ANÁLISE DE OBRAS: PINACOTECA DO ESTADO

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI Edegar Bernardes Silva

ANÁLISE DE OBRAS: PINACOTECA DO ESTADO

São Paulo 2014

EDEGAR BERNARDES SILVA

ANÁLISE DE OBRAS: PINACOTECA DO ESTADO

Trabalho apresentado como exigência parcial para a disciplina de História da Arte, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profa. Adriana Valese.

São Paulo 2014

“A arte não é um elemento vital, mas um elemento da vida.” – Mário de Andrade.

SUMÁRIO RESUMO .......................................................................................................................... 06 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 1 CAPÍTULO 1 – Figuras de Animais, 1954......................................................................... 3 1.1

A obra .................................................................................................................... 3

1.2

O autor ................................................................................................................... 4

1.2.1 Biografia .......................................................................................................... 4 1.2.2 Outras Obras .................................................................................................... 6 1.3

Análise do assunto ................................................................................................. 6

1.4

Análise sintática .................................................................................................... 7

1.4.1 Composição ..................................................................................................... 7 1.4.2 Desenho ........................................................................................................... 7 1.4.3 Cores e Luz ...................................................................................................... 7 1.4.4 Técnica e Matéria ............................................................................................ 7 1.5

Análise histórica .................................................................................................... 8

1.6

Análise pessoal ...................................................................................................... 8

CAPÍTULO 2 – La Porteuse de Parfum, 1923/1924 ........................................................ 10 2.1

A obra .................................................................................................................. 10

2.2

O autor ................................................................................................................. 10

2.2.1 Biografia ........................................................................................................ 10 2.2.2 Outras Obras .................................................................................................. 12 2.3

Análise do assunto ............................................................................................... 12

2.4

Análise sintática .................................................................................................. 13

2.4.1 Composição ................................................................................................... 13 2.4.2 Técnica e Matéria .......................................................................................... 13

2.5

Análise Histórica ................................................................................................. 13

2.6

Análise pessoal .................................................................................................... 14

CAPÍTULO 3 – Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1897/1900 ..................................... 14 3.1

A obra .................................................................................................................. 14

3.2

O autor ................................................................................................................. 15

3.2.1 Biografia ........................................................................................................ 15 3.2.2 Outras Obras .................................................................................................. 17 3.3

Análise da obra .................................................................................................... 18

3.4

Análise histórica .................................................................................................. 19

3.5

Análise pessoal .................................................................................................... 20

CONCLUSÃO .................................................................................................................. 21 BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................. 22 ANEXOS .......................................................................................................................... 24 ANEXO A ................................................................................................................. 24 ANEXO B ................................................................................................................. 27

RESUMO A arte é uma forma de expressão do homem diante da qual a sensação é de contemplação. No entanto, para que se possa entende-la, somente uma observação simplista pode não ser suficiente, exigindo do espectador técnicas de análise. Este trabalho tem como objetivo analisar três obras da Pinacoteca do Estado de São Paulo que foram observadas in loco durante visita ao museu. As obras são Figuras de Animais, Porteuse de Parfum e o próprio edifício da Pinacoteca. Considera-se na análise a obra, sua análise, a biografia do autor e outras obras, uma análise de contextualização do momento em que a obra foi concebida e uma análise pessoal. Por fim, verifica-se a relação entre as obras estudadas e a importância dos seus criadores para o movimento artístico da época, além de reafirmar a importância de como ler uma obra de arte para a formação pessoal.

INTRODUÇÃO A socióloga húngara Agnes Heller (1985) cita que a arte é um tipo de manifestação humana que desloca o ser do mecanicismo do cotidiano e que fortalece a consciência de si mesmo e de seu mundo ao redor. Já, segundo Coli (1991), a arte é a forma de expressão da atividade humana diante da qual a sensação é de contemplação. Ambos não definem a arte per se, mas apresentam em suas explicações aspectos sensitivos à arte: a consciência de si, a contemplação. O espectador pode observar uma obra de arte de maneira simplista, revelando seu gosto ou desgosto, muito devido às sensações que ela passa ao observador. Mas poderá também analisá-la a partir de certos parâmetros com a finalidade de compreender a obra, seu propósito, seu contexto, o porquê da utilização de determinado estilo e técnica etc. É importante ressaltar que ambas as abordagens são válidas, com suas vantagens e desvantagens, mas é o processo analítico de uma obra de arte que possibilitará uma compreensão mais técnica e contextual, ainda que, segundo Coli (1991), nunca será uma análise completa do que a obra pode oferecer como um todo, por melhor que a análise seja. Um exemplo dado por Gombrich (1951) é a comparação entre a obra de Guido Reni (Testa di Cristo, c. 1640 – Figura 1) e de uma obra da Idade Média (c. 1270 – Figura 2).

Figura 1 - Cabeça de Cristo, detalhe da pintura, c. 1640. London, National Galery.

Figura 2 - Mestre de Toscana: Cabeça de Cristo. Detalhe d’um crucifixo, c. 1270. Florência, Uffizi.

Segundo o autor, a expressão no quadro de Reni é mais fácil de entender, o que agradaria a algumas pessoas. Quando ele o pintou, queria, sem sobra de dúvidas, que o espectador 1

encontrasse toda a agonia e glória da Paixão de Cristo em sua face, de modo que tal expressão foi copiada em diversas capelas e casas onde “pessoas sabem nada sobre arte” (GOMBRICH, 1951, p. 13). Mas, de acordo com o mesmo autor, ainda com tal expressão fidedigna, não se deve fechar os olhos para trabalhos cujas expressões não sejam tão simples de entender. O pintor Italiano da Idade Média que fez o trabalho da Figura 2 teria sido tão sincero quanto os sentimentos de Reni sobre a Paixão de Cristo, porém é preciso conhecer seus métodos de desenho para entender seus propósitos de forma que, quando compreendidos, uma obra deste tipo pode até ser mais admirada, justamente por ter uma expressão menos óbvia (GOMBRICH, 1951). Diante do exposto, mostra-se a importância de analisar uma obra sob diversos ângulos, não se esquecendo, no entanto, da frase de Émile Male: “Diferentemente do filósofo, o artista não nos dá suas razões: ele se contenta em admirar e revelar”. Logo, volta-se à questão apontada acima sobre a arte como despertador de sentimentos da emoção, do espanto, da intuição, das associações, das evocações, das seduções, uma vez que o artista dá a perceber sua obra por modos que se possa talvez nomear, mas que escapam ao discurso, pois jamais deixarão de pertencer ao campo do não racional. (COLI, 1991, p. 105). Desta forma, este trabalho tem como objetivo analisar três obras de arte observadas na Pinacoteca do Estado de São Paulo, no dia 8 de Junho de 2014, de acordo com roteiro (ANEXO A) apresentado na disciplina “História da Arte”, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Anhembi Morumbi. Para cada uma, será feita uma descrição da obra, do autor, do assunto e uma análise sintática, histórica e de percepção pessoal. Além disso, o trabalho objetiva uma breve reflexão do ser pensante defronte uma obra de arte. Para atingir os objetivos deste material, as seguintes obras foram selecionadas: 

Figuras de Animais, 1954 – Di Cavalcanti;



La Porteuse de Parfum, 1923/1924 – Victor Brecheret;



Edifício Pinacoteca do Estado de São Paulo, 1896/1900 - Ramos de Azevedo.

A escolha dessas obras deu-se simplesmente por questões de afinidade que serão melhores compreendidas na análise pessoal de cada obra. Já a escolha do edifício da Pinacoteca como obra de arte justifica-se não só pela grande importância de Ramos de Azevedo como arquiteto em São Paulo, mas também por reiterar a afirmação de que o arquiteto deve, sim, associar intimamente a Arquitetura à Arte, evitando, assim, graduar-se como um arquiteto meramente tecnocrata ou pobre de reflexão estética, pois dentre outros motivos, segundo o filósofo Friedrich Schiller, o excesso 2

da razão acaba com a possibilidade do dogma e da fantasia como partes da vida humana (LOPES, 2012, p. 195), o que pode eliminar o processo de criatividade. Neste sentido, procura-se seguir aspectos da filosofia estética schilleriana, a qual busca colocar a educação estética na base da moralidade, formando o homem racionalmente sem deixar de lado o elemento sensível em seu desenvolvimento (LOPES, 2012).

CAPÍTULO 1 – FIGURAS DE ANIMAIS, 1954 1.1

A OBRA

Figura 3 - Figuras de Animais, 1954. Reprodução fotográfica pessoal.

Figuras de Animais (Fig. 3) é uma pintura de óleo sobre tela de dimensões (146,5 mm x 412,5 mm), criada em 1954, quando Di Cavalcanti tinha 57 anos, e que toma grande espaço em uma das paredes da Pinacoteca. Tem como procedência a doação pela Secretaria dos Transportes em 1986.

3

1.2

O AUTOR 1.2.1 Biografia Emiliano Di Cavalcanti foi um pintor brasileiro nascido

em 1897, no Rio de Janeiro, um dos primeiros artistas a pintar elementos da realidade brasileira, como festas populares, favelas, operários, o samba (Fig. 5) etc. Foi um dos idealizadores da Semana de Arte Moderna de 1922 (dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.). Aos 17 anos de idade, já fazia ilustrações para a Revista Fon-Fon (Fig. 4), obrigado, devido à morte de seu pai, uma vez que vinha de família humilde. Próximo de alcançar os 20 anos de idade, mudou-se para São Paulo para cursar a Faculdade de Direito, porém segue fazendo ilustrações, inicia a pintura, freqüenta o

Figura 5 - Samba, 1925. Reprodução fotográfica Vera Albuquerque. Coleção Geneviève e Jean Boghici.

atelier do impressionista George Elpons e torna-se amigo de Mário e Oswald de Andrade. Entre 11 e 18 de fevereiro de 1922, aos 25 anos de idade, idealiza e organiza a Semana de Arte Moderna, no Teatro Municipal de São Paulo. Para essa ocasião, cria as peças promocionais do evento com catálogo e programa (Fig. 6). Di Cavalcanti mudou-se para Paris em 1923, como correspondente do jornal Correio da Manhã, permanecendo até 1925. Lá, freqüentou a Academia Ranson e expos em Londres, Berlim, Bruxelas, Figura 4 - Estudo de capa para a revista Fon-Fon. Fonte: dicavalcanti.com.br

Amsterdã e Paris. Quando retornou ao Brasil, seguiu fazendo ilustrações, como o

livro Losango Cáqui, de Mário de Andrade, bem como os painéis de decoração do Teatro João Caetano no Rio de Janeiro (dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.). Os anos 30 encontram um Di Cavalcanti imerso em dúvidas quanto a sua liberdade como homem, artista e dogmas partidários. Inicia suas participações em exposições coletivas, salões nacionais e internacionais como a International Art Center em Nova Iorque. Em 1932, aos 35 anos de idade, funda em São Paulo, com Flávio de Carvalho, Antonio Gomide e Carlos Prado, o Clube dos Artistas Modernos. Publicou o álbum A Realidade

Figura 6 - Capa do catálogo da exposição da Semana de Arte Moderna, 1922. Reprodução Fotográfica Romulo Fialdini.

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Brasileira, série de doze desenhos satirizando o militarismo da época. Voltou para a Europa onde permaneceu até 1940. Em Paris, estabeleceu contato com Picasso, Léger, Matisse, Eric Satie, Jean Cocteau e outros intelectuais franceses. Em 1937 recebeu medalha de ouro com a decoração do Pavilhão da Companhia Franco-Brasileira na Exposição de Arte Técnica, em Paris (dicavalcanti.com.br; e-biografias.net, s.d.). Com a iminência da Segunda Guerra, retorna ao Brasil, fixando-se em São Paulo. Passa a combater abertamente o abstracionismo através de conferências e artigos, viaja para o Uruguai e Argentina, expondo em Buenos Aires. Em 1946 expõe no Rio de Janeiro, na Associação Brasileira de Imprensa, ilustra livros de Vinícius de Morais, Álvares de Azevedo e Jorge Amado, além de participar com Anita Malfatti e Lasar Segall do júri de premiação de pintura do Grupo dos 19 (dicavalcanti.com.br, s.d.). É convidado e participar da I Bienal de São Paulo, 1951. Fez doação generosa ao Museu de Arte Moderna de São Paulo, constituída de mais de quinhentos desenhos. Recebe a láurea de melhor pintor nacional na II Bienal de São Paulo, prêmio dividido com Alfredo Volpi. Em 1954 o MAM, Rio de Janeiro, realiza exposição retrospectivas de seus trabalhos. Faz novas exposições na Bacia do Prata, retornando à Montevidéu e Buenos Aires. Publica Viagem de minha vida. 1956 é o ano de sua participação na Bienal de Veneza e recebe o I Prêmio da Mostra Internacional de Arte Sacra de Trieste. Seus trabalhos fazem parte de exposição itinerante por países europeus. Recebe proposta de Oscar Niemayer para a criação de imagens para tapeçaria a ser instalada no Palácio da Alvorada também pinta as estações para a Via-sacra da catedral de Brasília (dicavalcanti.com.br, s.d.). Ganha Sala Especial na Bienal Interamericana do México, recebendo Medalha de Ouro. Torna-se artista exclusivo da Petite Galerie, Rio de Janeiro. Participa da Exposição de Maio, em Paris, com a tela Tempestade e com Sala Especial na VII Bienal de São Paulo. Recebe indicação do presidente João Goulart para ser adido cultural na França, mas não assume por causa do golpe de 1964. Lança novo livro, Reminiscências líricas de um perfeito carioca e desenha jóias para Lucien Joaillier (dicavalcanti.com.br, s.d). Faz exposição de obras recentes na Bolsa de Arte e sua pintura Cinco Moças de Guaratinguetá é reproduzido em selo. Falece no Rio de Janeiro em 26 de Outubro de 1976 aos 79 anos (dicavalcanti.com.br, s.d.).

5

1.2.2 Outras Obras Mulatas, Samba, Paisagem de Subúrbio, Pescador Galego, Gafieira, Mulheres Protestando, Vendedoras de Peixes, Mulher Deitada e Cachorro (Fig. 7), entre muitas outras.

Figura 7 - Mulher Deitada e Cachorro, 1954 - Reprodução fotográfica Caio Kauffmann/Itaú Cultural.

1.3

ANÁLISE DO ASSUNTO O quadro tem como tema o retrato-paisagem rural, uma vez que as personagens e a

presença de cavalos sugerem um local mais rural que urbano. Nesta obra, há mulheres, aparentemente armazenando algum alimento nos recipientes que levam em mãos. A mulher de primeiro plano leva consigo possivelmente algum grão ou cereal que é atacado por aves brancas (talvez pombos); no segundo plano, a mulher de verde carrega algo que parece ser o esqueleto de um peixe; já a terceira mulher carrega uma espécie de vasilhame, mas não é possível ver o que exatamente há dentro. Há também um rapaz de verde que sorri tocando um banjo a observar a situação. Além das mulheres, recortes nos planos de fundo mostram alguns cavalos providos de asas ou não, carregando algum humano ou não. É interessante observar que o quadro tem uma relação grande entre largura e altura, o que dá esse aspecto de enquadramento de uma paisagem com vários motivos evidentes.

6

1.4

ANÁLISE SINTÁTICA 1.4.1 Composição O próprio formato do quadro, em proporção de paisagem, sugere eixos na horizontal (Fig.

8). No entanto, a posição das personagens, tanto humanas como de cavalos, mostram claramente a quebra da horizontalidade do quadro com linhas praticamente verticais (Fig. 8). Não há o uso de perspectiva. O trabalho com recortes superpostos dá sentido de profundidade com o uso de proporções menores de desenhos se a cena estiver mais ao fundo. Os eixos de simetria verticais localizados na porção central levam o espectador a dirigir seu olhar para essa região, sendo que sua leitura se dá de baixo para cima.

Figura 8 - Eixos da composição. Eixos predominantemente verticais em vermelho e predominantemente horizontais em amarelo.

1.4.2 Desenho As linhas da obra em questão estão bem marcadas. É possível verificar que elas são importantes na pintura, pois sugerem bem as formas geométricas de cada desenho. Portanto, a linha tem papel fundamental. 1.4.3 Cores e Luz Para a avaliação do uso de cores, foram utilizados os esquemas cromáticos do ANEXO B. Há predominância de cores análogas entre os objetos do quadro. A mulher de verde, possui cores análogas, que são praticamente complementares as cores da mulher de marrom em terceiro plano. Ambas contrastam com a mulher em primeiro plano que possui cores neutras (preto e branco). O jogo de cores se repete nos cavalos à esquerda, usando cores análogas num mesmo cavalo, mas complementares entre um cavalo e outro. Uma mesma personagem (o tocador de banjo), no entanto, tem em seu corpo o mesmo jogo com as cores: em seus membros inferiores há cores análogas que, comparadas à parte superior da personagem, são complementares. 1.4.4 Técnica e Matéria As pinceladas são largas feitas em óleo sobre tela sendo uma técnica bastante utilizada por Di Cavalcanti, mas não exclusiva, uma vez que também trabalhou em outras obras com xilografia, 7

nanquim, madeira, serigrafia e até mosaico (Fig. 9). Tal técnica a óleo já era utilizada há tempos e em larga escala no momento de produção da obra estudada.

Figura 9 - Faixada do Teatro Cultura Artística, São Paulo: Alegoria das Artes, 1950. Obra de Di Cavalcanti feita em mosaico de vidro. Fonte: www.cursosdemosaico.com.br/historia-do-mosaico.php.

1.5

ANÁLISE HISTÓRICA Quando finalizou Figuras de Animais, Di Cavalcanti tinha 57 anos, idade com a qual já

havia se consagrado como artista da época moderna. No caso deste quadro, não mudam as tendências de se mostrar a cultura brasileira tão presente em suas obras. Mais que isso, Di Cavalcanti, como já foi mencionado, buscou mostrar o retrato da cultura negra nesta e em outras obras, característica da qual não abriu mão mesmo em suas obras mais tardias. Sua influência inicial pela Art Nouveau surge em suas obras da década de 20 (séc. XX) com o retrato da figura feminina. Suas pinturas exprimem sobretudo a sua busca do belo por meio de um modelo que ocorre ser de origem negra (ZANINI, 1983, p. 1024). Mas seu desenho evolui para figuras hipertrofiadas e formas que parecem se rompe, além de cores usadas em liberdade (ZANINI, 1983). Tais traços, que já surgem antes de sua primeira viagem à Europa, o acompanham ao longo de sua vida e, conseqüentemente, na obra em questão. 1.6

ANÁLISE PESSOAL Qualquer que seja a interpretação da pintura de Di Cavalcanti, é possível perceber que há

um aspecto de unificação dos seres em uma só categoria (animais que o são), sobretudo se se comparar o segundo quadro também titulado de Figuras de Animais, que, por sinal, encontra-se ao lado do trabalho estudado em questão. A Figura 10 mostra que há a representação de uma classe 8

social mais abastada, dentro de uma casa, mas que, todavia, não as fazem menos animais, ao menos pelo título dado pelo autor. É interessante notar que na figura XX, as mulheres são brancas, enquanto que o uso de cores na figura XX sugere que as pessoas são mais morenas ou negras.

Figura 10 - Figuras de Animais, 1954. Fonte: Design & Muito Mais (designmuitomais.blogspot.com.br/).

Os elementos, apesar de classes sociais diferentes, aparecem: cavalos alados ou não, aves (agora, sob um aspecto de harmonia e não mais como alimento), uma pessoa tocando um instrumento (no caso, um violoncelo) à direita da pintura. Apesar da relação com o labor pesado na cena estudada, o quadro passa uma sensação de harmonia não só no que é feito/trabalhado, mas entre os próprios animais, sobretudo no âmbito ecológico com a predação de peixes e aves para a alimentação e cavalos para a domesticação, atividades essas que, realizadas de tal maneira, costumam impactar muito pouco o ambiente. A simplicidade da cena também passa um bem estar e desejo de se apropriar daquele momento não como uma das personagens, mas como mais um integrante daquela paisagem de certa forma bucólica.

9

CAPÍTULO 2 – LA PORTEUSE DE PARFUM, 1923/1924 2.1

A OBRA La Porteuse de Parfum (ou, em português, A portadora de

Perfume. Fig. 11) é uma escultura com dimensões de 341 mm x 100 mm x 87 mm feito em gesso finalizada em 1924, quando Victor Brecheret tinha 30 anos de idade. Foi uma obra doada pelo próprio artista à Pinacoteca. Atualmente, encontra-se conservada em um dos corredores do segundo andar com alguma iluminação vinda de porta de vidro ao seu lado. 2.2

O AUTOR 2.2.1 Biografia Victor Brecheret nasceu em Farnese di Castro, Itália, no

ano de 1894, e com 18 anos iniciou seus estudos de desenho, entalhe e modelagem no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. Diferente dos artistas do modernismo brasileiro, Brecheret era de origem humilde e vem a São Paulo com seus tios maternos (MAC/USP, s.d.). Em 1913, viaja à Europa para estudar escultura, tornando-se aluno do escultor Arturo Dazzi, em Roma. Com 22 anos obtém o primeiro lugar na Exposição Internacional de BelasArtes, em Roma, com a obra "Despertar". Nesse período, alguns críticos observam a influência em seu trabalho dos escultores Bourdelle, Rodin (IVB, s.d.) e Mestrovic, neste principalmente

Figura 11 - La porteuse de Parfum, 1923-1924. Arquivo Pessoal.

devido à expressividade, tensão, alongamento e torsões das figuras (MAC/USP, s.d.). Em 1919, participa da exposição Mostra Degli Stranieri alla Casina del Pincio e novamente seus trabalhos recebem elogios da crítica. Retorna ao Brasil e instala seu ateliê no Palácio das Indústrias, com a ajuda de Ramos de Azevedo. Ali trabalha intensamente e em completo isolamento, sofrendo dificuldades de adaptação (IVB, s.d.). Em 1920, Victor Brecheret torna-se conhecido dos pioneiros do movimento de renovação artística, Menotti Del Pichia, Helios Seelinger, Di Cavalcanti e Oswald de Andrade, que o fazem símbolo do movimento. Ele é o moderno que os modernistas querem mostrar, repartindo com Anita Malfati o papel essencial no momento “heróico” que antecedeu a semana de Arte Moderna 10

de 1922. Ainda em julho de 1920, Brecheret, sob a influência do sentimento nativista dos jovens modernistas, realiza a maquete do "Monumento às Bandeiras” (IVB, s.d.). No dia 24 de abril de1921, na Casa Byington, expõe a escultura "Eva" (Fig. 12), que é adquirida pela Prefeitura de São Paulo. Torna-se bolsista do Pensionato Artístico do Figura 12 - Eva, 1919. Fonte: Andreia Jardim - Flickr.

Estado de São Paulo e viaja para a França,

deixando algumas esculturas que farão parte da Semana de Arte Moderna de 1922. Na França, expõe a escultura "Templo da Minha Raça" no Salon d'Automne em Paris e é premiado, entre quatro mil concorrentes. Tem participação significativa, através de suas obras, na Semana de Arte Moderna de 1922, mesmo estando em Paris (IVB, s.d.). Em 1924, aos 30 anos de idade, expõe "Portadora de Perfume" no Salon d'Automne, obra de análise deste trabalho, e, em 1925, expõe novamente no Salão da Sociedade dos Artistas Franceses e recebe menção honrosa. No Salon d'Automne expõe "A Dançarina" (IVB, s.d.). Como boa parte dos artistas da Escola de Paris, Brecheret está alinhado ao surgimento do “Art Déco” a partir de 1925 com a Exposição Internacional das Artes Decorativas e Industriais Modernas. Concordante com esta arte de vanguarda, modifica sua escultura, adotando formas geometrizadas, lisas e luminosas, sendo bastante elogiado pela crítica (MAC/USP, s.d.). Mas é só em 1926 que o artista realiza neste mesmo ano sua primeira exposição individual, em São Paulo (IVB, s.d.). Sócio-fundador da Sociedade Pró-Arte Moderna, SPAM, no período de 32, a grande atuação na vida paulista, organizando exposições, festas, encontros sociais, enfim, criando um ambiente para o convívio entre artistas e intelectuais e o desenvolvimento das novas idéias da arte. (IVB, s.d.). Participa da XXV Bienal de Veneza em 1950 e, em 51, é convidado para a I Bienal Internacional de São Paulo e é agraciado com o Prêmio Nacional de Escultura com "O Índio e a Suaçuapara". Durante o ano de 52, também acaba participando da XXVI Bienal de Veneza (IVB, s.d.).

11

Um novo marco para São Paulo surge no dia 25 de Janeiro de 1953, aniversário da Cidade de São Paulo com inauguração do "Monumento às Bandeiras" (Fig. 13). Nesse ano, realiza a fachada do Jockey Club de São Paulo (IVB, s.d.).

Figura 13 - Monumento às Bandeiras. Fonte: Wikipédia.

Em 1955, participa da III Bienal Internacional de São Paulo e da mostra Artistes Brésiliens, em Paris, organizada pelos Museus de Arte Moderna do Rio de Janeiro e de São Paulo. Em 17 de Dezembro desse ano, Victor Brecheret morre em São Paulo (IVB, s.d.). 2.2.2 Outras Obras Monumento às Bandeiras, Sepultamento, Dançarina, Beijo, Depois do Banho, Monumento ao Duque de Caxias, Fauno, entre outras. 2.3

ANÁLISE DO ASSUNTO Em La Porteuse de Parfum, o nome propriamente dito mostra o que é a cena: uma figura

feminina nua carrega em seu ombro direito uma espécie de vaso em formato elíptico com perfume em seu interior. A mulher parece retraída, devido à torção natural de sua perna e cabeça para lados opostos, levando a uma sensação de angústia e instabilidade.

12

2.4

ANÁLISE SINTÁTICA 2.4.1 Composição A figura feminina possui um eixo claramente vertical que, apesar de a torção gerar uma

sensação de instabilidade, tal posição ereta sugere solidez e equilíbrio ao carregar o pote de perfume. 2.4.2 Técnica e Matéria A escultura é feita em gesso, mas a pintura aplicada à obra pode confundir o expectador quanto ao tipo de material utilizado, que parece ser mais robusto. De fato, gesso não era o material dos mais utilizados por Brecheret como obra acabada. Durante sua vida, utilizou muito o bronze e várias obras na Pinacoteca são compostas por esse material. Uma obra também nominada de Carregadora de Perfume (mas essa em português), em cobre, exatamente igual ao original em gesso, foi adquirida em 1998 pela Pinacoteca por meio de Protocolo de intenções doação do Museu Nacional de Belas Artes, o Banco Safra e sua filha, Sandra Brecheret Pellegrini (PINACOTECA, s.d.). Logo, a primeira obra feita em gesso, deve ter sido feita para ser facilmente carregada para o Salon d’Automne de 1924 e transferida posteriormente para seu local definitivo, dado que o gesso é um material de muito baixo peso específico e mais fácil, portanto, de se carregar que o bronze. Ainda assim, Brecheret conseguiu dar belo aspecto ao gesso com uma pintura que simulava de alguma forma uma escultura feita em algum material metálico. 2.5

ANÁLISE HISTÓRICA Victor Brecheret deu sinais da qualidade de sua obra no Brasil quando Oswald de Andrade,

Di Cavalcanti e o pintor e caricaturista Hélios Seelinger o descubriram, no ano de 1920, em um atelier improvisado por Ramos de Azevedo no Palácio das Indústrias. Monteiro Lobato e Menotti del Picchia, a seguir, iniciaram a divulgação de sua obra (ZANINI, 1983). Impressionados com suas esculturas, tornou-se “fácil” para o escultor ser um dos expoentes da Semana de Arte Moderna de 1922 (SAM). Como iria amadurecer seu trabalho na sua segunda viagem à Europa em 1921, deixou diversos trabalhos para a SAM. Neste período em que aperfeiçoa sua técnica em Roma, entrou em contato e pôde admirar as obras do então Iugoslavo Ivan Mestrovic, o qual influenciou sua obra, sobretudo com relação à torção das figuras esculpidas, fato que também teve influência desde muito cedo de Rodin, antes mesmo desta sua segunda viagem. Este aspecto de torção do corpo está presente também na Portadora de Perfume.

13

O registro anatômico acurado de algumas obras como Eva (Fig. 12), influência da Art Decó, começa a ser eliminado a partir desta viagem à Europa e a figura geométrica simples feminina surge, dando um aspecto mais analítico à forma geométrica do motivo. 2.6

ANÁLISE PESSOAL A portadora de perfume é daquelas esculturas que chamam a

atenção primeiramente por sua altura, que traz certa imponência à primeira vista, mas ao mesmo tempo, lembra também delicadeza devido às curvas de suas formas, basicamente cilíndricas ou esféricas (Fig. 14). O padrão de beleza, contrário aos atuais, denota naturalidade e não deixa de emanar sensualidade por não seguir tais padrões contemporâneos. Sua localização na pinacoteca exige uma crítica para que a escultura fique em local aberto para que a incidência da luz destaque suas curvas de maneiras diferentes ao longo dos dias, o que valorizaria muito mais a obra.

Figura 14 - Detalhe da escultura onde se pode ver formas geométricas. Arquivo pessoal.

CAPÍTULO 3 – PINACOTECA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 1897/1900 3.1

A OBRA O Edifício da Pinacoteca do Estado de São Paulo (Fig. 15), projeto do escritório de Ramos

de Azevedo com desenho de Domiciano Rossi, foi parcialmente construído sem a cúpula (Fig. 16) e

o

revestimento

externo

em

1900

(FIALDINI, 2005). A falta de revestimento deixou aparente seus tijolos, maiores e mais pesados que os utilizados nos dias de hoje.

Figura 15 - Elevação a partir da Av. Tiradentes do projeto original para o edifício do Liceu de Artes e Ofícios, 1896. Fonte: ARAÚJO, 1994.

Além disso, o projeto original tinha como finalidade Figura 16 - Entrada principal da Pinacoteca do Estado, 2005. Acervo Pinacoteca / Foto: Cristiano Mascaro.

abrigar o Liceu de Artes e Ofícios. Em 1998, a pinacoteca tem sua reforma concluída com projeto 14

assinado pelo escritório do arquiteto Paulo Mendes da Rocha, o qual interveio na estrutura com o uso do aparente do aço. Possui 10.815 m² de área construída em um terreno de 7.000 m². 3.2

O AUTOR 3.2.1 Biografia Como um dos maiores responsáveis

pela mudança operada na cidade de São Paulo, em termos arquitetônicos, a figura de Francisco de Paula Ramos de Azevedo (Fig. 17) deve sempre ser lembrada, como o é na famosa Praça no centro de São Paulo que margeia uma de suas obras mais importantes: o Teatro Municipal de São Paulo. Nascido a 8 de dezembro de 1851, filho

Figura 17 - Retrato de Ramos de Azevedo, 1929. Oscar Pereira da Silva. Fonte: FIALDINI, 2005.

de uma tradicional família de Campinas (POLI/USP), iniciou a sua carreira de engenheiro matriculando-se na Escola Militar do Rio de Janeiro. Não sentindo pendor para a vida de quartel, abandonou-a e ingressou na Escola Central (Politécnica), na mesma cidade do Rio de Janeiro, onde fez os primeiros estudos. Não podendo completar aí o seu curso, deixou a escola e retornou à terra natal. Começou, então, em 1871, a trabalhar como prático na Companhia Mogiana de Estradas de Ferro. Em 1872 passou para a Companhia Paulista de Vias Férreas, que a esse tempo fazia o prolongamento da linha que ligava Campinas a Rio Claro. Era seu engenheiro-chefe o famoso Antônio Rebouças, a quem Ramos de Azevedo foi solicitar o modesto emprego de ajudante numa das seções da linha. Satisfeito em seu desejo, trabalhou durante dois anos com o chefe de seção, partindo ao cabo desse tempo (1875) para a Bélgica, onde fez o seu curso de engenheiro civil e arquiteto, na Universidade de Gand. Tão grande foi a nomeada de Ramos de Azevedo na Universidade, que seus trabalhos foram por ela escolhidos para figurar na Exposição de Paris em 1878 (ano de sua formatura). Formado, Ramos de Azevedo volta ao Brasil (em 1879) e instala-se em Campinas, que era então uma velha cidade do interior onde as construções também se faziam com taipa, pesadamente, sem arte e sem gosto (LOUREIRO, 1981 p. 47). A velha matriz campineira, com suas largas paredes de taipa, muitas delas fendidas, estava ainda por acabar e ameaçava ruir. A comissão encarregada da construção do templo consulta o seu jovem conterrâneo engenheiro e este assume o encargo de concluí-la, dando-lhe melhor aspecto e 15

consolidando-a. E assim o fez, transformando o edifício em um templo elegante e formoso, interna e externamente. Logo após, constrói o Matadouro de Campinas e, paralelamente, inicia a construção de uma série de casas particulares, entre as quais o solar de Antônio Corrêa Barbosa, e que deu à capital agrícola do Estado (como então era chamada Campinas) a feição moderna que passou a ter (LOUREIRO, 1981 p. 48). Mas à época Campinas era um campo muito estreito para a qualidade do trabalho de Ramos de Azevedo. Ao cabo de poucos anos, em 1886, ele transfere a sua residência para São Paulo e tem a sorte de encontrar à frente do governo da Província o Conde de Parnaíba, que o conhecia e que o encarregou, por ordem do Governo Geral, da construção do edifício destinado à Tesouraria da Figura 18 - Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania. Fonte: ecoturismo-sustentabilidade.com/

Fazenda, hoje Secretaria da Justiça e da

Defesa da Cidadania (Fig. 18). Concomitantemente, Ramos de Azevedo foi procurado por grande número de particulares para construir palacetes e casas de moradia. Nelas imprimiu uma feição original e elegante, que diferia completamente dos pesados e desgraciosos edifícios então existentes. Essas construções, além de enriquecerem o património artístico da cidade, muito contribuíram para o desaparecimento do aspecto provinciano da velha Paulicéia, concorrendo para a sua vertiginosa transformação na grande metrópole de hoje (LOUREIRO, 1981 p. 48). Além de sua atividade como engenheiro, Ramos de Azevedo exerceu inúmeros cargos, entre os quais o de Conselheiro do Banco Ítalo-Belga, da Sociedade Paulista de Agricultura, da Caixa Económica de São Paulo, da Comissão Administrativa do Teatro Municipal, de Mesário da Santa Casa de Misericórdia (desde 1902 até o ano de seu falecimento a 13 de junho de 1928). Foi presidente do Instituto de Engenharia, e um dos primeiros lentes que constituiu a primeira Congregação da Escola Politécnica, em 1894, tomando parte saliente na elaboração do Regulamento e do Regimento da Escola. Por morte do diretor, Dr. Paula Souza, foi ele (que já era vice-diretor) nomeado diretor (LOUREIRO, 1981 p. 49).

16

Mas sua mais importante gestão desenvolveu-se como Diretor do Liceu de Artes e Ofícios, que fora fundado em 1873, com o nome de Escola Propagadora da Instrução. Imprimiu Ramos de Azevedo grande dinamismo ao Liceu. Qualquer artífice ou mestre de valor que chegava do estrangeiro, era logo conquistado por ele para o Liceu, visando a formação de mão-de-obra qualificada. E o Liceu tornou-se o centro de onde se irradiou o movimento de artes aplicadas num São Paulo que adotara o estilo d’Art Nouveau com entusiasmo (LOUREIRO, 1981 p. 49). A primeira escola profissional de caráter industrial no Brasil funcionou junto ao Liceu, a partir de 1900, por iniciativa do arquiteto Ramos de Azevedo. Pouco tempo antes da fundação da escola, Ramos de Azevedo terminava a sua residência, onde já se observavam inúmeros elementos floreais, realizados por Luís Scattolini. Quando fundaram a escola, Ramos de Azevedo convidou o jovem Scatollini para auxiliá-lo na organização. Tão grande foi o desenvolvimento e notoriedade alcançados pelo Liceu, que chegou a obter o primeiro prêmio, medalha de ouro, em "artistic furniture", na Exposição Universal de St. Louis, em 1904, com umas vitrinas giratórias estilo Art Nouveau. Desta forma, Ramos de Azevedo formou artífices de aprimorada técnica, dos vários alunos que passaram pelo Liceu de Artes e Ofícios. Apesar de quase octogenário, não descansou até os últimos momentos, pois o seu vigor físico e energia intelectual o impeliam a novos projetos. Faleceu no Guarujá a 12 de junho de 1928, aos 76 anos de idade. (LOUREIRO, 1981 p. 49-50).

Figura 19 - Mercado Municipal de Campinas. Fonte: cinarasplace.blogspot.com.br/

3.2.2 Outras Obras Escola Politécnica (atual FATEC-SP), Teatro Municipal, Palácio das Indústrias, o edifício dos Correios e Telégrafos, o Hotel Guarujá (Santos), o Mercado Municipal de Campinas (Fig. 19), a Estação Sorocabana, entre outras.

17

3.3

ANÁLISE DA OBRA O edifício possui três pavimentos e

tem orientação simétrica ao redor de uma rotunda

em

forma

octogonal

central,

projetada para receber uma grande cúpula que nunca foi executada. Além do octógono central (Fig. 20), há ainda dois pátios laterais retangulares, também simétricos, ao redor dos quais se organizam as salas. Seguindo os ideais do arquiteto, o prédio foi construído em alvenaria

estrutural

de tijolos

de barro

Figura 20 - Planta do primeiro pavimento da Pinacoteca. Ao centro, o octógono. Fonte: ARTIGAS, 2000, p. 211.

(ZASNICOFF, 2007, p. 77-78). Em 1930, dois fatos mudaram radicalmente o uso do edifício: um incêndio no prédio e a instalação de um quartel provisório, em função das revoltas políticas – a Revolução de 1930 e a Revolução Constitucionalista de 1932. O Liceu de Artes e Ofícios foi transferido para um edifício na Avenida Tiradentes e continuou operando também no edifício da Rua Cantareira, que ainda hoje é a sua sede. O Liceu jamais retornou à sede original. A Pinacoteca permaneceu fechada por dois anos. Sua reabertura aconteceu no edifício da Imprensa Oficial do Estado, seu endereço até 1947, quando retornou ao Jardim da Luz e passou a dividir o edifício com a Escola de Belas Artes, que entre 1932 e 1939 fora responsável pela guarda e preservação de seu acervo. Para a sua instalação no edifício, a escola de Belas Artes realizou reformas devastadoras. Seu programa de necessidades era muito maior do que o espaço disponível, o último pavimento do edifício. Assim, implantaram um novo pavimento, dividindo o pé-direito em dois e destruindo as esquadrias e a alvenaria (ZASNICOFF, 2007, p. 78-79). A partir dos anos 1970, iniciou-se um movimento pela recuperação da Pinacoteca mas foi só entre 1993 e 1998 que ela passou por uma reformulação completa, enfrentando a maior reforma de toda a sua história, sob o comando do arquiteto Paulo Mendes da Rocha (ZASNICOFF, 2007). A reforma trouxe o uso de material de aço, nas passarelas, elevadores e outras estruturas, e vidro, na clarabóia (Fig. 21), além da restauração de estruturas que estavam comprometidas com o tempo.

18

Figura 21 - Vista do pátio, com passarela metálica, clarabóia e elevador. Fonte: ARTIGAS, 2000, p. 207.

Segundo a Carta de Veneza (1964), a intervenção no edifício deve ser evidente, não deve ficar disfarçada, com a utilização de estilos e materiais que simulem aqueles da construção original; deve ser realizada segundo as tecnologias construtivas do seu momento de realização – para não induzir ao engano; deve, portanto, ostentar a marca do nosso tempo (Art. 9º, Carta de Veneza, 1964). Assim, o material utilizado pelo arquiteto Mendes da Rocha e seu escritório procurou seguir tais princípios a fim de evidenciá-los na obra. Mostrando, desta forma, que a Pinacoteca é uma obra de arte resultante do Histórico de sua ocupação ao longo do tempo, de suas intervenções arquitetônicas e, inclusive, de sua não finalização do projeto original arquitetado pelo escritório de Ramos de Azevedo. 3.4

ANÁLISE HISTÓRICA Ramos de Azevedo comandava muitos profissionais ligados à construção civil e tinha como

ideologia a renovação da cidade, através da substituição da cidade colonial feita em taipa, pela nova construída em tijolos. Neste contexto, realizou uma reforma curricular que pretendia criar bases para a formação da Escola de Belas Artes de São Paulo (ZASNICOFF, 2007, p. 77). Com 19

seu prestígio ante os entes políticos, conseguiu recursos e terreno para levantar, ainda que incompleto, em 1900 o Liceu de Artes e Ofícios sob regras de composição de influência classicista (ZASNICOFF, 2007), como pode ser visto por Carlos Lemos no trecho a seguir: “...Em resumo, o procedimento era esse: escolhido o terreno, vistas as suas proporções, era imaginado um edifício grandiloqüente concebido dentro de todas as regras de composição classicizantes, se o profissional estivesse atrelado à tradição arquitetônica da Beaux Arts parisiense (que era o caso de Ramos) e depois, dentro do espaço então resultante era estudada a adequação do programa de necessidades. Está claro que há um certo exagero nesta última afirmativa assim genericamente exposta. A tendência era essa. A forma tinha prioridade sobre a função (...) (ARAUJO, 1994. p.10).

Assim, renovado pelas tendências européias, mas ainda presos ao academicismo do neoclassicismo, os edifícios da urbanização paulistana trazem consigo essas características. 3.5

ANÁLISE PESSOAL O edifício da pinacoteca encanta muito pelos tijolos empregados na sua construção. As

colunas de estilo clássico empregadas em tijolo realmente dão um ar distinto ao prédio de estilo acadêmico. Incrível é pensar que ele não foi totalmente acabado e que sua feição seria outra, caso houvesse sido, talvez com uma cara mais parecida à antiga Escola Politécnica (atual FATEC-SP), muito próxima dali, de autoria do mesmo arquiteto. Apesar de alguns autores julgarem que a intervenção em uma obra deva ser aparente, como já foi apontado, as estruturas de aço e a cobertura central não agradam tanto quanto a estrutura original, mas há de se confessar que a imitação da estrutural original não faria trabalho melhor. A ausência da cúpula do projeto original, a falta de acabamento e a intervenção recente pelo escritório Paulo Mendes da Rocha demonstram a história peculiar que esse edifício tem e muito de seu charme vem daí. Se um dia a sociedade avançar e permitir, as grades que o protegem serão retiradas e não haverá mais interferências visuais para sua contemplação, seja a partir da Estação da Luz ou a partir do Parque da Luz.

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CONCLUSÃO A descrição das três obras analisadas mostra não somente suas peculiaridades, inclusive como obras de materiais, técnicas e ofícios distintos, mas também é possível notar nelas as peculiaridades do estilo predominante de cada artista, seja ele um escultor, seja um arquiteto. Mais próximas entre si estão as obras de Di Cavalcanti e de Victor Brecheret, muito devido ao momento em que obtiveram êxito em suas carreiras e, principalmente, por terem sido um dos protagonistas da Semana de Arte Moderna em São Paulo. Já Ramos de Azevedo, adota um estilo mais acadêmico, típico estilo neoclássico brasileiro adotado como segundo estilo artístico pós-barroco e não só em voga na Europa durante algum tempo, mas muito difundido no Brasil por meio da Academia de Belas Artes carioca. Como o arquiteto vem de uma geração anterior aos outros artistas estudados, é de se esperar que sua influência artística seja menos moderna que a dos seus contemporâneos. No entanto, é de suma importância ressaltar sua posição destacada na mudança da arquitetura paulista, na virada do século XX, que mudou a cara do que viria a ser a futura megalópole brasileira. É interessante ressaltar que em algum momento da vida, todos esses personagens da história artística brasileira puderam se encontrar e se conhecer: a convite do então já consagrado arquiteto Ramos de Azevedo, Victor Brecheret improvisa um atelier no Palácio das Indústrias (atual Museu do Catavento) no qual se isola para produzir obras importantes de sua carreira. No entanto, como bolsista do Estado, sente-se insatisfeito naquela posição solitária, e o encontro com Di Cavalcanti e outros vanguardistas da época fazem com que a obra de Brecheret seja descoberta e divulgada no Brasil e no mundo. O encontro entre esses belos artistas não poderia gerar melhores frutos: a Semana de Arte Moderna, que revolucionaria a arte no Brasil. No processo de análise das obras, pode-se perceber que houve refinamento e melhora das observações, mostrando que a contemplação e síntese das conclusões de uma análise artística não é imediata, mas exige um treinamento e conhecimento de como fazê-la. É um esforço cultural no qual se deve apoiar os professores não só de ensino superior, mas também os de formação básica. Adaptando o que diz Jorge Coli em seu livro sobre o que é arte, para que se possa deveras emocionar-se em uma partida de futebol, é preciso conhecer as suas regras. O mesmo vale para a Arte pois, do contrário, tudo passará despercebido e como às vezes é feito em museus, passar-seia de modo indiferente pela obra.

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BIBLIOGRAFIA ARAUJO, Emanoel (Coord.). Pinacoteca do Estado. São Paulo: Banco Safra, 1994. ARTIGAS. Rosa (Org.). Paulo Mendes da Rocha. São Paulo: Cosac & Naify, 2000. COLI, Jorge. O que é Arte. Coleção Primeiros Passos. São Paulo: Editora Brasiliense, 12ª Edição, 1991. FIALDINI, R. 100 Anos da Pinacoteca – A formação de um acervo. Pinacoteca do Estado (SP). São Paulo: Editora Pinacoteca do Estado, 2005. GOMBRICH, E. H. The History of Art. London: Oxford University Press, 4th Edition, 1951. HELLER, Agnes. Historia y vida cotidiana – aportación a la sociologia socialista. Traducción de Manuel Sacristán. Barcelona: Editorial GRIJALBO S.A., 1985. LOPES, Rafael W. Educação Estética e Vida Ética em Friedrich Schiller. Cultura e Fé, vol. 35, n. 137, 181-198, abr./jun., 2012. LOUREIRO, Maria A. S. Evolução da casa paulistana e a arquitetura de Ramos de Azevedo. São Paulo: Voz do Oeste, Secretaria do Estado da Cultura, 1981. ZANINI, Walter (Org.). História geral da arte no Brasil. São Paulo, Instituto Walther Moreira Salles, 1983. 2v., il. ZASNICOFF, P. D. C. da S. A Dimensão Pública da Arquitetura em Museus: uma análise de projetos contemporâneos. Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção de título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Área de concentração: Teoria e prática do projeto arquitetônico. Belo Horizonte, 2007.

Referências na internet: Carta de Veneza, disponível em http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236. Acesso em Junho, 2014. Di Cavalcanti, disponível em http://www.dicavalcanti.com.br. Acesso em Junho, 2014. E-biografias, disponível em http://www.e-biografias.net/di_cavalcanti/. Acesso em Junho, 2014. IVB

-

Instituto

Victor

Brecheret,

disponível

em

http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo2/modernismo/artistas/brech/ind ex.htm. Acesso em Junho, 2014.

22

MAC/USP - Museu de Arte contemporânea da Universidade de São Paulo, disponível em http://www.brecheret.com.br/. Acesso em Junho, 2014. Pinacoteca do Estado de São Paulo, Acervo Artístico de Victor Brecheret. Disponível em: http://www.pinacoteca.org.br/pinacoteca-pt/default.aspx?mn=545&c=acervo&letra=V&cd=2339. Acesso em Junho, 2014. POLI/USP



Escola

Politécnica

da

Universidade

de

São

Paulo,

disponível

em

http://www.poli.usp.br/pt/a-poli/historia/galeria-de-diretores/200-prof-dr-francisco-de-paularamos-de-azevedo-.html. Acesso em Junho, 2014.

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ANEXOS ANEXO A

Roteiro para o Trabalho Leitura de Obras de Arte  

Escolher 3 obras do Acervo da Pinacoteca e realizar a análise das obras seguindo o roteiro abaixo. Formatar o trabalho segundo as Orientações para Trabalhos Acadêmicos – ppt em Material de Aula na Unidade Web

Orientações:

1. Observar atentamente as informações dadas na legenda da obra : autor(se houver); título ; data da execução; suporte/material ; dimensões; lugar de conservação.

2. Obter dados sobre o autor: data e lugar de nascimento e morte ; origem social ; anos e lugares de formação; idade que tinha quando da realização da obra; outras obras suas. 3. Reconhecer o tipo de assunto representado (tema ou gênero): cena religiosa ; histórica ; mitológica; alegoria ; retrato ; paisagem ... (se e quando apareceu ao público ; acolhimento...).

4. Analisar o assunto propriamente dito : descrever o que está representado ; lugares ; enquadramento da cena; personagens; ação das personagens ; objetos... Deve tentar perceber-se porque é que o autor pintou um quadro com aquelas dimensões e não outras, proceder à análise da cena, do enquadramento desta, dos móveis, dos objetos representados, da paisagem, da posição das personagens, identificando-as, como estão vestidas, em que atitude se encontram , etc.

Análise sintática

A composição - Quais são as linhas que organizam o quadro? Isto é, a organização das figuras segundo esquemas geométricos ou não, com eixos bem marcados ou não, segundo leis de perspectiva ou sem elas (como é criado o sentido de profundidade). 24

O desenho - qual é a função da linha, a sua espessura e forma? Tem um papel fundamental ou acessório?

As cores - Quais são as cores dominantes? Cores quentes ou frias?, análogas ou complementares?

A luz - De onde vem a luz? Está repartida uniformemente? Qual é o seu efeito?

A técnica - se for uma pintura: pincelada larga, pontilhada; se for um desenho: linear, sfumato; se for uma escultura: superfície lisa, rugosa, polida, opaca, colorida.

A matéria _óleo, têmpera, argila, mármore, bronze, grafite, etc.

Deverá analisar se o olhar do espectador é atraído para algum ponto em especial e porquê ; o que se pretende traduzir com determinadas cores ; se o emprego de determinada técnica marca decididamente o estilo do autor; se o emprego de determinadas matérias representa um avanço em relação a outros, inserção ou não nas técnicas comuns, etc Análise histórica Por que este tema? Por que esta técnica? Por que este estilo? Que efeito pretendeu produzir no público? Insere-se numa corrente artística ou rompe com as correntes dominantes? A resposta a estas questões levará à descoberta de problemas relacionados com: tipos de encomendas , ideias perfilhadas pelo autor, mentalidade dominante ; tipo de materiais colocados à sua disposição, influências de outros artistas, etc. Fazer um comentário pessoal sobre a obra de arte Comentar do ponto de vista pessoal uma obra de arte, é exprimir a sua adesão ou não, à obra, quer do ponto de vista intelectual, quer do ponto de vista afetivo, justificando a sua posição. Assista os (“sic”) vídeos no da série Obra Revelada.

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São análises de obras feitas por pessoas conhecidas e desconhecidas, mas cada qual faz uma leitura pessoal de uma obra de arte. Edilson de Souza - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=g_3dlQRn_wc Fabrício Carpinejar - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=AsTwTfQCbbo Benedito Nunes - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=Bo7PCx_o9-w Niede Guidon - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=ZxrVDNG6hAI Carlos Reichenbach - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=L0SoPLRcym8 Augusto Damineli - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=rtCEJHqIo5g Elke Maravilha - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=P42bDpAGuu8 João Sayad - Obra Revelada http://www.youtube.com/watch?v=bqenv0EK1AM

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ANEXO B

Figura 22 - Roda de Cores. Fonte: http://www.wl.com.br/roseantonelli/artigos/teoria.htm.

Figura 23 - Cores primárias, análogas, secundárias e complementares. Fonte: http://www.dcoracao.com/2010/10/teoria-das-cores-circulo-cromatico.html.

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