Ainda é pouco, muito pouco

June 29, 2017 | Autor: F. Chagas-Bastos | Categoria: Brazil, Brasil, Brazilian Foreign policy
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TERÇA-FEIRA, 02.09.2014

FABRÍCIO H. CHAGAS BASTOS* Ainda é pouco

N

ão é preciso que o Conselho de Direitos Humanos da ONU receba informações frescas de seus analistas de campo, ou que os diplomatas que o compõem votem resoluções para que o mundo saiba que o Estado Islâmico (EI) e grupos a ele associados estão cometendo violações e abusos no Iraque e na Síria. Cometendo. Não “supostamente” e “alegadamente cometendo” como a linguagem jurídico-diplomática usualmente trata situações deste tipo. Dados levantados e confirmados pela própria ONU dão conta que 1,4 mil pessoas foram mortas pelo extremistas em julho - quando do início da escalada de terror perpetrada pelo EI -, e 850 mil refugiados vagam pelas terras desérticas da região. Seguramente os números são maiores. Resulta em ficção consentida pela dita “comunidade internacional” que o CDH condene “nos termos mais fortes possíveis” as violações sistemáticas dos Direitos Humanos. Digo isto tendo em conta que a ONU foi ferida de morte em

2003 pelos Estados Unidos, quando declararam guerra ao Iraque de Saddam Hussein à revelia da opinião massiva dos membros que compõem a Organização. Mais, que seja aventada a necessidade (tardia) da anuência da ONU para uma intervenção militar em combate aos extremistas. Os Estados que detêm poder gerencial sobre o condomínio de poder, sob a forma do Conselho de Segurança, nada fizeram ao longo de quase uma década e meia para fortalecerem laços políticos na região. Nada além de fomentarem os grupos radicais que hoje se espalham pelo deserto iraquiano. Como tem se tornado usual, a postura brasileira é tímida ante a imagem de um colosso internacionalmente reconhecido. Que “o Brasil condena os abusos e violações” é sabido - e necessário - já há, pelo menos, uma centena de anos. Tributa ao óbvio solicitar em discurso no CDH que os responsáveis sejam levados à Justiça (cabe a pergunta: qual Justiça, já que o Estado iraquiano se desintegra e o Estado sírio claudica entre a força da mão de Assad e o esfacelamento da longa guerra que o assola?). Mesmo que de modo ‘quase envergonhada’, a postura brasileira de não apoiar uma intervenção militar é o caminho mais sensato a seguir num momento em que as areias do Oriente Médio se tornam a cada dia mais movediças. Inundar a região de armas e tropas seria nada mais que dar combustível e fôlego aos grupos radicais - que, por estarem pulverizados ao longo dos territórios, conseguem minar as forças organizadas (nacionais ou estran-

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geiras) com estratégias de guerrilha elaboradas ao longo da Guerra do Iraque. Declarações e discursos no órgãos multilaterais soam bem à imprensa. Precisamos de uma política externa mais assertiva, que inclua o país nas discussões e na gestão das crises de modo efetivo. O que foi feito até hoje é

muito pouco ante o que o País pode oferecer ao mundo.

FABRÍCIO H. CHAGAS BASTOS É PROFESSOR DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS CONTEMPORÂNEAS DA UNIVERSIDADE FEDERAL DA GRANDE DOURADOS (UFGD) E DOUTORANDO EM INTEGRAÇÃO DA AMÉRICA LATINA PELA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO (USP)

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