Apontamentos em torno da responsabilidade do hoteleiro pelos pertences dos hóspedes no Direito Português

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Apontamentos em torno

Da responsabilidade do hoteleiro pelos pertences dos hóspedes no Direito Português Manuel David Masseno Beja, 6 de Novembro de 2009

Da responsabilidade do hoteleiro pelos pertences dos hóspedes, no Direito Português

 Um ponto de partida, e de chegada: o Nova Lei dos

Empreendimentos Turísticos (Decreto-Lei n.º 39/2008, de 7 de Março) 

A aplicação do Programa SIMPLEX desregulamentou, quase totalmente, o contrato de alojamento turístico, incluindo a questão de quo



Apenas nos é relevante a definição de “[…] empreendimentos turísticos […] os estabelecimentos que se destinam a prestar serviços de alojamento, mediante remuneração […]” (Art.º 2.º n.º 1) Obrigatoriedade de existência de serviços depósito de valores na recepção (em todos os empreendimentos) e de depósito de bagagens (nos de 3, 4, e 5*) (Portaria n.º 465/2008, de 23 de Abril)



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 No quadro do micro-sistema, imediatamente, anterior

(centrado no Decreto-Lei n.º 167/97, de 4 de Julho): 

Além da obrigatoriedade de prestação de serviços de recepção e entrega das bagagens (Art.º 20.º n.º 1 alínea d), implicando a existência de depósitos de bagagens, em todos os hotéis (Anexo I), o



Ónus de colocar nas unidades de alojamento a informação, em Português e em Inglês, “Que a entidade exploradora não se responsabiliza pelo dinheiro, jóias ou outros objectos de valor que não sejam depositados através do serviço de guarda de valores prestado na recepção” (Art.º 21.º n.º 2, alínea c) e 20º n.º 1 alínea g)

(Decreto Regulamentar n.º 36/97, de 25 de Setembro) 

Fundamentava uma determinação a contrario da regra aplicável

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 Antecedentes remotos:  

de quando o Código ainda pretendia disciplinar, em termos comuns, a Sociedade Civil… não no que se refere à responsabilidade dos nautae, caupones et stabularii (D. 4.9 e D. 47.5)



No Art.º 1419.º e seguintes do Código Civil de 1867, o Código de Seabra, vigente até 1967, era disciplinado o Contrato de albergaria ou pousada



“Dá-se contrato de albergaria, quando alguém presta a outrem albergue e alimento, ou só albergue, mediante a retribuição ajustada ou de costume. § único. Este contrato deduz-se de factos, sem necessidade de estipulação expressa, quando o que presta albergue é albergueiro por ofício.”



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 E, especificamente:  “O albergueiro é responsável, como se fora depositário, pela bagagem, ou por quaisquer alfaias que o hóspede haja recolhido na pousada. § único. Se, porem, forem coisas de pequeno valor e fáceis de sumir, deverá o hóspede recomendá-las à guarda do albergueiro, aliás não responderá este pelo extravio ou deterioração delas, não se provando culpa da sua parte” (Art.º 1420º)  “O albergueiro responde, igualmente, pelos danos que os próprios criados, serviçais, ou qualquer estranho por ele albergado, causarem, salvo o regresso contra eles” (Art.º 1421º)  “O albergueiro não é, todavia, responsável pelos danos provenientes de culpa do hóspede, de força maior, ou de caso fortuito, para os quais de nenhum modo haja concorrido.” (Art.º 1422º)

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 Por sua vez, a Jurisprudência mais recente segue

explicitamente, a posição do Prof. António Menezes Cordeiro, considera o contrato de hospedagem como um contrato misto, contendo elementos da locação, da prestação de serviços, da compra e venda e do depósito, pois o “[…] o hospedeiro deve guardar as bagagens do hóspede.” (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 11/06/2007, Processo 0725475) 



Um argumento adicional encontramo-lo no preceito do Código Civil que atribui um direito especial de retenção ao “albergueiro, sobre as coisas que as pessoas albergadas hajam trazido para a pousada ou acessórios dela, pelo crédito da hospedagem” (Art.º 755.º n.º 1 alínea b)

Daí a aplicabilidade à situação, enquanto depósito necessário, do disposto nos n.º 1185.º e seg. do Código Civil actual, designadamente no que se refere às obrigações do depositário (Art.º 1185.º), pouco satisfatório atendendo ao actual Direito dos Consumidores

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Especialmente significativo é um Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 21/03/2006 (Processo 299/06), porém o mesmo segue uma argumentação bastante distinta:



“II – O contrato de hospedagem relativo a uma estadia numa unidade hoteleira envolve variados deveres acessórios ou laterais da prestação principal do hospedeiro, entre os quais se encontra o dever de assegurar ao hóspede e seus bens condições de segurança no gozo dos espaços daquela unidade (com o que se visa a satisfação cabal do interesse do credor na prestação principal, uma vez que não tendo o hóspede o domínio do espaço onde está hospedado, tem o direito de exigir que o mesmo esteja dotado das condições de segurança que evitem a colocação em risco quer da sua integridade física quer do património que o acompanha)

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III – A ocorrência de uma inundação de grandes proporções na garagem do hotel onde se encontrava hospedada a autora e onde estava parqueada a sua viatura, constitui uma indiscutível violação do dever acessório de garantia das condições de segurança dos hóspedes desse hotel e dos seus bens, pelo que na apreciação da responsabilidade pelos danos causados à autora, enquanto hóspede do hotel, nos situamos no âmbito da responsabilidade contratual.



VI – Sendo aplicável o regime da responsabilidade contratual, presume-se a culpa do hospedeiro pelo verificado incumprimento do dever acessório de garantia das condições de segurança das pessoas hospedadas e dos seus bens no hotel por ele explorado, nos termos do artº 799º, nº 1, do C. Civ.”

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Porém, esta insegurança seria obviada se Portugal houvesse aprovado e ratificado a Convenção sobre a Responsabilidade dos Hoteleiros quanto aos Objectos Transportados pelos Viajantes, do Conselho da Europa, adoptada em Paris, em 17 de Dezembro de 1972



A mesma já vincula a Alemanha, a Áustria, a Bélgica, o Chipre, a Eslovénia, a França, a Grécia, a Hungria, a Irlanda, a Itália, a Lituânia, o Luxemburgo, Malta, os Países Baixos, a Polónia e o Reino Unido na União Europeia, bem como a Bósnia-Herzgovina, a Croácia, a Geórgia, a MacedóniaFYROM, o Montenegro, a Sérvia e Turquia, fora da EU



Da responsabilidade do hoteleiro pelos pertences dos hóspedes, no Direito Português  No estrito entendimento do Art.º 8.º n.º 2 da Constituição da

República, esta Convenção não relevaria para a Ordem Jurídica Portuguesa. Porém, a realidade exige um questionamento adicional.

Assim, 

no Considerando 19 da Directiva 90/314/CEE do Conselho, de 13 de Junho de 1990, relativa às viagens organizadas, férias organizadas e circuitos organizados, em sede de limitação de responsabilidade, a Convenção é enumerada como um dos instrumentos internacionais que servem para balizar o regime comunitário a introduzir



adicionalmente, este regime era comum a quase todos os Estadosmembros à data do ingresso de Portugal, e de Espanha, na Comunidade Económica Europeia, sendo a única excepção a Dinamarca, o que o permitiria considerar como parte do acquis que assumimos em 1985, o qual não se refere apenas aos actos normativos

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um argumento adicional encontramo-lo em sede de autoregulação: o Regulamento Internacional de Hotelaria, de 2 de Novembro de 1981, aprovado pelo Conselho da IHA, actual IH&RA, em Catmandu, Nepal, dispõe que, na ausência de disposições da legislação nacional, aplicarse-á o disposto na Convenção (Art.º 1.º da II Parte – Outras Obrigações)



e o Regulamento é normalmente seguido pelo Trade, enquanto parâmetro de boas-práticas, sendo até indicado como integrando os contratos, tanto de alojamento como de viagem organizada, id est, releva, pelo menos, enquanto repositório de cláusulas contratuais gerais e em Portugal, o Art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 251/84, de 25 de Julho, sobre turismo de habitação, dispôs que “Em tudo o que for omisso, aplicar-se-á, com as necessárias adaptações, a legislação hoteleira vigente e os princípios gerais decorrentes do Regulamento Internacional de Hotelaria.”



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