Análise comparativa dos instrumentos de proteção do meio amb natural e do trabalho na mineração

May 24, 2017 | Autor: Romeu Thomé | Categoria: Direito Ambiental, Mineração, Mecanismos protetivos, Meio ambiente do trabalho
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Referência bibliográfica do artigo:

THOMÉ, Romeu; MENDES, Samuel. Análise comparativa dos instrumentos jurídicos de proteção do meio ambiente do trabalho e do meio ambiente natural na mineração brasileira. Revista Magister de Direito Ambiental e Urbanístico, v. 65, p. 73-91, 2016.

ANÁLISE COMPARATIVA DOS INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E DO MEIO AMBIENTE NATURAL NA MINERAÇÃO BRASILEIRA

COMPARATIVE ANALYSIS OF PROTECTION LEGAL INSTRUMENTS OF WORKING ENVIRONMENT AND NATURAL ENVIRONMENT IN THE BRAZILIAN MINING

Samuel Mendes1 Romeu Thomé2

RESUMO O presente trabalho procura estabelecer uma análise comparativa entre os mecanismos jurídicos de proteção do meio ambiente natural e do meio ambiente do trabalho. Para tanto, utiliza-se a mineração como pano de fundo, tendo em vista tratar-se de atividade que produz riscos, em escala considerável, tanto para a manutenção da qualidade dos recursos naturais (meio ambiente natural) quanto para a saúde e segurança dos trabalhadores desta atividade (meio ambiente do trabalho). O objetivo do artigo é, a partir do conceito mais amplo e abrangente de meio ambiente, que não fica restrito aos elementos do meio ambiente natural, aproximar e estabelecer possíveis conexões entre os instrumentos de proteção do meio ambiente natural e do trabalho. Foram utilizados, na pesquisa, além do método jurídicocomparativo, o jurídico-propositivo, a fim de sugerir o estabelecimento do diálogo mais efetivo entre as normas de Direito Ambiental e de Direito do Trabalho regulamentadoras da atividade de exploração mineral. Concluiu-se, por fim, que alguns princípios jurídicos usualmente aplicados para a proteção e reparação do meio ambiente natural apresentam base argumentativa eficazmente útil para a proteção do meio ambiente do trabalho, e devem, nessa perspectiva, ser desenvolvidos e aprofundados. PALAVRAS-CHAVE: meio ambiente natural; meio ambiente do trabalho; mineração; mecanismos protetivos. 1

Mestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC). Integrante do grupo de pesquisa “A gestão do patrimônio ambiental e a mineração: as medidas compensatórias ambientais e o desenvolvimento sustentável”, da Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC). Especialista em Direito Ambiental pela Universidade Gama Filho (UGF). Assessor Jurídico Ambiental do Sindicato da Indústria da Construção Pesada de Minas Gerais (SICEPOT-MG). Membro da Comissão de Direito Ambiental da OAB-MG. Advogado. 2 Doutor em Direito Público com ênfase em Direito Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG). Mestre em Direito Econômico com ênfase em Direito Ambiental pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Especialista em Direito Ambiental pela Faculdade de Direito da Universidade de Genebra, Suíça. Professor de Direito Ambiental nos cursos de Graduação e de Mestrado da Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC). Pesquisador líder do grupo de pesquisa “A gestão do patrimônio ambiental e a mineração: as medidas compensatórias ambientais e o desenvolvimento sustentável”, da Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC). Advogado.

ABSTRACT This paper seeks to establish a comparative analysis of the legal mechanisms of protection of the natural environment and the working environment. Therefore, we use mining as a background, considering that this is activity that produces risks, on a considerable scale, both to maintain the quality of natural resources (natural environment) and to the health and safety of workers of this activity (working environment). The purpose of the paper is from the broader and more comprehensive concept of environment, which is not restricted to the elements of the natural environment, approach and establish possible connections between the protection instruments of the natural and working environment. It was used in the research, in addition to legal and comparative method, the legal and propositional, in order to suggest the establishment of more effective dialogue between the regulatory standards of the Environmental Law and Labor Law of the mineral exploration activity. It was concluded, finally, that some legal principles usually applied to the protection and repair of the natural environment have argumentative base effectively useful for the protection of the working environment, and should, in this view, be developed and deepened. KEYWORDS: natural environment; working environmental; mining; protective mechanisms.

INTRODUÇÃO A doutrina ocupa-se, há alguns anos, com a hercúlea tarefa de conceituar meio ambiente. Compreende-se que, de fato, as particulares dimensões e variantes atribuídas a essa expressão pelas diversas ciências avolumam-se em múltiplas concepções. O intuito do presente trabalho não é, todavia, atribuir definição taxativa a meio ambiente, mas sim demonstrar a relação instaurada entre o que parcela da doutrina jurídica ambiental denomina meio ambiente do trabalho e o meio ambiente natural. Os instrumentos jurídicos de proteção dos recursos naturais se assemelham àqueles que têm como meta garantir a qualidade do ambiente laboral. Busca-se, com essa aproximação, desconstruir a barreira existente entre o Direito Ambiental e o Direito do Trabalho. A atividade de exploração de recursos minerais foi adotada como pano de fundo. Importa ressaltar que esta escolha não se deu aleatoriamente. Os riscos decorrentes da atividade minerária são produzidos em escala considerável tanto para a manutenção da qualidade dos recursos naturais (meio ambiente natural) quanto para a saúde e segurança dos trabalhadores desta atividade (meio ambiente do trabalho). O alto grau dos impactos (muitos deles negativos) decorrentes da mineração sobre o meio ambiente natural e os perigos a que são expostos os trabalhadores exigem a efetiva

utilização de instrumentos preventivos e reparatórios previstos nas normas vigentes. Os institutos de Direito Ambiental e de Direito do Trabalho, nessa perspectiva, entrelaçam-se.

1. O MEIO AMBIENTE DO TRABALHO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981), em seu artigo 3º, inciso I, definiu meio ambiente como o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. Esse conceito vem sendo alvo de críticas da doutrina especializada, sobretudo a partir da constitucionalização da proteção ambiental em 1988. Os principais argumentos relacionam-se à concisão e objetividade da norma de 1981, que teria se tornado insuficiente levando-se em consideração a amplitude do termo meio ambiente estabelecida pela Constituição Federal de 1988, que englobaria novos valores e elementos. Cumpre observar que o texto da Constituição da República de 1988 traz elementos interpretativos importantes ao fazer referência ao meio ambiente “ecologicamente equilibrado”, classificando-o como bem “de uso comum do povo”, relacionando-o à “sadia qualidade de vida”, além de enquadrá-lo concomitante como um “direito” e como um “dever”. Interessante destacar que o Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA, ao editar a Resolução nº 306, de 05 de julho de 2002, estabelecendo os requisitos mínimos e o termo de referência para realização de auditorias ambientais, apresenta uma definição mais abrangente em relação àquela da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente. Conceitua meio ambiente como "conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas" (BRASIL, 2002, grifo nosso). Ao incluir os aspectos social, cultural e urbanístico, percebe-se a inserção no conceito legal de meio ambiente de valores relacionados ao ser humano e às atividades antrópicas, em complementação aos elementos do meio ambiente “natural” ou “físico”, destacados no inciso I do artigo 3º da Lei 6.938/81. Resta claro que o ser humano passa a ser considerado elemento central do conceito de meio ambiente, desatando a distinção, segundo alguns autores, entre “meio ambiente” e “natureza”. Para Anthony Giddens, por exemplo, natureza se refere a tudo o que é criado independentemente da atividade humana, permanecendo desvinculado da intervenção antrópica. O termo natureza estaria relacionado, assim, aos bens naturais propriamente ditos,

despidos de qualquer conotação ou vinculação com o meio social, econômico ou cultural dos seres humanos. Em muitas tradições, é claro, a natureza foi personalizada; era o domínio de deuses, espíritos ou demônios. Entretanto, seria equivocado considerar o animismo ou outras perspectivas comparáveis como uma mistura de mundos humano e natural. Ao contrário, a personalização da natureza expressou sua própria independência dos seres humanos, uma fonte de mudança e renovação separada da humanidade, mas com uma profunda influência sobre as vidas humanas. Se a natureza era determinada por decisões, estas não eram humanas. (BECK; GIDDENS; LASH, 1997, p. 97).

Constata ainda Giddens (1997, p. 97) que “até os tempos modernos [...] a natureza permaneceu primordialmente um sistema externo que dominava a atividade humana, e não o contrário”. O ser humano, sobretudo a partir da Revolução Industrial, passa a interagir com a natureza em escala cada vez mais intensa, com o intuito de utilizar os recursos naturais como matéria prima para o desenvolvimento de suas atividades industriais e para alcançar o almejado crescimento econômico. O termo meio ambiente, a partir de então, passou a ser utilizado para se referir à natureza já alterada e influenciada pela intervenção humana. Para Giddens (1997, p. 98), “na época atual, a ecologia ambiental surgiu especialmente como resposta à percepção da destrutividade humana”. Desse modo, o termo meio ambiente refere-se não apenas aos bens naturais (meio ambiente físico) desvinculados da ação humana, como também ao conjunto composto pelos bens naturais já influenciados de alguma forma pela ação antrópica. Há uma nítida socialização da natureza no conceito moderno de meio ambiente (THOMÉ, 2014, p. 153). O ponto de partida para a análise de questões ambientais contemporâneas consiste na indissociável conexão entre a natureza, os interesses e as atividades dos seres humanos, como o bem-estar social e o crescimento econômico. Desse modo, a partir do alargamento de suas dimensões e elementos, é possível classificar o meio ambiente, hodiernamente, em a) meio ambiente natural; b) meio ambiente artificial; c) meio ambiente cultural; d) meio ambiente do trabalho. Cumpre destacar que, por óbvio, o meio ambiente deve ser considerado de forma unitária, composto pelos elementos enumerados, todos essenciais para a sadia qualidade de vida. A classificação do meio ambiente pela doutrina e jurisprudência pátria tem como objetivo primevo apresentar, de maneira didática, suas diversas dimensões. Neste sentido

afirma Celso Antônio Pacheco Fiorillo (2010, p. 71) que “a divisão do meio ambiente em aspectos que o compõem busca facilitar a identificação da atividade degradante e do bem imediatamente agredido”. Segundo a doutrina majoritária, meio ambiente natural ou físico é composto pelos recursos da natureza, tais como a água, o ar, o solo, a fauna e flora, e sua inter-relações recíprocas, como previsto na definição da Lei nº. 6938, de 31 de agosto de 1981. Já o meio ambiente artificial é composto pelo conjunto de edificações e equipamentos públicos, normalmente situados nos espaços urbanos, onde considerável parcela dos impactos ambientais é produzida na atualidade. O meio ambiente cultural, por sua vez, engloba o patrimônio histórico, artístico, arqueológico, paisagístico, turístico e espeleológico, merecendo especial proteção nos artigos 215 e 216 da Constituição de 1988. Por fim, resta analisar o meio ambiente do trabalho, geralmente relegado pelas análises jurídico-ambientais por ser considerado elemento do Direito do Trabalho. Esse viés laboral o distancia, de certa maneira, dos institutos de Direito Ambiental. Segundo Fiorillo (2010, p. 73),

Constitui meio ambiente do trabalho o local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais relacionadas à sua saúde, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que ostentem (homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos, etc.).

O meio ambiente do trabalho refere-se às condições ambientais do ser humano em seu cotidiano laboral, sendo os bens jurídicos tutelados a saúde e a segurança do trabalhador no seu ambiente de trabalho. As normas relacionadas ao meio ambiente do trabalho têm como intuito possibilitar que o trabalhador desfrute de uma vida de qualidade, por meio da implementação de processos e procedimentos adequados em suas atividades laborais. Destaca-se, na Constituição da República de 1988, a seguinte previsão: Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: (...) VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

Pode-se afirmar que o texto constitucional reconhece a proteção do meio ambiente do trabalho como condição indispensável à garantia do direito fundamental à saúde e à sadia qualidade de vida. Observa Giongo (2010, p. 75) que “não se pode falar em vida saudável sem a existência de um meio ambiente ecologicamente sadio.” O direito ao meio ambiente equilibrado (incluindo aqui o meio ambiente do trabalho) como condição necessária para a sadia qualidade de vida está previsto no caput do artigo 225 da Constituição de 1988. Vejamos:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Assume relevância, por fim, o artigo 1º, inciso III da Constituição da República de 1988, que garante o direito fundamental da dignidade da pessoa humana. Todo ser humano trabalhador é titular do direito de uma vida digna, que passa pela garantia da saúde e de segurança em seu ambiente de trabalho. A partir da análise sistêmica da Constituição de 1988 conclui-se pela necessidade de aplicação do princípio do desenvolvimento sustentável às questões relativas ao meio ambiente do trabalho, no sentido de garantir o exercício das atividades laborais em ambiente saudável que, repercuta na sua qualidade de vida de um modo geral e assegure a dignidade da pessoa humana.

2. A PROXIMIDADE ENTRE INSTITUTOS PROTETIVOS DO MEIO AMBIENTE NATURAL E DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO

Com o intuito de aproximar institutos do Direito Ambiental e do Direito do Trabalho e, ainda, de destacar a interdisciplinariedade inerente às análises jus-ambientais, passaremos a abordar as diversas dimensões do ambiente laboral. Trataremos, inicialmente, da noção de impacto ambiental. Tanto o meio ambiente natural, como o do trabalho, sofrem impactos oriundos das diversas atividades humanas, podendo ter assim a sua qualidade e equilíbrio afetados. Impacto, nos termos do artigo 1º da Resolução CONAMA 01/1986, consiste em

qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam: I - a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II - as atividades sociais e econômicas; III - a biota; IV - as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V - a qualidade dos recursos ambientais (BRASIL, 1986).

Nota-se que essa definição se prestaria também a avaliar possíveis interferências no trabalho humano, já que, neste caso, tais alterações incidiriam sobre a saúde, segurança e bem-estar da força de trabalho (inciso I). Também é relevante ressaltar que, assim como em relação ao meio ambiente natural, impõe-se a verificação e mensuração dos impactos laborais, de maneira a avaliar se os mesmos podem ser suportados por aqueles que irão recebê-los. Para o meio ambiente natural esta análise é realizada a partir da elaboração da “Avaliação de Impactos Ambientais”, gênero do qual o Estudo de Impacto Ambiental é uma modalidade. O Estudo de Impacto Ambiental deve identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da atividade, através de identificação, previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos relevantes, discriminando os impactos positivos e negativos (benéficos e adversos), diretos e indiretos, imediatos e a médio e longo prazos, temporários e permanentes; seu grau de reversibilidade; suas propriedades cumulativas e sinérgicas; a distribuição dos ônus e benefícios sociais. Além disso, deverá definir as medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os equipamentos de controle e sistemas de tratamento de despejos, avaliando a eficiência de cada uma delas e elaborar um programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos positivos e negativos, indicando os fatores e parâmetros a serem considerados (BRASIL, 1986). Por este motivo, a Avaliação de Impactos Ambientais em muito se assemelha aos programas de prevenção e gerenciamento de riscos previstos na legislação trabalhista, dos quais podemos citar o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), definido pela Norma Regulamentadora3 nº 09, e o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) previsto na Norma Regulamentadora nº 22.4 Senão vejamos: 3

As Normas Regulamentadoras (NR) são normas relativas à segurança e medicina do trabalho emitidas pelo Ministério do Trabalho, de observância obrigatória pelas empresas privadas e públicas e pelos órgãos públicos da administração direta e indireta, bem como pelos órgãos dos poderes legislativo e judiciário que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 4 A obrigação de elaboração do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) também está prevista na Norma Reguladora da Mineração (NRM) nº 01, aprovada pela Portaria DNPM 237/01 e que dispõe sobre Normas

22.3.7.1 O Programa de Gerenciamento de Riscos – PGR deve incluir as seguintes etapas: a) antecipação e identificação de fatores de risco, levando-se em conta, inclusive, as informações do Mapa de Risco elaborado pela CIPAMIN, quando houver; b) avaliação dos fatores de risco e da exposição dos trabalhadores; c) estabelecimento de prioridades, metas e cronograma; d) acompanhamento das medidas de controle implementadas; e) monitorização da exposição aos fatores de riscos; f) registro e manutenção dos dados por, no mínimo, vinte anos e g) avaliação periódica do programa (BRASIL, 1999).

A partir da análise da previsão legal sobre o tema percebe-se a similaridade entre os objetivos de ambas as avaliações, no sentido de identificar, mensurar e controlar os riscos e os impactos negativos incidentes sobre o meio ambiente natural e a saúde e segurança da força de trabalho. Outra semelhança entre os instrumentos de proteção do meio natural e laboral reside na relevância da participação, no procedimento de avaliação de impactos, dos sujeitos que podem sofrer as consequências negativas da atividade mineral. Para o meio ambiente natural é prevista a realização de audiências públicas, reuniões destinadas a expor à comunidade as informações de obras e/ou atividades potencialmente causadoras de significativo impacto ambiental e seus respectivos Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios de Impacto Ambiental (EIA/RIMA),5 com o intuito de dirimir as dúvidas e analisar as críticas e sugestões apresentadas, que poderão subsidiar a decisão quanto ao licenciamento ambiental da atividade (MINAS GERAIS, 1994). Já em relação ao meio ambiente do trabalho, a NR-22, por exemplo, prevê que o Programa de Gerenciamento de Riscos, bem como suas alterações e complementações, deverão ser apresentados e discutidos na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes na Mineração (CIPAMIN),6 para acompanhamento das medidas de controle (BRASIL, 1999, item 22.3.7.1.1). É necessário lembrar que a degradação do meio ambiente natural pode também repercutir negativamente no meio ambiente do trabalho. Na atividade de mineração, por exemplo, os impactos de geração de ruído e poeira e a diminuição da qualidade ou quantidade Gerais para a atividade minerária relacionadas à busca permanente da produtividade, da preservação ambiental, da segurança e saúde dos trabalhadores. 5 Embora a Resolução CONAMA 009/87, que dispõe sobre as audiências públicas, preveja que neste procedimento seja analisado apenas o RIMA, esta norma deve ser entendida conforme as previsões constitucionais vigentes, devendo, portanto, o EIA também ser analisado na audiência pública. Neste sentido Machado (2013, p. 169). 6 A CIPAMIN, ou Comissão Interna de Prevenção de Acidentes na Mineração, deve ser organizada e mantida em regular funcionamento, por empresas de mineração ou Permissionários de Lavra Garimpeira na forma prevista na NR-22. A CIPAMIN é composta de representante do empregador e dos empregados e o seu funcionamento é similar ao previsto na NR-05 para as CIPAs.

de água disponível impactam na saúde daqueles que trabalham nas minas. Ademais, essas interferências ainda podem prejudicar as condições de moradia dos próprios trabalhadores que habitam nas imediações do local de trabalho, realidade comum nos empreendimentos minerários. Ademais, a efetividade no controle, seja de impactos ambientais ou riscos à saúde, depende da definição de padrões máximos aceitáveis, bem como limites acima dos quais devem ser adotadas medidas mais severas, inclusive jurídicas, no sentido de evitar que tais parâmetros sejam ultrapassados. A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, em seu art. 9º, inciso I, estabelece a necessidade de definição de padrões de qualidade em relação ao meio ambiente físico. No que se refere à proteção da saúde dos trabalhadores são previstos limites de tolerância, que definem a concentração ou intensidade máxima ou mínima e o tempo de exposição do trabalhador a agentes nocivos, com o objetivo de evitar a concretização de dano à saúde do trabalhador durante a sua vida laboral. Essas regras encontram-se definidas na Norma Regulamentadora (NR) nº 15, emitida pelo Ministério do Trabalho, por força do que dispõe os arts. 189 e 190 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).7 Ademais, cumpre acentuar que a base argumentativa de alguns princípios jurídicos usualmente aplicados para a proteção e reparação do meio ambiente natural ajusta-se perfeitamente à proteção da qualidade do ambiente de trabalho. O princípio da prevenção, por exemplo, tem como intuito a adoção de medidas que obstem a materialização dos riscos ao meio ambiente e ao ser humano. Como já salientado, no meio ambiente laboral o trabalhador pode ser atingido direta e imediatamente pelos danos ambientais e pelos riscos ocupacionais decorrentes de sua atividade. Dessa maneira, a avaliação e controle dos impactos ambientais e dos riscos ocupacionais através dos já citados EIA/RIMA, PPRA e PGR, nada mais é do que a implementação de instrumentos para prevenir possíveis danos à saúde e garantir a segurança do trabalhador. Pode-se, inclusive, afirmar que o princípio da prevenção no meio ambiente do trabalho encontra-se constitucionalizado,8 inserido no artigo 7º, inciso XXII, da Constituição Federal de 1988, que 7

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei 5.452/43, assim dispõe: Art. 189 - Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de exposição aos seus efeitos. Art. 190 - O Ministério do Trabalho aprovará o quadro das atividades e operações insalubres e adotará normas sobre os critérios de caracterização da insalubridade, os limites de tolerância aos agentes agressivos, meios de proteção e o tempo máximo de exposição do empregado a esses agentes (BRASIL, 1943). 8 A previsão constitucional de alguns princípios favorece a sua aplicação, pois, ao estarem positivados em norma de hierarquia superior, passam a orientar o ordenamento como um todo, exigindo a criação e aplicação de

estabelece como direito do trabalhador a redução dos riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança. O princípio do poluidor-pagador, por sua vez, impõe que o poluidor arque com “o custo social da poluição por ele gerada” (MILARÉ, 2005, p. 164), evitando a externalização dos custos negativos de produção e a socialização dos prejuízos decorrentes de sua atividade. O princípio do poluidor-pagador assume dupla função: a de evitar a concretização do dano e, caso seja necessário, a de impor a reparação integral do meio ambiente degradado. No aspecto preventivo, resta claro que aquele que utiliza recursos naturais deve adotar todas as medidas necessárias para internalizar as externalidades negativas da atividade, devendo pagar (com investimentos em tecnologia limpa, por exemplo) para evitar a degradação do meio ambiente. Da mesma maneira, os impactos negativos sobre o trabalhador, decorrentes da inobservância das normas de segurança do trabalho, geram um custo excedente, a ser suportado pela própria coletividade. Vale lembrar que os danos decorrentes de acidentes de trabalho são compensados, muitas vezes, pelos instrumentos financeiros da Previdência Social e do Sistema Único de Saúde (SUS), mantidos com recursos públicos. Os acidentes de trabalho e as doenças ocupacionais, muitas vezes evitáveis, acarretam, além dos prejuízos à saúde e à integridade física do trabalhador, impactos financeiros significativos, que afetam negativamente, no aspecto macro, a implementação de políticas públicas nas áreas da saúde e da previdência social. Impõe-se ao empregador, desse modo, evitar a concretização de danos ao empregado (e consequentes prejuízos financeiros à coletividade). O investimento em segurança do trabalho é medida que internaliza as externalidades negativas no próprio custo de produção. Sob outra perspectiva, o seguro de Acidente do Trabalho (SAT) e o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) constituem instrumentos que reforçam a similitude existente entre o princípio do poluidor-pagador e os institutos utilizados para garantir a segurança do trabalho. O Seguro de Acidente do Trabalho (SAT) materializa-se a partir de uma alíquota adicional paga pelas empresas sobre o total de sua folha de pagamentos mensal, configurando-se como contribuição para o financiamento dos benefícios concedidos em razão do grau de incidência dos riscos ambientais do trabalho. Estas alíquotas variam conforme o ramo de atividade econômica definido pela Classificação Nacional de Atividades Econômicas normas infraconstitucionais conforme o seu conteúdo. Além disso, os princípios constitucionalizados passam a contar com uma rigidez formal, sendo que suas alterações, em tese, poderiam ocorrer apenas através de um processo legislativo especial, com quórum qualificado, o que dificultaria a sua supressão ou modificação (SAMPAIO, 2003, p. 85-86).

(CNAE) e pelo grau de risco9 da empresa. Para evitar que as empresas fossem taxadas apenas por seu ramo de atividades e, para incentivar a atuação preventiva na saúde e segurança do trabalho, foi criado também o Fator Acidentário de Prevenção (FAP) para beneficiar as empresas com melhor nível de medidas preventivas. Neste sentido, o FAP permite um ajuste no valor pago em função da gestão de segurança e saúde ocupacional que a empresa adote, com redução possível de até 50% ou aumento de até 100% nas alíquotas de contribuição do SAT.10 Vale lembrar que as conquistas de segurança e adequação do local de trabalho às disposições normativas, sobretudo no que se refere à prevenção de acidentes ou de doenças ocupacionais, constituem direitos fundamentais do cidadão trabalhador. Evitar a concretização dos danos é mais eficaz, sob diversas perspectivas, do que remediá-los. Essa é a tônica que deve pautar tanto o meio ambiente natural quanto o meio ambiente laboral. Caso o dano venha a concretizar-se, aplica-se, tanto em relação ao meio ambiente natural quanto em relação ao meio ambiente do trabalho, o princípio da reparação, ou responsabilização, com o intuito de reparar e ou indenizar as vítimas pelos danos causados pela atividade. Destaca-se, ainda, o princípio da informação, aplicável tanto como mecanismo de proteção do meio ambiente natural quanto do trabalho. Para a efetiva participação dos interessados, os dados ambientais devem ser amplamente divulgados. Destaca Machado (2013, p. 129) que “as informações ambientais recebidas pelos órgãos públicos devem ser transmitidas à sociedade civil, excetuando-se as matérias que envolvam comprovadamente segredo industrial ou do Estado. A informação ambiental deve ser transmitida sistematicamente, e não só nos chamados acidentes ambientais”. De acordo com a Constituição da República (art. 5, XXXIII), “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.” Não restam dúvidas sobre o interesse coletivo ou geral de que são dotadas as informações sobre o meio 9

Através do Decreto 6.042/07, os graus de riscos dos ramos de atividades das empresas foram reclassificados em função da ocorrência dos acidentes, tomando por base o histórico dos benefícios concedidos pelo INSS, entre os anos de 2000 e 2004. Desta forma, as empresas deixaram de ser taxadas apenas pelo perigo potencial de suas atividades. 10 As alterações das alíquotas do SAT permitidas pelo FAP são calculadas conforme o grau individual de sinistralidade de cada empresa para a Previdência Social, através da verificação de suas taxas de frequência, gravidade e custo dos acidentes e doenças ocupacionais, a partir da metodologia do Nexo Técnico Epidemiológico (NTEP).

ambiente, motivo pelo qual tais dados hão de ser efetivamente difundidos e publicados pelo Poder Público, com periodicidade e em meios hábeis a atingir a coletividade interessada. Já no âmbito do meio ambiente laboral na atividade minerária, o princípio da informação exige que os trabalhadores tenham direito a conhecer os riscos existentes no local de trabalho que possam afetar sua saúde ou segurança, devendo obter informação relativa à sua segurança ou saúde que esteja sob a responsabilidade do empregador ou da autoridade competente.11 Em ambas as situações de incidência do princípio da informação, a divulgação de dados é essencial para que a coletividade e os trabalhadores dimensionem os riscos a que serão submetidos pela atividade de exploração mineral e, a partir dessa ciência, adotarem as medidas que julgarem convenientes para evitar ou minimizar esses impactos negativos. Além disso, não se pode perder de perspectiva que o princípio democrático (ou da participação) pressupõe o direito de informação. Só é possível a participação em defesa do meio ambiente (seja natural ou do trabalho) quando há prévio acesso às informações pertinentes. O princípio democrático prevê a participação de diferentes grupos sociais na formulação e execução da política ambiental (MILARÉ, 2005). Antunes (2010) aponta o direito à informação e à participação como forma de implementação desse princípio. Além da já mencionada correlação entre as audiências públicas no procedimento de licenciamento ambiental e a apresentação do Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR) ou do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) para discussão nas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (constituídas por representantes da força de trabalho e dos empregadores), existem várias outras formas de participação na gestão de riscos no meio ambiente do trabalho. Como exemplo, podemos citar as CIPAs, encarregadas de inúmeras atribuições previstas nas Normas Regulamentadoras, entre elas: a elaboração e divulgação de um mapa, com a identificação dos riscos do processo de trabalho, realizado com a participação do maior número possível de trabalhadores; participação da implementação e do controle da qualidade das medidas de prevenção necessárias, bem como da avaliação das prioridades de ação nos locais de trabalho; realização periódica, de forma autônoma, de verificações nos ambientes e condições de trabalho visando à identificação de situações que venham a trazer riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores; obrigação de divulgação aos trabalhadores de informações relativas à segurança e saúde no trabalho; participação, com

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Vide artigo 13 da Convenção 176 da OIT sobre segurança e saúde nas minas.

o SESMT,12 das discussões promovidas pelo empregador, para avaliar os impactos de alterações no ambiente e processo de trabalho relacionados à segurança e saúde dos trabalhadores; possibilidade de requerer ao empregador a paralisação de máquina ou setor onde considere haver risco grave e iminente à segurança e saúde dos trabalhadores; participação, em conjunto com o empregador, da análise das causas das doenças e acidentes de trabalho e possibilidade de proposição de medidas de solução dos problemas identificados; promoção, anual, em conjunto com o SESMT, da Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho (SIPAT) e de Campanhas de Prevenção da AIDS (NR-05, item 5.16). Por fim, pode-se também estabelecer um paralelo em relação à participação da sociedade na formulação das políticas públicas de proteção do meio ambiente natural e do meio ambiente do trabalho. Enquanto para o meio ambiente natural múltiplos grupos sociais são incentivados a cada vez mais participar na formulação e execução da política ambiental (MILARÉ, 2005), a metodologia de regulamentação na área de segurança e saúde no trabalho tem como princípio básico a adoção do sistema Tripartite e Paritário, composto por governo, trabalhadores e empregadores, conforme procedimentos preconizados pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), nos termos da Portaria MTE nº 393/96. O intuito, aqui, também é proporcionar o debate amplo de todos os atores sociais envolvidos, para a formulação de políticas públicas relacionadas à segurança do trabalho. Vale lembrar que o Ministério do Trabalho, em observância ao princípio democrático, também vem oportunizando a participação social mais ampla por meio de consultas públicas como uma das etapas para a elaboração do texto básico de normas regulamentadoras sobre prevenção, segurança e saúde no trabalho.13

3. AS NORMAS DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE DO TRABALHO NA MINERAÇÃO

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Os Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) devem ser mantidos obrigatoriamente pelas empresas, nos termos da Norma Regulamentadora (NR) nº 4, com a finalidade de promover a saúde e proteger a integridade do trabalhador no local de trabalho. O dimensionamento dos SESMT vincula-se à gradação do risco da atividade principal e ao número total de empregados do estabelecimento, conforme os quadros constantes desta NR. 13 A título de exemplo destaca-se que a Norma Regulamentadora (NR) nº 01 encontra-se em consulta pública, sendo que a proposta de nova redação foi disponibilizada em consulta pública pela Portaria SIT n.º 428, de 27 de maio de 2014, cujo prazo foi prorrogado por mais 60 (sessenta) dias pela Portaria SIT n.º 446, de 16 de setembro de 2014, para coleta de sugestões da sociedade, sendo novamente prorrogado por mais 60 (sessenta) dias pela Portaria SIT n.º 449, de 11 de novembro de 2014.

Além de destacar a proximidade entre os institutos de proteção do meio ambiente natural e do meio ambiente do trabalho no ordenamento jurídico pátrio, importante abordar, ainda que objetivamente, as principais normas de proteção do meio ambiente laboral relacionadas à atividade de extração mineral. No âmbito internacional, cumpre salientar que o Brasil é signatário da convenção da Organização Internacional de Trabalho (OIT) sobre saúde e segurança nas minas. A referida Convenção foi promulgada, em âmbito interno, pelo Decreto 6.270/2007, tornando-se de observância obrigatória pelos empreendedores mineiros nos limites do território nacional.14 A Convenção da OIT prevê, expressamente, que os trabalhadores mineiros devem participar na preparação e na aplicação de medidas de segurança e saúde concernentes aos perigos e riscos decorrentes da indústria mineradora. Além disso, reconhece a importância de se prevenir qualquer modalidade de acidente mortal, lesão ou menoscabo da saúde dos trabalhadores ou da população, ou prejuízo ao meio ambiente advindo das atividades mineradoras. Nos termos do seu artigo 6º, determina, ainda, que ao adotar as medidas de prevenção e proteção do meio ambiente do trabalho, o empregador deverá avaliar os riscos e tratá-los na seguinte ordem de prioridade: “(a) eliminar os riscos; (b) controlar os riscos em sua fonte; (c) reduzir os riscos ao mínimo mediante medidas que incluam a elaboração de métodos de trabalho seguros; (d) enquanto perdure a situação de risco, prever a utilização de equipamentos de proteção pessoal, levando em consideração o que seja razoável e factível e o que esteja em consonância com a prática e o exercício da devida diligência”. As medidas destinadas a garantir a aplicação dessa Convenção em âmbito nacional estabelecer-se-ão por meio da legislação pátria, que deverá, quando for o caso, ser complementada por normas técnicas, diretrizes ou repertórios de recomendações práticas.15 Nesse sentido, a maior parte das disposições legais relacionadas ao regime jurídico do meio ambiente do trabalho na mineração está prevista na legislação trabalhista nacional, sobretudo nas disposições da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no Decreto-Lei 5.452/43, e nas Normas Regulamentadoras (NR) emitidas pelo Ministério do Trabalho. Cumpre destacar que a principal NR aplicável à atividade minerária é a NR-22, que tem por objetivo disciplinar os preceitos a serem observados na organização e no ambiente de

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O Decreto 6.270/2007 promulga a Convenção 176 e a Recomendação 183 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Segurança e Saúde nas Minas, adotadas em Genebra, em 22 de junho de 1995, na 85a Sessão da Conferência Internacional do Trabalho. 15 Artigo 4º da Convenção da OIT sobre Saúde e Segurança nas Minas.

trabalho, de forma a tornar compatível o planejamento e o desenvolvimento da atividade mineira com a busca permanente da segurança e saúde dos trabalhadores. O cumprimento da NR-22 é de responsabilidade das empresas mineradoras ou quaisquer permissionários de lavra garimpeira,16 que deverão ainda coordenar a implementação das medidas relativas à segurança e saúde dos trabalhadores das empresas contratadas e prover os meios e condições para que estas atuem em conformidade com a norma.17 A atividade de mineração também está sujeita às disposições do Decreto- Lei 227, de 28 de fevereiro de 1967 (Código de Mineração) que regula, por força do seu art. 3º, não apenas os direitos minerários (inciso I) e o seu regime de aproveitamento (inciso II), como também outros aspectos da indústria mineral (inciso III). Resta clara, a partir da leitura do referido Decreto-Lei, a competência do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) para fiscalizar diretamente as atividades de mineração, comércio e industrialização de matérias-primas minerais, para verificar o cumprimento integral das disposições legais e regulamentares (art. 88), bem como para expedir os regulamentos necessários à execução do Código de Mineração (art. 97).18 Além disso, constata-se que o Código de Mineração determina, em seu artigo 47, inciso V, que o titular da concessão mineral execute os trabalhos de mineração com observância das normas regulamentares. Com o intuito de minimizar os impactos ambientais decorrentes da atividade minerária e aprimorar as condições de saúde e segurança no trabalho, o DNPM, através da Portaria 237/01, resolveu publicar as Normas Reguladoras de Mineração - NRM:

As Normas Reguladoras de Mineração - NRM têm por objetivo disciplinar o aproveitamento racional das jazidas, considerando-se as condições técnicas e tecnológicas de operação, de segurança e de proteção ao meio ambiente, de forma a tornar o planejamento e o desenvolvimento da atividade minerária compatíveis com a busca permanente da produtividade, da preservação ambiental, da segurança e saúde dos trabalhadores (BRASIL, 2001, NRM-01, item 1.1.1).

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O campo de aplicação da norma é definido em seu item 22.2.1, sendo aplicável a qualquer tipo de atividade minerária, seja em minas subterrâneas, minas a céu aberto ou em garimpos, se aplicando ainda às atividades de beneficiamento mineral, bem como à pesquisa mineral. 17 Por este motivo, a norma estabelece que “quando forem realizados trabalhos através de empresas contratadas pela empresa ou Permissionário de Lavra Garimpeira, no contrato deverá constar o nome do responsável pelo cumprimento”. 18 Nos termos do Decreto 7.092/10, que aprova a Estrutura Regimental do DNPM, este órgão tem por finalidade promover o planejamento e o fomento da exploração mineral e do aproveitamento dos recursos minerais, bem como assegurar, controlar e fiscalizar o exercício das atividades de mineração em todo o território nacional, na forma da legislação, competindo-lhe ainda baixar normas, em caráter complementar, e exercer a fiscalização sobre o controle ambiental, a higiene e a segurança das atividades de mineração, atuando em articulação com os demais órgãos responsáveis e promovendo ações para o desenvolvimento efetivo do aproveitamento racional das jazidas, a segurança técnico-operacional das minas e o controle ambiental nas operações mineiras.

As vinte e duas Normas Reguladoras de Mineração (NRM) em vigor atualmente dispõem sobre temas diversos, entre eles: normas gerais para execução de atividades minerárias (NRM-01); normas específicas para lavra a céu aberto (NRM-02); normas específicas para as chamadas Lavras Especiais, assim entendidas aquelas com dragas flutuantes, desmonte hidráulico ou outros métodos, tais como por dissolução subterrânea, lixiviação etc (NRM-03); normas para aberturas subterrâneas (NRM-04); sistemas de suporte e tratamentos (NRM-05); ventilação (NRM-06); vias e saídas de emergência (NRM-07); prevenção contra incêndios, explosões e inundações (NRM-08); prevenção contra poeiras (NRM-09); sistemas de comunicação (NRM-10); iluminação (NRM-11); sinalização de áreas de trabalho e de circulação (NRM-12); circulação e transporte de pessoas e materiais (NRM13); máquinas, equipamentos e ferramentas (NRM-14); instalações (NRM-15); operações com explosivos e acessórios (NRM-16); topografia de minas (NRM-17); beneficiamento (NRM-18); disposição de estéril, rejeitos e produtos (NRM-19); suspensão, fechamento de mina e retomada das operações mineiras (NRM-20); reabilitação de áreas pesquisadas, mineradas e impactadas (NRM-21) e proteção ao trabalhador (NRM-22). Não obstante a multiplicidade de temas abordados pelas NRMs, observa-se que a maior parte das disposições sobre o meio ambiente do trabalho na mineração coincide com aquelas já previstas na NR-22 publicada pelo Ministério do Trabalho. Tal regra não se aplica, por óbvio, às normas que dispõem sobre questões concernentes ao meio ambiente natural ou físico e também àquelas que dispõem sobre obrigações inerentes à atividade de mineração. Vale lembrar que a atividade de mineração pode apresentar certas peculiaridades que requeiram a adoção, por parte de empreendedor, de medidas específicas de proteção de saúde e segurança, como nos casos de trabalhos desenvolvidos em escavações, túneis, galerias, minas e pedreiras, e no que se refere à tomada de medidas de prevenção para evitar explosões, incêndios, desmoronamentos e soterramentos, eliminar poeiras e gases, e garantir a rápida saída dos empregados do local de trabalho nos casos de acidente. Desse modo, além das normas previstas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), Decreto-Lei 5.452/43, tanto as NRs, especialmente a NR-22, quanto as NRMs, devem ser consultadas pelo empreendedor para a definição de suas obrigações em relação à manutenção da qualidade do meio ambiente do trabalho na mineração.

CONCLUSÃO

A garantia de exercício saudável e seguro das atividades laborais decorre de interpretação das normas constitucionais, que asseguram a dignidade da pessoa humana, a sadia qualidade de vida e o desenvolvimento sustentável, englobando tanto o meio ambiente natural quanto o do trabalho. Ao analisar as normas de Direito Ambiental e de Direito do Trabalho incidentes sobre a atividade de extração mineral, percebe-se uma nítida aproximação entre seus mecanismos preventivos e reparatórios. Se a verificação e a mensuração dos possíveis impactos da mineração sobre meio ambiente natural são feitos por meio da Avaliação de Impactos Ambientais (AIA), os programas de prevenção e gerenciamento de riscos, como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) exercem, por sua vez, papel similar em relação aos impactos sobre o meio ambiente do trabalho. Já no que tange à efetiva participação dos sujeitos que podem sofrer as consequências negativas da atividade mineral no procedimento de avaliação de impactos, destaca-se a realização de audiências públicas no procedimento de licenciamento ambiental. Esse instrumento pretende implementar o princípio democrático em matéria ambiental. A realização de discussão para o gerenciamento de riscos no ambiente de trabalho também está prevista nas normas que regulamentam as atividades minerárias. A participação dos trabalhadores é oportunizada nas reuniões da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes na Mineração (CIPAMIN). A definição de limites máximos de impactos suportáveis pela coletividade e pelos trabalhadores apresenta-se como outro ponto de contato entre as normas de proteção do meio ambiente natural e do trabalho. A definição de padrão de qualidade ambiental está prevista como instrumento da política nacional do meio ambiente. No âmbito laboral são estabelecidos limites de tolerância, com o intuito de proteger a saúde dos trabalhadores mineiros. Imperioso reconhecer, ainda, que alguns princípios jurídicos usualmente aplicados para a proteção e reparação do meio ambiente natural apresentam base argumentativa eficazmente útil para a proteção do meio ambiente do trabalho. Dentre eles destacam-se o princípio da prevenção, com vistas à redução dos riscos inerentes ao trabalho; do poluidorpagador, sobretudo para evitar a externalização dos custos negativos de produção e a socialização dos prejuízos decorrentes da atividade; e o princípio da informação, segundo o qual os trabalhadores têm direito a conhecer os riscos existentes no local de trabalho que possam afetar sua saúde ou segurança.

A necessidade de conciliar crescimento econômico e preservação ambiental exige o diálogo entre as normas de Direito Ambiental e de Direito do Trabalho regulamentadoras da atividade de exploração mineral. Riscos e impactos são inerentes à atividade de extração mineral, mas somente a garantia de proteção e reparação aos trabalhadores mineiros e ao meio ambiente natural podem qualificar a mineração como atividade sustentável.

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