Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

June 4, 2017 | Autor: Fabricia Giuberti | Categoria: Filosofía medieval, História medieval
Share Embed


Descrição do Produto

Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte

TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

Universidade Federal de Uberlândia - Campus Santa Mônica Uberlândia - 2014 Volume 2

Imagem principal: ‘Willys de Castro Uberlândia, MG, 1926 - São Paulo, SP, 1988 Projeto para pintura, 1957/1958 guache sobre papel quadriculado, 11 x 11 cm Acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo, Brasil. Doação de Hércules Barsotti, 2001. Crédito Fotográfico: Isabella Matheus.’

XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte

TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

Universidade Federal de Uberlândia - Campus Santa Mônica Uberlândia - 2014

Universidade Federal de Uberlândia - UFU Reitor: Prof. Dr. Elmiro Santos Resende Vice-Reitor: Prof. Dr. Eduardo Nunes Guimarães Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação - PROPP Pró-Reitor: Prof. Dr. Marcelo Emilio Beletti Instituto de Artes - IARTE Diretora: Profa. Dra. Renata Bittencourt Meira Programa de Pós-Graduação em Artes Coordenador: Prof. Dr. Narciso Larangeira Telles da Silva Secretária: Raquel Borja Peppe

XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte Comitê Científico Marco Antonio Pasqualini de Andrade (UFU/CBHA) Jens Baumgarten (UNIFESP/CBHA) Letícia Squeff (UNIFESP/CBHA) Maria Elizia Borges (UFG/CBHA) Paulo Knauss (UFF/CBHA) Comissão de Organização do XXXIV Colóquio do CBHA Claudia Valladão de Mattos (UNICAMP/CBHA) Roberto Conduru (UERJ/CBHA) Maria Berbara (UERJ/CBHA) Mirian Nogueira Seraphim (IFMT/CBHA) Renato Palumbo Doria (UFU/CBHA) Luciene Lehmkuhl (UFU/CBHA) Marco Antonio Pasqualini de Andrade (UFU/CBHA) Alexander Gaiotto Miyoshi (UFU)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) C72 Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte (34: 2014: Uberlândia-MG) v. 2 Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte: Territórios da História da Arte, Uberlândia, MG, 26 - 30 de agosto de 2014 / Organização: Marco Antonio Pasqualini de Andrade - Uberlândia: Comitê Brasileiro de História da Arte - CBHA, 2015 [2014]. 1302 p. 2v: 16 x 23 cm: ilustrado ISSN: 2236-0719 1. História da Arte. I. Comitê Brasileiro de História da Arte. II. Andrade, Marco Antonio Pasqualini de. III. Anais do XXXIV Colóquio do CBHA. CDD: 709.81

O corpo idealizado: as representações do filósofo Ramon Llull nas iluminuras do Breviculum (c. 1325) - Fabrícia dos Santos Giuberti e Ricardo Luiz Silveira da Costa

O corpo idealizado: as representações do filósofo Ramon Llull nas iluminuras do Breviculum (c. 1325) Fabrícia dos Santos Giuberti Universitat d’Alacant - UA

Ricardo Luiz Silveira da Costa

Universidade Federal do Espírito Santo - UFE

Resumo: Por volta de 1325, foi produzido no reino da França um belíssimo codex, o “Breviculum” (BadischeLandesbibliothek de Karlsruhe, Alemanha, St. Peter, perg. 92) que narra a vida do filósofo Ramon Llull (1232-1316), tal qual apresentada em sua autobiografia intitulada “Vida Coetania” (1311). O “Breviculum”, por sua vez, é uma versão reduzida do “Electorium”, compilação de obras do filósofo organizada por seu discípulo Thomas Le Myésier (canônico de Arras, doutor em Medicina e membro da Sorbonne [m. em 1336]), obra feita com a intenção de simplificar o pensamento de Llull e assim apresentá-lo ao ambiente universitário parisiense. O objetivo desse trabalho é discorrer uma narrativa iconográfica de duas das 12 iluminuras do “Breviculum” e compará-las com o conteúdo da “Vida Coetânia”. Para tanto, utilizaremos à metodologia defendida por Jean-Claude Schmitt (O corpo das imagens), que ressalta a especificidade da arte em sua relação dinâmica com a sociedade que a produz. Palavras-Chave: Corpo.Ramon Llull. Iluminuras.Breviculum Abstract: In the Kingdom of France, around 1325, a beautiful codex was produced. It was called the “Breviculum” (BadischeLandesbibliothek de Karlsruhe, Germany, St. Peter, parchment. 92), and it narrates the life of philosopher Ramon Llull (1232-1316) as it is presented in his autobiography entitled “Daily Life” (1311). The “Breviculum”, however, is a reduced version of the “Electorium”, a compilation of Llull’s works organized by his disciple Thomas Le Myésier (canon of Arras, doctor in Medicine and member of Sorbonne [m. in 1336]) that is intended to simplify Llull’s thought in order to present it to the parisian university environment. The aim of this paper is to expatiate on an iconographic narrative of two of the 12 illuminations of the “Breviculum” and compare them with the content present in “Daily Life”. To that end, the methodology employed will be that of Jean-Claude Schmitt (the body of images), which highlights the specificity of the art in its dynamic relationship with the society that produces it. Keywords: Body. Ramon Llull. Illuminations. Breviculum. 1125

.

Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

Apresentação Ramon Llull (1232-1316) é uma figura complexa, no sentido mais literal da palavra1. Durante sua longa vida acumulou vários títulos: o de filósofo cristão na tradição neoplatônica, como o primeiro dos grandes místicos hispânicos, como o primeiro europeu a escrever novelas em prosa sobre temas contemporâneos, como o primeiro europeu (desde a Antiguidade clássica) que utilizou a língua materna para tratar de Teologia, Filosofia e Ciência, como um dos criadores do catalão literário, como missionário, apologista cristão e fundador de uma escola de línguas orientais destinada à formação de missionários e finalmente como o inventor de uma Arte (sistema de técnicas semimecânicas com notação simbólica e figuras combinatórias, base de sua apologética e aplicável a todos os campos do saber humano)2. É sobre a vida desse notável homem que discorreremos em nossa narrativa iconográfica. I- Vida Coetânea A honor, glòria, laor e magnificència de nostro senyor Deu Jesus crist, lo reverend e digne de gran memòria mestre Ramon Llull, del regne de Mallorques, instat e sollicitat una e moltes vegades per alguns seus devots, referí e recontàles coses davall escrites, on se conten en la sua vida, conversió e penitència molt alta e meravellosa, segons que especificadament davall aparrà.3 À honra, glória, louvor, magnificência de Nosso Senhor Deus Jesus Cristo, o reverendo e digno de grande memória, mestre Ramon Llull, do reino de Maiorca, instado e solicitado uma e muitas vezes por alguns de seus devotos, (ele) referiu e contou as coisas abaixo escritas, onde se contêm a sua vida, conversão e penitência4 muito alta e maravilhosa, segundo que aparecem abaixo especificadamente.

Provavelmente por volta de setembro do ano de 1311, Llull ditou sua vida (Vita Coaetania) aos monges de Cartuxa de Vauvert,5 em Paris, extramuros, onde hoje se situam os Jardins de Luxemburgo.6 A primeira redação foi em latim porque a obra foi concebida como uma apresentação de Ramon ante o Concílio Geral da Igreja que se celebrou naquele ano na cidade de Vienne, no Delfinado.7 Houve uma tradução catalã, feita por um discípulo no final do século XIV, o qual introduziu algumas mudanças. A Vida Coetânia é uma justificação da vida e da obra de Llull, muito bem fundamentada: desde sua conversão até sua ida ao Concílio, o BONNER, Antoni. “Ambient Históric I vida de Ramon Llull”. In: Obres Selectes de Ramon Llull (1232-1316). Mallorca: Editorial Moll, 1989, Vol. I, p. 03.

1

2

Ibid.; loc. cit.

RAMON LLULL. Vida Coetânia (trad.: Ricardo da Costa). Disponível em: . Acesso em: 28 de julho 2014. 3

4 Passagem tipicamente franciscana. Ver OLIVER, Antonio. “El Beato Ramon Llull en sus relaciones con la Escuela Franciscana de los siglos XIII-XIV”. In: Estúdios Lulianos, 1966, pp. 47-55. In: COSTA, op. cit., p. 6. nota 4. 5 Vauvert era um dos três depósitos de livros criados por Llull em vida, com o objetivo de transmitir sua obra às futuras gerações (os outros depósitos eram em Gênova, financiado pelo patrício Perseval Spinola, e em Palma de Maiorca, com o apoio financeiro de seu genro). Estes três depósitos de livros determinaram à futura tradição manuscrita luliana: uma linha francesa, uma italiana e uma catalã. Ibid., p. 5. 6 Cf. BATLLORI em OE I, 31. Para ver a localização do mosteiro, ver LLINARES, LLULL, p. 90, n. 206. In: BONNER, op. cit., p. 10, nota 1. 7

BADIA, Lola; BONNER, Anthony.Ramón Llull: vida, pensamiento y obra literária. Barcelona: Empúres, 1988, pp. 11- 54.

1126

O corpo idealizado: as representações do filósofo Ramon Llull nas iluminuras do Breviculum (c. 1325) - Fabrícia dos Santos Giuberti e Ricardo Luiz Silveira da Costa

texto apresenta o beato guiado sempre por uma vontade superior, divina. As peregrinações, as viagens a Montpellier, Paris e Roma, as questões diplomáticas e as viagens missionárias seguem um fio cronológico, em torno do momento culminante (filosoficamente falando) do texto: o discurso que Ramon pronuncia ante o rei de Túnis em 1293, em que pretendeu demonstrar a verdade do Cristianismo através de sua Arte.8 II- O Manuscrito Thomás Le Myésier (1336), um discípulo de Ramon Llull e médico da Corte Francesa, por volta de 1325 organizou o Breviculum e o ilustrou com doze miniaturas de grande luxo que se conservam em um códice da BadischenLandesbibliothek de Karlsruhe (Alemanha). O manuscrito, resultado de um trabalho feito entre 1321-1336, no norte da França (possivelmente em Arras), inclui 45 folhas, cujas medidas são, aproximadamente, 34,5 x 28cm. Le Myésier conheceu Llull em Paris em 1287 e continuou a trabalhar intensamente para difundir os escritos do filósofo, sobretudo para combater as disputas parisienses sobre o averroísmo. A fim de tornar frutífero o lulismo, compilou o resumo de algumas de suas obras: o Electorium Magnum, compilação das obras do filósofo e o “Breviculum”, sua versão reduzida. O Breviculum está organizado em doze miniaturas de página inteira que narram sua vida de forma sequencial e com textos explicativos. Nele é apresentada a vida de Llull e sua filosofia é representada com imagens alegóricas. Detivemo-nos, inicialmente, na pré-análise iconográfica de duas dessas miniaturas: as lâminas I e IV do pergaminho. III- Narrativa Iconográfica: Miniaturas do Breviculum A primeira iluminura do Breviculum – lâmina I - está disposta em três cenas. Da esquerda para a direita, há, iconograficamente, a narrativa da conversão de Llull (Figura 1). O primeiro plano da imagem mostra Ramon sentado a escrever, possivelmente em seu quarto, pois as cortinas abertas mostradas logo acima de sua cabeça, fazem-nos supor tratar-se do interior desse ambiente. Llull olha para o exterior como se contemplasse, de sua janela, a aparição do Cristo cinco vezes repetidas. O Cristo é representado de forma realista, o corpo parece de fato pender-se da cruz, pois sua inclinação é para frente e para direita. A cabeça pende ligeiramente para a mesma direção e chega a tocar o ombro direito e a auréola cruciforme acentua e acompanha esse movimento. O perizônio- manto que encobre a nudez do cristo- é assimétrico e com pregas acentuadas, e chega até a altura dos joelhos, sua cor púrpura, a cor real, pode representar a paixão de Cristo, denotando que mediante a imensa dor o Cristo ainda possui vida. Os olhos da figura estão profundamente fechados e o corpo de Cristo exibe uma trágica flexão de dor,9 detalhe que enfatiza a aparência de sofrimento e 8

BADIA, Lola; BONNER, Anthony. 1988, p. 11-54 passim.

9

FRANCASTEL, Pierre. A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva, 1982, p. 159.

1127

.

Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

Figura 1 - Experiência de conversão e peregrinações de Ramon Lull a Rocamadour e Santiago de Compostela. Iluminura I do Breviculum. Badische Landesbibliothek de Karlsruhe, St. Peter, pergaminho (detalhe). Raimundus Lullus Ikonographie.

a conseqüente humanidade do Cristo. Suas chagas são discretas e delas escorrem pouco sangue. “O movimento do Cristo é igualmente vívido: parece sair-se da composição [...]”.10 As mãos estão acima da cabeça, sugerindo o peso do corpo inerte. Os joelhos estão levemente flexionados e a perna esquerda encobre parcialmente à direita. O crucifixo aparece em um momento fundamental da hagiografia luliana. Representa o momento em que Llull se encontra com o Cristo crucificado, ou seja, o elemento-chave de sua conversão. Na Vida Coetânea essa cena é descrita da seguinte maneira: estava Llull uma noite assentado ao lado de sua cama, disposto a compor e a escrever em sua língua vulgar uma cantiga sobre certa mulher que amava com um amor encantador. Enquanto começava a 10

FRY, Roger. Visión y diseño. Buenos Aires: Galatea Nueva Visión, 1959. p. 85.

1128

O corpo idealizado: as representações do filósofo Ramon Llull nas iluminuras do Breviculum (c. 1325) - Fabrícia dos Santos Giuberti e Ricardo Luiz Silveira da Costa

escrever a predita canção, olhou a direita e viu o Senhor Jesus Cristo suspenso em uma cruz. Vendo isso teve medo, deixou as coisas que tinha na mão e foi para cama dormir. No dia seguinte ainda preocupado com a visão que tivera, pôs-se novamente a escrever a sua predita canção, quando o Senhor lhe aparecera da mesma maneira na cruz e assim foram as cinco vezes repetidas. Ramon estava aterrorizado com as visões. “Maior quam ante et magis terribilis/maior e mais terrível do que antes.” Passou, então, à noite, a pensar em seu significado. Ramon compreendeu que aquelas aparições não pretendiam outra coisa senão que abandonasse o mundo a fim de dedicar-se dali em diante inteiramente ao serviço do Senhor Jesus Cristo. Llull continuou pensando e concluiu que ninguém poderia prestar a Cristo um serviço melhor e de tão grande que dar a sua vida e alma por seu amor e honra e assim converter ao seu culto e serviço os sarracenos que pelo seu grande nome cercavam os cristãos por todos os lados.11 Llull, disposto a concretizar esse propósito, formula um triplo objetivo: 1) procurar a conversão dos infiéis, até sofrer a morte por Cristo; 2) redigir um livro, ‘o melhor do mundo’, contra os erros dos infiéis; 3) suplicar a fundação de monastérios onde se ensinassem as línguas necessárias para sua missão.12 O segundo plano da tríade iconográfica, ou seja, da imagem central da iluminura, mostra Ramon subindo a montanha com um cajado na mão, utensílio muito utilizado por aqueles que faziam longas caminhadas, e portando ao que parece um alforje em suas costas. O beato é retratado como peregrino do santuário mariano de Rocamador (Occitânia). Além disso, a imagem mostra o momento em que Llull finalmente chega diante da capela e se depara com a imagem da virgem e o menino assentados em um trono ricamente ornado em ouro. O beato é retratado na imagem de semiperfil e com os olhos postos firmemente na santa, de sua boca saem inúmeras palavras, que nos fazem crer que seja a oração de Llull para obter êxito em seu propósito: pregar aos infiéis. Poucas cenas compõem o terceiro e último plano desta miniatura. Essa assim como a anterior mostra Llull como peregrino, mas desta vez, a Santiago de Compostela. Na cena o beato novamente é representado subindo uma montanha a fim de realizar sua peregrinação aos lugares santos. Llull porta, mais uma vez, o cajado e o alforje, típicos dos viajantes e é retratado abaixado e ajoelhado sobre sua perna esquerda, em um claro sinal de reverência ao homem que está à sua frente, em um plano superior ao seu. Cremos tratar-se de São Ramon de Penyafort (ca.1185-1275), haja vista o encontro de Llull com ele em Barcelona, na ocasião de sua peregrinação. Penyafort é retratado, ao que parece, em uma igreja assentado em uma cátedra e vestindo o hábito negro, comum aos dominicanos, em sua cabeça um chapéu também de cor negra e circundado por uma auréola em forma de trança, em sua mão esquerda um pequeno cajado negro semelhante ao de Llull e na lateral esquerda de seu tronco uma pequena bolsa ou alforje. Tais objetos-cajado e alforje- eram considerados símbolos de 11

BONNER, 1989, p.12-15 passim.

GAYÀ, Jordi. “El canvi de vida”. In: Introducció a R. Llull, Barrer llibre sobre la conquesta de Terra Santa. Barcelona: Proa, 2002, pp. 14-15.

12

1129

.

Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

humildade e vida dedicada ao serviço de Cristo. É perceptível o diálogo entre eles, devido à quantidade de palavras que saem da boca de Llull e a posição gesticular das mãos de ambos. De acordo com a Vida Coetânea, Ramon de Penyafort ao conhecer os planos de Llull de ir a Paris para adquirir a formação necessária para levar adiante seus propósitos, convence-o a voltar a Mallorca.

Figura 2 - Iluminação em Randa e Llull ensinando em Paris. Iluminura IV do Breviculum. Badische Landesbibliothek de Karlsruhe, St. Peter, pergaminho (detalhe). Raimundus Lullus Ikonographie.

Na lâmina II – diferentemente da imagem anterior – não é a peregrinação que está em questão, mas a devoção privada e o ensino. A iluminura é composta de várias cenas que denotam momentos diferentes da vida do beato (Figura 2). Iniciaremos a análise deste corpus pela figura de Llull representada no plano superior da esquerda para direita. Nela, Ramon aparece no alto de uma montanha, com a face voltada para o céu e em estado contemplativo. De sua boca saem palavras, as quais denotam ser 1130

O corpo idealizado: as representações do filósofo Ramon Llull nas iluminuras do Breviculum (c. 1325) - Fabrícia dos Santos Giuberti e Ricardo Luiz Silveira da Costa

uma oração, em virtude de suas mãos estarem em posição de súplica. Na Vida Coetânea, essa cena é descrita como a iluminação de Randa, nome da montanha que ficava perto da casa de Llull, onde ele costumava subir, a fim de contemplar a Deus mais tranquilamente. Lá permaneceu por oito dias, quando em um dado instante concedeu-lhe o Senhor uma revelação ou iluminação dando-lhe a forma e a maneira de como escrever o livro que tanto almejava para combater os erros dos infiéis e propagar a santa fé católica. Na imagem central da mesma iluminura, vemos Llull novamente na montanha de Randa, desta vez dentro de um ermitório o qual ele mandara edificar no lugar onde recebera a iluminação. Nessa cena Llull parece ouvir atentamente o que diz o homem que se encontra a sua frente, uma vez que o beato não é o emissor do diálogo principal, porquanto as palavras não saem de sua boca, ao contrário da cena anterior. Outra imagem compõe a cena: o homem anteriormente em conversa com Llull é retratado de joelhos a beijar um grande livro, o qual supomos ser o mesmo escrito por Ramon após sua iluminação. A última imagem desta pré-análise apresenta Llull na parte superior da cena e em posição elevada e destacada se comparada aos demais personagens. Está assentado em uma cátedra e com um grande livro aberto sobre um púlpito. Ele faz a leitura deste livro. Podemos afirmar isso, pois basta ver a quantidade de palavras expelidas de sua boca a inundar a cena. Seus interlocutores ouvem atônitos. O beato, nessa ocasião, ensina em Paris a convite do rei de Maiorca. IV- Conclusão O Breviculum tem um destinatário real: é por Thomas Le Myésier dedicado a uma personalidade elevada; a rainha Joana de Borgonha, esposa de Filipe V d’Artois e a Matilde d’Artois, sua filha mais velha, de quem era médico pessoal. Thomas apresentou o resumo (Breviculum) prometido à Rainha da França e Navarra e, de acordo com a intenção do próprio Ramon, compilado a partir de suas 155 obras. A mostra em miniatura de Thomas torna-se muito cedo um exemplo claro do que teríamos por características do retrato realista. A apresentação de seu extenso trabalho (o magnum Electorium) é habilmente encenada. O surgimento de miniaturas vai voltar para as instruções precisas de Le Myésier, o qual considera as imagens do Breviculum, por um lado, como a representação do lulismo; por outro, como um verdadeiro incentivo para o bom comportamento. O Breviculum é um códice o qual narra, por meio de imagens,a vida e obra do filósofo maiorquino Ramon Llull. Em princípio, há de se concluir: suas 12 iluminuras possuem a função de instrução, haja vista a imagem possuir o papel de alimentar o pensamento das coisas santas; outrossim, ela pode comover o espírito, suscitar um sentimento de compunção para o elevar-se à adoração de Deus.13 13

BASCHET, Jérôme.” Introdução: a imagem-objeto”, In: SCHMITT, Jean-Claude et BASCHET, Jérôme. L’image.

1131

.

Anais do XXXIV Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte TERRITÓRIOS DA HISTÓRIA DA ARTE

Referências Bibliográficas: BADIA, Lola; BONNER, Anthony.Ramón Llull: vida, pensamiento y obra literária. Barcelona: Empúres, 1988. BASCHET, Jérôme.” Introdução: a imagem-objeto”, In: SCHMITT, Jean-Claude et BASCHET, Jérôme. L’image. Fonctions et usages dês images dans L’Occident médiéval. Paris: Le Léopard d’Or, 1996, (tradução: Maria Cristina C. L. Pereira) . BONNER, Antoni. “Ambient Históric I vida de Ramon Llull”. In: Obres Selectes de Ramon Llull (1232-1316). Mallorca: Editorial Moll, 1989, Vol. I. FRANCASTEL, Pierre. A realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva, 1982 FRY, Roger. Visión y diseño. Buenos Aires: Galatea Nueva Visión, 1959. GAYÀ, Jordi. “El canvi de vida”. In: Introducció a R. Llull, Barrer llibre sobre la conquesta de Terra Santa. Barcelona: Proa, 2002. OLIVER, Antonio. “El Beato Ramon Llull en sus relaciones con la Escuela Franciscana de los siglos XIII-XIV”. In: Estúdios Lulianos, 1966. RAMON LLULL. Vida Coetânia (trad.: Ricardo da Costa). Disponível em: . Acesso em: 28 de julho 2014.

Fonctions et usages dês images dans L’Occident médiéval. Paris: Le Léopard d’Or, 1996, p. 1 (tradução: Maria Cristina C. L. Pereira)

1132

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.