Análise Gramsciana do estatuto do partido Rede Sustentabilidade: candidatura cívica independente

October 12, 2017 | Autor: Danielle Braz | Categoria: Gramsci, Partidos políticos
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ANÁLISE GRAMSCIANA DO ESTATUTO DO PARTIDO REDE SUSTENTABILIDADE: CANDIDATURA CÍVICA INDEPENDENTE

Danielle Cristina Braz

RESUMO: O recém-fundado partido político brasileiro “Rede Sustentabilidade” traz um estatuto repleto de inovações. Entre estas está a “candidatura cívica independente”, mecanismo que permite às lideranças de movimentos e causas sociais filiarem-se ao partido e lançarem candidatos, sem a necessidade de manterem vínculo orgânico com o partido. O presente artigo faz uma análise deste instrumento através de conceitos gramscianos, como o conceito de “vontade coletiva”, de “guerra de posições”, de “centralismo democrático” e, principalmente, através da proposta da forma organizativa do “Moderno Príncipe”. Com esta análise pretende-se demonstrar que a candidatura cívica independente, ao mesmo tempo em que enfraquece o sistema representativo dos partidos políticos, também é um indicativo da já instaurada crise de representatividade pela qual passam tais partidos.

PALAVRAS-CHAVE: Rede Sustentabilidade, Moderno Príncipe, Gramsci.

GRAMSCIAN ANALYSIS OF STATUTE’S PARTY "SUSTAINABILITY NETWORK": CANDIDATURE CIVIC INDEPENDENT



Bacharel em Direito, advogada e aluna especial do curso de Mestrado em Ciências Sociais da Unioeste Toledo (PR). E-mail: [email protected].

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ABSTRACT: The newly founded political party brazilian "Sustainability Network" brings a statute packed with innovations. Among them is the "candidature independent civic", mechanism that allows the leaders of social movements and causes affiliating to the party and engage candidates through it, without the need to maintain direct relationship with the party. This article analyzes this instrument through gramscian concepts, such as the concept of "collective will" of the "war of position", the "democratic centralism" and especially, through the proposal of the organizational form of the "Modern Prince". This analysis is intended to demonstrate that the candidature independent civic, while it weakens the representative system by political parties, is also indicative of the already established crisis of representation through which pass such parties.

KEYWORDS: Sustainability Network. Modern Prince. Gramsci.

1.

INTRODUÇÃO

O presente artigo tem por objetivo a análise, em bases gramscianas, de um dos mecanismos

trazidos

pelo

novo

partido

político

brasileiro

chamado

“Rede

Sustentabilidade”. O mecanismo escolhido chama-se “candidatura cívica independente” e será analisado à luz de alguns conceitos importantes da teoria de Gramsci, partindo do pressuposto que estes conceitos permanecem atuais e dão conta de explicar a atual conjuntura política brasileira. A candidatura cívica independente vem prevista no estatuto do partido (ESTATUTO..., 2013, p. 187) da seguinte forma: Art. 88. A REDE oferecerá até 30% (trinta) do total de vagas nas eleições proporcionais para candidaturas “cívica independentes” que serão oferecidas à sociedade para cidadãos não filiados e que não pretendam exercer vínculos orgânicos com nenhum partido político dispostos exclusivamente a disputar as eleições e exercer mandato parlamentar para defender e representar movimentos, redes e causas sociais legítimas e

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relevantes para a sociedade, o Programa, o Estatuto e o Manifesto da REDE.

A proposta do partido é, portanto, oferecer aos representantes de movimentos e causas sociais, a possibilidade de serem candidatos pela Rede, sem precisarem manter qualquer tipo de relação orgânica com o partido. Os representantes precisam somente apresentar uma carta de intenções, dizendo quais são seus propósitos para o mandato parlamentar, sendo que o partido terá o direito de deliberar, inclusive através de reuniões abertas à toda população, e decidir se aceita ou não a candidatura. Uma vez eleito através deste sistema, o candidato não terá a obrigação de obedecer a nenhuma orientação partidária e o partido, por sua vez, não poderá questionar ou interferir no mandato do parlamentar, a não ser que ele descumpra algum dos propósitos ao qual se vinculou na carta de intenções. Importa ressaltar, num primeiro momento, que apesar do partido escolhido não ser nem se auto declarar - um partido revolucionário, na acepção gramsciana da palavra, este instrumento foi escolhido por constituir-se em uma verdadeira inovação na organização partidária, não encontrando correspondência em nenhum dos estatutos de partidos políticos atualmente existentes no Brasil. Desta forma, em que pese a Rede não ter uma ação política que interesse à nossa análise, este instrumento, no mínimo curioso, carece de maior aprofundamento teórico, no sentido de demonstrar que ele talvez seja um reflexo do grave período de descrédito generalizado na atuação dos partidos políticos.

2. O MODERNO PRÍNCIPE

A concepção gramsciana do Moderno Príncipe nasce através de uma analogia feita entre o partido político e o Príncipe maquiaveliano. Na interpretação de Gramsci 1,

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Para Gramsci, Maquiavel não teria escrito o Príncipe inspirado ou destinado a algum soberano específico. Na verdade, o Príncipe seria um mito, na concepção soreliana da palavra, ou seja, “uma

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Maquiavel, enquanto um dos primeiros intelectuais orgânicos da burguesia escreve “O Príncipe” no intuito de formar entre os membros da classe burguesa uma vontade coletiva que os orientasse no sentido da unificação dos estados italianos em um só Estado-Nação. Esta unificação impulsionaria os propósitos comercias da burguesia e a fortaleceria enquanto classe progressista da época, criando as bases para a construção de um novo Estado. Este seria, portanto, o papel do Príncipe naquele determinado momento histórico. No entanto, na sociedade moderna em que vivera Gramsci, o Novo Príncipe não poderia ser uma única pessoa, mas sim a expressão de um grupo social, representado através do partido político (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 59). Nas palavras de Geraldo Magella Neres (2012, p. 17) o partido seria o “moderno Príncipe”, pois se consolidara como “a instituição reconhecida e legitimada pelo processo histórico recente como o criador de novos Estados e de novos ordenamentos: o suscitador de uma nova vontade coletiva que aspira a se transformar em sociedade integral”. Desta forma, o Moderno Príncipe se ocuparia da “grande política”, ou seja, de questões ligadas à fundação, destruição, defesa e conservação de “determinadas estruturas orgânicas econômico-sociais” (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 21); e não da “pequena política”, que teria relação com as questões políticas cotidianas. Neste ponto é preciso fazer algumas considerações sobre o foco deste estudo. Embora o tema do artigo seja a análise da candidatura cívica independente, instrumento de viés eleitoral que se enquadraria perfeitamente na pequena política gramsciana; não é sobre a pequena política que se pretende falar aqui. O objetivo é utilizar-se do mandato cívico independente para trazer à baila toda a discussão sobre a debilidade do sistema representativo por partidos políticos. Para isto se fará necessário analisar as possíveis conseqüências negativas que o instrumento em apreço causará à consciência coletiva do eleitorado brasileiro, relacionando-as com a teoria gramsciana sobre os partidos políticos, em especial sobre o Moderno Príncipe.

criação da fantasia concreta que atua sobre um povo disperso e pulverizado para despertar e organizar sua vontade coletiva” (Gramsci, 2000, v. 3, p. 14). Sobre a interpretação gramsciana de Maquiavel: Neres, 2009.

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Portanto, como vamos falar de consciência coletiva, que em Gramsci ganha um conteúdo de classes, certamente não estaremos falando da pequena política, mas sim da grande política, o que justifica a importância de bem conceituar o Moderno Príncipe. 3. A FORMAÇÃO DA VONTADE COLETIVA

O Moderno Príncipe, na proposta de Gramsci (2000, v. 3, p. 18), tem como principal função “ser o anunciador e o organizador de uma reforma intelectual e moral, [...] criar o terreno para um novo desenvolvimento da vontade coletiva nacional-popular no sentido da realização de uma forma superior e total de civilização moderna”. Esta reforma intelectual e moral está umbilicalmente ligada ao conceito de guerra de posições criada por Gramsci para explicar o processo de transição socialista nas sociedades ocidentais2. Isto por que a guerra de posições pressupõe a “conquista paulatina de espaços no seio e através da sociedade civil” (COUTINHO, 1984, p. 83); sendo que estes espaços uma vez conquistados, seriam preenchidos com o conteúdo produzido pela reforma intelectual e moral, que em última análise, consolidaria a formação de uma vontade coletiva da classe proletária. No entanto para que o Moderno Príncipe tenha condições de criar tal vontade coletiva no bojo da classe operária, através da guerra de posições, é preciso que ele observe alguns pontos fundamentais, que segundo Gramsci (1981, p. 242) seriam: 1) 2) 3) 4)

la ideologia de partido; la forma de la organización, y su grado de cohesión; la capacidad de funciona em contacto com la masa; la capacidad estratégica y táctica.

Entre os quatro elementos elencados por Gramsci, interessa-nos para fins do presente artigo, debruçar-se sobre o item 3: a capacidade do partido de funcionar em contato com a massa. Segundo Gramsci, o partido deveria ter entre seus membros, 2

Gramsci diferencia os países ocidentais dos orientais através do tipo de sociedade civil existente em cada um deles. Estes últimos possuem uma sociedade civil pouco organizada, enquanto que os primeiros possuem uma sociedade civil complexa e articulada “resistente às erupções catastróficas do elemento econômico imediato” funcionando como um verdadeiro “sistema de trincheiras”. (Gramsci, 2000, v. 3, pp. 71-74).

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dirigentes que seriam parte da massa e a ela permaneceriam vinculados, mesmo que exercendo funções diretivas, como forma de garantir a constante troca com a massa e rechaçar a teoria determinista de oligarquização dos partidos prevista por Michels3. Para que isto fosse possível, era preciso adotar um método de organização específico, através de células profissionais, ou seja, células com base no local de produção e não no critério territorial adotado pelos demais partidos burgueses. Além disso, o partido deveria ser especialmente responsável pela educação destes membros que seriam o principal instrumento do partido de vinculação com as massas (GRAMSCI, 1981, p. 248). Destas últimas observações feitas por Gramsci, sobre a necessidade do permanente contato do partido com as massas através da formação de dirigentes especialmente preparados para isso, podemos traçar um paralelo com a “candidatura cívica independente”. Em primeira análise, um leitor desatento poderia concluir que no momento em que o partido traz para perto de si representantes de movimentos e causas sociais, sem a necessária vinculação orgânica, ele estaria achando uma forma bastante capciosa de construir este contato com as massas, indispensável para a construção do partido revolucionário. No entanto, isto é uma falácia perigosa, pois fere o mais importante princípio organizativo do partido revolucionário: o centralismo democrático. Gramsci conceitua o centralismo democrático como sendo o principio de organização partidário mais apropriado aos partidos revolucionários. A este instrumento ele não dá conteúdo específico (GRAMSCI, 2000, v. 3, p. 92), apenas traça diretrizes gerais que devem ser observados na sua aplicação. Entre estas diretrizes está a organicidade, conceituada da seguinte forma:

“(...) ele (o centralismo democrático) é orgânico porque leva em conta o movimento, que é o modo orgânico de revelação da realidade histórica, e não se enrijece mecanicamente na burocracia; e, ao mesmo tempo, leva em conta o que é relativamente estável e permanente ou que, pelo menos, move-se numa direção fácil de prever, etc.” (Gramsci, 2000, vol. 3, p. 91).

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Gramsci dedicou algumas páginas dos seus Cadernos do cárcere para rebater a teoria da oligarquização dos partidos políticos defendida por Robert Michels no livro “A Sociologia dos Partidos Políticos” de 1914.

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A essência do centralismo democrático, portanto, está edificada sobre a idéia da centralização que garante a eficácia da ação partidária, e ao mesmo tempo, sobre a lógica democrática, que permite ao partido ter movimento, no sentido de ter organicidade, ou seja, permite que seus membros sejam capazes de pensar a conjuntura política, discuti-la e avaliar internamente as melhores posições a serem adotadas pelo conjunto do partido. Desta forma, podemos observar que as consequências da “candidatura cívica independente” seriam desastrosas para a organização interna do partido. Isto porque ao não estabelecer relação orgânica com o partido, a liderança mesmo que advenha das massas e com ela permaneça vinculado, não participará internamente da vida partidária e não se submeterá às posições adotadas pelo partido. Assim, o partido internamente sofrerá um esvaziamento das lideranças e externamente terá prejudicada a eficácia de sua ação política. Ademais, o prejuízo se dará também na esfera da formação política das próprias lideranças, que não participando da vida interna do partido e não tomando parte nas discussões, não terão a possibilidade de formarem dentro de si, por um processo dialético de convencimento, uma consciência verdadeiramente de classe, que enxergue no partido um instrumento necessário para a transformação social, e assim, permanecerão à mercê de pequenos interesses dos grupos que representam.

4. FORTALECIMENTO DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA PARA A CONSTRUÇÃO DO SOCIALISMO

Por fim, cabe ressaltar ainda os prejuízos que “a candidatura cívica independente” trará ao sistema de democracia representativa adotado pelo Brasil atualmente, e como o fortalecimento desta democracia está intimamente ligado com a construção do socialismo. O sistema de representação vigente no Brasil e na maioria dos países do mundo é o chamado sistema partidário, em que os partidos políticos são os verdadeiros detentores do

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mandato, conforme asseverou o Ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), César Asfor Rocha4: Ora, não há dúvida nenhuma, quer no plano jurídico, quer no plano prático, que o vínculo de um candidato ao Partido pelo qual se registra e disputa uma eleição é o mais forte, se não o único elemento de sua identidade política. O candidato não existe fora do Partido Político e nenhuma candidatura é possível fora de uma bandeira partidária.

Observa-se, portanto, que ao prever a “candidatura cívica independente”, o estatuto da “Rede Sustentabilidade” cria uma brecha no sistema eleitoral brasileiro, uma vez que, o candidato passa a se utilizar do partido apenas como uma ferramenta necessária à homologação de sua candidatura perante a Justiça Eleitoral, ferramenta esta que é facilmente descartada depois da eleição, algo que poderíamos chamar de prostituição dos partidos. Uma vez eleito, o parlamentar passaria a exercer o “mandato cívico independente” podendo atuar politicamente de forma autônoma. Legitimar-se-ia, portanto, a possibilidade do parlamentar “abandonar” o partido ao qual se vinculou durante a eleição, criando aqui não só uma brecha, mas uma verdadeira afronta à legislação eleitoral, que ao exigir o tempo mínimo de filiação e ao reconhecer o pertencimento do mandato aos partidos, deixa claro seu objetivo de fortalecer os partidos políticos, através da necessária vinculação – de fato e não apenas formal - entre candidatos/parlamentares e partidos. Neste sentido a “candidatura cívica independente” mais do que causar um prejuízo direto à democracia representativa, enfraquecendo-a, causa também, indiretamente um prejuízo à construção do socialismo. Isto porque, conforme assevera Coutinho (1984, p. 52) a luta pela construção do socialismo requer hoje, mais do que nunca, “a expansão da democracia representativa, a sua articulação com múltiplos organismos de democracia de base, a defesa de uma vida cultural aberta e pluralista”. Nesse sentido, ele se utiliza da contribuição dada por Rosa Luxemburgo (apud COUTINHO, 1984, p. 65) sobre a questão democrática:

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O Ministro se pronunciou durante a consulta feita por alguns partidos políticos, em abril de 2007, sobre a possibilidade de desvinculação do partido durante o mandato parlamentar. A consulta culminou na criação da Resolução nº 22.610 pelo TSE que versa sobre os casos de perda do mandato parlamentar por infidelidade partidária – incluindo aqui casos de desvinculação partidária sem justo motivo -, ressaltando mais uma vez que o mandato parlamentar pertence ao partido e não ao eleito.

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Jamais fomos idólatras da democracia formal, mas isso quer dizer apenas o seguinte: sempre distinguimos entre o núcleo duro de desigualdade e servidão recoberto pelo suave invólucro da igualdade e das liberdades formais, mas não para rejeitá-las, e sim para incitar a classe operária, a não se contentar com elas e a tomar o poder político, a fim de preencher esse invólucro com um conteúdo social novo.

A conclusão é que, ao enfraquecer os partidos políticos, se está ao mesmo tempo enfraquecendo a própria idéia – já muito debilitada – de representação política através dos partidos. Ao fazer isto, quem perde diretamente é a democracia burguesa, que vê desmoronar todo seu sistema de representação formal; mas perde também o próprio socialismo que vislumbra um retrocesso na democracia representativa, cuja conquista, mesmo não sendo suficiente, representa um patamar importante na guerra de posições gramsciana.

5. CONCLUSÃO

Da análise da “candidatura cívica independente” e da sua correlação com alguns importantes conceitos gramscianos, podemos chegar a conclusões interessantes. Em primeiro lugar, com relação ao papel central do partido político na revolução proletária. Para Gramsci, o partido, na forma do moderno Príncipe, é o único capaz de ser o agente mediador entre a classe operária e a formação de uma nova sociedade. Isto porque o partido é capaz de reunir interesses e valores que outras entidades e instituições não poderiam reunir. Por óbvio, o conteúdo do moderno Príncipe deveria ser adaptado às realidades sociais e históricas de cada nação, levando em conta os princípios básicos de organização elencados por Gramsci, mas a sua existência seria imprescindível. Em segundo lugar, conclui-se que a imprescindibilidade do partido decorre em grande parte, das funções que ele possui: a realização de uma reforma intelectual e moral e a formação de uma vontade coletiva, que represente os interesses da classe operária.

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A formação desta vontade coletiva passa necessariamente por, pelo menos, outros dois conceitos gramscianos: a guerra de posições e o centralismo democrático. O primeiro refere-se à forma de luta política que deve ser adotado pelo partido na sua ação externa, conquistando posições dentro da sociedade civil; e o segundo, à organização interna do partido. Estes conceitos são muito úteis para esclarecer a ideia gramsciana de como deveria se dar o contato do partido com as massas. O centralismo democrático procura garantir ao mesmo tempo a eficácia da ação política – unidade na ação – e a construção democrática de um consenso interno que garanta o constante movimento do partido. O contato dos dirigentes partidários com as massas, portanto, precisa se dar de maneira efetiva, ou seja, no sentido de garantir a formação de uma verdadeira consciência de classe entre as massas. Nesse sentido, o “mandato cívico independente” engana a classe operária, pois oferece à ela a possibilidade de votar em lideranças que, mesmo tendo discursos compatíveis com a causa do proletariado, nada poderão fazer isoladamente e de forma aleatória para modificar a realidade colocada, já que além de não serem capazes de formar a vontade coletiva, também não serão capazes de orientar as massas durante a ação política. Assim, o “mandato cívico independente” ao criar uma falsa contradição entre partido político e movimento social, com a ideia implícita de que os movimentos sociais seriam moralmente superiores aos partidos, acaba por dividir ainda mais a classe operária. A divisão do proletariado há muito prevista por Marx, como uma forma da burguesia impedir ou retardar a revolução, ganha, portanto, mais um aliado no estatuto partidário da Rede. A ideia é muito simples: concentrar grupos cada vez menores em torno de causas cada vez mais específicas e pontuais, o que acaba por ofuscar o verdadeiro cerne da questão: a luta de classes. Ao passo que estes movimentos diminutos passam a ganhar força, tornando-se mais importantes que o próprio partido revolucionário - este sim capaz de traçar a disputa tendo em vista a luta de classes – o que ocorre é o enfraquecimento do processo de construção do socialismo.

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Por fim, o que podemos depreender é que a criação de um instrumento como a “candidatura cívica independente” talvez seja um indicativo da crise de representatividade pela qual passam os partidos políticos atualmente. Por isso, a conclusão mais importante que podemos ter neste momento é sobre a necessidade dos partidos, em especial os de esquerda, repensar o seu papel na atual conjuntura política brasileira a tempo de recuperarem sua relação com a massa, posto que ela, em última análise, será o motor dos avanços sociais.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COUTINHO, Carlos Nelson. A democracia como valor universal e outros ensaios, 2ª ed. Ampliada. Rio de Janeiro: Salamandra, 1984. ESTATUTO da Rede Sustentabilidade. Diário Oficial da União, Brasília, DF, n. 38, p. 187-194, fev. 2013. GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. v. 3. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. v. 6. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000. GRAMSCI, Escritos Políticos. México DF: Ediciones Passado y Presente, 1981. MICHELS, Robert. Sociologia dos partidos políticos. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1982. NERES, Geraldo Magella. Política e hegemonia: a interpretação gramsciana de Maquiavel. Curitiba: Ibpex, 2009. NERES, Geraldo Magella. Gramsci e o “moderno Príncipe”: a teoria do partido nos Cadernos do cárcere. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2012.

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