Alternativas para o Tratamento da Esquistossomose: Caracterização Físico-Química do Complexo de Inclusão entre Praziquantel e Hidroxipropil-β-Ciclodextrina

June 19, 2017 | Autor: M. de Jesus | Categoria: Cyclodextrins
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Latin American Journal of Pharmacy (formerly Acta Farmacéutica Bonaerense)

Original Article Received: May 22, 2009 Accepted: February 6, 2010

Lat. Am. J. Pharm. 29 (7): 1067-74 (2010)

Alternativas para o Tratamento da Esquistossomose: Caracterização Físico-Química do Complexo de Inclusão entre Praziquantel e Hidroxipropil-β-Ciclodextrina Izabel S. CHAVES 1, Stella G. RODRIGUES 1, Nathalie F.S. MELO 3, Marcelo B. de JESUS 2, Leonardo F. FRACETO 3, Eneida de PAULA 2 & Luciana M.A. PINTO 1* Departamento de Química, Universidade Federal de Lavras, Caixa Postal: 3037, Lavras – MG, CEP: 37200-000, Brasil; 2 Departamento de Bioquímica, Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas; 3 Departamento de Engenharia Ambiental, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita 1

RESUMO. O praziquantel (PZQ) é o fármaco de escolha no tratamento da esquistossomose. Porém, ele apresenta baixa solubilidade aquosa, o que pode limitar a sua biodisponibilidade no organismo. Para contornar estas características foi feita a inclusão da molécula do PZQ em hidroxipropil-beta-ciclodextrina (HP-β-CD). Desta forma, o objetivo deste trabalho foi preparar e caracterizar o complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD. Estudos morfológicos, espectroscópicos e de calorimetria diferencial de varredura, demonstraram os primeiros indícios da interação hóspede/hospedeiro. Analisando a cinética de incorporação da molécula de PZQ na cavidade da HP-β-CD, pode-se determinar a constante cinética, além do tempo para equilíbrio do sistema. Utilizando-se isoterma de solubilidade foi possível observar que a interação com HP-β-CD aumentou a solubilidade aquosa do PZQ em 2,4 vezes. Ensaios de citotoxicidade in vitro, utilizando fibroblastos, demonstraram não haver indícios de toxicidade para estas células, nas concentrações testadas. Os resultados indicam que há um potencial favorável da aplicação deste fármaco na forma complexada em HP-β-CD. SUMMARY. “Alternatives for the Treatment of Schistosomiasis: Physico-Chemical Characterization of an Inclusion Complex Between Praziquantel and Hydroxypropyl-β-Cyclodextrin”. Praziquantel (PZQ) is the drug of choice commonly used for the treatment of shistosomiasis. However, it has low aqueous solubility, which could limit its bioavailability in the body. To circumvent these features, an inclusion complex with hydroxypropyl-beta-cyclodextrin (HP-β-CD) was prepared. Thus, the objective of this work was to prepare and characterize the PZQ/HP-β-CD inclusion complex. Morphological, spectroscopic, and calorimetric analysis showed the first signs of the guest/host interaction. The complexation kinetic analysis was used to determine the kinetic constant and, besides that, it was possible to establish the time consumed to reach equilibrium. Using the solubility isotherm, it was observed that the interaction with HP-β-CD increased 2.4 fold the aqueous solubility of plain PZQ. In vitro cytotoxicity tests, using fibroblast cells, evidenced no toxicity for these cells at the concentrations tested. These results demonstrated that there is a potential use of PZQ in formulations with HP-β-CD.

INTRODUÇÃO A esquistossomose é uma doença endêmica em 76 países, onde 779 milhões de pessoas estão em risco de contaminação e 207 milhões estão infectadas 1. Esta é causada por um parasita da classe trematoda, família Schistosomatidae, onde cinco espécies são capazes de infectar o homem: Schistosoma mansoni, S. intercalatum, S. japonicum, S. haematobium e S. mekongi 2. O Schistosoma, assim como outros membros do seu gênero necessita de dois hospedeiros para

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completar o ciclo de vida o que dificulta a profilaxia da doença 3. Em humanos não há relatos de indivíduos naturalmente imunes à doença, de forma que todos são, potencialmente, suscetíveis 3. Uma vez instalada a parasitose, seu tratamento medicamentoso seria ideal se iniciado logo após ocorrer a infecção, pois a doença pode causar lesões irreversíveis. A administração de fármacos é importante, porém limitada, dependendo do estágio de desenvolvimento do para-

PALAVRAS-CHAVE: Ciclodextrina, Complexo de inclusão, Esquistossomose, Praziquantel. KEY WORDS: Cyclodextrin, Inclusion complex, Praziquantel, Schistosomiasis.

Autor a quem a correspondência deve ser enviada: E-mail: [email protected]

ISSN 0326-2383

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CHAVES I.S., RODRIGUES S.G., MELO N.F.S., de JESUS M.B., FRACETO L.F., de PAULA E. & PINTO L.M.A.

Figura 1. Estrutura química do praziquantel e representação esquemática da estrutura da hidroxipropilbeta-ciclodextrina.

sito 4,5. Diversos fármacos já foram utilizados para o tratamento da esquistossomose, como o metrifonato, a oxamniquina e o praziquantel (PZQ), sendo este último a droga de primeira escolha na maioria dos países. O PZQ (2-(ciclohexilcarbonil)-1,2,3,6,7,11bhexahidro-4H-pirazino(2,1-a)isoquinolin-4-ona, Fig. 1) é um pó branco, sem cheiro e de gosto amargo. Sua solubilidade em água é muito baixa: cerca de 1 mM ou 0,3 mg.mL–1 6. Diversas razões justificam seu uso nesta doença, dentre elas, poucos efeitos colaterais, alta eficácia, facilidade na administração e um preço competitivo 2,7,8. Porém, alguns casos de resistência vem sendo relatados, demonstrando que seu potencial terapêutico pode estar diminuindo 9. Além disso, a sua baixa solubilidade aquosa pode limitar sua biodisponibilidade no organismo. Levando em conta estas características, alguns trabalhos relatam que suas propriedades farmacológicas podem ser melhoradas por inclusão em sistemas como as ciclodextrinas (CDs) 4,10-12. Isto proporcionaria uma melhora na sua solubilidade aquosa e consequentemente na biodisponibilidade da molécula. As ciclodextrinas são polissacarídeos cíclicos unidos por ligações glicosídicas, formando estruturas semelhantes a um cone truncado. Dentre as naturais as mais comuns são a α, β e γ que contém, respectivamente, 6, 7 e 8 unidades de glicose. O exterior da cavidade apresenta um caráter hidrofílico, devido às hidroxilas, e o interior possui baixa polaridade, conferindo a este ambiente a capacidade de inclusão de moléculas hóspede, podendo alterar as propriedades físico-químicas da molécula inserida. Apesar de ser a ciclodextrina com mais amplo uso em for-

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mulações farmacêuticas, a β-CD possui solubilidade aquosa limitada (16 mM), comparada a αCD (149 mM) e γ-CD (179 mM), o que pode levar a precipitação dos complexos de inclusão formados 13. Sendo assim, a síntese de CDs modificadas vem melhorando esta característica 14. A hidroxipropil-beta-ciclodextrina (HP-β-CD) é o resultado de uma destas modificações (Figura 1), onde as hidroxilas são substituídas com grupamentos hidroxipropil. Estas modificações promovem uma maior solubilidade desta CD em água, cerca de 30 vezes mais 15. Estudos toxicológicos demonstraram que a HP-β-CD aparenta ser segura tanto para administração oral quanto parenteral diferentemente da β-CD, que não deve ser usada por via parenteral, somente oral 15. O FDA cita a HP-β-CD na lista de ingredientes farmacêuticos inertes 15. A primeira patente de uma formulação contendo CD é datada de 1953, desde então seu emprego como excipiente em formulações farmacêuticas vem se tornando mais comum 14. Cerca de 515 princípios ativos tem sua associação com CDs descrita em literatura, em sua maioria melhorando a biodisponibilidade, estabilidade e segurança, através da formação de complexos de inclusão reversíveis em água 16. Como consequência, se encontram disponíveis no mercado mundial mais de 30 medicamentos contendo este excipiente em suas fórmulas 14,15. Desta forma, utilizamos a HP-β-CD neste trabalho para incorporar o PZQ, com o intuito de aumentar sua solubilidade e, consequentemente, sua biodisponibilidade e eficácia terapêutica. Devido a menor toxicidade e maior solubilidade da HP-β-CD comparada a β-CD, as formulações poderiam ser administradas por via parenteral, além da via oral normalmente utilizada, o que beneficiaria pacientes com limitações para administração per os. Para demonstrar a formação do complexo PZQ/HP-β-CD foi realizada a caracterização físico-química do sistema utilizando métodos espectroscópicos, uma análise morfológica, que foi obtida por microscopia eletrônica, além da calorimetria diferencial de varredura. Foi avaliada ainda a citotoxicidade do complexo formado em cultura de células de fibroblastos animais. Sendo assim, o presente trabalho abre perspectivas futuras para a realização de testes in vivo, que podem viabilizar o uso do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD para o tratamento da esquistossomose, avaliar a possibilidade de con-

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tornar casos de resistência relatados e possibilitar uma diminuição na dose administrada. MATERIAIS E MÉTODOS Preparação do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD Utilizando a metodologia descrita por de Jesus e colaboradores 11 foram preparados os complexos de inclusão PZQ/HP-β-CD na razão molar 1:1. O PZQ (Merck KGaA) foi solubilizado em acetona e a HP-β-CD (Roquette) em água ultra pura sob agitação, as soluções foram misturadas e levadas a um evaporador rotativo (Tecnal TE 210) a 53 °C, de forma que todo o solvente fosse eliminado. Posteriormente, o produto foi ressuspenso em água ultra pura, liofilizado (Liofilizador Labconco Freezone 4.5) e estocado a – 20 °C para posterior utilização. Caracterização do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD sólido A interação com a cavidade da CD pode causar alterações das propriedades físico-químicas da molécula hóspede e também da hospedeira. Sendo assim, podem ser utilizadas metodologias sensíveis a estas mudanças para avaliar o fenômeno de inclusão 15. O complexo de inclusão foi analisado por microscopia eletrônica de varredura (MEV), espectroscopia na região do infravermelho (IV), e calorimetria diferencial de varredura (DSC) com o intuito de observar tais alterações. Em todos os experimentos foram testadas amostras de PZQ e HP-β-CD livres, mistura física dos compostos e o complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD (razão molar 1:1). Microscopia eletrônica de varredura A morfologia dos compostos foi avaliada utilizando um microscópio eletrônico de varredura (LEO EVO40) pertencente ao Departamento de Fitopatologia da Universidade Federal de Lavras. As amostras, descritas anteriormente, foram preparadas em suportes de alumínio, usando fita dupla-face e recobertas com ouro, sob vácuo por 180 s, para que ficassem eletricamente condutivas. As análises foram realizadas utilizando um aumento de 1500 x. Espectroscopia na região do infravermelho A caracterização do complexo de inclusão também foi avaliada por espectroscopia na região do infravermelho, onde foram observadas alterações das absorbâncias que ocorrem em grupamentos presentes na molécula de ciclodextrina e no praziquantel, após interação com a cavidade. Os experimentos foram realizados

em um espectrômetro Excalibur Series FTS 3000 utilizando varredura na faixa de 4000 cm–1 a 400 cm–1, 16 sobreposições e resolução de 4 cm–1, utilizando-se pastilhas de KBr para preparar as amostras. Calorimetria diferencial de varredura O experimento de calorimetria diferencial de varredura foi realizado num calorímetro Shimadzu DSC-60 pertencente ao Centro de Análise e Prospecção Química da UFLA (CAPQ). Amostras de aproximadamente 4 mg foram aquecidas a uma velocidade e 10 °C/min, numa faixa de 30 a 200 °C, em atmosfera de nitrogênio. A calibração do instrumento foi feita com Índio. Pelos termogramas obtidos pode-se monitorar mudanças nas temperaturas de transição dos compostos antes e após a complexação. Caracterização do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD em solução A caracterização dos complexos de inclusão em solução baseia-se em alterações físico-químicas da molécula inserida e da CD 17. Para tal, foi utilizada a técnica de espectrofotometria na região do ultravioleta (UV) como ferramenta para os testes em solução do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD na razão molar 1:1. Cinética de formação do complexo A cinética de complexação foi realizada para mensurar o tempo necessário para que o fenômeno de inclusão atinja o equilíbrio. Quantidades apropriadas de PZQ e HP-β-CD (razão molar 1:1) foram homogeneizados em água ultra pura, sob agitação, a 30 °C, em triplicata. Posteriormente, alíquotas foram retiradas e analisadas por espectrofotometria no UV (λ = 270 nm, comprimento de onda de máxima absorção do PZQ) até que não houvesse mais aumento na intensidade de absorção de luz. Foi realizada a normalização dos valores de absorbância para cada intervalo de leitura (absorbância normalizada = absorbância no tempo t/absorbância inicial). A curva cinética obtida foi analisada através de modelos de zero ordem, primeira ordem e segunda ordem, a fim de se obter informações sobre a cinética de complexação do PZQ em HP-β-CD 18. Isotermas de solubilidade Isotermas de solubilidade foram obtidas utilizando metodologia descrita por Higuchi & Connors 19. Foram adicionadas a erlenmeyers quantidades em excesso de PZQ (8 mM) e concentrações crescentes de HP-β-CD (0 a 35 mM), em

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triplicata. Os frascos foram selados e agitados a 30 °C até atingir o equilíbrio. As suspensões obtidas foram centrifugadas a 280 xg por 15 min e filtradas através de membrana com poro de 0,22 µm (Millipore). A concentração de PZQ foi determinada espectrofotometricamente a 270 nm. Os valores de absorbância foram convertidos em concentração de PZQ, utilizando-se a constante de absortividade molar (ε = 201 L mol–1 cm –1 ) determinada previamente (dados não mostrados). A partir dos dados, foram obtidas as isotermas de solubilidade (concentração de PZQ vs concentração de HP-β-CD) e a constante de afinidade (Ka) foi calculada a partir da porção linear do gráfico utilizando a equação [1], proposta por Higuchi & Connors 19, onde So = solubilidade aquosa do PZQ em ausência de ciclodextrina. Ka =

inclinação So (1-inclinação)

[1]

Ensaios de citotoxicidade Ensaios em cultura de célula in vitro têm servido como uma boa alternativa para testes iniciais de citotoxicidade de ativos. O teste de redução do brometo de tetrazolium 3-(4,5-dimetiltiazol-2-il)-2,5-bifenil (MTT) avalia a função mitocondrial, possibilitando assim, avaliar a viabilidade das células após o tratamento com os compostos de interesse 4,20. Fibroblastos de pulmão de hamster chinês da linhagem 3T3 foram cultivados em meio DMEM contendo antibióticos (100 U.mL–1 de penicilina G; 100 µg mL–1 de estreptomicina), suplementadas com soro fetal bovino a 10 %, foram mantidos em atmosfera úmida de CO2 a 5 %, a 37 °C. Para os ensaios de viabilidade, foram utilizadas placas de cultura de 96 poços contendo 3 x 104 células/mL, incubadas a 37 °C por 48 h. Após esse período, o meio foi removido e reposto contendo concentrações crescentes (0,2 a 0,9 mM) de PZQ, HP-β-CD, e complexo de inclusão PZQ/HPCD (1:1), em 8 replicatas. Após 24 h a capacidade de redução do MTT foi utilizada para avaliar o percentual de células viáveis 20. RESULTADOS E DISCUSSÃO Caracterização do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD sólido A microscopia eletrônica de varredura (MEV) demonstrou alterações morfológicas na estrutura cristalina do PZQ e da CD, após a inclusão em HP-β-CD. Embora esta evidência não seja quantitativa, a morfologia é útil na caracterização da formação do complexo de inclusão 12,21,22.

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Figura 2. Análises morfológicas por MEV dos cristais de (A) PZQ livre; (B) HP-β-CD livre; (C) Mistura física de PZQ e HP-β-CD e ( D ) Complexo de inclusão

PZQ/HP-β-CD 1:1, em aumento de 1500 x.

Conforme observado na Figura 2A, o PZQ apresenta estrutura com cristais sólidos, alongados e cúbico-retangulares. Os cristais de HP-βCD (Fig. 2B) por sua vez, são maiores do que os de PZQ e apresentam aspecto liso e arredondado. Nas micrografias referentes à mistura física, utilizada como controle (Fig. 2C) foram observadas características das duas moléculas livres, demonstrando que o contato físico entre as moléculas não foi suficiente para que se formassem os complexos de inclusão. Diferentemente, a amostra do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD (Fig. 2D) apresenta características morfológicas com aspecto amorfo, sem contornos definidos, evidenciando que a forma cristalina foi perdida. Alterações semelhantes na estrutura cristalina de moléculas complexadas também puderam ser observadas por Melo et al. 23 e Pinto et al. 22 para outros compostos e ocorrem provavelmente devido a formação do complexo de inclusão 18. Os compostos na forma livre e o complexo de inclusão foram submetidos a espectroscopia na região do infravermelho (IV) afim de se observar mudanças em virtude da interação PZQ/HP-β-CD (Fig. 3). A Tabela 1 apresenta as principais frequências de vibração do PZQ, HPβ-CD, mistura física e complexo PZQ/HP-β-CD, bem como suas atribuições. Nota-se a diminuição da banda de 3000 a 3500 cm–1 da HP-β-CD livre em comparação ao complexo de inclusão, o que poderia ser explicado pela quebra de ligações de hidrogênio após a interação hóspede-hospedeiro, em consequência da liberação da água de inclusão. Estas moléculas de água ocupam normalmente a

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HP-β-ciclodextrina

Praziquantel

Número de onda (cm–1)

Atribuição

Número de onda (cm–1)

3386

Estiramento O-H

3002/3063

Deformação axial de C-H (ciclo alcanos)

2929

Vibração de deformação axial de C-H

2929/2852

Estiramento C-H

1646

Vibrações angulares H-O-H

1640

Estiramento C=O (amida)

1411

C-H no plano

1434

Estiramento C=C (aromático)

1333/1369

C-H, O-C-H, C-O-C

1212/1357

Estiramento C-N

1032/1081/1156

Vibração de deformação axial assimétrica de C-O-C

690/889

Deformação angular fora do plano de C-H (aromático)

Atribuição

Tabela 1. Principais bandas de absorção no IV e suas atribuições.

Figura 3. Espectros de absorbância na região do infravermelho de (A) mistura física, (B) complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD 1:1, (C) PZQ livre e (D) HP-β-

Figura 4. Termogramas de calorimetria diferencial de varredura de (A) HP-β-CD livre, (B) complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD 1:1, (C) mistura física e (D)

CD livre.

PZQ livre.

cavidade e são deslocadas quando algum composto menos polar se aproxima da cavidade. Ocorre diminuição dos modos vibracionais do PZQ livre na região de 1212-1357 cm–1, referentes ao estiramento C-N, após inclusão na cavidade da HP-β-CD. Os picos da HP-β-CD livre, assemelham-se aos do complexo PZQ/HP-β-CD, o que demonstra um provável encapsulamento. Utilizando DSC obtivemos termogramas que demonstram alterações nas temperaturas de transição após a inclusão da molécula de PZQ na cavidade da HP-β-CD (Fig. 4). No termograma da HP-β-CD livre, observa-se uma transição alargada relacionada à perda das moléculas de água da cavidade. O PZQ apresenta pico endotérmico com temperatura de transição próxima a

140 °C, correspondente a seu ponto de fusão 4,12. Ao ser incluída na cavidade da ciclodextrina, a molécula de PZQ perde sua transição, indicando que houve formação do complexo de inclusão, como já observado para outras moléculas 21,22. A mistura física demonstra que não houve complexação total, devido aos picos remanescentes observados. Estes dados (MEV, IV e DSC) são indicativos de que o complexo PZQ/HP-β-CD foi obtido na razão molar testada. Caracterização do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD em solução A cinética de complexação do PZQ em HPβ-CD foi estudada pelo acompanhamento da

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Figura 5. Cinética de formação do complexo de in-

Figura 6. Diagrama de solubilidade de fases do PZQ

clusão PZQ em HP-β-CD (razão molar 1:1), a 30 °C.

em presença de HP-β-CD, a 30 °C (n = 3).

absorção do PZQ no UV, a 270 nm, em função do tempo, até alcançar o equilíbrio. A curva da cinética de complexação obtida pode ser observada na Figura 5. Analisando a Figura 5, observa-se que nas primeiras 8 h de ensaio houve um aumento significativo no valor de absorção e em seguida uma tendência ao equilíbrio. Isto sugere que esta variação na absorbância do PZQ em presença de ciclodextrina está relacionada ao fenômeno de complexação. A cinética de complexação do PZQ com HPβ-CD apresenta-se de primeira ordem (ajuste monoexponencial), ou seja, a complexação depende principalmente da concentração de uma das espécies, sendo o valor da constante cinética (k) determinado como 0,183 h–1 (r = 0,91). Um outro fator é que o equilíbrio foi atingido em 8 h de experimento, sendo este valor importante para a realização dos demais experimentos, pois indica o tempo necessário para que o equilíbrio de complexação seja atingido. Moraes e colaboradores 18 trabalhando com anestésicos locais obtiveram valor da constante cinética da forma neutra de bupivacaína semelhante ao valor descrito aqui. Isto provavelmente está relacionado à maior hidrofobicidade das moléculas, que desta forma interagiriam bem com a cavidade da HP-β-CD.

esses efeitos são dependentes da estabilidade e da solubilidade do complexo formado 24. É possível observar uma correlação direta entre o aumento da solubilidade de ativos, pouco solúveis em água, com a estabilidade do complexo formado com ciclodextrinas 19. Utilizando isotermas de solubilidade foi possível obter informações sobre a solubilidade aquosa da molécula de PZQ em concentrações crescentes de HP-β-CD (Fig. 6). Observou-se um aumento de aproximadamente 2,4 vezes na solubilidade da molécula comparada à solução de PZQ na ausência da ciclodextrina. Este aumento linear da solubilidade é encontrado em isotermas do tipo AL e caracteriza uma relação molar 1:1. Isto significa que o aumento na concentração do PZQ em água é proporcional ao aumento da concentração de ciclodextrina, indicando que as moléculas estão interagindo, muito provavelmente formando complexos de inclusão 4,11. A constante de associação (Ka) para o complexo PZQ/HP-β-CD foi calculada como proposto por Higuchi & Connors 19 assumindo um complexo de razão molar 1:1, obtendo-se o valor de Ka = 47,29 M–1. Nos trabalhos de Becket et al. 10 e de Jesus 4 utilizando a mesma metodologia, foram obtidos respectivamente, os valores de Ka = 396,91 M–1 e 440,83 M–1, para interação do PZQ com a molécula de β-ciclodextrina. A diminuição no valor da constante deste trabalho deve-se, provavelmente, ao uso de uma CD modificada. Os grupos hidroxipropil ligados às bordas da β-CD, poderiam dificultar estericamente a interação da molécula hóspede com a cavidade, quando

Isoterma de solubilidade Uma das características dos complexos de inclusão com CDs é alterar as propriedades da molécula hóspede, como aumentar a solubilidade, modificar a absorção e melhorar a estabilidade do fármaco em solução 14. Porém, todos

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Figura 7. Viabilidade celular avaliada pelo teste do MTT com diferentes concentrações de PZQ/HP-β-CD 1:1 (!),HP-β-CD (!) e PZQ (!).

comparada a β-CD não modificada. No entanto, este valor de Ka ainda é suficiente para garantir que a molécula interaja com a cavidade prolongando a sua liberação e aumentando sua solubilidade, como observado para outros fármacos 18,22. Ensaios de citotoxicidade A Figura 7 mostra o perfil de viabilidade celular após tratamento com amostras de PZQ livre, HP-β -CD e do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD (1:1). Nas concentrações testadas, nenhuma das soluções apresentou acentuado efeito citotóxico aos fibroblastos, mostrado pelo ensaio de MTT. A administração de uma dose de 40 mg.kg–1 resulta em concentrações plasmáticas de PZQ entre 0,6-6,4 µM 4, bastante inferiores (uma ou duas ordens de grandeza) àquelas que apresentam qualquer toxicidade as células de fibroblasto testadas. A formação do complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD não trouxe qualquer alteração no padrão de viabilidade celular observado para as amostras de PZQ ou de HP-β-CD livres. Outros trabalhos utilizando cultura de células de fibroblastos demonstraram que o PZQ, a β-CD e seu complexo de inclusão, não apresentaram citotoxicidade nas mesmas concentrações testadas 4,21. CONCLUSÃO Este trabalho apresenta dados da caracterização físico-química da complexação do anti-helmíntico PZQ, utilizado para o tratamento da esquistossomose, com a HP-β-CD, ciclodextrina

modificada que apresenta grande solubilidade em água. Os resultados obtidos são indicativos de que o complexo PZQ/HP-β-CD 1:1 foi obtido e que este possui características morfológicas e espectroscópicas diferentes da mistura física do PZQ com a HP-β-CD. A interação das moléculas foi detectada tanto no complexo de inclusão sólido quanto em solução. Além disso, pode-se verificar que a formação do complexo altera as propriedades químicas do fármaco, aumentando a sua solubilidade em relação ao PZQ sozinho, o que pode torná-lo mais biodisponível. Em testes in vitro foi observado que tanto os compostos livres (PZQ e HP-β-CD) quanto o complexo desenvolvido não apresentaram toxicidade significativa às células nas concentrações analisadas. A importância destes dados se deve ao fato de que alguns casos de resistência ao PZQ têm sido relatados na literatura e o complexo de inclusão PZQ/HP-β-CD pode representar uma alternativa ao tratamento atual. Por permitir outras vias de administração e possuir uma maior solubilidade aquosa, a HP-β-CD pode ter um uso diferenciado da CD não modificada, atendendo, por exemplo, casos mais graves da doença, em esquemas posológicos diferenciados. A partir dos resultados apresentados abremse perspectivas para estudos de atividade farmacológica para o tratamento da esquistossomose, utilizando estas preparações. Agradecimentos. Ao CNPq pela bolsa de iniciação científica de I.S.C. e ao CAPQ pelo uso dos equipamentos.

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