Algumas Notas sobre o Zelo da Criança pelo Pai Fraco

O zelo pelos pais por parte de uma criança é muito mais do que um detalhe.

Em meu artigo "Subjugação Escolar e o Zelo pelo Adulto Fraco", tínhamos um menino submetido a um ritual estranho. Um ritual sádico por parte de seus colegas. Subjugado por lâmina [estilete], ele se punha de costas para os meninos, de frente para lousa, tinha de tirar as roupas e escrever xingamentos a respeito de si e da família. Pois bem, imaginemos esse menino ofendendo o pai por escrito, submetido às chantagens e risos dos demais.

Parte de sua sintomatologia passou a incluir a gagueira, que o pai também trazia em algum grau, o que reflete sua identificação com o (pai) agredido e culpa por coparticipar da agressão feita ao pai, quaisquer que sejam as demais e inevitáveis ambivalências que ele possa ter tido ao longo da vida, quais sejam: "preferir ter outro pai". A identificação com a fraqueza do pai o fez mimetizar o pai, para lhe fazer companhia concomitantemente ao dano causado a ele, pai, naquele sofisticado [ainda que "intuitivamente sofisticado"] ritual de humilhação. Gaguejando com o pai e como o pai ele lhe faz companhia, apesar de tê-lo detratado por escrito, sob chantagem. Além de zelar pelo pai [ter medo do medo do pai], de eventuais explosões de incompreensão ou impotência dele ao saber do ocorrido por sua boca, ele também expia a culpa de se sentir "cúmplice da agressão", na exata medida que aceitou atender às chantagens dos garotos [e importa menos, aqui, que ele tenha sido compelido a se submeter a elas, pela força]. Gaguejando como o pai [e com o pai], ele lhe faz companhia, além de poupá-lo da comunicação do ritual.

Mas, ainda assim, ele comunica algo, a nível inconsciente: "sou inseguro como você, pai".

Tais são algumas das nuances da complexa situação de quem zela pelo adulto que deveria cuidar dele, com toda a ambivalência que isso traz em seu rastro.


Se uma criança sabe que o pai "tem problema de coração", ela pode fantasiar todas as decorrências disso [usando os rumores do ambiente conjugados à sua imaginação] e, a partir desse "juízo imaginal de valor", poderá ocultar as rivalidades entre irmãos e omitir as brigas entre eles "temendo pelo pai", temendo pela morte do pai.

Se apenas um dos filhos visualiza isso e os demais não, esse poderá tentar "abafar o caso" e/ou filtrar pra si toda a responsabilidade das brigas entre os outros irmãos, sendo "pai no lugar do pai" [guardião da saúde do pai e "pai para seus irmãos"] para que [em sua fantasia] o pai não morra. Terá ele, assim, evitado a morte de seu pai. Para si e para todos: mãe e irmãos.



Marcelo Novaes