Apontamentos para uma História dos Ciclos Políticos, Econômicos e um Percurso Histórico na Bolívia do século XX

August 31, 2017 | Autor: Daniel Chaves | Categoria: Bolivian studies, Bolivia
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Apontamentos para uma História dos Ciclos Políticos, Econômicos e um Percurso Histórico na Bolívia do século XX Daniel Chaves*

Resumo:

Para concretizar o nosso objetivo central deste texto, que é a narração breve recheada de apontamentos para uma história da Bolívia no século XX, com ênfase no entrecruzamento das histórias dos polos de poder estabelecidos progressivamente em Santa Cruz e La Paz, nos voltaremos aos marcos elementares para compreender melhor os últimos 50 anos, que merecem maior destaque pela sua notável vivacidade e intensidade. Buscaremos, portanto, compreender como se relacionam estes processos históricos na formação da Bolívia contemporânea, como incidem em tópicos específicos do próprio centro da discussão histórica boliviana. Uma trajetória singular de disputas étnicas, raciais e políticas, que merece exame profícuo para uma compreensão no tempo presente.

Palavras-chave: Bolívia, Tempo Presente, Santa Cruz, La Paz. Resumen:

Para lograr nuestro objetivo de este texto, que es el percurso y apuntes hacia una historia de Bolivia en el siglo XX, con énfasis en el entrecruzamiento de historias de los polos de poder establecidas progresivamente en Santa Cruz y La Paz, vamos a utilizar los puntos de referencia primaria para entender mejor los últimos 50 años, que merecen mayor atención por su vivacidad y intensidad. Tenemos la intención, asi, em comprender cómo se relacionan estos procesos históricos en la configuración de Bolivia contemporánea sobre temas específicos, y mas, con el centro de la discusión histórica Bolivia. Una trayectoria singular de razas y etnias que merece un examen fructífero para la comprensión de la actualidad.

Palavras-clave: Bolívia, Tiempo Presente, Santa Cruz, La Paz.

Revista Estudos Amazônicos • vol. VIII, nº 2 (2012), pp. 117-164

Um dos pilares destacados na nossa modesta prerrogativa de construção teórica e epistêmica para o arrolamento deste estudo histórico na sua relação direta parte da racionalidade crítica do Tempo Presente enquanto perspectiva plural e cuasi metamórfica de construção do conhecimento - na medida em que não se constitui enquanto „camisa de força generalizante‟ das grandes escolas e periodizações historiográficas.1 Não seria adequado restar importância maior ou menor para essa conjuntura política em análise por razão de qualquer proximidade temporal com relação ao período de confecção deste trabalho, bem como é necessário entender que a História do Tempo Presente enquanto campo de tensões teórico-epistemológicas deve ser compreendido de forma mais ampla que simplesmente uma “história do presente”, ou como um salvo-conduto para que o historiador possa exercitar seus estudos em períodos mais próximos da contemporaneidade. Teixeira da Silva fala sobre o tema: (...) a história do tempo presente é um campo novo, mesmo muito recente, entre os historiadores. As suas origens se prendem à percepção por parte de alguns historiadores de uma censura social, de uma pátina do esquecimento, que interditava a explicitação de muitas das lutas mais contemporâneas.2

Exatamente sobre as pátinas de esquecimento, as questões sobre a veracidade e a totalidade em vias de esquecimento é que devemos nos apoiar para entender que o entrecruzamento dessas histórias,

comparadas,

nos

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subsidiará

amparo

para

que

reconheçamos os pontos nevrálgicos onde o passado é escondido e os paralelos são criados para se afastar no horizonte.3 Nos múltiplos encontros dos processos políticos históricos, forja-se a trama para uma história do tempo presente que não transforme o tecido social em retalhos e eleja o método comparativo. Segundo Lagrou, a prática dos historiadores do „tempo presente‟ – independentemente de qualquer pressuposto ou de qualquer definição – parece bem confirmar que „o presente começa cada vez com a última catástrofe datada‟ ou, ao menos, com a última grande ruptura4. Não é possível se portar como um admirador do passado e perder de vista a primeira revolução democrática do século XXI e as suas contradições mais íntimas, que com alguma probabilidade será matricial em alguns anos para estudos ulteriores sobre o “tempo presente” da alta contemporaneidade boliviana, quando se buscar compreender as razões e as tensões que conduziram um singular processo histórico em meio às transições não anunciadas do século XXI pós- “fim da história”5 . Indagações profundas que estão invariavelmente ligadas à fundação do tempo presente precedente destas transformações nos remeteriam diretamente à Revolução Nacionalista de 1952, quando se afirmou definitivamente a questão indígena e o nacionalismo de esquerda nas suas relações com o Estado. Ainda, é preciso estar atento sobre como estas relações se entrecruzaram com as dinâmicas regionais ligadas à planície de Santa Cruz, que

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também nos são igualmente interessantes. No entanto, é possível crer que o evento relacionado à 1ª revolução democrática do século XXI, sendo não só a eleição do 1º presidente indígena do país como também o 1º presidente eleito efetivamente pela sua maioria nas urnas do país - e quiçá mais, com a refundação nacional pela Carta Magna de 2009 - nos rende subsídios suficientes para abalizar essa produção de um novo marco para um novo presente na história boliviana. Conforme nos explicou Lagrou, essa última „catástrofe‟ dada é sempre definidora com relação ao presente e ao tempo vivido. Nesse sentido, é pertinente que se situe para balizar a percepção temporal aqui trabalhada no recorte (2003-2008), o marco da Revolução Nacionalista de 1952 para a compreensão da contemporaneidade política boliviana, contendo as transformações fundamentais da sociedade hoje constituída. E, mantendo a perspectiva enunciada por Kocka para trabalharmos com a noção de que uma história entrecruzada é pertinente como forma mais aguçada, para articularmos, primaremos invariavelmente por uma história comparada que aproxime ainda mais as trajetórias, os impactos e as transformações relacionadas aos fenômenos e objetos históricos em comparação. Assim, compreender-se-á aqui que tanto nos polos político-econômicos de La Paz e de Santa Cruz, as implicações destes fenômenos se deram de forma igualmente relevantes, cada qual com a sua particularidade.

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Sobre um período que pode ser destacado como instável e marcado pela ruptura que funda o século XX boliviano. Segundo Alfredo Camargo, a “convenção [constitucional] de 1880, que deu à Bolívia nova constituição, consagra o término do período preponderantemente caudilhista-militar (...). O novo Estado que conforma é civilista e oligárquico, nos moldes do liberalismo clássico dos fins do século XIX”.6 Neste panorama, adjacente a já transcorrida Guerra do Salitre7 começada em 1878, nota-se uma profunda crise intra-oligárquica que confrontou os partidos Conservador e Liberal, que por sua vez dividiram o poder desde o início do século XIX até a década de 20. Posteriormente, quando estoura a Guerra do Chaco (1932-1935), novo sismo ocorre na história do país. Retomaremos este último conflito em alguns momentos para analisar como os conflitos militares envolvendo o país, proporcionaram impactos na determinação da sua história política, econômica, social e institucional. Retornando ao processo que desemboca na Guerra Civil de 1899, é possível que se afirme com segurança que este confronto se deu em duas frentes claramente delineadas, que posteriormente se entrelaçariam na associação de grupos sociais distintos. Por um lado, a revolta de quéchuas e aimarás liderada pelo representativo Zárate “Mallku” Willka, que lutava pela “restituição das terras comunitárias usurpadas e a concessão de autonomia administrativa às comunidades indígenas”.8 Por outro, a já citada crise intraoligárquica,

envolvendo

Liberais

e

Conservadores,

estava

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diretamente relacionada à transição do ciclo extrativista da prata para o estanho. Com essa mudança, reordenar-se-ia o próprio arranjo político interno do país e Sucre, próxima às minas de Potosí e antiga capital, perderia os poderes legislativo e executivo para La Paz, mais próxima às minas de estanho em Oruro. É possível destacar aqui a determinação dos ciclos de extrativismo mineral, então atividade quase única do país, é indubitável sobre os conflitos que via-de-regra incidiram nas transições institucionais do século XVIII e XIX. É possível dizer, igualmente, que a confluência entre estas duas frentes na Guerra Civil de 1899 decorre do esgotamento geral do sistema econômico e político liberal vigente, somado a ressurgência da pertença coletiva entre os indígenas sobre as terras comunitárias usurpadas - que, paradoxalmente, fora fundamental para a vitória liberal através da aliança tática confeccionada entre Willka e José Manuel Pando, líder liberal. Sendo interessante observar também a presença já marcante do regionalismo nas questões internas bolivianas, envolvidas nesse momento por tensões entre norte (La Paz) e sul (Sucre), está-se diante da relevância de disputas de etnicidade e recursos naturais envolvendo os ciclos políticos e econômicos do país. Restava para Sucre, capital „provisória‟ desde a fundação do país em 1825, apenas o poder judiciário. E o federalismo, bandeira liberal, não deixou neste momento o caráter propositivo para se efetivar em realidade, bem com as autonomias indígenas não se concretizaram. Formar-

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se-ia, então, uma paz liberal que se estenderia até a Guerra do Chaco e que sufocaria tanto as aspirações indígenas, quanto as federalistas. É pertinente notar que na região de Santa Cruz, sobre este momento, a historiografia regional destaca esforços na direção de uma compreensão mais apurada sobre o desenvolvimento da sua economia agropecuarista e na expansão das conexões viárias com Cochabamba, principal via para escoamento dos seus produtos. Os conflitos internos pelo poder no país, até este momento, não haviam atingido Santa Cruz, região relativamente distante, cuja produtividade

ainda

não

era

expressiva

e

tampouco

demograficamente relevante. Segundo Roca, Los cruceños sabían, por experiencia de siglos, que su economía de base agropecuaria no tendría futuro alguno si no encontraba una conexión vial permanente con la vecina Cochabamba. La necesitaban porque además de ganar ese mercado del valle, el mismo servia de tránsito para llegar al otro más distante y mucho más amplio: el de La Paz y las minas. Desde fines del siglo diecinueve, los cruceños estaban sufriendo en carne propia las consecuencias del aislamiento a que la había sometido el ferrocarril que venía del Pacífico.9

Ainda segundo Roca, discutia-se intensamente nos círculos das elites empresariais de Santa Cruz das primeiras décadas do século XX, o interesse mineiro das elites liberais de La Paz em aproximarse dos mercados estrangeiros através do Oceano Pacífico, em detrimento da incipiente integração nacional viária - inclusive,

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ainda segundo Roca, pelos produtores crucenhos10 - que, não desenvolvida, relegava os produtores orientais a um isolamento infértil. Não menos impactante, os produtos do país vizinho Peru que desfrutava de uma geografia favorável às trocas com La Paz chegavam com muito mais facilidade tributária e logística a nova capital boliviana, o que gerava profunda insatisfação em Santa Cruz, uma cidade então pequena e bastante empobrecida. Não menos importante, é necessário citar a exportação primária não-manufaturada do estanho, então responsável por 60% do comércio exterior nacional,11 como elemento envolvido no arranjo que conduzirá a Bolívia a Revolução de 1952. A economia mineira fora duramente atingida pela crise mundial de 1929, mesmo que a burguesia proto-especulativa do país - simbolizada na figura de Simon Patiño, El ‘magnate’ del Estaño - flutuasse pela crise sem grandes prejuízos, devendo a isso as suas conexões corporativas com os compradores estadunidenses. Mas, ainda assim, como em toda a periferia então dependente do capital internacional, essa crise abalroaria a economia nacional boliviana. A questão daí derivada, no entanto, era a deficiência clara de um mercado interno minimamente sólido e uma concentração de produção e renda entre pequenos cartéis proprietários das minas, resultando em uma situação social catastrófica. Ainda segundo Everaldo Andrade, (...) a deterioração da economia e a tensão crescente das relações políticas internas aumentavam as dificuldades do governo de Daniel Salamanca. Nas eleições de 1931, ele perdeu a

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maioria no Congresso. Nas ruas, as greves e os movimentos de estudantes cresceram. Em 1º de Julho de 1931 Salamanca surpreendeu a todos rompendo relações com o Paraguai depois de um pequeno incidente de fronteira”.12

Alguns autores, como Corum13, discordam do caráter súbito e inesperado dessa ação e narram que a região do Chaco Boreal já era uma preocupação geoestratégica da Bolívia desde a década de 20. Segundo este último, a própria chegada de Kundt nos anos anteriores teria o propósito da obtenção do Chaco Boreal, mesmo que Kundt jamais tivesse pisado na região. Ayerbe (2002)14 ainda enuncia que o motivo da guerra seria a pretensão boliviana de ter acesso ao Rio Paraguai através do Chaco Boreal, convergindo com a explicação de Corum. De qualquer forma, ao se assinalar a questão dos recursos naturais como foco da disputa (ou do ataque, supondo que este seria estritamente causado pelos bolivianos) apresenta-se uma proposta interessante, visto o solavanco causado pela crise de 29 na economia boliviana e, ainda mais, com a mediterraneidade da Bolívia após os conflitos com o Chile e com o Brasil, quando perdeu suas saídas para os oceanos Pacífico e Atlântico, respectivamente. A Guerra do Chaco foi um conflito indubitavelmente desconectado da realidade socioeconômica e política do país, já fragilizada; ainda, com um notório descarte da via das negociações com o Paraguai. Conforme as expectativas bolivianas, poderia ser a válvula de escape para a descompressão do crítico cenário interno, com uma guerra de conquista rápida e surpreendente contra o Revista Estudos Amazônicos • 125

exército paraguaio - então sem esforços direcionados para este conflito - e que, ainda, poderia servir ainda para ter acesso às supostas reservas petrolíferas que auxiliariam a recuperação da economia nacional. Reservas estas que, aliás, jamais existiram. O exército boliviano, liderado pelo general prussiano Hans Kundt, foi duramente derrotado pelos paraguaios e saiu do conflito com um saldo de 60.000 mortos, aproximadamente, segundo Andrade. Como resultante político direto da Guerra do Chaco, as classes médias urbanas eram cada vez mais atingidas pelos seguidos insucessos liberais e se condensava um senso cada vez mais interessado no desenvolvimento nacional, até então inexistente. Por outro lado uma inteira geração desiludida com o nacionalismo republicano e sem confiança nas instituições nacionais reúne-se e forma o Partido Obrero Revolucionario (POR). Organizado em meio a Guerra do Chaco, em 1934, o POR começou como um partido notoriamente intelectual, mas progressivamente foi substituído por uma direção sindicalista que se manifestou cada vez mais contrária aos partidos socialistas „pequeno burgueses‟ ou intelectuais15. A crise social se acentuara, com um enorme grupo de indígenas e populares sacrificados pelo conflito - ou ainda desertados - e cada vez mais insatisfeitos com a aguda condição social e política do país, que perdera neste conflito um importante território, parte integrante do departamento de Santa Cruz. Nesta região, uma dura crise da borracha e da castanha tornava as já duras condições de

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vida ainda mais difíceis e o departamento do Beni era criado pelo general Pando. Segundo Ximena Soruco, Sin embargo, durante la primera mitad del siglo XX, después de la caída del precio de la goma y con un breve momento de incentivo económico con la Guerra del Chaco, y la necesidad de alimentar y mantener a las tropas, la economía regional de Santa Cruz se contrae.16

É neste mesmo instante que começa se transformar a economia de Santa Cruz, com presença já consolidada e atuação especial dos imigrantes alemães, suíços e austríacos (instalados desde o último quartel do século XIX) que reorientavam a economia local para o comércio de importação associado à agropecuária e ao transporte fluvial, com iniciativas que incluíam a fundação do Banco Santa Cruz.17 Trata-se de um período da história regional de Santa Cruz marcado pelo caráter clânico das relações comerciais ainda desmobilizados com relação às suas associações e organizações políticas, associado a um impulso migratório induzido por estas mesmas elites e por intensa ligação com capitais europeus, que por sua vez seriam parte da esteira para a chegada destes imigrantes. 18 Nos termos de Soruco, é necessário (…) relacionar goma y agroindustria, es decir, la goma se convierte en la acumulación originaria – junto a la inversión estatal desde 1952– para el desarrollo de la agroindustria tal como hoy la conocemos. De ahí que la descripción de las casas comerciales alemanas y en general europeas, fundadas con capital de la goma, son centrales para este estudio pues muestran nítidamente el paso de

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la goma al comercio y posteriormente a la actividad agropecuaria. Al describir las casas comerciales europeas en Santa Cruz, identifiqué a extranjeros y nativos (criollos y mestizos) en este proceso inicial; sin embargo a la larga esta división se torna borrosa. Los extranjeros que formaron casas comerciales en Santa Cruz y sobrevivieron al auge de la goma, se casaron con mujeres bolivianas, ingresaron a los círculos exclusivos de la élite local (clubes sociales, fraternidades, cámaras de productores y comerciantes, y posteriormente las cooperativas de servicios básicos, bancos, las corporaciones de desarrollo regional y hasta el engranaje político en diferentes etapas).19

Portanto, ainda que aparentemente isoladas do poder local, as elites regionais de Santa Cruz e a própria economia local estavam integradas a lógica processual da Bolívia durante a 1ª metade do século XX. Não é possível destacar, contudo, nenhuma capacidade de se organizar politicamente para reivindicar com preeminência qualquer papel dentro do Estado boliviano, já que se caracterizava por uma baixíssima densidade demográfica, economia ainda mono-extrativista e sociabilidade nucleada ainda em bases familiares restritas. Mesmo assim, é possível identificar que a lógica política das elites nacionais se integrava neste período, como se refere no texto aqui e acolá, na mesma derivação das suas atividades econômicas extrativistas, ainda que os barões do estanho do altiplano tivessem obtido êxito na cooptação do Estado nacional para os seus interesses, diferentemente dos barões orientais.

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É neste momento, inclusive, que o seu primeiro conterrâneo, Germán Busch Becerra, assume a presidência da República. Busch teve seu governo caracterizado pelo personalismo e pela ausência de qualquer aparato político que sustentasse as suas medidas,20 sem que

representasse,

contudo,

bandeiras

quintessencialmente

crucenhas. Sua atuação seria fundamental durante a derrocada de Daniel Salamanca, agindo então como chefe da polícia nacional boliviana e colaborando na instalação de David Toro no poder - o mesmo Toro que, anos depois, curiosamente seria derrocado por ele para chegar ao poder. Durante a sua gestão foram promulgadas leis e decretos relativamente progressistas como o Código de Trabalho - conhecido como Código Busch -, além de ter sido alçada também a “Ley de Regalias”, também conhecida como a lei que redimensionou a lógica da distribuição dos royalties de exploração do petróleo e gás. Esta lei, de 1938, estipulava que todo o arrecadado pelo governo central seria redistribuído igualmente entre os nove departamentos bolivianos - e, portanto, 11% para cada um destes. Segundo Bryan Lijerón, Se merece un reconocimiento especial al Gral. Germán Busch que participó valientemente en la contienda [Guerra do Chaco]. Posteriormente durante su presidencia se promulgó en 1938 la Ley de regalías que beneficiaba con el 11% a los departamentos productores de hidrocarburos. Esta ley fue ideada por el propio Busch y su Ministro de Minas y Petróleo, Dionisio Foianini.21

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Precisamente neste momento, segundo a convergência das narrativas mapeadas sobre a história regional crucenha, se daria o primeiro impulso do século XX na direção de uma redistribuição mais equitativa dos capitais arrecadados pelo executivo nacional junto aos departamentos - o que sugere marcar aqui a discussão em torno dos 11% da „Ley de Regalias‟ como fundamental quando ressignificada para eventual sustentação histórica da questão autonomista22 no século XXI pela direção da prefeitura departamental associada à direção do Comitê Cívico Pro - Santa Cruz, seu principal aparato civil de apoio político.23 Ainda no altiplano, formava-se progressivamente nas classes médias urbanas, especialmente entre intelectuais, burocratas e profissionais liberais, um sentimento de profunda insatisfação com relação ao jogo oligárquico liberal censitário e desintegrado da sociedade boliviana, ao mesmo tempo em que se conformava o desejo por um país menos suscetível às intempéries do mercado internacional. Aspirava-se, na esteira da formação de um país, uma identidade nacional pós-Guerra do Chaco desinteressada sobre os determinismos racialistas que obliteravam a formação da bolivianidade. Por trás de todos estes indicativos perpassava a vontade por participação e representação que desembocaria em um partido político multiclassista, nacionalista, que fosse capaz de agregar e aglutinar os grupos sociais representativos da Bolívia então contemporânea. Surgia nesse contexto o Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR) em 1941, partido centrista que 130 • Revista Estudos Amazônicos

assumiria papel central na Revolução de 1952 e deslocaria de vez os últimos resquícios de espectro ideológico dos liberais sobre a sociedade boliviana. Segundo Camargo, Nascido do esgotamento da república oligárquica e apoiada em várias classes e setores – burguesia comercial, intelectuais, operários mineiros e camponeses – o MNR, imbuído de visão integradora da sociedade boliviana, traduziu-se em ampliação radical do espaço de participação política, mediante a introdução do voto universal, caracterizando-se, ao mesmo tempo, pela adoção de modelo centralizador dos instrumentos decisórios e administrativos do Estado. Tanto a centralização administrativa quanto a universalidade de representação política – verdadeiro binômio, por assim dizer – representam conseqüências lógicas do cunho multiclassista.24 Seu programa, que basicamente discutia a abolição das estruturas oligárquicas „feudais‟, o apoio a liberação econômica anti-imperialista e a iniciativa de uma reforma agrária, entre outras questões consideravelmente progressistas para o cenário boliviano em questão. Obteve bastante adesão no momento seguinte a sua fundação ao apoiar boa parte dos sindicatos mineiros, no processo de estreitamento de relações com a da Federação Sindical dos Trabalhadores Mineiros Bolivianos (FSTMB). Nessa mesma década, o congresso mineiro da FSTMB, então ligada ao POR, se reúne na mina Pulacayo e ali se formam as Teses de Pulacayo (1946), fundamentais para a consolidação da luta Revista Estudos Amazônicos • 131

operária na Bolívia ao requerer o controle das minas e a formação de

milícias

urbanas

revolucionárias,

além

de

orientar

ideologicamente o radicalismo das ações sindicais bolivianas pelos próximos 60 anos. Estariam marcados, claramente, os indicativos anti-imperialistas, anti-colaboracionistas e unitaristas em relação ao movimento operário, com ênfase na formação de uma Central Operária única, superando as fissuras do movimento para avançar no projeto revolucionário em questão.25 Tornava-se cada vez mais intenso o processo de emancipação política e ideológica dos movimentos operários sindicalizados com relação às estruturas patronais, e por sua vez a queda-de-braço com o poder instituído se mostrava franca devido à alta adesão popular junto aos sindicatos.

Manifestações,

econômica

fragilizariam,

repressão sem

policial

dúvida,

o

e centro

debilidade político

tradicionalmente instituído no altiplano. Já em Santa Cruz, o cenário era bem diferente. A década de ‟40 é caracterizada pela capacitação financeira e industrial dos proprietários de terra, orientando o então tímido desenvolvimento da economia regional agropecuarista - e sem a presença de um movimento operário, ou melhor, neste caso, tratar-se-ia de um movimento camponês. Uma questão nacional com relação a este desenvolvimento agrícola seria, neste momento, a de integrar o Oriente - e mais especial, Santa Cruz e o Beni - ao restante do país, para que a sua produção pudesse alcançar os mercados andinos através de Cochabamba. 132 • Revista Estudos Amazônicos

Na medida em que estamos de fronte da primeira iniciativa que se concretizou nos termos de uma integração viária para fortalecer a união entre os mercados da planície e da cordilheira no século XX, rapidamente o calor das questões políticas contemporâneas relança luz a uma das questões mais polêmicas da historiografia boliviana, estando claramente tensionada entre autores pró Santa Cruz e autores nacionalistas. O que se discute, nesse sentido, é se essa integração ocorrida na década de ‟40 - o “Plan Bohan” - teria o seu impulso primordial lançado por La Paz, autonomamente, como capital que deseja a integração nacional, ou se foi por iniciativa dos EUA que por sua vez estariam entusiasmados em apoiar os pleitos alavancados pelos próprios crucenhos. O que entra em questão, objetivamente, é a responsabilidade sobre o primeiro impulso efetivo para integrar Santa Cruz ao altiplano, ação esta fundamental para o desenvolvimento da indústria e do comércio crucenho como o conhecemos no século XXI. E esse impulso lançaria gradativamente Santa Cruz para a ambiência política nacional, o que não ocorrera antes com tal efetividade. Nos termos de Costas Lijerón, que claramente atribui a responsabilidade a uma iniciativa norte-americana para o desenvolvimento

da

economia

boliviana

que

teria

sido

passivamente implementado pelo governo boliviano,

En 1942 una comisión estadounidense, presidida por Mervin Bohan, presentó al gobierno boliviano un programa alternativo para la economía nacional

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conocido con el nombre de “Plan Bohan”, que identificó las potencialidades de las tierras del oriente y las buenas condiciones para incentivar la agroindustria y la agricultura. Otra recomendación de este plan era la necesaria construcción de una carretera que una a Santa Cruz con el occidente a través de Cochabamba, la cual fue inaugurada en 1954 y permitió la integración cruceña con el resto del país a la vez que reemplazó la idea del ferrocarril.26

Ainda, outro ponto de vista expresso por Saucedo (2008), atribui de forma ainda mais plena a responsabilidade aos EUA como financiadores e executores da obra (e por sinal, comemora esta responsabilidade): Esta nueva Bolivia, instaurada con el Plan Bohan, fue ideada, planificada, financiada, ejecutada, administrada y fiscalizada por los EEUU. Los bolivianos fuimos verdaderos convidados de piedra en este plan, gracias a Dios. La marcha hacia el Oriente no fue otra cosa que la consecuencia lógica del Plan Bohan. La búsqueda de un futuro mejor para muchos bolivianos, con deseo de progresar, en una Bolivia minera agobiada. 27

Independentemente de qualquer perspectiva, é possível dizer que o Plan Bohan, superando qualquer discussão de ordem ideológica, é fundamental para que se compreendam as relações entre as fazendas de Santa Cruz e o seu desenvolvimento nos anos seguintes, incluindo-se aí as iniciativas do governo nacionalista de 1952 que tramaram a “marcha para o oriente”, uma região indômita e com baixa densidade demográfica. A própria „Marcha‟ foi resultante da experiência militar do Chaco, que entre outras

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situações insólitas, tornou-se fracassada por problemas logísticos graves que envolviam até mesmo o fornecimento de gás e água para as tropas nacionais lançadas em postos avançados no Chaco, que muitas vezes morreram de sede e fome. Segundo Dunia Sandoval, o plano teria sido uma compensação dos EUA para a Bolívia por conta do apoio aos aliados, com o fornecimento de estanho e a produção de petróleo e gás, além da própria agroindústria, e essa verdadeira coluna vertebral rodoviária teria sido fundamental para o que hoje se conhece em termos de desenvolvimento econômico no departamento de Santa Cruz.28 Essa comunicação cada vez maior entre o altiplano e a planície teria permeado, inclusive, a própria formação das frentes políticas em Santa Cruz - e mais uma vez, é colocada em risco a validade de um discurso que valida a total desconexão de Santa Cruz do resto do país. Ainda nos termos de Dunia Sandoval, a própria formação social pós-Guerra do Chaco teria contagiado Santa Cruz na medida em que as insatisfações coletivas dos indígenas, operários ou camponeses, além de jovens e cidadãos que tinham pequenas propriedades teriam se confluído e intercomunicado na experiência do campo de batalha e da repartição das perdas após o conflito. 29 A formação da “Legião de Ex-Combatentes do Chaco” é uma das evidências

dessa

experiência

interclasse,

que



haveria

experimentado outros passos como na Revolta Federalista dos “Igualitários” em 1877, ou ainda durante as campanhas regionalistas pela conexão viária das primeiras décadas do século Revista Estudos Amazônicos • 135

XX, duramente condicionadas pelos resultados da Guerra do Pacífico: acordos de livre-comércio com o Peru e o Chile que priorizavam esses países em detrimento das trocas internas, além da própria perda da saída pelo Oceano Pacífico. O que Dunia Sandoval discute, contudo, é que essas experiências

interclasse

não

necessariamente

anularam

a

possibilidade de experiências operárias, contrariando a tese de que Santa Cruz havia modelado suas reivindicações políticas apenas através de movimentos regionalistas interclassistas, cuja defesa foi frequente no movimento autonomista conforme examinaremos posteriormente. Os próprios ex-combatentes orientais do Chaco formariam em 1944 - no mesmo período das „Teses de Pulacayo‟ e da formação da sindical FSTMB, portanto - a Unión Obrera, que se aglutinou ao Movimento Nacionalista Revolucionário (MNR), o qual se formava na década de ‟40 e conquistaria o poder em 1952 estando Santa Cruz, nesse sentido, ocupando um papel chave tanto nos conflitos civis do final dos anos ‟40 e até mesmo na vitória do MNR em 1952, quando os dirigentes regionais crucenhos ganharam as eleições.30 Em termos objetivos, a Revolução de 1952 foi um contragolpe de Estado liderado pelo Movimento Revolucionário Nacionalista (MNR) e pela Central Obrera de Bolivia (COB), colocando no poder o carismático presidente Victor Paz Estenssoro, que voltaria ao poder em mais quatro períodos de governo: 1956-60, 1960-64 e 1985-1989. Foi o resultado da associação política entre os já 136 • Revista Estudos Amazônicos

citados sindicatos mineradores de orientação política marxista, com as classes médias urbanas insatisfeitas com a preeminência do modelo liberal exportador-primário e com o sistema políticopartidário vigente desde o final do século XIX - e que havia gerado toda a trajetória catastrófica da 1ª metade do século XX. Entre os seus sucessos, promoveu uma intensa reforma agrária no altiplano, propôs a nacionalização de recursos naturais, inaugurou o sufrágio universal e aplicou uma reforma do sistema educativo. É possível que seja considerado o marco das transformações políticas no Estado boliviano, colocando o indígena, a classe trabalhadora e o nacionalismo de esquerda no poder como traços fundacionais da história contemporânea do país. A explicação clássica de René Zavaleta Mercado sobre a Revolução de ‟52, destaca-a adjuntamente a Guerra Civil de 1899 em “Lo Nacional Popular em Bolívia” como dois momentos „constitutivos‟.31 Nesse sentido, com uma interface conceitual bastante considerável com relação à noção de “tempo presente”, na medida em que explica a Revolução de ‟52 como a impossibilidade prática de manutenção de um determinado arranjo de tensões entre Estado e Sociedade Civil que subitamente se arrebenta e reordena as relações. Evidentemente, a explicação de Zavaleta Mercado mantém uma divisão gramsciniana entre Estado, para um lado, e Sociedade Civil, por outro, como duas unidades estanques, diferentemente da compreensão de Bedaridá ou Lagrou, por exemplo, que destacam a permeabilidade das responsabilidades Revista Estudos Amazônicos • 137

sociais e políticas entre toda a sociedade sem nenhum tapume entre Estado e Sociedade, na medida em que um constitui o outro de forma osmótica. No entanto, é bastante crível a ideia de que a Revolução de ‟52 transformou radicalmente a dinâmica estrutural da sociedade boliviana. O marco de ruptura central da Bolívia no século XX trouxe a inversão das possibilidades de mobilidade social, o fim da cidadania censitária para adotar o voto universal, o início da progressiva conversão da concentração demográfica no campo para as cidades, e acima de tudo, um plano audacioso de Reforma Agrária que expropriou grandes fazendas no altiplano boliviano. Para tanto, confrontou e dissolveu o Exército nacional, que havia participado de todos os círculos do poder político boliviano, e instalou em seu lugar milícias operárias e indígenas por um breve período. É importante situar os impactos da Revolução de ‟52 na política em Santa Cruz, especialmente no que está relacionado a terra e aos recursos naturais, questão política que até hoje persiste. Segundo Dunia Sandoval,

(...) en Santa Cruz, antes de la reforma agraria de 1953, existía una gran acumulación de tierras sin aprovechar. En su mayoría, los propietarios trabajaban en forma individual y en mucha menor escala contrataban jornaleros. La presencia de cooperativas y sociedades agrícolas era casi insignificante.32

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No entanto, a própria autora frisa que, ao contrário da política de dissolução das grandes propriedades no altiplano, em Santa Cruz o plano do governo do MNR desejava converter as propriedades em grandes empresas agrícolas, sendo assim uma espécie de „celeiro‟ para o país:

El proceso de reforma agraria en el Oriente fué distinto ya que el MNR contaba con un proyecto distinto para la región. Mientras en el Occidente se intentaba privatizar la tierra dotando a los campesinos de pequeños terrenos, en el Oriente, el proposito era construir empresas agrícolas”. 33

Ou seja, a progressista reforma agrária nacionalista de 1952 de alguma maneira estimulou o desenvolvimento agroindustrial em Santa Cruz, já que dinamizou consideravelmente a economia local com a perspectiva de incremento na produção, do aumento de mão-de-obra disponível - por sua vez produto das migrações internas fortalecidas pelo MNR. Nos termos de Roca, “La nueva industria produjo demanda de profesionales, técnicos, operarios y administradores, además de mano de obra para la construcción de galpones, viviendas y aulas escolares”.34 Ainda assim, o período deve ser aqui trabalhado de forma mais consistente

ao

passo

que

determinadas

transformações

institucionais desta época foram cruciais para os próximos 60 anos na região. Essa própria modernização de Santa Cruz que era empunhada pela reforma de 1953 - concluída ao mesmo tempo Revista Estudos Amazônicos • 139

que a estrada Cochabamba-Santa Cruz - foi duramente contestada pela elite regional, que via enorme risco a sua posição na transformação da grande propriedade (o latifúndio) em empresa agrícola. Segundo Soruco, La Reforma Agraria de 1953 define la empresa agrícola como aquella que se caracteriza por la inversión de capital suplementario en gran escala, el régimen de trabajo asalariado y el empleo de medios técnicos modernos (art. 11). (…) Como se observa en esta definición, la empresa agrícola se opone al latifundio en tres aspectos: capital, salario y tecnología.35

Ainda no próprio trabalho de Soruco,36 está explícita a apreciação do Informe de Merwin Bohan no início dos anos ‟40, que afirma o investimento técnico quase nulo na seleção de solos, na colheita, plantio e muito menos na própria qualificação da mãode-obra, cuja organização da produção é caseira, de uso comum e com condições técnicas extremamente rudimentares para a produção de açúcar, por exemplo. Os dados do I Censo Agropecuário de 1950, apresentado por Soruco, reafirmam que a superfície cultivada do departamento de Santa Cruz equivale a apenas 8% da sua extensão, enquanto La Paz cultivava 32% - mais que o triplo em hectares. Ainda, o número de fazendas quantificadas pelo Censo chegou a 907 em Santa Cruz, enquanto La Paz possuía 1.958 unidades - mais que o dobro, o que novamente nos indica a crer na quantidade elevada de grandes propriedades. Os dados ganham dimensão ainda mais amplificada

140 • Revista Estudos Amazônicos

se levar-se em consideração que o departamento de Santa Cruz possui superfície três vezes maior que La Paz. Ainda, o abraço dado pela Revolução de ‟52 a „Marcha hacia el Oriente‟ envolveu a ocupação do Oriente pelos produtores camponeses pobres e indígenas do altiplano, que sem dúvida não seriam bem aceitos pelas elites locais. Aliás, é possível dizer que a formação das institucionalidades políticas da sociedade civil crucenha atende imediatamente a essa dinâmica. É importante notar que a própria fundação do Comitê Cívico Pro - Santa Cruz (CCPSC) ocorre em 1950, por iniciativa da Federação Universitária Local (FUL), existente desde a década de 1940, com o objetivo de reivindicar a sua parcela equânime (os 11% da “Ley de Regalias”) dos recursos hidrocarburíferos, que por sua vez seriam utilizados pela governança local para desenvolver projetos e obras ligadas às demandas

de

infraestrutura

em

uma

região

tida

como

relativamente abandonada no país. Em um raro esforço de quantificação e detalhamento do funcionamento interno do CCPSC, José Luis Roca nos descreve uma estrutura baseada em organizações sindicais, gremiais e empresariais. Ou mais detalhadamente, o estado de associação do CCPSC órbita, mutatis mutandis, na seguinte lógica: Una reforma estatutaria de 1997 amplió a 19 los „grupos de instituciones‟ afiliados que son actualmente las seguientes: agrupecuaria, campesinos y etnias autoctonas cruceñas, cívicas femeninas, cooperativas, culturales, deportivas, educativas, empresariales, estudiantes de secunderia y universitarios, fraternidades cruceñas,

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gremiales, juveniles, mutuales, excombatientes y jubilados, profesionales de nível médio, universitarios de nível superior, servicio a la comunidad, trabajadores a sueldo, transportistas, juntas vecinales cívicas. En el nuevo estatuto tienen mayor representación las instituciones provinciales a través de sus respectivos comités cívicos y otras entidades. Otra reforma importante es que para ser miembro del directorio o presidente del Comité, ya no es necesario ser cruceño de nacimiento; basta ser hijo de padre o madre cruceños.37

No mesmo impulso, surge a União da Juventude Crucenhista (UJC) e o Comitê Cívico Feminino, ambos em 1957. É interessante constatar que, em ocorrência francamente simultânea, desdobravam-se os embriões da luta sindical-partidária que geraria, entre os anos 1940 e 1952, as Teses de Pulacayo, a fundação e queda do Partido Operário Revolucionário (POR), a ascensão dos movimentos mineiros da Central Operária Boliviana (COB) e o desfecho da Revolução Nacionalista de 1952. São impulsos iniciais por maior participação deliberativa no recolhimento e gestão da tributação local - possivelmente um impulso reativo desses grupos frente à predominância andina. Conforme comenta Helena Argirakis Jordán, (…) con la revolución de 1952, Santa Cruz ingresa en un proceso de modernización socio histórica y dicha base clánica se ve obligada a dar paso a una conformación más amplia de las élites locales entre aquellos que ocupan posiciones de prestigio, reconocimiento y autoridad, al poseer cualidades y aptitudes valoradas socialmente.38

142 • Revista Estudos Amazônicos

O governo revolucionário do MNR iniciado em 52 permaneceria por mais dois mandatos, até a derrubada do 3º governo Paz Estenssoro em 1964. A incapacidade do MNR em sustentar a governabilidade já debilitada pelas inúmeras rachaduras dentro do próprio partido, que sofria pressões típicas de movimentos políticos policlassistas, somou-se a hiperinflação, ao insucesso da reforma agrária e pela deficiência na produção de alimentos e principalmente a inépcia no controle e planejamento econômico pós-nacionalizações mineiras, levando o Estado a compensar os antigos proprietários de modo a quebrar o país, potencializando imediatamente os setores à esquerda do governo a se indispor com as medidas de contenção da crise. Este período pode

ser

caracterizado

pela

ausência

de

eleições,

com

concomitantes golpes de estado e governos de curtíssima duração, que por sua vez alternavam orientações ideológicas liberais - como por exemplo, o próprio Barrientos Ortuño, que era adepto do livre-mercado e do estreitamento do relacionamento com os EUA, já bastante desenvolvido - e esquerdistas - como Juan José Torres, cuja figura política se desenvolvia baseada no general Velazco Alvarado no Peru, para instituir um „socialismo‟ autoritário, de base popular, mas com a garantia da lei e da ordem assegurada pelas Forças Armadas enquanto aparato coercitivo. Crescia a bola de neve política do MNR a cada dia e as decisões políticas se mostravam cada vez mais insustentáveis: o próprio vice de Paz Estenssoro, René Barrientos Ortuño, que havia o apoiado Revista Estudos Amazônicos • 143

desde a Revolução de ‟52, desfechou um golpe de estado militar contra si antes da posse em 1964. É preciso dizer, nesse sentido, que os próprios militares de alta patente que auxiliaram o MNR na reconstrução das Forças Armadas no período posterior a Revolução, foram os mesmos que depuseram Paz Estenssoro com o apoio de setores camponeses insatisfeitos com o MNR, e alojaram-se de forma errática e instável no poder pelos sete anos seguintes. Nessa espiral descendente, com sete presidências em apenas sete anos, revezando-se quatro figuras políticas nesse sentido, deve ser destacada a tradição de militares envolvendo-se na política a partir de práticas políticas personalistas. No entanto, neste período - e mais notadamente na figura de Juan Jose Torres a presença militar constitui-se na questão nacional de forma diferenciada do período liberal, e mais notadamente isso ocorre no tocante aos recursos naturais e a soberania nacional, cuja relação e associação impactariam diretamente anos depois nas relações Bolívia-Brasil durante a nacionalização dos hidrocarbonetos em 2005, sob o decreto “Heroes del Chaco”.39 Nesse contexto castrense e na década de „70, o General Juan José Torres, que teria agido por influência pelas tendências intelectuais relacionadas ao conjunto de formulações conhecido como “Teoria da Dependência”40 e, com corte anti-imperialista e retórica popular, buscou a promoção da Bolívia como um país em desligamento da periferia do sistema capitalista. Seu projeto, contrário a 144 • Revista Estudos Amazônicos

(…) la presencia monopolica, que representa un desplazamiento de riqueza de los países monoproductores del afianzamiento de las estructuras nacionales de los países subdesarrolados”, pretendia enlaçar “el proceso de liberación conquista de la soberanía nacional sobre los recursos naturales de carácter esencial (…) como un proceso de creación de las industrias básicas.41

O general Torres chegou a convocar uma assembleia popular operária, instalada em junho de 1970, que teria os mesmos poderes de um parlamento regular, e trouxe novo embalo para as disputas sociais em uma Bolívia desacreditada pelos doze anos de governo MNR - a despeito do esvaziamento e posterior confrontação das próprias forças políticas sindicais organizadas, como a central COB. Nas palavras de Gallardo Lozada, as mudanças principais do governo com relação à ordem social e política se deram na medida em que El gobierno revolucionario adoptó una política de amplia apertura para la clase trabajadora del país. (…) El presidente de la republica invitó a los dirigentes de la COB para reunirse semanalmente en su despacho y analizar todos los problemas que surgieran en forma voluntaria o involuntaria. 42

Segundo Miguel Sá, (...) durante o século XX, a Bolívia nacionalizou duas vezes seus hidrocarbonetos. (...) A segunda nacionalização ocorreu em 1969, durante o governo do general Ovando Candia e sob influência de líderes socialistas como Marcelo

Revista Estudos Amazônicos • 145

Quiroga Santa Cruz, quando se expropriaram os bens, ativos e mercados da também norteamericana Gulf Oil Company (Carvajal, 2006).43

E, foi justamente na defesa dessa segunda nacionalização, que resultou na queda de Ovando Candia e na assunção de Torres, que surge um novo nacionalismo militar e anti-imperialista. Só que o próprio Torres, mantendo em voga a tendência de instabilidade dos últimos anos, encerraria esse ciclo com uma chegada distinta ao poder que, de alguma maneira súbita, pacificaria as tensões político-institucionais por “longos anos”, se levarmos em consideração a temporalidade e a durabilidade dos mandatos políticos na Bolívia na sua era republicana. Torres cairia após um governo enunciado como revolucionário e popular, mas que não durara mais que 10 meses, entre outubro de 1970 e agosto de 1971. As cisuras que o levaram para fora do Palácio Quemado se deram, por um lado, entre uma base aliada sectária, especialmente os setores trotskistas da COB que viam na sua derrocada um caminho para a sua chegada ao poder, e por outro lado, entre as próprias Forças Armadas anticomunistas temerosas que as tendências socialistas de seu governo pudesse resultar em nova dissolução das FA‟s, como ocorrera em 1952. E a partir de Santa Cruz, sua terra natal, e com o apoio dos EUA, Brasil e outros países que faziam parte do núcleo militar simpático às ideias anticomunistas e liberal-desenvolvimentistas (que formaria, anos depois, a chamada “Operação Condor”), o então 146 • Revista Estudos Amazônicos

coronel Hugo Banzer Suárez tomaria o poder com o apoio da „Junta Militar‟, que deporia Torres, e deixaria um rastro de mais de 200 mortes no país, somente na transição.44 Formado na Escola das Américas, então instrumento de instrução militar que também teve atuação política na formação ideológica dos oficiais que atuariam nas altas cúpulas dos países das Américas, Banzer governaria o país pelos próximos sete anos. Segundo Gallardo Lozada, o golpe contra Torres teria tido o apoio - ou senão, o consentimento - das duas principais forças políticopartidárias do país, a Falange Socialista Boliviana (FSB, de tendências fascistas) e o próprio MNR.45 O que é interessante notar para este trabalho é que, nessa narrativa, nota-se o primeiro intento objetivo da elite regional de Santa Cruz em se conformar como poder político definitivo na Bolívia, sendo inclusive o ponto de partida do movimento golpista que derrubou Torres. A narrativa in loco de Gallardo Lozada defende, na própria década de ‟70, o seguinte: En realidad, la gran estrategia acordada por el comando supremo de Santa Cruz de Santa Cruz tenía varias etapas, a saber: Si el golpe contaba con el apoyo de todas las guarniciones del país, Banzer había planeado para esa eventualidad la conformación de un gobierno provisional que se haría fuerte en Santa Cruz, inmediatamente lo reconocerían el gobierno brasileño y el paraguayo (…) en este caso la mejor alternativa, que también habían planificado fríamente los estrategas antinacionales del fascismo asesorados por el imperialismo yanqui, era la proclamación de la autonomía republicana del departamento de Santa Cruz que, como es de presumir, estaría bajo la

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tutela absoluta del Brasil (…) en él planteaba sin eufemismos, luego de un análisis geopolítico de la república boliviana, que la „gran nación camba‟ oriental de Santa Cruz, Beni y Pando debía mirar al naciente Atlántico como su única salida natural de progreso y bienestar, frente al occidente „colla‟ del que debía segregarse no sólo por múltiplas razones políticas y económicas, sino por tradiciones étnicas y culturales que obligaban a trazar una línea divisoria que escindiera al país en dos áreas independientemente influidas (…).46

Com segurança, não é possível dizer que Banzer jamais avançou em planos secessionistas para a região de Santa Cruz, visto inclusive que este plano esbarraria na impossibilidade prática até hoje persistente dos laços comerciais entre altiplano e planície; no entanto, deve ser marcada a presença de um discurso contrasecessionista (o que evidencia o seu polo oposto, ou seja, alguma marca separatista já presente) em uma fonte referente aos anos próximos ao golpe que anexa a iniciativa anticomunista castrense ao subnacionalismo camba em um caldeirão conservador.47 O que se destaca com efetividade e sem risco de falácia no período Banzer Suárez, que vai de 1971 a 1978, é o caráter repressivo do seu governo. No primeiro ano da sua gestão, através do lema “Orden, paz y trabajo”, Banzer desativou a COB e fechou as universidades do país, mantendo ainda um diálogo relativamente estável com as cúpulas dos partidos que apoiaram a sua chegada ao poder - o que implica em uma posição relativamente conciliadora, que senão manteve o pacto militar-camponês, ao menos teve tolerância com as lideranças partidárias. No plano econômico, 148 • Revista Estudos Amazônicos

abriu o país para os investimentos em petróleo e gás, aproveitando a “maré” positiva do governo Nixon, que duplicou a cooperação que rendia ao seu país, e outras transformações econômicas importantes para o futuro do país estariam em curso. Segundo Baptista Gumucio, Este fue el tiempo de la enorme expansión de la agricultura cruceña mediante créditos del Estado, destinados al cultivo y a la exportación da algodón, café, azúcar y madera, así como la ganadería. (…) Dos productos sustituirían con el tiempo el colapso que había significado para Santa Cruz la caída del algodón [a partir de 1975]: la soya y la cocaína, el primero de uso legal y la segunda de operación clandestina. La actividad del narcotráfico se había iniciado de manera subrepticia en los años sesenta y se señalaba al jefe de policía chileno Luis Gayan, que cayó con Paz Estenssoro, como uno de sus animadores. 48

Sobre este período, é possível dizer que este ciclo algodoeiro, cujo boom ocorreu entre os anos 1970 e 1975, contou com fortes subsídios estatais e pela conjuntura favorável de preço. E o resultado que nos interessa, a fim de compreender o entrelaçamento das dinâmicas nacionais na Bolívia e regionais em Santa Cruz, é que assim então surgiu a efetiva mecanização e modernização da agricultura crucenha, bem como o impulso fundamental para os fluxos migratórios intra-estatais na 2ª metade do século XX. A burguesia local obteve êxito no seu plano de agro industrialização

progressiva,

associando-se

aos

investidores

estrangeiros interessados em aplicar na região indômita os Revista Estudos Amazônicos • 149

resultados da revolução verde dos fins dos anos ‟50.49 Conforme enunciam Harnecker e Fuentes, Como resultado, la nueva elite emergente de Santa Cruz, vinculada a los agro-negocios y con claros intereses sobre la explotación del gas, fue recompensada por su papel en el golpe de estado. Las políticas regresivas de distribución de tierras de Banzer, el otorgamiento de créditos que nunca fueron pagados, y el dinero de las regalías obtenidas por la explotación del gas en esa región que no fueron redistribuidas al resto del país, sentaron las bases para que esta nueva élite se consolidara en el poder durante los regímenes neoliberales.50 Enquanto na planície arrancava um novo ciclo econômico que futuramente seria determinante para todo o sucesso e toda a instabilidade nacional das próximas décadas, o altiplano encarava seus primeiros rastros de decadência burguesa e da assunção de novas forças e formas políticas. Arregimentava-se de forma discreta e codificada um movimento político diferenciado, cuja organicidade não dependia mais de programas e matizes ideológicos orientados para a manutenção das variantes da república ocidentalizada e seus conceitos de democracia, participação, representação e organização política.51 É de suma importância compreender o processo de formação em torno do heterogêneo movimento katarista (inspirado no legendário herói indígena Tupac Katari, morto no século XVII pelas tropas coloniais), na medida em que a sua orientação diferenciada com 150 • Revista Estudos Amazônicos

relação às formas de organização e as agendas políticas tradicionais, bem como a sua argamassa identitária indígena, são fundamentais para se compreender a contemporaneidade política no país. Segundo Camargo, o movimento destacou-se por constituir o pólo de referência radical do discurso de autonomia indígena, constituindo símbolo poderoso de certo irredentismo aimará enraivecido52. Katari, nessa direção, era a ressignificação original e nacional apropriada para a retórica antiimperialista: antes, mortos pelos conquistadores; hoje, mortos pelo império. Igualmente, é importante elucidar que, ademais o katarismo se notabilizar pela sua orientação identitária distinta, cujos alicerces camponeses, comunitaristas, sindicais e indígenas são assaz próprios, denotam uma outra forma de aglutinação em torno do seu movimento como um somatório de experiência mais que propriamente o concatenar de comitês, seções eleitorais ou diretórios conforme um partido político. Dentre as várias incorporações culturais cuja influência política do katarismo seriam profundas neste momento, segundo Rocha, seria a atitude do movimento político, que (...) passou a utilizar a bandeira Wiphala, símbolo dos povos indígenas, e a recuperar tradições e o próprio uso do idioma [aimará]. O Katarismo usou intensamente as rádios, para transmitir programas e radio novelas em aimará sobre as lutas históricas desta etnia, e também para diversões cotidianas, como partidas de futebol e adaptações de filmes de sucesso.53

Revista Estudos Amazônicos • 151

Ainda segundo o Manifesto de Tihuanaco, The systematic attempt to destroy the Qhechwa and Aymara cultures is the source of the nation´s frustrations. Politicians from the dominant minorities have attempted to create a type of development based solely on a servile imitation of the development of other countries, while our cultural heritage is totally different.54

De acordo com este ponto de vista está Alfredo Camargo ao enunciar que (...) as emissoras aimarás puderam, durante muito tempo, escapar da censura imposta aos meios de comunicação – que somente atinge-as no final do governo Banzer –, tendo assim constituído, durante quase meia década, talvez o único veículo de comunicação livre em toda a Bolívia.55

Uma das chaves explicativas, exposta em Harnecker e Fuentes, traduz a formação camponesa dos movimentos sindicais - e não necessariamente operária - ao longo dos anos ‟60 e que havia se tornado própria e notória durante a Assembleia Popular do governo Torres como pontos de partida para a transformação das organizações genuinamente populares no país e organizadas em torno da auto-identificação indígena do movimento katarista. Nos termos próprios destes autores, a influência do movimento antiimperialista, revoltado com o neocolonialismo, revelou-se também na Bolívia: En 1973, los kataristas salieron nuevamente al escenario nacional, soltando su más importante manifiesto que definía las políticas de esta corriente. (…) se proclamó el manifiesto declarando „somos explotados como campesinos y

152 • Revista Estudos Amazônicos

oprimidos como indígenas‟ y „nos sentimos extranjeros en nuestro propio país‟.56

O movimento katarista, com a sua matriz nacional aimará, foi responsável pela reinserção dos cultos e símbolos autóctones, pela retomada estratégica do ayllu - unidade social básica do Império Inca - como espacialidade para a discussão da questão agrária, e mais importante, pela renovação simbólica da política a partir do abandono das figuras dos caciquistas caudillos criollos ou dos mallkus (chefes) indígenas, mas na atenção destinada ao mito do Pachacuti, de uma história milenar interrompida e que retornaria, nas palavras lendárias de Katari, através de „milhões e milhões‟. Com a sua matriz estritamente indígena, e não mais mestiça, e especialmente camponesa, foi o movimento katarista que deu origem a Confederación Sindical Única de Trabajadores Campesinos de Bolivia (CSUTCB), que se uniria a COB para formar novamente a união camponês-operária dos anos ‟50. No entanto, a CSUTCB não faria com que os movimentos sociais camponeses orbitassem novamente em torno da operária COB, seja pela energia adquirida pelos movimentos camponeses através das experiências durante os regimes de exceção - incluindo-se aí o pacto militar-camponês - e pela sua orientação étnica inédita; seja pela própria perda da vanguarda dos movimentos operários soterrados pelo sectarismo político e pela repressão dos regimes de exceção, por sua vez motivada na outrora preeminente representatividade sindical operária. Revista Estudos Amazônicos • 153

Ainda sobre a repressão no interior da questão política na segunda metade da década, o banzerato (como era alcunhado o governo de facto de Banzer Suárez) realiza um verdadeiro „golpe dentro do golpe‟, fazendo com que a repressão se tornasse ainda mais intensa e toda a atividade política seria proibida, com os principais e concorrentes líderes político-partidários sendo exilados sem possibilidade de negociação. Entre torturas, assassinatos e exílios forçados, mais de 3.000 pessoas, em sua maioria líderes políticos, foram perseguidos politicamente durante o „banzerato‟, caracterizando-se um período de intensa pressão política.57 Até hoje, por ausência de investigações abertas e julgamentos para revisar os porões da ditadura banzerista, não há um número exato (ou próximo disso) que enumere os desaparecidos. O Katarismo, por exemplo, só teria seus líderes restituídos e a sua força política recondicionada no final dos anos ‟70, com a anistia política relativa promovida pelo fim do governo Banzer Suárez. No entanto, os partidos políticos dominariam uma transição tortuosa e altamente voltada para uma perspectiva democrática parlamentarizada, sem nenhuma aspiração suficientemente representativa no sentido de alçar vôo a uma democracia mais participativa - modelo, por sinal, especialmente jovem em todo o ocidente. A própria inserção do katarismo nesse jogo de tensões, através de duas frentes distintas (o Movimiento Revolucionario Tupac Katari / MRTK e o Movimiento Indio Tupac Katari MITKA) denota esta proposição.

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A queda de Banzer é atribuída por muitos historiadores à falta de legitimidade que o governo teve, na medida em que havia sido consolidado, malgrado certa tortuosidade institucional, uma série de experiências populares pendentes à esquerda. Com a exceção da burguesia crucenha, beneficiada com os seus incentivos creditícios, distribuição de terra favorável58 e incentivo à exportação, nem mesmo a guarnição de La Paz estaria ao seu lado nos fins da década de ‟70. Para tentar forjar tal legitimidade, Banzer tornou-se ciente de que uma força político-partidária seria necessária para participar das eleições e, com esse intuito, criou a Acción Democrática Nacionalista (ADN), em março de 1979. Mais uma vez, a Bolívia mergulharia em instabilidade institucional no poder executivo. Seguiram-se, entre 1978, ano do fim da ditadura Banzer, e 1982, início do governo de Hernán Siles Suazo, oito mandatos presidenciais de curtíssima duração (alguns duraram até mesmo dias, semanas), que oscilaram desde uma „narcoditadura‟ com Luis Garcia Meza, até a presença inédita de uma mulher no poder, Lídia Gueiler. O período pode ser caracterizado sucintamente por uma crise econômica brutal causada pela queda do preço do estanho (então a principal commodity do país), que por consequência e inépcia dos governos causou uma brutal hiperinflação e o aprofundamento da posição marginal da Bolívia na economia continental. Ainda, a situação política a cada vez se tornava mais degradada: as tensões entre os movimentos

progressistas

pró-democracia

(entre

eles,

os

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presidentes civis deste interregno, a ala à esquerda do MNR coordenada por Siles Suazo e do Comité Nacional de Defensa de la Democracia) e os setores militares conservadores lançaram o país em um banho de sangue generalizado. Aliás, os próprios setores militares entraram em choque interno, na medida em que alguns altos oficiais (como David Padilla Arancibia, no final de 1978) já haviam tomado ciência da insustentabilidade de mais governos militares no país; enquanto isso, outra facção (as chamadas “roscas”, pequenos grupos políticos facciosos), buscava impedir a chegada dos setores progressistas ao poder através de genocídios políticos e de contragolpes antidemocráticos. Em 1981, foram readquiridos os direitos democráticos no país após uma vasta campanha sindical e o reconhecimento do governo de Hernán Siles Suazo, vencedor dos pleitos de 1970 e 1980 que não pode tomar posse pelos tais contragolpes conservadores. 59 Buscando a retomada do projeto nacional-desenvolvimentista popular da Revolução de 1952, o seu partido Unidad Democrática y Popular (UDP, um conglomerado dos principais partidos de esquerda do país)60 tentou se consolidar como uma alternativa de esquerda que agregasse os setores médios como o MNR um dia o fizera. No entanto, a crise internacional do petróleo de 1979 arrastou ainda mais a Bolívia para o precipício econômico que já encontrara, por conta das finanças públicas devastadas pelos regimes de exceção além da já presente crise dos preços do minério. Sem demora, o governo da UDP se aprofundara em uma 156 • Revista Estudos Amazônicos

crise profunda, especialmente após a saída da COB da sua coalizão. Por conta da difícil sustentação de seu governo, Suazo convocou eleições gerais para 1985, um ano antes da data orientada. Com a falência do projeto político da antiga esquerda do MNR, aproveitara-se da situação a ala moderada do partido, liderada pelo vencedor Victor Paz Estenssoro. Foi bem capitalizada por Paz Estenssoro a ideia de que, como no final da década de „60, as tensões entre esquerda e direita nos anos „80 reeditaram uma Bolívia falida e que, portanto, o centro era a melhor escolha. Talvez seja um engano, no entanto, dizer que Paz Estenssoro e o MNR eram os mesmos. Sem a base sindical da COB, esfacelada, e com uma esquerda em recomposição, essa ala centrista do MNR avançou a galope em um plano econômico que se tornaria famoso pela sua “terapia de choque”. O panorama de uma hiperinflação gigantesca e a voga do Consenso de Washington abalizando o início desta nova etapa transformou o partido outrora nacionalista em um adepto patente da corrente econômica dita “neoliberal”. Ainda segundo Mauricio Santoro Rocha, a "desrevolução", ou seja, o desmantelamento da máquina estatal de '52 se deu através de privatizações - eufemisticamente chamadas de "capitalizações" - e de demissões em massa, revelando a sua face mais dura para as camadas populares.61 Sintomaticamente, é nesse momento que se instala uma ruptura crítica no quadro dos partidos deste país, Revista Estudos Amazônicos • 157

abalroando o mais importantes destes bolivianos até então e iniciando um “xeque”, um abalo a essa estrutura consolidada. Como fazer o eleitorado entender que, ao se eleger novamente o dito nacionalista MNR, em verdade chegava a La Paz uma doutrina de choques privatizantes? O ministro do planejamento de Estenssoro nesta gestão era o tecnocrata Sanchez de Lozada, formado nos EUA. Sua primeira assunção presidencial se deu entre 1993-1997, em uma gestão marcada por descentralização municipal e avanços no processo de liberalização da economia, obtendo relativa popularidade e agradando consideravelmente setores emergentes das elites do país, ávidas por essa descentralização. Entre essas elites, estavam os agro empresários de Santa Cruz de la Sierra, grupo que reivindicaria posteriormente o seu papel enquanto pilar da economia boliviana na entrada do século XXI. Em 2002, Sanchez de Lozada voltaria ao cargo encontrando um avançado processo de privatizações na economia do gás, central para aquele país, entre os quais estavam envolvidos agentes internacionais como companhias transnacionais de extração de hidrocarbonetos e a grande e contestada superpotência do pós-Guerra Fria, os EUA. As decisões mais urgentes sobre os rumos do recurso mais rentável deste país estariam, segundo os rebeldes, subordinadas aos interesses estrangeiros. Justamente nessa contestação residiriam as questões que levariam Sanchez de Lozada à derrocada na Guerra do Gás, onde os movimentos sociais organizados em torno do 158 • Revista Estudos Amazônicos

partido da FEJUVE e do Movimiento al Socialismo (MAS) pararam o país exigindo a reversão deste processo de exportações, sendo o governo altamente criticado pelas massas por essa reversão não representar efetivamente o crescimento do país. Nesta breve introdução a história da Bolívia contemporânea, buscou-se entrelaçar e contextualizar as narrativas, os principais processos e marcos relacionados aos mais notáveis agentes políticos de Santa Cruz e La Paz, os dois polos de poder econômico, político e social dessa Bolívia aqui narrada. Salvo este esforço, é preciso avançar ainda nas questões mais objetivas deste período, o que esperamos de um afortunado debate ainda vivo e pulsante. Nas próximas contribuições, certamente não se furtarão questões determinantes dessa história entrecruzada de um dos mais interessantes percursos da história recente sul-americana.

Artigo recebido em abril de 2013 Aprovado em junho de 2013

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NOTAS *

Doutorando em História Comparada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em História Comparada por esta mesma universidade. Professor de História Contemporânea da Universidade Federal do Amapá (UNIFAP). Pesquisa sobre instituições, democracia e bem-estar na Bolívia e no Equador em corte comparativo para o seu doutoramento. Contato eletrônico: [email protected] Sitio eletrônico: www.cptempopresente.org. 1 Em Schurster (2009), há um franco e amplo debate expositivo sobre a história do Tempo Presente, examinando como a “visão orwelliana, onde há o reconhecimento de um continuo fortalecimento do poder apoiado numa racionalidade generalizada, imposta em todos os lugares da existência coletiva e individual, [acaba] transformando assim a teoria histórica numa camisa de força generalizante, a qual esta não se propõe”. Ver ainda para uma revisão conceitual pertinente: SCHURSTER, Karl. “Ver e não ver: por uma história do Tempo Presente”. Rio de Janeiro: Revista Eletrônica Boletim do TEMPO. Ano 4, nº 14, 2009. 2 TEIXEIRA DA SILVA, Francisco Carlos. “Herzog: uma história do presente”. Disponível em: . Acesso em: 30/out./ 2009. 3 BEDARIDÁ, François. “Tempo Presente, Presença da História”. In: FERREIRA, M. e AMADO, J. (Orgs). Usos & Abusos da História Oral. Rio de Janeiro: FGV, 1996. 3 LAGROU, Pieter. “Sobre a atualidade da história do tempo presente”. In: PORTO JR., Gilson (Org). História do tempo presente. São Paulo: EDUSC, 2007, p. 37. 4 Ibidem. 5 Ver: FUKUYAMA, Francis. O Fim da história e o Último homem. Rio de Janeiro: Rocco, 1992. 6 CAMARGO, Alfredo Jose Cavalcanti Jordão de. Bolívia – A Criação de um Novo País a Ascensão do Poder Político Autóctone das Civilizações Pré-colombianas a Evo Morales. Brasília: Ministério das Relações Exteriores, 2006, p. 129. 7 Também conhecida como Guerra do Pacífico ou Guerra do Guano, envolvendo Peru, Bolívia e Chile, no qual a Bolívia perdeu o acesso ao Oceano Pacífico para o Chile, até hoje persistente. Opta-se pela denominação “Guerra do Salitre”, comumente utilizada, para que se evite confusão com o confronto ocorrido entre 1937 e 1945 envolvendo o Eixo e os Aliados na Segunda Guerra Mundial. 8 CAMARGO, Bolívia, p. 128. 9 ROCA, Jose Luis. Economia y sociedad en el Oriente Boliviano (siglos XVI-XX). Santa Cruz: Cotas, 2001, p. 557. 10 Ver em ROCA, Economia y sociedad en el Oriente Boliviano, o registro de documentação da Sociedad de Estudios Geográficos e Historicos de Santa Cruz, citado na página 558. Em COSTAS LIJERÓN, Bryan. Luchas cívicas. Disponível em: . Acesso em: 16/out./2007, também se nota a menção ao Memorandum al Congreso Nacional, ao dizer que “En 1904, la Sociedad de Estudios Geográficos e Históricos envía un

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Memorándum al Congreso Nacional, en el que planteaban – entre otras cosas – la integración del oriente con el Occidente, a través de la construcción de una ferrovía que uniera Santa Cruz con Cochabamba”. Também é preciso dizer que a denominação “crucenho” refere-se ao cidadão nativo do departamento de Santa Cruz. Observar-se-ão denominações como cruceño (grafia castelhanizada) ou camba, que por sinal não necessariamente é sinônimo de crucenho. 11 Ver ANDRADE, Everaldo de Oliveira. A Revolução Boliviana. São Paulo: Unesp, 2007, p. 27. 12 Idem, pp. 30-31.

CORUM, James S. “O poder aéreo na guerra do Chaco”. Disponível em www.airpower.maxwell.af.mil/apjinternational/apj-p/2003/1tri03/corum.html Visitado em dez./2009. 14 AYERBE, Luis Fernando. Estados Unidos e América Latina: A construção da hegemonia. São Paulo: UNESP, 2002. 15 BERNARD, Jean-Pierre. CERQUEIRA, Silas. NEIRA, Hugo. GRAILLOT, Helène. MANIGAT, Leslie & GUILHODÈS, Pierre. Guide to the political parties in South America. Inglaterra: Penguin Books, 1974, p. 116. 16 SORUCO, Ximena et al. Los barones del Oriente - el poder en Santa Cruz ayer y hoy. Santa Cruz: Fundación Tierra, 2008, p. 30. 17 ROCA, “Economia y sociedad en el Oriente Bolivian”, p. 411. 18 SORUCO, Los barones del Oriente, p. 17. 19 Ibidem, pp. 17-18; 32. 20 ANDRADE, A Revolução Boliviana, pp. 36-38. 21 COSTAS LIJERÓN, Luchas cívicas. 22 Santa Cruz retomará la lucha por las regalías. El nuevo dia, 16 de Julho de 2008. Ver ainda: La ley que otorga regalias cumplió 70 años con más recortes a sus ingresos. El mundo, 16 de Julho de 2008. 23 Que equivaleria, na lógica do ordenamento jurídico-legal do Estado brasileiro aos nossos estados federados, mas que na Bolívia, como Estado então centralista, configura um nível intermediário regional subordinado ao nacional e acima do municipal. 24 CAMARGO, Bolívia, p. 150. 25 Ver: Federacion Sindical de Trabajadores Mineros de Bolivia. Tesis central de la Federación Sindical de Trabajadores Mineros de Bolivia aprobada sobre la base del proyecto presentado por la delegación de Llallagua. Disponível em: . Acesso em 19/dez./2009. 26 COSTAS LIJERÓN, Luchas cívicas. 27 ORTIZ SAUCEDO, Jimmy. “El Plan Bohan y la Marcha hacia el Oriente”. Disponível em:. Acesso em 12/dez./2009. 28 DUNIA SANDOVAL, Carmen. Santa Cruz: Economía y Poder (1952-1993). La Paz: Fundación PIEB, 2003, pp. 14-16. O trabalho de Dunia Sandoval destaca-se pela abrangência extensa, ao mesmo tempo em que discute determinadas questões 13

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eclipsadas pela maior parte dos historiadores nacionais como terra, trabalho, organizações políticas e movimentos sociais. Ainda, mais especial é a maneira a qual relaciona Santa Cruz a todos estes assuntos, na medida em que a historiografia de destaque trabalha com os grandes temas por um lado, enfocando as transformações no altiplano, ou apenas com as formações cooperativas responsáveis pelo desenvolvimento crucenho, polarizando a história política dos últimos 50 anos e, senão ajudando, mantendo o fosso entre a história política em dimensão nacional. 29 Ibidem, p. 18. 30 Ibidem, pp. 20-23. 31 ZAVALETA MERCADO, René. Lo nacional-popular en Bolivia. México: Siglo XXI Editores, 1986, p. 17. 32 DUNIA SANDOVAL, Santa Cruz: Economía y Poder, p. 42. 33 Ibidem, p. 43. E ainda, é preciso dizer que poucas propriedades de terra foram distribuídas no bojo da reforma. Ver: Ibidem, p. 46. 34 ROCA, Economia y sociedad en el Oriente Bolivian, p. 583. 35 SORUCO, Los barones del Oriente, p. 40. 36 Ibidem, p. 41. 37 ROCA, Economia y sociedad en el Oriente Bolivian, pp. 605- 606. 38 ARGIRAKIS JORDÁN, Helena. “Prólogo”. In: SORUCO, Los barones del Oriente, p. viii. 39 MORALES AYMA, Juan Evo. Decreto Supremo 28.071 “Héroes del Chaco”. Disponível: . Acesso em 11/dez./2009. Essa nacionalização realizou-se em uma ação mediática que orquestrou o dia do trabalho, a presença militar e a realização de promessas das últimas eleições. O impacto direto nas relações entre Bolívia e Brasil misturou desconfiança com conciliação, em termos que exploraremos posteriormente. 40 Uma caracterização básica aqui compreendida desse conjunto de idéias elucidaria que, teoricamente, o atraso de determinados países decorre da relação do capitalismo mundial de dependência entre países "centrais" e países "periféricos" - incorrendo, portanto, na noção de que o capitalismo não só é modo de produção, como também sistema de circulação. Como centro formador da economia mundial estariam os chamados „países centrais‟, sendo identificados no espaço em que o meio técnico científico informacional circula em escala ampliada e os fluxos de capital igualmente fluam com mais intensidade. Já os „países periféricos‟ estaria posicionados às margens desse espaço privilegiado, sofrendo as sanções impostas pelas intempéries do centro capitalista, além de estar provida por uma circulação de capitais e de desenvolvimento técnico-científico consideravelmente reduzido com relação aos países centrais, justamente pela sua subordinação (ou dependência). Essa dependência, por sua vez, estaria relacionada ao processo histórico de adesão forçosa das zonas periféricas ao sistema capitalista, já mundializado, e às debilidades dessa inserção imperfeita - ou „subdesenvolvida‟ - que impediria os países periféricos de se emancipar econômica e politicamente com relação ao centro. Ver: GUNDER FRANK, André. Capitalism and Underdevelopment in Latin America: Historical Studies of Chile and Brazil. New York: Monthly Review Press, 1967.

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TORRES, Juan José. El general Torres habla a Bolivia. Argentina: Ediciones de Crisis, 1973, pp. 11; 15. 42 GALLARDO LOZADA, Jorge. De Torres a Banzer: diez meses de emergencia en Bolivia. Argentina: Ediciones Periferia, 1972, pp. 166-167. 43 SÁ, Miguel. “A Bolívia no Tempo Presente: projetos em disputa e crises a partir do altiplano”. In: CHAVES, Daniel. ARAUJO, Rafael & SÁ, Miguel. Bolívia - passos das revoluções. Niterói: Muiraquitã, 2009, p. 34. 44 BAPTISTA GUMUCIO, Mariano. Breve Historia Contemporânea de Bolívia. México: Fondo de Cultura Económica, 1996, p. 307. 45 GALLARDO LOZADA, De Torres a Banzer, p. 420. 46 Ibidem, pp. 424-425. 47 O discurso é notado, novamente, com vigor e menção explícita aos recursos naturais do gás e petróleo, no Século XXI. Ver: El Condor Boliviano Editores. “Prólogo”. In: PINOCHET UGARTE, Augusto. Geopolítica de Chile. La Paz: El Cóndor Boliviano, s/a. 48 BAPTISTA GUMUCIO, Breve Historia Contemporânea de Bolívia, pp. 309b-310. 49 O termo, inicialmente cunhado em uma apresentação de William Gaud, burocrata do USAID (Agencia dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional), refere-se a uma faixa de processos de inovação técnico-científica que revolucionaram a produção agrícola em todo o mundo. O modelo se baseou no uso direto de sementes melhoradas (em especial, as híbridas), insumos industriais, diminuição do custo de manejo e mecanização, bem como uso de tecnologia no plantio, na irrigação e na colheita. Esta etapa do desenvolvimento agroindustrial na região, por sua vez, está relacionada à formação dos Complexos Agroindustriais (CAI). Sobre a formação do Complexo Agroindustrial e a tecnificação do campo, ver: KAUTSKY, Karl. A questão agrária. 3ª ed. São Paulo: Proposta Editorial, 1980. 50 HARNECKER, Marta & FUENTES, Federico. “MAS-IPSP de Bolivia: Instrumento político que surge de los movimientos sociales”. Disponível em: . Acesso em: 20/out./2009, p. 33. 51 Segundo o Manifesto de Tihuanaco, primeiro documento do movimento katarista consolidado em 1973, “In practice the Bolivian peasantry has never really belonged to any political party because no party has represented their true interests or been inspired with their cultural values”. É necessário mencionar também Garcia Linera, quando afirma categoricamente que este somatório de experiências não segue pela via tradicional dos movimentos políticos e sociais ocidentais: “La comunidad, por tanto, lleva el sello de la subalternidad a la que ha sido arrinconada y de la que no puede sustraerse hasta ahora. De igual manera, los distintos tipos de unificación intra-comunal, ya sean en la forma de resistencia a las imposiciones estatales o de demanda por sus exclusiones, cargan el efecto de esta supeditación colonial que, paradójicamente, es renovada por la resistencia y la demanda”. Ver respectivamente: Manifesto de Tihuanaco. Anexo I. In: CAMARGO, Bolívia, p. 293. GARCIA LINERA, Álvaro. La potencia plebeya: acción colectiva e identidades indígenas, obreras y populares en Bolivia. Buenos Aires: Prometeo Libros, 2008, p. 205. 52 CAMARGO, Bolívia, p. 173.

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ROCHA, Maurício. “A outra volta do bumerangue: Estado, movimentos sociais e recursos naturais na Bolívia (1952-2006)”. In: Ibidem. Bolívia: de 1952 ao Século XXI. Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão / Ministério das Relações Exteriores, 2006, p.24. 54 Manifesto de Tihuanaco. Anexo I. In: CAMARGO, Bolívia, p. 288. 55 CAMARGO, Bolívia, p. 165. 56 HARNECKER & FUENTES, “MAS-IPSP de Bolivia: Instrumento político que surge de los movimientos sociales”, pp. 33-35. 57 “Hidden cells reveal Bolivia's dark past”. In: BBC News, disponível em: . Acesso em: 16/dez./2009. 58 Ver o “Cuadro 7: Distribución de Tierras en Bolivia según presidentes por período de gobierno”, baseado no “Situación y perspectivas del proceso agrario”. Ministerio de Desarrollo Sostenible, 2002. Citado en Plan Nacional de Saneamiento y Titulación. La Paz: Ministerio de Desarrollo Rural, Agropecuario y Medio Ambiente, 2006. Segundo este, durante o governo Banzer se entregou mais de 33% da quantidade geral de terras desde a Revolução de ‟52, incluindo até mesmo as suas dotações na redistribuição de terras. 59 SÁ, “A Bolívia no Tempo Presente: projetos em disputa e crises a partir do altiplano”, p. 13. 60 Movimiento de Izquierda Revolucionaria (MIR), de Jaime Paz Zamora, o Movimiento Nacionalista Revolucionario de Izquierda (MNR-I), de Hernán Siles Suazo, o Partido Revolucionario de la Izquierda Nacionalista, de Juan Lechín Oquendo e Lidia Gueiler e o Partido Comunista de Bolivia. Deve ser destacada a multiplicidade de frentes partidárias neste momento, se configurando ainda mais de uma dezena de partidos em torno da UDP. 61 ROCHA, “A outra volta do bumerangue: Estado, movimentos sociais e recursos naturais na Bolívia (1952-2006)”, p. 23.

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