Amamentação e desmame entre crianças indígenas do leste de Roraima

June 14, 2017 | Autor: E. Mainbourg | Categoria: Indigenous Studies
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AMAMENTAÇÃO E DESMAME
ENTRE CRIANÇAS INDÍGENAS DO LESTE DE RORAIMA

Evelyne MarieTherese Mainbourg
(Centro de Pesquisa Leônidas & Maria Deane/FIOCRUZ – AM) (;
Ana Felisa Hurtado Guerrero
(Centro de Pesquisa Leônidas & Maria Deane/FIOCRRUZ – AM) 2;
Iolene Cavalcante de Almeida
(Depto Estatística/Universidade Federal do AM) 3.

Palavras-chave: amamentação, desmame, crianças indígenas, Leste de Roraima.
Número do Trabalho: 4860
GT nº 23 : Nutrição e Saúde

INTRODUÇÃO
O aleitamento materno prolongado e a introdução progressiva de alimentos
são ainda mais importantes em populações indígenas rurais pelas
dificuldades de condições de acesso e processamento de alimentos adequados
para a criança menor de 6 anos. Durante uma avaliação nutricional realizada
em populações indígenas do leste de Roraima em 2001 e 2002, foram
levantados dados referentes ao aleitamento materno e desmame entre as
crianças menores de 6 anos.

OBJETIVO
Objetivo geral: Identificar as práticas de amamentação relacionadas com a
duração da amamentação e a introdução de padrões alimentares em crianças
menores de 6 anos (e já desmamadas) das etnias Macuxi, Wapishana, Taurepang
e Wai-Wai.

MATERIAL E MÉTODOS
Trata-se de um estudo transversal do Distrito Sanitário Especial Indígena
Leste de Roraima, com amostragem aleatória estratificada proporcional. A
amostra do presente trabalho é de 179 crianças distribuídas em 50
comunidades de todos os pólos-base do referido distrito incluídos no estudo
em função do critério de acessibilidade por via terrestre ou fluvial (23
pólos-base num total de 28). Estas crianças eram menores de 6 anos e já
desmamadas, com fim de comparabilidade, sendo que as crianças que ainda
mamavam serão objeto de um outro estudo (análise de sobrevivência). Os
dados levantados dependeram até certo ponto, da memória dos pais quando a
criança já era grande. Três datas foram observadas: a) quando começou a
tomar mingau, b) quando começou a se alimentar de "comida" (entendida como
alimentos outros que mingau), e c) quando a mãe deixou de amamentar. A
atração das datas como 1 ano, 1 ano e meio, 2 anos... teve provavelmente
certo impacto, tanto porque a mãe ou o pai tinha que se lembrar dessas
datas para todos os filhos menores de 6 anos, quanto porque estas fases
representam etapas de integração na sociedade e as datas de mudança são
associadas a eventos como aparecimento dos dentes ou desenvolvimento
psicomotor que ocorrem numa mesma faixa etária. A composição do mingau não
foi levada em consideração, mas geralmente, o leite de vaca ou em pó, nessa
área indígena, não costuma ser acrescentado ao mingau feito com a mandioca.


RESULTADOS
Os resultados mostram que 91,86 % das crianças eram amamentadas aos 6
meses, 80,23 %, aos 12 meses, e 25,58 % aos 24 meses. A mediana de duração
de amamentação foi de 12 meses; a de amamentação exclusive foi de 6 meses.
E a prevalência de amamentação exclusive aos 6 meses foi de 64,86 %. Porém,
61,02% das crianças menores de 6 anos usaram ou usam a mamadeira. 22,03%
começaram a tomar mingau com 6 meses de idade, e 15,25%, com 1 ano de
idade. 44,63 % começaram a comer "comida" com 1 ano de idade Um estudo
realizado entre os Guarani mostrou que 95,5 % das crianças estavam
amamentadas aos 6 meses (Serafim, 1997). Um outro estudo entre os Terena
mostrou que 93,8 % das crianças eram amamentadas aos 12 meses e 30,4 % aos
24 meses, mas o aleitamento materno exclusive era de 21 % no primeiro mês e
de 6,2 % no segundo mês. (Ribas, 2001). Observa-se então uma prevalência de
amamentação um pouco menor do que entre os Terena e os Guarani, mas uma
prevalência de amamentação exclusive muito maior. Tanto a amamentação
exclusive, quanto a amamentação de todo tipo, entre as crianças indígenas
do leste de Roraima, são bem mais longas do que entre crianças não
indígenas de diferentes regiões do país (Horta et al., 1996, Kitoko et
al.,2000, e Sena et al., 2002) . Kitoko et al. (2000) encontraram entre
crianças de João Pessoa apenas 23,9% das menores de 4 meses sendo
amamentadas de forma exclusive, contra 46,3 % em Florianópolis. A mediana
de duração de amamentação exclusive foi de 16,5 dias em João Pessoa, 53
dias em Florianópolis (id.) e 39,4 dias no DF onde 70,9% das crianças
menores de 6 meses eram amamentadas de forma parcial ou exclusive (Sena et
al., 2002), mais de 90 % entre os indígenas Guarani e do DSL. A mediana de
duração de amamentação de todo tipo em João Pessoa era de 6 meses e meio,
contra quase 8 meses em Florianópolis e 12 meses no DSL. Em Pelotas (RS),
ela passou de 3,1 a 4 meses entre 1982 e 1993 (Horta et al., 1996), prova
do esforço realizado pelos programas de saúde pública.


CONCLUSÃO
As crianças indígenas do leste de Roraima são amamentadas em maior
proporção e durante maior período do que as crianças não indígenas. Porém,
seis em cada dez crianças menores de 6 anos do leste de Roraima usaram ou
usam mamadeira, o que representa um risco de diarréia e desidratação
importante. Faz-se necessário incentivar a permanência do aleitamento
materno por tempo prolongado com introdução progressiva de alimentos em
idade apropriada, e recomendar o abandono da mamadeira para privilegiar a
alimentação com a colher. As mudanças ocorrendo na estrutura social dessas
comunidades podem induzir uma redução do tempo de aleitamento materno e
precipitar a introdução dos alimentos na dieta da criança. As práticas das
populações não indígenas e das populações urbanas em geral, aliadas às
ações de educação em saúde e à qualidade do acompanhamento das mães e das
crianças no SUS podem ser decisivas na evolução da amamentação e do desmame
dessas populações indígenas em contato cada vez mais acentuado com a
sociedade envolvente. Os profissionais de saúde atuando no Distrito
Sanitário Especial Indígena do Leste de Roraima têm papel fundamental no
sentido de frear os impactos negativos e implementar ações através dos
Agentes Indígenas de Saúde em articulação com outros atores chave das
comunidades e com as organizações indígenas. Um estudo comparativo poderia
ser feito daqui a alguns anos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HORTA, B.L. et al.: Amamentação e padrões alimentares em crianças de duas
coortes de base populacional no Sul do Brasil: tendências e diferenciais.
Cadernos de Saúde Pública, 1996, vol.12, suppl.1, p.43-48.
KITOKO, P.M. et al.: Situação do aleitamento materno em duas capitais
brasileiras: uma análise comparada. Cadernos de Saúde Pública, Dez 2000,
vol.16, no.4, p.1111-1119.
RIBAS, L.B.: Saúde e nutrição de crianças indígenas Terena, Mato Grosso do
Sul, Brasil. Tese de Doutorado em Nutrição, Faculdade de Saúde Pública da
USP, São Paulo, 2001.
SENA, M.C.F. et al.: Prevalência do aleitamento materno exclusivo no
Distrito Federal, Brasil. Cadernos de Saúde Pública, Jun 2002, vol.18,
no.3, p.613-621.


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