Adriano Moreira de Castro e a Castrália

August 6, 2017 | Autor: Alda Neto | Categoria: Emigração Portuguesa
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Adriano Moreira de Castro e a Castrália Alda Neto*

Resumo:

O Norte do país foi, durante a segunda metade do século XIX e o primeiro quartel do século XX, um importante polo migratório para o Brasil. Neste artigo apresentaremos o percurso de um desses portugueses, Adriano Moreira de Castro, focando ainda a visibilidade atingida nos seus locais de origem, nomeadamente nas casas por eles construídas ou recuperadas. A Castrália, casa mandada construir por este emigrante, constitui a manifestação em terras paredenses desta vontade de ser bemsucedido e, em simultâneo, de procurar retratar/conservar as memórias que trouxe do Brasil.

Palavras-chave: Brasileiros; Casas de Brasileiro; Pará.

Abstrat:

Between the second half of the nineteenth century and the first quarter of the twentieth century, the north of the country was an important centre of migration to Brazil. In this article, we will present the route of a Portuguese man, Adriano Moreira de Castro, and focus the visibility of these immigrants in their native lands, specially by the houses they built or recovered. Castrália in Paredes, which is the house built by this immigrant, reflects the will of being successful and of collecting memories brought from Brazil.

Keywords: Brazilians; Brazilian’s Houses; Pará.

A emigração no século XIX tornou-se um fenómeno singular, uma vez que houve um progressivo desequilíbrio e agravamento das Revista Estudos Amazônicos • vol. VII, nº 1 (2012), pp. 65-94

estruturas socioeconómicas em Portugal. A agricultura era a atividade económica preponderante num país que estava dividido em vastas extensões de terras a sul do Rio Tejo e pequenas parcelas a norte. O fenómeno migratório apresentava-se, desta forma, como uma alternativa à degradação da estrutura fundiária e uma consequente urbanização dos campos. Os portugueses deslocaram-se para as cidades do litoral português, nomeadamente Lisboa e Porto. No entanto, estas cidades revelaram-se incapazes de proporcionar a esta imensa massa um trabalho e uma consequente melhoria das condições de vida e este facto terá contribuído para o aumento da emigração. A movimentação de mais de quatro milhões de portugueses desde meados do século XIX, para além de aspetos demográficos e económicos, envolve componentes sociais e culturais de grande importância, como, por exemplo, a própria mobilidade social que se opera no regresso dos emigrantes, as transferências de conhecimentos profissionais e de tecnologia, aculturação, assimilação, integração ou repulsa, relativamente aos novos padrões culturais encontrados. A agricultura constituiu o sector de onde saiu a maior parte da mão de obra para o Brasil. Observe-se o exemplo do brasileiro Adriano Moreira de Castro que emigrou para o Brasil como tentativa de fuga à atividade agrícola.

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Ilustração 1 - Adriano Moreira de Castro por Felipe Fidanza (arquivo particular da Castrália)

Entre 1888 e as duas primeiras décadas do século XX, houve um crescimento das correntes e fluxos migratórios provenientes da Europa, em direção ao Brasil. As atividades urbanas (comércio e indústria), nomeadamente nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, tornaramse a principal ocupação da comunidade portuguesa. No entanto, os portugueses deslocaram-se para todo o território brasileiro e ocuparamse das mais variadas atividades desde a agricultura à indústria ou até mesmo à política. Adriano Moreira de Castro constitui um dos variados exemplos de portugueses que partiram para o Brasil, na segunda metade do século XIX, e que regressaram nos finais de Oitocentos ao seu país de origem enriquecidos ou economicamente remediados. Estes homens que partiram das várias freguesias do concelho de Paredes, a partir da segunda metade do século XIX e nas duas primeiras décadas do século XX, fizeram-no por questões de sobrevivência económica. Aliás, ao Revista Estudos Amazônicos • 67

chegarem ao Brasil destacaram-se, sobretudo no comércio e na indústria. Adriano Moreira de Castro nasceu na freguesia de Louredo, concelho de Paredes (Portugal) a 09 de dezembro de 1858. Os seus pais, Joaquim Ribeiro Coelho da Silva Moreira e Margarida de Sousa e Castro, eram caseiros numa propriedade rural na mesma freguesia. Por volta de 1872, emigrou para o Brasil. Este paredense desembarcou na cidade de Belém do Pará, onde começou por ser aprendiz no comércio para, alguns anos mais tarde, criar a empresa Araújo, Castro & Cª. Esta empresa tornou-se numa das mais importantes empresas, nos finais do século XIX, no Estado do Pará. Trabalhou no Estado do Pará ao longo do último quartel do século XIX, tendo regressado, provavelmente, a Portugal no início do século XX. Na cidade de Belém do Pará casou com Maria Angélica de Magalhães, uma portuguesa natural de Melgaço. Esta faleceu a 22 de outubro de 1894, tendo deixado uma única filha, Enedina Moreira de Castro. Posteriormente, viria a casar com Gregória Pacheco de Castro, natural do Estado do Pará. Após a sua chegada, fixou residência na freguesia de Louredo, onde adquiriu um grande número de terrenos, tendo utilizado um deles para a construção de “(…) uma linda e apalaçada vivenda da Castrália, que é um folgar de olhos pelas belezas que aí encerra.”. O “brasileiro” Adriano Moreira de Castro procurou criar os meios para que as crianças da sua aldeia natal pudessem frequentar as escolas. Para além das condições criadas, o “brasileiro” doou à sua freguesia natal uma escola para a aprendizagem das primeiras letras por ambos os sexos, tal como a residência para os professores. É importante, ainda referir, que no concelho de Paredes foram construídas várias escolas por iniciativa dos “brasileiros” recém-regressados que procuraram dotar as principais freguesias destes espaços. Uma das escolas, mandadas construir pelo Conde Ferreira, foi erigida na freguesia de 68 • Revista Estudos Amazônicos

Castelões de Cepeda, sede do concelho de Paredes. Em

1912,

foi

eleito

Presidente

da

Comissão

Municipal

Administrativa do Concelho de Paredes, tendo pedido exoneração do cargo nesse mesmo ano. Entre 1912 e 1918, procedeu ao financiamento da construção de uma escola na freguesia de Louredo. Em 1918, a escola foi inaugurada com a presença de importantes personalidades da época, entre elas, D. António Augusto de Castro Meireles e José Coimbra Pacheco, proprietário da Estância de Louredo. O Ministro da Instrução, Dr. Alfredo Magalhães, foi convidado para a inauguração, mas não esteve presente na mesma. O jornal República, no dia 12 de Outubro de 1918, publicou um artigo sobre o brasileiro e a inauguração da escola, salientando sobretudo a defesa da instrução como um valor republicano – “Depois do pão, a educação é a primeira necessidade do povo” (frase transcrita na fachada principal da escola). Desta forma, Adriano Moreira de Castro é exaltado como um modelo dos ideais republicanos, assentes sobretudo na instrução e na educação do povo. Este “brasileiro” defendia o alargamento da instrução a todas as classes sociais, ajudando para tal os mais necessitados através da concessão de bolsas de estudo, ou mesmo da dádiva dos materiais necessários, como é ainda recordado por algumas pessoas da freguesia. O “brasileiro” Adriano Moreira de Castro organizou uma grandiosa festa aquando da inauguração da escola de Louredo, em 1918. Para esta festa, o “ brasileiro” convidou todos os presentes, entre eles jornalistas dos mais importantes periódicos portuenses (“O Comércio do Porto” ou “ Jornal de Notícias”), a participarem na recepção que organizou na sua vivenda “Castrália”. Após a inauguração do edifício, Adriano Moreira de Castro instituiu donativos anuais para que os jovens mais necessitados pudessem frequentar a escola, mas também criou prémios de mérito escolar. Apesar desta intervenção na escola, a memória prevalece em relação à Revista Estudos Amazônicos • 69

atitude de beneficência. O

seu empenho e trabalho em prol

da instrução foram

reconhecidos em 1936, pelo Presidente da República, General Óscar Carmona. A 7 de Abril desse ano foi-lhe conferido o título de Cavaleiro da Ordem da Instrução Pública. O ”brasileiro” foi um constante impulsionador da imprensa regional, destacando-se como colaborador, mas, também, como principal financiador. Este “ brasileiro” afirmou-se, ainda, entre a comunidade local, e mesmo a nível nacional, pela demonstração dos seus ideais políticos e pelos vários textos que redigiu para o jornal “A Behetria de Louredo” e para o “Almanaque Luso-Brasileiro”, editado por Parceria A. M. Pereira. Relativamente ao jornal “A Behetria de Louredo”, publicado entre os anos de 1921 e 1922, este foi um dos principais financiadores. Os textos redigidos constituem apologias ao Estado do Pará e ao Rio Amazonas e, também, verdadeiros enigmas alusivos à sua terra natal e à sua terra de eleição. Criou, ainda, pequenos contos onde os protagonistas são, na sua maioria, um jovem de origens humildes que parte para o Brasil e a rapariga e os pais que aguardam a sua chegada, rodeado de grande riqueza. Alguns destes textos tinham como tema animais, como a mosca. Em todos os exemplos referidos, Adriano Moreira de Castro procurou rever o percurso realizado e a busca da riqueza e, simultaneamente, valorizar o Estado do Pará como neste exemplo: Linda terra paraense / Deixa que um teu amigo, / Te recorde e em ti pense / E vê conversar contigo. / Despedi-me aí de tudo, / Quando embarquei no vapor, (…) Terra de grandes poetas / jardins, parques, monumentos, / De mui

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frondosas florestas/ Eléctricos melhoramentos. (…) 1

A sua filantropia estendia-se às festas populares, quer no concelho de Paredes, quer no concelho vizinho de Penafiel. Veja-se o exemplo da festa em honra de São Sebastião (Louredo – Paredes) ou a Festa de Nossa Senhora da Saúde (Bustelo – Penafiel) cujas despesas foram suportadas integralmente por este brasileiro. Do ponto de vista ideológico, Adriano Moreira de Castro era um fervoroso defensor dos ideais republicanos, tendo inclusive patrocinado a realização de vários comícios no concelho de Paredes e, alguns destes, na sua vivenda Castrália. Este, também, organizou um importante comício republicano a 29 de Abril de 1911. As Igrejas, Misericórdias e Confrarias constituíram uma outra área de atuação destes “brasileiros de torna-viagem”. No que concerne à Santa Casa da Misericórdia de Paredes, Adriano Moreira de Castro realizou um grande número de ofertas pecuniárias para a construção do Hospital. O retrato deste benemérito encontra-se exposto na galeria dos Irmãos Beneméritos da Irmandade da Misericórdia de Paredes, tal como aconteceu com o Comendador António Pereira Inácio, importante emigrante paredense no Estado de São Paulo. Nas suas doações à Misericórdia de Paredes, procurou honrar

outros “brasileiros”

paredenses que não conseguiram obter tanto sucesso como ele. O “ brasileiro” Jerónimo de Barros (jornalista, natural de Sobrosa, emigrou para o Brasil, criador e diretor do jornal “A Redenção”), esquecido pelos seus conterrâneos, logo após a sua morte, foi homenageado por este através da doação de uma quantia avultada, para a construção de uma parede no Hospital. Mesmo após a sua morte, contemplou no seu testamento uma quantia de 20 contos, a ser utilizada no Hospital da Irmandade da Misericórdia de Paredes. Revista Estudos Amazônicos • 71

Esta imagem de benemérito nem sempre corresponde ao perfil que se construiu do “brasileiro”, já que este é visto como um avarento pela literatura portuguesa, como é o caso de algumas obras de Camilo Castelo Branco, entre elas “Os Brilhantes do Brasileiro”. No entanto, este “brasileiro” demarcou-se desta visão, pois coube-lhe um papel extremamente importante na divulgação da instrução e no auxílio aos mais pobres. Apesar destas atitudes notáveis, é necessário realçar que muitos dos atos de filantropia tinham como principal objetivo a comenda ou um título nobiliárquico. A Casa de “brasileiro” é um dos principais vestígios materiais da emigração para o Brasil e do regresso destes portugueses. As casas construídas pelos emigrantes, na segunda metade do século XIX e no início do século XX, foram catalogadas como objetos bizarros e perturbadores da ordem e simplicidade da paisagem nortenha. Escritores como Camilo Castelo Branco ou Júlio Dinis descreveram as casas de “brasileiros” dando-lhes um cunho anedótico. A título de exemplo, Camilo Castelo Branco, em “O Senhor do Paço de Ninães”, descreve a casa do emigrante, atendendo sempre à falta de gosto característica do seu proprietário: Andados, pois, mil passos na quebrada da ramalhosa encosta, nos sai de rosto uma casa de dois sobrados, caiada, azulejada, com suas colunas pintadas de verde e como de papelão grudado à parede, com as bases amarelas e os vértices escarlates.

Vão-se

os

olhos

naquilo!

Esta

maravilha arquitectónica devem-na as artes ao gosto e génio pinturesco de um rico mercador que veio das luxuriantes selvas do Amazonas, com todas as cores que lá viu de memória, e todas

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aqui fez reproduzir sob o inspirado pincel de trolha, o qual se havia ensaiado num S. Miguel de retábulo de alminhas com uma fortuna digna de Itália.2

As descrições camilianas da casa de “brasileiro” inserem-se na paisagem rural do Minho e procuram exprimir, sobretudo, o novoriquismo, bem como a incoerência e mau gosto artístico. Como se pode constatar, não foi só o “brasileiro” alvo das críticas literárias, mas também a casa, cuja descrição tem de ser encarada como um mero exercício literário, uma vez que se de facto houve casas que, quer nas suas cores, quer nos materiais ou decoração usados se assemelham às descrições literárias, outras há que são bastante diferentes e que têm sido menosprezadas por este “fardo” que lhes foi imposto pelos escritores da época. Esta visão literária não pode nem deve ser encarada de uma forma tão linear, uma vez que algumas referências apresentadas constituem uma realidade. Por exemplo, o azulejo que é uma referência habitual nestas descrições foi de facto um dos materiais cujo uso no exterior foi introduzido e vulgarizado pelos “brasileiros”. Salientam-se, ainda, outros elementos decorativos presentes nestas casas que variam entre as torres com pináculos ou cataventos e as estátuas que rematam os telhados ou os portões. O colorido das fachadas é visível num grande número de edifícios. O jardim, limitado por um gradeamento e fechado por portões de ferro forjado, assume uma grande importância, uma vez que este constitui uma tentativa de recriação do ambiente exótico brasileiro. Esta construção é a expressão da vitória e da riqueza de uma vida de trabalho, mas ao mesmo tempo constitui a busca de uma identidade social e, simultaneamente, psicológica, cujos contornos se confundem entre a admiração dos naturais da sua aldeia e a aprovação, Revista Estudos Amazônicos • 73

o poder económico e a aceitação dos novos modelos que traz consigo. A casa de “brasileiro” constitui um dos investimentos que o “brasileiro” faz na sua terra natal, alterando por completo quer a paisagem, quer o quotidiano de todos aqueles que ali habitam. Esta alteração é visível não só nas características supracitadas, mas também nas relações que, de ora em diante, se passam a estabelecer nesta casa que abre as suas portas a todos aqueles que a queiram visitar. Como o arquiteto José Carlos Loureiro afirma (…) Aquilo que ontem parecia sem valor, deturpado por

visões

críticas

viciadas

por

premissas rígidas ou distorcidas, surge amanhã como símbolo do gosto de uma época, como testemunho de uma tecnologia até aí de valor insuspeitado, representativa de valores sociais positivos ou negativos, mas de inegável valor histórico e artístico. 3

É importante que as “casas de brasileiros” comecem a ser encaradas como o testemunho de uma época que contribuiu, não só para introduzir novos materiais como para desenvolver um mercado de trabalho ao nível dos ofícios e das indústrias a elas ligados, mas também novas práticas arquitetónicas e decorativas. Assim, consideramos importante referir um exemplo associado ao emigrante que temos vindo a referir – a “Castrália”. Para além de toda a atividade de benemerência desenvolvida por Adriano Moreira de Castro, este

se

destacou

pela

construção

de

um

edifício

que

foi,

simultaneamente, a sua habitação e um espaço de convívio entre todas as classes sociais. A casa de “ brasileiro” é o espaço de receção não só dos familiares, mas de todas as novas amizades que o emigrante, 74 • Revista Estudos Amazônicos

entretanto, estabeleceu. A “Castrália” constituiu simultaneamente o ponto de encontro de republicanos, intelectuais e dos mais necessitados. Se neste espaço se organizaram comícios republicanos, também a casa foi visitada por ilustres personagens, como o bispo D. António Augusto de Castro Meireles,4 José Coimbra Pacheco5 e Leónidas de Castro Melo.6 Este último visitou Adriano Moreira de Castro em 1911, tendo manifestado publicamente na imprensa local o seu apreço pelo brasileiro Adriano Moreira de Castro e pela atividade filantrópica desenvolvida. Os habitantes mais necessitados de Louredo também eram uma constante na “Castrália”, uma vez que o “brasileiro” procurava auxiliar todos aqueles que o procuravam, como se constata pela atribuição de bolsas de estudo e cabazes ou pelos jantares de Natal realizados na escola. Em 1911, o periódico “A Redenção” publicou um artigo alusivo à “Castrália”. Neste artigo é dada a notícia da criação de uma composição musical, uma valsa, em honra da “Castrália”. Esta composição era da autoria de Álvaro Teixeira Lopes. O snr. Álvaro Teixeira Lopes, exímio musicista portuense, escreveu uma linda, cadenciosa e, por vezes, saltitante valsa, que baptisou com o título acima [Castrália], como homenagem ao nosso amigo e antigo republicano Snr. Adriano Moreira de Castro, a quem a offertou. O nosso amigo, sensibilisado

em

extremo

com

a

gentil

lembrança, já mandou para a Alemanha o original, a fim de imprimir umas centenas de exemplares, com parte dos quaes quer retribuir a gentileza do autor, para este expor à venda.7

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À semelhança desta publicação, Adriano Moreira de Castro encomendou, em 1909, uma coleção de três postais, que fez distribuir pelos seus familiares e amigos. Nestes postais, é visível a grandiosidade da edificação, bem como o próprio emigrante que se fez fotografar na sacada do primeiro piso.

Ilustração 2 - Postal da Castrália – 1909 (Arquivo Particular da Castrália)

A “Castrália” caracteriza-se pela sua localização geográfica e implantação, uma vez que esta se encontra situada no centro da freguesia, próxima da igreja matriz. Numa das extremidades da propriedade localiza-se o cemitério paroquial, sendo rodeada por terrenos agrícolas, propriedade do “brasileiro”. A entrada principal realiza-se a partir da estrada municipal aberta em 1920. Esta casa foi construída pelo emigrante junto da casa dos seus progenitores, composta por um único piso. É nossa opinião que esta casa terá começado a ser construída no início do século XX e 76 • Revista Estudos Amazônicos

concluída por volta de 1909, data que se encontra assinalada no portão principal. Desde 1910, surgem referências à habitação deste “brasileiro de torna-viagem” na imprensa. A casa é referenciada com epítetos como linda, luxuosa, belíssima e apalaçada. Em 1922, o periódico “A Behetria de Louredo” narra-a da seguinte forma: “(…) linda e apalaçada vivenda da Castrália, que é um folgar de olhos pelas belezas que encerra”.8 Como se pode verificar, esta casa causava imensa curiosidade na imprensa da época, quer pelo constante movimento cultural e político, quer mesmo pelo seu aspeto exterior e interior. A designação atribuída às casas de “ brasileiros” está igualmente relacionada com a homenagem que o “brasileiro” procura prestar à mulher que, no lugar de origem, aguardou a sua chegada ou o lugar em que a casa é construída. No caso do edifício em análise, a designação atribuída constitui uma junção do apelido do “ Brasileiro” – Castro e do nome Castália. De acordo com a mitologia grega, Castália era uma donzela de Delfos, perseguida por Apolo, junto do santuário, e que se atirou a uma fonte, à qual foi dada, posteriormente, o seu nome.9 Desta forma, consideramos que a “ Castrália” seria um espaço onde a música, a cultura e a política se cruzariam sob a proteção do seu patrono, Adriano Moreira de Castro.

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Ilustração 3 - Portão da Castrália (foto da autora)

A “Castrália” destacou-se, simultaneamente, pelas suas dimensões e características arquitetónicas, que se aproximam mais das inovações da Europa do que das características importadas do Brasil. A casa afirma-se na paisagem devido às suas grandiosas dimensões e ao seu telhado demasiado inclinado. A inclinação do telhado constitui uma influência das inovações arquitetónicas da Europa, fazendo lembrar os “chalets”. Este tipo de construções representa as mudanças introduzidas no nosso território pelos arquitetos, engenheiros, cenógrafos ou botânicos europeus ou mesmo pelas viagens realizadas pelos “brasileiros” no continente europeu. Adriano Moreira e Castro era um constante visitante das capitais europeias, nomeadamente Paris e Londres, de onde importava grande variedade de objetos do quotidiano e mesmo de luxo. Consideramos que esta afirmação da casa na paisagem poderá coincidir com a necessidade do emigrante em se

78 • Revista Estudos Amazônicos

afirmar perante a comunidade que o viu partir para o Brasil. O conjunto edificado é composto pelo edifício de habitação e por um grupo de construções anexas, como a garagem, o celeiro e pequenos espaços de apoio à atividade agrícola. Este palacete apresenta-se com quatro fachadas, dando ao edifício uma forma cúbica. Na extremidade sul da propriedade existe um mirante, cuja balaustrada se abre para o adro da Igreja Paroquial de São Cristóvão de Louredo. Todo o conjunto edificado é cercado por um muro, cuja entrada é feita através de um portão em ferro forjado com a inscrição “Castrália” e a data de 1909. O portão principal conduz a um pequeno pátio e à entrada principal. A fachada principal apresenta, no primeiro andar, uma varanda rematada por uma balaustrada, em cujas extremidades se encontram as figuras alegóricas do Comércio e da Indústria. Na fachada lateral, existe um pequeno jardim romântico, com uma gruta, cuja entrada está adossada à entrada da sala de jantar. O edifício é composto por quatro pisos. Na cave localizam-se a adega, a garagem e os espaços de apoio à agricultura. Anteriormente, existia uma pequena central a gás que era usada para iluminar e aquecer toda a casa. Na fachada voltada para sul localizam-se quatro janelas de sacada e na parte este abre-se uma porta. No rés do chão existe a cozinha, que foi alterada ao longo dos tempos. Para além deste espaço, existem a Sala de Jantar, a Sala da Música, a Sala da Geografia/Biblioteca e o “Quarto do Bispo”. Junto do “Quarto do Bispo” situa-se um pequeno lavatório composto por uma bacia em cerâmica, com flores azuis. Esta peça de cerâmica é de origem inglesa. Neste piso, existe um vestíbulo que permite aceder à escadaria principal, em madeira, que conduz aos pisos superiores. Ao longo de todo o piso, existe um corredor que permite a ligação entre a Revista Estudos Amazônicos • 79

“Castrália” e a casa dos progenitores de Adriano Moreira de Castro. No piso do rés do chão situam-se três portas, abrindo-se a porta central para uma escadaria e corrimão em madeira para o primeiro piso. A porta central é de madeira e vidro. Nas vidraças, anteriormente, encontravam-se motivos florais pintados, mas estes foram recentemente substituídos. Na fachada Sul abre-se uma varanda, para a qual confluem as janelas de

sacada

da

Sala

de Jantar,

da

Sala

da

Música

e

do

Escritório/Biblioteca. Saliente-se a estrutura em ferro forjado colocada sobre a varanda. De acordo com testemunhos familiares, esta estrutura seria utilizada para a colocação de uma cobertura em períodos de calor. Apesar de não ter sido encontrado qualquer projeto do edifício, consideramos que o próprio Adriano Moreira de Castro terá sido, provavelmente, o autor do traço do edifício. No arquivo particular da “ Castrália”, encontramos a representação parcial do alçado lateral do jardim. Nesta representação, pode observar-se a existência de dois pisos. No piso do rés-do- chão abrem-se duas portas e duas janelas. No primeiro piso foram abertas quatro janelas. Entre os vãos foi representado um postigo. As aberturas de ambos os pisos são rematados no lintel com silharia. De acordo com a “Monografia de Paredes”10, os principais materiais usados na construção e decoração da casa eram provenientes de terras brasileiras como é o caso das madeiras (pau-brasil e pau-cetim) ou de alguns objetos decorativos (estatuária). O exterior da casa sofreu alterações desde a sua construção, uma vez que inicialmente, a casa era rebocada a branco, tendo o telhado rematado por lambrequins em madeira, decorados com motivos florais. Segundo testemunhos orais, estas estruturas terão sido retiradas, posteriormente devido ao mau estado de conservação. Hoje em dia, a casa é inteiramente rebocada de cor cinza, mantendo-se as restantes 80 • Revista Estudos Amazônicos

estruturas do período de construção.

Ilustração 4 - A Castrália na atualidade (foto da autora)

O interior destaca-se pela decoração nos espaços de recepção, alternando com a sobriedade dos quartos da família e com as áreas de serviço. Como é referido num artigo da época, a “Castrália” encerrava inúmeras belezas. Embora a família não fosse muito numerosa (apenas uma filha do primeiro casamento), a casa possuía um grande número de divisões bastante espaçosas: sete quartos, três quartos para os empregados, quatro instalações sanitárias, uma cozinha e três salas. A cozinha era um espaço de dimensões modestas, encontrando-se localizada anteriormente à sala de jantar. É de referir que entre a cozinha e a sala de jantar existe uma escada em madeira, em caracol, que permitia o acesso direto dos empregados, quer à cave, quer aos

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restantes pisos, evitando desta forma o contacto direto entre patrões e serviçais ao longo do dia. O vestíbulo é de dimensões modestas, mas destaca-se pelo simbolismo da decoração aí presente. De acordo com testemunhos orais, para este espaço terão sido concebidas quatro cadeiras em paubrasil e pele, com a seguinte decoração: o nome da habitação encontra-se inscrito no espaldar em pele. Esta inscrição foi colocada sobre uma esfera armilar, símbolo do rei D. Manuel I e elemento existente no centro da atual bandeira portuguesa. A esfera armilar encontra-se cercada por uma moldura vegetal. Na parte inferior do espaldar encontram-se duas figuras masculinas seminuas, talvez índios brasileiros. O teto foi revestido a estuque, posteriormente pintado de rosa e branco. Encontram-se representados motivos florais e vegetalistas. O pavimento do átrio de entrada é em cerâmica, com motivos geométricos e florais. A escadaria principal que conduz ao primeiro andar é em madeira com corrimão do mesmo material.

Todavia, apesar de bastante

degradadas, os degraus apresentam pinturas na parte central que procuram imitar uma tapeçaria. São ainda visíveis pormenores em alguns degraus que representam flores avermelhadas. Relativamente aos quartos, estes são de dimensões modestas, encontrando-se, na atualidade, sem qualquer mobiliário. Ao contrário dos restantes quartos que se localizam no primeiro piso, o “Quarto do Bispo” situa-se entre a sala de jantar e a sala da música, no rés do chão. Os quartos encontram-se orientados para o interior da casa, como forma de manter a privacidade, à semelhança das casas da burguesia portuense. A divisão de maiores dimensões é a Sala de Jantar, cujas janelas se estendem para o pátio principal e a porta para o pequeno jardim. Esta sala destaca-se pela decoração das paredes e pelo teto em estuque policromo. O teto é em estuque e estão representados motivos florais e 82 • Revista Estudos Amazônicos

animais, em alto-relevo. O pavimento da sala de jantar foi executado em pau-brasil e pau-cetim, madeiras importadas do Brasil por este. No centro do pavimento, encontra-se o monograma de Adriano Moreira de Castro – AMC. As paredes são decoradas com pintura mural, estando duas delas assinadas – C. Carvalho. Estas pinturas representam cenas alusivas ao Brasil, nomeadamente ao Estado do Pará, encontrando-se no primeiro terço pequenos quadros com cenas campestres, citadinas e marítimas. Estes pequenos painéis constituem um friso que percorre toda a divisão, funcionando como um elemento divisório. No primeiro terço da parede, o pintor realizou uma pintura a imitar madeira. As cenas principais representadas são as seguintes: a primeira cena retrata uma praça com uma fonte ao centro a jorrar água. Esta praça está rodeada por palmeiras e outras árvores. Junto da fonte existe um candeeiro em ferro forjado, com um grande globo branco. A fonte é em granito e apresenta sereias esculpidas. É composta por três taças de tamanho diferente, com a representação de motivos geométricos. Na base, na parte interior da taça de maiores dimensões, estão representados seres marinhos (provavelmente sereias) com as bocas abertas. A fonte pintada na “Castrália” assemelha-se a uma fonte existente na cidade de Belém do Pará intitulada de “Fonte das Sereias”, no largo Baptista Campos.

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Ilustração 5- Pintura mural da Fonte das Sereias na Sala de Jantar (foto da autora)

Ilustração 6 - Fonte das Sereias (http://haroldobaleixe.blogspot.com)

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Na outra parte da parede está representado um cais com dois barcos. No cais está uma pessoa de cor negra, de pé, a olhar para o rio, provavelmente o Rio Amazonas, ou para o barco que está junto da margem. Em primeiro plano, estão representadas três palmeiras. Os dois barcos têm a bandeira portuguesa hasteada. Na parede voltada para o pátio interior encontra-se uma alameda de palmeiras, com edifícios em estilo neoclássico. De acordo com informações orais recolhidas, esta cena é uma recriação da Avenida Dezesseis de Novembro na cidade de Belém do Pará.

Ilustração 7 - Pintura mural da Avenida Dezesseis de Novembro na Sala de Jantar (foto da autora)

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Ilustração 8 - Avenida Dezesseis de Novembro em Belém do Pará (http://www.panoramio.com/photo/18960097)

Uma outra cena representa uma torre em ruínas, composta por uma janela em arco quebrado no rés do chão e, no primeiro andar, uma janela que se abre para uma varanda. No mesmo andar existe uma outra varanda, cuja abertura encontra-se coberta por vegetação que emerge do interior da torre. Para além da torre na cena, existe vegetação e uma árvore, cujos ramos se inclinam sobre a torre. Em primeiro plano, estão representadas umas pedras a simular a entrada de uma gruta. Esta torre em ruínas existe, de facto, na cidade de Belém do Pará, na Avenida Baptista Campos e foi representada em vários postais ilustrados nos finais do século XIX.

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Ilustração 9 - Pintura mural da Sala de Jantar (foto da autora)

Ilustração 10 - Torre em Ruínas em Belém do Pará (http://www.flickr.com/photos/m_hermes/page36/)

Por fim, encontra-se um pôr do sol com árvores na margem de um lago. Em segundo plano, é visível o crepúsculo e as árvores estão

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envoltas nele. No lago estão projetadas as sombras das árvores. Do lado do corredor, está representada uma única cena com guarás que se estão no lago e nas margens.

Um grupo de andorinhas

sobrevoa o lago. Do outro lado do móvel está uma bananeira, em primeiro plano. Nesta cena encontra-se a assinatura do provável autor – C. Carvalho, 1920 (?). A data está no canto inferior esquerdo da cena. No entanto, o quadro representativo está, parcialmente, obstruído pela existência de um aparador grandes dimensões. Encontra-se ainda uma outra cena com a representação de um lago, à margem do qual existe uma casa. Esta casa tem, apenas, um piso. A fachada principal da casa é constituída por uma porta e uma janela. Um arbusto está encostado a uma das fachadas laterais. No meio do lago está uma pequena embarcação à vela, cuja sombra está projetada no lago. Em primeiro plano estão representados nenúfares brancos e uma árvore. Esta pintura, também, está assinada pelo mesmo pintor. Na outra cena está um bando de cisnes num lago que estão a ser observados por uma criança do sexo feminino. Esta criança está de pé sobre uma ponte que serve de travessia entre as margens do lago. Em último plano existe um grande número de árvores de grande porte. Como se pode verificar, Adriano Moreira de Castro procurou representar na Sala de Jantar elementos/paisagens características da cidade de Belém do Pará, demonstrando uma ligação intensa ao Brasil e, também, como materialização de um gosto que não era só típico dos “brasileiros”, mas, também, dos burgueses que decoravam o interior das suas casas com paisagens bucólicas. Algumas destas paisagens paraenses representadas existem atualmente na cidade de Belém do Pará, como é o caso da Torre em Ruínas ou da Fonte das Sereias. Consideramos que estas alegorias apresentadas ao longo da sala de jantar constituem uma demonstração da importância da cidade do Pará no percurso do emigrante. Estas pinturas murais assemelham-se a 88 • Revista Estudos Amazônicos

autênticos bilhetes-postais do Pará perpetuados nas paredes desta sala. O pintor que assina estas cenas poderá ser originário da cidade brasileira ou então poderá ter-se inspirado em postais trazidos pelo emigrante, sendo desta forma alguém local a quem o “brasileiro” pagou para executar. Quanto ao teto em estuque da sala de jantar, nele encontram-se representações em alto- relevo. Estas representações apresentam animais ligados à caça, nomeadamente aves, e frutos exóticos, como o ananás ou o chuchu. Nos pendentes do teto existem animais de caça emparelhados. A própria organização e decoração das divisões da edificação procura retratar esta tentativa dos “brasileiros” em se aproximarem dos ideais burgueses, ideais que procuram conjugar com os conhecimentos e influências que trazem do Brasil. Destacamos ainda o ambiente burguês que este “brasileiro” procurou recriar através dos objetos introduzidos e na decoração parietal das divisões e na organização das divisões no interior da casa. Na Sala da Música, o popular e o erudito encontram-se representados em simultâneo. O pavimento é em madeira (pau-brasil e pau-cetim), encontrando-se ao centro o monograma do “brasileiro” – AMC. Nas paredes da sala da música estão representadas figuras infantis populares que tocam instrumentos de corda. Para além das pinturas murais, foram colocados dois espelhos, decorados com motivos florais, que ladeavam um e outro lado da porta principal. As pinturas a fresco encontram-se dispostas por toda a sala. Seguem-se dois exemplos das representações na Sala da Música. Uma das cenas retrata uma figura feminina vestida “à minhota” a tocar harpa. A personagem apresenta uma saia e camisa brancas, com umas botas pretas calçadas e um lenço rosa amarrado na cabeça. A perna direita está apoiada sobre uma almofada da mesma cor do lenço. O rosto está voltado para o Revista Estudos Amazônicos • 89

espectador, numa clara atitude de convite à audição da música que está a tocar. Esta pintura está assinada com a seguinte inscrição – M. C., 1919 (presumivelmente, pois a data está ligeiramente apagada). Outra cena apresenta um jovem rapaz a tocar violino. Esta personagem está vestida com uns calções castanhos e uma camisa branca e encontra-se descalço. Sobre os ombros traz uma capa castanha semelhante às usadas pelos pastores e sobre a cabeça um chapéu de feltro com uma pena rosa. Da cintura pende um garrafão. O pé esquerdo está apoiado sobre uma pedra. Esta pintura está assinada pelo mesmo pintor da sala de jantar – Costa Carvalho.

Ilustração 11 - Pintura mural da Sala da Música (foto da autora)

O teto da Sala da Música está decorado com instrumentos musicais feitos em estuque, associados à representação de motivos vegetalistas e florais. Os instrumentos musicais representados estão enquadrados por ramos de flores suportados por mãos. Todos os 90 • Revista Estudos Amazônicos

instrumentos representados estão colocados sobre uma pauta musical. Nesta pauta musical está inscrita o hino francês A Marselhesa, que neste caso recebe o título de Marseleza Paredense. Após uma leitura atenta da pauta que se encontra reproduzida no teto, são visíveis modificações na letra original do hino francês. O escritório, também chamado de Biblioteca ou Sala da Geografia, possui dimensões mais reduzidas que as salas anteriores. Esta sala destaca-se pela representação do globo, no centro do teto, e nas extremidades os símbolos iconográficos do deus Hermes: o caduceu, espécie de cetro com duas serpentes entrelaçadas, e o pétaso, chapéu de abas largas a quem foi acrescentado um par de asas pequenas. O globo representado em Maçonaria,

na

alto-relevo medida

em

poderá que

estar relacionado este

objeto

com

a

representa

o

conhecimento ilimitado e a própria universalidade desta associação.11 Como podemos constatar, o interior da “Castrália” destaca-se pela excessiva decoração e riqueza iconográfica contrastando com a singeleza da decoração exterior do edifício. Destaca-se, ainda, um importante elemento arquitetónico – Mirante – que foi construído numa extremidade da propriedade, próximo da Igreja Paroquial, e a uma cota superior à em que se encontra o templo. Este pavilhão permite descortinar uma vista sobre a freguesia, permitindo que, através de aberturas, como a varanda, se possa ver para o exterior. O mirante construído é semelhante a um torreão e apresenta na fachada principal dois arcos de volta perfeita separados por uma coluna. Sobre estes arcos está uma balaustrada que corre ao longo de todo o mirante, tendo sido colocado no centro o monograma do “ brasileiro” – AMC. De acordo com

informações

orais, este espaço seria usado pelo emigrante para assistir a cerimónias públicas, como procissões, uma vez que este se encontra voltado para a Igreja Paroquial. Este espaço foi construído pelo Revista Estudos Amazônicos • 91

emigrante como forma de afirmação do seu poder económico sobre a restante freguesia, pois se assemelha a uma espécie de tribuna. Em nossa opinião, a “Castrália” e o “brasileiro” Adriano Moreira de Castro tornam-se difíceis de separar, na medida em que esta era constantemente citada na imprensa local e nacional, como espaço de habitação e de convívio, sobretudo pelos inúmeros banquetes e festas que aí se realizavam. Esta “casa de brasileiro” foi, inclusive, citada num artigo publicado no jornal “O Novo Paredense”, como um exemplo do trabalho desenvolvido pelo emigrante no seu concelho: “(…) No concelho de Paredes estão bem patentes as produções resultantes do dinheiro dos brazileiros, por exemplo temos: (…), em Louredo, a Castrália e a sua mola, (…)”.12 Este palacete foi ainda sistematicamente citado em obras da época, como a “Monografia de Paredes”, onde o seu autor, Dr. José do Barreiro, refere o seguinte: O capitalista, regressado do Brazil, snr. Adriano Moreira de Castro, edificou aí um palacete para sua habitação, a que poz o nome de Castralia, para o que mandou vir ricas madeiras do Brazil (…). Panorama encantador/ Desde a Castrália à estrada./ Quantas belezas encerra/ Esta nossa terra amada! (…).13

Artigo recebido em agosto de 2012 Aprovado em novembro de 2012 NOTAS 92 • Revista Estudos Amazônicos

Mestre em História da Arte Portuguesa, pela Faculdade de Letras, da Universidade do Porto. *

CASTRO, Adriano Moreira de. Almanaque Luso-Brasileiro. Lisboa: Parceria A. M. Pereira Ltda, 1923. 1

2

CASTELO BRANCO, Camilo. O Senhor do Paço de Ninaes. [S.I.: s.n], pp. 23-24.

LOUREIRO, José Carlos. A Casa do Brasileiro: os Portugueses e o Mundo. Conferência Internacional (1985). Vol. VI. Fundação Engenheiro Antonio de Almeida, 1989, pp. 33-36. 3

D. António Augusto de Castro Meireles era filho de Raimundo Duarte Meireles e Delfina Moreira de Castro, irmã de Adriano Moreira de Castro. Nasceu a 15 de Agosto de 1885 em São Vicente de Boim, concelho de Lousada e faleceu a 29 de Março de 1942, na cidade do Porto. A 22 de Abril de 1908 foi ordenado sacerdote. Em 1912, concluiu os cursos de Teologia e Direito na Universidade de Coimbra. Após a conclusão do seu curso, dedicou-se em simultâneo à carreira eclesiástica e à advocacia na cidade do Porto. Foi nomeado bispo de Angra de Heroísmo a 29 de Junho de 1924, tendo aí permanecido até 1929. Na diocese de Angra do Heroísmo privilegiou a educação católica e a organização política dos católicos no arquipélago dos Açores. Procurou aumentar a influência política e social da Igreja nos tempos agitados da Primeira República Portuguesa (1910-1926). Tornou-se uma presença constante na imprensa diária através da aquisição pela Diocese dos jornais A União (Angra do Heroísmo) e a Democracia (cidade da Horta). Fundou diversas instituições vocacionadas para o acolhimento de sacerdotes que não tivessem família, como foi o caso do Presbitério de São Carlos, ou para a instrução das elites locais, como o Colégio da Esperança. Em 1929, substituiu D. António Barbosa Leão, como bispo da cidade do Porto, permanecendo aí até 1942, data em que viria a falecer. 4

José Coimbra Pacheco nasceu na freguesia de Louredo, concelho de Paredes, numa família de importantes comerciantes do Porto. O seu pai, Miguel Moreira Pacheco, era proprietário da Quinta de São Cristóvão, na freguesia de Louredo. Desconhecem-se dados relativos à sua infância. No entanto, sabemos que José Coimbra Pacheco foi um cidadão de grande destaque na freguesia de Louredo. José Coimbra Pacheco e os seus irmãos António e Augusto criaram uma casa bancária - António Coimbra & Irmão, que adquiriu uma grande importância entre os meios financeiros portuenses. Casou com Augustinha Coimbra, provável cidadã de origem brasileira. Foi um importante benemérito de Louredo, na medida em que procurou criar infraestruturas, bem como atraiu um grande 5

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número de turistas. Procurou concluir a estrada entre Bitarães e Sobrosa, estrada que ligava a freguesia de Louredo às sedes de concelho de Paredes e de Paços de Ferreira. Era proprietário da Estância de Louredo, também conhecida por Varanda da Saúde. José Coimbra Pacheco foi um dos principais impulsionadores para a construção de uma linha de caminho-de-ferro entre a cidade de Penafiel, a vila da Lixa e a localidade de Entre-os-Rios. Leónidas de Castro Melo foi um importante médico e político brasileiro. Nasceu a 15 de Agosto de 1897, no município de Barras, e faleceu a 24 de Maio de 1981 em Teresina. Foi governador do Estado de Piaui por um período de dez anos, durante o governo de Getúlio Vargas. Com a redemocratização do país, fundou o PSD neste Estado, sendo eleito senador, entre 1955-1963. Chefiou o Serviço de Profilaxia Geral do Piaui. Durante o seu governo inaugurou o Hospital Getúlio Vargas, além de escolas e diversas infraestruturas. No entanto, o seu governo ficaria marcado por denúncias de tortura e censura à imprensa. 6

7

A Redenção. Nº 1, 8 de outubro de 1911.

8

A behetria de Louredo. Nº 2, 22 de Janeiro de 1922.

GRIMAL, Pierre. Dicionário da Mitologia Grega. Lisboa: Difel, 1992, p. 78 (De acordo com este dicionário, Castália poderá designar, ainda, a filha de Aqueloo e mulher do rei Delfo. Dele teve um filho, Castálio, que terá reinado em Delfos, após a morte do seu pai). 9

10

BARREIRO, José do. Monografia de Paredes. Porto: Tipografia Barros e Costa, 1922, pp. 413-416, 645.

MARQUES, A. H. de Oliveira. Dicionário da Maçonaria Portuguesa. 2 vol. Lisboa: Editorial Delta, 1986, pp. 515-516. 11

12

O Novo Paredense, n.º 57.

13

BARREIRO, José do. Op. Cit., pp. 413-416.

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