“Antropofagia. Único sistema capaz de resistir quando acabar no mundo a tinta de escrever”

June 23, 2017 | Autor: Alexandre Nodari | Categoria: Antropofagia Brasil
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“Antropofagia. Único sistema capaz de resistir quando acabar no mundo a tinta de escrever”1 Alexandre Nodari (UFPR/species)

A Marco Antonio Valentim, por me chamar a atenção para a aranha metafísica que paira sobre nossas cabeças “A rede é um modo de ser. (...) A bem dizer, chovem redes aos borbotões, e parece que essa proliferação de redes atinge seu ápice nos momentos em que os acontecimentos históricos (...) são intoleráveis; e, verdade seja dita, nessa sua propensão para serem intoleráveis os acontecimentos históricos são talentosos. (...) Se eu quisesse indicar uma das constantes da rede, incluiria esse fora como uma das dimensões necessárias. Assim, e quando o espaço se torna concentracionário, a formação de uma rede cria uma espécie de fora que permite ao humano sobreviver.” (Fernand Deligny, O aracniano)

1. Em um romance de terror recente, Samanta Schweblin (2016) apresenta uma versão distópica do presente. Situada no campo argentino, a ficção ecoa, de modo inquietantemente familiar, quase qualquer zona rural do mundo padronizado: um ambiente dominado por plantações de soja a perder de vista, com o solo e a água envenenados pelos agrotóxicos, e – eis um dos elementos que hiperbolizam a atualidade, mostrando sua face monstruosa – crianças deformadas por tais “defensivos químicos”. O título do livro, Distância de resgate, é a forma como a narradora e protagonista se refere a uma espécie de princípio da precaução materno: “Sempre penso no pior. Agora mesmo estou calculando quanto demoraria para sair correndo do carro e chegar até Nina [sua filha], se ela corresse de repente para a piscina e se atirasse. A isso dou o nome de ‘distância de resgate’, que é como chamo a distância variável que me separa de minha filha, e passo a metade do dia fazendo esse cálculo, embora sempre arrisque mais do que deveria” (p.22). Descrita como um “fio invisível” que se tensiona e se estira fazendo-se sentir no corpo2, a distância de resgate que liga a filha à mãe parece operar como metonímia para algo como uma tessitura entre as pessoas e entre elas e as coisas, que deve ser constantemente (re-)tramada para que o mundo não se desfaça. Assim, próximo

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Versão para publicação de texto apresentado no Simpósio Haroldo de Campos 2015 (setembro, São Paulo). A citação que intitula esse texto foi extraída de “antropofagia e cultura”, de Oswald de Andrade, publicado em 15 de maio de 1929, na segunda dentição da Revista de Antropofagia. Todas as citações não referenciadas dos antropófagos foram extraídas da edição facsimiliar da Revista, referida na bibliografia. 2 “O fio está tão curto que mal consigo me mover no quarto” (p. 63); “O fio está tão tenso que o sinto sendo puxado do estômago” (p. 73); “É como se amarrasse o estômago a partir de fora. Aperta o estômago” (p. 133); “Alguma coisa está puxando o fio com mais força e as voltas diminuem de tamanho. O fio vai partir meu estômago” (p. 134).

2 do fim da narrativa, nos deparamos com um cômodo em que fotos e outros objetos estão bizarramente ligados uns aos outros por um fio: “Um único prego sustenta tudo, cada foto pende da de cima, amarrada com o mesmo fio de sisal. (...) muitas coisas mais estão penduradas com fio de sisal, ou amarradas umas às outras. (...) Não parece uma quantidade desproporcional de coisas, mais parece que, à sua maneira, você esteve tentando dar um jeito no estado deplorável da casa e em tudo que há nela” (p. 138, 140). O romance trata do rompimento desses fios – metonímia de todos os fios –, que se convertem em rastros de pólvora prestes a consumir tudo aquilo que antes uniam. Desse modo, a ficção não isola o “terror” lá fora, no campo, para além dos limites das homogeneizadas cidades globais; pelo contrário, ela entrelaça, pelo horror, ambos os espaços, como lemos nas linhas finais, nas quais o marido da protagonista foge da zona rural, mas não do perigo:

Não para no povoado. Não olha para trás. Não vê os campos de soja, os riachos entretecendo as terras secas, os quilômetros de campo aberto sem gado, as vilas e as fábricas chegando à cidade. Não repara que a viagem de volta foi se tornando cada vez mais lenta. Que há carros demais, carros e mais carros cobrindo cada nervura de asfalto. E que o trânsito está parado, paralisado há horas, fumegando efervescente. Não vê o importante: o fio finalmente solto, como um pavio aceso em algum lugar; a praga imóvel prestes a irritar-se. (p. 142-3)

O romance termina justamente aqui, ou seja, em nosso presente à beira de uma catástrofe ambiental, que, porém, já está em curso desde o rompimento da trama de fios invisíveis.

2. Talvez possamos descrever o projeto motor da modernidade, o des-envolvimento, como o rompimento dessa tessitura invisível, insubstancial, ou seja, que não constitui um ser, mas está entre os seres, que os correlaciona: o inter-esse. Nesse sentido, a modernidade não seria só um processo de desencantamento do mundo, como o formulou Max Weber, mas também um processo de des-interessamento do homem em relação ao mundo. Nela, o mundo se torna um objeto externo e disponível, matéria morta separada do homem, que, por sua vez, se converte em um sujeito autônomo e individual. Entre ambos, parece não haver mais um laço, uma relação, mas apenas domínio, sujeição, propriedade. Fechado em si mesmo, o autossuficiente sujeito humano, o homo autotelus, acredita dispor das coisas do mundo, inclusive outros humanos, como se fossem seus objetos, como se seu agir sobre o mundo não implicasse uma reação.3 Tal processo não 3

Desenvolvi esse ponto um pouco mais detidamente em Nodari, 2013. Sobre o mito kantiano do homo autotelus, cf. Buck-Morss, 1996.

3 poupou nem mesmo os sentidos, com a tentativa de submissão da arte àquilo que Kant chamou de “prazer desinteressado”. Mas o des-interessamento não des-envolve completamente o Humano da Terra: como mostra Distância de resgate, o entrelaçamento na forma de uma fina teia delicada e invisível dá lugar a uma re-implicação do homem no mundo por meio da catástrofe e do horror: o fio se torna um pavio prestes a incandescer. A isso – à destruição das “nuanças que constituem essa espécie de líquido intersticial” das sociedades humanas, desse espaço intermédio responsável pela “circulação vital” – Araripe Jr. (1891:19) chamou de “Terror”, de modo que talvez possamos dizer que o Terror político e ecológico, a catástrofe social e ambiental, seja a destruição do que estamos nomeando como interesse. E frente ao Terror, a única alternativa parece ser aquilo que Ailton Krenak chamou de “cuidado com o mundo”, fórmula que deve ser tomada em seu duplo sentido: é preciso cuidar do mundo, que é frágil, assim como é preciso tomar cuidado com o mundo, que é igualmente perigoso. Ou seja, precisamos constituir novamente um espaço intersticial, a trama invisível que liga e separa os seres, para que eles não entrem em rota de colisão fatal. O re-envolvimento cosmpolítico (Viveiros de Castro, 2011) constitui, assim, também um re-interessamento do mundo. E nossa hipótese aqui é a de que a Antropofagia talvez seja um de seus nomes. 3. Se o horizonte em que Haroldo de Campos (1997) postulou a idéia de uma “poesia pósutópica” era o da “crise dos grandes relatos” (Lyotard, 1990), talvez se possa dizer que o Antropoceno, a atual era geológica da Terra, em que história humana e história natural se confundem4, seja uma crise do grande Relator, o “Homem”, e de seus avatares – a “civilização”, a idéia de Universal, a suposta relação especial do homem com a linguagem e o mundo, etc. Ou seja, não se trata mais apenas de uma crise do humanismo, mas de uma crise do Humano. Contudo, em que sentido a Antropofagia pode ser vista como uma estratégia diante dessa crise civilizacional da espécie e ambiental do mundo, como sugerimos? De que modo ela pode se configurar como uma práxis do interesse, uma ação ao mesmo tempo interessada e interessante? Em vários textos, os integrantes da Antropofagia a definiam como um movimento anti-civilizacional: “Todas as nossas reformas, todas as nossas reações costumam ser dentro do bonde da civilização. Precisamos saltar do bonde, precisamos queimar o bonde”; “Se enganam os que pensam que somos contra somente os abusos da civilização 4

Cf. Chakrabarty, 2013. Estou me fiando, no que diz respeito à catástrofe ambiental, na recente obra de Danowski e Viveiros de Castro, 2014 – de cuja perspectiva sou muito devedor.

4 ocidental. Nós somos é contra os usos dela.” Nesse sentido, um dos alvos do movimento era justamente o símbolo do afã civilizatório colonialista, o Humano, ou melhor, as suas declinações ocidentais e etnocêntricas, encarnadas, entre outras, nas figuras do Espírito (“O espírito se recusa a conceber o espírito sem o corpo”), e da roupa (“O que atropelava a verdade era a roupa, o impermeável entre o mundo interior e o mundo exterior”), metáforas do isolamento do homem em relação ao mundo. Contra o “homem vestido”, os antropófagos reivindicavam o “homem nu”, o “homem natural”, o “homem biológico”, o “animal humano”. Todavia, deve-se ter o cuidado de não tomar tais figuras conceituais como índices de uma identidade natural prévia, de uma estabilidade instintual ou de um determinismo biológico. Pelo contrário, a nudez ou naturalidade se apresentavam não como uma determinação, uma redução de possibilidades, e sim como a sua multiplicação: “Contra o homem artificial – burro e cacete – o homem natural. Contra o animal que se veste, o animal que se enfeita”. Livrar-se da roupa implicava, assim, poder usar muitas e distintas roupas; afinal, como dirá anos mais tarde Gilberto Gil psicografado por Rogério Duarte, “A nudez é a soma de todas as roupas”.5 Nesse sentido, a “animalização” proposta não configurava um retorno a um suposto estágio de estabilidade: “Antropofagia é simplesmente a ida (não o regresso) ao homem natural”; “O que se quer é simplicidade e não um novo código de simplicidade. Naturalidade, não manuais de bom tom”. Temos, assim, que evitar dois erros na hora de ler tais notas “naturalizantes” ou “biologicizantes” da Antropofagia. O primeiro consiste em ver tais referências como se fossem do mesmo tipo determinista que a maioria das feitas pela geração anterior às vanguardas (o próprio Araripe Jr., já citado, seria um exemplo); o segundo, em olhá-las pelas lentes da vulgata contemporânea da biogenética, com suas terapias gênicas e transgenias, baseadas na crença do poder hiperdeterminante dos genes – que é, não custa salientar, uma crença no poder hiperdeterminante da escrita enquanto inscrição conformadora, que dá forma à matéria (no princípio era o verbo e no princípio está a sequência genética são

Vale a pena citar o trecho inteiro (que consta no LP “Gilberto Gil”, de 1968): “Eu sempre estive nu. Na Academia de Acordeão Regina tocando La Cumparsita, eu estava nu. Eu só sabia que estava nu, e ao lado ficava o camarim cheio de roupas coloridas, roupas de astronauta, pirata, guerrilheiro. E eu, do mais pobre da minha nudez, queria vestir todas. Todas, para não trair minha nudez. Mas eles gostam de uniformes, admitiriam até a minha nudez, contanto que depois pudessem me esfolar e estender a minha pele no meio da praça como se fosse uma bandeira, um guarda-chuva contra o amor, contra os Beatles, contra os Mutantes. Não há guarda-chuva contra Caetano Veloso, Guilherme Araújo, Rogério Duarte, Rogério Duprat, Dirceu, Torquato Neto, Gilberto Gil, contra o câncer, contra a nudez. Eu sempre estive nu. Minha nudez Raios X varava os zuartes, as camisas listradas. E esta vida não está sopa e eu pergunto: com que roupa eu vou pro samba que você me convidou? Qual a fantasia que eles vão me pedir que eu vista para tolerar meu corpo nu? Vou andar até explodir colorido. O negro é a soma de todas as cores. A nudez é a soma de todas as roupas.” 5

5 formulações homólogas). A esta vulgata, talvez os antropófagos respondessem que o que interessa é o que está entre os genes, o que os liga e os afasta, e o que está entre eles e o mundo, a inter-ação entre ambos. Nesse sentido, a tentativa de despir a figura ocidental do homem de sua ipseidade e da ilusão do “auto-interesse” narcisista acarretava um questionamento das fronteiras (entre espécies, entre natureza e cultura – fronteiras simbolizadas pela roupa) e não a simples passagem ao lado de lá: tratava-se de deslocar a identidade do humano, de buscar uma não-coincidência do humano consigo mesma, abrindo-o a exterioridade (a “exogamia” dos antropófagos) por meio de uma outra imagem da natureza (animalidade), da cultura (humanidade) e de sua relação. Tentaremos demonstrar isso por meio de dois exemplos, para depois, partindo deles, repensar as possibilidades abertas pela Antropofagia diante do cenário atual de crise.

4. O primeiro deles é a bem conhecida versão anedótica da origem do movimento antropófago divulgada por Raul Bopp (2008:57-58):

Uma noite, Tarsila e Oswald resolveram levar um grupo de amigos, que frequentavam sua casa, a um restaurante situado nas bandas de Santa Ana. Especialidade: rãs. (...) Quando, entre aplausos, chegou o prato com a esperada iguaria, Oswald levantou-se, começou a fazer o elogio da rã, explicando, com uma alta percentagem de burla, a doutrina da evolução das espécies. Citou autores imaginários, os ovistas holandeses, a teoria dos homúnculos, para provar que a linha da evolução biológica do homem, na sua longa fase pré-antropóide, passava pela rã — essa mesma rã que estávamos saboreando (...). Tarsila interveio: – Com esse argumento, chega-se teoricamente à conclusão de que estamos sendo agora uns... quase-antropófagos.6 6

Fernando Scheibe me alertou que o discurso de Oswald contém também uma possível remissão a JeanPierre Brisset, para quem os homens descendiam das rãs – o que ele sustentava, entre outros, por uma amalucada análise linguística. A referência foi apontada diversas vezes por Wilson Martins, como em um artigo de 1992, recolhido em Eulalio (2001:490-500), no qual aparece citado um trecho de Brisset: “As rãs perderam a faculdade de se transformar, mas permanecem até hoje para testemunhar, pela sua forma graciosa, e seu canto tão semelhante à voz humana, assim como sua inteligência, que o Todo-Poderoso serviu-se da sua criação para a do homem (...) Os gritos da rã são a origem da linguagem humana (...) O som da voz e a modulação do canto da rã já têm qualquer coisa de humano. Seus olhos, seu olhar, alguns tics da face são semelhantes aos nossos; e do calcanhar ao pescoço nenhum animal possui uma graça corporal que tanto o aproxime do corpo humano” (p. 498). Cabe mencionar ainda que Brisset foi seguidamente reivindicado pelos patafísicos, surrealistas, e mais recentemente recebeu a atenção de Michel Foucault, que reeditou o seu La grammaire logique, com um prefácio (coligido em Foucault (2006:299312)), e sobre ele escreveu, em “A linguagem enlouquecida”: “Para dizer a verdade, acho que o maior desses místicos da linguagem não pertence ao século XVIII, mas está bem mais próximo de nós. Era um simples professor de gramática francesa que viveu no fim do século XIX. Chamava-se Jean-Pierre Brisset. Era conhecido como um doido varrido e foi reconhecido por André Breton. Em quatro livros, desenvolveu um prodigioso delírio etimológico que vai do coaxar das rãs, nossas ancestrais, aos ecos mais perturbadores, mais inquietantes, e em certo sentido também mais naturais de nossa linguagem presente. Sacudindo as palavras como uma matraca obstinada, repetindo-as em todos os sentidos, arrancando-lhes harmônicas irrisórias, mas decisivas também, fez nascer delas, por uma espécie de dilatação monstruosa, fábulas; fábulas em que se resume toda a história dos homens e dos deuses, como se o mundo desde sua criação não

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Menos conhecida que a burla oswaldiana sobre a evolução é a seriedade escondida por trás dela. Anos mais tarde, quando tenta formular filosoficamente as teses antropófagas em A crise da filosofia messiânica, Oswald de Andrade (2011:147-149) resgata a teoria dos homúnculos e dá nome àquele que Bopp acreditava ser um dos “autores imaginários”, Edgard Dacqué:

Antes de continuar a história do homem vestido, vejamos por um instante o que é o homem. O Evolucionismo de Darwin, se bem que forme na base do conhecimento biológico atual, deixou brecha aberta a outras divagações e pesquisas sobre a origem das espécies. Uma intervenção espetacular no campo do Evolucionismo veio constituir a de Edgard Dacqué, cujo valor cultural enciclopédico se enriquece de uma imaginação poética sem par. Segundo as suas concepções, não é difícil chegar-se à teoria do homem pré-estrelar. Coincidência curiosa com a tese da célula hereditária, da matéria sutil e eterna de Mendel e outros biólogos atuais. Desse modo, no correr das transformações dos seres, o homem teria sido molusco, peixe, sáurio, ave e mamífero. E dele teriam derivado, como colaterais, os tipos fixados dessas espécies. Que teria ocorrido no seio do oligoceno ao sol novo prenunciador do quaternário, quando o homem já tendo assumido a dignidade do ereto, na forma do primata, assistiu à morte dos grandes mamíferos, às transformações gigantescas da flora e à repartição diluvial dos continentes e dos mares? Aí, por adaptações lamarckianas, ter-se-iam repartido os colaterais já em alta evolução, em hominídeos, fósseis improdutivos, larvas coiteiras de formas perdidas e ele então, o antropopiteco, teria instalado o Reino do Macaco por toda a extensão viável de sua marcha em busca de sua fixação. Seria a promiscuidade heteróclita, onde se podia colocar o aparecimento do homúnculo de Bolk. Este sábio anatomista holandês proclama que o homem é a fetalização do macaco. E nada impede que se adapte ao folhetim da vida que submete a matéria criadora de Paracelso às aventuras estruturais de Dacqué, esse “feto do macaco” que teria, enfim, realizado no Homo sapiens o seu fim de linha, pois não é evolução e sim regressão. Não por ser o feto de Bolk, mas o simples produto do cruzamento de uma espécie superior – o antropopiteco – com as larvas hominídeas onde se acentuariam as marcações de cada arcano ancestral. E o homem de cara íctia, como o homem-ave e o batráquio, seriam a réplica de seus arquétipos perdidos na fixação dos colaterais de Dacqué. Ter-se-ia, portanto, assistido por toda a terra habitável, a um funambulesco Reino do Macaco. Na promiscuidade estabelecida entre o antropopiteco e essas sombras da espécie humana, qual seria o enxerto, o cavalo? Se conservarmos, numa marcada biotipologia, os traços da evolução de Dacqué, é certo que numa confirmação paralela há muito de humano em cada espécie de animal. O papagaio fala, a abelha se organiza em sociedade obreira como a térmita, o pavão confirma Freud, a formiga economiza e o tangará dança. Campo para polêmica e para pesquisa fica o romance biológico que desenvolvemos da teoria de Dacqué, juntando-se agora à de Bolk, não menos surpreendente e fabuloso do que foi A origem das espécies, de Darwin, no seu início. Poder-se-ia talvez fixar através da iconografia histórica, das artes e mesmo da fotografia,

fosse mais que um gigantesco jogo de palavras, um jogo de contas de vidro que obedecesse às leis mais gratuitas, porém mais imperiosas” (Foucault, 2016).

7 quanto o homem de certa época ou de certa civilização e até quando, reproduziu a sua origem felina, íctia ou porcina. Não é inoportuno criar-se uma Dacquéana e levá-la às suas últimas consequências antropológicas e culturais. Seria aceitar o ponto de vista do primitivo que se identificava com o totem.

Tentemos destrinchar a passagem citada. Edgard Dacqué (1929:231) era adepto de uma estranha forma de criacionismo, segundo a qual uma Ur-forma humana havia sido intencionada por Deus e atravessado todas as espécies até chegar a sua forma atual: “A proto-forma [Urform] humana estava presente metafisicamente, i.e., por Deus ‘intencionada’, já no reino orgânico, quando num período primitivo as primeiras criaturas se manifestaram. Humanos, embora tendo aparecido no tempo como seres humanos completos somente no último período glacial, estavam lá, contudo, já em todos os organismos incontáveis milhões de anos atrás”. Na versão oswaldiana, que cruza Dacqué com Bolk, essa proto-forma teria sua manifestação nas “larvas hominídeas”, a primeira forma de vida, capazes de se acasalarem com outras formas, verdadeiras “larvas coiteiras”, que se diferenciaram de acordo com o ambiente e acasalaram-se apesar dessas distinções, resultando, por fim, em sua forma atual, o homo sapiens. Esse seria o resultado do cruzamento do antropopiteco com “larvas hominídeas” presentes em outras espécies, derivando daí as semelhanças “totêmicas” entre certos homens e animais – a miscigenação tornaria “menos característico ou menos acentuado o tipo originário das espécies de que derivamos” (Andrade, 2011:149). Não se trata, aqui, somente de biologia, mas também de uma cosmologia poética, algo sublinhado por outro interessado no pensamento de Dacqué, Walter Benjamin (s/d:534), após assistir a uma conferência daquele: “Todos os ouvintes entenderam que a palestra não tratou somente de assuntos biológicos. A biologia de Dacqué rompe com o Darwinismo. Além disso, contudo, constrói uma série de estranhas conexões com a mitologia, a Metafísica e a antropologia filosófica”. E a metafísica ou mitologia em jogo parece se conectar àquele “Antropomorfismo” apregoado no Manifesto, consistindo em uma espécie de protoantropomorfismo dos animais, o qual tornaria possível, por sua vez, o teriomorfismo atual dos humanos: uma outra lógica da identidade, das identificações, daquilo que é específico e especial, afastada tanto do evolucionismo quanto do humanismo. Pois, como lembra Agamben (2002:33), Lineu, na sua taxonomia, incapaz de achar um critério biológico capaz de distinguir o homem do macaco, elenca como differentia specifica do humano a fórmula “Nosce te ipsum”: o homem é aquele que é capaz de se reconhecer como tal, de reconhecer a sua humanidade, de reconhecer a sua imagem no espelho (o campo

8 semântico de species abarca imagem, semelhança, espelho, etc.). Já na definição oswaldiana, seria possível, ao contrário, reconhecer a humanidade de qualquer animal e também o parentesco de qualquer homem com seu antecessor animal (a identificação totêmica), caindo por terra, assim, a ipseidade da definição evolucio-humanista: como no conto “O espelho” de Guimarães Rosa, a primeira coisa que o homem veria no espelho seria o seu aspecto animal, produzindo o estranhamento e não o reconhecimento da imagem do humano (“Parecer-se cada um de nós com determinado bicho, relembrar seu facies, é fato (...) Meu sósia inferior na escala era, porém — a onça.”). No limite, portanto, seguindo o argumento de Oswald, qualquer espécie que comamos faz de nós “quaseantropófagos”, como-canibais – e é curioso que, ao menos nessa versão mítico-anedótica relatada por Bopp, a Antropofagia surja referida à devoração de um animal em tese nãohumano. Mas o “Antropomorfismo” de que fala o Manifesto remete também a cosmologias ameríndias, mais especificamente à condição subjetiva plena que muitas destas atribuem a potencialmente todos os seres no tempo mítico, de modo que a teoria dacqueana e aquilo que Tânia Stolze Lima e Eduardo Viveiros de Castros chamaram de “perspectivismo ameríndio” parecem entrar em ressonância, formando uma “metáfora lancinante”. Não por acaso, um dos mitos mais apreciados pelos antropófagos era o tupi amazônico referente à origem da noite, pois o mito começa justamente afirmando a condição antropomórfica originária: “No princípio não havia noite – dia somente havia em todo tempo. A noite estava adormecida no fundo das águas. Não havia animais; todas as coisas falavam” (Couto de Magalhães, 1935:172).7 Bopp publicou uma reescritura desse mito na Revista de Antropofagia, batizando-o de Yperungaua (a primeira palavra tupi do relato, traduzida por “princípio” ou “antigamente” – o “tempo não-datado” de que fala o Manifesto). O Yperungaua, bem como a referência a Dacqué, revelam que a temática antropófaga da naturalização da cultura, ou seja, da animalização do homem, implicava a culturalização da natureza e a hominização do animal – melhor dizendo, implicava uma zona de contato, de inter-esse entre ambos. Talvez seja por isso que Oswald tenha contraposto a figura do homem vestido ao mito tupi, ou seja, contraposto a civilização ocidental a um contato não só com a terra, mas com uma Terra entrelaçada a um subsolo cultural, mítico: “o índio despido é a imagem decisiva do ingênuo, do sincero, do

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Cf. Lévi-Strauss, 2004:391ss para uma análise desse mito e para a diferenciação entre culturalização da natureza e naturalização da cultura (que, no plano mítico, aparecem nas respectivas formas de ausência originária da noite e do dia).

9 realmente justo. É a expulsão de todos os adornos que sobravam. E que, por isso mesmo, não fazem falta. É a fisionomia que se caracteriza por si mesma. Agressiva. Bárbara. Como a própria terra. Mas a terra boiando nas lendas da cobra grande e ainda com aquele imaginário fio umbilical que prendia ao yperungaua que é o princípio mais longe de todas as coisas”. 5. O segundo exemplo de “homem biológico” dos antropófagos que invocaremos aparece em um texto anônimo publicado no Diário da Manhã do Espírito Santo, em 18 de agosto de 1929. Intitulado “A descida antropofágica”, ali encontramos, após a constatação d’“A falência do continente europeu e [d]a reabilitação do indivíduo biológico”, a adesão “às sugestões de Uexküll para uma nova concepção biológica das sociedades humanas”.8 Provavelmente, essa seja a única referência dos antropófagos a Jakob von Uexküll, tido como um dos fundadores da moderna ecologia, e mais conhecido pelo seu conceito de Umwelt. Geralmente vertido como “mundo-próprio”, o termo talvez se traduza melhor por “mundo-ao-redor”, o mundo que cada espécie ou mesmo indivíduo forma, configura, tece: “Cada sujeito fia as suas correlações como os fios de uma aranha, relativamente a determinadas propriedades das coisas, e tece-as numa sólida teia que suporta a sua existência” (Uexküll, s/d:42). Detenhamo-nos na formulação, de surpreendente teor antropófago, para tentar compreendê-la melhor. Em primeiro lugar, nela, a posição da subjetividade (ou da cultura) coincide com a condição vital, o que quer dizer que todo ser vivo tece o seu Umwelt: “cada ser vivo é um sujeito, que vive num mundo que lhe é particular, de que ele constitui o centro” (ibid.:31). E na medida em que é o sujeito quem fia seu ambiente existencial, armando uma teia de sentido, a objetividade não é um dado fixo: as “coisas” de que fala o biólogo, e de cujas propriedades os sujeitos se apropriam para formar seu mundo, variam de acordo com sua relação com o ser vivo, ou seja, de acordo com a significação que adquirem nessa relação, de modo que até mesmo objetos imaginários podem ter significação e compor um mundo. O sujeito não constitui seu mundo a partir de objetos dados a priori, mas de significantes que determinam a sua natureza. A isso, o biólogo chamou de “a inconstância dos objectos, que dentro de cada mundo-próprio, mudam também de conformação, sempre que mudam de significado” (ibid.:212; grifo nosso). Tal variação dos objetos, acrescente-se, não diz respeito apenas

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Uma transcrição desse e de outros textos pouco conhecidos dos antropófagos aparecerá em breve na revista species – revista de antropologia especulativa.

10 àquilo que é acidental neles, mas a sua própria essência9: “Nem uma única propriedade da matéria se conserva a mesma quando percorremos a série de mundos-próprios das diferentes espécies”, afirma Uexküll. “De mundo para mundo”, continua, “em cada um dos objectos que observamos, muda não só o teor significante mas também o arranjo de todas as suas propriedades, tanto materiais como formais.” O mundo-ao-redor é um mundo indiscernível de uma perspectiva, “mundo-de-um-sujeito” (perspectivismo) e não “mundo-para-um-sujeito” (relativismo), para lançar mão da diferenciação de Danowski e Viveiros de Castro (2014: 33). O “cosmos parte do Eu”, dirá Oswald no Manifesto. A consequência disso é que o que chamamos de mundo, o ambiente supostamente único em que estariam dispostos sujeitos e objetos, seria, na verdade, um caleidoscópio disforme e conflitante de mundos, ou melhor, uma entre-trama imbricada de teias existenciais: Só por excessiva leviandade alimentamos a ilusão de as correlações do sujeito, outro que não nós, com as coisas do seu mundo-próprio existirem no mesmo espaço e no mesmo tempo que as que nos ligam às coisas do nosso próprio mundo humano. Esta ilusão é alimentada pela suposição da existência de um mundo único em que todos os seres vivos estão encerrados. Daí a convicção geralmente aceite, de que deve haver um único espaço e um único tempo para todos os seres vivos. (...) Não existem só as multiplicidades de espaço e tempo, em que as coisas podem alargar-se; existe também a multiplicidade dos mundos-próprios, em que as coisas subsistem sob formas sempre novas” (ibid.:42, 2256).

Não há, na teoria de Uexküll, um ponto de vista exterior aos demais que permita dar uma unidade objetiva à multiplicidade de mundos-próprios, convertendo-os em um mundo; ou seja, não há um ponto de vista extra-terreno, fora do mundo, como Deus.10 Isso não quer dizer, porém, que esses mundos-próprios não entrem em contato, não se impliquem, se dobrem uns sobre os outros. Pelo contrário, se a correlação sujeito-objeto constitui cada mundo-ao-redor, então, como já indica a raiz Um-, aparentada ao nosso prefixo ambi-, e de sentido próximo a circum-, estamos num caminho de mão dupla: não só o sujeito de um mundo é objeto de outros, mas entre ambos existe um laço que não é transcendental 9

Trata-se de uma verdadeira transubstanciação, pois mesmo a diferenciação metafísica do ser entre essência e acidente torna-se acidental, pois ela também passa a depender do sujeito do ponto de vista: “Só a ligação mais ou menos estreita do objecto significante com o sujeito permite dividir as propriedades em essenciais (essentia) e acessórias (accidentia)” (ibid.:142). 10 É verdade que, se Uexküll não afirma nenhuma objetividade prévia, postula sim uma subjetividade primordial: “E no entanto todos estes diferentes mundos-próprios estão incluídos e arrastados num uno que se conserva eternamente vedado a todos os mundos-próprios. Por trás de todos os mundos por ele criados, oculta-se eternamente o sujeito inatingível — a Natureza” (ibid.:137). Todavia, a Natureza aqui não parece constituir um super-sujeito transcendente à multiplicidade de mundos, mas uma subjetividade imanente a elas, a condição da própria multiplicidade, uma espécie de partitura musical, para usar uma figura cara ao autor. Talvez se possa dizer, assim, que o sujeito Natureza seja aquilo que torna possível as correlações, a própria possibilidade do ponto de vista, e de sua variação.

11 aos mundos, mas imanente a eles. O que há, portanto, é uma com-posição: “Logo que cada componente de um objecto orgânico ou inorgânico surge, como objecto significante, no cenário da vida de um sujeito animal, esse componente é posto em contacto com um, digamos, ‘complemento’, situado no corpo do sujeito que intervém como utilizador do significado” (ibid.:145). Mais adiante, ao tentar responder porque a aranha consegue fiar “um padrão vazio, eficiente, de uma mosca” (ibid.:163), isto é, a produzir uma “réplica fiel da mosca” (ibid.:164), sua vítima, mas uma réplica em negativo, os vazios da teia, tecida proporcionalmente ao tamanho e peso da inimiga que ela jamais conheceu, ao tentar responder como a aranha consegue fazê-la, Uexküll apresenta uma formulação que poderíamos muito bem tomar como uma definição da Antropofagia: “É claro que a teia de aranha é de estrutura ajustável à mosca, porque a própria aranha já o é também. Ser ajustável à mosca significa, neste caso, que, na sua estrutura, a aranha adoptou certos elementos da mosca. (...) Para nos exprimirmos melhor: quando dizemos que a aranha é ajustável à mosca, queremos significar que, na sua constituição corpórea, aquela adoptou para si certos motivos ou determinismos da melodia da mosca” (ibid.:204). Aquilo que o sujeito não é, seu inimigo, sua presa, a mosca, agora se apresenta como constitutivo da aranha, da sua subjetividade, de sua possibilidade de constituir mundo: para comer a mosca, a aranha deve incorporar seu modo de ser, de algum modo ser como a mosca. Desse modo, poderíamos afirmar que a relação entre a mosca e aranha não é de mera complementariedade, e sim de suplementariedade: se, como aponta Derrida, o suplemento, diferentemente do complemento, é uma “adição exterior” (p.177), então a mosca se afigura para a aranha como um paradoxal “suplemento originário”, pois na relação entre elas, “a potência da exterioridade [a mosca]” aparece “como constitutiva da interioridade [da aranha]” (383). Se o mundo-ao-redor é uma teia, um texto tramado pelo sujeito (a aranha), então a exterioridade lhe é imanente: os vazios da teia, as entre-linhas do texto. Todo mundo implica um fora, todo mundo é uma texterioridade.11

6. Como dissemos, a formulação de Uexküll ressoa as definições da Antropofagia, em especial uma: a transformação do Tabu em totem, ou seja, a devoração enquanto uma transfiguração do desfavorável em favorável, do valor negativo em valor positivo, do mundo métrico, extenso, em mundo não-métrico, intenso.12 Segundo essa ideia, o

A formulação é inspirada em uma análoga de Viveiros de Castro (2004:18): “each text has its own hors-texte”; “cada texto tem seu próprio fora do texto”. 12 Detive-me nessa fórmula antropofágica em Nodari, 2015. 11

12 inimigo, o Tabu, o limite, seria introvertido para constituir totemicamente o sujeito, e abri-lo – por dentro – à exterioridade, à “exogamia” como o chamavam os antropófagos: no exemplo de Uexküll, por meio de uma “introversão objetiva”, a mosca passaria a compor também a aranha, numa correlação (reversível) sujeito-objeto. “Nada existe fora da Devoração. O ser é a Devoração pura e eterna” (Andrade, 1992:286), dirá Oswald: Nada existe fora da Devoração, porque é a devoração que implica a exterioridade (o fora) no sujeito. Mas essa formulação sublinha também que a Antropofagia constitui uma cosmologia, uma ontologia que explica o funcionamento do cosmos e de todos os seres, não se restringindo a uma práxis humana (no duplo sentido de que envolve e implica o inumano e também de que os seres inumanos também a praticam, dado que é a relação universal): o ser, aquilo que é ontologicamente primeiro, é a relação de devoração, o entre-ser. É tendo isso em mente que devemos ler uma fórmula seminal do Manifesto: “Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago”. Nela, vemos que, na medida em que os termos “homem” e “antropófago” possuem (à primeira vista) uma relação de todo e parte respectivamente, parece haver uma espécie de modificação da lógica da subsunção, segundo a qual “homem”, como categoria mais ampla e geral, deveria, por isso, ser também a última da sequência, englobando um pretérito “antropófago”: “Lei do antropófago. Lei do homem”. Se “antropófago” aparece depois, então talvez constitua, paradoxalmente, uma figura mais vasta que subsuma o “homem”. O paradoxo se dissolve, por um lado, se levarmos em consideração a subjetividade inerente (Uexkull), ou a proto-humanidade originária (Dacqué e a mitologia ameríndia) de todos os seres, que fazem da espécie e subjetividade humanas em sentido estrito apenas uma forma dentre outras da humanidade e da subjetividade, implicando, assim, que a devoração (literal ou metafórica) de um ser por outro faça dele um antropófago (ou quaseantropófago): a Antropofagia de Oswald e seus companheiros é uma forma de tornar manifesta esse canibalismo geral latente, de tornar Manifesto o Antropófago, para fazer uso de um maravilhoso apontamento de Beatriz Azevedo (2016). Por outro lado, ele se desfaz também se atentarmos para a isomorfia da fórmula da lei canibal, pois esta permite – e mesmo demanda – que a dobremos sobre si mesma: inclusive em mim, só me interessa o que não é meu, ou seja, em mim, só me interessa aquilo que não sou, que é outro em mim, que não me é próprio. Se essa é a “Lei do Homem”, é também o que faz o humano se converter em antropófago, ou seja, é também a “Lei do Antropófago”: enquanto homem, só me interessa o inumano (em mim), justamente aquilo que não é próprio à minha condição humana – e nada mais “inumano” e primitivo na tradição ocidental que

13 o canibal. A avidez canibal, desse modo, não constitui um acúmulo narcísico, pelo contrário: não é um acaso o incessante uso do verbo “interessar” pelos antropófagos para designar a variante canibal do desejo, pois só há entre-ser onde há diferença. Em Interessere, um belíssimo poema provavelmente inspirado na fórmula oswaldiana, Décio Pignatari (2004:220) sublinha de modo magistral essa relação: “No homem interessa o que não é homem / Na mulher interessa o que não é mulher / No animal interessa o que não é animal”. Só há interesse onde o ser não coincide consigo, onde a ipseidade dá lugar ao diferimento e à implicação: e é por isso que “só o escritor interessado pode interessar” (Andrade, 2009:152).

7. Mas, para voltar à questão que nos move aqui, de que modo a recolocação da relação entre humano e inumano, cultura e natureza proposta pela Antropofagia pode se afigurar como uma estratégia diante da crise em curso? Talvez uma pista nos seja dada pela correção que Oswald propõe a um dos quatro “erros de Marx”, Oswald (2009:81): “O que interessa ao homem não é a produção e sim o consumo”. Se estamos corretos em nossa leitura, o que se desenha aqui é uma oposição entre dois modelos de ação (ou poiesis): o consumo geraria o interesse, ao passo que a produção, não. Em uma passagem arquiconhecida d’O capital, citada seguidamente por Oswald, Marx (1980:202), falando do trabalho humano, a base da produção, afirmava: “[O homem,] atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza”. Para além das críticas oswaldianas ao privilégio concedido ao trabalho, a que sempre contrapunha o ócio, a “sábia preguiça solar” ou mesmo a “aventura exogâmica” (a viagem, o sair de si), cumpre sublinhar a via de mão única da transformação de que fala Marx, dominada exclusivamente pelo homem, senhor de si, da natureza e das transformações de ambos. Mas como o consumo se contraporia a esse modelo de transformação? Devemos atentar para o jogo de sentidos mobilizado por Oswald: o consumo em questão é o alimentar, de modo que a oposição se dá entre uma práxis exclusivamente humana e outra comum a todos os viventes (lembremos: o que interessa no homem é aquilo que não é próprio a ele), a alimentação, que constitui uma via de mão dupla, envolvendo, portanto, o interesse e não uma dominação soberana. Pois, como vimos, comer o outro envolve de algum como ser/estar como ele, incorporá-lo no sentido forte (dar corpo à exterioridade), de modo que o cogito canibal talvez seja: eu como outro – nos dois sentidos de “como”, verbo e advérbio, ação e metáfora, conteúdo e forma. Devorar o outro, transformando-o em um “totem”, é diferente de ser o outro; é ser como

14 o outro, quase o outro, ao modo do outro – simultaneamente próximo e distante, igual e distinto: “identidade ao contrário”, na magnífica fórmula de Viveiros de Castro. Geralmente, tendemos a focar nos estados resultantes da devoração, isto é, costumamos nos guiar pelo princípio da identidade (da não-contradição), seja afirmando que somos o que comemos, seja postulando o contrário, que incorporamos narcisicamente o que deglutimos, de modo que ignoramos o ato da devoração que condensa a reciprocidade de ambas as transformações: ao comermos, estamos nos transformando naquilo que comemos, assim como que aquilo que comemos está se transformando em nós. O mesmo se passa com a concepção corrente de metáfora (da comparação, do como), em que reduzimos a diferença dos termos aproximados a uma identidade. Todavia, como lembra Lévi-Strauss (1986:240), a metáfora “sempre funciona dos dois modos; se nos perdoarem a aproximação, como certas ruas, ela tem ‘mão dupla’”. Portanto, o ato de comer e o de metaforizar ignoram o princípio da não-contradição, pois envolvem sempre essa reciprocidade: “O ‘como’”, afirma Haroldo de Campos (2004: 150, 149), “torna lábil o estatuto da identidade (da continuidade, da verdade), abrindo nele a brecha vertiginosa da associação por analogia”, guiando-se pela “não lógica do terceiro incluído, onde uma coisa pode deixar de ser igual a si mesma para incorporar o outro, a diferença”. A devoração antropófaga constitui, assim, a passagem, para usar novamente palavras de Haroldo de Campos (1997:25), do “ontológico, ‘substancialista’”, ao “modal, vale dizer, simultaneamente diferencial e dialógico – ubicado, desubicado e ubíquo”. O como outro – o consumo canibal – forma, assim, uma tessitura, um inter-esse, implicando o mundo no sujeito – e o sujeito no mundo. Desse modo, o Antropófago é aquele que tece uma texterioridade, que estabelece com a alteridade uma relação imanente de entrelaçamento.

8. O consumo antropófago, portanto, parece estar na ordem do dia, já que a própria noção de produção como fazer exclusivamente humano está posta em xeque, enquanto obra de um homo faber que, supostamente rico de mundo, não cessa de destruir mundos, inclusive o próprio. Na esteira de sua crítica ao consumo, Oswald contrapunha, a esse homo faber, o homo ludens, como duas formas de lidar com o que chamava de “fluxo de sentimento animal” (stream of unconsciousness ou stream of animalness, poderíamos dizer). Isso que o homem não é, sua animalidade, argumentava Oswald, lhe assalta desde dentro, e se “não se gastar em arte, em política, ou em esporte, terá, sem dúvida, que adotar o equívoco de uma religião confessional” (Andrade, 1992:248). A “religião” aparece na passagem com o sentido próprio que Oswald lhe dá, isto é, como “filosofia messiânica”: a teoria e

15 a prática de um poder que nega este mundo atual em nome de um futuro mundo totalmente humano a ser construído ou conquistado física ou metafisicamente. Ou seja, diante de sua “constante lúdica”, animal, o humano poderia optar por negá-la por meio do messianismo, convertendo a exterioridade numa promessa de futuro (baixa antropofagia), ou exercê-la aqui e agora por meio, entre outros, da arte, constituindo, assim, um mundo neste mundo (alta antropofagia). E aqui, para além de uma associação mais geral que podemos fazer entre arte e inumanidade13, talvez seja interessante atentar para o modo como a poética antropofágica em sentido estrito lidava com tal “fluxo animal”. Em primeiro lugar, se levamos em consideração a correção oswaldiana de Marx, podemos afirmar que a poeisis antropofágica é antes de tudo uma poética da transformação recíproca (consumo) e não da criação autotélica (a produção enquanto transformação controlada e dominada pelo homem): se Platão definira a poiesis como a passagem do inexistente ao existente, talvez se possa dizer que os antropófagos responderiam que “Na natureza, como na arte, nada se cria, nada se destrói, tudo se devora, se transforma reciprocamente”. Essa concepção “naturalista” da arte se

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Talvez em nenhuma arte como a poesia se evidencie e tematize o caráter impróprio e mesmo inumano daquilo que a modernidade considerou prerrogativa exclusiva do homem, a linguagem – e, por extensão, ao próprio ser do homem. A poesia como “furor divino”, como imantação que liga a Musa aos ouvintes por intermédio do poeta (Oliveira, 2014), como produto da influência de um gênio impessoal sobre o sujeito criador, como “geomorfismo” e “canto da Terra” (Link, 2012): em todas essas declinações, a poesia aparece como um dom extra-humano (natural ou sobre-natural) ao homem. Dom perigoso que ele deve saber retribuir, por meio do texto que implica (i.e., dobra) tudo aquilo que ele não é, aquilo que está fora de si (o mundo), e cujas formulações mais conhecidas talvez sejam a de Rimbaud (2015): “Está errado dizer: Eu penso. Deveríamos dizer: Pensam-me (...) EU é um outro”; e a de Pessoa: “Sinto-me múltiplo. Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos que torcem para reflexões falsas uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas. Como o panteísa que se sente árvore e até flor, eu sinto-me vários seres. Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente, como se o meu ser participasse de todos os homens, incompletamente de cada, por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço.” Desse modo, poderíamos seguir a via percorrida por Marco Antonio Valentim (2012:27), e ler o jogo entre som e sentido, entre a “prosódia e a semântica da palavra”, que caracteriza a poesia, como um jogo entre as dimensões humana e animal, cultural e natural da palavra: “à articulação entre o som e o sentido responde, em outro plano, a articulação entre natureza e cultura”, afirmava Lévi-Strauss. Ou, em sentido ligeiramente distinto, poderíamos dizer, conforme sugestão de Guilherme Gontijo Flores, que “a poesia tem algo de animal porque insiste em sempre relançar o corpo no jogo da linguagem, ao evocar o ritmo e a materialidade vinculados aos sentidos”, implicando, assim, o corpo (o “irracional”) na linguagem. Talvez seja esse o sentido profundo da recomendação aristotélica do uso de estrangeirismos e metáforas na linguagem poética, pois, afirma Emmanuel Taub (2015), “O poeta é o estrangeiro na linguagem”: “A poesia (e as artes) nos desumanizam da humanidade do humano”. A poesia seria, assim, o nome de um fazer impropriamente humano, um artifício natural, e a tarefa do poeta não seria a de produzir algo, mas a de tecer aquela floresta de correspondências de que falava Baudelaire: um mundo. Em tempos de terror e catástrofe, a poesia é mais necessária do que nunca: ela é o paradigma de um fazer que é um dos “direitos originários” dos viventes, a tessitura de mundos – ela co-implica sujeito e objeto, interioridade e exterioridade, humano e inumano, produzindo uma linha de fuga ao projeto antropocêntrico que tentou converter a Terra em uma grande casagrande padronizada sem fora.

16 caracterizaria, então pela introdução da diferença no mesmo14: se, como afirma Montaigne (um dos inspiradores da Antropofagia), a arte tende a produzir a similitude, e a natureza, a diferença, devemos reparar que “A semelhança não unifica na mesma proporção que a dessemelhança diversifica. A natureza parece ter-se esforçado por não criar duas coisas idênticas (...) A diferença introduz-se por si só em nossas obras e nenhuma arte pode chegar à similitude” (Montaigne, 1961:322). E a estratégia poética por excelência dos antropófagos consistia justamente numa incorporação recíproca, pela qual a incorporação para si de materiais já dados (apropriação, transformação de si) implicava também a incorporação nestes de uma diferença (transformação do outro). Talvez o exemplo mais conhecido seja o Tupi, or not tupi that is the question, do Manifesto, em que a apropriação do original de Shakespeare não o oblitera, mas o abre a uma variação, gerando nele um interesse pelo qual ele, sem deixar de ser a frase hamletiana, tampouco se identifica plenamente consigo mesmo. Além disso, a alteração mínima que se dá nessa apropriação produz um efeito máximo de transformação semântica: a passagem da questão do ser à dos modos de ser, do ontológico ao odontológico, pois não se trata mais de “ser ou não ser”, mas de ser canibal (tupi) ou nãocanibal (not tupi) – e ser canibal, lembremos, implica ser como o outro que se come (ou seja, é a estabilidade do ser que se questiona pela postulação da variabilidade, multiplicidade e transformação de seus modos). Na Antropofagia, portanto, “o maior é o menor”, como dirá Raúl Antelo (2006:27).15 E aqui nos deparamos com outro traço característico da poética do movimento antropófago (que, é pouco notado, produziu pouquíssimas obras): o seu minimalismo – o material da Revista de Antropofagia (especialmente em sua segunda dentição, que é quando o ideário do grupo se solidifica) se compõe de aforismos, textos compostos puramente de citações, muitas delas deslocadas de seu contexto, ready-mades. Assim como reivindicavam a “redução aos cacarecos” dos adornos da civilização, os antropófagos utilizavam poeticamente um procedimento de “redução”, constituindo uma verdadeira “poesia menos”, pra usar formulações de Haroldo (Campos, 1972:xxxiii-xxxiv; 2004:221-230). Mas, de novo, vale salientar toda a intensidade contida nessa extensão mínima, retomando na íntegra uma passagem do Manifesto mencionada só parcialmente: “Da equação eu parte do Cosmos

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Natural e diferente aparecem como sinônimos em diversos textos oswaldianos, como, por exemplo, nessa passagem: “o aparecimento do homem natural, isto é, de uma humanidade diferente da que era então conhecida” 15 Antelo refere-se diretamente ao poema “amor”, composto do verso (único) “humor”.

17 ao axioma Cosmos parte do eu. Subsistência. Conhecimento. Antropofagia.” A subsistência mencionada aponta, por um lado, para essa redução ao “eu”, mas, ao mesmo tempo, para toda uma multiplicidade presente nele, já que contém em si a exterioridade, um mundo.16 Nesse sentido, o essencial na fórmula é a possível variação do sentido de “parte”: na primeira ocorrência, funcionando como substantivo, sinônimo de “porção” (o eu como porção delimitada, determinada, do mundo; participação passiva); na segunda, como conjugação do verbo partir – o cosmos começa no eu, é uma teia que se arma a partir dele (participação ativa, a “consciência participante” de que fala o Manifesto17, afinal, só me interessa o que não é meu, ou seja, o sujeito não pode ficar em si mesmo, sendo possível desenrolar dele todo um mundo). Desse modo, a poiesis canibal consiste não na produção e acúmulo de (sempre mais) obras, mas no consumo que as transforma, gerando nelas o interesse. Esse é o sentido da oposição entre o animal que se veste (fixidez) e o animal que se enfeita (variação). E esse é o sentido também do trecho que intitula nosso texto: para substituir a escrita, entendida não (ou não só) em seu sentido literal, mas enquanto insígnia de uma produção exclusivamente humana e de dominação do mundo, poiesis que, como mostrou Lévi-Strauss (2005:240) em sua famosa “Lição de escrita”, segmentariza, hierarquiza, divide, rompe os fios (a etimologia de escrita remete justamente ao ato de cortar), os antropófagos apresentavam uma poética do interesse, do consumo, da tessitura, um “sistema” de remissões e correspondências – para usar a expressão de Barthes, propunham uma mudança do regime poético, uma passagem da obra ao texto, do fechado em si ao aberto pro fora. Assim, a bravata oswaldiana adquire hoje um novo sentido. Por um lado, a tinta de escrever tende a acabar física e metafisicamente, como apontou um seguidor da Antropofagia e de sua poeisis da redução: “Na febre programada de possuir cada vez mais (bens, objetos, propriedade), a espécie humana esqueceu, numa amnésia conveniente, que os recursos naturais do planeta são finitos. O ferro está com os dias contados. O petróleo — nem se fala. O níquel vai faltar logo. O papel acaba com a natureza. O que é verdadeiro em cima, é verdadeiro em baixo, diz a Cabala, diz a Alquimia. O que é verdadeiro fora, é verdadeiro dentro” (Leminski, 2015:83-4). E, por outro, já estamos adentrando um regime de “pós-escrita” (Flusser, 2010), especialmente Sobre a noção antropofágica de subsistência, conferir a minha apresentação “Limitar o limite: modos de subsistência”, disponível em https://www.academia.edu/9492226/Limitar_o_limite_modos_de_subsist%C3%AAncia 17 Devo à interlocução com Maria Carolina de Almeida Amaral o insight sobre a relação entre a “consciência participante” e o aforismo referente à relação entre eu e cosmos. 16

18 por meio de nossos computadores e da internet. De certa forma, portanto, os antropófagos anteviram aquela máxima enunciada recentemente por um integrante do Partido Pirata alemão: “A web é nosso campo de existência. A internet é o lugar em que vivemos”. Pois a Antropofagia não cessa de nos recordar disso, de que todo mundo é uma tessitura, a resultante de um jogo recíproco de implicações e remissões, de interesses, e de que a rede que parte de cada vivente (ou seja, não a internet em si, mas as variações de mundos, suas transformações, sua abertura a um fora) é a única saída a essa civilização que se torna cada vez mais insuportável. E, por isso, o modo como essa poiesis canibal do interesse, que consiste na confecção de texterioridades, pode se transformar em e transformar a política é uma questão das mais urgentes – e mais interessantes – de nosso tempo.

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