Antropologia aplicada e desenvolvimento

Share Embed


Descrição do Produto

Práticas Profissionais de Antropologia

Desenvolvimento A procura de uma solução ética para o envolvimento dos antropologos

Luís Pedro Ramalho | nº 53869 | AC 1 | Junho 2015

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Indice Prefácio.................................................................................................................... 3 Antropologia aplicada Vs Aplicação da antropologia................................................ 4 Antropologia do desenvolvimento Vs Antropologia aplicada ao desenvolvimento.... 5 História do desenvolvimento.................................................................................... 6 Carta para dentro.................................................................................................... 11 De encontro à ética................................................................................................ 11 Proposta................................................................................................................. 12 Bibliografia............................................................................................................. 14 Estudos de caso...................................................................................................... 15 Anexos................................................................................................................... 19

2

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Prefácio Este trabalho pretende constituir-se como um projecto de aplicação prática da Antropologia. Uma abordagem para resolver a inserção profissional de quem acaba uma licenciatura nessa matéria. Para mim é duplamente complicado: Primeiro porque dediquei-me ao estudo da antropologia por pura vontade de aprender. Realizo-me ao adquirir novos conhecimentos. Creio que grande parte da humanidade herdou esse gene que nos foi impulsionando e que se manifesta no fascínio e deslumbramento de descobrir. Acredito que quando novas sinapses se ligam somos invadidos por uma “recompensa” de euforia. Sim, é mais ou menos dizer que somos adictos à descoberta, à curiosidade e conhecimento. Porque sempre tive esta ideia romântica de que toda a gente devia ter oportunidade de estudar sem um fim em si, a minha vida foi dividida pelo estudo técnico para exercer uma profissão e o estudo como auto-satisfação. Claro que acabei por desinteressar-me do primeiro e confesso estar a ter dificuldades em conciliar os dois interesses. Depois de concretizada a paixão pelo estudo da antropologia, gostaria de me poder dedicar inteiramente a ela. A outra dificuldade que encontro prende-se com um pragmatismo que sempre me obrigou a agir. Não sou muito dado a reflexões inconsequentes, julgo que a reflexão existe para ser expressa na acção, mesmo a mais abstracta pode surgir em poesia ou outra forma de arte, como a ciência pode ser. Mais, julgo que a reflexão sem acção é estéril. Assim também nunca fui dado as susceptibilidades do uso do conhecimento. Percebo perfeitamente a relutância que os nefastos usos verificados possam causar, mas penso que um sentido de auto crítica ética e o desconfiar de possíveis manipulações são garantia mínima. Prefiro isso à inacção que acaba em conivência e cumplicidade com outros males. Uma dificuldade adicional que me surgiu foi a constatação que tudo é matéria de especialização em antropologia, assim quando me resolvi dedicar à aplicação da antropologia no desenvolvimento percebi que a par da prática (área da antropologia aplicada), o desenvolvimento constitui-se por si em perspectiva de crítica, obviamente isto levou-me a procurar uma solução ao nível da ética, o que também constitui um corpo académico da antropologia. Parece-me às vezes que se procura a racionalização para fundamentar uma posição confortável de inacção, uma vez que esta garante o não correr riscos e uma isenção à crítica. Sempre tentei pautar-me pela acção informada, e é com a minha consciência que ajusto contas, ela é o meu mais feroz crítico. De qualquer maneira, prefiro tentar ao medo de errar, nunca fui bom a lidar com medos. Creio que a ciência é isso mesmo, feita para melhorar a condição e acção humana. Mas correndo o risco de errar. O contrário não é ciência, é contemplação, crítica, divagação ou dogmatismo religioso. Qualquer antropólogo que pretenda envolver-se e trabalhar na área do desenvolvimento deverá ter em conta a problemática que este constitui ao ser também potencial ferramenta de propagação e imposição da hegemonia do sistema sócio-economico capitalista. Este trabalho não só pretende ser proposta de trabalho, como também resolver (pelo menos para mim), a questão ética que o envolve. 3

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Antropologia aplicada Vs Aplicação da antropologia Antropologia aplicada é sempre assunto melindroso de se abordar no meio académico. Na verdade falar da aplicação de qualquer ciência no meio académico é sempre olhado de lado e com desconfiança. Não é para menos, a ciência, para o ser, deve ser livre e a sua aplicação pressupõe sempre uma direcção ou objectivo condicionador. No entanto, é preciso recordar que embora o conhecimento e a satisfação da curiosidade sejam em si uma realização, é a capacidade de agir sobre o mundo que o transforma, é também na prática e na acção que o conhecimento se concretiza, o processo de conhecer não pode ser dissociado do acto da aplicação do conhecimento, sob o risco de se esvaziar em contemplação. Estamos aqui então perante aquilo que à priori pode parecer um dilema: - Deve ou não o conhecimento antropológico ser aplicado? Sim deve. - Devem ou não as possíveis aplicações desse conhecimento dirigir a antropologia? Não, não devem. Estabeleceu-se ao longo dos anos a ideia e categorização de que o trabalho de investigação académica (trabalho intelectual) era um trabalho mais “nobre e puro”, e a aplicação do conhecimento que dele resultava, um trabalho menor. Isto porque por um lado não se dissocia conhecer de descobrir ou criar, e criar é algo sempre mais nobre, e por outro lado a sequência do próprio processo (às vezes erradamente) prioriza o primeiro acto (conhecer) sobre o segundo (aplicar/praticar). Mas creio que o principal motivo seja o trauma das aplicações passadas e o risco das más aplicações. Como é sabido a antropologia tem na sua consciência vários casos polémicos de má aplicação, desde as ideias de evolucionismo social expressas nas piores formas de racismo e até eugenia, passando por “legitimações” colonialistas, até aos mais recentes casos do projecto Camelot e HTS (Human Terrain System). Gerou-se assim uma espécie de necessidade de purificar o presente para redimir o passado, através de uma omissão ou inacção. Todas as ciências tiveram e tem más aplicações, mas também tiveram boas aplicações. - É um problema das ciências? Não, é um problema do homem, como antropólogos mais do que ninguém o deveriam saber. Em abono da verdade todas as áreas de acção humana (a religião, a política, a ciência e até o desporto) são passíveis de ser críticadas pelo mal que fizeram à humanidade. Das duas uma, ou ficamos quietos e nada fazemos, ou assumimos que esse não é um problema da aplicação das áreas em si, mas de comportamento humano, uma vez que não é de deuses perfeitos de que falamos, corremos sempre o risco de fazer mal… ou bem, pelo menos até conseguirmos antever no futuro as consequências do que fizermos no presente. Conhecer e saber é um poder. Julgo que a aplicação e o conhecimento antropológico são justamente formas para que o uso desse poder possa ser direccionado para benefício comum. - Corremos um risco em aplicar o conhecimento? Corremos logo um risco ao procurar conhecer. Uma certeza temos se não fizermos nada, a da cumplicidade ou conivência por omissão ou inacção. Faço uma distinção entre antropologia aplicada e aplicação da antropologia, porque embora a fronteira que vou traçar não seja completamente nítida, julgo que será perceptível. 4

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Por antropologia aplicada entendo o pressuposto de que os termos (condições) dessa aplicação partem ou são definidos pela antropologia e pelos seus códigos de ética e é aplicada por antropólogos. Por aplicação da antropologia entendo que os termos são imposto por um objectivo que não é da antropologia, isto é, um uso de métodos, conhecimentos (etnografias, pesquisas, etc.) por parte de não antropólogos, e cujo intento não é declarado, explícito, ou é dissimulado. Obviamente o que aqui está em causa são discussões de ética, que julgo serem de extrema importância e talvez onde resida a chave para a solução do dilema, como veremos mais adiante. No entanto é preciso ter em conta que a ética, como noção moral de bem e mal não é universal, varia conforme tempo e cultura local. Assim, impor uma visão ética de interesse para os outros é a ideia que assistiu as conversões religiosas forçadas dos séc. XIV em diante. A visão capitalista de mercado é uma ideologia que também incute uma moral do que é bom ou mau. Estudar as relações, ao fim e ao cabo, é estudar a ética. Pat Caplan (2003) explica que a ética tornou-se uma característica de marketing, uma mais valia dos produtos ou mesmo um bem vendável. O marketing das grandes companhias, da responsabilidade social e do ambientalmente sustentável.(1)

Antropologia do desenvolvimento Vs Antropologia aplicada ao desenvolvimento Justamente uma das áreas que reflectem bem toda essa polémica ética é a do desenvolvimento.(2) O desenvolvimento na antropologia como já foi mencionado, constitui-se por um lado em objecto de estudo e matriz analítica, naquilo a que se chama a especialização em antropologia do desenvolvimento, e por outro lado em aplicação prática do conhecimento e métodos antropológicos, designada por antropologia aplicada ao desenvolvimento. Enquanto a primeira é uma área de análise teórica que vê o desenvolvimento de um ponto de vista crítico como uma categorização reminescente do evolucionismo, que dividia o mundo em civilizado ou incivilizado, com etapas alcançadas num único caminho temporal (sequencial), e que fomenta a alteridade e subalternidade, a segunda é uma prática ligada aos projectos de desenvolvimento, como consultores ou mediadores desses projectos.

1) “Economic interests appeared largely to prevail over ethical and even, in some cases, longer-term political interests. Ethics-talk has entered the economic arena too. A number of companies today offer their customers the option of investing their money in ‘ethical’ accounts. Indeed, the number of such schemes has multiplied in the last few years and they are currently growing faster than conventional investment ‘products’.1 The financial pages of the broadsheets regularly report on their progress with headlines like ‘Boardrooms discover corporate ethics’ (Cowe 1999), while big foundations such as Ford endorse ethical investment: ‘Corporate ethics meets the bottom line: ethical behaviour is good for business – and can lead to new markets’ (Lang 1999: 16). There are now ‘ethical consumers’, ‘corporate ethics’, and ‘socially responsible businesses’. For philosophers, as for anthropologists, the issue of ethics raises the hoary question of universalism versus relativism, since a comparison of different historical periods and different national disciplinary traditions suggests that the field of anthropological ethics is a shifting one.” 2) “Hymes’ book Reinventing Anthropology, a collection of 16 articles to which he wrote a substantial introduction, has become something of a classic. Hymes summed up its intended audience as follows: This book is for people for whom ‘the way things are’ is not reason enough for the way things are, who find fundamental questions pertinent and in need of personal answers; those for whom security, prosperity and self-interest are not sufficient reasons for choices they make; who think if an official ‘study of man’ does not answer to the needs of men, it ought to be changed; who ask of anthropology what they ask of themselves – responsiveness, critical awareness, ethical concern, human relevance, a clear connection between what is to be done and the interests of mankind. (1972: 7) Here again ethics was conflated with relevance and with a desire to link anthropology to an improvement in the well-being of humankind. In his view of anthropology as essentially a political activity, Huizer maintained that the anthropologist must be both partisan and a partisan: to show which side one is on. In short, his arguments encompassed both the practice of ethnography via fieldwork, and the theoretical premises which underlie it, including the awareness of ideology, the impossibility of valuefree work and the need for reflexivity.” Pat Caplan, Anthropology and ethics, 2003

5

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

O termo desenvolvimento é por si só susceptível de discussão, é aliás por ai que tudo começa. Pressupõe uma dualidade de etapas num caminho linear exclusivo de evolução. (3) O que coloca problemas ao nível de alteridade e significação que consequentemente são reflectidas na prática. Mas na verdade, qualquer termo usado, progresso, evolução, modernização, é susceptível das mesmas polémicas. A estrutura pensante do homem é categorizante. Tem de fixar o “objecto” e compará-lo, não lida bem com caos, dinâmica, ambiguidade ou fluidez. Claro que há a conveniência e aproveitamento político disto. De qualquer maneira, creio que o chamado “framework” (e que corresponde a uma realidade materialista) é que temporal e espacialmente (historicamente) estamos todos inseridos num amplo “quadro” de capitalismo, as práticas sócio-económicas são hegemónicas, o que não quer dizer que ao nível micro ou local não estejam a nascer e a acontecer dinâmicas alternativas, de contestação, negociação, adaptação ou simplesmente apropriação. As práticas capitalistas sócio-económicas são de facto um termo a condicionar as alternativas, negá-lo não é de todo proveitoso. Com o termo desenvolvimento surgem outros de igual polémica, como: Dador, beneficiário, receptor ou reivindicação. Não quero de todo cingir-me à discussão do uso dos termos, à excepção do termo desenvolvimento que tem de facto uma correspondência significativa em práticas sócio-económicas, o restante remeto para questões de semântica. Um dos problemas desta dualidade resulta em que a crítica antropológica ao desenvolvimento, ao críticar o conceito e prática do desenvolvimento, crítica também os seus colegas envolvidos na prática da antropologia em projectos de desenvolvimento, tornando-os cúmplices da “maldade” e inviabilizando a possibilidade de uma prática que não exclui a crítica e vice versa.(4)

História do desenvolvimento O conceito de desenvolvimento começa a surgir logo após a II Guerra Mundial com a conferência de Bretton Woods (1944) e a criação do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do IBRD (International Bank for Reconstruction and Development, hoje parte do Banco Mundial), e ganha forma num discurso do presidente Truman dos EUA em 1949. Aquilo que à priori poderia parecer uma medida bem intencionada começou depressa a reunir suspeitas e críticas. 3) ‘Development’ is a largely European and American idea which emerged in the postwar era (Arce and Long 1999: 5). Attitudes and policy were based on assumptions about the superiority of nations that had successfully modernized themselves, and ‘backward’ or ‘underdeveloped’ countries were described as ‘the Third World’, representing an earlier stage of technological inferiority and ignorance. Development would help them to ‘catch up’. The implication was that local traditions were a bar to ‘progress’ and should be discarded, and a ‘developmentalist’ relationship was created with Third World countries, requiring that they replicate European and American models (Escobar 1995).” Veronica Strang , What Anthropologists, 2009 4) “For the critics, conversely, the development anthropology is profoundly problematic because of its adherence to a framework - development that has made possible a cultural politics of domination over the Third World. In so doing, they contribute to extending to Asia, Africa and Latin America a project of cultural transformation shaped, broadly speaking, by the experience of capitalist modernity. Anthropologists have generally shown great ambivalence regarding development. In recent years, it has become almost axiomatic among anthropologists that development is a problematic and often invasive concept.[…] […]However, while the anthropologydevelopment equation is understood and dealt with in many different ways, it is possible to distinguish, in the late 1990s, two broad schools of thought: those who favour an active engagement with development institutions on behalf of the poor, with the aim of transforming development practice from within; and those who prescribe a radical critique of, and distancing from, the development establishment.[…] […]Part one of the article analyses the work of anthropologists working in the self-defined field of development anthropology - that is, those working within development institutions and in anthropology departments training students for applied anthropology jobs in development. Part two outlines a critique of development and development anthropology which has been elaborated since the late 1980s by a growing number of anthropologists inspired by poststructuralist theories and methodologies; we shall refer to this critique as the anthropology of development.” Arturo Escobar, Anthropology and development, 1997

6

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

O desenvolvimento sobretudo assente na modernização começou a ser caracterizado como a nova forma de evolucionismo, isto é a categorização e essencialização redutora em povos desenvolvidos e não desenvolvidos era uma nova criação de alteridade e forma de subalternização dos povos do hemisfério sul, “atrasados”. Depressa surgiram também acusações de que esta seria uma nova forma de imperialismo ou neocolonialismo, que apenas pretendia explorar os recursos e produção dos países colonizados ou ex-colonizados, numa versão “soft” escondida atrás de boas intenções e por isso tinha acomodado ou pervertido a crítica. Havia também suspeitas que o que era realmente pretendido era criar uma esfera de influência uma vez que o mundo estava a ser dividido em dois “blocos ideológicos”. O que estava escondido era um programa de “Hearts and Minds” para evitar ou ganhar as novas formas de luta, que consistiam nas guerrilhas revolucionárias e anti-colonialistas, que tinham pervertido a “lógica da guerra” e a assimetria do poder militar, e dependiam do apoio popular descontente com o colonizador (India 1947, Birmánia 1948, China 1949, Vietname 1952, Argélia 1954, Cuba 1958).(5) (ver também nota anexa) O desenvolvimento até aos anos 70 caracterizou-se por massivas acções que tinham sobretudo as estruturas financeiras internacionais como dadores e os estados e governos como receptores, medidas Top-Down. Em grosso modo falharam muitos dos programas, não só não conseguiram acabar com a pobreza dos locais onde foram implementados, como ainda a acentuaram ou simplesmente foram alimentar as elites corruptas desses países receptores.(6) 5) We focus on a series of related ideas that overlap, are expressed in different ways and are surprisingly persistent. The first of these concerns evolution. Social evolutionist paradigms, which imply that societies progress through stages and, for example, that development means movement from tradition to modernity, recur in various forms. More specifically, technological evolution is an essential part of development, an apparently neutral, scientific process, yet invariably treated as if it were in men’s, and not women’s, domain. Another set of ideas relates to money, which is seen as the key variable in measuring people’s quality of life; its acquisition in greater and greater amounts is portrayed as automatically progressive. All humans are (or at least should be if modern) motivated by rational, self-interested acquisitiveness. At the same time if any household member increases their income, it is presupposed that all members will benefit because equality exists within households. If new technology and increased income are made available to developing people, why then does the process of modernization sometimes falter? We look at one evolutionist explanation: traditional culture acts as a barrier. Culture is often reified as a collection of rituals and costumes exhibited principally by the less evolved, at times to be celebrated and at other times to be overcome. Emma Crewe and Elizabeth Harrison, Whose Development? An Ethnography of Aid, 1998 ‘Development has often been linked to, or equated with modernisation; that is the transformation of traditional societies into modern ones, characterised by advanced technology, material prosperity and political stability’ (Hobart 1993: 5). The idea of development therefore rests on an assumption that there are technological, material and political goals to which all societies should aspire, and that wealthier countries should assist others in attaining these. Veronica Strang , What Anthropologists, 2009 6) “Development intervention has been widely criticized. There is both statistical and visible evidence of increased poverty, environmental degradation, and inequality in many parts of the world (Simmons 1995).[…] If reducing these is an aim of development intervention, then, many argue, it is not working. At the same time, the history of development aid is apparently packed with a series of costly project failures. The shortcomings of the development ‘industry’ itself are increasingly well publicized. Overpaid expatriates are imposing inappropriate schemes on helpless ‘locals’ while aid processes in general are riddled with corruption and plagued by inefficiency. Aid, many claim, is geared towards satisfying donors’ rather than recipients’ interests.[…] Arguably, reformers with, in the development industry remain entangled in the principles and ideas upon which it was founded. These include a series of related assumptions, with their origin in the European Enlightenment, in which rationality, the search for objective, truth, and a belief in a movement, towards modernity are paramount’. This point about reformers has also been made by those who distance themselves from the development industry and take a more radical line, arguing that the assumptions on which the industry are based are inherently problematic.” Emma Crewe and Elizabeth Harrison, Whose Development? An Ethnography of Aid, 1998 “One of the most common criticisms made by anthropologists of development planning is that it is done in a ‘top-down’ manner. Planning is done at a distant office, and hence, often the plan does not match the local requirements. Robert Chamber’s (1983) Rural Development: Putting the Last First is a seminal statement of this position and draws heavily upon the insights of anthropology.[…] Chambers attacks the biased preconceptions of development planners, most of whom have only a very shaky uinderstanding of rural life in so-called developing societies (Chambers, 1983, 1993). The only solution as Chambers argues is to ‘put the poor first’ and, most importantly, enable them to participate in projects of their own design and appraisal.[…] Closely related to anthropological critiques of top-down planning is the criticism that planners fail to acknowledge adequately the importance, and potential of local knowledge. Instead, projects often involve the assumption that western or urban knowledge is superior to the knowledge of the people to be developed. They are regarded as ignorant, although the anthropologists have repeatedly shown, they have their own areas of appropriate expertise. Development projects often fail because of the ignorance of planners rather than the ignorance of the beneficiaries. This might inolve a range of factors, such as local ecological conditions, the availability of particular resources, physical and climatic conditions and so on.” Suman Nath, Study materials on Anthropology, 2012

7

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

A partir dos anos 70, verificou-se uma mudança na abordagem dos projectos de desenvolvimento no sentido de incluir medidas estruturais (Structural Adjustament Programs, SAP). Esta nova orientação foi vista como uma forma de diminuir os estados e desregula-los no sentido de abrir caminho aos mercados e às corporações trans-nacionais, conforme as políticas neo-liberais que estavam a ganhar forma e iriam atingir um pico durante os mandatos de Reagan e Tatcher. Ao mesmo tempo os projectos representavam cada vez mais compromissos de crédito e criação de dívidas enormes. As metas temporais estabelecidas nos projectos (médio-curto prazo), são muitas vezes reflexo e indicador da aplicação de uma ideologia neo-iberal, mais virada para o consumo e imediatismo. Isto não só quebra tempos de organização e de resposta (resistência) como é factor para uma maior hegemonia que condiz com a uniformidade (ferramenta por excelência de controlo e previsibilidade dos sistemas) que elimina as diferenças que advêm de especificidades e que são entraves aos mecanismos de mercado global. Assim os projectos de desenvolvimento ao ligarem-se a concepções económicas dominantes têm privilegiado a uniformização dos contextos em detrimento da adequação dos projectos aos contextos. Esta nova tendência neo-liberal de “world governance” suscitou grandes críticas e aponta o efeito pernicioso do afastamento do papel dos Estados, no entanto a intervenção de estruturas estatais não constitui nem nunca constituiu garantia de confiança na defesa dos interesses das populações locais. Os funcionários/ representantes estatais são corruptíveis e também se movem por interesses próprios antagónicos aos da população. Não faltam casos que o comprovem.(7) A partir dos anos 90, com a queda do muro de Berlim e o fim dos blocos, a consciência ecológica e os objectivos do milénio traçados pela ONU, uma nova consciência surgiu no sentido de que a eficiência dos projectos dependia do envolvimento dos receptores, começaram a implementar-se medidas Bottom-UP e a ter em conta cada vez mais a necessidade de adequação dos projectos às especificidades locais. 7) “This new aid framework has two key theoretical underpinnings: neoliberalism and institutionalism. Following the collapse of communism, international aid became underpinned conceptually by a neoliberalist confidence in market exchange, the doctrine of comparative advantage and the framing of development goals not in terms of national economic development (through the administered economy) but rather in terms of establishing the conditions for successful participation in (production for) world markets. As international markets replaced independent states as the real agents of change, the role of government was to secure the conditions for market integration, including the rule of law, secure private property, anti-corruption measures, accountable and effective government, ‘economic freedom’ (liberalisation, deregulation, privatisation, controlled inflation, the removal of protectionism), as well as investment in education, health and communications (Burawoy 2003; Robinson 2002: 1052–53, 6). And the instruments of aid – stabilisation and structural adjustment programmes engineered and imposed by the international financial institutions (IFIs – the IMF and the World Bank) – were oriented towards assisting an internal restructuring of national economies to harmonise with the ‘new legal and regulatory superstructure for the global economy’ so as to allow the free movement of capital. And the ‘enterprise models’ applied ensured that various state functions were increasingly taken over by the market (Ferguson and Gupta 2002: 989). […] reshaping social behaviour so as to increase efficiency and enhance the economic behaviour of individuals (2002: 1058–59). Recent work extends institutional analysis to the relations of international aid itself, so that ‘partnership’ and ‘local ownership’ become strategies to restructure incentives and overcome the ‘moral hazard’ or ‘principal agent’ problems inherent in aid processes (Ostrom et al. 2002). In parallel, the idea of ‘path dependency’ allows that structures of incentives are shaped by the historical interactions of institutions (e.g. Putnam 1993; Robinson 2002: 1059). These ideas, and especially the importance of getting institutions and incentives right, underpin a re-accommodation of the role of both the state (in the rubric of ‘good governance’) and self-organising society (community or social capital) as complementary mechanisms for development in a ‘post-Washington consensus’, although the market retains its inherent powers of organisation, rational allocation, benefit optimisation and non-territorial transnational regulation (Duffield 2002: 1055; cf. Fine 1999).[…] The conceptual tools of the ‘new institutional economics’ allow a new managerialism in international development, no longer confined to project cycles, and driven by a combination of poverty target orientation and policy-based objectives.7 Indeed, as its ends have narrowed to the achievement of quantified targets on poverty or ill-health, the means of international aid have expanded from the management of economic growth and technology transfer to the reorganisation of state and society needed to deliver on targets (Mosse 2005a: 3–4, 237–38; Quarles van Ufford et al. 2003).[…] Much of this book focuses on what has sometimes been characterised as a ‘new architecture of aid’. To what does this refer? First, it refers to the focus of aid on policy reform rather than conventional investment projects; reform which is ‘neoliberal’ in the sense of promoting economic liberalisation, privatisation and market mechanisms as the instruments of growth and efficiency. Instead of funding individual projects donors collaborate (in principle) to make concessional finance available (in the short term through budgetary support) to assist governments to develop their own overall strategies for economic growth and poverty reduction (through Comprehensive Development Frameworks, sector-wide approaches [SWAPs], and the like) or finance the cost of fiscal, governance or pro-poor reforms that would make these strategies sustainable in the long run (such as privatising loss-making public sector operations, cutting civil service, decentralisation and anti-corruption measures). In some cases loans and grants are now made to states on the basis of demonstrable commitment and past performance on the reform agenda – that is aid ‘selectivity’ rather than ‘conditionality’ – and outcomes known through state-level poverty monitoring.3 This change in aid, Eyben (with Leon, this volume) suggests, can be regarded as a shift from ‘gift’ to ‘contract’.” David Mosse And David Lewis, The Aid Effect, 2005

8

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Ao mesmo tempo foi ganhando mais relevância aquele que hoje é chamado o 4º sector da economia, as ONGs, que vieram também responder à desacreditação dos projectos lançados pelas instituições governamentais e internacionais. Tomaram lugares ora como interface ou intermediários dos programas, ora como angariadores de fundos que depois implementavam nos seus próprios projectos ou através de parceiros (organizações) locais.(8) O próprio conceito de desenvolvimento também mudou, passando a ser menos ligado a um modo de vida ocidentalizado, para uma ideia mais de mudança e melhoria, independentemente do caminho. Os dados mensuráveis passaram a conter indicadores mais fiáveis de menor ou mais aproximada escala e relacionados com aspectos para além da economia, como acesso à educação, cuidados básicos de saúde, igualdade de rendimentos, e não só o PIB.(9) Assistiu-se também a um aumento da consciência de que o mundo não era dividido claramente em países modernos/desenvolvidos e países atrasados/subdesenvolvidos. O princípio de que os outros estão atrasados neste percurso único em direcção ao futuro, parece ser renegado (ainda mais com as últimas crises) pela existência de condições de pobreza extrema com implicações em todos os campos, da saúde à educação, passando pela exploração, trabalho escravo, corrupção e injustiça nos países outrora chamados desenvolvidos, Europa e EUA. Qualquer análise mais atenta aos indicadores das próprias organizações alinhadas com sistemas capitalistas como a OCDE, e no PNUD demonstram as assimetrias internas e o decrescimo nos indicadores de desenvolvimento (saúde e escolaridade) ao longo do início do milénio. É então normal que surjam cada vez mais programas de desenvolvimento e auxílio, protagonizados por ONGs nestes países. Parece antes que a ideia de desenvolvimento alicerçada no capitalismo, de produção e consumo intensivo, faliu. Em parte os programas falharam porque obviamente eram reflexo da origem do problema e não o poderiam resolver. Ao tomar como base o sistema económico capitalista os programas de desenvolvimento geraram outras assimetrias, desigualdades e catalizaram a corrupção. Muitas vezes os programas criaram 8) “While multilateral agencies (for example, specialized UN agencies, the World Bank, and the International Monetary Fund) are meant to be accountable to national governments -That is, their donors - NGOs have tended to rely on direct financial support from the public, the private sector, and charitable institutions in addiction to governmental sources. NGOs, in theory at least, derive their legitimacy from the claim that they serve or represent sections of the public. This role has been complicated by their increasing dependence on government for funding. Over the past few years the quest to ‘get development right’ has been associated with a great proliferation of development NGOs. For many they epitomize greater sensitivity and an abilIty to embrace the needs and aspirations of their intended beneficiaries (or ‘partner’ organizations) in Africa, Asia, South/ Central America, and the Caribbean. The state, on the other hand, is increasingly viewed as inefficient, wasteful,’ and ineffective and is increasingly sub-contracting its service provision to NGOs.” Emma Crewe and Elizabeth Harrison, Whose Development? An Ethnography of Aid, 1998 “The …World Bank document points out that “Since the mid-1970s, the NGO sector in both developed and developing countries have experienced exponential growth…. It is now estimated that over 15 percent of total overseas development aid is channeled through NGOs.” That is, roughly $8 billion dollars. Recognizing that statistics are notoriously incomplete, the World Bank adds that there are an estimated 6,000 to 30,000 national NGOs in developing countries alone, while the number of community-based organizations in the developing world number in the hundreds of thousands. Such organizations must operate as a non-profit group. While in that respect, NGOs are meant to be politically independent, in reality it is a difficult task, because they must receive funding from their government, from other institutions, businesses and/or from private sources. All or some of these can have direct or indirect political weight on decisions and actions that NGOs make.” Suman Nath, Study materials on Anthropology, 2012 9) “…prompted by the apparent failure of top-down, economically-oriented approaches, a re-evaluation of the cultural and social aspects of development started to take place in the early 197Os, which opened unprecedented opportunities for anthropology. ‘Culture’ - which until then had been a residual category, since ‘traditional’ societies were thought to be in the process of becoming ‘modem’ - became inherently problematic, calling for a new type of professional capable of relating culture and development. Arturo Escobar, Anthropology and development, 1997

9

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

maiores assimetrias e pobreza ao mudar relações de poder. Ao mesmo tempo abandonavam os ideais humanistas, como a educação, saúde e direitos humanos em geral, porque estes muitas vezes antagonizavam com os objectivos ou aspirações económicas. Assim, nos últimos anos temos estado a assistir a uma mudança no paradigma do desenvolvimento no sentido de incluir a sustentabilidade. Isto é, a ideia de um sistema que se autonomiza e não dependente em larga escala, e que não se preda a si próprio, social, ambiental e economicamente. Se por um lado o desenvolvimento de facto corresponde à descrição feita pela crítica da antropologia, e que o envolvimento da antropologia nos projectos pode ser vista como cúmplice, por outro a posição defendida de não envolvimento é conivente com a situação por passividade e não envolvimento. Justamente por serem conscientes e os mais aptos a intervir atenta e críticamente, devem ser os mais envolvidos. Apesar do problema ético que é um possível colaboracionismo ou conivência com as situações acima descritas que os antropólogos envolvidos em projectos de desenvolvimento incorrem, muitas das críticas feitas pela antropologia do desenvolvimento aos colegas envolvidos nos projectos de desenvolvimento partem do lado oposto à ideia de evolucionismo. É uma noção de isolamento e não interferência nos sistemas sócio-culturais no sentido de os preservar. Ora é hoje bem patente que estes sistemas não são isolados, nem nunca o foram, muito menos são estáticos. Julgo que relativamente ao impacto de interferências esse pode ser benéfico se o resultado obtido for condizente com o objectivo pretendido e se este for explicitado e requerido pela grande maioria dos seus membros e estes estiverem perfeitamente conscientes das implicações e consequências. E isto é precisamente o que constitui aquilo a que se chama de reivindicação e que pode fazer parte do conceito bottom-up.(10) Como já sabemos, a noção de preservação museológica, um museu vivo, foi ultrapassada. Nenhuma cultura ou sociedade é isolada e as histórias não são estáticas e não precisamos de uma visão de guardião da preservação. Isso caberá em primeira e última instância aos próprios, caso contrário continuamos a sofrer de um preconceito etnocentrico, que se revela de superiorização através de um paternalismo, sobranceria e arrogância. Todos estamos “dentro” do capitalismo e todos temos o dever de combater o seu efeito nefasto, garantindo a possibilidade de um acesso a bens essênciais, procurando que o desenvolvimento não seja fachada para aproveitamento, e não deixar justamente que o desenvolvimento seja um termo imposto unilateralmente, ou seja um aproveitamento dessas mesmas condições de assimetria de poder nas relações económicas em que já se encontram colocados e garantir que consigam encontrar o seu próprio caminho nos seus próprios termos. Afinal é do lado de cá, alimentado, escolarizado e com saúde que surge a crítica, para que essa crítica seja genuína é preciso garantir condições para que outros também sejam capazes de a fazer.(11) 10)…cultures are no longer bounded, discrete, and localized, but deterritorialized and subjected to multiple hybridizations; similarly, nature can no longer be seen as an essential principle and foundational category, an independent domain of intrinsic value and truth, but as the object of constant reinventions, especially by unprecedented forms of technoscience; and, finally, nobody really knows where the economy begins and ends, even if economists, in the midst of neo-liberal frenzy and seemingly overpowering globalization, steadfastly adhere to their attempt to reduce to it every aspect of social reality, thus extending the shadow that economics casts on life and history. Arturo Escobar, Anthropology and development, 1997 11) Furthermore, there is an implied compatibility, or even confluence, of interests between different people that should be explored rather than merely taken for granted. These more radical theorists see development itself as a. Western-generated idea that has served to perpetuate relations of subordination in its creation of the ‘Third World’ as the underdeveloped’ ‘other’.[…] These two broad lines of critique could be characterized’ as illustrating the difference between ‘develompment anthropology and ‘the anthropology of development’ (Grillo and Rew 1985). Development anthropologists are among the reformers who, from the inside and through processes of translation and communication, try to make development better. Anthropologists of development hope to stand outside and to comment on the discourses and practices of the ‘machine’ (Ferguson 1990), usually as analysts rather than developers. Emma Crewe and Elizabeth Harrison, Whose Development? An Ethnography of Aid, 1998

10

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Se o desenvolvimento tem sido usado como meio de subalternizar, também pode ser usado precisamente para fazer o caminho inverso, isto é pervertendo a sua lógica, fazer o empoderamento das pessoas que sofrem mais e estão condicionadas com essa assimetria que lhes nega a comida, a saúde e as explora.

Carta para dentro Não podemos negar o impacto transversal e a hegemonia do paradigma capitalista no mundo inteiro. Não podemos negar a acentuação e as novas assimetrias de poder criadas por este sistema. E por mais “românticos” que sejamos na procura da beleza da diferença, não podemos negar que muitas vezes essa diferença é precisamente a ruptura que foi causada nos métodos locais/autóctones de subsistência e precisamente essa diferença é então a assimetria de condições ao acesso de educação, alimentação, protecção, direitos básicos humanos que se prendem com sobrevivência e vida com dignidade. É preciso ter atenção a se as diferenças sócio-culturais que “pretendemos” entender e preservar não são pobreza ou resultado dela, se o “exotismo” é “genuíno” ou resultado da exploração histórica. Não podemos negar que é ao perceber, agir e perverter que estamos efectivamente a resistir a esse sistema. Então o desenvolvimento não é caridade ou descargo de consciência, é obrigação para com um semelhante, é responsabilidade de não ficar quieto, sob pena de ser conivente e cúmplice da desgraça causada. Porque também não pode ser oportunidade de negócio, rentabilização ou manipulação, como o foi muitas vezes.

De encontro à ética É então aqui que para o antropólogo, a complexidade da situação e a hipótese ou suspeita de aproveitamento e imposição não devem ser motivos de afastamento, mas sim de envolvimento, justamente porque é quem mais pode garantir a defesa de um desenvolvimento genuíno feito nos próprios termos, como salvaguarda de interesses locais e respeito pelas suas vontades, crenças e especificidades. Habituados à complexidade e a interpretar os outros, sendo “ocidentais”, conscientes, cépticos e críticos melhor podemos identificar o conflito de interesses. A crítica ao desenvolvimento não tem necessariamente que excluir uma participação activa nestes processos. A questão é transformá-lo. Assim como atender ao respeito pelas identidades locais expressas nas convicções e práticas sócio-culturais, e às necessidades e reivindicações, não exclui necessariamente projectos de cooperação e desenvolvimento. Tal, a meu ver, incorreria em cinco questões: - Negar a história do capitalismo e as suas relações com exploração e assimetria de poder. - Negar as dinâmicas de transformação sócio-cultural. - Olhar o outro como passivo, coitadinho, incapaz de negociar, apropriar-se, defender-se e perverter ( o que como já foi dito constitui uma visão paternalista, sobranceira e racista). - Negar a universalidade dos direitos humanos na forma de igualdade de oportunidade, justiça na distribuição e possibilidade de realização, independente das diferenças, ou seja a procura do bem conjunto e realização individual. - Negar a garantia de que os projectos não seriam mais um aproveitamento e causa dessa assimetria, subalternidade e uma imposição. Assim julgo que é precisamente através da ética, a mesma ética que serve para a crítica, que julgo ser possível uma aplicação da antropologia no desenvolvimento. 11

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Assim este ensaio destina-se a constituir uma proposta para que: - Se ensine ou aborde nas faculdades a temática do desenvolvimento, não só como perspectiva crítica e analítica, mas também e sobretudo para que possíveis estudantes que acabem a trabalhar em organizações ou projectos de desenvolvimento saiam sensibilizados e com instrumentos para garantir um prática condizente com uma ética de respeito pela dignidade e pelos interesses dos locais e constituam deste modo “evitadores” de um desenvolvimento caracterizado como forma de aproveitamento de condições assimétricas. - Que as organizações e associações de antropólogos pressionem os governos a legislar no sentido de incluir antropólogos nos projectos de desenvolvimento, e de obras estatais, bem como vincular nos estudos de impacto ambiental (componente de estudo de impacto sócio-económico) o parecer de um antropólogo, à semelhança do acontece com geólogos, arqueólogos ou biólogos. - Sensibilizar tanto os financiadores como os intermediários (ONGs) para a importância da garantia de defesa ética que constitui a inclusão de antropólogos na elaboração dos projectos de desenvolvimento, uma vez que estes são quem melhor se posiciona como interlocutores das necessidades e reivindicações locais. - Sensibilizar tanto os financiadores como os intermediários (ONGs) para a utilidade do antropólogo como adequador dos projectos as especificidades sócio-culturais locais e assim reduzir o desperdício, aumentar a rentabilização dos meios e tornar o projecto mais eficaz e sustentável. Se querem de facto um desenvolvimento sustentável, baseado na solidariedade, e comprometido eticamente, então facilmente perceberão o princípio hierárquico que estabelece que acima dos interesses do financiador está a vontade e o interesse consensual e autónomo daqueles que ele pretende beneficiar, e é com este que o antropólogo estabelece o seu primeiro compromisso. Para que o desenvolvimento não seja uma arena de confronto de interesses, e consequentemente uma acção prejudicial para ambas as partes e pondo em causa a sua sustentação é preciso ter em conta o seguinte: a) A premissa de que o desenvolvimento não pode ser imposto, nem possui modelo ou receita única, aplicável transversalmente. Isto é, modelos exclusivamente económicos de produção ou consumo têm demonstrado não ser os melhores, ou pelo menos prioritários. E que só o envolvimento, empoderamento, atenção aos interesses e reivindicações dos próprios são garantia de genuinidade, legitimidade. b) O princípio de que cada sistema sócio-cultural possui as suas especificidade e essas são o que lhes confere identidade, a exclusividade e que se liga à dignidade da sua maneira de ser. Isto implica que certas práticas locais podem não ser perceptíveis ou compreensíveis para olhares externos, mas possuem significações importantes que se podem sobrepor, ou afectar o projecto, e que por isso deverá ser o projecto a adequar-se a essas especificações. 12

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

c) que todas as dimensões de um sistema se afectam mutuamente, e que a intervenção numa dessas dimensões, mesmo que parecendo benéfica pode e irá certamente afectar outras partes do sistema sóciocultural de formas não necessariamente boas. Para tal é preciso ter em atenção de que as intervenções nunca afectam só aqueles que pretendem, só aquelas práticas que pretendem ou só durante aquele tempo. De resto o financiador/promotor, sendo o empregador, deverá encarar o antropólogo como sendo justamente o seu primeiro gesto de beneficiação da comunidade, e também como garantia de que a sua intenção e acção não incorrerá em impor medidas contrárias aos interesses da comunidade que pretende desenvolver. Por seu lado o antropólogo deve envolver os próprios na consciencialização das necessidades e elaboração de emendas, reivindicações ou alterações aos projectos, garantir que o interesse ou reivindicação da comunidade é: 1) consensual e consciente; 2) autónomo/independente; 3) que o projecto não irá a médio prazo colidir ou destruir a identidade e dignidade da comunidade.

Nota anexa (página 7) Numa nova forma contemporânea de “Hearts and Minds” David Mosse e David Lewis, no livro THE AID EFFECT dizem o seguinte: “But the greater intrusion of aid is especially evident (and now explicit) in relation to states that are weak, ‘failing’, poorly integrated into, or excluded from, global markets, where poverty is constructed as a dangerous threat to security, remedied through the assertive promotion of neoliberal prescriptions.17 Indeed, Soederberg suggests that the stronger the implicit connection between poverty and the environment of terrorism, the greater the shift in donor attention from a state’s external actions to its domestic behaviour (2004b: 292). This is nowhere clearer than in the new ‘pre-emptive development’ in US foreign aid illustrated by Bush’s Millennium Challenge Account, established in parallel to USAID with grant finance conditional upon measured performance on the trio of ‘ruling justly’, ‘investing in people’ and ‘economic freedom’ – a selfconsciously American internationalism, resting on some version of Benjamin Franklin’s sentiment that ‘America’s cause is the cause of all mankind’ (Soederberg 2004b: 279). Here, unilateralism, more stringent conditions, internal intervention, a shift from loans to performance based grants (offering closer surveillance and monitoring that allows value-based judgements by carefully selected assessors) are all part of the US reinvention of aid, fuelled by, but in place well before, the terror attacks of ‘9/11’ (2004b: 292–93). Such initiatives illustrate how, as Duffield puts it, ‘the security concerns of metropolitan states have merged with the social concerns of aid agencies’; how ‘aid and politics have been reunited’ (2002: 1067). He notes that ‘the link between development and security is now a declaratory position within mainstream aid policy’ (2002: 1067), focusing on places where exclusion from globalisation coincides with the collapse of state structures, ‘social regression’, the destruction of the social fabric, criminality, violence and war (2002: 1067). Here an idiom of ‘borderland barbarianism’, on the one hand sustains distancing dichotomies of ‘us’ and ‘them’, justifying interventions to reform and reconstruct state and society and demonstrating a radicalised development and ‘the will to govern’ (Duffield 2002: 1052–54);18 while, on the other, it expresses the inadequate reach of capitalism and provokes projects for the capitalist incorporation of a ‘non-integrating gap’ (Soederberg 2004a, 2004b). In ‘zones of insecurity’, Duffield suggests, the arrangements of aid set up as part of short-term conflict resolution or social reconstruction become instruments of increasingly permanent international governance, often through ‘expanding public–private networks of aid practice’ (2002: 1062). In confrontation with violence and the new wars, he argues, development has been rediscovered ‘as a second chance to make modernity work’ (2004: 1064, original emphasis).”

13

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Bibliografia: CAPLAN, Pat. Anthropology and ethics In The ethics of anthropology: Debates and Dilemas. Edit. Pat Caplan, Routledge, 2003, PP1-52 CASSELL, Joan and JACOBS, Sue-Ellen in Handbook on Ethical Issues in Anthropology. Introduction http://www.aaanet.org/committees/ethics/ CREWE, Emma and HARRISON, Elizabeth. Whose Development? An Ethnography of Aid Zed Books, 1998 ESCOBAR, Arturo, Anthropology and development UNESCO 1997. Published by Blackwell Publishers. HAGBERG, Sten and OUATTARA, Fatoumata. Engaging anthropology for development and social change, Bulletin de l’APAD [En ligne], 34-36 | 2012, mis en ligne le 18 juillet 2013, Consulté le 11 mars 2015. URL : http://apad.revues.org/4105 HICKEL, Jason. The death of international development Red Pepper, Fev. 2015 HILL, James N. The Committee on Ethics: Past, Present, and Future in Handbook on Ethical Issues in Anthropology. CHAPTER 2 http://www.aaanet.org/committees/ethics/ MOSSE, David and LEWIS, David. The Aid Effect. Giving and Governing in International Development PLUTO PRESS, 2005. PP1-11 NATH, Suman. ANTHROPOLOGY FOR BEGINNERS, Study materials on Anthropology http://sumananthromaterials.blogspot.de/2012/05/anthropolog POLLARD, Amy and STREET, Alice. Anthropology Through Development: Putting Development Practice into Theory http://www.anthropologymatters.com/index.php/anth_matters/article/view/204/328 STRANG, Veronica. What Anthropologists Do Berg 2009 WAX, Murray L. Some Issues and Sources on Ethics in Anthropology in Handbook on Ethical Issues in Anthropology. CHAPTER 1 http://www.aaanet.org/committees/ethics/

14

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Estudos de caso Os estudos de caso visava sobretudo estabelecer uma relação entre a crítica ao desenvolvimento e a possibilidade pratica de melhoria dos projectos pela intervenção de uma visão antropológica. Embora tenham sido feitos dois, apenas o primeiro é aqui desenvolvido devido a constrangimentos de tempo. Ambos constituíram-se de uma leitura crítica e analítica dos documentos do projecto, de uma entrevista e de uma conclusão. O primeiro caso MOSAP acabou por ser melhor estudado do que o segundo caso: OIKOS. Também o primeiro caso parece mais problemático por se aproximar mais do cenário crítico do desenvolvimento, do que o segundo, que parece mais conforme com a prática desejada e cumprindo mais com preceitos éticos. MOSAP (Market Oriented Smallholder Agriculture Project) é um projecto de desenvolvimento agrícola com orientação para pequenos agricultores e com a finalidade de orientar a produção para o mercado (comércio) na região central de Angola (Bié, Huambo e Malanje). Com custo total de 95 milhões de dólares, é financiado pelo Banco Mundial em 70 milhões de dólares e o restante pelo governo angolano (20 milhões) e pelos agricultores (5 milhões em géneros). O objectivo é beneficiar 200.000 pequenos produtores. Teve uma primeira fase que decorreu de 2009 até 2014 e uma segunda fase (MOSAP2) que decorrerá entre 2015 e 2020. (Ver documentos em anexo)

Entrevista ao engenheiro agrónomo Luis Ramalho, um dos responsáveis técnicos pela implementação do projecto Enquadramento A estrutura governativa de Angola é composta pelo Governo Central (GC) do qual faz parte o Ministério da Agricultura Desenvolvimento Rural e Pescas (MINADERP), deste Ministério faz parte a Secretaria de Estado da Agricultura e Desenvolvimento Rural (SEADR). Dentro do SEADR existe um órgão central: o Instituto de Desenvolvimento Agrário (IDA) que é responsável pela execução das políticas, programas e projectos do sector agrário a nível de todo o território. A estrutura  territorial do Governo é composta pelos Governos Provinciais (GovP), Administrações Municipais (AdM) e Administrações Comunais (AdC), por esta ordem hierárquica descendente. O MINADERP é representado, a nível provincial, por 1 Direcção provincial, a qual tem uma representação (Departamento) do IDA. A nível das AdM  existem as EDA’s (Estação de Desenvolvimento Agrário) que têm “extensões” a nível comunal, de que não me lembro o nome. Toda esta estrutura é que superintende todo o Sistema Agrário Nacional (SAN): Camponeses (Agricultores familiares), Agricultores empresariais, etc. Os Programas/Projectos tipo MOSAP surgem através da estrutura nacional do IDA. Para a gestão do MOSAP foi criada uma estrutura autónoma (a Unidade de Implementação do Projecto - UIP-MOSAP) que tem escritórios e técnicos nas 3 províncias, que depende do IDA e trabalha no terreno em estreita ligação com os técnicos do IDA e EDA’s. Toda esta estrutura tem muitas fragilidades: falta de técnicos (em número e em qualidade), falta de meios, nomeadamente transportes, falta de incentivos para os técnicos (salários baixos e não pagamento de trabalho e despesas extraordinários). 15

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Quem determina as necessidades? O financiador, o governo ou os locais? - É o IDA, em princípio em interacção com todo o SAN. Quem traça o projecto? Quais são as intervenções de cada uma das partes? - O projecto é delineado em conjunto pelo “dono”, o IDA, e pelo financiador, o BM/BIRD e, neste caso, as duas partes envolveram também a FAO, além dos três consultores. O governo angolano concorreu ao programa de financiamento ou foi proposto pelo Banco Mundial? - O BM tem uma representação permanente em Luanda e tem vários programas/projectos dos quais um é o MOSAP. O financiamento (empréstimo) é solicitado pelo governo, e negociado pelas duas partes, dentro de linhas de crédito que o BM (não esquecer que o nome completo é BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento) disponibiliza. Como são (se é que são) tidos em conta os interesses dos locais? (Parece-me uma medida TopDown). Foram envolvidas associações ou organizações dos locais quando foi criado o projecto? - Embora com algumas limitações não é o típico topdown, pelo menos desta vez. Fomos contratados três consultores (O Joaquim César (JC), eu - graças ao JC -  e um Engº Santomense)  e  foram envolvidos técnicos da FAO, do BM, do IDA, Administrações locais, etc. Foram visitadas algumas áreas de produção, nomeadamente áreas de regadio e contactadas algumas Associações de Camponeses, bem como organismos e agentes ligados ao comércio nos dois sentidos (das produções locais e dos inputs para a agricultura), também contactados organismos na área de assistência técnica e investigação agrária (que embora de forma incipiente vão  se desenvolvendo e  procurámos aproveitar -  o JC e eu -  para chamar  a atenção para a necessidade  de integração dos vários actores e componentes do desenvolvimento rural). É claro que o tempo foi pouco para tratar de um assunto tão complexo e com uma extensão territorial e populacional tão grande, também se notou a tentação do método “copy and paste” (J. Stiglitz dixit) para a definição dos projectos. Como são tidas em conta as especificidades locais (não técnicas), como por exemplo relações económicas locais, hábitos e práticas de consumo, trabalho e de produção agrícola?  - Devido à guerra civil e à falta de políticas adequadas o meio rural foi despovoado. O palco principal da guerra foram estas três províncias. Actualmente nota-se um regresso, a par do crescimento da população. A estrutura e a dinâmica  social está em reconstrução. A agricultura é praticamente só de subsistência (com o projecto pretende-se que haja produção de excedentes para o mercado - o que já se vai notando um pouco). A pobreza é muita e os hábitos e práticas de consumo são muito básicos. Quais as expectativas e motivações dos locais? O que esperam do projecto? Esta de acordo com alguma revindicação? - O MOSAP (1), que devia ter-se iniciado em 2009 mas na realidade só se iniciou em 2012, teve um impacto positivo nas populações locais e por isso criaram-se muitas expectativas por parte das populações locais e nota-se um interesse muito grande na continuação através do MOSAP 2. Não há nenhuma revindicação, Há é “mão estendida”. Como é quantificada a parcela dos 5 milhões em género, existe uma atribuição de valor por unidade produzida? e como é que se vai processar essa “contribuição”? Para quem vai? Quando? - É estimado o trabalho, mão-de-obra e prestação de serviços, dos elementos das associações/cooperativas na execução dos subprojectos. Todos os beneficiários têm de estar organizados em associações ou cooperativas reconhecidas /cadastradas nas EDA’s/IDA e os apoios/investimentos do MOSAP são todos efectuados na forma de subprojectos. Os beneficiários recebem os meios previstos no  Subprojecto (sementes, animais, 16

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

adubos, trabalho de tractores, moagens, armazéns, etc. Parte dos trabalhos de desmatação, construção, etc, são efectuados sem pagamento e contabilizados nos custos finais como investimento da comunidade. A questão da propriedade das terras, são individuais? estatais? de cooperativas? - Pela Lei de Terras em vigor, a terra pertence ao Estado que concede o direito de usufruto. Os camponeses têm o direito de usufruto das terras que trabalham, direito esse que é controlado pelas autoridades tradicionais (Sobas) reconhecidas pela administração. Normalmente cada camponês tem a sua área familiar e é estabelecida uma área colectiva. Procura-se influenciar a constituição de cooperativas comerciais, mas as capacidades de organização e gestão são escassas. De que modo são acauteladas relações de dependência, de fornecedores de material, fertilizantes, circuitos de mercado pouco proveitosos para os produtores? Estas pessoas (“alvos” do programa) fazem agricultura como forma de subsistência ou estão motivados (e têm formação) para uma escala de produção para o mercado? - Começa a ser um problema, sobretudo para a venda dos excedentes de produção, dado que Angola importa (importava) a maior parte dos produtos alimentares e os circuitos comerciais para os produtos do campo não existiam /existem levando a que muitas vezes não tenham saída e se estraguem ou que sejam vendidos a preços muito baixos. No caso dos inputs para a produção, o problema não se coloca para o camponês/beneficiário, eles são fornecidos pela estrutura do MOSAP. Existem circuitos de mercado (distribuição)? Como foram aferidas as necessidades do mercado (em termos de tipo de produto)? - Presentemente existe uma estrutura/programa  a nível nacional para a comercialização dos produtos agrícolas (PAPAGRO) do Ministério do Comércio. O MOSAP 2 tem como um dos objectivos (Subcomponente - ver TdR) o sistema de comercialização nas áreas abrangidas pelo projecto estando previstas as questões de marketing. Conclusão: Creio que um dos principais problemas do projecto prende-se com a discrepância de expectativas entre financiadores/ promotores e beneficiários do projecto. Isto porque do lado do financiadores ha uma concepção (unilateral) de transformação dos beneficiários em médios produtores agrícolas e a sua inserção numa economia de mercado, sobretudo com expectativas de que estes assumam papéis em processos de crédito e consumo de insumos. Do lado dos beneficiários todos os dados indicam (à priori - através da faixa etária, escolarização e práticas relatadas) que a agricultura que a maior parte pratica (salvo excepções) é de sobrevivência e de pequena escala, sem motivação, ou interesse em mudar. Isto pode dever-se a uma situação em que não concebem genuinamente o seu papel numa economia de mercado, não aspiram à obtenção de grandes lucros uma vez que não é essa a sua prioridade, bastando suprir as suas necessidades mais básicas. Por outro lado sabemos que o trabalho agrícola tende a perder população quando existe uma evolução social com tendência capitalista (o que justifica as grandes migrações internas). É um trabalho pesado de risco (controlo das intempéries, pragas, etc.) e muitas vezes sem perspectiva de melhoria a curto e médio prazo. Assim é normal que a população não aspire a ser agricultor, e só o faça como subsistência. Com a agravante de neste caso não possuírem conhecimentos técnicos que permitam mitigar os riscos, não possuírem circuitos de mercado eficazes para o escoamento do produto, consequentemente não perspectivam a possibilidade de grandes rendimentos. Ir mais longe, seria especulativo e só com contacto directo se poderá confirmar a hipótese anteriormente descrita. Uma das questões de grande pertinência que não consegui verificar nos documentos do projecto, relaciona-se com a propriedade da terra. 17

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

A OIKOS descreve-se da seguinte maneira: "Fundada em 23 de fevereiro de 1988, em Portugal, a Oikos – Cooperação e Desenvolvimento é uma associação sem fins lucrativos, reconhecida internacionalmente como Organização Não Governamental para o Desenvolvimento (ONGD/INGO). Trabalhamos com as comunidades de regiões e países mais pobres e vulneráveis, independentemente da sua origem étnica, língua, religião ou geografia. Acreditamos, acima de tudo, num mundo sem pobreza e injustiça onde o desenvolvimento humano seja equitativo e sustentável à escala local e global. Desde a Emergência ao Desenvolvimento, passando pela Educação, Mobilização Social e Influência Pública, o trabalho da Oikos estende-se atualmente Portugal, África e América Latina. Desde a fundação há 25 anos, a Oikos já trabalhou nos 5 continentes, em concreto: Angola, Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Guiné-Bissau, Haiti, Indonésia, Panamá, Uruguai e Timor-Leste. Somos cidadãos solidários, com uma consciência clara do papel da cidadania global para a promoção da equidade na erradicação da pobreza extrema e na redução das assimetrias económicas e do conhecimento que caracterizam a realidade mundial. A nossa atividade encontra-se estruturada em continuum nas áreas da emergência/ação humanitária, desenvolvimento/vida sustentável e mobilização/cidadania global. Através da nossa ação, com os diferentes atores sociais (Comunidades, Governos e Sociedade Civil local, Setor Privado, Academia), partilhamos esforços e responsabilidades e facilitamos soluções para garantir que todas as pessoas usufruam do direito a uma vida digna.   A estratégia chave atual da Oikos assenta em 3 frentes: • Conversão da Oikos numa associação assente em "membership" de cidadãos(as) e coletivos da Sociedade Civil; • Aposta em novos modelos de atuação e outras formas de financiamento da sua estrutura e atividades (negócios sociais, parcerias com o setor privado e prestação de serviços); • Aposta nas áreas temáticas e geográficas em que constitui comprovado valor-acrescentado." (Retirado do site oficial: www.oikos.pt) Tem vários projectos, a decorrer em várias partes do mundo desde a America latina a Ásia, passando por África e Portugal. A Oikos trabalha com uma rede de parceiros locais, e uma rede de financiadores Numa conversa tida ao telefone com Pedro Krupenski - Diretor de desenvolvimento, este disse que eram os parceiros locais em conjunto com as populações que identificavam as necessidades e que posteriormente era criado um projecto em que cada parte iria contribuir, sendo que à sede cabia a procura de financiamento, ou programas financiados aos quais os projectos pudessem concorrer, e este método era uma das formas de acautelar os interesses locais.

18

Luís Pedro Ramalho, nº 53869, AC 1 | Praticas da Antropologia

Carta de apresentação / candidatura espontânea para alunos de antropologia que pretendam candidatar-se a lugares de ONGs Exmos(as) Senhores(as) venho por este meio apresentar a minha candidatura espontânea para uma eventual oportunidade de trabalho na vossa organização. Sou formado em antropologia social e creio que esta pode contribuir para uma melhoria de eficiência nos projectos de cooperação e desenvolvimento. Julgo que a inclusão de um antropólogo traria certamente vantagens em vários níveis e ciclos dos projectos, assim como trazer insights importantes aos mesmos e consequentemente potencializa-los. Fase inicial: Identificação e interpretação de necessidades, adequação dos projectos às especificidades sócio-culturais locais. Evitando assim erros que levam ao desperdício das verbas. Fase de implementação: Auxiliar na articulação, mediação e ajustes. Conhecendo as praticas locais o antropólogo é quem melhor serve para identificar características dos projectos que poderão ser problemáticas ou ineficientes, e ajusta-las para melhor cumprir o seu propósito Fase final: Auxiliar na avaliação do impacto dos programas. A valorização e significação locais muitas vezes diferem das do promotor, e medir o impacto segundo os critérios deste último pode não ser a melhor maneira de aferir a eficiência dos projectos Método etnográfico de observação participante possibilita adquirir conhecimentos que de outra forma escapariam. Habituados às relações e complexidade, tem uma visão holista (integrada) dos sistemas, o que permite avaliar o impacto que medidas isoladas possam ter em outras dimensões que não aquelas para as quais são direccionadas. A Inclusão do antropólogo é ainda forma de aumentar a garantia de actuação eticamente responsável e beneficiação das comunidades, respeitando às suas crenças, valores e interesses.

19

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.