral; II - for formulada por parente com o qual a criança ou adolescente mantenha vínculos de afinidade e afetividade; III - oriundo o pedido de quem detém a tutela ou guarda legal de criança maior de 3 (três) anos ou adolescente, desde que o lapso de tempo de convivência comprove a fixação de laços de afinidade e afetividade, e não seja constatada a ocorrência de má-fé ou qualquer das situações previstas nos arts. 237 ou 238 desta Lei. § 14º Nas hipóteses previstas no § 13 deste artigo, o candidato deverá comprovar, no curso do procedimento, que preenche os requisitos necessários à adoção, conforme previsto nesta Lei.



29 O pedido será distribuído, aleatoriamente, a um dos membros da Comissão, que atuará como relator. A equipe técnica da CEJA emitirá parecer e o processo será encaminhado ao relator que o levará para deliberação em sessão plenária. A CEJA/MG reunir-se-á ordinariamente duas vezes por mês, com a presença da maioria absoluta de seus membros e, extraordinariamente, por convocação do seu Presidente. Sendo o pedido deferido pela CEJA, receberá uma numeração de habilitação. Caso contrário, o processo entrará em diligência para reexame em cinco dias. A criança ou o adolescente serão indicados para o cadastro da CEJA/MG pelo Juiz de Direito da Infância da comarca de abrigamento, que enviará a seguinte documentação: a sentença de destituição do poder familiar com trânsito em julgado, a certidão de nascimento, o local de abrigamento e o estudo psicossocial. Deverá ainda certificar que não existem interessados nacionais na comarca para a referida adoção. Além disso, em cumprimento ao disposto no art. 331 Provimento 161/CGJ/2006

31

do

32

, os Magistrados que apreciam questões relativas

à Infância e Juventude encaminham à CEJA, mensalmente relação atualizada das crianças e adolescentes institucionalizados na comarca que atuam, com informações sobre a identidade das mesmas, identificação da instituição em que estão acolhidas, tempo e motivo do abrigamento, relatório psicossocial e se existe eventual processo envolvendo a criança. Algumas vezes, alguns relatórios constam apenas a identidade das crianças, data de nascimento e a 31 Os Juízes de Direito competentes para apreciar questões relativas à Infância e Juventude deverão, mensalmente,



encaminhar à CEJA, relação atualizada das crianças e dos adolescentes institucionalizados.SS 1º A relação será elaborada sob a responsabilidade do Juiz de Direito da Comarca ou da Vara, independentemente de sua condição de substituto ou titular, que a firmará, e deverá conter os seguintes dados obrigatórios, sem prejuízo de outros que entender cabíveis e necessários: I - nome e data de nascimento da criança ou do adolescente, preferencialmente com a certidão, ou cópia, do registro de nascimento; II - relato sobre a identidade da criança ou do adolescente, contemplando a sua disponibilidade para adoção, o meio social, o histórico médico, pessoal e familiar, assim como quaisquer peculiaridades de origem cultural, étnica ou religiosa; III - nome dos pais; IV - identificação da instituição onde a criança ou adolescente está abrigado, inclusive com endereço completo, telefone e nome dos responsáveis; V - tempo e o motivo do abrigo; VI - existência de eventual processo envolvendo a criança ou adolescente e, em caso positivo, a respectiva fase; VII - informação sobre a destituição do poder familiar; e VIII - número de instituições existentes no âmbito da Comarca, inclusive com endereço completo, telefone e nome dos responsáveis. SS 2º A relação de que trata o SS 1º deste artigo deverá ser atualizada trimestralmente, também sob a responsabilidade do Juiz de Direito competente e encaminhada à CEJA.



32 Codifica os atos normativos da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais.

30 instituição em que se encontram abrigadas. Assim, a CEJA faz uma análise do relatório, e, verificando que uma criança se encontra em idade muito avançada, requisita informações ao Juiz de Direito da comarca de abrigamento das crianças, tais como se há algum processo envolvendo a criança com a finalidade de se iniciar o procedimento de destituição do poder familiar, para possibilitar

uma

futura

adoção.

Dessa

forma,

tais

relatórios

são

importantíssimos para agilizar e tornar mais eficaz o processo de adoção. Após o encaminhamento dos documentos necessários para o cadastramento na CEJA pelo Juiz de Direito, a Comissão irá verificar a destituição do poder familiar, transitada em julgado, para cadastrar e expedir edital para adoção com as informações seguintes: iniciais dos nomes dos menores, datas de nascimento e comarca de abrigamento. Após 30 dias, todos os estrangeiros habilitados poderão protocolizar requerimento informando o interesse na adoção, reservando os primeiros 15 dias do edital aos brasileiros interessados. Verificados mais de um pedido de adoção para a mesma criança, de estrangeiros já previamente habilitados na CEJA/MG, serão analisados pelo setor técnico e encaminhados ao relator do processo da habilitação mais antiga que os levarão a julgamento pela comissão em sessão plenária. Existe uma ordem a ser observada. Haverá preferência ao pretendente estrangeiro habilitado na CEJA há mais tempo (ordem de antiguidade), desde que atenda aos melhores interesses da criança disponibilizada para adoção internacional. Se houver brasileiros residentes no exterior dentre os interessados, estes terão preferência mesmo perante ao de habilitação mais antiga. Há preferência também para pretendentes que aceitem a adoção de irmãos sem separá-los. Na sessão plenária ao mínimo por maioria de votos, concedido provimento ao pedido de adoção, será expedido o laudo de habilitação, que conterá os nomes da criança e dos pretendentes aceitos pela CEJA, e será enviado ao Juiz de Direito da Infância da Comarca de abrigamento da criança, para acompanhar o estágio de convivência e proferir a decisão final quanto à adoção. 6.5- Do acompanhamento pós-adotivo

31 A Comissão preocupa-se com o destino das crianças, após adotadas,

considerando

necessário

o

acompanhamento

posterior

ao

deferimento da medida, por considerar que a adoção internacional é medida excepcional.

Assim,

concretizada

a

adoção,

a

CEJA/MG

faz

o

acompanhamento, pelo período mínimo de dois anos, através de relatórios pós-adotivos

semestrais

encaminhados

à

comissão

pelos

casais

ou

organismos estrangeiros. De acordo com o art. 17, V do Decreto 5.491, de 18 de julho de 2005, o organismo credenciado tem como obrigação, dentre outras, “apresentar relatórios semestrais de acompanhamento do adotado às Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção Internacional – CEJAIS pelo período mínimo de dois anos, independentemente da concessão da nacionalidade do adotado no país de residência dos adotantes.” Tal acompanhamento das crianças brasileiras adotadas por casais estrangeiros é de suma importância, na medida em que, a partir dos relatórios enviados, será possível analisar como está sendo a adaptação da criança a seu novo lar, à nova cultura, língua, etc, bem como seu relacionamento e envolvimento com seus novos pais. Do ponto de vista sócio-cultural, a todo instante surgem questionamentos sobre as possibilidades de êxito de uma criança numa sociedade cultural, lingüística e racialmente distinta de sua origem. As investigações realizadas em diversos países já oferecem condições de avaliar se as crianças adotadas por estrangeiros, hoje adolescentes ou adultos, têm tido problemas dessa ordem. A experiência documentada na CEJA/MG, através da análise de diversos processos envolvendo a adoção de menores brasileiros por casais estrangeiros e da análise dos relatórios pós-adotivos (ver relato de casos no capítulo 7), revelam que a maioria destas adoções internacionais, feitas com a rigorosa observância dos critérios legais, tem alcançado notável sucesso na sua finalidade superior de promover a integração plena da criança em seu novo meio familiar e social. O êxito das adoções comprova, mais uma vez, o que há muito a adoção internacional vem demonstrando: que os vínculos familiares se nutrem muito mais de afeto do que de sangue.

32

7- RELATO DE CASOS COLHIDOS NA CEJA/MG

7.1- Adotantes: M.M e R.S País: Itália Associação: CIFA Adotados: E.O.N.L. e J.P.O.

A genitora das crianças E.O.N.L. e J.P.O.F. fazia uso imoderado de bebidas alcoólicas e deixava os filhos trancados em casa. Ela responde por processo criminal por atear fogo na casa em cujo interior se encontravam todos os filhos. O genitor é dependente químico, havendo informações que ele dorme e trabalha na rodoviária. Os genitores têm uma residência, apta a receber os filhos, mas nenhum deles aderiu a nenhum tratamento de dependência química, revelando, assim, condutas abandônicas, tanto no âmbito material quanto no afetivo e emocional. Foi decretada, portanto, a perda do poder familiar. Após o regular trâmite do processo de adoção e deferida esta ao casal M.M e R.S, as crianças chegaram na Itália no dia 28/03/2009. Segundo os relatórios pós adotivos enviados à CEJA/MG, primeiramente, E.O.N.L. apresentou comportamentos de resistência e oposição às regras e à disciplina, não reconhecendo a autoridade das pessoas adultas, sobretudo das mulheres. Todavia, no segundo semestre esses comportamentos não se repetiram, aceitando ser orientada pela mãe que conquistou sua confiança e à qual se sente muito ligada. J.P.O.F. é descrito como uma criança ativa, que possui facilidade de ganhar a atenção e simpatia dos colegas e das pessoas adultas. Demonstrou boa capacidade no uso da língua italiana. Os cônjuges adotantes solicitaram ajuda dos profissionais da agência sanitária local e dos técnicos da CIFA, diante das dificuldades encontradas inicialmente. Disseram estar cansados pela tentativa contínua de adequada aproximação das dificuldades das crianças, mas, sobretudo apresentaram-se fortes, com boa vontade e capacidade de refletir, dispostos a descobrir outras modalidades de interação com elas. O pai adotivo mostrou-se

33 mais objetivo e reflexivo. A mãe adotiva mostrou-se mais envolvida no ponto de vista afetivo. Ambos demonstraram uma afetuosa aproximação física, acolhendo-os com abraços e sorrisos. Foi salientado que, com a superação progressiva das experiências iniciais, no segundo semestre consolidaram suas funções parentais. As crianças estão recebendo adequada atenção à saúde, com atualização do cartão vacinal e controles periódicos. Nos relatórios escolares constam que ambos os menores foram matriculados no Instituto Integrado Estadual “Folgore de San Gimignano” desde o início de abril de 2009. A relação escola-família foi constante, positiva e marcada por uma máxima colaboração. E.O.N.L.foi aprovada e iniciou o terceiro ano, sendo salientado que demonstrou extrema vontade de aprender e obteve boa integração no grupo escolar. Participou de projeto de aprendizagem da língua italiana a alunos oriundos de outros países. J.P.O.F. estabeleceu boas relações com os colegas e com as professoras. Apresentou discreta capacidade de se expressar

na

língua

italiana,

boas

capacidades

de

memorização

e

aprendizagem e preferência por jogos livres e de movimento. No segundo semestre, mostrou-se sensível às repreensões e solicitações das professoras, aprendendo a respeitar as regras da comunidade escolar. Foi demonstrado por fotografias que as crianças estabelecem uma boa inserção social e familiar, participando ativamente das atividades escolares, datas festivas, atividades esportivas e recreativas, especialmente junto a outras crianças. E.O.N.L. freqüenta um curso de ginástica desde setembro de 2009, conseguindo bons resultados, o que é motivo de orgulho para os pais. Após a grande mudança enfrentada nos primeiros meses e as dificuldades iniciais superadas, mostramse sempre mais adaptados à nova realidade. Conclui-se que o processo de inclusão no novo núcleo familiar e social tem ocorrido de modo favorável, propiciando um contexto adequado ao desenvolvimento físico e psicossocial das crianças. O casal empenha-se na aproximação das reais necessidades das crianças, promovendo sua ampla integração sócio-familiar e provendo-as tanto de recursos materiais como afetivos.

7.2- Adotantes: M.S e S.P. País: Itália

34 Associação: Ai.Bi. Adotados: S.P. e I.P.S. Os irmãos são filhos biológicos da mesma mãe e de pais distintos. Sempre moraram junto da mãe. O relacionamento e vínculo afetivo entre S.P. e I.P.S. são estreitos, daí a necessidade de mantê-los juntos em uma mesma família. Ambos foram vítimas de maus-tratos, agressões física e psicológicas por parte do padrasto e omissão por parte da genitora. Há várias denúncias contra o companheiro da mãe, o qual chegou a fraturar o braço de S.P., além de ter-lhe tirado o gesso fora da época estabelecida. Ademais, exigia que as crianças lambessem o chão para limpar o que sujavam e obrigava-os a fumar maconha e cheirar cocaína. Decretada a perda do poder familiar e após o regular trâmite do processo adotivo, foi deferida a adoção ao casal M.S. e S.P. As crianças chegaram à Itália em abril de 2008. Após cerca de dois anos na Itália, segundo os relatórios pósadotivos, é possível evidenciar que a inserção dos irmãos na nova família parece proceder de forma positiva. No âmbito das relações, os meninos parecem ter construído um vínculo afetivo seguro e forte com ambos os pais, não obstante as dificuldades encontradas no primeiro período no Brasil e durante os primeiros meses na Itália. O casal conta que as crianças tiveram dificuldades para conseguirem confiar completamente nos pais. Atualmente, porém, ambos mostram um profundo vínculo afetivo com os pais em quem confiam serenamente. Os relatórios contam que as crianças se mostram adequadas e serenas. Não obstante ainda seja possível notar alguns sinais de sofrimento ligados às suas vivências no Brasil, ambos os irmãos conseguiram se integrar na nova família e na comunidade sem particulares dificuldades. O casal afirma ter encontrado na própria comunidade pessoas acolhedoras e sensíveis, que ajudaram seus filhos a sentirem-se acolhidos e integrados. Em relação à inserção social, ambas as crianças freqüentam com sucesso a escola, I.P.S. na sexta série e S.P. na segunda. Os pais mostram um comportamento educativo de referência, levando os meninos a terem um maior empenho nas matérias nas quais sabem que eles podem ir melhor e aceitando os resultados apenas suficientes nas áreas ou matérias de estudo

35 nas quais persistem algumas dificuldades, apoiando ambos os filhos. I.P.S. obteve ótimas notas e avaliações positivas por parte dos professores, que segundo contam os pais, se mostram muito satisfeitos com o percurso de estudo do garoto. I.P.S mostra um grande empenho nos estudos e atinge resultados que sobressaíram-se, sobretudo em matemática e em língua espanhola, além de manifestar ótimas relações com os colegas, pelos quais é conhecido como ponto de referência. S.P. freqüenta a segunda série com sucesso, seja pela formação, tendo obtido ótimos resultados, seja pelas suas relações, mostrando boa integração com os colegas de classe. Ainda que tenha um temperamento muito diferente daquele do irmão, mais inclinada à introspecção e à tranqüilidade, a menina pôde construir vínculos de amizade muito fortes com algumas colegas de sala, com quem compartilha tudo. Em relação ao desenvolvimento psico-físico, ambos gozam de boa saúde e mostram um bom andamento do crescimento desde que chegaram à Itália. I.P.S. está estudando espanhol com sucesso e também inglês, mas com um pouco mais de dificuldade. Os pais contam que mantém também o português. A irmã do pai começou há alguns meses os procedimentos para o processo adotivo e os meninos se mostram entusiasmados com a situação que os permitirá acolher um primo, bem como reviver muitas passagens da própria história. Conclusivamente, considera-se que, até o momento, a inserção dos menores na nova família se dá de forma positiva e que os pais são dotados de todos os requisitos afetivos e educativos necessários para dar continuidade positiva à experiência adotiva.

7.3- Adotantes: S.G.A.M e C.M.P.M. País: França Associação: A.P.C. Adotada. M.O.L.

A genitora de M.O.L. era prostituta, dependente química e, desde a gestação manifestava o desejo de doar a menina. Após o nascimento, a

36 criança foi deixada sob os cuidados de um casal. Desde então, a mãe biológica não mais a procurou. Foi decretada a destituição do poder familiar em relação à mãe biológica. Na certidão de nascimento da infante, não houve o assentamento do nome do genitor. A menina tem um triste histórico de rejeição, marcado por quatro tentativas mal sucedidas de inserção em família substituta. A primeira experiência durou dois anos. M.O.L. foi colocada na companhia de um casal, quando ainda era bebê. Nesse período, a menor era deixada, ora na companhia dos avós maternos “adotivos”, ora com os pais “adotivos, existindo incoerência na educação transmitida por essas pessoas. Tal fator interferiu em sua formação. A infante passou a apresentar problemas de comportamento, teimosia e agressividade. Teve dificuldade de adaptação nas instituições que freqüentou (creches e hoteizinhos), caracterizada por choro e problemas de saúde. Na mesma data em foi deixada na Vara da Infância, M.O.L. foi entregue ao segundo casal, sob guarda provisória. Depois de deis meses, ela foi devolvida, sob a alegação de que apresentava rebeldia e desejo de consumir bebida alcoólica. Na quarta e última experimentação, a menina esteve sob os cuidados de tutores, durante três anos e nove meses. Inicialmente, o casal pleiteou a sua adoção, para depois modificar a ação para tutela, retirando da menor os direitos sucessórios em relação a si. Desde o início da convivência familiar, os guardiões orientaram a infante a chamá-los de padrinho e madrinha. Devolveram-na à Justiça, alegando que a criança respondia com rispidez e agressividade, questionava suas ordens, era pirracenta e implicante. M.O.L afirmou que os padrinhos a tratavam com indiferença e que seus filhos biológicos a maltratavam. Finalmente, após o regular trâmite do processo de adoção, esta foi deferida ao casal francês S.G.A.M e C.M.P.M.. Os três chegaram à França em setembro de 2009. A família organizou um almoço para a chegada de M.O.L. Foram também organizadas festas e boas vindas com os vizinhos. De acordo com o primeiro relatório pós-adotivo encaminhado à CEJA, houve uma excelente integração familiar. A menina se dá bem com seus tios, tias, avós, primos e primas. Gosta de estar em casa, do seu quarto, do jardim de sua casa. Se sente à vontade em seu novo ambiente e conhece toda a vizinhança. Aprendeu o francês muito rápido, principalmente na escola. Tem

37 excelente saúde, nunca fica doente. Dorme e come muito bem. As vacinas já haviam sido feitas no Brasil e estão em dia. M.O.L. fala muito bem o francês. Na escola está em um nível que corresponde a apenas um ano de atraso em relação à sua idade. É uma ótima aluna (em matemática, ditado e em francês). Gosta de ler, principalmente poesia. Está aprendendo espanhol. A menina tem um bom relacionamento com os seus professores e com seus colegas que a elegeram como mediadora da sua sala, que é a aluna que atua como intermediária na solução de conflitos na classe. Ela não gosta de faltar a nem um dia de aula. Pratica dança moderna, que ela mesma pediu. É muito assídua, sempre muito concentrada e não gosta de faltar. Gosta de bicicleta e de ir pescar e caçar com seu pai. A menina permanece ainda um pouco fechada. Tem ainda dificuldades para expressar o que sente. Tem também uma tendência em se fazer de vítima, em se sentir perseguida pelos outros. As marcas de suas “adoções” anteriores, com todos os seus problemas, o seu sentimento de rejeição, são sentimentos ainda presentes em seu discurso e atitudes. Para M.O.L., a grande mudança que ela está vivendo – mudança de país, de cultura, de alimentação, de língua – foram e são difíceis de administrar e ela está se libertando pouco a pouco desse passado. Os pais são orgulhosos de sua filha e parecem estar felizes juntos.

7.4- Adotantes: R.E.A.L. e D.P.L.L. País: França Associação: A.P.C. Adotados: J.K.R., C.R e A.C.R.

As crianças J.K.R., C.R e A.C.R. têm mais dois irmãos, L.R e U.R. que foram adotados por outro casal também francês. Todas as cinco crianças foram abrigadas em meados de 2006. a institucionalização foi motivada pelo uso de violência física do padrasto de J.K.R. e genitor dos outros quatro. Os infantes eram submetidos à prática de mendicância. A genitora e o companheiro eram dependentes químicos e faziam uso de drogas e álcool na presença dos menores. Além dos maus tratos, as

38 crianças estavam sujeitas à privação de alimentos e moravam em local aberto sujeito às intempéries. Os infantes manifestavam satisfação por estarem abrigados, apesar de sentirem saudades da mãe, com quem mantinham vínculo afetivo. Entretanto, a genitora não efetuou qualquer esforço para retomar suas guardas, tendo deixado de visitá-los há quase dois anos. Foi decretada, portanto a destituição do poder familiar. As profissionais judiciais afirmaram existir forte vínculo entre os irmãos, o qual se aprofundou durante o período de abrigamento. Foi relatado que eles não admitem a hipótese de serem separados. O parecer técnico sugere que as crianças sejam adotadas conjuntamente. Na impossibilidade de manutenção do grupo reunido, podem ser formados dois ou três grupos, desde que os adotantes residam em uma mesma localidade e se disponham a manter o convívio entre os irmãos, o que de fato ocorreu. Após o regular trâmite do processo de adoção das crianças J.K.R., C.R e A.C.R. pelo casal R.E.A.L. e D.P.L.L., a família chegou à França em fevereiro de 2009. Segundo o primeiro relatório pós-adotivo enviado à CEJA, de maneira geral, as crianças têm um comportamento afetivo com seus pais. Entre eles há episódios de ciúme, cada um querendo estar mais perto de seus pais que os outros, solicitando carinho e atenção. As pessoas externas à família observam e comentam que as crianças estão felizes e bonitas. A.C.R é a que mais sente a separação de seus outros dois irmãos, quem vivem em Lyon. Ela pede para vê-los. Apresentou um episódio de saudade que os pais consolaram com palavras: “Eles têm outro papai e outra mamãe, eles estão felizes; eles pensam em você, e nós vamos revê-los, é claro, mas ainda não sabemos quando”. J.K.R é mais introvertido que seu irmão e sua irmã. Ele observa antes de se lançar em uma nova relação. A música o ajuda muito. C.R. é uma criança sociável. Faz amigos rapidamente, tem facilidade de ser aceito pelo grupo. Por outro lado, é mais influenciável. A.C.R. encontrou bem o seu espaço entre crianças de sua idade. É sempre convidada para os aniversários de seus colegas. Esperou impacientemente seu aniversário para festejá-lo em casa

39 com seus coleguinhas. Uma das primeiras coisas que ela fez esse dia, foi mostrar sua casa a eles, de maneira muito compenetrada. Na volta às aulas, os pais tiveram o cuidado de informar aos meninos que a atenção diferenciada que eles tiveram no início de sua escolarização, em março de 2009, era excepcional e que em setembro eles seriam tratados como os outros, que agora eles pertenciam completamente ao grupo e que eles não deveriam esperar um tratamento diferenciado. Esta realidade resultou numa pressão muito forte para J.K.R., que é plenamente consciente que ele tem mais dificuldades que seu irmão e sua irmã. Em todo o caso, essa apreensão foi passageira, pois depois da volta dos feriados de Finados, com ajuda de um curso de fonoaudiologia, ele ficou mais seguro e obteve resultados escolares que lhe motivaram a continuar a se esforçar. Quando a família atravessa momentos de crise, os pais constatam como as crianças têm a capacidade de “mudar de assunto”, sem guardar animosidade em relação à eles, nem se voltar contra si próprios. Os pais se reforçam quando à capacidade deles de assumir sua próprias dificuldades. Durante os feriados de Finados, os três foram para diferentes colônias de férias. Todos voltaram encantados. A experiência de separação respondeu ao desejo dos pais de que eles tenham lembranças individuais, propícias à construção de duas identidades. Os três irão em férias de inverno na montanha para descobrir o esqui. Há uma grande ternura e uma cumplicidade grande entre o casal. Os filhos são os que mais se beneficiam disto. É uma família sólida e bem construída. A inteligência e o amor são seus principais componentes.

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5- CONCLUSÃO

O direito à convivência familiar e comunitária foi alçado à categoria de direito fundamental por força da Constituição Federal que acolheu a doutrina da proteção integral, em detrimento da doutrina da situação irregular até então em vigor. Sob a ótica da doutrina da situação irregular, a institucionalização era considerada uma solução permanente para a criança ou adolescente que cometesse alguma infração ou cujos pais fossem ausentes ou, ainda, cuja família estivesse em situação de pobreza. Acreditava-se que, encaminhada a uma instituição e sob a orientação histórica de uma mentalidade higienista, a sociedade estaria protegida e as crianças e os adolescentes permaneceriam nessas instituições até o advento da maioridade. Em contraposição a esse ponto de vista, a doutrina da proteção integral tem por objetivo assegurar às crianças e aos adolescentes todas as condições para que se desenvolvam livres e dignamente. Como decorrência da referida doutrina, estabelece-se prioridade absoluta à efetivação dos direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, dentre os quais se insere o direito à convivência familiar e comunitária. A partir do nascimento de uma criança, a família se torna o seu principal núcleo de socialização. Os primeiros anos de vida da criança são marcados pela dependência do ambiente e daqueles que dela cuidam. Nesse contexto, o relacionamento estabelecido com os pais ou substitutos afigura-se fundamental para o desenvolvimento afetivo, físico e psicológico da criança. A família é fundamental porque é nela que a criança deve encontrar alimento, a segurança, o equilíbrio, o afeto e os cuidados individuais que devem ser oferecidos pelos pais. É a partir da família que poderá surgir ou não a capacidade da criança para construir novos vínculos, para desenvolver autoconfiança e auto-estima e para se tornar autônoma no futuro, quando necessitará ter autocontrole e capacidade para tolerar frustrações e angústias. É a família que fará a ponte entre a criança e o mundo que a cerca, auxiliando sua inclusão na comunidade e fazendo com que absorva regras, limites e

41 proibições necessárias à vida em sociedade. Assim sendo, a maneira como esta “ponte” é construída pelos pais ou substitutos será determinante para a formação do modo de ação e reação da criança no decorrer do desenvolvimento de sua personalidade. Dessa forma, uma análise mais profunda sobre o assunto, tendo em mente a situação atual das crianças desamparadas, nos mostra a necessidade de incentivar a adoção, buscando a aplicação do que preceitua a Declaração Universal de Direitos Humanos quando assevera que a infância tem direito a cuidados e assistência especiais, o que é incoerente com a circunstância de haver infantes relegados em instituições de caridade. É certo que hoje existe muita burocracia e entraves para que sejam

efetivadas

adoções

internacionais,

demonstrando

talvez

um

nacionalismo tendente a enclausurar melhores oportunidades àqueles que têm possibilidade de vida melhor com uma adoção internacional, discriminando não a pessoa do adotante, mas o lugar de onde vem. Devem ser revistos os princípios norteadores da adoção internacional, desatando os aplicadores do direito da legalidade estrita e colocando-os frente à realidade social e o interesse da criança. Tal “interesse da criança” não deve ser entendido como o de permanecer no país de origem e sim o de ser adotada, já que uma criança não tem necessidade de um país ou de uma cultura, mas de amor e de uma família. A adoção internacional é o melhor recurso existente para as crianças brasileiras privadas do convívio com a família de origem e que não tiveram chance de colocação em famílias substitutas no Brasil. Desde que realizada em boas condições, com ética e com observância das regras estabelecidas pela legislação própria, não podemos deixar de incentivá-la.

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44 MINAS GERAIS. Resolução nº557/2008. Alterada pela Resolução nº592/2009. Dispõe sobre a criação da Comissão Estadual Judiciária de Adoção – CEJA/MG – e sua regulamentação.

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