Aquisição Fonética de Crianças de 1-3 anos no ambiente de Educação Infantil, caso Creche/UFG.

July 6, 2017 | Autor: Lucas Alves | Categoria: Linguistics, Educação, Fonética, Aquisição de língua
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Aquisição Fonética de Crianças de 1-3 anos no ambiente de Educação Infantil, caso Creche/UFG.1 Lucas Alves Costa

Pressupostos “... graças à linguagem, a consciência individual de cada ser humano não se restringe à experiência pessoal e às próprias observações, uma vez que, com a Aquisição da Linguagem, o conhecimento de todos os homens pode tornar-se propriedade de cada um, enriquecendo, por conseguinte, a consciência individual”.(PALONGANA, Isilda Camponer).

A fala, segundo Saussure, corresponde à segunda parte dentro dos estudos da linguagem, pois é algo individual, de caráter heterogêneo, assistemático e variável. Em certo sentido, a fala é algo concreto, com características peculiares, podendo ser classificada, transcrita e observável seguindo métodos fornecidos pela Fonética. Já para Vygotsky, a fala é tão necessária quanto os olhos e as mãos, na execução de tarefas práticas. A palavra “aquisição”, segundo o Dicionário Aurélio, significa “ato ou efeito de adquirir”. Já a palavra “adquirir” significa “passar a ter (algo), obter, conquistar e assumir”. Com isso, podemos afirmar que aquisição da fala é um processo individual que se constitui e se manifesta no meio social, pois só se pode ser adquirida, num respectivo contexto, de algo ou alguém. A criança com desenvolvimento fonológico normal desde os primeiro anos de vida já possui o aparelho fonador apto à produção sonora. Porém, para o ato da fala é necessário que aja uma relação envolvendo elementos psicofísicos e sociais. Daí, se dar a produção de sons dentro de um sistema linguístico organizado. A criança se expressa de várias formas: por meio do choro em primeiro momento, depois passa a produzir alguns sons esdrúxulos, a pronunciação de fonema, a seleção de palavras e formação de frases. Tal processo se dá entre 1 ano e 5 meses aos 5 anos de idade. Nesse período a aquisição da fala passar por variações na pronuncia de vogais e consoantes que estão sendo adquiridas e estabilizadas. O meio social é um elemento eficaz na aquisição da fala, pois a criança observa a fala do outro e em muitos momentos imita. Nessa interação com o outro, a criança exercita as formas fonéticas já adquiridas. Com isso, o ambiente em que a criança se depara com o uso frequente da fala dos outros propicia a aquisição de forma mais satisfatória. Considerando que a fala é essencialmente social.

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Artigo solicitado como forma de conclusão da Disciplina Fonética e Fonologia do 2º Semestre de 2009 da Faculdade de Letras – UFG. Orientado pela Profª Drª Maria Sueli de Aguiar.

“Vygotsky considera que a fala é desde o estágio mais primitivo, socializada, e sua função primordial, tanto na criança como no adulto, é a comunicação, o contato social” (PALONGANA, Isilda Camponer)

Temos como objetivo principal investigar como estão sendo produzidos os sons da fala de crianças de 1-3 anos com desenvolvimento fonético normal, manifestada num ambiente de Educação Infantil onde estão em interação entre si, sem a separação por faixa etária, e com adultos. O levantamento de dado é feito com a gravação da fala das crianças no momento da realização da Atividade Dirigida na Instituição (Creche/UFG). A transcrição desses dados segue a notação fonética das normas do Alfabeto Fonético Internacional – IPA 1993. No momento de Atividade Dirigida na Creche/UFG é proposta para as crianças uma vivência com as cinco áreas do conhecimento que são: linguagem, artes, brinquedos e brincadeiras, passeio e música. As crianças são convidas pelos professores (as) para um local especifico preparado para tal finalidade. Durante a atividade os professores (as) responsáveis proporcionam um momento de diálogo com as crianças. É importante destacar que nessa atividade estão presentes todas as crianças da creche independente da faixa etária e gênero sexual e que no momento do diálogo a criança é livre para falar o que lhe convêm, seja referente ao tema da atividade ou não. Não há na Instituição nenhuma criança que apresente problemas auditivos, porém há uma que apresenta uma síndrome que compromete o desenvolvimento da sua fala. As crianças que fazem parte da Creche/UFG são filhos ou filhas de técnicos administrativos, professores e alunos da Universidade Federal de Goiás. Já o quadro de professores e professoras é formado por grande maioria de estagiários, bolsistas de diversos cursos como: artes cênicas, pedagogia, psicologia, letras e educação física, juntamente com professoras efetivas, substitutas e técnicos administrativos. Contudo, diante desses pressupostos apresentados, voltemos nossa atenção agora para os dados coletados e as transcrições fonéticas para então procurarmos ter uma visão geral de como é a produção fonológica nessa população de crianças inserida num ambiente que tem a sóciointeração como norteadora das atividades pedagógicas.

Constituição do Corpus A gravação da fala das crianças foi feita no turno vespertino em que estavam presentes 38 (trinta e oito) crianças juntamente com os 10 (dez) adultos-professores (as). No dia da coleta dos dados, a Área de Conhecimento trabalhada foi Linguagem. A Atividade foi proposta e planejada por dois professores com a ajuda de todos os (as) educadores do turno. Essa Atividade era de contação de história. As crianças foram convidadas a concentrar-se

num ambiente escolhido. Após a reunião de todas é retomada a História do Barco, que tinha sido iniciada em outro dia. A história é contada por um professor, porém com a interferência constante das crianças. É nessa situação que se centra a coleta dos dados, destacando principalmente a fala das crianças. Por ter sido gravado em um local aberto com a presença de crianças de 1 ano a 3 anos, alguns sons misturam-se, porém não compromete a audição da fala em si.

O Diálogo e Interação na Atividade Professor 1: Pessoal, pessoal senta aqui na piscina! C1: Sophia, senta aqui perto de mim! Professor 1: Sabe aquela história que vimos na semana passada? Parece que vou ter que recontar a história. C2: Eu lembro C3: Eu lembro Professor 1: Quem quer ouvir de novo? C4: Eu! C5: Eu! C6: Eu! Professor 1: Então vamos ouvir a história C7: A gente vai, agente vai fazer o barquinho hoje? Professor 1: Hum! Mais que pergunta mais interessante. Agente vai terminar de fazer nosso barquinho mais tarde. C8: Eu pensei que era hoje Professor 1: Mas é (nome da criança) hoje. Três e meia Professor 2: O livro é esse, a história...o Barco. Escrita por Mery França e Ary França. Professor 1: A história começa assim: Adeus papai, adeus mamãe Agora vou levar meu barco para o ria e vou navegar. Vou ver os peixes grandes e pequenos. Vou ver a tartaruga nadar. C9: A tartaruga aparece o casco dela C10: Olha o saci bebendo água com a língua Professor 1: O rio passa pela montanha, passa no meio da mata da mata. Vou ver a onça beber água C11: Sophia C12: Mas é, mas é porque ela ta bebendo água com a língua Professor 1: É com a língua. O rio passa lá longe, onde o índio vai pescar C13: E não é índio é onça C14: E não é onça é ele

Professor 1: As águas do rio não param, elas vão até o mar. Com meu barco eu vou navegar. Vou (inaudível) até o mar. C15: Hoje é... Professor 1: Vai longe, com meu barquinho de papel C16: Mas agente vai navegar? Professor 1: Vamos navegar C17: A gente vai fazer nosso barquinho hoje? Professor 1: Agente vai numa atividade construir o barquinho. Vamos construir um barquinho hoje. C18: A gente tem que ter água Professor 2: Então pessoal. A atividade vai continuar aí agente vai fazer uma Marketi C19: O que é Market? Professor 2: Market é uma... Agente vai faz uma, agente faz de conta um lago, com um barquinho dentro. E depois eu vou trazer pra vocês o que é uma market. Então agente vai fazer uma meleca, primeiro coloca tinta, coloca na mesa C20: Hoje eu vou suja minha blusa Professor 2: Não precisa suja a blusa, é só as mãos na mesa. Agente pega esse papel assim, passa a mãozinha para ele colar. Com cuidado agente vai tirar. O lado aqui vai ficar todo com a meleca e depois agente vai colocar o barquinho. Alguém quer recontar a história? C21: Eu! C22: Eu não! Professor 1: Olha, olha a água no teto C23: Ela vai molhar eu C24: Nossa! C25: A minha mãe tava no telhado da minha casa Professor 2: Mas conta alto...se não agente não escuta C26: Não quero contar não Professor 2: O (nome da criança) não quer contar, alguém quer contar? C27: Eu quero, é porque não sei Professora 2: Vai falando o que tem nessa história. Alguém pessoal quer contar a história? C28: Eu! C29: Eu! C30: Eu! C31: O nome não é Letícia é lêlê Professora 3: Lêlê é o apelido dela, igual o seu é diogera da Bahia C32: O tigre tava bebendo água

Na Atividade que destacamos acima podemos observar trinta e duas intervenções das crianças por meio da fala no decorrer de 7 minutos e 35 segundos. A transcrição fonética somente da fala das crianças está em anexo.

Considerações finais A partir da transcrição fonética, observamos o número de vezes em que certos fonemas foram empregados pelas crianças. Os fonemas /p/, /b/, /k/, /g/, /t/, /d/ os /m/, /n/ e os /f/, /v/, /s/ já estão adquiridos e estabilizados no sistema fonológico do grupo de crianças pesquisado. Assim como os fonemas vocálicos /e/ /w/ /a/ /ʼ€/. Podemos perceber também que aparecem algumas vezes à repetição de muitos fonemas pronunciados de forma igual entre duas ou mais crianças. Isso se deve ao fato de haver certa imitação que a criança faz do som produzido por outra. Há também um esforço por parte de algumas para repetir a pronuncia utilizada pelo adulto-professor no momento da atividade. Os erros de pronúncia de alguns fonemas consonantais foram considerados insignificantes pelo fato de haver uma entonação da voz no momento da pronuncia, agora a não pronunciação de alguns fonemas foi considerável na produção da fala do grupo. Por exemplo, o fonema /w/ quase não era audível devido à tonicidade da voz.

A produção da fala dessas crianças é imbuída de aspectos de significação, pois tal produção é conduzida por uma atividade proposta. Há a contextualização da produção e ao mesmo tempo as crianças de idades diferentes estão em contatos uma com as outras para que aja uma interação e troca de conhecimentos. As crianças também acompanham a fala do adulto-professor que muitas vezes instiga a observar e assim adquirir os sons emitidos por ele. Já as que ainda estão na fase inicial de produção da fala o contado com um ambiente onde a fala é o primeiro meio de comunicação favorece o bom desempenho da aquisição fonética. Dessa forma, a aquisição fonética em um ambiente de educação infantil onde a sócio-interação é proposta, viabiliza a construção e efetivação do diálogo como forma de estar no mundo, transformando-o e transformando-se por meio da troca de conhecimentos adquiridos e historicamente constituídos.

Referencias

SILVA, Thais Cristófaro. Fonética e Fonologia do Português. Editora Contexto, 2005.

TASCA, Maria. Interferência da língua falada na escrita das séries iniciais, o papel de fatores linguísticos e sociais. Editora EDIPUCRS, 2002.

PALANGANA, Isilda Campaner. Desenvolvimento e aprendizado em Piaget e Vygotsky, a relevância do social. Editora Sammus Editorial, 2001.

REGO, Tereza Cristina. Vygotsky, uma perspectiva histórico-cultural da Educação. Editora Vozes, 13º Edição, 2002.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Cognição, Linguagem e Práticas Interacionais. Editora Lucerna, 2007.

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