ANÁLISE LOCACIONAL DOS ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS E FISCAIS DA PRODUÇÃO DE SOJA EM MATO GROSSO

July 27, 2017 | Autor: Alexandre Faria | Categoria: Taxation, Employment, Soybean, Mato Grosso, Taxa De Erro De Bit (BER), Agricultural Taxes
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ANÁLISE LOCACIONAL DOS ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS E FISCAIS DA PRODUÇÃO DE SOJA EM MATO GROSSO Dilamar Dallemole* Alexandre Magno de Melo Faria**

RESUMO Este estudo tem como escopo central avaliar a atividade produtiva da soja, considerando sua capacidade de geração de emprego, renda e arrecadação de ICMS para os municípios mato-grossenses. Já é notória a existência de uma significativa bibliografia voltada a estudos sobre soja, contudo, nem todos os aspectos foram abordados ou correlacionados. A metodologia proposta correlaciona essas variáveis, por meio de um indicador de especialização local, utilizado em estudos para delimitar a localização de atividades econômicas. Este indicador, plotado graficamente, permite identificar se há alguma anomalia na estrutura de arrecadação ou na formalização do emprego. Especificamente no caso de Mato Grosso, 44 municípios foram selecionados como especializados e como esperado o gráfico da renda se mostrou mais estável, enquanto que os do emprego e da arrecadação exibiram variações mais significativas, identificando situações as quais podem sugerir distorções no registro de empregados e recolhimento de ICMS. Em relação ao emprego, alguns municípios apresentaram uma especialização no registro de empregados muito elevada, destoando da geração de renda, mas que confirma essa formalização. O mesmo não acontece com a arrecadação de ICMS, pois muitos municípios registraram uma especialização superior e outro inferior da renda, sendo que ambas as situações acarretam em problemas de distribuição de receita para as regiões. Apesar de se tratar de um fato sistêmico, a alocação de recursos públicos fica comprometida e as desigualdades regionais podem estar sendo fomentadas pela própria administração pública. Palavras-chave: Soja-Renda. Soja-Emprego. ICMS-Mato Grosso.

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Doutor em Ciências Agrárias; Professor Adjunto da Universidade Federal de Mato Grosso. E-mail: [email protected].

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Doutor em Desenvolvimento Socioambiental; Professor Adjunto da Universidade Federal de Mato Grosso. E-mail: [email protected].

Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

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LOCATIONAL ANALYSIS OF SOCIOECONOMIC AND FISCAL ASPECTS OF SOY PRODUCTION IN MATO GROSSO ABSTRACT This study has the objective to assess the central activity of soybean production, considering their capacity to generate employment, income and revenues of ICMS to municipalities in Mato Grosso. It is noticeable that there is a significant literature dedicated to studies on soy, however, not all aspects were correlated. The proposed methodology correlates that variables by means of an indicator of local expertise, used in studies to define the location of economic activities. This indicator, plotted graphically identifies if there is any abnormality in the structure of collection or in formal employment. Specifically in the case of Mato Grosso, 44 municipalities were selected as specialized and as expected, the graph of income was more stable, while the employment and revenue showed most significant changes, identifying situations that may suggest distortion of the record of employees and payment of ICMS. With regard to employment, some municipalities had a specialization in the register of employees very high, which clashes with the generation of income, but confirms that formalization. Not so with the collection of ICMS, where many municipalities recorded a higher specialization of the lower income and other, since both situations cause problems in distribution revenue for the regions. Although it is a fact that systemic allocation of public resources is compromised and regional inequalities may be being encouraged by government. Keywords: Soy-Income. Soy-Employment. ICMS-Mato Grosso.

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1 INTRODUÇÃO A agricultura vem registrando significativas transformações em Mato Grosso, principalmente motivadas pela mudança do padrão tecnológico utilizado nas lavouras (PRIMAVESI, 1997). A chamada “Revolução Verde” permitiu que o estado obtivesse um elevado nível de produção nos últimos anos em virtude do melhoramento genético apresentado com as novas cultivares.

espalhando-se por, praticamente, todas as regiões, com reflexos positivos sobre os padrões socioeconômicos (DOMINGOS, et al. 2010).

Além do melhoramento genético, de acordo com Pereira (1995), o crescimento da produção agrícola, em especial a da soja, principal produto da pauta de exportações matogrossenses, se deve ao processo de modernização da agricultura, que adotou um modelo de mudança em sua base técnica. Mato Grosso migrou de um processo de cultivo na agricultura, cujas bases técnicas eram rudimentares, passando a adotar máquinas e equipamentos de forma intensiva, assim como insumos e defensivos agrícolas.

Todavia, alguns aspectos relacionados à sojicultura, ainda, permanecem à margem da discussão em Mato Grosso, como a formalização da mão de obra, a arrecadação de impostos e suas relações com a renda. Domingos (2010) relaciona alguns dos principais estudos sobre a referida atividade nas demais regiões brasileiras e nesse estado, considerando a baixa internalização de renda e arrecadação de impostos, entretanto, aborda o expressivo crescimento na produção. Pereira (1995) e Primavesi (1997) complementam abordando as temáticas relacionadas à modernização agrícola e às questões agroecológicas, contudo, não se percebe uma avaliação mais aprofundada acerca dos mecanismos relacionados ao sistema de registro de empregos e arrecadação de impostos.

Não obstante, as mudanças institucionais somaram-se a essa nova base tecnológica no campo e, conjuntamente, configuraram um novo cenário do agronegócio brasileiro. Nos últimos anos a abertura comercial, seguida da desregulamentação dos mercados, as reformas na política agrícola e a consolidação de blocos econômicos acabaram de consolidar um modelo competitivo de produção no campo, com a necessidade de ganhos de escala, considerando significativos investimentos em tecnologia (JANK; NASSAR, 2000).

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), a produção de soja em 2009 ultrapassou 10,5 bilhões de reais para uma arrecadação de 238 milhões. Participou com 18,4% no total da receita do estado, enquanto que sua contribuição na arrecadação de impostos e na geração de postos de trabalho foi de apenas 7,2% e 4,7%, respectivamente. Considerando estas informações, o questionamento a ser analisado está relacionado a possíveis anomalias nos sistemas de registro destas informações.

O estado de Mato Grosso acompanhou a nova estrutura produtiva e passou a se destacar na produção de diversas culturas, sendo o cultivo do grão de soja, a principal no que se refere a exploração agrícola. Dado a facilidade em promover o encadeamento de atividades, em função de seu cultivo e beneficiamento, a soja ampliou sua área de abrangência no estado,

Nesse sentido buscou-se, por meio de uma ferramenta de análise locacional, identificar alguns aspectos relacionados à especialização na arrecadação e no registro de empregos. A intensão é identificar os locais que apresentam alguma disfunção nos sistemas responsáveis pela formalização do emprego e pelo recolhimento de ICMS em Mato Grosso.

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2 A PRODUÇÃO DE SOJA EM MATO GROSSO Mato Grosso é considerado um dos principais produtores de commodities do País, com grande destaque para a soja, milho e algodão. Como pode ser observado na Tabela 1, em 2009 o estado foi responsável pela metade da produção

brasileira de algodão, alcançando a cifra de 1,7 bilhões de reais. Na sequência, em termos de participação na produção, a soja mato-grossense representa 27,7% da produção nacional, sendo computada em mais de 10 bilhões de reais.

Tabela 1- Produção de lavoura temporária em Mato Grosso, 2009

Fonte: IBGE, 2012.

O milho gera uma renda semelhante a do algodão, contudo sua participação é de apenas 12,2%. Cana-de-açúcar, arroz e feijão seguem no rol das principais culturas produzidas, contudo, sua representatividade, assim como a renda gerada, não possui a mesma magnitude, mas são importantes devido às questões relativas à segurança alimentar.

No caso da soja, a área colhida em Mato Grosso foi de 5,8 milhões ha em 2009, que representou 26,8% daquela ocupada pela atividade no Brasil. Por meio dos dados contidos na Tabela 2, ainda, é possível perceber que a produtividade local de 3,1 t/ha é superior a produtividade nacional de apenas 2,6. Este fator é responsável pela maior representatividade em quantidade produzida, cujo registro foi de 31,3% em 2009.

Tabela 2 - Produção de soja no Brasil e em Mato Grosso, 2009

Fonte: IBGE, 2012.

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A produção de soja está distribuída em um significativo número de municípios em Mato Grosso. Os dados da Tabela 3 comprovam a produção média estadual informada, considerando que os principais produtores apresentam indicadores semelhantes. A maior área destinada está disposta no município de Sorriso, que com cerca de 590 mil ha produziu 1,8 milhões de t. Mantendo a mesma média, o segundo maior produtor é Sapezal, com 362 mil ha e 1,1 milhões de t.

Apesar da produção de soja apresentar números significativos, o mesmo não ocorre com a empregabilidade e arrecadação de impostos pelo setor. Devido à alta intensidade tecnológica exigida para que os ganhos de escala sejam atingidos, a demanda por trabalhadores não se apresenta de forma intensa em Mato Grosso e a soja, principal responsável pelo superávit da balança comercial regional, representa apenas 4,7% do emprego, conforme dados da Tabela 4. Ainda, em 2009 foi registrado um trabalhador para cada 197 ha.

Tabela 3 - Principais municípios produtores de soja em Mato Grosso, 2009

Fonte: IBGE, 2012. Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

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No que se refere à arrecadação de impostos, o registro apresenta a sucinta representatividade de 7,2% do total de ICMS em Mato Grosso (Tabela 4). Trata-se de questões importantes, tendo em vista que o cultivo da soja

gera uma renda elevada, quando comparada às demais atividades do estado, mas não mantém essa mesma representatividade traduzida em postos de trabalho e arrecadação.

Tabela 4 - Produção, arrecadação e empregabilidade da soja, 2009.

Fonte: IBGE, 2012; SEFAZ-MT, 2009.

Esta breve contextualização indica que a sojicultora é uma atividade representativa na dinâmica da socioeconomia local. Ao se avaliar as referidas peculiaridades da soja em Mato

Grosso, considerando o que já foi exposto, a base analítica proposta, suportada em modelos de análise regional, encaixa-se de forma mais adequada a este estudo.

3 ASPECTOS RELEVANTES A CERCA DA TEORIA LOCACIONAL As teorias da localização têm como premissa que toda empresa escolhe a localização que ofereça o maior lucro esperado. Por isso, o espaço territorial não pode ser tratado, apenas, como o local onde ocorre a interação dos fatores produtivos e o equilíbrio das forças centrípetas de aglomeração e centrífugas de desaglomeração, mas o espaço de atração e agregação que oportuniza o desenvolvimento de economias regionais (SANTANA, 2005). Esta discussão permeia o presente trabalho, dando ênfase ao enfoque do economista alemão Alfred Weber, cuja instalação das indústrias ocorre onde os custos de transporte de matérias-primas e/ou produtos finais sejam mínimos e os fatores de aglomeração estejam presentes. Os custos com transporte são decisivos Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

na determinação das preferências de localização, provenientes de uma função que relaciona o peso físico a ser transportado com a distância a ser percorrida (DALLEMOLE, 2007). Com caráter secundário Weber (1929) cita a mão de obra como sendo um fator que influencia na localização regional. Existe locais onde o preço dela é mais barato, devendo ser relacionado com os custos de transporte para a obtenção de uma nova composição dos custos mínimos que indicará uma nova tendência locacional e regional (DALLEMOLE, 2007). Isto é possível, porque a relação interregional gera, automaticamente, uma interdependência, fazendo com que o todo opere na forma de um sistema, com estruturas 92

dominantes, pouco impactadas pelos desequilíbrios regionais. Significa dizer que existem centros e periferias regionais, com diferentes níveis de concentração e aglomeração (DALLEMOLE, 2007). Estes centros podem se converter em regiões polo, a partir dos espaços econômicos com alto grau de poder de aglomeração, dentre os quais existem campos de forças funcionais que emanam efeitos concentradores ou dispersores. Quando os efeitos concentradores são superiores há uma tendência de concentração da atividade econômica nestes espaços, os quais se tornarão regiões polos ou potenciais (DALLEMOLE, 2007). As regiões polo tendem a causar crescimento econômico e podem ser responsáveis pelo desenvolvimento. Quando causam crescimento, há aumento da renda e estes espaços são caracterizados como polos de crescimento. Quando ocorrem transformações estruturais em toda a região estes espaços são denominados de polos de desenvolvimento (PERROUX, 1967). No que tange a distribuição da atividade produtiva no espaço, considerando os aspectos citados, há uma articulação no sentido da concentração em determinadas regiões. No caso da produção de soja em Mato Grosso, existe esta concentração, que é responsável pela geração de emprego, renda e arrecadação de ICMS.

Em Mato Grosso, independente de qual seja o município, a produção de soja ocorre de forma semelhante, considerando que a tecnologia empregada desde o plantio até a colheita é análoga, no tocante a necessidade de insumos, mão de obra, defensivos e no rendimento por hectare, o que vai refletir em uma semelhança na renda bruta e, por sua vez, na arrecadação de ICMS. O cálculo deste imposto considera as relações comerciais em que haja a circulação de mercadorias, como resultado da aplicação de uma alíquota a qual resulta numa apropriação por parte do estado de um percentual sobre o faturamento ou valor contábil destacado nessas transações. Cabe fazer o registro da Lei Complementar nº 87/1996 (BRASIL, 1996) conhecida como Lei Kandir, que dispõe sobre o ICMS e, dentre os assuntos tratados nesta, o que mais se destaca é a desoneração do referido imposto dos produtos (primários ou industrializados semielaborados) e serviços destinados à exportação. Uma forma de incentivo fiscal para estimular os setores produtivos voltados à exportação, com o objetivo de oportunizar os produtos nacionais a ganhar competitividade no mercado externo e favorecer o saldo da balança comercial. Por se tratar de uma lei genérica, sua incidência ocorre de forma homogênea, independente de qual seja a região.

4 ASPECTOS METODOLÓGICOS A alternativa selecionada para a identificação dos espaços especializados na produção de soja é a utilização de metodologias de localização espacial empregadas em análises de economia regional. Especificamente para este estudo, primou-se pela estimativa do Índice de Concentração Normalizado (ICN), que possibilita a identificação dos municípios especializados na Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

produção de soja em todo o estado (CROCCO, 2003). A referida metodologia utiliza-se da ponderação de três índices relacionados ao grau de especialização, a comparação da produção municipal em relação à produção estadual ponderada pela estrutura produtiva dividida pela estrutura produtivas do estado, além da captação da importância da produção municipal em relação à estadual. 93

O ICN é uma média ponderada entre o Quociente Locacional (QL), o Índice de HirschmanHerfindahl (IHH) e o Índice de Participação Relativa (PR), em que o peso de cada indicador é calculado com base na análise de componentes principais. De acordo com Santana (2004), a primeira característica é determinada pelo QL, que permite identificar o nível de especialização de certa atividade no município em questão:

O numerador apresenta os dados referentes ao município, em que o Eij corresponde ao valor da produção/ICMS/emprego de soja no município j e o Ej representa o valor da produção/ ICMS/emprego de todas as atividades que constam no município j. No denominador estão representados os dados de Mato Grosso, em que o EiA mostra o total da produção/ICMS/emprego da soja no Estado e o EA representa o valor total da produção/ICMS/emprego de todas as atividades que constam no referido Estado. Cabe ressaltar, de acordo com Crocco (2003), que um QL > 1 apenas indicar uma diferenciação produtiva da atividade, pois podem haver assimetrias entre os municípios da região, além da alta representatividade de uma empresa no município. Para atenuar problemas desta natureza integra-se ao cálculo do ICN o IHH:

poder de atração econômica, devido ao seu nível de especialização (SANTANA, 2004). O terceiro componente do ICN, denominado Índice de Participação Relativa, capta a importância da atividade i do município j no total representado pela atividade i em Mato Grosso:

Este indicador deve variar entre zero e um; quanto mais próximo de um, maior a representatividade da atividade em Mato Grosso. Estes três indicadores subsidiarão a composição do ICN:

Os pesos θ para cada um dos indicadores foram determinados pelo método de análise de componentes principais, em que a matriz de correlações revela a proporção da variância da dispersão total da nuvem de dados gerada, representativa dos atributos de aglomeração, que é explicado por esses três indicadores (SANTANA, 2004). Tal análise obtém a partir das variáveis do modelo (QL, IHH, PR) a sua combinação linear, produzindo para cada um dos 141 municípios os componentes:

em que os ai serão os pesos para os i municípios que variam sujeitos à condição:

O IHH permite comparar o peso da atividade i do município j no setor i de Mato Grosso em relação ao peso da estrutura produtiva do município j na estrutura do estado. Se o valor for positivo, a atividade i do município j no estado está mais concentrada neste local, tendo maior Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

Para obter as variâncias associadas a cada componente e os coeficientes das combinações lineares a técnica dos componentes principais emprega a matriz de covariância das variáveis, obtidas por meio do software estatístico SPSS. 94

As variâncias dos componentes principais são os autovalores desta matriz, enquanto os três coeficientes ai1, ai2 e ai3 são os seus autovetores associados. Mais detalhes acerca da parte econométrica do modelo podem ser obtidas em Crocco (2003) e Santana (2004). Para o cálculo do ICN empregado foi considerado o valor da produção de soja dos

municípios, disponível no site do IBGE (2010), assim como o Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios e de Mato Grosso. Ainda, para o emprego utilizou-se dados da Relação de Informações Sociais (RAIS) e para o ICMS foram usados de arrecadação da Secretaria de Estado de Fazenda de Mato Grosso (SEFAZ), todas as três fontes referentes ao ano de 2009, para cada município, além do total estadual.

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS Com a normalização das cargas, por meio da técnica de componentes principais, os resultados obtidos apresentam uma estrutura ponderada de indicadores de renda, emprego e arrecadação de ICMS. Como se esperava, devido ao crescimento linear e constante da produção mato-grossense, o indicador representativo da renda mostrou-se estável (Gráficos 1 e 2), sem oscilações consideráveis, para os municípios que apresentam especialização na produção de soja. Considerando que o emprego e o ICMS derivam da renda gerada pela atividade, pode-se confirmar essa variável como referência e projetar alguns cenários para correlacioná-las. Devido ao fato da produção de soja difundir-se por praticamente todos os municípios de Mato Grosso, houve o registro de um significativo número daqueles especializados, tornando-se necessário, para efeitos de plotagem, a divisão em dois grupos. Um gráfico foi elaborado considerando os que apresentam, pelo menos, dois indicadores de especialização dentre os três estimados (Gráfico 1) e outro que considera, apenas, um indicador (Gráfico 2). De acordo com os indicadores plotados no Gráfico 1, identificam-se alguns picos nos municípios de Bom Jesus do Araguaia, Santo

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Antônio do Leste e São José do Povo, em que a especialização decorrente da variável emprego destoa da renda (produção - PIB). Isso pode estar acontecendo em função do registro equivocado de trabalhadores de municípios vizinhos, ou a atividade não acompanha o mesmo nível tecnológico dos outros. Santo Antônio do Leste, também, destoa nas mesmas proporções na arrecadação de impostos, mesma disfunção registrada em General Carneiro, Novo São Joaquim, Campos de Júlio e Dom Aquino. Nestes casos, também pode estar ocorrendo erro no registro, ou o sistema de fiscalização pode ser mais eficiente nestes municípios. O fato é que problemas desta natureza não prejudicam a socioeconomia destes municípios, apenas indicam que o sistema é falho. Por outro lado, a arrecadação de ICMS apresenta especialização que destoa da renda nos municípios de Gaúcha do Norte, Porto Estrela, Nova Nazaré e São José do Povo, com variação contrária, entretanto, acentuada nos dois últimos. Há complicações pertinentes em relação a esta disfunção, como por exemplo, alguma incorreção no registro das informações ou no sistema de arrecadação, ou mesmo a falta deste registro, o que pode resultar em sonegação de impostos.

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Gráfico 1 - ICN da soja em Mato Grosso, 2009.

Fonte: elaborado pelo autor com dados do IBGE, RAIS, SEFAZ-MT, 2009.

Seja qual for a interpretação, existe alguma incoerência nestes espaços. Independente do que está ocorrendo, já se pode observar um problema para estes municípios: ao deixar de efetuar o registro, significa que está sendo ocultada parcela do valor adicionado da produção (ou pode estar sendo recolhido em outro município), com o recolhimento de um montante menor de impostos. A principal consequência é o impacto sobre o Índice de Participação dos Municípios (IPM), que tende a diminuir, impactando negativamente no rateio da parcela de ICMS que cabe aos mesmos. Este comportamento não ocorre com o emprego como pode ser observado no Gráfico 1,

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significando que a formalização deste ocorre de forma coerente naqueles municípios os quais possuem mais de uma especialização. É interessante observar que esse comportamento também ocorre nos demais municípios com uma especialização (Gráfico 2). De modo geral, a variável emprego apresenta alguns picos na especialização, o que reflete apenas alguma disfunção no sistema, mas que por apresentarse sempre acompanhando ou acima da renda, indicando não haver informalização na atividade em nenhum dos espaços especializados ou que, pelo menos, é minimamente constante e não representativa. Cabe ressaltar que esse indicador não reflete a intensidade do uso da mão de obra, mas sim, esta se mantém coerente em todos os espaços.

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Gráfico 2 - ICN da soja em Mato Grosso, 2009.

Fonte: elaborado pelo autor com dados do IBGE, RAIS e SEFAZ-MT, 2009.

A especialização, também, apresenta alguns picos na arrecadação de ICMS, assim como foi registrado nos municípios com mais de uma especialização. Com os mais significativos identificam-se os de Alto Araguaia e Santa Rita do Trivelato, seguido de Nova Ubiratã, Pedra Preta, Primavera do Leste, Rondonópolis, Sapezal, Tabaporã e Tesouro, entretanto, com menor intensidade. A interpretação segue na mesma coerência, ou seja, que está ocorrendo o registro incorreto de ICMS nestes espaços, os quais não são oriundos dos mesmos, tendo em vista que destoa da especialização decorrente renda. Isso é reconfortante para estes municípios que estarão recebendo uma fatia maior deste imposto, contudo, à custa de outros que estão perdendo.

Entretanto, assim como nos municípios com duas especializações, existem outros onde esse indicador do ICMS não acompanha ou supera o da renda. Em Nova Xavantina, Reserva do Cabaçal, Rosário Oeste, São José dos Quatro Marcos, Tangará da Serra e Vila Bela da Santíssima Trindade a especialização da arrecadação destoa da renda, indicando que o registro de ICMS apresenta alguma disfunção. As consequências são as mesmas apresentadas para o outro grupo de municípios, ou seja, há falhas no sistema, ao permitir que o ICMS não seja registrado na devida região de produção, a qual será privada de parcela que lhe cabe do repasse deste imposto.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS A metodologia aplicada revelou que o sistema de registro de emprego e o de controle da arrecadação não atinge a eficiência desejada. Contudo, não foram apresentadas anomalias significativas relativas ao setor Amazônia: Ci. & Desenv., Belém, v. 7, n. 14, jan./jun. 2012.

produtivo da soja. Cabe destacar, apenas, alguns problemas de ordem local, para aqueles municípios em que o registro da comercialização da produção não é contemplado em sua plenitude. 97

O fato da especialização do emprego, na maioria dos casos ser superior a da produção apenas atesta que aquele gerado pela atividade é coerentemente formalizado. Somente quando isso deixa de ocorrer é que há uma preocupação com a possibilidade da existência de informalidade na atividade, fato não identificado de forma contundente em nenhum município. Apenas Tangará da Serra ficou, relativamente, aquém do desejável. No caso do ICMS, foram identificados alguns municípios cujo indicador de especialização na arrecadação apresentou situações contrárias ao da produção, sendo, em alguns casos, consideravelmente inferior. Por se tratar de uma parcela fixa deste mesmo produto, com percentual idêntico para todas as regiões, a situação aponta para alguma disfunção no sistema de arrecadação, pois se está permitindo que este imposto não seja registrado em sua plenitude no local de origem. O principal problema é a consequência disso para estes municípios, pois implicará em diminuição do seu IPM, acarretando em perda de receita, decorrente da diminuição do repasse do ICMS. Contudo, o oposto, da mesma forma ocorrida para atividade, não é desejável para o

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Estado, pois o fato do registro de ICMS acima do que deveria ocorrer implica em apropriação de imposto indevido que deveria ser registrado em outros municípios, que serão penalizados na hora de receber o repasse. Caso isso ocorra em um espaço ao entorno de uma região concentradora, a consolidação desta redistribuição de renda pode favorecer a relação centro-periferia, apoiada pelo sistema. Em caso de consolidação de centros é possível que essas relações sejam ainda fortalecidas com essa disfunção na arrecadação. Aos olhos da análise regional, trata-se de um fator trivial, que terá significativa importância na condução do desenvolvimento nesses espaços. Com o passar do tempo e a capacidade das forças centrípetas, podem surgir polos de desenvolvimento e novos centros nessa mesma periferia. Para se saber exatamente os fatos responsáveis pelas disfunções são necessários que ocorra um estudo específico nestes municípios. Um fator de relevante importância tendo em vista que os recursos redistribuídos não são suficientes para atender a demanda dos mesmos.

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REFERÊNCIAS

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