Análise da Longa-Metragem \"Inside Out\" da Disney/Pixar: As Emoções na Personagem \"Disgust\"

Share Embed


Descrição do Produto

Análise da Longa-Metragem “Inside Out” da Disney/Pixar: As Emoções na Personagem “Disgust” António Ferreira1, Pedro Mota Teixeira1 e José Pedro Teixeira1 1

Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, Escola Superior de Design, Campus do IPCA – Lugar do Aldão 4750-810 Vila Frescainha S. Martinho BCL, Portugal {amferreira, pmteixeira, jteixeira}@ipca.pt

Abstract. O presente artigo é parte integrante de um estudo alargado das emoções nas personagens principais de Inside Out, uma longa-metragem da parceria Disney/Pixar. O objetivo principal é estudar as manifestações emocionais via facial e corporal, assim como as combinações mais utilizadas em/entre ambas. Desta forma, constatamos expressões que os autores entenderam como universais, algo que está em constante debate na comunidade científica. O presente estudo partirá de uma recolha de fotogramas das personagens indicadas, recorrendo e comparando a estudos prévios no âmbito social e psicológico, cujo tema principal é a comunicação não-verbal e que atentam comportamentos típicos humanos nos mais variados contextos. As personagens principais são cinco emoções universais e, neste caso, serão analisadas as que surgem com maior frequência, ou seja, as emoções da personagem Riley. Repulsa (Disgust) será a personagem investigada no presente artigo. Keywords: Expressão, Corpo, Face, Animação, Emoção.

1 Introdução As expressões faciais e corporais, enquanto canais informativos não-verbais, têm um papel fulcral na comunicação. Vários autores como Mehrabian, Ray Birthwistell, Navarro, Peace & Peace, Morris, McNeil, McCloud, Ekman & Friesen (cit. in [1]) destacam uma série de fatores nesse mesmo sentido: Mais de 65% da comunicação presencial é não-verbal; o sucesso da comunicação está na correta descodificação por parte do recetor; a identificação da personalidade de alguém consegue-se recorrendo à observação do comportamento corporal e facial; manifestações emocionais ocorrem com combinações semelhantes na face, em contraste com uma variedade expressiva corporal, onde a principal variável é o contexto (vide – (p. 1) [1]). A animação não é exceção para todos os aspetos acima descritos pois as emoções, aliadas aos princípios da animação, revelam-se condimentos essenciais na receita de uma clara comunicação entre personagem e espectador. Este último aspeto é válido para os vários tipos de personagem já que parte do processo de humanização das mesmas corresponde precisamente à atribuição de emoções. A nossa persistência e motivação, neste tipo de estudos, tem que ver com vários aspetos que Lohmmet & Marsella (p. 3-4) [1] enumeram, principalmente a dificuldade em encontrar um método eficaz para o estudo de manifestações naturais e fidedignas de emoções via corporal. Como consequência, existe grande dificuldade na construção de um código de gestos corporais universais à semelhança do Facial Action Coding System (FACS) para gestos faciais. Adicionalmente há um estudo de Gelder, citada pelas mesmas

575

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

autoras, que revela uns pesados 95% da investigação científica focada nas expressões faciais, em contraste com 5% dedicada a todas as outras expressões não-verbais, incluindo corporais. Acreditamos, a par de Ekman & Friesen [2], que as expressões faciais revelam claramente a emoção em causa e que o corpo comunica a forma como lidamos com essa mesma emoção. No entanto, discordamos da ideia de que através do corpo não transparece informação emocional. O facto de o corpo revelar como lida com determinadas emoções, pode criar uma série de reações padronizadas, ou seja, gestos que revelam igualmente a emoção vigente. Gostaríamos de deixar alguns alertas relativamente a estudos de recolha e análise de expressões de emoções em animação. Para revelarmos dados estatísticos precisos e com informação coesa é necessário ter sempre presente que existem vários tipos de gestos, nomeadamente emocionais, emblemáticos, reguladores, adaptadores e ilustrativos (vide – (p. 3) [3]). Quer isto dizer que, enquanto a personagem está a manifestar-se, podem ocorrer misturas entre os vários tipos de gestos, inclusive com formatos de boca que correspondem a fonemas e não propriamente a estados emocionais. Por exemplo: Uma personagem abre a boca pronunciando um “A”. Se, porventura, tiver as sobrancelhas subidas nesse fotograma, não implica que a personagem esteja a manifestar surpresa, ou seja, pode corresponder a um gesto ilustrativo das sobrancelhas subidas para dar enfase à palavra que menciona no momento. Outro exemplo: Suponhamos que a personagem está enraivecida enquanto discursa. Se eventualmente pronunciar um “A”, não implica que seja uma mistura de raiva com surpresa nesse fotograma, pois o formato da boca corresponde apenas ao fonema e não à emoção de surpresa. Para se distinguir os vários tipos de gestos é muito importante compreender o contexto no qual esse fotograma ocorreu para, no final, não misturar dados estatísticos de informações sobre gestos distintos. No presente estudo alargado atentamos apenas gestos emocionais.

2 Nojo e Desprezo 2.1 Problemática Aquando no lançamento dos teasers de Inside Out, no final de 2014, e conforme constatado num estudo prévio (p. 8) [4], onde analisamos os mesmos, a personagem Disgust (nojo) manifestava mais emoções e combinações de desprezo do que propriamente de nojo. Esta situação específica abre um vasto leque de questões já que nojo e desprezo são duas emoções universais distintas. Pergunta 1. Porque não atribuir o nome de Desprezo (Contempt) à personagem? Ekman, cientista e psicólogo cujo grupo de trabalho foi consultado [7] para auxiliar a caracterização das personagens de Inside Out, refere que contempt, “embora altamente reconhecível, não é uma palavra muito utilizada na língua inglesa” (p. 58) [5]. Eventualmente, dado o cuidado que o Marketing de uma produção deste calibre necessita, é possível que Disgust seja uma palavra mais próxima ou mais familiar aos espectadores, o que justificaria a opção. Reforçando esta possível justificação, temos o exemplo da versão dobrada em português de Portugal, cujo nome da personagem é Repulsa. Nojo ou nojenta seriam, em português, termos desadequados e eventualmente distantes do espectador devido ao seu poder sonante negativo e simbolismo altamente pejorativo.

576

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

Por outro lado, a corrente teórica de Ekman, que defende a existência de sete emoções universais distintas [5][6], justifica vincadamente a distinção entre nojo e desprezo há cerca de 35 anos, já que, até à data, o próprio Ekman considerava o desprezo uma variante do nojo [2]. Com bastante contestação por parte de céticos no que respeitava à universalidade da emoção de desprezo, Ekman e os seus seguidores viram-se obrigados, desde então, a fundamentar a sua teoria. Os seus estudos mereceram cada vez mais atenção e credibilidade por toda a comunidade científica e, em 2009, Ekman foi considerado uma das 100 pessoas mais influentes no mundo. Pergunta 2. Depois de uma batalha de 35 anos de investigação, porque permitiram uma personagem chamar-se Disgust que, por sua vez, age maioritariamente com Desprezo? Pergunta 3. Porque foram misturadas novamente estas emoções, relativizando as suas claras distinções? Pergunta 4. Chegou inclusive a existir algum alerta, nesse sentido, por parte da Paul Ekman Group? Se a resposta for positiva, foi opção da produtora manter o nome Disgust pelas razões acima especuladas? Deixamos em aberto estas questões, às quais não obtivemos/encontramos resposta até ao momento. 2.2 Características Emocionais Prosseguindo com as particularidades da emoção de nojo e desprezo pretendemos expor a clara distinção entre ambas. A emoção do nojo é a sucessora do paladar malgostoso característico dos mamíferos (Rozin cit. in [7]) que envolve a ingestão de substâncias danosas ao organismo. O desenvolvimento da cognição permitiu ao ser humano compreender e identificar os causadores das suas emoções e assim procurar os mesmos quando resultam em experiências prazerosas ou evita-los no caso de experiências danosas. Por outro lado, a racionalidade trouxe-nos igualmente algumas distorções cognitivas, neste caso, na emoção do nojo. Uma distorção cognitiva corresponde a uma série de: “(…) raciocínios imprecisos que são normalmente utilizados para reforçar o pensamento ou emoções negativas - dizendo-nos coisas que soam racionais e precisas, mas que só servem realmente para nos sentirmos mal a respeito de nós mesmos” [8]. No que respeita à emoção de nojo as distorções cognitivas mais frequentes são a ‘lei do contágio’, ou seja, uma vez em contacto, para sempre em contacto, e a ‘lei da semelhança’ que consiste na manifestação de repulsa sobre objetos inofensivos como consequência da sua semelhança com objetos danosos [9]. A náusea e o vómito são consequências comuns na ocorrência de nojo [9] e podem ser provocados por sabor, cheiro, toque, ações, aspeto ou ideias de outrem [16], mas também por animais ou insetos (Rozin cit. in [7]), ou seja, pessoas, objetos e animais podem ser alvo de uma manifestação emocional de nojo. Convém, no entanto, referir que não pode ser considerada uma emoção universalmente negativa, pois há pessoas que procuram e têm prazer nos mais variados tipos de experiências repulsivas [2].

577

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

O desprezo é uma emoção de exclusão e superioridade por parte de quem é alvo e de quem a manifesta, respetivamente [10]. É frequentemente direcionado a um outro ser humano embora o preconceito que o caracteriza, ironicamente, transforma o alvo numa “não pessoa”, sem valor e indigno de qualquer tipo de atenção [11] [12]. Preocupações emocionais são as principais causas de manifestação de desprezo [2] [10]. Essas mesmas preocupações: “(…) envolvem a autoestima e valores no âmbito pessoal e social. As pessoas podem sentir desprezo por terem sido profundamente feridas ou insultadas por alguém, (…) [por quem] transgrediu um código moral, como maltratar pessoas inocentes, trair amigos ou a família, (…) por quem tira partido de uma posição social, a fim de melhorar as suas próprias finanças, ou por desrespeitadores de pessoas idosas” [10]. Izard [10], numa análise comparativa das emoções universais, reúne a raiva, nojo e desprezo num grupo identificado como ‘tríade da hostilidade’. Os principais fatores de distinção, relativamente às outras emoções, são as avaliações negativas direcionadas aos outros e a sua ocorrência em transgressões essencialmente éticas [10] [14]. No que respeita ao desprezo, Izard refere que é a mais fria e mais subtil das três emoções [10], isto é, a exclusão/rejeição de alguém é uma posição que pode provocar danos irreparáveis no opositor enquanto a sua manifestação expressiva é extremamente subtil com poucas oscilações musculares e/ou corporais. Não se poderá considerar o desprezo como uma experiência universalmente positiva, pois a imposição de superioridade pode recolher frutos altamente tóxicos para o emissor [2] [13]. Após esta exposição, de algumas propriedades, confirma-se que são emoções distintas e mais à frente, neste artigo, iremos clarificar as suas particularidades expressivas.

3 Recolha de Dados: Resultados Estatísticos Globais Nesta secção do artigo expomos vários resultados estatísticos no que respeita às emoções expressas (primárias e secundárias 1) e a comparação entre a quantidade de manifestações de nojo e de desprezo, assim como as suas misturas com outras emoções. Constará, então, numa análise quantitativa que nos levará a conhecer um pouco melhor esta emoção e a forma como é aplicada na animação. Primeiramente, em dois gráficos, revelamos a quantidade e percentagem de ocorrências de emoções primárias e secundárias.

1

Emoções secundárias resultam da mistura entre emoções primárias (pág. 48 [15]).

578

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

3,1%

Nojo

4,2%

Alegria

5,2%

Surpresa

5,5%

Raiva

7,3%

Tristeza Medo

9,4%

Desprezo

9,4% 0

5

10

15

20

25

30

35

40

Fig. 1 – Emoções Primárias (quantidade e percentagem de ocorrências; 385 = 100%)

Noj + Aleg

0,0%

Med + Aleg

0,0%

Surp + Rai

0,3%

Noj + Trist

0,3%

Rai + Trist

0,3%

Rai + Noj

0,5%

Surp + Aleg

0,5% 0,8%

Surp + Noj

1,0%

Med + Noj

1,3%

Med + Rai

1,0%

Rai + Aleg

2,6%

Aleg + Trist

2,9%

Med + Trist

3,1%

Desp + Aleg

3,9%

Med + Desp

4,7%

Surp + Trist

4,9%

Rai + Desp

5,5%

Surp + Desp

7,0%

Noj + Desp

7,5%

Desp + Trist

8,1%

Surp + Med

0

5

10

15

20

25

30

35

Fig. 2 – Emoções Secundárias (quantidade e percentagem de ocorrências; 385 = 100%)

Com os dados apresentados, conseguimos constatar um total de 385 manifestações emocionais, por parte da personagem Repulsa. De salientar o facto de as misturas de medo + alegria e nojo + alegria não terem sido detetadas nesta personagem. Por outro lado,

579

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

tal como especulado na secção 2.1 – Problemática, a superioridade de ocorrências de desprezo, relativamente ao nojo, é clara. Tal como nos teasers, a longa-metragem revela uma elevada tendência na utilização da emoção de desprezo na personagem Repulsa (Disgust). Repare-se nas emoções primárias onde o desprezo surge como emoção mais utilizada (36 vezes) contra o nojo (12 vezes). Nas emoções secundárias a tendência também se verifica, pois nas combinações mais utilizadas é visível a presença de desprezo (desprezo + tristeza; surpresa + desprezo; raiva + desprezo), e nas menos utilizadas surge por várias vezes o nojo. Para clarificação destes dados, decidimos criar um gráfico adicional que compara a utilização de desprezo e nojo, somando as emoções primárias e secundárias que envolvem os mesmos.

Nojo (12x) Nojo + Desprezo (27x) Nojo + Medo (4x) Nojo + Surpresa (3x) Nojo + Raiva (2x) Nojo + Tristeza (1x) Nojo + Alegria (0x)

Desprezo (16x) Desprezo + Tristeza (29x) Desprezo + Nojo (27x) Desprezo + Surpresa (21x) Desprezo + Raiva (19x) Desprezo + Medo (15x) Desprezo + Alegria (12x)

26%

74%

Fig. 3 – Comparação de utilização de Nojo e Desprezo

4 Análise de Dados: Expressões Completas de Nojo e Desprezo 4.1 Nojo Primeiramente revelamos as manifestações expressivas da emoção de nojo e, de seguida, recorreremos a estudos prévios para verificar se efetivamente coincidem com o comportamento humano, ou ainda se ocorre algum tipo de gesto não analisado nos nossos estudos até ao momento.

580

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

Fig. 4 – Personagem Repulsa (Disgust): Ocorrências da emoção de nojo (emoção primária)

Segundo o estudo alargado de António Ferreira [16], no que respeita às expressões faciais, nesta emoção podem ocorrer o lábio superior subido, que se confirma em todos os exemplares da fig. 4, lábio inferior subido (verifica-se nas figuras 4C, 4D e 4K), ligeiramente descido e contraído (Fig. 4A, 4B, 4E, 4G, 4H, 4I, 4J) ou ainda a projeção da língua para fora da boca (Fig. 4F e 4L). O enrugamento do nariz é altamente característico nos humanos mas nesta personagem é apenas algo notório nas figuras 4B, 4C, 4D, e 4L, ou seja, apenas em ocorrências com maior intensidade e contração muscular. As bochechas subidas e as rugas em baixo da pálpebra inferior, a qual é subida mas não tensa, são dois movimentos usualmente associados, devido à anatomia do ser humano. São mais evidentes estas duas características na fig. 4A, 4B, 4C, 4D, 4F, 4G, 4I, 4J e 4L. As sobrancelhas podem ocorrer inalteradas/neutras (fig. 4I) ou descidas e ligeiramente contraídas nas extremidades internas, forçando um pouco a descida da pálpebra superior (mais evidente nas figuras 4A, 4B, 4C, 4D, 4F, 4G e 4L). Segundo o estudo de expressões corporais de Ferreira, Gomes e Teixeira [1], constata-se que os ombros direcionados para a frente e a cabeça ligeiramente rebaixada são gestos característicos da emoção de nojo (verifica-se na fig. 4A, 4B, 4D, 4F e 4G). Noutra secção, do mesmo estudo, os autores referem a existência de gestos corporais que funcionam como barreiras, no sentido da pessoa proteger-se da fonte danosa (humano ou objeto). Curiosamente esses gestos surgem no estudo da emoção de medo. Nas figuras 4D, 4F, 4G e 4L, relativamente à postura dos braços, poderemos especular dois

581

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

tipos de justificação para a sua ocorrência: Eventualmente a personagem experiencia uma mistura de nojo com medo, ou, já que “o nojo é um sentimento de aversão (…) [que] envolve a intensão de ‘livrar-se de’ ou ‘fugir de’ [no qual] o objetivo é remover o objeto em questão ou afastar-se dele para evitar o contágio” (pág. 66 [2]), podemos deduzir que os referidos gestos de braços funcionam como uma barreira instintiva relativamente à fonte repugnante. Há, ainda, um outro tipo de gesto que os mesmos autores referem, nomeadamente a subida lenta da mão em direção ao peito, onde permanece, que conseguimos constatar na figura 4I. Os braços cruzados foram analisados no âmbito da emoção de raiva, mas tal como especulado (p. 551 [1]) poderá ocorrer noutro tipo de emoções. Neste caso (fig. 4H) pode deduzir-se que ocorreu na sequência de transição de emoção, ou seja, a personagem estava descontraída e com os braços cruzados por intuição e de repente depara-se com algo repugnante. A face mudou mas o corpo permanece com a postura anterior. Na sequência das figuras 4J e 4K, Repulsa questionase sobre o comportamento estranho de Riley, ou seja, os seus gestos de braços acompanham o ritmo da voz e dão ênfase às palavras, o que significa que são gestos ilustrativos [3]. Pease and Pease (158-160 [18]) revelam que o gesto da mão direita da figura 4J indicia uma tomada de decisão ou avaliação de uma determinada situação, o que coincide com a ação deste plano específico. Ainda relativamente a estas duas últimas figuras é importante destacar o facto de a personagem Repulsa, em muitas das suas manifestações expressivas corporais, posicionar-se com a anca ligeiramente inclinada acumulando grande parte do peso corporal apenas numa perna. Mais à frente, neste artigo, exploramos este aspeto interessante. Em termos quantitativos chegamos, então, ao seguinte gráfico: Mãos no Peito

8,3%

Braços Cruzados

8,3%

Anca unilateral

16,7%

Mãos no Queixo

16,7%

Sobrancelhas Neutras

16,7%

Língua Exteriorizada

16,7% 25,0%

Lábio Inf. Subido Braços - Barreiras

33,3%

Nariz Enrugado

33,3%

Cabeça - Baixo

41,7%

Ombros - Frente

41,7%

Sobrancelhas Descidas

58,3%

Lábio Inf. Descido e Contraído

58,3%

Pálpebras Inf. Enrugadas

75,0%

Bochechas Subidas

75,0% 100,0%

Lábio Sup. Subido

0

2

4

6

8

10

12

14

Fig. 5 – Personagem Repulsa (Disgust): Combinações expressivas da emoção primária de nojo (quantidade e percentagem de ocorrências; 12 = 100%)

582

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

4.2 Desprezo

Fig. 6 – Personagem Repulsa (Disgust): Ocorrências da emoção de desprezo (emoção primária)

Depois da recolha de informação de vários autores, Ferreira [16] conclui a existência das seguintes particularidades expressivas universais, na emoção de desprezo: Boca unilateral aberta com exposição de alguns dentes, unilateralmente contraída ou fechada e com queixo subido; sobrancelhas subidas, bilateral ou unilateralmente, e ainda unilateralmente

583

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

com a extremidade externa subida; pés-de-galinha na zona dos olhos, rugas na pálpebra inferior, olhos semicerrados, rugas labionasais e subida unilateral das bochechas. É evidente o recurso da Disney/Pixar à expressão de subida unilateral das sobrancelhas e das bochechas nesta emoção, embora a variedade contextual define os diferentes graus de intensidade (Grau de intensidade elevado: Fig. 6A, 6D, 6J, 6M, 6AD, 6AH, 6AJ; Grau de intensidade intermédio: Fig. 6C, 6E, 6F, 6G, 6I, 6L, 6N, 6O, 6P, 6S, 6T, 6AC, 6AE e 6AK). Existem alguns exemplos com ambas as sobrancelhas subidas, comos a figuras 6B, 6H, 6Q, 6R, 6V, 6X, 6Z, 6AA e 6AI. Sobrancelhas neutras surgem nas figuras 6K, 6U, 6B e 6AF. As sobrancelhas da figura 6AG têm uma disposição retilínea o que é um aspeto interessante e que acaba por dar ênfase aos olhos semicerrados característicos de desprezo (pág. 553 [1]). Relativamente a esta última expressão confirma-se em quase todos os exemplos, exceto nas figuras 6B, 6D, 6F, 6G, 6J, 6K, 6AD, 6AH, 6AI e 6AJ. No que respeita à boca, a combinação unilateral aberta com exposição de alguns dentes verifica-se nas figuras 6D, 6G e 6Z. Relativamente à boca unilateralmente contraída é evidente nos exemplos da figura 6A, 6C, 6H, 6J, 6M, 6N, 6O, 6V, 6Y, 6AB, 6AC, 6AE, 6AF, 6AH e 6AI. A boca fechada com queixo subido surge na figura 6B, 6E, 6F, 6I, 6K, 6O, 6P, 6Q, 6R, 6S, 6T, 6U, 6X, 6AA, 6AB, 6AG e 6AK. Rugas, resultantes de qualquer tipo de esforço muscular, são praticamente nulas nesta emoção, na personagem Repulsa. Como nos referem alguns autores [16], as rugas são mais evidentes em adultos. Devido ao facto de esta personagem ter um aspeto jovial, e à emoção de desprezo ter expressões bastante subtis, as rugas são praticamente inexistentes. A cabeça ligeiramente levantada é mais uma característica evidente no desprezo (pág. 553 [1]) é mais uma constante em vários fotogramas (fig. 6A, 6B, 6C, 6H, 6Q, 6R, 6S, 6Y, 6Z, 6AA, 6AE e 6AI). Deduzimos que os braços cruzados (fig. 6C, 6L, 6M, 6O, 6V, 6Z, 6AA, 6AE e 6AF) representem uma atitude defensiva (p. 61 [19]) e de desaprovação (p. 128 [19]), já que são duas características do emissor de desprezo. Presumimos, também, tomando em consideração as características dos diversos tipos de desprezo [1] que as figuras 6I e 6K revelam aborrecimento e as figuras 6Q, 6R e 6AB demonstram desinteresse, pois a personagem está ocupada a fazer as suas maquilhagens e manicura enquanto a ação principal lhe é completamente alheia. Esta é uma personagem bastante feminina que utiliza maquilhagem, caminha numa pose bastante intelectual, e arriscaríamos mesmo sensual, e no final da longa-metragem delira com o nascimento da “ilha da moda” que corresponde à parte do cérebro de Riley, então adolescente, reservada a esta nova prioridade característica da idade. Nesse sentido, expomos então, a interpretação de alguns autores relativamente aos aspetos altamente femininos que nos faltam analisar. Tal como na emoção do nojo surge a anca disposta de forma unilateral mas, desta feita, num número consideravelmente maior de vezes (fig. 6C, 6D, 6L, 6M, 6N, 6O, 6P, 6S e 6AF). Edwards [19] curiosamente atribui um cariz sexual a este tipo de postura, mencionando inclusive que a sua tradução é “observa quanto estrogénio eu tenho”. Reforça a sua argumentação, inclusive, com fotos da revista Sports Illustrated nas quais as modelos assumem inúmeras vezes poses de anca disposta unilateralmente. Associada à emoção de desprezo, especulamos que, esta postura, possa ter que ver com impaciência ou gestos dominantes [1], assumindo que a personagem exige o surgimento de algo que a desperte positivamente enquanto aguarda impacientemente. Acreditamos que a questão da sexualidade não seria, de todo, a intenção dos autores. Relativamente à postura das mãos descaídas ou sem pulso firme (fig. 6A, 6D, 6E, 6H, 6X, 6Y, 6AJ e 6AK) Edwards refere que transmitem feminilidade e submissão. Por fim, as mãos na cintura. É uma postura altamente associada a passagem de modelos “para dar a impressão de que sua roupa é

584

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

para a mulher moderna, com atitude e visão de futuro” (p. 73 [20]), ou seja, atribui uma imagem de mulher poderosa. Superioridade é outro aspeto relevante da emoção de desprezo e as figuras 6D, 6G, 6P, 6AG, 6AJ, e 6AK revelam isso mesmo. Tal como no exemplo da emoção anterior, concluímos com um gráfico quantitativo. 0,0% 2,8% 5,6% 8,3% 8,3% 11,1% 16,7% 22,2% 25,0% 25,0% 25,0%

Rugas Sobr. Retilíneas Braços Aborrecimento Braços Desinteresse Boca Aberta Unilateral Sobr. Neutras Mãos na Cintura Mãos Descaídas Anca Unilateral Braços Cruzados Sobr. Subidas Bilateral

33,3%

Cabeça Levantada

41,7% 47,2%

Boca Contraída Unilateral Boca Fechada Queixo Subido

58,3% 58,3%

Bochech. Subidas Unilateral Sobr. Subidas Unilateral

72,2%

Olhos semicerrados

0

5

10

15

20

25

30

Fig. 7 – Personagem Repulsa (Disgust): Combinações expressivas da emoção primária de desprezo (quantidade e percentagem de ocorrências; 36 = 100%)

Conclusão Com base na documentação dos autores consultados verifica-se que nojo e desprezo são, de facto, duas emoções distintas. Paul Ekman e os seus seguidores afirmam que esta última é mais uma emoção universal, embora existe algum ceticismo por parte de outros teóricos. A distinção expressiva entre ambas é notória e, nesta longa-metragem, algumas combinações expressivas foram mais utilizadas que outras. Na emoção primária de nojo, o lábio superior subido, as bochechas subidas, o lábio inferior descido e contraído, as pálpebras inferiores enrugadas, a cabeça direcionada para baixo e os ombros para a frente ocorreram entre 40% e 100% de vezes. Curiosamente o enrugamento do nariz, uma das expressões mais características desta emoção, ficou abaixo dos 40% mas o significado não passou despercebido, nem se criaram ambiguidades. Na emoção primária de desprezo os olhos semicerrados, as sobrancelhas e bochechas levantadas unilateralmente, a boca fechada com queixo subido e a boca contraída unilateralmente ocorreram entre 40% e 100% do número total de vezes. Embora a personagem se chame Disgust (Nojo), existem mais manifestações de desprezo, incluindo emoções primárias e secundárias, numa escala muito próxima de 1 para 4. Deixamos para debate todas as questões anteriormente efetuadas para a razão desta mesma ocorrência.

585

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

Pretende-se continuar o presente estudo, como mencionado no resumo, prosseguindo nesta personagem com a investigação das emoções secundárias, pois devido à extensão da mesma, no presente artigo foram revelados apenas dados globais (fig. 2). Pretende-se ainda efetuar o mesmo estudo para as restantes personagens. Por outro lado, é interessante complementar este tipo de investigação com estudos a respeito da ligação entre contextos e combinações expressivas específicas, já que a quantidade e a análise expressiva dizem-nos “o que” utilizar e “como” utilizar, respetivamente, enquanto o contexto nos dá informação sobre “quando” utilizar, o que é um dado muito importante para evitar ruídos na comunicação universal.

Referências 1. Ferreira, A., Gomes, R. & Teixeira, P. M.: Estudos de Expressões Corporais para Animação. CONFIA – 3rd International Conference on Illustration and Animation, 539-558, https://www.academia.edu/12775794/Estudos_de_Expressoes_Corporais_para_Animacao (2013) 2. Ekman, P. & Friesen, W. V.: Unmasking the Face (Reprint Edition). Cambridge, Malor Books (2003) 3. Ferreira, A., Teixeira, P. M. & Tavares, P.: Estudos de Expressões Faciais para Animação 3D. CONFIA - 2nd International Conference on Illustration and Animation, 193-211, https://www.academia.edu/5469319/Estudos_de_Expressoes_Faciais_para_Animacao_3D (2013) 4. Ferreira, A.: As Emoções na Personagem Animada: Análise de várias animações da Disney/Pixar. AVANCA | CINEMA: Conferência Internacional de Cinema - Arte, Tecnologia e Comunicação, https://www.academia.edu/14863501/as_emocoes_na_personagem_animada _analise_de_varias_animacoes_disney_pixar (2015) 5. Ekman, P.: Emotions Revealed. New York, Times Book (2003) 6. Matsumoto, D. & Hwang, H. S.: Reading facial expressions of emotion. Psychological Science Agenda, 25. [Em linha]. Disponível em http://www.apa.org/science/about/psa/2011/05/facia l-expressions.aspx. [Consultado em 26/03/2016] (2011) 7. Dalglish, T. & Power, M. J.: Handbook of Cognition and Emotion. Chichester, U. K., John Wiley & Sons (1999) 8. Grohol, J. M.: 15 Common Cognitive Distortions. [Em linha]. Disponível em http://psychcentral.com/lib/15-common-cognitive-distortions/ [Consultado em 26/03/2016] (2015) 9. Adams, T. G., Brady, R. E. & Lohr, M.: The Nature and Function of Disgust in Coping and Control. In: Trnka & Karel & Kuska (Ed.). Re-constructing Emotional Spaces "From Experience to Regulation", 4, 63-76 (2011) 10. Fischer, A.: Contempt: A Hot Feeling Hidden under a Cold Jacket. In: Trnka & Balcar & Kuska (Ed.). Re-constructing Emotional Spaces "From Experience to Regulation", 5, 77-88 (2011) 11. Oatley, K. & Jenkins, J. M.: Understanding Emotions. Cambridge, Blackwell Pub (1996-1998) 12. Faigin, G.: The Artist’s Complete Guide to Facial Expression. New York, Watson-Guptill Publications (1999) 13. Ekman, P.: Emotions Revealed. New York, Times Book (2003) 14. Rozin, P., Lowery, L., Imada, S. & Haidt, J.: The CAD triad hypothesis: A mapping between three moral emotions (contempt, anger, disgust) and three moral codes (community, autonomy, divinity). Journal of Personality and Social Psychology, 76, 574–586 (1999) 15. Zagalo, N.: Emoções Interactivas do Cinema para os Videojogos. Coimbra, Grácio Editor (2009) 16. Ferreira, A.: Contributo para o Estudo das Expressões Faciais na Animação. (Dissertação de Mestrado). Instituto Politécnico do Cávado e do Ave. Barcelos, Portugal (2013)

586

CONFIA . International Conference on Ilustration & Animation Barcelos. Portugal . June 2016 . ISBN: 978-989-99465-6-9

17. Lhommet, M. & Marsella, S. C.: Expressing emotion through posture and gesture. In: Calvo, R.,D'Mello, S. K., Gratch, J. and Kappas, A. (eds.) The Oxford Handbook of Affective Computing. Oxford University Press, USA (2014) 18. Pease, A. & Pease, B.: The Definitive Book of Body Language. Australia, McPherson's PrintingGroup (2004) 19. Edwards, V. V.: Decoding Female Body Language. [Em linha]. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=lV2RTqrJ354 [Consultado em 13/01/2016] (2014) 20. Peace, A.: Body Language. Australia, Camel Publishing Company (1981)

587

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.