ANÁLISE DA RECIPROCIDAE DO FICHAMENTO TURÍSTICO À LUZ DA TEORIA DE JOGOS

May 29, 2017 | Autor: Cláudio Ratke | Categoria: Game Theory
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ANÁLISE DA RECIPROCIDAE DO FICHAMENTO TURÍSTICO À LUZ DA TEORIA DE JOGOS

CLÁUDIO RATKE1 FÁBIO HABITZREUTER 2

RESUMO A iniciativa com relação à implantação do fichamento dos americanos chegados ao Brasil pelo governo, como uma retaliação sobre o mesmo tratamento oferecido aos brasileiros que lá desembarcam, tem levado a várias discussões, muitas patrocinadas por grupos com interesse comercial afetados por esta iniciativa. Esse trabalho aborda o assunto usando a teoria dos jogos, com base na reciprocidade, para avaliar essa iniciativa do governo. PALAVRAS–CHAVE: Teoria dos jogos. Reciprocidade. ABSTRACT

The initiative about the implantation of records of Americans that came to Brazil adopted by the government, applying a retaliation on the same treatment offered to Brazilians who land there, lead to several discussions, many of them supported from groups with commercial interests affected by this initiative. This paper approaches a subject using a game theory, relying on reciprocity, to evaluate this initiative from the Brazilian government. KEYWORDS: Reciprocity: game theory.

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INTRODUÇÃO

Após os atentados sofridos em 11 de setembro, os Estados Unidos começaram uma guerra contra o terrorismo. Dentre as várias medidas, o fichamento das pessoas que entram nos Estados Unidos teve uma grande repercussão no Brasil, criando entre os dois países uma crise. O Brasil então aplicou o direito à reciprocidade fazendo com que os americanos também fossem fichados ao entrarem em território brasileiro. A aplicação do direito à reciprocidade pelo Brasil criou uma série de divergências internas, defendidas pelas entidades interessadas. Este artigo faz uma análise baseada na teoria dos jogos utilizada para tratar conflitos.

TEORIA DE JOGOS A teoria dos jogos foi desenvolvida por John Von Neumann e teve sua divulgação difundida através da publicação do seu livro “Theory of Games and Economic Behavior”1. Nas últimas décadas, a Teoria dos Jogos tem se disseminado em ambientes estratégicos, nas empresas e nas áreas econômicas, utilizada como ferramenta de auxílio e promovendo o estudo racional para os responsáveis pelas tomadas de decisões. Também têm sido usadas por governantes para modelar suas estratégias microeconômicas. Basicamente, sempre que a sua decisão é interdependente e simultânea em relação à decisão do outro, estes conceitos podem ser aplicados.

1

O matemático John Von Neumann publicou seu primeiro artigo sobre a Teoria dos Jogos em 1928 (NEUMANN, 1928).

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REPRESENTAÇÃO DO JOGO Um determinado jogo composto por N jogadores tem um contexto estratégico e orientado por um conjunto de premissas previamente estabelecidas. Cada conjunto de ações de um determinado jogador é denominado de estratégias, e apenas uma destas estratégias deverá ser utilizada. O processo de seleção da estratégia do jogador poderá ser influenciado diretamente pelas jogadas anteriores dos demais jogadores. (DAVIS, 1973) Uma Matriz de Pagamentos ou representação matricial do jogo (Matriz de Payoffs) representa a interação entre dois jogadores. As linhas e colunas representam as estratégias e, a célula, os seus respectivos resultados, como ser observado na Figura 1:

Figura 1 Matriz de PayOff .

TIPOS DE ESTRATÉGIAS DE JOGO Determinados jogos são classificados segundo a quantidade de estratégias possíveis e são conhecidos como jogos de estratégia única ou jogos com infinitas estratégias. (DAVIS, 1973) Alguns jogos apresentam situações propiciando ou não a possibilidade de serem de forma repetitiva. Para esse tipo de estratégia, a classificação dada consiste em jogos repetitivos e não repetitivos ou estáticos, sendo estes jogados apenas uma vez. Create PDF with PDF4U. If you wish to remove this line, please click here to purchase the full version

Existem ainda jogos seqüenciais e jogos não seqüenciais onde os jogadores podem tomar suas decisões ao mesmo tempo ou movimentos um após o outro. Nos jogos de soma zero entre dois participantes, os interesses pessoais são totalmente opostos: para um ganhar, outro terá de perder. Contudo, um jogo que permita uma série de lances consecutivos abre espaço à cooperação, mesmo de modo indireto. Nash (1996) procurou mostrar como se poderia reduzir o jogo cooperativo a um jogo não-cooperativo. Para tanto, cada jogador teria de possuir informação completa da estrutura do jogo e da função de utilidade de seu oponente, sendo ambos os indivíduos plenamente racionais. O que vale dizer que todos os jogadores sabem que cada um tem o conhecimento comum (informação partilhada pelos envolvidos) de todas as suas respectivas estratégias e ganhos, durante todo o desenrolar do jogo. Assim, cada um sabe quantos participam do jogo, as decisões que podem tomar e as suas recompensas esperadas. Além disso, na evolução do jogo, cada jogador tem a informação perfeita sobre qual ponto de decisão, nó do jogo extensivo, se encontra, isto é, na sua vez de escolher o que fazer o agente sempre sabe o que os outros fizeram até aquele momento.

DILEMA DOS PRISIONEIROS

A Figura 2 retrata uma situação caracterizada como do tipo “dilema dos prisioneiros”. Segundo Neumann, tendo os jogadores A e B cometido um pequeno delito conjuntamente, eles são interrogados em separado sobre a autoria do crime. Um acordo lhes é oferecido: Se ambos confessarem, serão punidos com três meses de detenção. Se um deles confessar e o outro não, quem confessou é liberado e quem negou o crime fica preso por seis meses. Se ambos

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negarem, terão um mês de prisão pela frente. Como o interrogatório é feito em separado e eles não podem se falar, a estratégia dominante para os dois, que é confessar o crime, muito provavelmente será a solução do jogo. Esse não é, contudo, o resultado socialmente mais preferível, uma vez que, se ambos os prisioneiros negassem o delito, o resultado agregado seria melhor que o observado em conseqüência da utilização da estratégia dominante por cada um dos agentes.

Figura. 2. Dilema dos prisioneiros.

Cada um toma a decisão sem saber qual é a decisão do outro. O dilema é que, se ambos confessam, ambos ficam em pior situação do que se tivessem cooperado um com o outro negando o crime. Mas como há o risco de ser o único a negar e não ser beneficiado por uma pena mais leve, ambos sempre confessariam, nunca havendo cooperação entre eles (NEUMANN, 1953). Enquanto os jogadores que se encontram algumas poucas e limitadas vezes tendem a nunca cooperar com receio que o outro o traia, aqueles que esperam encontros futuros tendem a alterar esta estratégia com base no histórico do comportamento do outro jogador. Por isso o “Dilema do Prisioneiro” foi utilizado de forma iterada, isto é, os jogadores se encontravam repetidas vezes. Desta forma, para analisar o desempenho de variadas estratégias frente a situações em que os interesses dos atores não são absolutamente opostos, Axelrod lançou um torneio de “Dilema do Prisioneiro Iterado” em computador -

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nos moldes dos torneios de xadrez. Especialistas em Teoria dos Jogos foram convidados a enviar seus programas. Os participantes vinham de áreas como economia,

psicologia,

sociologia,

ciências

políticas

e

matemáticas.

Surpreendentemente, o vencedor foi o programa mais simples entre todos os submetidos. Este se baseava na seguinte estratégia: começar cooperando e, a partir daí, fazer tudo que o outro fizesse. É baseada no estudo desta estratégia que a Teoria da Cooperação se desenvolve. Em muitas situações reais não há um conflito de interesses absoluto. Esses casos em que os jogadores podem se beneficiar mutuamente são por vezes referidos como jogo de soma não-zero. Se um ganha não quer dizer que o outro tenha que perder, como é o caso do “Dilema do Prisioneiro”. A presente Teoria da Cooperação foi desenvolvida a partir da análise dos resultados do torneio e das características da estratégia vencedora. Vence aquela que somar mais pontos após um número determinado de jogadas. A pontuação se baseia no valor relativo de cada recompensa/custo. Os jogos evolucionários são jogados por populações. Suponha-se que o tempo está subdividido em períodos e que, em cada período, todos os elementos de uma população monomórfica bem grande (infinita, tecnicamente) são escolhidos aleatoriamente, dois a dois, para jogar o dilema do prisioneiro em consideração. Eles podem pertencer a uma das frações da população, as quais se caracterizam pelo fato de que os seus elementos adotaram, provisoriamente talvez, uma das seguintes cinco estratégias: •

Poliana - coopera independentemente da estratégia da fração que

enfrenta; •

Anti-social - escolhe a defecção sempre, independentemente da

estratégia da fração adversária; •

Retaliadora - toma a iniciativa de cooperar, mas em seqüência

responde com a mesma ação empregada por sua oponente no período anterior.

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Se ela cooperou, ela coopera e, se ela não o fez, ela opta pela defecção. Esta estratégia é mais conhecida como “tit-for-tat”; •

Oportunista - mutação da anti-social que escolhe a sua estratégia

dependendo da fração adversária do momento. Se esta joga poliana, ela prefere a defecção. Se a adversária joga a defecção, ela também opta por esta alternativa. Se aquela joga a estratégia retaliadora, ela fará o mesmo. Se a outra for também oportunista, ela prefere, mais uma vez, jogar "tit-for-tat"; •

Retaliadora disfarçada - vem a ser uma mutação da estratégia anti-

social que se disfarça de “tit-for-tat”, enganado as adversárias. Estas, por acreditar que estão enfrentado esta última, optam, por exemplo, pela cooperação, mas obtém como resposta a defecção sempre. Segundo Binmore, com base nesse pequeno conjunto de estratégias, vários jogos podem ser considerados. O primeiro a ser examinado contém agentes que adotaram e só podem adotar as estratégias poliana, anti-social e retaliadora. Como a estratégia de defecção tende a desaparecer neste primeiro jogo, em seqüência, será considerado o jogo que contém as estratégias poliana, retaliadora e oportunista. Por sua vez, como agora é a estratégia poliana que tende a desaparecer, será então analisado o jogo que contém as estratégias retaliadora, oportunista e retaliadora disfarçada. Os outros jogos possíveis serão desprezados (OSBORNE, 1997)

Como cada jogo tem horizontes infinitos, vai-se assumir sempre que, a cada encontro, os payoffs considerados são obtidos descontando-se todo fluxo de rendimentos futuros com uma determinada taxa. De acordo com Binmore, dada a matriz de payoffs anteriormente apresentada, pode-se apresentar a estrutura de payoffs de todos os jogos possíveis com estas cinco estratégias por meio da seguinte matriz de dimensão 5 por 5 (BINMORE, 1992).

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Figura 3 Matriz 5 por 5 de Binmore.

FORMAS DE PROMOVER

A COOPERAÇÃO

Se a iteração não é repetida, isto é, se não há a possibilidade de futuros encontros, é muito difícil que surja cooperação, uma vez que, no curto prazo, valeria mais a pena evitar a hipótese de o outro não cooperar do que arriscar na esperança de uma recompensa pela cooperação mútua. Binmore ainda afirma que, para promover a cooperação, é importante que os dois indivíduos possam se encontrar outra vez e, reconhecendo-se, recordar o comportamento do outro até o momento, de forma a poder responder com reciprocidade. Como coloca Axelrod, “a justiça de uma transação é garantida não pela ameaça da lei, mas pela antecipação de transações mutuamente gratificantes no futuro”. Desta forma, embora não seja suficiente, é necessário fazer com que o futuro seja importante com relação ao presente. Como coloca Axelrod, “aumentar a sombra do futuro”. Isso pode ser conseguido fazendo as interações mais duráveis ou fazendo-as mais freqüentes. Uma vez satisfeita a necessidade de que a interação não seja esporádica, a cooperação pode ser promovida através de variações nas recompensas ou custos para cada atitude, ou ainda por meio da ética.

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CONCLUSÃO A Teoria dos Jogos, apesar de não pretender legitimar estratégias, é capaz de notar empiricamente as limitações de uma postura retaliadora. “A base da cooperação não é realmente a confiança, mas a durabilidade das relações. Quando as condições são propícias, os indivíduos podem vir a cooperar através de um aprendizado, via tentativa e erro, das possibilidades de recompensas mútuas; através da imitação de outros indivíduos bem sucedidos; ou mesmo via de um processo de seleção cego dos comportamentos mais viáveis.” (Axelrod, 1990). Axerold (1990) ainda mostra que a cooperação baseada na reciprocidade pode surgir em meio a um ambiente competitivo, a partir de um pequeno grupo de indivíduos que estejam prontos para retribuir a cooperação e que se relacionem entre si. Para isso é necessário que a “sombra do futuro” seja importante

a

ponto

de

fazer

essa

reciprocidade

estável.

Mas,

surpreendentemente, poucos são os requisitos sobre as características pessoais dos indivíduos. Isto é, ele não precisa ser racional, nem mesmo ser capaz de se comunicar - já que seus atos falam por ele. Da mesma forma, não é preciso haver amizade ou confiança, e nem mesmo uma autoridade central. Uma vez que há reciprocidade, a punição pela oposição restabelece o equilíbrio das relações. Mas é importante que a retaliação seja imediata. Se ela tarda, corre-se o risco da ação ser mal interpretada. E, não sendo relacionada com uma atitude anterior, ela perde seu valor como punição, passando a ser uma provocação. A evolução da cooperação fica comprometida. Neste sentido, Axelrod dá alguns outros conselhos: •

mudar a recompensa ou o custo esperado por uma determinada ação

- grandes mudanças podem até fazer com que a situação deixe de ser um dilema; •

ensinar as pessoas a se importarem com os outros - altruísmo é um

motivo para a ação;

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ensinar reciprocidade - retribua tanto a cooperação quanto a

oposição, evitando ser explorado: mas a retribuição de uma oposição deve ser mais branda para evitar retaliações intermináveis e o fim da possibilidade de qualquer cooperação. Deve ser apenas na medida da punição pela tentativa de explorar o outro, e não da vingança. •

melhorar a capacidade de reconhecimento - capacidade de

reconhecer o outro de interações passadas, permitindo que aja com reciprocidade. Nos Fundamentos da Dinâmica da Cooperação (ao contrário do que ocorre em jogos de soma zero, como o xadrez, por exemplo) o programa vencedor do torneio de “Dilema do “Prisioneiro Iterado” apresentou uma estratégia que foi bem por promover o interesse mútuo, e não por explorar a fraqueza do adversário”. Em diversas situações reais, o mesmo acontece. É importante ser capaz de reconhecê-las, identificando quando vale a pena deixar de lado a imagem de “adversário” e cooperar com o outro em busca de um resultado melhor.

REFERENCIAS

AXELROD, Robert, The evolution of co-operation. New York: Penguin Books, 1984. BINMORE, Ken, Fun and games: a text on game theory. D.C. Heath, Lexington, MA, 1992.

BINMORE, K., OSBORNE, M. J. & RUBINSTEIN, A. "Noncooperative Models of Bargaining". In: AUMANN, R. J. & HART, S. Handbook of Game

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Theory, v. 1, cap. 7, p. 179-225. - Amsterdam: Elsevier, 1992. Disponível em: < http://arielrubinstein.tau.ac.il/papers/40.pdf.>. Acesso em: dez. 2005. DAVIS, Morton D. Teoria dos jogos. São Paulo: Cultrix, 1973. NASH, John F. Essays on game theory. Cheltenham: Edward Elgar, 1996. NEUMANN, John Von; MORGENSTERN, Oskar. Theory of games and economic behavior. Princeton: PUP, 1953. OSBORNE, M. J.; RUBINSTIEN, A. A course in Game Theory, The MIT Press, 1997.

©Breve Currículo: 1

Mestre em Informática e Estatística pela UFSC.

Professor e Coordenador do Curso de Tecnologia em Redes de Computadores. 2

Mestrando no Departamento de Informática e Estatística da UFSC.

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