ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Arqueologia Guarani no litoral Sul do Brasil / Rafael Guedes Milheira, Gustavo Peretti Wagner (orgs.). – Curitiba : Appris, 2014. 290 p. ; 23 cm. – (Ciências Sociais - Seção Antropologia e Sociologia) Inclui bibliografias ISBN 978-85-8192-293-5 1. Arqueologia – Brasil, Sul. 2. Índios Guarani. 3. História. I. Milhera, Rafael I. Guedes. II. Wagner, Gustavo Peretti. III. Série. II. III. CDD 20. ed. – 930.1
Editora e Livraria Appris Ltda. Rua José Tomasi, 924 - Santa Felicidade Curitiba/PR - CEP: 82015-630 Tel: (41) 3156-4731 | (41) 3030-4570 http://www.editoraappris.com.br/
Printed in Brazil Impresso no Brasil
Rafael Guedes Milheira e Gustavo Peretti Wagner (Orgs.) Adriana Schmidt Dias Antonio Lezama Dione da Rocha Bandeira Francisco Silva Noelli Jairo Henrique Rogge María Farías Gluchy Mariana Araújo Neumann Sergio Baptista da Silva
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
Curitiba – PR 2014
FICHA TÉCNICA DIREÇÃO - ARTE E PRODUÇÃO
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CONSULTORES Alícia Ferreira Gonçalves – UFPB
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Geni Rosa Duarte – UNIOESTE
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Simone Wolff – UEL
João Feres Junior – UERJ
Vagner José Moreira – UNIOESTE
Jordão Horta Nunes – UFG
APOIOS
STRATA
Consultoria em Arqueologia e Patrimônio Cultural
AGRADECIMENTOS
A realização de um livro é uma atividade complexa que exige da organização um esforço imenso para a coleta de recursos e filtragem de informações, assim como um grande trabalho de editoração. Esse esforço, é claro, ficou centrado nas mãos dos organizadores, porém, uma série de colegas e instituições compartilharam as tarefas para a confecção desse livro. Inicialmente agradecemos ao colega Francisco Silva Noelli, que participou como um consultor e crítico do conteúdo do livro, desde a concepção original, revisão geral dos capítulos e protagonismo na redação do capítulo final e tabela de sítios. Agradecemos também ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal de Pelotas (PPGA-UFPEL) que acreditou no potencial informativo do projeto, como obra relevante para o meio acadêmico. Da mesma forma, agradecemos ao Instituto de Ciências Humanas da UFPEL pelo incentivo e parceria na realização do livro. Finalmente, agradecemos aos colegas: Juliano Campos, Marco Aurélio Nadal De Masi, Eliane Chim, Cleiton Silveira, Vanderlise Machado Barão, Luciana Peixoto, Claudio Corrêa Pereira, Mariano Bonomo, Charles Miranda, Dione da Rocha Bandeira e Jairo Henrique Rogge pela disponibilização de dados que permitiram enriquecer a tabela dos sítios arqueológicos Guarani do litoral sul do Brasil. Agradecemos também à acadêmica Daiane Marin e Chaiane Alves Quadrado pelo auxílio na editoração do livro e tabelas. Agradecemos também ao colega Jonathan Duarte Marth pela elaboração dos mapas.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO....................................................................................................9 (Gustavo Peretti Wagner e Rafael Guedes Milheira) CAPÍTULO 1 – ARQUEOLOGIA GUARANI EM SANTA CATARINA: LITORAL NORTE..........................................................................................................15 (Dione da Rocha Bandeira) CAPÍTULO 2 – O POVOAMENTO GUARANI DO LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL E SUAS RELAÇÕES COM OS DEMAIS OCUPANTES DA REGIÃO................................................................................................................... 39 (Gustavo Peretti Wagner) CAPÍTULO 3 – A CERÂMICA GUARANI DO LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL...............................................................................63 (Mariana Araújo Neumann) CAPÍTULO 4 – ARQUEOLOGIA GUARANI NO LAGO GUAÍBA: REFLETINDO SOBRE A TERRITORIALIDADE E A MOBILIDADE PRETÉRITA E PRESENTE........81 (Adriana Schmidt Dias e Sergio Baptista da Silva) CAPÍTULO 5 – ASSENTAMENTOS LITORÂNEOS DA TRADIÇÃO TUPIGUARANI: UM EXEMPLO DO LITORAL CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL..................... 115 (Jairo Henrique Rogge) CAPÍTULO 6 – ARQUEOLOGIA E HISTÓRIA GUARANI NO SUL DA LAGUNA DOS PATOS E SERRA DO SUDESTE....................................................... 125 (Rafael Guedes Milheira) CAPÍTULO 7 – LA CUESTIÓN GUARANÍ COMO UN PROBLEMA DE PERSPECTIVA.............................................................................................................. 155 (Antonio Lezama e María Farías Gluchy)
CAPÍTULO 8 – OS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS GUARANI DO LITORAL SUL DO BRASIL, URUGUAI E ARGENTINA: REGISTROS ATÉ 2013...................................177 (Francisco Silva Noelli, Rafael Guedes Milheira e Gustavo Peretti Wagner) CAPÍTULO 9 – O ESPAÇO DOS GUARANI: A CONSTRUÇÃO DO MAPA ARQUEOLÓGICO NO BRASIL, PARAGUAI, ARGENTINA E URUGUAI........... 187 (Francisco Silva Noelli) CAPÍTULO 10 – TABELA DE SÍTIOS GUARANI DO LITORAL SUL DO BRASIL, URUGUAI E ARGENTINA.............................................................................................205 (Francisco Silva Noelli, Rafael Guedes Milheira e Gustavo Peretti Wagner) BIBLIOGRAFIA........................................................................................................... 257 SOBRE OS AUTORES.................................................................................................289
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INTRODUÇÃO
Gustavo Peretti Wagner 1 Rafael Guedes Milheira 2
Este livro é fruto das discussões realizadas no Simpósio Tópicos em Arqueologia Regional no Litoral Sul do Brasil, organizado por Gustavo Peretti Wagner e Rafael Guedes Milheira durante o XV Congresso da Sociedade de Arqueologia Brasileira, realizado no ano de 2009, em Belém, Pará. Naquela ocasião foram reunidos pesquisadores com interesse específico na Região Sul do Brasil, com contribuições de Dione da Rocha Bandeira, Gustavo Peretti Wagner e Rafael Guedes Milheira. Marco Aurélio Nadal de Masi e Flavio Calippo participaram intensamente das discussões mediadas por Klaus Hilbert. Naquele momento, as atenções foram direcionadas à Arqueologia dos sambaquis e ao papel das sociedades ceramistas no povoamento da costa Sul do Brasil. Temas como organização social, economia, territorialidade e cronologia marcaram os debates. Outra característica do simpósio foi a busca dos arqueólogos por compor estudos a partir de diferentes fontes de pesquisa, tais como informações arqueológicas, etnográficas e etnohistóricas. A aproximação de fontes diversas e a variabilidade de temas cotejados, em nosso entendimento, tem colocado a Arqueologia Guarani em uma linha de amadurecimento teórico e metodológico resultante dos últimos vinte anos de pesquisa, quando uma geração de arqueólogos inconformados com a abordagem tradicional e acrítica iniciou a busca por novas orientações e abordagens. Essas pesquisas influenciaram as novas gerações abrindo as portas da academia para um movimento pluralista instigando o enriquecimento do diálogo. Foi com este espírito que o presente livro foi organizado. A meta estabelecida foi condensar trabalhos de diferentes autores com visões distintas da 1 Arqueólogo e Historiador. STRATA – Consultoria em Arqueologia e Patrimônio Cultural –
[email protected]. 2 Professor do Bacharelado em Antropologia/Arqueologia e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal de Pelotas. Pesquisador do LEPAARQ/UFPel
[email protected].
Arqueologia Guarani, hora focadas no empirismo dos dados de campo, hora orientadas para reflexões de âmbito teórico. Bem como no cotejamento entre os campos. A visão dos autores não contempla uma unidade teórica, tampouco foi o objetivo dos organizadores compor uma obra que buscasse apresentar uma perspectiva unilateral e definitiva para a Arqueologia Guarani. Se o panorama dos anos 1960 até 1990 foi de oposição entre as diferentes tendências, paradigmas ou escolas teóricas na Arqueologia brasileira e, especificamente, na Arqueologia Guarani, a partir da última década do século XX o que se viu foi uma pluralização das práticas arqueológicas, incorporando uma multiplicidade de vozes na participação da produção do conhecimento. Da mesma forma, nota-se uma crescente articulação de diferentes teorias arqueológicas, fomentando um ambiente em que a estratégia para a melhor forma de constituir interpretações ou compreensões sobre o comportamento, cultura e história das sociedades indígenas é a abordagem holística. Todos os trabalhos publicados nesta obra são fruto da Arqueologia acadêmica. Trata-se de sínteses de dissertações, Teses e projetos de pesquisa focados na Arqueologia Guarani nos litorais Sul do Brasil, Uruguai e Argentina, na forma de capítulos, por vezes resultantes de projetos de pesquisa com financiamento governamental. Nesse sentido, esta obra possibilitará maior circulação dos trabalhos, através de uma versão editorial de fácil acesso. O livro é composto de dez capítulos. No primeiro capítulo, Arqueologia Guarani em Santa Catarina: litoral norte, Dione da Rocha Bandeira apresenta uma sistematização detalhada dos dados etnohistóricos e arqueológicos disponíveis para a Baía da Babitonga. O trabalho demonstra a tensão entre os reiterados relatos da presença indígena na região e a identificação material de ocupações notadamente Guarani. Utiliza a toponímia como indício tradicional da presença indígena e denota a baixa incidência de sítios nas mesmas áreas. Para Bandeira, as cronologias recentes encontradas na Babitonga sugerem um eixo de povoamento no sentido interior-litoral, aproveitando as calhas fluviais existentes em diversos pontos da costa, originando um processo complexo que culminaria na sobreposição de diferentes levas populacionais cronologicamente distintas em uma mesma região. O capítulo seguinte aborda O Povoamento Guarani do Litoral Norte do Rio Grande do Sul e suas Relações com os Demais Ocupantes da Região, onde Gustavo Peretti Wagner sistematiza os dados existentes para a região apresentando o processo paulatino de ocupação do território. Sugere um modelo hipotético de povoamento marcado por dois momentos específicos, avaliando os episódios de interação cultural entre as diferentes populações indígenas e
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destas, com o elemento europeu. Inicialmente a conquista Guarani alija as populações Jês de suas tradicionais áreas de exploração, tanto através de conflitos bélicos quanto através de relações de parentesco e reciprocidade. O momento seguinte é marcado pela chegada das frentes de colonização ibéricas que condicionam uma reestruturação das estratégias territoriais e culmina com o despovoamento gradual da costa. No terceiro capítulo, A Cerâmica Guarani do Litoral Norte do Rio Grande do Sul, Mariana Araújo Neumann considera tecnologia como a arena política onde diferentes agentes discutem a produção coletiva do cosmo. Neste sentido, admite que seus produtos traduzem diferentes formas de associação, diferentes contornos sociais particulares a contextos locais e temporais, orientando associações possíveis para a história indígena pré-colonial. As análises da tecnologia cerâmica focam no litoral norte do Rio Grande do Sul e oferecem uma leitura categórica para uma área de grande relevância para o escopo desta obra. Em Arqueologia Guarani no Lago Guaíba: Refletindo sobre a Territorialidade e a Mobilidade Pretérita e Presente, Adriana Schmidt Dias e Sergio Baptista da Silva propõem compreender o uso do espaço lagunar pelas sociedades guarani pré-coloniais, buscando avaliar aspectos de continuidade e mudanças nos padrões de ocupação indígena do território. Empreendem intenso levantamento de dados arqueológicos e incorporam as lideranças Guarani na construção das estratégias de pesquisa, caracterizando contribuição ímpar à temática no sul do Brasil. Desde o Delta do Jacuí até a desembocadura na Laguna dos Patos, as aldeias antigas ocuparam preferencialmente os pontais, as ilhas e as baias, buscando locais abrigados da incidência do vento sul e privilegiando as margens do Guaíba, em detrimento das encostas graníticas, denotando intensa atividade de navegação e sociabilidade. Jairo Henrique Rogge sintetiza as pesquisas realizadas pelo Instituto Anchietano de Pesquisas em Assentamentos Litorâneos da Tradição Tupiguarani: Um Exemplo do Litoral Central do Rio Grande do Sul. O trabalho apresenta uma caracterização geral dos sítios e respectivas cronologias oportunizando ao leitor correlacionar os dados arqueológicos locais às áreas adjacentes e compor uma compreensão regional do processo de povoamento litorâneo. É importante ressaltar que esse trabalho aponta distinções funcionais para sítios arqueológicos distintos, contribuindo para as discussões do modo de organização territorial Guarani. O capítulo intitulado Arqueologia e História Guarani no sul da Laguna dos Patos e serra do Sudeste, de Rafael Guedes Milheira, aborda a Arqueologia como história indígena de longa duração. Como tal, o autor busca, em primeiro lugar,
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romper com a perspectiva tradicionalmente imposta pela academia de Arqueologia pré e pós-colonial, que tanto martiriza e despersonaliza a história indígena milenar. Em segundo lugar, o autor buscou cotejar fontes históricas, etnográficas e arqueológicas, demonstrando que o processo de ocupação regional alcança uma profundidade temporal de aproximadamente 900 anos, num território constituído entre as terras altas da serra do sudeste e as terras baixas da laguna dos Patos. Por fim, o trabalho busca questionar a historiografia tradicional que relega o papel das sociedades indígenas a um segundo plano na constituição da identidade local, na perspectiva de que os indígenas, assassinados, escravizados e territorialmente desapropriados foram silenciados no processo histórico que constituiu a cidade de Pelotas e região. O sétimo capítulo intitula-se La Cuestión Guaraní como un Problema de Perspectiva e aborda de forma ampla as diferentes caracterizações da cultura arqueológica Guarani. Antonio Lezama e María Farías Gluchy destacam que a definição do que se entende por Guarani, depende da amplitude com que o investigador enfoca o tema. Quando situada nas escalas continental, regional ou local, a categoria Guarani assume, através do pesquisador, diferenças idiossincráticas. O oitavo capítulo consiste em um texto e uma longa lista de sítios arqueológicos Guarani, incorporando sítios e ocorrências situadas no litoral sul do Brasil, Uruguai e Argentina, localizados até o ano de 2013. Os sítios são sistematizados na forma de uma tabela apresentada em capítulo separado, ao final dos textos que compõe a obra (capítulo 10). Não é pretensão dos autores a completude dos dados representados na tabela, uma vez que diversos trabalhos de levantamento realizados através de contrato não foram publicados e são de acesso restrito. No entanto, contém a totalidade dos registros de sítios publicados até o ano 2013. As informações sobre os sítios são divididas em Estado/ País, cidade, localidade, nome do sítio, sigla, coordenadas geográficas, datação, método de datação e fonte bibliográfica. Com a referida tabela, o objetivo de Francisco Silva Noelli, Rafael Guedes Milheira e Gustavo Peretti Wagner é sistematizar informações que sirvam como subsídios e ferramentas de trabalho para pesquisas, gestão do patrimônio cultural, projetos de desenvolvimento regional e composição de Sistemas de Informação Geográfica. Anexo à tabela de sítios arqueológicos apresentam-se mapas, cuja confecção permite visualizar as principais áreas de ocorrência de sítios Guarani no litoral. O nono capítulo é uma republicação de autoria de Francisco Silva Noelli. O texto intitulado “O espaço dos Guarani: a construção do mapa arqueológico no Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai” foi originalmente publicado no ano de 2004 na Revista de Indias. O capítulo apresenta uma síntese da Arqueolo-
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gia Guarani produzida nos últimos 20 anos, no que se refere a uma abordagem teórica que coteja informações arqueológicas, etno-históricas e etnográficas. Além disso, o autor apresenta um mapa que demonstra a localidade dos sítios arqueológicos Guarani entre Brasil, Paraguai Uruguai, e Argentina, áreas essas que coincidem com as informações extraídas das publicações dos cronistas e viajantes dos séculos XVI e XVII.
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CAPÍTULO 1 ARQUEOLOGIA GUARANI EM SANTA CATARINA: LITORAL NORTE3 Dione da Rocha Bandeira4
TRADIÇÃO GUARANI: NO BRASIL E EM SANTA CATARINA A Tradição Arqueológica Tupiguarani (grafada sem hífen para diferenciar-se da família linguística Tupi-Guarani) é definida a partir de uma cerâmica pintada (policrômica, com decoração geométrica, em predomínio) e/ou com decoração plástica, de formas e funções variadas, encontradas em sítios rasos (manchas pretas) que ocorrem no litoral brasileiro e na bacia do rio Paraná (incluindo Argentina, Uruguai e Paraguai). Além da cerâmica é característico o sepultamento em urnas. Inicialmente essa tradição foi subdividida nas subtradições5: Corrugada6·, com predomínio deste tipo de decoração plástica na cerâmica que ocorria em sítios no sul do Brasil (litoral e bacias dos grandes rios), Pintada7, com predomínio deste tipo de decoração que ocorria em sítios do litoral (Sudeste e Nordeste) e Escovada, com predomínio deste tipo de decoração plástica que ocorria em sítios com influência europeia (PROUS, 1992). 3 Este artigo baseia-se na tese de doutorado da autora Ceramistas Pré-coloniais da Baía da Babitonga, SC – Arqueologia e Etnicidade defendida em 2004. 4 Arqueóloga e professora do Mestrado Patrimônio Cultural e Sociedade da Univille e do Museu Arqueológico de Sambaqui de Joinville. 5 Inicialmente as diferenciações que deram origem às subtradições (predomínio de um tipo de decoração) foram relacionadas a diferenças cronológicas entre elas, sendo a Pintada considerada a mais antiga. Hoje essas diferenças são interpretadas como manifestações regionais (PROUS, 1992). 6 Atualmente esta subtradição é tratada, pela maioria dos arqueólogos, como tradição Guarani. 7 Atualmente esta subtradição é tratada, pela maioria dos arqueólogos, como tradição Tupinambá.
Pesquisas que reúnem informações arqueológicas, etno-históricas e linguísticas apontam a Amazônia como local de origem dos povos que constituíram a tradição Tupiguarani e que teriam, há cerca de 3.000 anos A.P., se dispersado para o sul, seguindo duas rotas, uma pelo interior, pelos Rios Madeira, Guaporé e Paraguai e a outra, pela costa atlântica, a partir da foz do Rio Amazonas (BROCHADO, 1980, 1989; SCATAMACCHIA, 1993-1995, BUARQUE, 1999). Elas são consideradas, devido aos aspectos acima mencionados, ancestrais de falantes da família linguística Tupi-Guarani (tronco linguístico Tupi), Guarani (Tape, Carijó, Arachã, etc.) e Tupi (Tupinambá, Tupiniquim, entre outros). No início da colonização, os Guarani viviam em áreas junto à bacia do rio Paraná e litoral sul do Brasil (RS, SC, PR, MS e SP até Cananéia e países vizinhos) e os Tupi no litoral sudeste e nordeste (PROUS, 1992). Por esta distribuição, atualmente, as subtradições Corrugada e Pintada, estão sendo denominadas Guarani e Tupi, respectivamente. O limite das áreas ocupadas por elas é o mesmo entre índios Tupi e Guarani, o rio Paranapanema, entre São Paulo e Paraná (SCATAMACCHIA, 1984). Com base nessa literatura, em termos gerais, pode-se afirmar que os tupiguarani pré-históricos tinham preferência por ambientes com temperatura e umidade média, nunca ocupando áreas de clima seco e frio com mais de 400m de altitude. Estavam sempre próximos a rios navegáveis - eram exímios navegadores fluviais - à mata e muitos, também, junto ao oceano (PROUS, 1992). Para a sua subsistência plantavam, caçavam, pescavam e coletavam diversos alimentos. Na plantação empregavam o sistema conhecido como coivara, que consiste no estabelecimento de roças mistas temporárias (cerca de 3 a 4 anos) no meio da mata, próximo à aldeia, em que a retirada de plantas maiores e a queima eram procedimentos prévios. Entre os cultivos mais conhecidos estão o milho e a mandioca, mas também feijões, amendoim e algodão, entre outros. Há indicativos de que faziam o manejo das matas próximas às suas aldeias, expandindo ou até introduzindo espécies de interesse. A tradição arqueológica Guarani é considerada ancestral dos Carijó ou Cário, denominação dada aos Guarani do litoral catarinense, contatados desde a chegada dos primeiros europeus no início do século XVI. Se em relação à Tradição Guarani, como um todo, há vasta documentação (material arqueológico, documentos escritos e iconográficos) e milhares de referências bibliográficas (MELIÁ et al., 1987; NOELLI, 19938, entre outros) que permitem considerá-los um dos mais estudados no Brasil, para os Carijó, a do8 Trabalho que faz revisão crítica de publicações arqueológicas, etno-históricas, etnológicas e linguísticas referentes ao Guarani e grupos relacionados (falantes do tronco linguístico Tupi-Guarani) em todo o Brasil com ênfase ao aspecto subsistência. 16
cumentação conhecida é pouca e menor ainda são os títulos publicados. Dessa forma, no litoral de Santa Catarina, o que se conhece hoje desse povo tem como base documentos, publicações e estudos etnográficos dos Guarani que viveram em outras regiões. Há diversos relatos do século XVI que se referem a indígenas no litoral de Santa Catarina. Para o norte do Estado os mais conhecidos são os de Binot Palmier de Gonneville (PERRONE-MOISÉS, 1992), francês que alguns acreditam que esteve em São Francisco do Sul em 1503, e do espanhol Álvar Núñes Cabeza de Vaca (1999). Este último chegou a Assunção, no Paraguai, em 1541, partindo do litoral de Santa Catarina na altura da foz do rio Itapocu seguindo o Peabiru9 (caminho indígena) acompanhado e orientado por índios da Ilha de Santa Catarina. A indicação da foz do rio Itapocu, em várias publicações (por exemplo, CARDOSO e WESTPHALEN, 1986), como um dos pontos de entrada do Peabiru ao continente, conhecido pelos indígenas que viviam no litoral central de Santa Catarina, como atesta a expedição de Cabeza de Vaca, tem levado a considerar essa região como área de domínio dos Carijós, ou seja, Guarani. O Guarani indígena, em termos gerais, segue o mesmo padrão da Tradição Tupiguarani sucintamente caracterizada acima. Elementos distintivos que podem ser apontados são, além de um percentual maior da decoração plástica sobre a pintura em cerâmica, a preferência no cultivo da mandioca ao invés do milho e uma quase ausência do canibalismo. As datações existentes indicam sua presença no Centro-Oeste e no sul do Brasil entre 2.010 ± 75 anos A.P. (Foz do Iguaçu/PR) e 850 ± 75 anos A.P. (Foz do Iguaçu/PR) (NOELLI, 1999-2000). Um aspecto extremamente marcado neste grupo, segundo importantes pesquisas arqueológicas realizadas (BROCHADO, 1989; NOELLI, 1993, 19992000) é a sua paulatina expansão territorial associada ao crescimento demográfico. A presença do Guarani em extenso território, que inclui o oeste e o sul do Brasil mais territórios de países vizinhos, fez emergir uma imagem de conquistador que, ao se expandir, iria dominando, no dizer de alguns, guaranizando (DE MASI, 2000) os povos ou pessoas (NOELLI, 1999-2000) que ia encontrando. Segundo Noelli (1999-2000, p. 247-48), o Guarani tinha “a prescritividade como norma. As pessoas e as “coisas novas” eram incorporadas e enquadradas nos 9 Antes dele, em 1542, o português Aleixo Garcia tomou o mesmo caminho atingindo a Bolívia e, em 1555, outros espanhóis, entre eles Hernando de Trejo, partindo da Ilha de São Francisco chegaram a Assunção. Segundo Quandt (2003), o Peabiru partiria do canal de Três Barras na porção nordeste da Baía da Babitonga. Cardoso e Westphalen (1986) indicam uma entrada na altura do rio Itapocu e outra junto ao canal de Três Barras. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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seus códigos e estruturas [...] eram radicalmente prescritivos reproduzindo-se continuamente com pouca variabilidade na cultura material”. Em suas aldeias viviam entre 300 a 600 pessoas, em média, reunidas em famílias nucleares que compunham algumas famílias extensas em torno de uma liderança. O líder não conquistava esta posição por herança, mas por suas qualidades. Os assentamentos desses grupos se deram, em geral, como já afirmamos, próximos a cursos de água. Em termos de alimentação, além da caça e da pesca generalizada, a coleta de plantas (e mel) e o plantio eram a base da subsistência. A plantação era feita não somente nas roças dentro da mata, mas em outros locais tais como junto às casas e caminhos (NOELLI, 1999-2000). Tinham um grande conhecimento das regiões onde se instalavam, manejando espécies de interesse. Há informações que indicam terem eles trazido para o sul espécies vegetais da Amazônia. Há inúmeros estudos sobre a cerâmica que indicam uma grande variedade de formas, tamanhos e tratamentos de superfície em vasilhames que serviam para a preparação de alimentos e para o consumo. Entre os primeiros destacam-se as panelas (yapepó), que pelo tamanho avantajado também podiam servir de urna funerária, os cambuchí, talhas utilizadas para preparar e servir a bebida fermentada da mandioca (cauim) e também utilizada como urna funerária. Entre aqueles com função de servir alimento, destacam-se os copos (...) para a bebida fermentada (cambuchí caguatá) e os pratos (ñae e ñaembé) (NOELLI, 1999-2000). Em Santa Catarina pouco foi produzido pela Arqueologia sobre os Guarani. Há bem mais referências a sítios identificados com informações de moradores em todo o estado do que a partir de pesquisas em sítios arqueológicos. No litoral, Piazza (década de 60), Eble e Rohr (década de 70) e Lavina, recentemente (1999, 2000), realizaram pesquisas em sítios Guarani. Desde a década de 1990, com o advento dos estudos ambientais, muitas áreas passaram a ser alvo de levantamentos arqueológicos. Entretanto, nas áreas atingidas pela Usina Hidrelétrica (UHE) Quebra Queixo (São Domingos e Ipuaçu), pela Linha de Transmissão (LT) Quebra Queixo-Pinhalzinho (de Ipuaçu a Pinhalzinho, extremo oeste), pela UHE Barra Grande (de Anita Garibaldi a Lages), pela UHE Salto Pilão (Ibirama, Lontras e Apiuna) e pela LT Blumenau-Itajaí, nenhum sítio Guarani foi encontrado10. Já no litoral sul e central, a maioria dos levantamentos tem identificado sítios dessa tradição11. 10 Conforme informação oral da arqueóloga Ana Lúcia Herbets que participou destes levantamentos. 11 Conforme informação oral da arqueóloga Ana Lúcia Herbets, no levantamento da BR-101, doze novos sítios Guarani foram localizados, além de três sítios cerâmicos, provavelmente Ita18
Somente dois sítios Guarani foram parcialmente estudados no litoral do Paraná, segundo Chymz (2002). Os registros desses sítios foram todos frutos de descobertas pontuais, ou seja, poucas foram as áreas com levantamentos sistemáticos. Esta falta de informação deve-se, segundo ele, ao privilégio dado aos sambaquis. Os registros de cerâmica Guarani no litoral do Paraná remontam ao início do século passado, em Paranaguá e Antonina, associados a sítios a céu aberto (manchas pretas) (CHYMZ, 2002). Bigarella (1950-51) registra três sítios com cerâmica que atribui aos Guarani, às margens da baía de Guaratuba. Chymz (2002) em visita a estes sítios constata que apresentam cerâmica Itararé. Somente um deles teria camada com cerâmica Guarani sobre a Itararé. Esta cerâmica Guarani corresponde a vasilhas com acabamento simples, corrugado ungulado e ungulado tangente e grãos grossos de antiplástico. Apesar de a cerâmica analisada por Chymz ser considerada Guarani, consultando-se relatos do século XVI, sobre presença indígena no litoral do Paraná, encontram-se indícios de que lá estariam índios Tupiniquin, apontando uma contradição entre dados arqueológicos e etno-históricos e levantando dúvida acerca dos limites entre os Guarani e os Tupi. Piazza trabalhou em Santa Catarina enquanto esteve vinculado ao PRONAPA, no litoral norte, no planalto de Canoinhas, nos campos de Lages, no vale do Itajaí e no médio e alto Uruguai. Este pesquisador identificou sítios Guarani somente no litoral norte e no médio e alto Uruguai (PIAZZA, 1971 e 1974). No litoral norte, localizou um sítio (Poço Grande) a partir do qual criou a fase Itapocu, da subtradição Corrugada, situada cronologicamente entre 1.500 e 1.600 depois de Cristo (d.C.)12. No médio Uruguai, identificou sítios para os quais propôs a fase Mondaí, da subtradição Corrugada, datada em torno de 500 d.C. Já para o alto curso desse rio propôs duas fases, a Ita e a Ipira, sendo a primeira da subtradição Corrugada e a segunda da Escovada. Para a fase Ita obteve datação em torno de 1.000 anos A.P., enquanto para a Ipira, obteve uma cronologia que estaria entre 1.500 e 1.600 d.C. Esse mesmo autor realizou escavações no sítio Rio Tavares, situado em área de dunas em Florianópolis (PIAZZA, 1965). Para a Ilha de Santa Catarina, além dos trabalhos de Rohr e Piazza, Schmitz (1959) faz uma síntese da cerâmica Guarani. raré. Em Florianópolis, dois sítios Guarani foram identificados em estudos ambientais na Praia do Campeche. 12 Piazza indica em mapa na publicação de 1974 um sítio Guarani na Ilha de São Francisco do Sul próximo ao sambaqui Enseada. No entanto, este sítio nunca foi encontrado em diversos levantamentos realizados recentemente nem mencionado pelos antigos arqueólogos que trabalharam na região como Bigarella, Tiburtius, Beck e Rohr. O que nos leva a questionar a existência do mesmo. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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No Vale do Itajaí foram realizados levantamentos nas décadas de 60 e 70, por Piazza e Eble (1969) que constataram a presença de grande número de sítios de diferentes tipologias – casas subterrâneas, abrigos-sob-rocha, grutas, sítios cerâmicos e sítios abertos, mas um único sítio Guarani (SC-VI-69) (EBLE e SCATAMACCHIA, 1974). Este sítio, segundo Eble (1973, p. 47) “está completamente dissociado do contexto geográfico que normalmente suporta material tupiguarani, isto é, o litoral e a região do Vale do Rio Uruguai”. Rohr (1984), na sua publicação Sítios Arqueológicos de Santa Catarina refere-se ao litoral registrando os seguintes paradeiros Guarani: 20 em Jaguaruna, 02 em Imbituba, 02 em Garopaba, 01 em Paulo Lopes, 01 em Palhoça, 06 em Florianópolis e na bacia do Uruguai, 51 no município de Itapiranga, 02 em Mondaí, 02 em Caxambu do Sul, 01 em Chapecó e 04 em São Carlos. Note-se que os sítios Guarani cadastrados por Rohr, no litoral de Santa Catarina, ocorrem somente nos municípios do sul do Estado (o município mais ao norte é Florianópolis), embora cadastre grande quantidade de sambaquis e “sítios rasos de sepultamento” (cerâmica Itararé) em vários municípios do litoral norte. O tamanho das aldeias Guarani varia entre 60m2 e 10.000m2 e estão, na maioria das vezes, próximas a cursos de água doce (lagoas e rios) e até a 5km de distância do oceano, principalmente em áreas de substrato arenoso, como as restingas (ROHR, 1984; LAVINA, 1999 e 2000). Há, entretanto, raros registros de sítios Guarani em encosta de morro no litoral, como é o caso do sítio cadastrado por Lavina no canto norte da Praia do Rosa, em Garopaba, a uns 60m de altura em frente a uma lagoinha. Algumas vezes, a cerâmica Guarani ocorre sobre ou misturada com cerâmica da Tradição Itararé. Este é o caso do sítio raso da Tapera, em Florianópolis, pesquisado por Rohr, cujo material foi revisto por Silva et al., (1990). No litoral de Santa Catarina, as datações mais antigas indicam o início da ocupação em torno de 500 anos antes da chegada dos primeiros europeus no Brasil (1050 ± 150 anos A.P., mancha 19, Tubarão, Lavina, 1999). No litoral sul, Lavina (2000), através dos estudos realizados para a construção da rodovia Interpraias, escavou três sítios Guarani (Acampamento da Escola Isolada Lagoa dos Esteves, Aldeia do Cemitério da Lagoa dos Esteves e Aldeia da Lagoa Mãe Luzia). Datações de 720 ± 70 e 610 ± 60 anos A.P. foram obtidas para os últimos dois sítios. Esse mesmo arqueólogo, em estudo realizado na ZPE, em Tubarão (LAVINA, 1999), também no litoral sul, localizou 25 estruturas de habitação. Das escavadas obteve datações entre 715 ± 75 e 1.050 ± 150 anos A.P. Nessa região, Eble e Schmitz (1972) escavaram um sítio sobre dunas no município de Laguna. 20
TRADIÇÃO GUARANI NA REGIÃO DA BAÍA DA BABITONGA – LITORAL NORTE DE SANTA CATARINA No litoral norte, apesar das menções a indígenas desde o início da colonização, os dados arqueológicos publicados a que tivemos acesso referem-se a um único sítio Guarani, situado às margens do rio Poço Grande, afluente do rio Piraí (PIAZZA, 1974), nos limites entre os municípios de Joinville e Guaramirim, localidade denominada Poço Grande, anteriormente mencionado. Há suspeita, pela presença de poucos fragmentos cerâmicos corrugados, de sítio Guarani junto ao rio Sambaqui, afluente do rio Palmital, em Joinville. Segundo a arqueóloga Mírian Baptista Carle (comunicação verbal) foi identificado sítio Guarani em São Francisco do Sul em 2011 na localidade de Iperoba (UTM 741437E/7097183S) durante trabalhos de Arqueologia de contrato. Outra referência a possível sítio Guarani é de Gualberto (1908, p. 296) quando se refere a sambaquis na região. Declara: [...] se tem encontrado nos Sambaqui igaçabas ou urnas de barro, como um facto raro, e eu mesmo encontrei e possuo fragmentos que se podem atribuir a um desses vasos, achados em um Sambaqui, perto da foz do rio Paraty, pouco distante do canal do Araguary, que é a barra sul do rio de S. Francisco do Sul.
Pela terminologia que usa – igaçabas - parece estar referindo-se a um sítio com cerâmica Guarani. Entretanto, ao mencionar que possuía fragmentos, parece não ter encontrado um vasilhame inteiro de grandes dimensões que é característico desta tradição. Além disso, não se tem, via de regra, ocupações Guarani sobre sambaquis; isto tem sido uma característica das ocupações Itararé. Segundo Santos (apud CHYMZ, 1951, 2002, p. 75-95) o frei Gaspar da Madre de Deus, no século XVIII, teria mencionado “achados de “...pedaços de panellas quebradas...” em ostreiras da Província de Santa Catarina”. Acreditamos ser a mesma situação. Por outro lado, a toponímia das denominações de diversos acidentes geográficos, municípios, localidades e bairros da região indicam suas origens em língua indígena que acreditamos ser Tupi-Guarani. Para o nome da baía, Babitonga, há diferentes interpretações. Para Gualberto (apud PEREIRA, 1984) Babitonga seria uma variação de ibiporanga – ibi - terra e poranga - formosa. Teodoro Sampaio (apud PEREIRA, 1984) considera ser Babitonga variação de Bopitanga, por
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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sua vez, variação de mbipitanga que significa - de vermelho ou avermelhar, ou variação de mbaé-pitanga - a vermelha. Tenório de Albuquerque (apud PEREIRA, 1984) acredita ser corruptela de babaétoungá – lugar contornado pelas águas ou lugar das pitangueiras. Identificamos outros topônimos na região que parecem corresponder a palavras (ou radicais) de língua Guarani. Conforme o dicionário de Luiz Caldas Tibiriçá (1989) e Bueno (1982), seus significados podem ser os seguintes (Quadro 1):
Quadro 1 – Topônimos da região Baía da Babitonga Topônimo
Tipo/Município13 Correlato em Guarani segun- Correlato em Guarani segundo do Tibiriçá (1989) Bueno (1984)
Acarai
Rio /SFS
Araquari
Município/ARA
Caraí - senhor, vinho ou chicha de cará A – fruto, semente, sombra, alma Ara – diaCuarahi – sol Cuari – furo
Acara – cascudo Caraí – variedades de macacos Acaray – rio dos acarás Araquara – esconderijo de papagaio Ara – dia, nascer, correr, alto Quara – furado, cuá, kuá - cintura, meio – ri – líquido, água corrente, Araguari – rio das baixadas dos papagaios ou araras
Arataca
Estrada/ JLL
Babitonga
Baía/ diversos
Bupeva
Localidade/SFS
Cubatão
Rio/JLL
Ara – dia, tempo, céu, firma- Arataca – armadilha para caça mento, mundo, época de pequeno porte Mba – totalidade
Embopitanga – nome dado à barreira avermelhada nas costas de SC
Peva (= pea) – esse (a), abrir, Yby – terra sacar, separar. Peba – chata, plana, planície
13 SFS, São Francisco do Sul; ARA, Araquari; JLLE, Joinville; ITA, Itapoá; GUAR, Guaramirim. 22
Quadro 1 – Topônimos da região Baía da Babitonga Topônimo
Tipo/Município
Gamboa
Rio e Localidade/
Correlato em Guarani segun- Correlato em Guarani segundo do Tibiriçá (1989) Bueno (1984) Caá-mbó – o feixo, barreira para peixe
SFS Iperoba
Localidade/SFS
Ipe – na água, Ipé – pato I – pé – o que é plano, raso Ro – amargo, rançoso, variedade de mandioca.
Ipiranga
Ypé-roba – casca amarga, igual a Peroba Árvore de lenho duro
Localidade/
I – água, rio
Ipyrunga – começar
ARA
Piri – junco, esteira
Ypy – pé planta, fundo do rio
Anga – alma, espírito, essência, ânimo. Iririú
Bairro/JLL
Iriru – recipiente de água
Iriri = riri – ostra, molusco
Riru – vasilha, recipiente
U – comer, beber, morder, preto, negro
I – água, rio Itapoá
Município/ ITA
Ita – pedra
Ita-apuã – cabo de pedra
Po-a – sorte
Ita – pedra
Pu-ã – levantar-se, por-se de Pu – onomatopéia de estampipé do Pu – rebentar, som. Ã – sombra, alma.
à – cousa, objeto, instrumento redondo
Á – cair, desprender-se Itaum e Itaum-açu
Bairro e rio/ JLL
Ita – pedra
Itaú – pedra preta
Hu (~) – negro, flecha. Assu – lado esquerdo
Itinga
Bairro/
Tingá – quebrar as pontas
Itinga – água branca, rio branco
JLL
I – água, rio
I – água Tinga – branco
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Quadro 1 – Topônimos da região Baía da Babitonga Topônimo
Tipo/Município
Correlato em Guarani segun- Correlato em Guarani segundo do Tibiriçá (1989) Bueno (1984)
Itacoara
Morro/
Ita – pedra
JLL
Cuara (= cuá) – furo, cova, orifício, abertura
Itakuara – cova de pedra, furna, gruta Taquara – bambu I - água
Itapocu
Rio/ sos
Ita – pedra diver-
Itapucu – pedra comprida
Pucu – comprido, alto
Jacu
Localidade/ARA
Jacu – ave galinácea de carne saborosa
Yacu – desconfiado, ave
Jacutinga
Rio e Morro/SFS
Jacu – ave galinácea de carne saborosa
Yacu -tinga – jacu branco
Ingá – arvore da família leguminosa Jaguaruna
Rio/Localidade/ ITA
Yaguara – cão, onça, tigre Una – preto
Jarivatuba
Bairro/JLL
Jarivá – variedade de palmeira
Jativoca
Localidade/
Jati – montículo, amontoado
JLL
Oca – praça, rua
Tuva - pai
Jaribá – fruta que cai antes de amadurecer Tuba – pai Jativ – ia-ti – que está por tinga, ou abelhas claras Jatii – furúnculo, tumor Boc – cova, buraco
Mutuca
Rio/JLL
Paranaguá-mirim
Bairro/JLL
Mutuca ou butuca – vespão, mosca grande Paraná – rio caudaloso Guá – indica procedência Miri (~) – pouco, pequeno.
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Paranaguá – enseada do mar, baía, porto Mirim – pequeno
Quadro 1 – Topônimos da região Baía da Babitonga Topônimo
Tipo/Município
Correlato em Guarani segun- Correlato em Guarani segundo do Tibiriçá (1989) Bueno (1984)
Parati
Rio/ARA
Pará – matizado, tabaco, mar, oceano.
Paraty – baía, porto e mar tranquilo
Ti (^,~) – nariz, bico, pudor, vergonha, urina, montão, ponta, branco
Paratyy – rio das tainhas Pirati - tainha
Parati – Tainha Pirabeiraba
Distrito/
Piraí
Rio/JLL
Pira – crua, cru.
JLL
Pira – pelo, couro Pirábiá – peixeiro, cevar peixe Eirabiá – gosto do mel
Pira – cru, crua
Pira – couro, pele
Pirãi – peixe de dente aguPira – peixe de pele ou couro çado terrivelmente agressivo I – água Quati
Rio/GUA
Cuati – pequeno roedor
Quati – quati
Quiriri
Rio e serra /JLL
Kiriri – calar, silenciar, silêncio, quietude
Quiriquiri – gavião, falcão
Saguaçú
Lagoa/JLL
Saguassu – grande (fruta,semente), variedade de bugio
Saí (Saí-mirim e Saí-guassu)
Localidade/
Sai – galinheiro,
ITA
Sa-i - pequeno, pouco, escasso
Saí – pássaro Sai (~) – olhos pequenos, esperto
Sa-i – nome de várias aves Miri (~) – pouco, pequeno Guassu – grande Tapera
Localidade/SFS
Taperá – espécie de andorinha grande Taperé – tapera, casa abandonada, em ruínas
Taperá – andorinha Taba-era – taba (aldeia) abandonada em ruínas
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Quadro 1 – Topônimos da região Baía da Babitonga Topônimo
Tipo/Município
Correlato em Guarani segun- Correlato em Guarani segundo do Tibiriçá (1989) Bueno (1984)
Ubatuba
Rio e Localidade /SFS
Tuva – pai
Yba tyba – pomarUibá-tyba – canavial das flechas Ybá-tyba – porto das canoas
Una
Localidade/SFS
Una – preto, Uná - grãos
A questão da toponímia será retomada mais adiante. Em pesquisa realizada por nós em nosso doutoramento (BANDEIRA, 2004) não foram identificadas novas evidências arqueológicas de ocupação Guarani. Nenhum dos 72 sambaquis prospectados por nós apresentou material que possa ser associado a esta Tradição. Os arqueólogos entrevistados nesta pesquisa que estudaram a região no passado (Anamaria Beck, Walter Piazza e João José Bigarella) não tinham informações além das já publicadas sobre sítios Guarani. Piazza não confirmou a existência de sítio Guarani na Enseada. Além disso, foram obtidas informações, com alguns moradores contatados, sobre sambaquis com cerâmica, porém, nenhum deles apresentou cerâmica desta Tradição. Considerando não ter sido identificado outro sítio desta Tradição na região, realizamos (BANDEIRA, 2004) nova escavação no sítio Guarani Poço Grande, já mencionado, cujo alto grau de destruição produzido por quase 100 anos de plantio, inclusive com maquinário moderno, permitiu unicamente a coleta de algum material cerâmico muito fragmentado e desgastado. Além destes escassos dados arqueológicos, há uma vasta lista de publicações e documentos que se referem ao litoral brasileiro nos primeiros séculos de colonização. Entretanto, em se tratando de Santa Catarina e, em particular o litoral norte, são escassas. A literatura mais acessível apresenta informações dos séculos XVIII e XIX sobre o litoral central, como é o caso da publicação Ilha de Santa Catarina – Relatos de viajantes estrangeiros nos séculos XVIII e XIX (HARO, 1996). Alguns desses viajantes estiveram no litoral norte e mencionam a cidade ou porto de São Francisco ou São Francisco do Sul e cujos textos podem ser encontrados nos volumes reeditados na Coleção Reconquista do Brasil, das editoras Itatiaia e da USP. O inglês Mawe (1978, p. 57), que esteve em Santa Catarina em 1807, refere-se ao “magnífico porto de São Francisco”. O francês Auguste Saint-Hilaire (1978) 26
apresenta, em Viagem a Curitiba e Província de Santa Catarina, capítulo específico sobre o Distrito de São Francisco, no qual teria estado em 1820. Seu relato é interessante porque remete constantemente a outros autores que escreveram sobre a região, no século XIX, como Aubé e Mawe, e também nos primeiros séculos da colonização, como Gabriel Soares de Souza (em sua viagem de 1587). Saint-Hilaire (1978) quando se refere aos indígenas da região menciona o Carijó. Diz “A ilha de São Francisco tinha sido outrora ocupada pelos índios Carijós” (SAINT-HILAIRE, 1978, p. 141). Deixando claro, entretanto, com esta afirmação e com outra frase que inicia com “No tempo dos índios...” (SAINT-HILAIRE, 1978, p. 139), que na época de sua visita não havia mais índios na região. Há várias outras publicações que tratam de visitas à região de São Francisco como as de Carl Seidler em 1825, de Robert Avé-Lallemant em 1858, de Ferdinand Denis (1980) e do Pe. Aires de Casal (1976). Entretanto, não há referência à presença indígena. Pelo decurso dos séculos anteriores, não mais havia índios Guarani no litoral catarinense. Quando mencionados nesses relatos, o foram com base em informações de personagens que estiveram em Santa Catarina, nos séculos XVI e XVII. Muitos foram os europeus que passaram pela costa catarinense nos dois primeiros séculos da colonização. Nas obras clássicas que tratam da História de Santa Catarina (BOITEUX, 1912; CABRAL, 1994; LUZ, 2000; PIAZZA, 1983) há referências, para o século XVI, aos seguintes viajantes: Binot Palmier de Gonneville (1504); Dom Nuno Manoel e Cristovão de Haro (1514) que deram o nome de São Francisco à região, conforme Boiteux (1912); João Dias Solis (1515) que se refere à Ilha da Prata, que alguns consideram Santa Catarina e outros, São Francisco, e deu o nome de São Francisco à região, segundo Pereira (1984); Cristovão Jacques (1521); Fernão de Magalhães (?); Alonso Garcia (1522); Garcia Jofre de Loyasa e Don Rodrigo de Acuña (1525); Sebastião Caboto (1526 ou 1542); Martin Afonso de Souza (1531-1532); Pedro Mendoza e Gonzalo de Mendoza (1534); Alonso Cabrera (1537); Don Álvar Núñes Cabeza de Vaca (1541); Juan Hernandes (?), vindo do Paraguai para incentivar o cultivo da mandioca entre os índios para abastecer navios (conforme Cabral, 1994); Diego Sanabria (Filho de Juan de Senabria) com Juan de Salazar y Espinoza (1553); Hans Staden (1549); Dom Pedro Ortiz de Zarate (1572); Rui Dias de Melgarejo (1573); Don Diego Mandieta (1573); Francis Drake (1581); Juan Ortiz de Zarate (?) e Jaime Rasquim (?). A historiografia regional, em geral, tem considerado que a expedição do capitão francês Binot Palmier de Gonneville esteve em São Francisco do Sul nos primeiros anos do século XVI (de 05 de janeiro a 3 de julho de 1504). O municí-
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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pio de São Francisco do Sul comemorou seus 500 anos em 2004. Entretanto, há controvérsias se esta expedição esteve mesmo em São Francisco do Sul. O relato dessa expedição seria o primeiro, e um dos poucos conhecidos até o momento, que faz referência aos indígenas que viviam no litoral norte de Santa Catarina nesse período. No livro de Leyla Perrone-Moisés (1992), intitulado Vinte Luas, há, na íntegra,14 o documento (Relação da Viagem do Capitão de Gonneville às Novas Terras das Índias) em que Gonneville conta, resumidamente, como foi a viagem e descreve as aldeias e alguns dos costumes indígenas, já que o diário de bordo foi perdido com o naufrágio do navio após ataque de piratas. Os aspectos da cultura material dos nativos descritos são fontes importantes para uma possível analogia entre as informações arqueológicas e dos Guarani em geral. Destacamos os seguintes trechos: [...] vivendo da caça e pesca, e do que a terra lhes dá de per si, e de alguns legumes e raízes que plantam; indo meio nus, os jovens e a maioria dos homens usando mantos, ora de fibras trançadas, ora de couro, ora de plumas, como aqueles que usam em seus países os egípcios e os boêmios, exceto que são mais curtos, com uma espécie de avental amarrado sobre as ancas, indo até os joelhos, nos homens, e nas mulheres até o meio das pernas; pois homens e mulheres se vestem da mesma maneira, exceto que a vestimenta da mulher é mais longa. E usam as fêmeas colares de pulseiras de osso e de conchas; não o homem, que usa, em vez disso, arco e flecha tendo por virotão um osso devidamente acerado, e um chuço de madeira muito duro, queimado e afiado no alto; o que constitui toda a sua armadura. E vão as mulheres e as meninas com a cabeça descoberta, tendo os cabelos gentilmente trançados com cordéis de ervas tingidas de cores vivas e brilhantes. Quanto aos homens, usam longos cabelos soltos, com um círculo de plumas altas, de cores vivas e bem dispostas. [...]. Também dizem que o dito país é medianamente povoado. E as habitações dos índios formam aldeias de trinta, quarenta, cinquenta ou oitenta cabanas, feitas à maneira de galpões com estacas unidas umas às outras, ligadas por ervas e folhas, com as quais os ditos habitantes são igualmente cobertos; e têm por chaminé um buraco, para sair a fumaça. As portas são bastões corretamente ligados; e eles as fecham com chaves de madeira, quase como as que se usam, nos campos da Normandia, nos estábulos. E seus leitos são as esteiras macias cheias de folhas ou penas, suas cobertas são esteiras, peles de animais ou plumagens; e seus utensílios domésticos 14 Tradução feita por esta autora do documento original em francês. 28
são de madeira, mesmo as panelas, mas estas são revestidas de uma espécie de argila da espessura de um dedo, o que impede que o fogo as queime. Também dizem ter notado que o dito país está dividido em cantões, cada um com seu Rei; e embora os ditos Reis não sejam mais bem alojados e vestidos do que os outros são muito reverenciados, por seus súditos; e nenhum é tão atrevido que ouse desobedecer-lhes, já que eles têm poder de vida e de morte sobre seus vassalos [...]. O dito rei era aquele em cuja terra permaneceu o navio; seu nome era Arosca. Seu país tinha a extensão de um dia, e era povoado de cerca de uma dúzia de aldeias, cada uma das quais tinha seu capitão particular, e todos obedeciam ao dito Arosca. [...] em paz com os Reis vizinhos, mas eles e seus vizinhos guerreavam com outros povos das terras interiores: contra os quais investiu duas vezes, durante a estada do navio, levando de quinhentos a seiscentos homens cada vez [...] (PERRONE-MOISÉS, 1992, p. 21-23). Entretanto, para Pereira (1984) a questão acerca do local onde aportou a expedição de Gonneville continua em aberto. A semelhança entre a baía de Babitonga e o rio francês Orne identificada pelos expedicionários quando adentraram a costa à procura de um porto não se confirma. Além das diferenças morfológicas (o rio Orne seria muito menor), a questão básica é que a Babitonga não é um rio, embora a maioria das baías brasileiras tenha sido identificada como rios (Rio de Janeiro, por exemplo, entre outros). As publicações todas (Cândido Mendes de Almeida, Tristão de Alencar Araripe, H. Boiteux, entre outros) que afirmam ter estado Gonneville e sua expedição na baía da Babitonga, basearam-se na conjetura do geógrafo francês Armand d’Avezac (PEREIRA, 1984 p. 24) que, em 1869 publicou a relação autêntica. Neste documento, declara: Como a terra onde aportaram era ao sul do trópico e aí chegaram ao cair das calmarias, torna-se evidente que o surgidouro deverá ser na costa do Brasil, entre as latitudes de 24’ por lado e 27’ a 30’ por outro lado. Ora, na latitude média entre os dois termos, aos 26’ e 10 sul, desemboca o Rio de São Francisco do Sul, no país habitado pelos Carijós (apud PEREIRA, 1984, p. 17). Aleixo Garcia (em 1522) e Álvar Nuñes Cabeza de Vaca (em 1541), também estiveram na costa norte catarinense. Percorreram o caminho indígena conhecido como Peabiru que ligava o Atlântico ao Pacífico. O segundo viajou até Assunção e o primeiro até os Andes, tendo sido o primeiro europeu a conhecer o império Inca (BOND, 1998). Ambos deram início à viagem na foz do rio Itapocu, acompanhados de índios Guarani. Outro viajante, que também empreendeu esta viagem, foi Juan de Salazar y Espinoza, em 1551.
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Tivemos acesso ao relato de Álvar Núñes Cabeza de Vaca, através da edição de 1999 de seu livro Naufrágio e Comentários. Entretanto, nada menciona sobre o litoral norte e nem sobre indígenas que habitavam aquelas terras. Unicamente diz: “Cruzaram pelo rio Itabocu, tendo tomado posse do mesmo e de toda aquela terra em nome de Vossa Majestade, como terra nova descoberta” (CABEZA DE VACA, 1999, p. 156). Hans Staden (1974), na segunda viagem que fez ao Brasil, em 1549, com Juan de Salazar y Espinosa, esteve, devido ao naufrágio da embarcação em que viajava, durante dois anos na Ilha de Santa Catarina. Menciona em alguns momentos a presença indígena, porém, sem apresentar maiores informações. Dado importante relativo a esta viagem é que parte da tripulação que ficou na ilha de Santa Catarina mudou-se para a Ilha de São Francisco e lá permaneceu por cerca de dois anos. Entre eles está o casal Hernando de Trejo e Maria de Sanábria,15 que teve, nesta ilha, o filho Hernando de Trejo y Sanábria, posteriormente, bispo de Tucuman e fundador da Universidade de Córdoba. Em 1553, o jesuíta Leonardo Nunes, chega à ilha para resgatar as senhoras. Entretanto, não encontramos nenhuma publicação que trouxesse maiores informações sobre este período ou referência a documento produzido por alguns dos membros da expedição. Outro tipo de fonte em que é possível encontrar informações sobre indígenas de Santa Catarina, são os relatos de religiosos. Uma das mais importantes referências é a obra de Serafim Leite (1945) História da Companhia de Jesus no Brasil. Há um capítulo específico no livro V sobre Santa Catarina. São relatadas, para a segunda metade do século XVI e século XVII, as missões dos seguintes padres: Leonardo Nunes em 1553, Pero Correia e João de Souza em 1554, Agostinho de Matos e Custódio Pires em 1596, Jerônimo Rodrigues e João Lobato entre 1605-1607 (A Missão dos Carijó), Afonso Gago e João de Almeida em 1609, João Fernandes Gato e João Almeida em 1617, Antônio de Araújo e João de Almeida em 1622, Pedro da Mota e Pero Rodrigues em 1624, Manuel Pacheco e Francisco de Morais em 1628, Inácio de Siqueira e Francisco de Morais em 1635. A missão dos padres Jerônimo Rodrigues e João Lobato, que tivemos oportunidade de ler na íntegra, não se refere a índios do litoral norte de Santa Catarina. Apesar de que, na relação produzida pelo Padre Jerônimo Rodrigues, 15 Em pesquisa no Arquivo Nacional www.arquivonacional.gov.br e Biblioteca Nacional www.bn.br não encontramos informações disponíveis indexadas a este período e a estes personagens. O mesmo ocorreu em pesquisa que fizemos no Arquivo Público de Santa Catarina (só documentação a partir XVIII). O Catálogo de documentos avulsos manuscritos referentes à Capitania de Santa Catarina – 1717-1827 de Serpa e Flores (2000) não aborda a documentação referente aos primeiros séculos de colonização. 30
ao relatar a origem e uma das justificativas da missão, diz “[...] em que lhe pedia Padres pera virem com ele a pousar no Rio de S. Francisco, que está naquela paragem, aonde os Carijós mataram nossos Irmãos [...]” (LEITE, 1940, p. 197). Entretanto, o destino dessa missão era Laguna. Ao se referir à chegada a Laguna, Padre Jerônimo diz “E assim chegamos à terra dos Carijós, aos 11 de Agosto de 1605 [...]” (LEITE, 1940, p. 215). Como se ali vivessem os Carijós e não, em outros pontos do litoral. Durante a viagem, são forçados a adentrar o Rio de São Francisco. Deste trecho da viagem a única menção a indígenas é a seguinte: Saídos, pois de Paranaguá, fizemos nossa viagem com mares mui grossos, e sempre a remos. E, chegando de fronte da barra de um rio, que se chama Guaratiba, não achamos remédio pera nele podermos entrar, e botar muitos escarcéus ao mar. E assim nos foi forçado (ainda que era quase noite) irmos, por diante, ao Rio de S. Francisco, que estava dali a quatro ou cinco léguas, no qual entramos perto da meia noite, como se entráramos por um rio morto, por ter uma barra mui fermosa, grande e funda. Só dos padres moços tínhamos lástimas, por já não poderem consigo, com haverem remado sem descançar, desde pela manhã até aquelas horas; mas quis-nos o Senhor logo consolar com acharmos alí uma canôa de Carijós, que logo pela manhã nos vieram visitar; pregando um deles, e mostrando alegria com nossa vinda; mas, depois, não foi qual nos cuidávamos que fôsse. Este foi um dos que o P. Custódio Pires e o P. Agostinho de Matos tinham trazido de S. Vicente aos Patos. E assim, logo disse ao Padre que désse facas a todos os que ali tinha consigo, sem nos oferecer nem sequer uma talhada de carne de moquém da muita que tinha (LEITE, 1940, p. 212-213). Temos a impressão que já neste período não havia maiores concentrações de índios no litoral norte. Por sua proximidade maior com paulistas, deve ter sido uma das primeiras regiões alvo das sangrentas expedições de aprisionamento e escravização. Conforme Monteiro (1994, p. 37) “[...] já existia, antes mesmo da fundação de São Vicente, um modesto tráfico de escravos do litoral sul, encontrando-se, no meio do século [XVI], muitos escravos carijós nos engenhos de Santos e São Vicente”. O relato do padre Jerônimo refere-se a Carijós passando fome, aldeias pequenas com poucos índios como atesta esse trecho em que conta: [...] E assim nos metemos na primeira casa da primeira aldeia, que segunda nem terceira e outra alguma tinha. E assim são cá todas as aldeias, de maneira que, a uma casa, chamam aldeia. E esta não tinha dentro em si mais de tres moradores, ou para melhor dizer tres casai com tres ou quatro filhos [...] (LEITE, 1940, p. 216-17).
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É indubitável o alto grau de alteração que o modo de vida destes índios já sofrera no início do século XVII, o que torna qualquer tentativa de usar estes relatos como fonte para atingir o Guarani pré-colonial, muito frágil16. Embora não trate da região que estamos focando, em consulta à obra do padre jesuíta Antônio Ruiz de Montoya (1997) que missionou, em meados do século XVII, pelas Províncias do Paraguai, Paraná, Uruguai e Tape constatamos que há várias indicações de costumes dos Guarani e diferenças entre eles. Não há dúvidas que no litoral norte de Santa Catarina há indícios da presença Guarani atestada pelo sítio cadastrado por Piazza parcialmente escavado por nós (BANDEIRA, 2004). Com todos os prejuízos que a cerâmica coletada apresentava, percebeu-se elementos que podem ser relacionados à cerâmica Guarani. Antiplástico constituído de grãos de minerais e cacos de cerâmica moídos (em menor quantidade). Fragmentos com espessuras de 15 mm, que remetem a vasilhames de grandes proporções. Cerca de 15% dos fragmentos com vestígios de pintura, além de fragmentos com decoração plástica dos tipos ungulado simples, digito-ungulado e ungulado em barra longitudinal. Essas características são as mesmas identificadas nas cerâmicas descritas para sítios de Paranaguá, Paraná (CHYMZ, 2002), de Florianópolis (SCHMITZ, 1959; PIAZZA, 1965) e do litoral sul de Santa Catarina (LAVINA, 1999 e 2000). Além disso, o local de implantação – planície aluvial às margens do rio Poço Grande – corresponde a um ambiente similar a outras antigas aldeias Guarani no litoral de Santa Catarina. Entretanto, esse sítio não está na baía da Babitonga. Nesta, há somente um registro de sítio Guarani (feito por Mirian Baptista Carle anteriormente mencionado). Este fato, certamente, pode ser decorrente da baixa visibilidade que estes sítios têm se comparados aos sambaquis. Também se pode considerar que suas aldeias estivessem justamente onde hoje estão as cidades que margeiam a baía, já mencionadas. São frequentes os registros de sítios pré-históricos sob estruturas urbanas (por exemplo, o sambaqui que havia onde está hoje o Clube Harmonia Lyra, em Joinville, no centro da cidade). Outro ponto a se considerar é a maior fertilidade que os solos de antigas aldeias apresentam. Com o acúmulo de matéria orgânica durante a ocupação, estas áreas tornam-se melhores para a horticultura. Há registros de sambaquis cuja superfície foi utilizada para lavoura (por exemplo, sambaqui Espinheiros II em Joinville e Bupeva I em São Francisco do Sul). O plantio, como nós pudemos constatar no sítio Poço Grande, pode destruir as camadas arqueológicas, princi16 O impacto da Conquista Ibérica nas estratégias territoriais Guarani é igualmente destacado Wagner, Dias e Baptista da Silva e Milheira neste volume. 32
palmente quando se trata de sítios com camadas delgadas como é característico de sítios Guarani, que não ultrapassam 50 cm (LAVINA, 1999). Entretanto, acreditamos que todos os sítios não podem ter sido destruídos. A literatura etno-histórica que se refere explicitamente a grupos que viviam nesta região, ainda é escassa. Descrição com maior detalhamento conhecida é a relação de Gonneville, cujo ponto da costa que arribou não está inquestionavelmente definido. No litoral do Paraná a situação não é diferente – a presença indígena no início da colonização não é conhecida. Chymz (2002, p. 74) diz o seguinte sobre esta questão: “Pouquíssimos dados podem ser resgatados na documentação existente com relação ao tipo humano e aos usos e costumes dos índios”. A descrição que Gonneville faz dos indígenas que viviam na região, se comparada com as produzidas para os Guarani em outras regiões, levanta alguma dúvida quanto à sua vinculação com este grupo. Temos aqui uma situação intrigante. Se Gonneville esteve mesmo na Ilha de São Francisco duas possibilidades se colocam: ✓ Contatou grupo Guarani com diferenças significativas daqueles descritos em outras regiões; ✓ Ou contatou grupos de outras etnias que vivam na região. ✓ Ambas as hipóteses levantam dúvidas acerca do modelo de ocupação solidamente estabelecido para o litoral catarinense que preconiza que eram os Guarani ou Carijó que viviam nesta região, no período da chegada dos europeus. Por outro lado, ao se considerar Guarani o grupo mencionado, questiona-se, também, a tese da manutenção, por estes índios, de um mesmo padrão cultural por todas as regiões que ocupou, desde sua saída da Amazônia, defendida por alguns (NOELLI, 1993). Lavina (2000, p. 91), referindo-se a Gonneville como um dos primeiros europeus a entrar em contato com os Guarani diz: [...] embora uma leitura atenta da cultura material e da sociedade encontrada pelos navegadores levante dúvidas a respeito [da vinculação dos indígenas descritos por eles e os Guarani], já que muitos dados não condizem com o que se conhece a respeito da cultura Guarani convencional.
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Em nossa avaliação17, pelo menos três pontos da descrição dos indígenas feitas por Gonneville distinguem-se bem das descrições feitas dos Guarani: 1) Em todos os relatos é colocado como hábito Guarani o de dormir em rede e não em esteiras. Conforme Gonneville, seus ”leitos são as esteiras macias cheias de folhas ou penas, suas cobertas são esteiras, peles de animais ou plumagens”. Descrição que não está de acordo com o colocado para o Guarani, mas sim com os Jê (LAVINA, 1994). 2) O mesmo pode-se dizer da panela. Embora em todos os relatos sobre modo de vida Guarani haja menção à enorme variedade de formas de utilização de madeira – para construção das casas, canoas, instrumentos musicais, armas etc. não vimos referência a panelas revestidas de barro. Noelli (1993, p. 221) referindo-se a recipientes de madeira, diz que “estes itens são questionáveis, sujeitos a serem rejeitados em outras análises, mas haveria a possibilidade de existir pratos, “cochos” escavados na madeira, a exemplo dos pilões e canoas”. A descrição de Gonneville – “seus utensílios domésticos são de madeira, mesmo as panelas, mas estas são revestidas de uma espécie de argila da espessura de um dedo, o que impede que o fogo as queime” – vai contra ao descrito para o Guarani. Ao referir-se a utensílios de cozinha seria de se esperar que ele mencionasse as panelas de barro, também. 3) As habitações descritas por Gonneville – “feitas à maneira de galpões com estacas unidas umas às outras, ligadas por ervas e folhas, com as quais os ditos habitantes são igualmente cobertos; e têm por chaminé um buraco, para sair a fumaça. As portas são bastões corretamente ligados; e eles as fecham com chaves de madeira, quase como as que se usam, nos campos da Normandia, nos estábulos”, também fogem do “padrão” Guarani. As ilustrações de Hans Staden (1974), de 1557, dos Guarani da Ilha de Santa Catarina e de Ulrich Schmidl, de 1599 (PERRONE-MOISÉS, 1992), dos Cários não representam orifícios. A maioria das fontes que estamos utilizando permitem questionar o domínio no litoral norte de Santa Catarina pelos Guarani. A etno-história, a partir de informações contidas na documentação referente aos primeiros contatos entre nativos e europeus no início da colonização, aponta dúvidas sobre a identidade do grupo étnico que vivia no litoral norte de Santa Catarina, no século XVI. Por um lado, há fonte (Gonneville) que os descreve de modo diferenciado ao Carijó contatado em outros pontos do litoral. Por outro lado, há uma falta de pesquisa sobre a documentação quinhentista sobre esta região. As publicações que tratam da questão baseiam-se em publicações anteriores e não em pesquisas na documentação original. 17 Rodrigo Lavina, com quem discutimos a questão, partilha a mesma opinião. 34
Além disso, são recorrentes, nessa literatura, indicações de fortes diferenciações sócio-culturais entre grupos tomados como um mesmo. A seguinte citação de Montoya (1997, p. 211) indica, certamente, uma das causas para esta percepção. “[...] Esta redução [Nossa Senhora dos Reis] forjou-se a Companhia de várias nações de índios com a diversidade de suas línguas, ainda que todos se entendam através da comum, guarani”. Os relatos que falam dos Guarani, assim como demais indígenas no litoral do Brasil no início do século XVI, em geral, mencionam a presença de outros grupos, nitidamente diferenciados, são chamados de Tapuias ou Guayana. Gabriel Soares de Souza, em 1587 (2001, p. 93), ao se referir aos nativos próximos ao porto de D. Rodrigo (Ilha de Santa Catarina) diz: “[...] Essa terra é possuída dos tapuias, ainda que vivem algum tanto afastados do mar, por ser esta terra desabrigada dos ventos”. Isto indica que “apesar do quadro sugerido pelas primeiras fontes escritas, os Guarani - conhecidos na época como Carijó ou Cario - não ocupavam esta vasta região de modo homogêneo ou exclusivo” (MONTEIRO, 1992, p. 477). Entretanto, isto tem sido mais facilmente aceito para o interior. Para o litoral, há uma forte tendência em considerar o Guarani o único grupo em toda a sua extensão, embora indicações ao contrário. Isto retrata o predomínio, que via de regra, as fontes escritas têm perante aos materiais. Mesmo parcial e superficialmente estudadas, como parece ser o caso do litoral norte de Santa Catarina, as escritas têm sido tomadas como fontes exclusivas de informações sobre passado. O estudo da cultura material através da Arqueologia raramente ocorre e os poucos trabalhos produzidos não são consultados. Segundo Jones (1998, p. 219) “[...] a interpretação de grupos étnicos dentro da Arqueologia Histórica está inserida dentro de uma estrutura narrativa derivada de fontes escritas e reflete o status privilegiado tradicionalmente concedido às palavras”. E há diferenças entre as representações da etnicidade na literatura e a forma como ela é inscrita e expressa nas práticas culturais, o que torna necessária, para a interpretação de grupos étnicos, a superação da questão da interação do texto e da cultura material. A materialidade permeia todas as atividades humanas, desde aquelas mais cotidianas, como as ligadas à produção de alimentos até aquelas mais esporádicas como os rituais relacionados ao nascimento ou à morte de membros do grupo. Essas manifestações materiais, utensílios usados nas refeições ou as pinturas corporais, por exemplo, são a um só tempo, reflexos e condutores das concepções culturais e relações sociais de grupos humanos. Consistem na culARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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tura material que, nas palavras de Funari (1988, p. 79), é a “totalidade material socialmente apropriada [...] e toda a representação física da cultura”. O estudo da cultura material, através da Arqueologia, oferece a possibilidade de uma abordagem mais ampla do passado, na medida em que se volta para os vestígios de todos os segmentos da sociedade e não apenas àqueles dominantes (FUNARI, 1999). Perspectiva esta que justificou e norteou a pesquisa que realizamos (BANDEIRA, 2004). A possibilidade de haver regiões no litoral em que outras etnias existiam, é, pois, grande. A questão da toponímia permanece em aberto, entretanto, é preciso considerar três possibilidades alternativas. Pela similaridade das línguas faladas no litoral (Família Tupi-guarani), os conquistadores desenvolveram uma forma de se comunicarem com todos os grupos utilizando elementos comuns delas, é a Língua Geral (SCATAMACCHIA, 1993-1995). As denominações de origem indígena podem estar relacionadas a esta língua. Durante o Estado Novo, através do movimento em prol da construção de uma nacionalidade, há uma valorização do mestiço. “Elementos da arte marajoara foram incorporados na arquitetura de edifícios públicos e a mudança dos nomes de localidades para nomes em língua Guarani representa uma etapa na construção de uma identidade nacional” (HILBERT, 2001, p. 111). Essas alterações podem ter atingido a região. Além disso, as similaridades linguísticas nem sempre estão relacionadas às similaridades étnicas. A questão do limite norte da ocupação Guarani não é uma questão fechada. Chymz (2002), conforme já mencionado, levanta dúvida, com base em informações etno-históricas, sobre a identidade dos indígenas no Paraná. Talvez a divisão política entre sul e sudeste tenha influenciado a definição entre as duas subtradições. A Arqueologia, até o momento, não conseguiu produzir indicativos para a presença massiva de Guarani na baía da Babitonga. Embora tenha produzido informação considerável para outras regiões de Santa Catarina, inclusive, no litoral. De acordo com pesquisas arqueológicas (baseadas também em dados linguísticos e etnográficos), os Guarani teriam sua origem no sudoeste da Amazônia, região a partir da qual se dispersaram em direção ao sul, pelo interior do continente. Sua dispersão ocorreu “pelo sistema fluvial Paraná-Paraguai-Uruguai, pela costa atlântica adjacente e as bacias dos rios costeiros [...]” (BROCHADO, 1989, p. 74), conforme já mencionado. A tomada de direção para o litoral deve ter ocorrido a partir do interior, em um ou mais pontos. Ao chegarem ao litoral, os Guarani teriam se dispersado tanto para o sul como para o norte, nas áreas onde conseguiu penetração, uma vez que 36
o litoral como um todo deveria estar sendo habitado por outras sociedades. As datações disponíveis para esta tradição em Santa Catarina indicam o extremo oeste, Itapiranga, a região com a mais antiga ocupação, com data de 1.180 anos A.P. Um pouco mais recentes estão as datações no litoral sul de Santa Catarina, em torno de 1.000 anos A.P. As mais recentes estão no litoral central, 910 e 555 anos A.P. (Gráfico 1). Com base nestas datações pode-se pensar que o Guarani estaria ocupando o litoral de Santa Catarina mais tardiamente, a partir do sul. Aliás, isto já é um consenso, embora datação recente para o litoral central tenha recuado bastante a ocupação desta região. De todo modo, pode-se cogitar a possibilidade de que as datações mais recentes para o litoral de Santa Catarina estejam no norte. A datação em termoluminescência (TL) de material cerâmico do sítio Poço Grande forneceu uma data de 340 ± 35 A.P. (BANDEIRA, 2004). Esta data, extremamente recente, se confirmada, reforça esta ideia de uma ocupação tardia no norte e talvez por isso mais tênue, mais rarefeita, que resulte baixa densidade de vestígios que parece caracterizar a região.
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Gráfico 1 – Datações absolutas de sítios Guarani de Santa Catarina18.
18 As abreviações referem-se aos municípios em que se situam os sítios datados - Joinville: JLL; Florianópolis: FLO; Içara: IÇA; Tubarão: TUB e Itapiranga: ITP. 38
CAPÍTULO 2 O POVOAMENTO GUARANI DO LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL E SUAS RELAÇÕES COM OS DEMAIS OCUPANTES DA REGIÃO Gustavo Peretti Wagner19
INTRODUÇÃO O litoral norte do Rio Grande do Sul tem sido alvo de pesquisas arqueológicas ao longo dos últimos dois séculos. Já em fins do século XIX iniciaram as primeiras incursões de cunho exploratório na região, estendendo-se até a primeira metade do século XX (KOSERITZ, 1884; BISCHOFF, 1928 [1887]; ROQUETTE-PINTO, 1970 [1906]; GLIESCH 1925, 1932; SERRANO, 1937; FREDIANI, 1952). Tais pesquisas foram realizadas no litoral central e norte, priorizando as regiões dos atuais municípios de Cidreira, Tramandaí, Osório, Arroio do Sal e Torres. A partir de então as pesquisas passaram ao âmbito acadêmico-científico, orientadas por problemáticas classificatórias onde a ordenação e compartimentação dos elementos culturais forneceram as bases para o reconhecimento das culturas arqueológicas (SCHMITZ, 1958; BOMBIM, 1964-1965, 1971; RUSCHEL, 2003 [1966]; MILLER, 1967, 1974; KERN, 1970, 1984, 1985, 1996, 1997; KERN, LA SALVIA e NAUE, 1985; TOCCHETTO, 1987; JACOBUS e GIL, 1987; GAZZANEO, JACOBUS e MOMBERGER, 1989; THADDEU, 1995; ROSA, 1996; JACOBUS, 1997; WAGNER, 2004, 2008, 2009A, 2009B; ROGGE, SCHMITZ e ROSA, 2007; BECKER, 2007, 2008; ROGGE e SCHMITZ, 2010; WAGNER et al., 2011). O presente trabalho caracteriza-se como uma síntese e reavaliação das interpretações apresentadas em estudo anterior (WAGNER, 2004), onde foram reunidos todos os dados arqueológicos até então existentes a respeito das ocu19 Arqueólogo e Historiador. STRATA – Consultoria em Arqueologia e Patrimônio Cultural –
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pações pré-históricas dos grupos ceramistas no litoral norte do Estado. Contudo, o crescimento urbano regional impulsionou a multiplicação das pesquisas arqueológicas em atendimento à demanda do licenciamento ambiental, oportunizando o surgimento de novos dados sobre o tema. A tendência desenvolvimentista acelerada impeliu a administração pública à realização de planos de gestão e estratégias de proteção ambientais, resultando na condução de atividades de reconhecimento e avaliação do patrimônio histórico e arqueológico em diferentes municípios. Alguns exemplos bem sucedidos destas iniciativas públicas encontram-se em Xangri-Lá (GIOVANNINI, 1995) e Arroio do Sal (ROGGE, SCHMITZ e ROSA, 2007; ROGGE e SCHMITZ, 2010). A região designada como litoral norte do Estado possui uma delimitação pré-existente, compreendendo os balneários e municípios situados entre o Balneário Quintão, município de Palmares do Sul e o município de Torres. A divisão é orientada por critérios econômicos, baseando-se no contingente populacional e infraestrutura para exploração turístico-imobiliária. Contudo, o entende-se aqui como litoral norte, estende-se desde a desembocadura do Rio Mampituba, na divisa com o Estado de Santa Catarina até o paralelo 30° sul, nas imediações da desembocadura da Laguna de Tramandaí. O limite leste da área caracteriza-se pela linha de praia oceânica, estendendo-se até os contrafortes da Serra Geral, extremo oeste da área de pesquisa, envolvendo diferentes formações vegetais, sistemas hídricos e feições geomorfológicas.
O LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL: SEUS RECURSOS E SUAS VÁRZEAS O litoral norte do Rio Grande do Sul caracteriza-se como uma estreita faixa arenosa limitada entre as escarpas da Serra Geral, a oeste e a linha de praia oceânica, a leste. Sua extensão atinge aproximadamente 100 km de comprimento, no sentido sul-norte e uma largura que varia entre 15km no sentido oeste-leste (região de Tramandaí) e 5km em Torres, extremo norte da área. Na área de estudos a “fisiografia de superfície”, para parafrasear o autor da primeira síntese sobre a planície costeira do Estado (DELANEY, 1965), compreende as terras altas de oeste, suas encostas abruptas e a planície arenosa. Estas regiões foram intensamente exploradas pelas diferentes populações pré-históricas que nela habitaram desde 6.000 anos A.P. até o século XVI. Esta região será considerada neste trabalho em dois compartimentos: Planalto Meri40
dional e planície costeira, compartimentos estes que são integrados pelos vales dos rios Maquiné, Três Forquilhas e Mampituba, os quais funcionaram como as principais vias de acesso interior-litoral tanto para os grupos de caçadores coletores quanto para os grupos ceramistas. O Planalto Meridional pode ser descrito como uma superfície elevada com aproximadamente 1.000 m com feições suavemente planas que se inclinam para oeste. Entrecorta-se pelas cabeceiras dos cursos d’água que contribuem para as bacias dos rios Taquari-Antas, Caí e Sinos, tributários da bacia do Guaíba, bem como os rios Três Forquilhas, Maquiné e Mampituba, que atravessam as escarpas na direção leste, rumo ao litoral norte. A parte superior da estratigrafia da Bacia do Paraná aflora nos paredões dos vales fluviais, no limite oeste da área de pesquisa, onde são visíveis as sequências vulcânicas e sedimentares denominadas formações Serra Geral e Botucatú (HORN-FILHO, 1987; TOMAZELLI e VILLWOCK, 2000). As litologias da Formação Serra Geral estão representadas por rochas básicas e ácidas que constituem os morros testemunhos e a escarpa da Serra Geral. As rochas básicas, como os basaltos, são predominantes junto aos morros e nas porções basais da escarpa, enquanto nas partes superiores ocorrem as rochas ácidas como granófiros, dacitos e vidros ácidos. Rochas básicas também ocorrem junto à plataforma continental, cerca de dois quilômetros a leste da linha de costa, dando origem a Ilha dos Lobos. Esta possui cotas baixas, no máximo 1,5 m acima do nível do mar, sendo preenchida por depósitos arenosos constantemente movimentados pela oscilação diária das marés (DELANEY, 1965; HORN-FILHO, 1987; REGINATO, 1996). Os afloramentos areníticos conhecidos por Formação Botucatú encontram-se sotopostos às rochas basálticas da Formação Serra Geral. Apresentam-se na forma de paredões que, por vezes, se aproximam aos 90° de inclinação, bem como pequenas colinas de formato arredondado, sobretudo no limite noroeste da área. Os arenitos que situados no contato com as rochas vulcânicas sofreram, há aproximadamente 220 milhões de anos, metamorfoses decorrentes das altas temperaturas das lavas, originando camadas centimétricas de rochas conhecidas como arenitos silicificados (REGINATO, 1996). Feições erosionais típicas desta litologia são as cavernas e grutas de abrasão marinhas identificadas por Gomes; Ab’Sáber (1969) na margem oeste da Lagoa Itapeva. Nos vales fluviais encontram-se dezenas de abrigos rochosos nos paredões encaixados dos rios Maquiné, Três Forquilhas e Mampituba, bem como nas nascentes da grande bacia do Rio dos Sinos, voltadas para a Depressão Central do Estado. Aqueles abrigos foram ocupados ao longo do Holoceno por diversas populações pré-históricas, utilizando-os como cemitérios, acampamentos de caça, sítios cerimoniais ou moradia. Durante os séculos XVIII e XIX, alguns
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destes locais foram novamente ocupados por diminutos grupos indígenas, ou ainda por escravos forros e fugitivos (MILLER, 1967; 1969; 1974. RIBEIRO, 1997; DIAS, 2003; WAGNER, 2004). A evolução geológica da planície costeira foi condicionada por processos atuantes no interior de dois sistemas deposicionais siliciclásticos: Sistema de Leques Aluviais, caracterizado pelos rios que provêem as lagoas litorâneas e Sistema Laguna-Barreira, principal responsável pelas feições fisiográficas de superfície da planície arenosa. Este esquema evolutivo foi proposto por Villwock et al., (1986) e detalhadamente desenvolvido por Villwock e Tomazelli (1995) e Tomazelli e Villwock (2000), tendo sido atualizado e amplamente discutido em Hesp e Dillenburg (2009). A Província Costeira evoluiu para leste através da coalescência lateral de quatro sistemas deposicionais do tipo laguna-barreira, que registram, respectivamente, um máximo transgressivo seguido de um evento regressivo. O sistema Laguna-Barreira IV, de idade holocênica, instalou-se no último máximo transgressivo, há 5.100 anos, momento em que os níveis oceânicos atingiram entre 2m e 4m acima dos atuais20. O sistema lagunar do litoral norte foi então invadido pelas águas oceânicas dando origem a uma grande laguna que incorporava todos os principais corpos d’água. O sistema de leques aluviais tinha seu fluxo barrado pelas então elevadas massas de água das lagoas, dando origem a amplas planícies deltaicas que se estendiam ao longo do sopé da Serra Geral. O aumento da pluviosidade causado pelo Ótimo Climático contribuiu significativamente para a elevação do suprimento de água, ampliando o sistema lagunar21 e diminuindo de forma considerável as áreas secas emersas. 20 As cotas atingidas nos máximos transgressivos e suas datações vêm sendo discutidas desde a década de 1960, resultando em diferentes curvas para as flutuações holocênicas. Pesquisas recentes demonstram que as cotas máximas atingidas pelos níveis marinhos holocênicos entre os estados de Pernambuco e Rio de Janeiro seriam de aproximadamente 4m, enquanto que para a costa sul do Brasil não teriam ultrapassado 2.5m. Destaca-se ainda que o máximo transgressivo teria sido alcançado em um período equivalente ao longo de toda a costa brasileira, o qual se situaria entre 5.000 A.P. e 5.800 A.P. (cf. ANGULO, LESSA e SOUZA, 2006). Entretanto, aquelas pesquisas excetuam a costa sul-rio-grandense e privilegiam os dados disponíveis para os estados situados entre Santa Catarina e Rio Grande do Norte. Para uma discussão detalhada sobre o comportamento dos níveis oceânicos e seus impactos no povoamento pré-histórico do litoral do Rio Grande do Sul ver Wagner (2009a, 2009b). 21 O sistema lagunar engloba um complexo de ambientes deposicionais que se desenvolve no espaço de retrobarreira que corresponde à região topograficamente baixa situada entre a barreira e os terrenos interiorizados mais antigos. No caso específico da planície costeira sul-rio-grandense, os sistemas lagunares situam-se para oeste das respectivas barreiras. Os ambientes encontrados nesta superfície podem ser além das próprias lagunas, lagos, pântanos, canais inter-lagunares ou deltas intra-lagunares (TOMAZELLI, 1990). 42
Naquele período, as superfícies que se mantiveram secas foram as elevações arenosas de aspecto terraceado formadas durante o último máximo transgressivo pleistocênico (120.000 A.P.), momento em que as cotas marinhas elevadas permitiram a formação de terraços com 15m de altitude. Já o máximo transgressivo holocênico, deu origem à barreira arenosa que, ancorada na Pedra da Itapeva, estendia-se para sul por aproximadamente 100 km, interrompida apenas na desembocadura da Laguna de Tramandaí. Esta elevação arenosa atinge atualmente até 32m e encontra-se preservada na margem leste da Lagoa de Itapeva (TOMAZELLI e VILLWOCK, 2000). As duas feições descritas aqui se situam nas imediações do sistema lagunar holocênico do litoral norte, nas áreas limítrofes com os ambientes deposicionais lagunares que posteriormente transicionaram para ambientes paludiais e turfáceos ao longo dos últimos 5.000 anos. Populações caçadoras coletoras ocuparam diversos abrigos rochosos no vale do Rio Maquiné. O sítio RS-LN-01 (Cerrito Dalpiaz), foi habitado entre 5.950 ± 190 (SI-234) e 4.280 ± 180 (SI-233), momento em que o sítio teria sido abandonado definitivamente (MILLER, 1967), denotando o povoamento do interior dos vales do litoral norte como estratégia alternativa durante os milênios de instabilidade paleoambiental. O recuo progressivo das águas oceânicas em curso a partir de 4.900 A.P.22 deu origem às paisagens com as quais interagiram as populações pré-históricas que nelas se estabeleceram. A formação dos canais de ligação inter-lagunares configuraram um verdadeiro “rosário de lagoas”23 e disponibilizaram terras úmidas e húmicas para plantio. Os antigos fundos lagunares24 do sistema Laguna-Barreira IV concentram espessas camadas de matérias orgânicas decompostas, ricas em nutrientes com relativa proximidade ao freático, garantindo o provimento de água aos cultivares. A faixa mais externa da planície arenosa, situada entre as lagoas e mar, foi formada através do contínuo alinhamento de cordões arenosos entremeados por pequenas lagoas estreitas e alongadas acumuladas em superfícies de relevo 22 Estimativa realizada com base em perfil polínico descrito por Lorscheitter (2003) que evidencia o sequencial aumento dos esporos de vegetação higrófila de ambientes mixohalinos e a progressiva dessalinização dos terrenos adjacentes à paleolaguna do faxinal, atualmente sotoposta pela Mata do Faxinal, a sudoeste de Torres. 23 Termo cunhado por Roquette-Pinto (1970 [1906]). 24 Os fundos lagunares são reconhecidos atualmente pela feição escurecida dos sedimentos arenosos, tendendo do preto para o acinzentado, contendo conteúdos elevados de argilas e biodetritos. Espacialmente, caracterizam as regiões suscetíveis a alagamentos e inundações sazonais. Correspondem às “áreas alagáveis” delimitadas na FiguraFigura 01. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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deprimido, denominadas cavas25 (GODOLPHIM, 1976). As elevações destes cordões arenosos atingem entre 3m e 6m de altitude em relação ao nível do mar e favorecem a instalação da vegetação de restinga na forma de pequenos capões (RAMBO, 1956; HORN-FILHO, 1987). São sobre estes cordões que estão situados os principais sambaquis do litoral norte (cf. WAGNER, 2009a; 2009b), bem como grande parte dos sítios ceramistas da planície arenosa mais externa. Na medida em que o vento dominante de Nordeste empurra massas de areia na direção sudoeste, todos os corpos lacustres e lagunares do litoral norte são colmatados, iniciando-se uma sequência evolutiva lagoa-pântano-turfeira, que em seu estágio final consiste em novos campos de plantio com elevado conteúdo de matérias orgânicas (TOMAZELLI, 1990). No interior dos vales dos rios que drenam as terras altas de oeste a regressão marinha acarretou na liberação de grande parte dos terrenos inundados e úmidos, onde foram depositadas camadas de espessuras variadas de lamas húmicas. Os solos hidromórficos conferem às superfícies das várzeas o aspecto plano característico, favorecendo as práticas de plantio desde a pré-história até os dias atuais. A história da Floresta Tropical Atlântica (Floresta Ombrófila Densa), na encosta da Serra Geral é bastante recente, coincidindo com as temperaturas mais elevadas e com a maior umidade do Ótimo Climático, momento em que as espécies tropicais oriundas da Região Sudeste povoaram as escarpas migrando através da “Rota Migratória da Costa Atlântica Brasileira” (cf. MENEGAT, 1998, p. 48). As variações térmicas atingem médias de 22 a 26°C para o mês mais quente, de 10 a 15°C para o mês mais frio, e anuais entre 16 e 20°C. O regime pluviométrico situa-se entre 1000 mm e 1500 mm sendo, estas duas variáveis, responsáveis pelo ritmo dos processos erosivos que transformam as rochas fontes de oeste em solos férteis transportados e depositados pelo agente hidrológico26. O regime de chuvas varia entre. Parte da água chuva flui para o sistema fluvial somando-se à carga já transportada, parte infiltra-se no solo em direção ao freático por percolação e parte escorre pela superfície até encontrar horizontes impermeabilizados por sedimento argilosos dando origem a turfeiras, lagos e pântanos temporários. 25 Exemplos destas lagoas são as lagoas da Cavalhada e do Parque Tupancy, encontradas nos balneários Camboim e Atlântico, respectivamente. 26 No sistema de classificação tradicional de Köppen, o clima do Rio Grande do Sul caracteriza-se pelo tipo Cfa, onde “C” significa mesotérmico, “f” indica precipitação bem distribuída ao longo do ano e “a” indica a temperatura média do mês mais húmido superior a 22°C (RADAM-BRASIL, 1986). Utiliza-se aqui a classificação moderna que atribui a Região Sul do Brasil o clima Subropical Húmido (NIMER, 1989; STRAHLER e STRAHLER, 2000; NETO e NERY, 2005). 44
Naquelas depressões a vegetação tropical arbórea instala-se aproveitando a umidade e fertilidade dos solos recém-formados, tanto nos antigos fundos lagunares quanto nas cavas entre os cordões arenosos. A cobertura vegetal da planície costeira mais externa é marcada pela sucessão de matas psamófitas sobre cordões e matas tropicais paludosas nas cavas, compondo uma paisagem intensamente biodiversificada já descrita por Lamego (1946) e Rambo (1956) como “restinga litorânea”. Como resultado, os complexos processos geológicos deram origem às paisagens geomorfológicas com as quais interagiram as populações pré-históricas que ocuparam o litoral norte do Estado. O povoamento vegetal, as condições de umidade e a abrangente rede hidrográfica permitiram a formação de solos férteis, possibilitando o estabelecimento das aldeias em áreas específicas do litoral, dando origem aos padrões de povoamento e uso do espaço, abordados nas páginas que seguem.
O POVOAMENTO GUARANI NO LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL Os sítios arqueológicos dos horticultores Guarani no litoral norte do Estado são caracterizados pela inserção em unidades ecológicas específicas, as quais concatenam a proximidade aos solos férteis, a drenagem adequada dos terrenos bem como presença de cobertura vegetal de influência tropical. Os aspectos físicos da área de pesquisa foram sistematizados na seção acima, resta demonstrar e avaliar as formas de interação dos Guarani com o meio, materializadas nos substratos dos sítios arqueológicos e suas distribuições espaciais. Em trabalho anterior, Wagner (2004) realizou levantamento bibliográfico geral acerca das ocupações Guarani ao longo do litoral Meridional do Brasil, incorporando as regiões Sudeste e Sul. Depreende-se que as localizações dos sítios arqueológicos dos grupos Guarani no litoral norte do Rio Grande do Sul indicam a procura de locais elevados em meio à paisagem. Foram escolhidas, quando possível, as elevações das dunas pleistocênicas já fixadas. As dunas já fixadas são aquelas que não estão mais sujeitas às movimentações e realocações oriundas da energia eólica, estão fora do campo de dunas ativas. Estes remanescentes do sistema laguna-barreira III encontram-se principalmente no bordo oeste do “rosário de lagoas”.
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A escolha daqueles locais permite a otimização do aproveitamento dos recursos lacustres conjugados ao aproveitamento das zonas baixas para plantio. Estas zonas correspondem aos leitos de antigas lagoas costeiras, isoladas pelos recuos das linhas de costa pretéritas, seguidas de forte processo de colmatação, o qual ocasionou seu paulatino desaparecimento. Os leitos destes extintos corpos aquosos são ricos em material orgânico decomposto e/ou em decomposição, constituindo excelentes locais para a prática da horticultura. A relativa proximidade do mar possibilitou a complementação da alimentação através da pesca e eventual coleta de moluscos. A distribuição dos sítios se insere nos limites da Floresta Ombrófila Densa que ocorre junto às escarpas do planalto onde a caça e coleta vegetal eram empreendidas. No interior dos vales que atravessam concentram-se as principais fontes de captação de matérias-primas para as indústrias lítica e cerâmica. A escolha daqueles locais está também relacionada a duas outras demandas principais, a boa drenagem dos solos durante os períodos de maior pluviosidade e a situação estratégica defensiva. Catafesto de Souza (1987), Noelli (1993, 1999-2000), Soares (1997) e Dias (2003) consideram que a territorialidade Guarani tenha os conduzido ao conflito com grupos vizinhos, tendo em vista que a noção defensiva seria norteadora destes processos. Adota-se como premissa deste trabalho que os assentamentos de maior prestígio ocupavam as várzeas e outros ambientes mais favoráveis ao sistema econômico dos Guarani, enquanto as aldeias de menor produtividade e, por consequência, de menor prestígio, eram instaladas nos vales mais encaixados. Noelli (1993) estabelece os parâmetros ecológicos deste sistema de povoamento Guarani, enquanto Soares (1997) privilegia os aspectos sociais do sistema, centrando-se nas relações entre as diferentes parcialidades Guarani e destas com os grupos não Guarani (Jê no âmbito do presente trabalho). Os autores propuseram abordagens complementares ao problema da espacialidade Guarani e consideram que as maiores e mais populosas aldeias corresponderiam às aldeias mais antigas, comportando os clãs de maior prestígio. Arqueologicamente, aqueles aspectos estariam representados por sítios com estratos culturais mais profundos e solos arqueológicos de maior extensão (cf. SOARES, 1997). Na realidade, a vinculação das “manchas pretas” às unidades habitacionais já foi sugerida por Miller (1967) quando definiu as fases Paranhana e Maquiné no litoral norte. Sugere-se como critério de delimitação das proporções dos sítios as categorias definidas por Brochado (1973) onde os sítios pequenos possuem menos de 1.000 metros quadrados, os médios ficam entre 1.000 e
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5.000 metros quadrados, os grandes possuem entre 5.000 e 20.000 metros quadrados e, finalmente, os que possuem de 20.000 até 50.000 metros quadrados podem ser considerados sítios muito grandes. Destaca-se que a conquista territorial Guarani desenvolveu-se conforme proposta de Soares (1997), onde as relações de parentesco foram estabelecidas através do cuñadazgo e, os inimigos, reduzidos através da guerra e antropofagia ritual. A partir de então o território passa a ser ocupado lentamente e manejado em nível socioambiental, destinando os locais mais férteis aos clãs de maior prestígio e, em expansão radial, novas aldeias seriam paulatinamente fundadas nas áreas de menor status. Brochado (1989) considera que o povoamento Guarani tenha se dado através da estratégia de “enxameamento”. Entretanto, apenas com o aumento do contingente populacional se tornaria possível aos grupos recém-chegados disputar as áreas mais favoráveis ao estabelecimento de seu modo de vida. “Mas logo, na primeira grande expansão, correspondente ao clímax da cultura, as aldeias se transferiram para as várzeas, de terras mais férteis e mais profundas, onde havia bastante caça, pesca e moluscos comestíveis (...)” (SCHMITZ, 1997, p. 305). Naquele momento, a pressão territorial estaria concentrada na ocupação dos férteis deltas do sistema de leques aluviais que drenam as terras altas de oeste. Em se considerando válidas as datações de 1.102 ± 110 A.P. (SI-413) e 896 ± 100 A.P. (SI-412), para o sitio RS-LN-35 (Miller) 27 percebe-se a priorização do delta do Rio Maquiné como estratégia de povoamento Guarani. A partir de então, a “(...) população já era suficiente para com os índios caçadores e coletores [ou ceramistas], que podiam ser enxotados, destruídos ou incorporados. As aldeias, com isso, se tornariam maiores e mais duradouras” (SCHMITZ, 1997, p. 305). O RS-LN-16 (Miller), com 52.200m2, maior sítio do litoral norte, realmente possui uma datação que atinge 556 ± 200 (SI-411), bastante posterior às datas do RS-LN-35 (Miller), tornando bastante viável a hipótese levantada. Observando-se o mapa da ocupação Guarani no litoral norte (ver Figura 01), percebe-se que tanto a aldeia mais antiga, quanto a mais extensa, situam-se sobre os elevados terrenos pleistocênicos, nas regiões limítrofes com as terras férteis e baixas dos terraços lagunares holocênicos, nas proximidades dos recursos dos vales fluviais, tais como a pesca, a caça, a coleta, a captação de argila e obtenção de matérias-primas líticas; explorando intensamente um sistema eco27 Os sobrenomes dos pesquisadores responsáveis pela descoberta dos sítios Guarani no litoral norte se faz necessária em função da utilização repetida das siglas de nomenclatura dos sítios. Diversos pesquisadores utilizaram as designações RS-LN (Rio Grande do Sul-Litoral Norte) para cadastramento de sítios. Como resultado, foram documentados três diferentes sítios com a mesma sigla: RS-LN-01, por exemplo. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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lógico no extremo sudeste da área de influência da vegetação tropical brasileira. Desta forma propõe-se que esta faixa de terreno, situada no sopé das escarpas da Serra Geral, e que se estende ao longo do “rosário de lagoas”, seja a área de maior prestígio socioambiental no momento inicial da conquista Guarani no litoral norte do Estado. Provavelmente, os sítios localizados entre as lagoas Malvas, Ramalhete e Quadros façam parte de uma mesma ocupação dos Horticultores Guaranis. Os sítios maiores como RS-LN-32(Miller), RS-LN-33(Miller) e RS-LN-36(Miller) talvez sejam explicados pela realocação dos centros residenciais (teyy ogá e amundá) de um mesmo tekohá. Os sítios RS-LN-26 (Miller), RS-LN-29 (Miller), RS-LN-34 (Miller), RS-LN-35 (Miller), RS-LN-48 (Miller) e LQQ01 – Walter Medeiros, em função de suas proporções reduzidas, sejam áreas destinadas aos acampamentos para incursões rápidas ou mesmo roças. É possível ainda que estes sítios médios e pequenos estejam associados apenas a ocupações pós-contato, pois as famílias poderiam ter se dispersado em pequenos grupos. Catafesto de Souza (1987) destaca que, naquele momento de desestruturação social, as próprias casas seriam consideradas aldeias. A distância máxima entre os sítios do tekohá da Lagoa do Ramalhete é de aproximadamente 8 km. Noelli (1997) sugere que, para ser possível inferir a área de domínio dos tekohás, é necessário delimitar as distâncias das possíveis áreas de captação de recursos inorgânicos. Tendo por base que as indústrias líticas limitam-se ao uso de basaltos, dioritos, arenitos e geodos de quartzo ou calcedônia28, pode-se inferir que as distâncias entre os sítios e suas fontes de matérias-primas são basicamente, as distâncias entre estes e a encosta da Serra Geral. No caso do tekohá da Lagoa do Ramalhete, a distância máxima a ser percorrida seria de 14 km no sentido de atingir os cursos alto e médio do Rio Maquiné. A concentração de sítios arqueológicos no entorno das lagoas Tramandaí, Armazém, Biguá, Emboaba e Custódias provavelmente seja explicada pelo mesmo sistema de uso do espaço pelos Guarani. Alguns dos sítios denominados por 28 No que diz respeito ao material lítico encontrado nos sítios, nota-se que a preferência para a base das indústrias líticas é o basalto. Tal fato provavelmente está relacionado à proximidade dos sítios da formação basáltica Serra Geral. São encontrados entre as coleções dos sítios seixos arredondados, os quais podem ser captados nos leitos dos rios que sulcam as escarpas da Serra Geral em direção às lagoas costeiras. Foram encontrados ainda, placas de basalto colunar, as quais poderiam ter sido coletadas junto às encostas ou nas margens dos rios. Outra matéria-prima bastante encontrada foi a calcedônia. Esta rocha ígnea aparece quase em sua totalidade, relacionada à técnica de lascamento bipolar, em que pese existam lascas bipolares de quartzo e ágata em alguns sítios. Os geodos de calcedônia podem ser coletados nos leitos dos rios após o seu desprendimento das rochas basálticas. Há também, a curiosa ocorrência de dois exemplares de arenito silicificado. Um exemplar encontra-se junto ao material lítico do sítio LQQ01 - Walter Medeiros, sendo o outro, associado ao LLe02 - Areal Moro. 48
Eurico Miller como “RS-LC” seriam, possivelmente, fruto das realocações deste tekohá, ou mesmo sítios anexos dentro da área de domínio. A concentração de sítios arqueológicos localizados entre as lagoas de Itapeva e Quadros, dois dos maiores corpos lacustres do litoral norte, poderia ser considerada outro tekohá. A área é bastante favorável ao desenvolvimento da horticultura, com possibilidade de apoio na coleta de moluscos junto aos banhados e ao mar, bem como à complementação da alimentação através da caça nos limites da Mata Atlântica que se encontra junto às escarpas e ao vale do Rio Três Forquilhas. O sítio do Areal se caracteriza como centro residencial (teyý ogá, ou mesmo um amundá), pois possui 10.000 m2. Outro sítio de consideráveis proporções é o sítio Manoel João. Os sítios do Lima, Onildo Aguiar, Família Nunes e Lomba da Folia seriam sítios de tamanhos médios e pequenos. As matérias-primas para a produção dos artefatos líticos e cerâmicos poderiam ser obtidas no vale do Rio Três Forquilhas, que dista menos de 10 km de distância máxima do sítio mais afastado. Uma última concentração de sítios encontrada na área de pesquisa seria formada pelos sítios RS-LN-16 (Miller), RS-LN-30 (Miller), RS-LN-31 (Miller) e LLe02 – Areal Moro. Há ainda a informação de ter sido retirada uma urna funerária do sítio Fazenda do Casqueiro, o que caracterizaria outra ocupação Guarani ainda neste último tekohá. A distância máxima entre os sítios é de 9 km e as fontes de captação de recursos líticos e minerais dos rios Caraá e Maquiné distam 12km e 28km, respectivamente. É possível, contudo, que todos os sítios arqueológicos do litoral norte do Rio Grande do Sul sejam integrantes de um mesmo tekohá que se estendeu ao longo do tempo, dominando toda a área. As únicas datações existentes sugerem uma ocupação permanente na área iniciada 1.102 ± 110 A.P. (SI-413) no RS-LN-35 (Miller), que perdurou até a chegada da colonização europeia. As informações etno-históricas fornecem indícios da extensão desta área de domínio dos grupos Guarani no litoral norte. A terra em sí não é má. Pode ter em comprimento, desde Santa Catarina até Taramiandiba, que está além de Boipitiba, aonde os brancos tambémvão resgatar 40 ou 50 léguas, ao longo do mar, e ao longo de umas serras, que estão do mar, meia légua, uma légua, até duas, em algumas partes; e dalí por diante começam os Arachãs (...) (RODRIGUES, 1940 [1605], p. 229). Naquele momento a presença dos sítios Guarani no litoral central e norte do Rio Grande do Sul limitaria o acesso dos grupos Jê aos recursos costeiros, levando ao progressivo abandono destas estratégias de subsistência em função das
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pressões expansivas dos tekohá. A inexistência de evidências materiais do contato indígena-europeu nos sítios Jê sugere a impossibilidade destes grupos de explorar os recursos litorâneos, provavelmente em função da supremacia bélica e populacional Guarani, que os teria privado das áreas tradicionais de domínio. Se em um primeiro momento a ocupação dos migrantes amazônicos coexistia com os grupos ceramistas da Tradição Taquara, agora não mais há competição por recursos ou áreas de caça e coleta. Os aldeamentos Guarani estariam estabilizados no litoral norte do Rio Grande do Sul em pleno desenvolvimento de seu modo de vida. Propõe-se que a conquista destes novos territórios foi estruturada através de interações culturais em dois âmbitos principais, conflitos29 e reciprocidade. Nas sociedades Tupi, a guerra compõe elemento essencial do ethos, pois atua como artifício de coesão social e identitária, conforme demonstrado por Fernandes (1970) para as populações Tupinambá da costa leste e nordeste do Brasil. No caso Guarani, a guerra permitiu a contínua expansão por novos territórios bem como a perpetuação de um sistema de liderança social calcado no prestígio individual. Neste sentido, a guerra ritual, acompanhada das cerimônias comunais de antropofagia, contribuiu para o enaltecimento dos “principais” (caciques), dando destaque às teýy dentro do tekohá, possibilitando a ocupação das unidades ecológicas de excelência. A reciprocidade era igualmente fortalecida naqueles momentos através dos convites aos parentes para participação nas cerimônias públicas relacionadas, compreendendo desde as batalhas, a preparação do cauim pelas mulheres, a antropofagia em si ou mesmo nos discursos de exacerbação individual e perpetuação da memória oral (MÉTRAUX, 1979; SOUZA, 1987; NOELLI, 1993; SOARES, 1997). Nesta perspectiva, os vales dos rios Três Forquilhas e Sanga Funda poderiam ter sido habitados por aldeias menores, enquanto que os rios Maquiné e Mampituba poderiam oferecer várzeas mais amplas e mais férteis, as quais seriam ocupadas por aldeias intermediárias. É possível, então, que alguns dos sítios localizados na Planície Costeira, nas proximidades das desembocaduras 29 Referindo-se exclusivamente aos Coroados, Mabilde (1983 [1836], p. 45) informa a existência de rivalidades entre os grupos com as seguintes palavras: “Ainda que todos os coroados tragam o mesmo distintivo da cabeça tonsurada e o cabelo cortado da mesma maneira, pertencendo, assim, à mesma nação, muitos não são amigos e pode-se dizer, sem correr risco de errar ou exagerar, que entre as tribos, na sua grande maioria, existem sempre rivalidades, mais ou menos fundamentadas (...)”. Rodrigues (1940 [1605], p. 236) documenta as rivalidades entre Tapuia e Carijó na Região Sul do Brasil. “(...) E como os tapuias não estarão mais de 9 ou 10 léguas destes, todo o ano e toda a vida ainda aos saltos a eles, porque todos os meses vão a eles. Mas não há muitos dias que os tapuias os tomaram em uma cilada e mataram uma bôa soma deles (...)”. 50
destes rios, estejam relacionados a áreas de atividades dos tekohá do interior dos vales. A circulação dos grupos seria facilmente conseguida com a ajuda de canoas, aproveitando os cursos inferiores dos rios para atingir as lagoas. Noelli (1993) afirma ser notória a preferência destes grupos pelos deslocamentos embarcados em detrimento dos trajetos a pé. Entretanto, é necessário destacar que as áreas de maior interesse sejam as férteis várzeas das lagoas e canais que formam o rosário lacustre do litoral norte. O advento da chegada dos colonizadores europeus certamente caracterizou-se como um elemento de desestruturação deste estável sistema de assentamento e uso do espaço. As pressões escravagistas e as doenças trazidas pelos “brancos” provavelmente empurraram os Guarani em direção ao planalto. O litoral sul do Brasil, desde a região de Laguna até o sul do Rio Grande do Sul, caracteriza-se como uma grande planície que não oferece portos naturais. Essa condição topográfica influenciou o processo de povoamento europeu do litoral. Apenas pequenas embarcações conseguiam atracar nas praias rasas, ou entrar em rios como Araranguá, Mampituba e Tramandaí. Provêm deste contexto as primeiras informações a respeito da região limítrofe entre os Estados de Rio Grande do Sul e Santa Catarina, as quais decorrem das expedições de Sebastião Caboto (1527-1530), e Martim Afonso de Sousa (1531-1532). Martim Afonso foi responsável pelo primeiro registro dos rios Mampituba e Tramandaí, o qual se encontra descrito em Gabriel Soares de Sousa como Rio de Martim Afonso e caracterizado como um sítio excelente para o estabelecimento de um povoado (SOUSA, 1971 [1587]). Cesar (1998) destaca que as únicas notícias do litoral norte na documentação colonial das duas primeiras décadas do século XVI, informam apenas a existência de um rio povoado por índios que encontra o mar em frente a uma ilha. Tratam-se provavelmente do Rio Mampituba e Ilha dos Lobos, no município de Torres. Naquele momento, os vales dos rios, anteriormente ocupados pelas aldeias menores, agora seriam os únicos redutos seguros do litoral norte, tornando-se alvo de disputas entre as pequenas e grandes aldeias em fuga. A planície litorânea continuaria uma excelente área para pesca e coleta, mas somente poderia ser aproveitada em incursões rápidas, através do uso de canoas. Os pequenos grupos Guarani desceriam a foz dos rios Maquiné, Sanga Funda, Três Forquilhas e Mampituba em rápidos deslocamentos em embarcações, estabelecendo-se em elevações nas margens das grandes lagoas. As elevações caracterizariam ao mesmo tempo a continuidade de seu sistema econômico anterior e um ponto de vigia das embarcações e tropas terrestres ibéricas que poderiam se aproximar. As pressões expansivas coloniais resultaram na drástica diminuição das populações indígenas na América, seja através das doenças ou escravização. Na costa ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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brasileira Cardim (1939 [1584]) e Sousa (1971 [1587]) documentaram a fuga para o interior dos grupos Tupinambá litorâneos em razão das preagens e pressão territorial dos "brancos”. No litoral norte as bandeiras paulistas obrigaram os grupos Carijó a deslocarem-se em direção ao interior, buscando guarida junto às missões da Companhia de Jesus. No ano de 1635, o jesuíta Francisco Ximenes documenta a presença de grande quantidade de indígenas nas cabeceiras do Rio Taquari, os quais seriam originários da costa e teriam buscado assentamento nas proximidades da redução de Santa Teresa (cf. SOARES, 1997). Quando em marcha para o Paraguai, Cabeza de Vaca (2009) relatou o encontro com um indivíduo natural da costa do Brasil em curso pelo Peabiru nas proximidades de Assunção. Como resultado, o litoral sul do Brasil presenciou, a partir do início do século XVII, um período de paulatino despovoamento. Com efeito, no ano de 1658 o padre Luís Pessoa documenta nos Informes das Terras do Sul que “ainda naquelas partes na ribeira do mar não há já gentio, senão alguns poucos na lagoa dos patos, aonde os nossos portugueses vão fazer suas compras de índios pelas costas desta costa [...]” (CESAR, 1998, p. 30). Brochado (1989) sugere que as migrações históricas dos grupos indígenas Tupi e Guarani seriam impulsionadas por dois fatores principais, as pressões territoriais escravagistas do período colonial, por forçarem a emigração e a possibilidade de ocupação dos vazios deixados pelo impacto europeu no contingente populacional indígena brasileiro, possibilitando a imigração. De fato as pesquisas arqueológicas empreendidas na região central do litoral evidenciaram ocupações Guarani e Jê com data de 280 ± 50 A.P. (Beta 202366), no sítio RS-LC-80 (cf. ROGGE, 2006), sugerindo a retomada do povoamento litorâneo pelas populações ceramistas do litoral norte. Dias (2003) depara-se com a mesma situação no atual município de Santo Antônio da Patrulha, onde duas datações de 165 ± 20 A.P. (LVD 594) e 205 ± 25 (LVD 595) para o sítio RS-S-399 - Campestre Novo-1 denotam a presença Guarani na cabeceira do vale do Rio dos Sinos30. Em 1721 Manuel Gonçalves de Aguiar observa a presença de indígenas nas terras do litoral norte e/ou central do Estado do Rio Grande do Sul da seguinte forma: “(...) são pouco habitadas de gentio, e só ao pé da Serra, e antes de chegar a ela se vêem bastantes fumaças de gentio bravo, mas este não comercia com ninguém” (CESAR, 1988, p. 67). As presenças de ocupações indígenas nos vales dos rios Maquiné, Três Forquilhas e Mampituba, são referidas nas crônicas de família dos primórdios do povoamento das colônias alemãs e italianas, como por exemplo: 30 Cronologias recentes para a região central da planície costeira do Rio Grande do Sul são igualmente referidas nos capítulos Rogge e Milheira neste volume. 52
[...] Por fim, a longa descida da Serra do Umbu. São cinco quilômetros, da serra abaixo, serpenteando os precipícios. Na entrada de uma gruta, índios fumavam, fazendo balaios de cipó. Continuavam sentados, fazendo qualquer gesto hostil, quando a caravana passou. Eles eram os verdadeiros donos daquelas matas, daquelas serras. As cavernas eram lugares sagrados. Nelas, seus mortos descansavam. Passar, os viajantes podiam. Parar e fazer morada, jamais (MANSAN, 1999, p. 11).
AS RELAÇÕES COM OS DEMAIS OCUPANTES DA REGIÃO As informações sistematizadas acerca dos sítios ceramistas do litoral norte do Estado e regiões vizinhas indicam uma sucessão de ocupações e reocupações identificadas através de três conjuntos materiais: cerâmica Taquara, cerâmica Guarani e objetos de origem europeia, caracterizando um processo histórico de longa duração. Os processos de interação cultural no litoral norte são caracterizados por três momentos claramente delimitados. Inicialmente os grupos ceramistas do planalto dominaram esta região coexistindo, possivelmente, com grupos pescadores coletores dos sambaquis. Naquele momento os portadores da Tradição Taquara mantinham um sistema de exploração sazonal em três ambientes, conforme proposto por Schmitz (1997). Esta estrutura modificou-se pela chegada dos grupos Guarani que teriam adentrado na planície litorânea a partir da bacia do Jacuí, contornando o Planalto Meridional (BROCHADO, 1984)31. Desde então, a planície litorânea foi paulatinamente sendo dominada pelos invasores de origem amazônica através do estabelecimento de relações de parentesco, oportunizando a formação de um imbricado sistema de casamentos intergrupais, dando origem a múltiplos episódios de interação. O terceiro momento é marcado pelos contatos indígenas com as expedições portuguesas que realizavam os primeiros reconhecimentos dos mares e terras que viriam a pertencer à Província de São Pedro, bem como pelas iniciativas jesuíticas de catequese para expansão da fé. 31 Na realidade existem duas propostas daquele autor para a origem do povoamento Guarani no litoral norte do Estado. Inicialmente, Brochado (1973, 1975) propõe que as levas migratórias seriam originárias do litoral de Santa Catarina que, atravessando a costa povoariam as duas margens da Lagoa dos Patos. Anos mais tarde, Brochado (1980, 1984, 1989) inverteu o sentido da migração proposta e coloca os sítios do litoral norte como originários do povoamento do vale do Jacuí e Bacia do Guaíba, através dos qual teriam sido ocupadas as costas de Santa Catarina e Paraná. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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As cronologias disponíveis sugerem que os grupos ceramistas Jê32 do Brasil Meridional (Tradição Taquara), já haviam se instalado na região extremo leste do planalto e encostas voltadas para a planície costeira há 1.515 ± 105 A.P. (SI-805) (SIMÕES, 1972). Suas expressões regionais ficaram conhecidas, a partir da década de 1960, como Fase Taquara (MILLER, 1967). As regiões das lagoas do Porteirinho, Porteiro e Fortaleza, no litoral central do Estado, apresentam ocupações Guarani que iniciaram33 em 1.900 ± 40 (Beta 206105), estendendo-se até 280 ± 50 (Beta-202366), onde os sítios, via de regra, apresentam associação com cerâmica Jê (ROGGE, 2006). As únicas datações existentes no litoral norte remontam aos trabalhos de levantamento de sítios realizados por Eurico Miller durante o desenvolvimento do PRONAPA, referindo-se aos sítios RS-LN-35: 896 ± 100 A.P. (SI-412) e 1.102 ± 110 A.P. (SI-413) e RS-LN-16: 535 ± 200 (SI-410) e 556 ± 200 (SI-411). Pesquisas realizadas recentemente nos sambaquis da barreira da Itapeva demonstram uma ocupação tardia de sítios concheiros na margem oeste da Lagoa de Itapeva, onde o Sambaqui da Dorva - LII-43 foi habitado a partir de 1.110 ± 40 A.P. (Beta-244550, 1.080 a 940 cal. – probabilidade: 95%) (WAGNER, 2009a). Contudo, a contemporaneidade das populações sambaquieiras aos grupos ceramistas Jê na região precisa ainda ser comprovada. Evidências dos contatos entre os grupos pré-históricos sul-rio-grandenses são os zoólitos encontrados por Ribeiro (1991) no sítio RS-RP-171, localizado no vale do Rio Pardo, que se situa cerca de 280km distante do litoral. Em que pese trate-se de uma referência ao período pré-cerâmico, a ocorrência deste material, característico dos grupos sambaquieiros, reforça a hipótese da existência de um comércio entre os grupos ocupantes da planície costeira e os grupos do interior. Miller (1971) registrou a presença de um zoólito nas casas subterrâneas da Fase Guatambu. Muitos dos sítios encontrados no litoral norte possuem ocorrências conjugadas de material cerâmico Jê e Guarani (ver Figura 02). Os sítios arqueológicos são: RS-LN-16 (Miller), RS-LN-18 (Miller), RS-LN-26 (Miller), LQQ01 - Walter Medeiros, LII07 - Darci Leal, LII04 - Irmão Broda, LAA01 - Lauro Rodrigues, LLe02 - Areal Moro, RS-LN-07 (Hilbert), RS-LN-08 (Hilbert), RS-LN-22 (Hilbert) bem como os dois sítios estudados por Schmitz (1958). Os episódios que deram origem às interações culturais entre os ceramistas pré-históricos e, posteriormente, com os europeus, possibilitaram duas for32 Uma avaliação crítica das tradições Casa de Pedra, Taquara e Itararé e suas relações com os grupos Jê, pertencentes ao tronco Macro-Jê pode ser encontrada em Noelli (2005). 33 Rogge (2006) apresenta ainda uma datação de 2.142 ± 175 A.P. (LVD-660) para ocupação Guarani que foi considerada demasiadamente antiga quando comparada com a cronologia regional. 54
mas gerais de interações: trocas sejam elas materiais (representadas nos sítios arqueológicos) e imateriais (ideias), ou confrontos. Situações de interação na forma de confrontos possuem respaldo nas escavações de Rohr (1966, p. 14) no sítio da Praia da Tapera, onde “(...) Pelo menos três indivíduos, seguramente, foram atingidos por flechas mortais”. A despeito da existência de conflitos entre as populações ceramistas pré-históricas do litoral norte, destaca-se que mesmo eventos bélicos possibilitam práticas comerciais, ou mesmo incorporação de indivíduos vencidos ao grupo. No que diz respeito a tais práticas entre os Coroados, Mabilde (1983 [1836], p. 86) informa que “Não dão nunca quartel a prisioneiros ou inimigos vencidos que sempre são mortos com golpes de varapau, concedendo a vida às mulheres e às crianças que, pela sua idade, estejam em condições de acompanhá-los em sua marcha (...)”. Nos comentários redigidos por Pero Hernández acerca da expedição de Cabeza de Vaca (2009, p. 145) a Assunção e terras vizinhas, evidencia-se que o rapto de mulheres é prática comum entre as populações indígenas do Brasil Meridional, pois os índios denominados agaces ao atacarem Buenos Aires “Roubaram os armazéns dos espanhóis onde tinham seus mantimentos e levaram mais de trinta mulheres guaranis.” O mesmo se dá na sociedade Guaicurú onde “As mulheres possuem o direito de libertar o prisioneiro que os homens trazem para junto deles, podendo este até continuar a viver entre eles, se quiser, passando a ser tratado como se fosse um integrante da tribo.”34 34 Quando consultadas as fontes etno-históricas sobre a “sub-cultura Tupi” (cf. BROCHADO, 1980) percebe-se que as próprias expedições de guerra realizadas pelos Tupinambá da costa tinham objetivo de incorporação mesmo que temporária, de indivíduos às aldeias. Os relatos de Staden (1999[1548]) proporcionam claras descrições da liberdade concedida pelos Tupinambá aos prisioneiros, que transitavam livremente nas aldeias, participavam das atividades de pesca e construção de canoas empreendidas por adultos e crianças e passavam o tempo confeccionando objetos sem nenhuma restrição dos índios às formas e aparência dos produtos. Staden (1999 [1548]) chega a construir uma grande cruz de madeira fixando-a na praça central, em frente a casa na qual se encontrava cativo. Léry (1960 [1557], p. 75) descreve as intensas inimizades existentes entre os grupos Tapuia e Tupinambá e como as guerras estavam dizimando ambas as populações. Contudo, mesmo em momentos de guerra o comércio de trocas era estabelecido. “(...) o margaiá, o caraiá ou o tupinambá (assim se chamam as nações vizinhas), sem se fiar no uetacá mostra-lhe de longe o que tem a mostrar-lhe, foice, faca, pente, espelho, ou qualquer outra bugiganga e pergunta-lhe por sinais se quer efetuar a troca. Em concordando, o convidado exibe por sua vez plumas, pedras verdes que coloca nos lábios, ou outros produtos de seu território. Combinam então o lugar da troca, a 300 ou 400pés de distância; aí o ofertante deposita o objeto da permuta em cima de uma pedra ou pedaço de pau e afasta-se. O uetacá vai buscar o objeto e deixa no mesmo lugar a coisa que mostrara, arredando-se igualmente, a fim de que o margaiá ou quem quer que seja venha procurá-la. Enquanto isso se passa são mantidos os compromissos assumidos. Feita porém a troca, rompe-se a trégua e apenas ultrapassados os limites do lugar fixado para a permuta procura cada qual alcançar o outro (...)”. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Já no século XIX há a descrição da adoção de um escravo negro, foragido nas matas de Vacaria aos Coroados, que inclusive acompanhava os homens nas correrias e assaltos às colônias alemãs (MABILDE, 1983 [1836]). O estabelecimento de interações sociais com grupos não Guarani deve ser entendida como uma estratégia de expansão e conquista territorial, conforme proposto por Soares (1997). Estas relações eram pautadas, sobretudo pela guerra que, por um lado, proporcionava a tomada dos territórios, mas por outro lado, oportunizava a incorporação de indivíduos. O objetivo era a “aquisição” de novas mulheres, tendo em vista sua representatividade enquanto elemento de prestígio social para os “principais”, chefes das famílias extensas, líderes das teýy. O rapto de mulheres pressupunha a assimilação de traços culturais Guarani pelas mulheres raptadas bem como a imposição dos mesmos aos grupos subjugados em guerra. O fenômeno da guaranização permitiu aos tekohá em expansão um mecanismo de conquista de novas terras e o estabelecimento de novas aldeias, inicialmente em áreas menos produtivas onde jovens chefes, de ainda pouco prestígio, iniciariam sua ascensão social através da poligamia, acúmulo de regalos, de vassalos e vitórias em guerras (SOARES, 1997). Kern (1994) destaca que o plantio do milho, como estratégia de subsistência dos grupos ceramistas Jê, teria sido decorrência de relações de interações culturais, pois esta espécie vegetal teria sido introduzida na Região sul do Brasil pelos grupos Guarani. Provas concretas da domesticação do milho pelos grupos Jê foram suscitadas por Schmitz e Becker (1997 p. 271) “Restos de milho e de cabaças foram encontrados em um dos abrigos da fase Guatambu [...]”. Neste sentido, as cerâmicas Jê, pertencentes à Tradição Taquara geralmente encontradas em sítios Guarani no litoral norte, poderiam representar a incorporação de mulheres através das relações de guerra e parentesco. O mesmo se aplica a outros elementos exógenos como matérias-primas líticas de locais distantes, bolas-de-boleadeira, como no sítio RS-LN-34 (Miller), ou pontas de projétil, como no RS-LN-16 (Miller). As relações de reciprocidade entre as culturas arqueológicas ceramistas que ocuparam o litoral norte ocorreram tanto entre os grupos Jê e Guarani quanto entre as aldeias Guarani35. As informações etno-históricas a respeito das relações de sociabilidade 35 É necessário considerar as possíveis relações existentes entre as aldeias localizadas na planície arenosa e as aldeias localizadas nos vales dos rios que descem do planalto em direção ao litoral. Há informações sobre a existência de sítios dos Horticultores Guaranis no vale do Rio Maquiné, mas não conhecidas suas localizações nem o material de suas coleções. Os vales escavados pelos rios Sanga Funda, Três Forquilhas e Mampituba, caracterizam-se como áreas de grande potencialidade para a ocupação Guarani, bem como o aproveitamento de suas encostas mais elevadas para as aldeias Jê. Pesquisas futuras devam ser destinadas a estes vales, no sentido de caracterizar as ocupações dos grupos ceramistas ou mesmo dos caçadores-coletores que os precederam. 56
Guarani indicam que o cuñadazgo consiste em formar alianças entre cunhados baseadas nas relações de parentesco e reciprocidade. Os laços estabelecidos são acompanhados de obrigações de reciprocidade de bens dentro do círculo de parentesco. Estes bens compreendem escravos cativos, sobrinhas, irmãs, filhas ou objetos de valor. As mulheres são ofertadas por meio de casamentos conferindo prestígio social aos “principais” através da valorização da poligamia. Os objetos de valor ou escravos são ofertados na forma de regalos, circulando amplamente dentro e entre as aldeias, costurando as redes de parentesco através da reciprocidade (SOARES, 1997). O cuñadazgo envolve também a reciprocidade de convites cerimoniais, sejam estes para rituais elaborados como a antropofagia, ou para o acompanhamento em atividades diárias como a pesca, a caça, refeições, estas últimas expressas na forma de convites para “comer no mesmo prato” e “beber no mesmo vaso” (SOARES, 1997). No litoral norte, Rodrigues (1940 [1605], p. 230) documenta a manutenção das relações comerciais entre os grupos Guarani quando relata: “[...] É a mais pobre gente que cuido há no mundo... porque ele não tem cousa alguma, scilicet, não tem algodão, nem peles, nem tipóias, nem fio, nem arcos, nem frechas, tudo isto lhes trazem os Arachãs [...]”. A presença de evidências materiais dos contatos entre os grupos ceramistas do litoral norte pode estar relacionada a diversos episódios de interação: roubo de objetos e víveres, rapto de mulheres, aprisionamento de guerreiros, assimilação de indivíduos, trocas comerciais bem como em respeito às complexas leis que regem as relações de parentesco e se expressam na ampla circulação de objetos entre as aldeias, posteriormente materializada na diversidade material intersítios. Entretanto, a chegada das frentes de colonização ibéricas estabeleceu uma série de mudanças no quadro geral do povoamento da área, deslocando as comunidades indígenas de suas áreas de domínio originais e condicionando o estabelecimento de novas estratégias de uso do espaço36. As pressões escravagistas (preagens) e as doenças “brancas” contribuirão sobremaneira para a redução do contingente populacional no Brasil Meridional. As interações culturais e comerciais entre indígenas e europeus foram dominadas pelas trocas de mercadorias, informações e escravos. Desde os primeiros contatos transcorridos no sul do Brasil entre guaranis e europeus, as relações foram pautadas principalmente por trocas de objetos europeus por prisioneiros indígenas. A antiguidade do comércio no sul é atestado por Monteiro (1992, p. 490) quando ressalta que “[...] Desde meados do século XVI, os primeiros povoadores da capitania de São Vicente... frequentavam 36 No capítulo 4, Dias e Baptista da Silva destacaram os efeitos do processo de Conquista ibérica nas estratégias territoriais no Lago Guaíba. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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o litoral ao sul da capitania, travando um intenso intercâmbio com os grupos Guarani da região, sobretudo na chamada laguna dos Patos37 [...]”. O sítio LII02 - Cemitério possui uma conta de colar em sua coleção, a qual sugere o contato com os portugueses. Nos sítios pesquisados por Schmitz (1958, p. 115) foram igualmente encontradas “[...] três contas de vidro de origem europeia [...]”. Estes objetos foram, por vezes, adquiridos em troca de indivíduos de tribos rivais, que a sociedade branca absorvia como mão-de-obra escrava. Aquelas práticas são presenciadas por Rodrigues (1940 [1605], p. 234-235) nas regiões do Mampituba e restante do litoral norte do Rio Grande do Sul: “[...] E daqui vem a venderem-se uns aos outro com tanta crueldade, sem terem respeito às pessoas, que vendem, serem suas parentas ou não. E assim vendem a varejo quantas podem, scilicet, sobrinhas e até alguns rapazes de manos de 15 anos têm ousadia pera venderem. Depois que aquí chegamos, té houve índios que venderam seus próprios enteados, a própria mulher, outros vendem as verdadeiras sobrinhas porque não querem andar com elas, ou por se contentar de uma mulher casada, pera haver, vendeu-lhe o marido. Outro pobre moço, estando pescando, vem outro por detrás e dá com ele no navio. Outro senhor de uma casa [...] vindo vender um, foi alí vendido doutro [...].
Destaca-se no trecho referido de Rodrigues a existência de ocasiões em que “principais” de casas são preados, demonstrando a profunda desestruturação da estrutura social que a colonização europeia da América representou nas culturas indígenas e, em especial, nas culturas Tupi e Guarani. As palavras dos próprios Carijó exemplificam esta desestruturação: “[...] E se os brancos dizem ser os Carijós bons é porque se lhes vendem. E até os mesmos carijós estão dizendo: - porque lhes vendemos nossos parentes dizem que somos bons [...]” (Rodrigues 1940 [1605], p. 242). As contas eram produtos do maior interesse para os indígenas, com as quais ornavam colares, em substituição aos ossos de animais e conchas anteriormente ostentados. Serrano (1937, prancha XX) encontrou três colares ainda articulados incluindo diversos objetos de origem europeia com dedais e contas venezianas, sendo, um originário do município de Três Cachoeiras e, os outros dois, originários do Sambaqui de Itapeva, município de Torres38. A carta de Cami37 Monteiro (1992) deixa claro que a Laguna dos Patos referida é a Laguna, em Santa Catarina e não a atual Laguna dos Patos, no Rio Grande do Sul. 38 O sambaqui de Itapeva estava, certamente, desocupado no século XVI. Uma datação realizada por Wagner (2009a, p. 49) evidencia a ocupação do sambaqui em 3.130 ± 40 A.P. (3.300 a 58
nha registra o interesse dos Tupinambá pelas contas com as seguintes palavras: “Viu um deles umas contas de rosário, brancas; fez sinal que lhes dessem, e folgou muito com elas, e lançou-as ao pescoço; e depois tirou-as e meteu-as em volta do braço, e acenava para a terra e novamente para as contas e para o colar do Capitão, como se dariam ouro por aquilo”. Rodrigues (1940 [1605], p. 240) atesta a importância das contas no comércio do litoral norte, que são adquiridos dos europeus e possuem alto valor para trocas entre os indígenas. “Estimam muitos os moumas, que levam pera Angola, e outras que são como canudinhos que deita o mar fóra. E vão-nos buscar daquí a mais de 70 léguas. E com estas contas hão quanto querem dos Arachãs.” Mas não apenas escravos eram adquiridos pelos europeus, mas também objetos. É mais uma vez Rodrigues (1940 [1605], p. 240) quem oferece testemunho destas práticas na área de estudos. “(...) E estes tais em pago de lhes trazerem de tão longe (que muitas vezes com a fome e cansaço morrem) o fio, redes, tipóias, e pelejos, vendem os Tubarões aos brancos (...)”. O LII14 - Sítio do Lúcio (HILBERT et al., 2008) bem como os sítios pesquisados por Schmitz (1958) possuem “uma lamela de cobre perfurada para ornato” em seus respectivos acervos, demonstrando outro produto de interesse indígena. Em Montoya (1985 [1639], p. 168) podem ser encontrados diversos exemplos de objetos que despertaram interesse dos indígenas tais como “anzóis, agulhas e alfinetes, contas de vidro e miçangas”. Sobre os Tupi da costa Sudeste e Nordeste Gandavo (1964 [1576]) relata a presença maciça de cavalos nas antigas capitanias de Ilhéus, Bahia e Pernambuco no século XVI. Entretanto Cabeza de Vaca (2009) relata repetidas vezes o medo que os cavalos despertavam nos Guarani que o acompanhavam na jornada iniciada em Santa Catarina em direção à região de Assunção. Rodrigues (1940 [1605]) informa a incorporação do gado pelos Carijó do litoral norte já nos anos iniciais do século XVII. Os fenômenos de interações culturais permitiram a integração de elementos novos ao universo cultural indígena Guarani. Exemplo claro destes processos é a incorporação de alças como elementos funcionais à vasilha cerâmica Guarani encontrada no sítio Darci Leal - LII-07. A observação das localizações dos sítios arqueológicos Guarani com evidências de contatos com o elemento europeu proporciona a clara ideia das intensas modificações transcorridas. Se em um primeiro momento, a planície costeira era explorada através da ampla circulação fluvial ao longo do sistema de leques aluviais alimentados pelo planalto, bem como pelo rosário de lagoas 3.260 cal. – probabilidade: 95%, AMS). Desta forma, os colares possivelmente relacionem-se a uma reocupação ceramista sobre o local, ainda que Kern, La Salvia e Naue (1985, p. 579) expressem claramente que “(...) Não há nenhum nível estratigráfico arqueológico canônico indicando um estabelecimento de horticultores sobre a Pedra de Itapeva”. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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do litoral, a chegada das frentes de colonização europeia resultou na reestruturação deste sistema. Neste segundo momento, os vales dos rios, anteriormente ocupados pelas aldeias menores, agora seriam o único reduto seguro do litoral norte, tornando-se alvo de disputas entre as pequenas e grandes aldeias em fuga. A planície litorânea continuaria uma excelente área para pesca e coleta, mas somente poderia ser aproveitada em incursões rápidas, através do uso de canoas. Os pequenos grupos Guarani poderiam descer as fozes dos rios Maquiné, Sanga Funda, Três Forquilhas, Cardoso e Mampituba em rápidos deslocamentos embarcados, estabelecendo-se em terrenos altos às margens das grandes lagoas. As elevações caracterizariam ao mesmo tempo a continuidade de seu sistema econômico anterior e um ponto de vigília das embarcações e tropas terrestres ibéricas que poderiam se aproximar. As análises da cerâmica encontrada nos sítios, bem como os resultados das análises já publicados, demonstram que as contas de colar, os artefatos de metal e as vasilhas com alças aparecem exclusivamente em sítios de pequeno e médio porte, localizados sobre elevações muito próximas das margens das lagoas, as quais se ligam com as desembocaduras dos rios dando acesso ao interior dos vales. Este é o caso dos sítios LII07 - Darci Leal, BAM06 - Família Machado, LII02 - Cemitério, LII14 – Sítio do Lúcio e os sítios localizados por Schmitz (1958) às margens do rosário de lagoas do litoral norte. As situações de conflitos documentadas nas páginas antecedentes foram responsáveis pelo gradual desaparecimento de muitas parcialidades indígenas que ocupavam o território brasileiro. O impacto dos anos finais do processo colonial sobre a sociedade Guarani foi expresso nas palavras de Brochado (1975, p. 1980) “[...] é tão deprimente que nem vale a pena nos estendermos a respeito [...]”. Os altivos guerreiros que devoravam os vencidos acabaram subjugados pela supremacia bélica ibérica. A missionarização degenerou a base religiosa da cultura Guarani. A utilização como contingente militar nas guerras entre portugueses e espanhóis diminuiu sua população. A subjugação como mão-de-obra escrava no sistema produtivo colonial desagregou os grupos e privou-os do domínio de suas respectivas terras. Desta maneira as populações Guarani foram aniquiladas física e culturalmente, sendo geneticamente absorvidos pela miscigenação que deu origem à sociedade luso-brasileira. Nos dias atuais, a única forma de aproximarmo-nos das estruturas sociais de populações indígenas pretéritas é através dos trabalhos arqueológicos. Entretanto, os arqueólogos têm assistido ao acelerado processo de destruição dos vestígios materiais destas culturas em função da exploração imobiliária e crescimento das malhas urbanas. Muitas questões continuam à espera de respostas, e muitos sítios ainda precisam ser escavados. Resta-nos, aos profissionais da Arqueologia, empenharmo-nos para que o nosso objeto de estudo resista ao crescimento das cidades litorâneas. 60
Figura 01- Mapa contendo as localizações das aldeias pré-históricas Guarani no litoral norte do Rio Grande do Sul.
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Figura 02- Mapa contendo os sítios arqueológicos com evidências de contato entre os ceramistas Guarani e Jê no litoral norte do Rio Grande do Sul.
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CAPÍTULO 3 A CERÂMICA GUARANI DO LITORAL NORTE DO RIO GRANDE DO SUL Mariana Araújo Neumann 39
O litoral norte do Rio Grande do Sul possui uma das coleções mais completas de cerâmica arqueológica da chamada Tradição Guarani40 no Rio Grande do Sul41. Oriundas das pesquisas desenvolvidas pelo Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA) na região entre os anos de 1965 e 1966 (MILLER, 1967), elas encontram-se hoje sob a salvaguardada do Museu Arqueológico do Rio Grande do Sul (MARSUL). Destas coleções, destacam-se as 14 vasilhas inteiras ou restauradas provenientes de sete sítios arqueológicos42 localizados nos municípios de Osório e Capão da Canoa. Apesar da falta de registro de muitos dos dados contextuais dos sítios43, os quais nos permitiriam análises mais aprofundadas sobre o material, apenas 39 Graduada e Mestre em História pela UFRGS. Atualmente é arqueóloga do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN (
[email protected]). 40 Embora uma “Tradição Guarani” não tenha sido definida na literatura, convencionou-se, a partir da publicação da tese de José Justiniano Proenza Brochado (1984), chamar assim os conjuntos arqueológicos semelhantes que se distribuem desde o Rio Madeira, seguindo pelo interior do Brasil até a bacia do Rio da Prata, os quais correspondiam, na classificação do PRONAPA, à Sub-Tradição Corrugada da Tradição Tupiguarani. 41 A síntese sobre a ocupação Guarani nesta região pode ser consultada em Wagner, neste volume. 42 RS-LN-33: Lagoa Negra, RS-LN-35: Bassani 1, RS-LN-36: Ramalhete 2, RS-LN-40: Praia do Barco 1, RS-LN-44: Arroio Teixeira, RS-LN-47: Calipso, e RS-LN-48: Bassani 3. 43 A ausência deste tipo de dado se deve às preocupações e metodologias pronapianas. Com o objetivo de formular cronologias relativas da ocupação pré-colonial brasileira, o fundamental era cobrir de pesquisas a maior parte do território nacional, identificando sítios e materiais que pudessem ser seriados. Neste intuito adotou-se uma metodologia de campo que privilegiava prospecções e coletas de superfície assistemáticas (DIAS, 1995; BARRETO, 1999/2000; PROUS, 1992) e as interpretações das coleções resultantes baseavam-se na variação quantitativa de tratamento de superfície e antiplástico (FORD, 1962). Assim, todos os dados necessários para atingir o objetivo do Programa estavam nas próprias coleções e, apesar da ênfase dada aos trabalhos de campo, não se destinou muita atenção às informações contextuais e à metodologia de escavação.
o trabalho sobre estas coleções torna possível a compreensão de questões tecnológicas como as dinâmicas de uso das diferentes categorias funcionais de vasilhas e o padrão de aplicação dos grafismos policromos, particularmente bem preservados neste contexto. Foi com o intuito, portanto, de explorar o potencial destas coleções, que as retomamos através de um estudo tecnológico minucioso44. Tecnologia é um dos principais conceitos da Arqueologia. Em toda a história da disciplina, podemos ver que foi a preocupação com as diferentes formas de produzir o mundo, principalmente o mundo material, que orientou o olhar arqueológico para os conjuntos de artefatos encontrados em diferentes contextos regionais e temporais45. Segundo Ingold (2000), apesar das diferentes formulações que teve, tecnologia pode ser entendida como “os meios pelos quais um entendimento racional do mundo exterior é posto a favor da sociedade” (INGOLD, 2000, p. 312). Conforme o autor, o conceito foi cunhado por e para o capitalismo, a fim de promover o que chama de “desembasamento” das relações sociais das relações técnicas de produção, deslocando o sujeito do centro para a periferia do processo. Isto visava garantir que o que se passasse na transformação do mundo material não mais resultasse na transformação do mundo social, o que proporcionava certo equilíbrio das tensões inerentes ao processo. Porém, em outros momentos da história ou em outras sociedades não modernas ou não ocidentais, como as Guarani que aqui consideramos, o fazer e o usar um objeto estabelecem uma relação muito mais intrínseca com as demais dinâmicas sociais, carregando a tecnologia de conteúdo social. Neste sentido, devemos retroceder o conceito de tecnologia até antes de sua constituição capitalista, possibilitando retomar a carga de socialidade subjacente às práticas tecnológicas e considerá-las como uma porta de acesso à (cosmo)lógica que as sociedades pretéritas davam ao mundo e às suas relações. Isto implica em, nas palavras de Bruno Latour (2004, 2007), tornar o conceito simétrico, ou seja, não mais significar a contraposição de dois conjuntos de seres definidos pela modernidade como ontologicamente distintos e incompatíveis (como diferentes matérias-primas e os seres humanos que as transformam), mas sim compreender as diferentes formas de associação entre seres semelhantes (como diferentes matérias-primas e os seres humanos que 44 Este estudo corresponde a minha pesquisa de mestrado (Neumann, 2008), onde analisei comparativamente coleções do litoral norte e do Vale do Rio da Várzea, com o objetivo de identificar perfis tecnológicos particulares a cada contexto, discutindo, assim, questões sobre a História Guarani Pré-Colonial. 45 Sobre a discussão da aplicação do conceito de tecnologia em Arqueologia, ver Dobres (2000). 64
as transformam!)46. Isto posto, concordamos com Ingold (2000) ao mostrar que este movimento indica que, mais que um conceito instrumental, uma tecnologia é fundamentalmente social, pois se refere a seres humanos, vivendo e trabalhando em ambientes que incluem outros humanos assim como uma variedade de agências e entidades não humanas. Através de suas experiências de troca com estes vários componentes do ambiente, as pessoas desenvolvem atitudes específicas e sensibilidades, que são portadoras das técnicas. Reciprocamente, através da disposição de suas habilidades técnicas, as pessoas ativamente constituem seus ambientes. Mas, nesta inter-relação mutuamente constitutiva entre pessoas e o ambiente não há dicotomia entre componentes humanos e não humanos. Há técnicas para o engajamento com companheiros humanos, assim como há técnicas para o engajamento com animais e plantas dos quais depende a vida, ou com materiais como madeira, argila ou pedra na produção de um equipamento (INGOLD, 2000, p. 321) O que uma tecnologia revela, assim, é uma relação de socialidade íntima entre humanos e não humanos, caracterizada como o debate que resulta na constituição de um mundo comum, um coletivo. É esta relação simétrica que compreendemos como tecnologia: uma arena política – nas palavras de Latour (2004) uma assembleia – onde humanos e não humanos figuram como proposições à formação do coletivo e defendem suas perspectivas (NEUMANN, 2008). Neste sentido, um artefato é a síntese deste debate, guardando em si os paradigmas ideais do tipo de cosmo que humanos e não humanos desejaram produzir. Desta forma, o conceito de tecnologia traduz também outros conceitos caros à Arqueologia, como padrão de assentamento, consumo e mesmo socialidade, tornando-se ainda mais fundamental à disciplina. Neste cenário, a cerâmica assume um papel destacado. Como o produto fundamental da tecnologia Guarani pré-colonial para a análise arqueológica, nela se cruzam e se tencionam os poderes de diversos seres associados. Pensando em pessoas, argilas, antiplásticos, fogos e alimentos como seres ontologicamente semelhantes, principalmente por serem todos dotados de agência, a cerâmica surge como o continente de uma série de relações políticas entre os Guarani e o ambiente. Ela pode, através da sua composição de pasta, da sua forma, dos grafismos em sua superfície, do seu uso e do seu descarte, intimidar agências perigosas ou incorporar agências desejáveis à composição do cosmo. Mais do que isto, ela é capaz, através de seu uso, de fazer transitar estas agências entre os membros do coletivo. 46 Tal premissa caracteriza a Arqueologia Simétrica, perspectiva teórica que recentemente começou a se desenvolver a partir da influência das propostas de Bruno Latour. Ver Neumann (2008; 2010 no prelo), Webmoore (2007), Whitmore (2007) e Shanks (2007). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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No caso das cosmologias ameríndias, a produção – de pessoas e artefatos – é um contínuo processo de predação de agências de outras esferas cosmológicas, o que depende de uma série de premissas tecnológicas (FAUSTO, 2001; BARCELOS NETO, 2002; LIMA, 2005; VAN VELTHEM, 2003; VIVEIROS DE CASTRO, 2002). Considerando tecnologia a arena política onde os diferentes membros dos coletivos indígenas discutem os alcances e limites desta predação, nossa hipótese é que existem minúcias na produção das vasilhas que revelam diferentes seres reproduzidos e, logo, diferentes formas de associação entre os Guarani e sua cerâmica. Neste caso, a análise tecnológica revelará uma série de especificidades em contextos regionais determinados, as quais podem revelar diferentes contornos cosmológicos próprios aos coletivos indígenas pré-coloniais. Para compreendermos todas estas relações possíveis, adotamos a metodologia de análise da cadeia operatória. Esta pode ser entendida como toda a sequência de operações que envolvem a transformação da matéria em um produto, refletindo as escolhas feitas pelo artesão (DOBRES, 2000; LEMONNIER, 1992). Se aceitamos o conceito de tecnologia como a arena política onde humanos e não humanos debatem igualmente a produção do cosmo, então seus produtos guardam os detalhes deste debate, e o estudo de suas cadeias operatórias serve como um “livro de atas”, descortinando as proposições aceitas e negadas, listando a maneira como cada elemento entrou no jogo, cada poder que agregou ao coletivo (NEUMANN, 2008). Desta forma, uma análise tecnológica nos permite acompanhar os procedimentos levados a cabo para a produção do coletivo. A metodologia desenvolvida foi inspirada tanto em modelos etnoarqueológicos como da Arqueologia experimental. Para compreender o início do processo produtivo, utilizamos o modelo de cadeia operatória desenvolvido por Silva (2000), em seu estudo da produção cerâmica entre os Assuriní do Xingu. Para compreender dinâmicas de uso, a partir das marcas que deste remanescem nas vasilhas, utilizamos a metodologia de análise de marcas de uso de Skibo (1992). Nossa análise inclui também a observação de alterações tafonômicas, pois, embora não tenhamos suficientes dados contextuais dos sítios para interpretar a questão do descarte, estas marcas limitam e interferem a observação dos demais critérios tecnológicos (SCHIFFER, 1987). Para compreender a relação entre forma e função das vasilhas cerâmicas Guarani pré-coloniais, utilizamos o modelo de Brochado e colaboradores (LA SALVIA e BROCHADO, 1989; BROCHADO, MONTICELLI e NEUMANN, 1990; BROCHADO e MONTICELLI, 1994). Os critérios considerados foram: antiplástico, técnica de confecção, tratamento de superfície, queima e acabamento de superfície, parte constituinte, antiplástico, tratamento de superfície, marcas de uso internas e externas, alterações tafonômicas e categoria funcional. Neste artigo enfatizaremos as relações 66
entre produção (representada pela análise da composição de pasta), forma (categorias funcionais) e função (análise de marcas de uso), onde acreditamos que residam as especificidades dos conjuntos de vasilhas.
AS VASILHAS CERÂMICAS DO LITORAL NORTE O objetivo da análise tecnológica de vasilhas inteiras foi questionar sobre as dinâmicas de uso das diferentes categorias funcionais conhecidas para a cerâmica arqueológica Guarani, relacionando as demais características tecnológicas em termos de especificidades morfológicas, funcionais e regionais47. Em nossa análise partimos do princípio de que qualquer escolha tecnológica não é aleatória, pois determina a re-produção de um ser específico. Diferentes contornos de bordas ou bases, a escolha das matérias-primas, as texturas e pinturas aplicadas, assim como as marcas do desempenho de uma função, caracterizam as especificidades e propriedades cosmológicas destes seres (VAN VELTHEM, 2003). A coleção de vasilhas inteiras compõe-se por 14 peças48, sendo um tembirú ungulado (tombado sob o número T-367) recuperado no sítio RS-LN-33: Lagoa Negra; três yapepó (números de tombo T-484, T-581 e T-582) e três tembirú (números de tombo T-120, T-121 e T-122) recuperados no sítio RS-LN-35: Bassani 1; uma pequena “vasilha” inteira ungulada, certamente de treino de uma artesã ainda criança (número de tombo T-088), no sítio RS-LN-36: Ramalhete 2; um yapepó corrugado-ungulado inteiro (número de tombo T-133), no sítio RS-LN-40: Praia do Barco 1; um yapepó corrugado-ungulado inteiro (tombado sob o número T-085) no sítio RS-LN-44: Arroio Teixeira; um cambuchí caguaba pintado externamente em vermelho e preto sobre branco, e internamente em preto sobre engobo vermelho (número de tombo T-476) e dois cambuchí pintados externamente em vermelho sobre branco (tombados sob os números T-1184 e T-605) associados aos enterramentos escavados no sítio RS-LN-47: Calipso; e um cambuchí (número de tombo T-1187) no sítio RS-LN-48: Bassani 3. Apresentaremos as análises das relações tecnológicas por categoria funcional (LA SALVIA e BROCHADO, 1989).
47 As comparações regionais podem ser consultadas em Neumann (2008). 48 Os croquis completos das marcas de uso para cada vasilha analisada podem ser consultados em Neumann (2008). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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✓ Yapepó O termo Guarani yapepó pode ser traduzido para o português como “panela”49, e determina, para a Arqueologia, uma categoria genérica de potes usados ao fogo. La Salvia e Brochado (1989) as caracterizaram como vasilhas que possuem base conoidal ou arredondada, corpo com bojo saliente, borda côncava, vertical ou extrovertida e boca restringida, cujo uso principal é cozer alimentos ao fogo. Em sua definição vemos uma variabilidade formal no que tange ao tipo de bordas e bases, assim registradas por Montoya: yapepó rebí chûa (panela com fundo conoidal) e yapepó rebí agûa (panela com fundo redondo) (LA SALVIA E BROCHADO, 1989, p. 125-127). Estas diferenças ainda foram pouco exploradas pela Arqueologia Guarani, motivo pelo qual optamos por enfatizar as características morfológicas para perceber quais escolhas tecnológicas se ligam a elas. As coleções do litoral norte possuem quatro yapepó: dois com fundo arredondado do tipo yapepó rebí agûa (T-581 e T-582) e dois com fundo conoidal do tipo yapepó rebí chûa (T- 085 e T-133). Estas últimas se caracterizam também por possuírem contornos complexos, com múltiplos ombros. A análise tecnológica mostrou que a composição das pastas50 estabelece diferenças entre os dois tipos de yapepó: pastas com baixa concentração de hematita (cor amarelada) para as yapepó rebí agûa, e pastas com alta concentração de hematita (cor avermelhada) para as yapepó rebí chûa. Quanto à opção de tratamento de superfície, as coleções correspondem à característica identificada por Brochado, Monticelli e Neumann (1990) e Brochado e Monticelli (1994) de que os yapepó possuem tratamentos superficiais plásticos, independente das peculiaridades morfológicas. Quanto às marcas de uso, Fidryszewski (2007), em sua análise da coleção de vasilhas Guarani inteiras do Alto Uruguai, percebeu que as diferenças morfológicas internas à categoria yapepó caracterizam panelas com funcionalidades específicas. Enquanto as panelas com fundo arredondado (yapepó rebí agûa) possuem carbonização distribuída em faixas horizontais de diferentes intensidades, concentradas principalmente nas bases, as panelas com fundo conoidal (yapepó rebí chûa) possuem uma carbonização homogênea em toda a superfície 49 Conforme La Salvia e Brochado (1989), a partir de Montoya (1876): YAPEPÓ = olla (de IA = calabaço + PEPÓ = aba, borde; ou TATAPÓ = cosa que se pone al fuego). 50 A composição das pastas corresponde à análise dos antiplásticos presentes. A partir da leitura da etnografia de Garlet e Soares (1998), sugerimos a interpretação desta questão conforme a cor da pasta (a qual foi medida em relação à maior ou menos concentração de hematita) que, segundo os autores, ainda hoje é um critério que define as formas de associação entre os Guarani e sua cerâmica. 68
interna. Isto indica diferentes tipos de alimentos sendo cozidos em cada variedade de panela. Nossos resultados são semelhantes a estes. Em relação aos yapepó rebí agûa, creditamos a dois fatores o tipo de marca de uso observado. O primeiro é o tipo de alimento sendo preparado. A carbonização no fundo nos remete a alimentos pastosos a sólidos, em que a água do cozimento evapora durante o processo, tal qual as vasilhas ittoyom dos Kalinga (SKIBO, 1992). Sugerimos que nestas vasilhas pudessem ser preparados os mingaus comentados na literatura etnohistórica (BROCHADO, 1991), e que ainda hoje fazem parte da alimentação Mbyá-Guarani (TEMPASS, 2005). O segundo fator é a forma arredondada do fundo, que faz com que as labaredas se concentrem na parte inferior da vasilha, e a restrição da boca faz com que o calor fique preso no interior (SKIBO, 1992). Uma panela assim permite que se atinja altas temperaturas durante o cozimento, possibilitando acidentes de queima dos alimentos. Em relação aos yapepó rebí chûa, os fatores forma e conteúdo também estão agindo na produção das marcas. Quanto à forma, uma vasilha de fundo cônico possui muito mais superfície em contato com o fogo. Se um fundo arredondado direciona as labaredas para os lados, concentrando o calor, um fundo cônico direciona as labaredas para cima, permitindo que o fogo envolva boa parte da vasilha, provocando a carbonização interna do conteúdo mesmo nas partes mais altas, próximas ao pescoço. Além disto, para que as paredes internas fiquem uniformemente cobertas por carbonização, é necessário que seu conteúdo seja bastante líquido (para que não carbonize somente no fundo) e ao mesmo tempo viscoso, possuindo muitas partículas sólidas que possam aderir às paredes internas e carbonizar. Portanto, o conteúdo preparado deveria ser algo como um líquido espesso. Baseada na literatura etnohistórica (Anchieta, [1584]1964; de Lèry [1577]1926; Montoya, 1997 [1892]; Noelli, 1993; Staden [1557]1956) sugiro que estas vasilhas fossem especificamente utilizadas na produção do caium. Assim, consideramos que as yapepó rebí chûa sejam um tipo de cambuchí devido a sua semelhança morfológica e funcional.
✓ Cambuchí As coleções do litoral norte possuem três vasilhas cambuchí: T-605 e T-1184, associadas aos enterramentos do sítio RS-LN-47: Calipso, e T-1187, recuperada no sítio RS-LN-48: Bassani 3. O termo Guarani cambuchí foi traduzido por Montoya como jarro ou cântaro (LA SALVIA e BROCHADO, 1989, p. 132). Caracterizadas como vasilhas
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de contornos complexos, são sempre lembradas por serem bem acabadas com elaboradas pinturas na face externa a partir da borda até o último ponto de inflexão, remetendo à função ritual que cumpriam na produção do cauim e posteriormente nos sepultamentos. No entanto, existe uma variabilidade formal, estética e funcional interna à categoria. Se mesmo Montoya já indicava os diferentes usos das vasilhas cambuchí – fermentar, guardar e servir líquidos – nos cabe considerar esta variabilidade funcional na sua relação com as diferentes escolhas tecnológicas. Podemos pensar em pelo menos três subcategorias para os cambuchí, conforme sua função: uma para armazenar água, e duas ligadas à produção de bebidas alcoólicas – cozinhar os ingredientes51 e fermentá-los. Iniciamos pela função de armazenamento, que não deixa marcas específicas na superfície cerâmica. Duas vasilhas da coleção do litoral norte (T-1184 e T-1187) não possuem marcas específicas em sua superfície interna. Segundo a documentação dos sítios, estas vasilhas estão associadas a sepultamentos. Noelli (1993, p. 102) indica que o sepultamento é uma função secundária na vida das vasilhas, ou seja, que antes de fazerem parte do conjunto funerário elas foram utilizadas em outras atividades. Na ausência de marcas de uso, como é o caso, podemos considerar que sua função anterior tenha sido pouco agressiva às paredes, como o armazenamento de líquidos – mas, sem descartar a hipótese de que tenham sido produzidas exclusivamente para o enterramento, pois não há regra nesta relação. Quanto ao tipo de pasta utilizada, as vasilhas T-1184 e T-1187 possuem matéria orgânica em sua composição de pasta, associada a altas concentrações de hematita, o que, como vimos, dá uma cor avermelhada à vasilha. Entre as vasilhas do litoral norte não pudemos aprofundar a observação sobre a variabilidade de grafismos por que, das vasilhas decalcadas, apenas T-1184 tem um bom grau de preservação, sendo que o cambuchí tombado sob o número T-1187 apresenta apenas alguns fragmentos preservados. Nesta vasilha pudemos identificar nove espaços gráficos: lábio, borda, restrição da borda, pescoço, restrição do pescoço, primeiro ombro, restrição entre os ombros, segundo ombro e diâmetro máximo (inflexão para o corpo da vasilha). Na pintura das vasilhas Guarani, lábio e pontos de inflexão e restrição são marcados com faixas comumente vermelhas que delimitam as áreas a serem pintadas. Estas áreas se localizam na borda, pescoço e ombro (s), e recebem composições de linhas que formam padrões mais elaborados. Das áreas pintadas do cambuchí T-1187 obtivemos decalque apenas de parte do grafismo presente no primeiro e no segundo ombro. Em ambos o gra51 Caso dos yapepó rebí chûa. 70
fismo se caracteriza por traços verticais e horizontais que se encontram em um ângulo de 90º, lembrando a nós uma escada. A vasilha tombada sob o número T-1184 (ver Figura 01) apresenta os mesmos nove espaços gráficos referidos para T-1187. Neste grafismo o lábio e os pontos de inflexão também foram evidenciados com faixas vermelhas, delimitando as áreas de pintura. A primeira área pintada é a borda, na qual se observa a aplicação de linhas vermelhas sobre fundo branco. O espaçamento entre estas linhas nos mostra que elas estão dispostas aos pares, indicando a representação de linhas vazadas cujos bordos são vermelhos e o interior branco. Estas linhas estão dispostas diagonalmente formando triângulos que são o módulo do desenho. O espaço é preenchido com a combinação dos módulos no sentido superior e inferior, ou seja, nos intervalos entre cada triângulo se coloca outro na posição invertida. A segunda área pintada é o pescoço e aí identificamos o mesmo padrão descrito para a borda. A repetição dos padrões também está presente na terceira e quarta áreas (primeiro e segundo ombros). O padrão de linhas vazadas com bordos vermelhos e fundo branco se mantém, mas o desenho formado é mais complexo. As linhas partem do limite das áreas – faixa vermelha nos pontos de inflexão – verticalmente em relação à boca da vasilha, e em certo ponto se curvam, formando meias-calotas. A combinação destas linhas forma o módulo do desenho, cuja imagem nos lembra um cálice. O espaço é preenchido com a combinação dos módulos no sentido superior e inferior, ou seja, nos intervalos entre cada módulo se coloca outro na posição invertida. Quanto às vasilhas relacionadas à produção do cauim, inicialmente esperávamos identificar apenas marcas de fermentação. No entanto, como exploramos no tópico anterior, as características morfológicas e funcionais dos yapepó rebí chûa nos levaram a concluir que estes sejam também um tipo de cambuchí, responsáveis por uma etapa específica da produção de cauim. No que tange à função “clássica” dos cambuchí, a fermentação de bebidas alcoólicas, apenas uma vasilha proveniente do litoral norte, T-605, apresentou tais marcas. As marcas de fermentação podem apresentar-se em padrões bastante variados. Fermentação é um processo através do qual a transformação dos alimentos provoca a liberação de gás carbônico e, no caso do uso de vasilhas cerâmicas, os líquidos envolvidos podem penetrar a superfície interna e fazer com que esta descame à medida em que tais gases são liberados. Estas descamações são as marcas deixadas pela fermentação. Nossas análises indicam que a descamação pode ser mais ou menos intensa conforme o tipo de antiplástico e qualidade do alisamento interno da vasilha – o que causa maior ou menor penetração dos líquidos fermentantes nas paredes.
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Montoya registrou alguns verbetes sobre o uso dos cambuchí em que se alerta para o cuidado em não mexer com a vasilha para que o conteúdo não se turve: erecó recó imé cambuchí húúnge ñemonãni ay hãgûâmâ = no menees el vaso porque no se enturbie el vino (LA SALVIA e BROCHADO, 1989, p.134). Não apenas a borra resultante da decantação das partes sólidas do cauim pode provocar esta turvação, mas também os fragmentos de superfície cerâmica que se despreendem na fermentação. Devido a esta variação no processo, tivemos certa dificuldade para formular um modelo de distribuição destas marcas. Além disto, nem todas as vasilhas analisadas estão completas. Mesmo T-605 é um grande fragmento de borda com parte do corpo. Ainda assim ela pôde trazer informações quanto ao seu uso. Por exemplo, que na fermentação a vasilha poderia estar cheia quase por completo – uma vez que inclusive na área próxima à borda observam-se descamações. Em relação às composições de pasta, T-605 apresentou pasta com concentração média de hematita, apresentando uma coloração alaranjada. A vasilha T-605 pôde ser decalcada (ver Figura 02). Este cambuchí possui seis espaços gráficos relacionados a seus contornos. O grafismo aqui identificado foi traçado com linhas grossas e assimétricas, sendo provavelmente o trabalho de uma pintora pouco experiente. Lábio, pescoço e inflexão entre os ombros foram marcados com faixas vermelhas. Na borda, o módulo da pintura são linhas vermelhas aplicadas sobre fundo branco. Estas estão dispostas desordenadamente, sobrepondo-se umas às outras. Nos dois ombros foi aplicado o mesmo padrão de linhas verticais e horizontais que se encontram em ângulos de 90º formando figuras quadradas. Ao contrário da vasilha T-163, onde estes módulos possuem as mesmas dimensões e se combinam num ritmo constante, o que vemos aqui são figuras irregulares, implicando a mudança no padrão de aplicação do desenho.
✓ Ñaetá O verbete de Montoya que traduz ñaetá indica: caçarola (de ÑAE = cosa côncava e A=TÁ=RÁ=YA=cozer) (LA SALVIA E BROCHADO, 1989, p. 142). São formas muito abertas, de contorno conoidal ou elipsóide simples, borda direta contínua com a parede ou levemente convexa (BROCHADO, MONTICELLI e NEUMANN, 1990, p. 737). A coleção do litoral norte não possui nenhum exemplar de ñaetá, então todas as referências à categoria serão expostas na análise dos fragmentos do sítio RS-LN-35, que segue adiante.
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✓ Cambuchí caguaba O verbete de Montoya para cambuchí caguaba indica: CAGUABA= onde se bebe vinho, instrumento de beber (LA SALVIA E BROCHADO, 1989, P.133). Estas vasilhas são conoidais de contorno simples ou complexo, abertas ou levemente restringidas, que podem receber tanto tratamentos plásticos quanto acabamentos pintados internos ou externos (BROCHADO, MONTICELLI e NEUMANN, 1990, p. 734). Na coleção analisada temos dois cambuchí caguaba: T-367 e T-476. Quanto às composições das pastas, ambas as vasilhas apresentam pastas com altas concentrações de hematita, gerando tons avermelhados. Em relação aos tratamentos e acabamentos de superfície, temos tanto os plásticos quanto as pinturas. A vasilha T-367 possui a superfície externa ungulada e a vasilha T-476 (ver Figura 03) possui um fino acabamento pintado externo e interno que foi decalcado. Esta vasilha apresenta dois pontos de inflexão: restrição do pescoço e ponto de maior diâmetro da peça (inflexão do bojo). Tipicamente, estas vasilhas também têm o lábio e os pontos de inflexão marcados com faixas vermelhas, delimitando as áreas a serem pintadas com padrões mais elaborados. Assim, em T-476, o primeiro padrão foi pintado sobre o lábio, sendo uma faixa vermelha que dá início à primeira área de pintura. Esta compreende o espaço entre a borda e a inflexão do pescoço. Nesta área, sobre um fundo branco, foram traçados pares de finas linhas vermelhas que compõe linhas vazadas, cujos bordos são vermelhos e o interior branco. Estas linhas estão dispostas diagonalmente formando triângulos, que são o módulo básico do desenho. O preenchimento do espaço se dá pela combinação destes módulos no sentido superior e inferior, ou seja, entre cada triângulo se coloca outro em posição invertida. O terceiro padrão é a faixa vermelha que destaca a restrição do pescoço, limitando o fim da primeira área e o início da segunda. Na segunda área pintada, o padrão de linhas vazadas com bordos vermelhos e fundo branco se mantém, mas o desenho que formam são mais complexos. As linhas possuem uma parte reta e vertical em relação à boca da vasilha, e em certo ponto se curvam, formando meias-calotas. A combinação destas linhas forma o módulo do desenho, que nos lembra um cálice. Da mesma maneira que no padrão anterior, o espaço é preenchido com a combinação dos módulos no sentido superior e inferior. Por fim, o ponto de maior diâmetro da vasilha é marcado com uma faixa vermelha, marcando também o final do grafismo.
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Internamente, a vasilha possui um banho vermelho que dá o fundo para a aplicação do grafismo. Este consiste em uma cruz a partir da qual linhas sinuosas preenchem o espaço. Este grafismo foi realizado com tinta preta e pela espessura e forma dos traços acreditamos que tenham sido feitos com os dedos. Em relação ao uso destas vasilhas, identificamos poucas marcas. Basicamente eles possuem desgaste na base, que pode ser decorrente tanto do armazenamento – caso fossem guardadas com a boca para cima, o que parece correto, dado que não observamos desgaste junto à borda ou lábio – quanto da manipulação em uso (apoiando o fundo da vasilha com as mãos).
✓ Tembirú Montoya define tembirú como prato (de TEMBIÚ = comestível, comida, onde U (1) = comer e beber) (LA SALVIA e BROCHADO, 1989, p.142), sendo usados para servir e consumir alimentos. Brochado, Monticelli e Neumann (1991) definiram suas características morfológicas como vasilhas muito abertas, possuindo base arredondada, borda direta ou côncava, inclinada para fora e contínua com a parede. Estas vasilhas podem receber também acabamentos de superfície externos ou internos. A coleção do litoral norte possui três tembirú: T-120, T-121 e T-122. Quanto à questão das pastas, o tembirú T-120 não pôde ser analisado por não apresentar quebra suficiente, e os demais foram confeccionados com pastas caracterizadas pela presença de material orgânico e baixas concentrações de hematita – lhes conferindo tons amarelados. Os três exemplares possuem acabamentos superficiais internos pintados, tendo sido possível decalcar apenas T-122 (ver Figura 04). No entanto, não foi possível compreendermos bem como se estabelece o padrão gráfico. O lábio foi pintado com uma faixa vermelha, sendo que em uma das extremidades da vasilha esta se amplia abruptamente, se aproximando da base. Neste ponto há uma fratura na peça, motivo pelo qual não sabemos que proporção teria esta faixa em relação à vasilha, ou qual a sua forma. No corpo e base veem-se finas linhas vermelhas pintadas sobre fundo branco. Estas linhas se iniciam em uma das extremidades da vasilha e seguem até o lado oposto, onde se curvam e voltam ao ponto de origem. Devido à fratura não sabemos se este movimento continua até o fim da peça ou se encerra na primeira volta. Em relação aos padrões policromos aplicados nos tembirú do litoral norte, podemos mencionar também um conjunto de fragmentos do sítio RS-LN-35 remontados, que apresentam seu grafismo muito bem preservado. Nes74
tes fragmentos vemos que sobre o lábio foi aplicada a típica faixa vermelha. Corpo e base possuem um fundo branco sobre o qual foram pintadas finas linhas vermelhas semicirculares ou ondulares. As figuras formadas preenchem o espaço relacionando a concavidade de uma com o início de outra. Assim, do interior de um semicírculo partem as linhas que originarão outro, e, desta forma, as figuras estão todas encaixadas. Da mesma forma que para os cambuchí caguaba, identificamos poucas marcas de uso entre os tembirú, sendo frequente o desgaste nas bases, decorrente do armazenamento ou do uso. A vasilha T-121 apresentou também um desgaste em forma anelar ao redor da borda externa, indicando que a vasilha pode ter tido algum tipo de amarração naquele ponto ou de ter servido como tampa para outra vasilha.
A COLEÇÃO DO SÍTIO RS-LN-35: BASSANI 1: QUESTÕES PARA A ANÁLISE DE FRAGMENTOS Quando se trabalha sobre uma coleção cerâmica da Tradição Guarani, o primeiro critério taxonômico considerado é a categoria funcional. Isto porque, para estas vasilhas, devido aos trabalhos de Brochado e seus colaboradores nos anos 1980 e 1990, a questão da relação entre forma e função parece ter sido solucionada. No entanto, como vimos, existe uma série aspectos morfofuncionais variáveis que perpassam a caracterização das categorias funcionais. E ainda, estas variações também se refletem nos demais critérios tecnológicos que atravessam a cadeia operatória das diferentes vasilhas. Ao contrário do que pode parecer, considerar esta ampliação nas variáveis de análise para coleções de fragmentos, as quais nos trazem informações ainda menos precisas, não implica em tornar inviável o entendimento. É possível identificarmos algumas regularidades tecnológicas por categoria funcional nas coleções de vasilhas inteiras, as quais podem ser transpostas e justamente resolver alguns aspectos genéricos identificados na análise da coleção de fragmentos do sítio RS-LN-35: Bassani 1. Uma questão interessante oriunda de nossa análise é a interpretação da produção da pasta cerâmica a partir de sua cor, considerada em relação à concentração de hematita. Como vimos, as baixas concentrações, gerando tons amarelados, se relacionam à produção e consumo de alimentos (yapepó rebí agûa e tembirú). Já as altas concentrações, gerando tons mais avermelhados, ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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se relacionam à produção e consumo de bebidas fermentadas (cambuchí e cambuchí caguabá). Quando, na análise da coleção do sítio RS-LN-35: Bassani 1, identificamos fragmentos de diferentes categorias funcionais (com morfologia, tratamento superficial e marca de uso característicos), nenhuma especificidade técnica ficou evidente pois havia uma grande variedade de pastas52 sendo usada, aparentemente, indiscriminadamente. Apenas a especificação promovida pela análise de vasilhas inteiras permitiu reconsiderarmos este aspecto genérico e compreender um pouco melhor a coleção. A análise da coleção de fragmentos do sítio RS-LN-35: Bassani 1 mostrou que os tipos de pastas se dividem de forma bastante desigual, sendo 88% de pastas com baixas e baixíssimas concentrações de hematita, e apenas 12% de pastas com concentrações médias e altas, sem especialização em relação ao tratamento de superfície ou categoria funcional. Isto reforça o uso de pastas claras para o uso de cerâmica comum, de uso cotidiano, sendo as escuras, vermelhas, reservadas às vasilhas especializadas, referentes às peças rituais. Uma categoria funcional que não pôde ser apresentada em relação às vasilhas inteiras, os ñaetá, pode aqui ser explorada. A coleção do sítio RS-LN-35 possui 30 fragmentos de bordas desta categoria funcional. A análise de composição de pastas para estes fragmentos mostrou o uso de pastas com baixas concentrações de hematita, ou seja, cores mais amarelas. Isto condiz com a premissa levantada de que cores mais claras se relacionariam à produção e consumo de alimentos. No entanto, as 18 bordas de cambuchí caguaba e as 49 de tembirú apresentam pastas amarelas, ou seja, não confirmam este padrão. Mas as categorias “de servir”, cambuchí caguaba e tembirú, são as mais suscetíveis a variações morfológicas, além da questão dos grafismos policromos, que determinam especificidades que não puderam ser completamente exploradas.
POSSIBILIDADES DA ANÁLISE TECNOLÓGICA PARA A HISTÓRIA PRÉ-COLONIAL Considerando tecnologia como a arena política onde diferentes agentes discutem a produção coletiva do cosmo, seus produtos traduzem diferentes for52 A coleção do litoral norte chegou a apresentar 35 tipos diferentes de pastas cerâmicas ou combinações possíveis de antiplásticos. 76
mas de associação, diferentes contornos sociais particulares a contextos locais e temporais. Portanto, a exploração minuciosa da tecnologia envolvida na produção de um conjunto artefatual traduz sentidos possíveis na direção de uma história Guarani pré-colonial. Duas imagens opostas, resultantes da ampla dispersão Guarani pelo atual território brasileiro, dominam os debates sobre a história Guarani anterior ao contato europeu e durante os séculos XVI e XVII. Por um lado, as fontes da época indicam uma unidade cultural e linguística bastante abrangente em todo o território Guarani. Por outro, estas mesmas fontes apontam uma intensa fragmentação política e territorial marcada por alianças e hostilidades entre diferentes grupos locais, bem como destes com seus vizinhos Guaycuru e Kaingang (ASSIS e GARLET, 2002; MONTEIRO, 1992; SUSNIK, 1982). A historiografia brasileira recentemente vem buscando investigar a segunda posição, revelando um quadro político conflitivo semelhante àquele registrado para os grupos Tupi da costa atlântica, tornando as interpretações sobre a história indígena colonial cada vez mais complexas (MONTEIRO, 1992; FAUSTO, 1992). A Arqueologia, ao contrário, apesar de poder acrescentar novas fontes e novos dados a este debate, tem permanecido centrada na imagem monolítica e homogênea da grande nação Guarani. Segundo Noelli (1993, p. 9), desde que adquiriram sua identidade étnica a partir da proto-família linguística Tupi-guarani, os Guarani atravessaram mais de três mil anos até os primeiros contatos com os invasores vindos da Europa, reproduzindo fielmente sua cultura material e as técnicas de sua confecção e uso, sua subsistência. Concomitantemente, a linguagem definidora destes objetos, técnicas e comportamentos. Do ponto de vista teórico aqui defendido, esta é uma visão bastante engessada da história Guarani pré-colonial. Em uma perspectiva simétrica sobre a história, a formação do coletivo é um debate constante sobre a aceitação ou rejeição de novas propostas – humanas ou não humanas, – cujo resultado é a ampliação ou manutenção de seus contornos. No caso das cosmologias Ameríndias, observamos uma tendência à manutenção dos contornos estabelecidos. Isto se evidencia pela ênfase dada à reprodução dos parâmetros demiúrgicos na (re)produção original do cosmo (ASSIS, 2006; BARCELOS NETO, 2002; VAN VELTHEN, 2003). Isto não significa, no entanto, que haja uma filosofia voltada para o passado. Pelo contrário, a manutenção de formas tradicionais de produzir pessoas e coisas está centrada no presente – e no futuro do coletivo. Uma vez que o cosmo indígena é habitado por uma infinidade de seres poderosos que atuam à margem do social, a possibilidade de se reinstaurar o caos original está dada,
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e apenas a reprodução acurada da ordem cósmica, socializando as diferentes agências, pode garantir o evitamento de que esta possibilidade se concretize. Em princípio, toda inovação resulta em poder não domesticado, o que significa perigo para a vida social (justificando a concepção prescritiva da cultura material defendida por Noelli (1993)). Ao mesmo tempo, quando trabalhamos a história Guarani em termos de longa duração através da Arqueologia pré-colonial, percebemos como uma de suas características mais marcantes a relação constante com a inovação ao longo de sua ampla dispersão pelo interior da América do Sul, a partir de sua origem amazônica há 5.000 anos (BROCHADO, 1984). A questão que surge é: como se resolve este (aparente) paradoxo? Deslocando do olhar do Guarani “padronizado” para o Guarani “parcializado”, ou seja, para as fragmentações sociais indicadas na bibliografia etnohistórica e que estão registradas nas coleções arqueológicas, podendo ser acessadas por análises tecnológicas comparativas minuciosas.
Figura 01- Cambuchí T-1184.
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Figura 02- Decalque de fragmento do cambuchí T-605.
Figura 03- Cambuchí caguabá T-476. Notar semelhança com o padrão observado em T-1184.
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Figura 04- Tembirú T-122.
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CAPÍTULO 4 ARQUEOLOGIA GUARANI NO LAGO GUAÍBA: REFLETINDO SOBRE A TERRITORIALIDADE E A MOBILIDADE PRETÉRITA E PRESENTE Adriana Schmidt Dias53 Sergio Baptista da Silva54
Entre 2008 e 2009 foram realizados levantamentos arqueológicos de sítios pré-coloniais da Tradição Guarani nas localidades de Itapuã, Morro do Coco e Ponta da Formiga, situadas na região metropolitana de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Estas pesquisas foram coordenadas por Adriana Schmidt Dias e desenvolvidas enquanto membro do Grupo Técnico (GT), constituído pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), a fim de identificar e delimitar terras indígenas mbyá-guarani no âmbito do Plano Operacional para a Identificação e Delimitação de Terras Indígenas nas Regiões Sul do Lago Guaíba e Norte da Laguna dos Patos, RS, sob coordenação geral de Sergio Baptista da Silva. As atividades do GT tiveram por objetivo compreender a pertinência das citadas áreas no complexo multi-local que caracteriza a ocupação mbyá-guarani no sul e no sudeste do Brasil, visando produzir relatórios de identificação e caracterização das terras indígenas reivindicadas. Durante os trabalhos do GT foram realizados estudos sistemáticos sobre a presença guarani nesta área, desde as perspectivas etnológica, etnográfica, histórica, arqueológica e ambiental. As pesquisas arqueológicas visaram compreender o uso do espaço lagunar pelas sociedades guarani pré-coloniais, buscando avaliar aspectos de continuidade e mudança nos padrões de ocupação indígena do território. Os objetivos dos trabalhos de campo foram localizar, geo53 Professora do Departamento e Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisadora do CNPq.
[email protected]. 54 Professor do Departamento e Programa de Pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
[email protected]
-referenciar e avaliar o grau de preservação das ocupações pré-coloniais, bem como verificar sua relação com as ocupações historicamente mais recentes, ainda presentes na memória social mbyá. Conforme o Artigo 2° da VII Parte da Portaria/FUNAI n° 14, na elaboração deste Relatório Circunstanciado de identificação e delimitação de terras indígenas, todos os trabalhos de campo foram realizados com a participação dos indígenas e no decorrer da pesquisa suas manifestações e interpretações foram incorporadas aos relatórios produzidos. Além dos trabalhos de campo, para a elaboração dos relatórios do GT também foram efetuados levantamentos bibliográficos, documentais e cartográficos sobre os dados arqueológicos, históricos, etnográficos e etnológicos relacionados aos Mbyá-guarani e à sua ocupação ao longo das margens e ilhas do Lago Guaíba e ao norte da Laguna dos Patos. Também foram realizados levantamentos sobre as condições ambientais e ecológicas da área em questão. A Região Hidrográfica do Guaíba ocupa a porção centro-leste do Estado e é formada pelas bacias que drenam direta ou indiretamente para o Lago Guaíba que deságua na Laguna dos Patos. A Bacia Hidrográfica do Lago Guaíba está situada na Depressão Central e Encosta do Sudeste e limita-se ao norte com as bacias dos rios Caí e Gravataí, ao sul com a bacia do rio Camaquã, a leste com a bacia do Litoral médio e a oeste com a do baixo Jacuí. As águas dos rios Gravataí, Sinos, Caí e Jacuí desembocam no Delta do Jacuí, formando o Lago Guaíba, que em Guarani significa “lugar onde o rio se alarga” (gua = grande; i = água; ba = lugar). A superfície do Lago Guaíba é de 496km2, com profundidade média de 3 m, possuindo entre 900m e 19km de largura e 50km de comprimento entre o Delta do Jacuí e o Pontal de Itapuã (NICOLODI, 2007). O Guaíba banha em torno de 85km de terra na margem ocidental, onde situam-se os municípios de Eldorado do Sul, Guaíba e Barra do Ribeiro, e 100km na margem oriental onde ocorre uma ocupação urbana mais intensa associada aos municípios de Porto Alegre e Viamão. A bacia hidrográfica do Lago Guaíba é caracterizada por um clima temperado, moderadamente chuvoso, com média anual de temperatura de 20º C e de pluviosidade de 1300 mm, distribuída regularmente ao longo do ano, porém com tendência de estiagem no verão. No contexto local, o Lago Guaíba exerce uma função termoreguladora em decorrência das encostas graníticas em suas margens que controlam a incidência de ventos e concentram diferencialmente a umidade. Nas encostas voltadas para o sul, a concentração de umidade favorece o desenvolvimento de formações florestais, predominando nas encostas voltadas para o norte a formação de campos (MENEGAT et al., 2006). 82
O Lago Guaíba situa-se na interface entre dois domínios geomorfológicos: o Escudo Cristalino Sul-Rio-Grandense e a Planície Costeira. O Escudo Cristalino Sul-Rio-Grandense é formado por granitos do Cinturão Dom Feliciano e abrange o sudeste do Estado. Suas formas de relevo variam desde coxilhas, morros, pontões e cristas até chapadas, ocorrendo em ambas às margens do Lago Guaíba pontais de 1 km a 2 km de extensão, conformando um conjunto contínuo de baias, ilhas rochosas e morros interiorizados, com altitudes entre 50 a 265 metros. A Planície Costeira corresponde à porção leste do Estado, sendo formada por depósitos arenosos, cuja dinâmica sedimentar obedeceu às variações dos níveis marinhos quaternários (IBGE, 1986). A atual Planície Costeira formou-se a partir da última transgressão marinha há cinco mil anos, sendo compartimentada nas seguintes unidades: Planície Aluvial Interna, Coxilha das Lombas, Sistema Lagunar Guaíba-Gravataí, Barreira Múltipla Complexa e o Sistema Lagunar Patos-Mirim. Na Coxilha das Lombas ocorrem evidências de um antigo sistema de ilhas-barreira que isolou do mar o sistema Lagunar Guaíba-Gravataí, hoje ocupado pelas bacias hidrográficas do Lago Guaíba e do rio Gravataí (VILLWOCK e TOMAZELLI, 1995). Em termos fisiográficos o Lago Guaíba insere-se na região da Depressão Central, apresentando um relevo de terras baixas circundadas por elevações graníticas (morros) correspondentes à parte nordeste da Serra do Sudeste, com influência da Planície Costeira. Localiza-se, portanto, na transição entre o Bioma Mata Atlântica (Floresta Estacional Semidecidual e Floresta Ombrófila Densa) e o Bioma Pampa (Formações Pioneiras da Planície Costeira) (IBGE, 1986). Em função das características climáticas e geomorfológicas, os solos da região do Lago Guaíba são típicos de zonas alagadiças variando de arenosos a argilosos, sendo intensamente afetados pelas flutuações pluviométricas, predominando a dissecação no verão o que favorece a ação mecânica do vento. Nos morros graníticos ocorre um acentuado intemperismo químico das rochas, acompanhado pela ação erosiva pluvial e fluvial, originando pequenos cones aluviais, voçorocas e terraços fluviais. Os solos, em geral, são rasos e impermeáveis, de granulação arenosa grosseira, rochosos e entremeados por blocos de pedra ou matacões Nas encostas íngremes acumulam-se solos mais argilosos e profundos, com maior permeabilidade e maior retenção de água. Nas planícies das margens do Guaíba ocorrem solos aluviais arenosos, com baixo teor de nutrientes, alta permeabilidade e baixa retenção de água (IBGE, 1986). Levantamentos ambientais realizados na área do Parque Estadual de Itapuã indicam a presença atual de 208 espécies de aves, destacando-se o trinta-réis (Sterna hirundo) e a batuíra (Pluviales dominica) como aves migrantes do
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hemisfério norte e ainda o urubu-de-cabeça-amarela (Cathartes burrovianus) e o gavião-de-rabo-branco (Buteo albicaudatus) (DRNR, 1997). Quanto à ictiofauna, das 106 espécies de peixes já registradas para o Sistema Lagunar dos Patos, 44 foram registradas na área atualmente ocupada pelo Parque Estadual de Itapuã e 34 para a região do Delta do Jacuí. Sua abundância local varia de acordo com as estações, sendo influenciada pela temperatura da água e pelo ciclo reprodutivo dos peixes, decrescendo apenas no inverno (DUFECH e FIALHO, 2009; SACCOL-PEREIRA e FIALHO, 2010). Predominam em número de espécies os caracídeos (lambaris, dentuço), os pimelodídeos (pintado, jundiás) e os cíclídeos (carás). Como a Laguna dos Patos possui ligação com o mar são também encontrados em Itapuã espécies diádromas, como a tainha e a corvina, que durante seu ciclo vital realizam migrações entre as águas salgadas e doces. Destaca-se ainda que as áreas adjacentes ao Parque Estadual de Itapuã atualmente propiciam a ocorrência de pesca comercial e amadorística, dirigida especialmente para as seguintes espécies: pintado, jundiá, traíra, peixe-rei, piava, biru, bagre, corvina e linguado (DRNR, 1997). Como resultado dos levantamentos arqueológicos de campo e da revisão dos dados de acervo relativos a pesquisas anteriores, foi possível registrar a presença na região do Lago Guaíba de 37 sítios arqueológicos da Tradição Guarani, dentre os quais dois apresentam datações entre 610 e 440 anos AP. A distribuição dos sítios revela uma rica rede de assentamentos pré-coloniais que interligava o Delta do Jacuí com os pontais e ilhas do Lago Guaíba, estendendo-se até a desembocadura com a Laguna dos Patos. Observa-se que as ocupações guarani pré-coloniais conformam um horizonte sócio-cultural e ambiental que atualmente continua sendo palco da territorialidade mbyá-guarani através da presença de inúmeras aldeias e acampamentos nesta área, como é o caso da Aldeia do Cantagalo (Tekoá Jataity), da Aldeia de Itapuã (Tekoá Pindó Mirim) e do acampamento do Lami (Tekoá Pindó Poty)55, na porção oriental sul do Lago Guaíba, e dos acampamentos do Petim, Passo Grande e Flor do Campo e da aldeia de Coxilha Grande (Tekoá Porã), no lado ocidental da parte centro-sul do Lago Guaíba. As áreas objeto dos trabalhos do GT estão especialmente vinculadas a este horizonte espacial, ecológico e simbólico, tanto do ponto de vista de uma temporalidade pré-colonial mais recuada, como do ponto de vista de uma historicidade mais próxima. Muitos Mbyá-guarani moradores de Pindoty (Itapuã) e Jataity (Cantagalo), mas também muitas pessoas que estão hoje em outras 55 Informações adicionais sobre estas e outras ocupações atuais mbyá-guarani da região metropolitana de Porto Alegre podem ser conferidas em Baptista da Silva e colaboradores (2008). 84
aldeias do litoral sul e sudeste do Brasil, têm ligações fortes e recentes com o Morro do Coco, o Parque Estadual de Itapuã e com a Ponta da Formiga. Além de terem constituído aldeias junto com seus grupos de parentes e afins nestes locais há poucas décadas atrás, igualmente lá têm enterrados seus mortos.
ASPECTOS DA TERRITORIALIDADE E DA MOBILIDADE MBYÁ-GUARANI Atualmente, a língua guarani no Brasil (Família linguística Tupi-Guarani do Tronco Tupi) costuma ser subdividida em três dialetos: o Mbyá, o Nhandeva e o Kaiowá. Seus falantes distribuem-se em tekoá (aldeias) e acampamentos com situação fundiária não regularizada, localizados principalmente nos Estados brasileiros das regiões sul, sudeste e centro-oeste. A este ponto de vista linguístico devem ser agregados elementos de identidade sociocultural, o que permite falarmos de três parcialidades étnicas atuais guarani (os Mbyá, os Nhandeva ou Xiripá e os Kaiowá), que apesar de sua unidade linguística, cultural e social, especialmente em relação ao Ñandé Rekó56, passaram por diferentes processos histórico-culturais de contato com populações não indígenas e com vários Estados Nacionais da América do Sul, culminando em identidades sócio-políticas um tanto diversas. Em outras palavras, temos no povo guarani uma unidade cultural mito-cosmológica, mas que dialoga com uma diversidade de identidades sócio-políticas constitutivas das relações entre as três parcialidades étnicas e, mesmo, entre os tekoá. Os Mbyá-guarani distribuem-se entre os Estado do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo, estando também presentes no Uruguai, Argentina e Paraguai. A dinâmica societária que orienta o processo de territorialização desta população caracteriza-se, concomitantemente, pela descentralização em pequenos grupos familiares e pela intensa articulação destes mesmos grupos em redes de parentesco interaldeãs. Neste sentido, o território mbyá-guarani apresenta-se como um complexo de conexões sociais e ambientais, uma vez que os recursos básicos para a reprodu56 Ñandé Rekó guarani, ou “nosso costume”, no qual tem fundamental importância as Belas Palavras, expressas nos mitos e nos cantos sagrados, no sistema xamânico-cosmológico, no aguyje, “estado de totalidade acabada”, de perfeição espiritual-religiosa, que é buscado constantemente, e no tapejá, o ser caminhante guarani que procura na Terra sem Mal, sob a liderança dos xamãs e durante a vida terrena, o reencontro com a divindade e a imortalidade perdidas. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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ção da sociedade estão articulados nas redes de parentesco, as quais condicionam também o acesso a recursos naturais imprescindíveis para a reprodução do modo de vida tradicional. Assim, sementes, plantas medicinais, materiais para artesanato, dentre outros recursos, têm seu acesso mediado pelas redes de parentesco e pelo sistema simbólico vinculado ao ambiente. O estudo de uma região particular da territorialidade mbyá-guarani deve ter por eixo a dimensão global do sócio e do cosmos deste coletivo indígena. Este se inscreve em pequenas áreas (“ilhas”), num universo de relações que extrapolam as dimensões do espaço físico, envolvendo agências múltiplas (humanos e extra-humanos - divindades, animais, plantas e outros seres que povoam o cosmos guarani), além de outros coletivos indígenas e não indígenas, através de lógicas próprias que produzem as relações sociais nas aldeias e entre as aldeias (BAPTISTA DA SILVA, 2008; PRADELLA, 2009). Portanto, para compreender as demandas territoriais na porção sul do Lago Guaíba e na região norte da Laguna dos Patos deve-se situá-las no complexo multi-local da territorialidade guarani, atentando para as relações com as demais aldeias localizadas a leste, centro e norte do Rio Grande do Sul, nos outros Estados do sul e sudeste do Brasil, bem como nos países limítrofes do cone sul americano. Ao analisar aspectos das noções de territorialidade e mobilidade mbyá através da perspectiva histórica, Garlet (1997) sugere que o contato interétnico constituiu-se em um marco de resignificação destas categorias, cujo impacto tem uma longevidade de pelo menos 300 anos57. Garlet sugere que embora os Mbyá se tornem “visíveis” aos ocidentais enquanto grupo étnico somente no início do século XX, há fortes indícios nas fontes documentais do período colonial de que as referências aos Ka’yguá (os do mato) tratem do mesmo grupo. Seu território original situava-se onde hoje é o Paraguai, organizando-se a sociedade a partir de grupos de parentesco (famílias extensas) e afins em torno de uma liderança religiosa e/ou política58. Neste contexto, a mobilidade circunscrevia-se ao território contínuo, motivada pela circularidade regular das sedes de aldeias, pela exploração sazonal do ambiente, pelo encontro com os extra-humanos nele presentes ou por crises sociais internas. É a partir da segunda metade do século XVII que o processo de testerritorialização mbyá inicia-se, em função da expansão colonial voltada à exploração das imensas reservas de madeira e erva-mate a leste de Assunsión, área então dominada pelos Guarani não incluídos 57 Para análise da trajetória histórica dos Mbyá e suas repercussões sócio-políticas ver também Garlet e Assis (2009). 58 Para uma análise etno-histórica da organização social dos Guarani entre os séculos XVI e XVII ver Soares (1997). 86
no sistema reducional jesuíta ou no sistema colonial das encomiendas. Estes sofreram um intenso processo de depopulação, causada pelos confrontos e epidemias e pela perda da quase totalidade do território original, exigindo uma reestruturação das noções tradicionais de território e mobilidade espacial. De acordo com Garlet (1997, p. 185), “[...] o território que anteriormente possuía seus limites geográficos relativamente determinados, ou seja, limites contínuos, a partir do contato inter-étnico passa a ser concebido como descontínuo. Seus limites poderão ser sempre ampliados com a reterrritorialização. Atrelada a esta nova noção de território, identifica-se uma nova categoria de mobilidade, a migração. Tanto uma como a outra são reelaborações feitas a partir de suas premissas culturais. O seu território passa a ser descontínuo e fragmentado, mas para que os novos locais possam ser a ele incorporados precisa possuir as características ambientais e simbólicas prescritas pela cultura”.
De acordo com Garlet (1997), a organização social também se reestruturou a partir desta nova noção de território, mantendo-se hoje a família extensa como base da organização social. Porém, é configurada de maneira dispersa entre vários aldeamentos, dispostos na amplitude do território, sendo a mobilidade espacial a principal estratégia de re-elaboração dos laços sociais. Assim, a dinâmica da ocupação do território mbyá caracteriza-se pela circularidade, uma vez que os espaços escolhidos para ocupação e que correspondem minimamente às pautas culturais são constantemente retomados por grupos familiares num sistema de revezamento. Igualmente, a mobilidade contemporânea configura-se a partir de uma conjunção de fatores que a impulsiona e justifica, destacando-se a busca de espaços que ofereçam condições mínimas para que a existência ocorra de acordo com o ideal de vida projetado culturalmente, permitindo: “[...] manter-se Mbyá através do caminhar. Portanto, mesmo não havendo mais espaços ideais que permitam uma existência plena e perfeita, através da circularidade é possível maximizar o potencial existente sobre o território e viver de acordo com o modo de ser tradicional (...) caracterizado por uma dinamicidade que recicla e recria o novo a partir da lógica tradicional” (GARLET, 1997, p. 187).
Também na perspectiva cosmológica, é através dos deslocamentos que os Mbyá repetem constantemente a ação paradigmática das divindades, dando origem a uma nova Terra Sem Males, fundada, estabelecida e cultivada segundo os princípios da cultura. Para Garlet (1997, p. 187). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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“Ao proceder desta forma, repetem outra ação paradigmática: criam o mundo ao caminhar. Imitam os heróis culturais que ao caminharem sobre a terra nominaram as plantas e os animais. Movimento (dança e caminhar) e palavra (palavra-alma e reza) são os fundamentos do mundo. Ao caminhar e dizer sua palavra ritualizada, os Mbyá fundam o seu mundo e podem ampliar constantemente seu território. Da mesma forma, a palavra (proferida e ritualizada) e o movimento (caminhar, partir para outro espaço) podem ser tomados como elementos culturais eficazes tanto na afirmação da identidade como de resistência às pressões interétnicas”. Atualmente vivem no Rio Grande do Sul mais de 2.600 indivíduos pertencentes a este coletivo indígena, habitando cerca de 83 áreas indígenas de forma precária e em espaços exíguos em sua maioria59. Contudo, apenas uma ínfima parte destas áreas possui algum procedimento jurídico de reconhecimento fundiário. Este fato, por si só, desestabiliza e compromete a permanência das famílias nesses espaços devido à forte pressão social, política e econômica da sociedade envolvente. Durante décadas, os Mbyá-guarani estiveram à margem da atuação do indigenismo oficial, que os considerava “estrangeiros”, devido a sua concepção de territorialidade, e também difíceis de trabalhar dada a sua mobilidade social, o que acarretou a ausência de identificação e demarcação de terras adequadas para sua reprodução física e cultural (BAPTISTA DA SILVA et al., 2010). O foco das atividades deste GT estava relacionado à identificação e caracterização de terras indígenas associadas à regularização da atual área de implantação da Aldeia de Itapuã (Tekoá Pindó Mirim), bem como à avaliação de outros locais de uso tradicional e com potencial dentro das lógicas mbyá para reprodução do modo de ser guarani como o Morro do Coco, a Unidade de Conservação Parque Estadual de Itapuã e a Ponta da Formiga. O núcleo residencial e as áreas de roças da aldeia Pindó Mirim localizam-se no distrito de Itapuã e restringem-se a uma área de 26 hectares em uma porção de terras limítrofes com o Parque Estadual de Itapuã. O Parque Estadual de Itapuã e o Morro do Coco localizam-se na porção oriental sul do Lago Guaíba, no distrito de Itapuã, no extremo sul do município de Viamão, que faz limite ao norte com os municípios de Alvorada, Gravataí e Glorinha, ao sul com a Lagoa dos Patos, a leste com Capivari do Sul, e a oeste com Porto Alegre. O Morro do Coco é composto por quatro propriedades privadas, das quais duas são Reserva Particular do Patrimônio Natural. A Ponta da Formiga é uma área de preservação ecológica que pertencia durante as ativi59 Segundo levantamento efetuado pelo Núcleo de Antropologia das Sociedades Indígenas e Tradicionais (NIT-UFRGS), no âmbito do projeto Guarani Transfronteiriços. 88
dades de campo do GT à empresa de produção de celulose Aracruz Celulose, recentemente vendida para uma companhia chilena chamada Fíbria. Está localizada no município da Barra do Ribeiro que faz limite ao norte com o município de Guaíba, ao sul com o município de Tapes, a oeste com os municípios de Mariana Pimentel, Sertão Santana e Sentinela do Sul, e a leste com o Lago Guaíba e Laguna dos Patos. Estas três áreas têm em comum o fato de serem extremamente ricas do ponto de vista ambiental, constituindo-se em referenciais tradicionais importantes para o processo de reivindicação mbyá por permitirem a sustentação do Ñandé Rekó, o modo de ser guarani. Na medida em que a concepção de territorialidade mbyá não é contínua, estas áreas com riqueza de recursos naturais para a coleta, a caça e a pesca são os “lugares eleitos” para o estabelecimento de aldeias que podem ser comparadas a “ilhas” ou “arquipélagos” já que entre as várias aldeias (e as imensas áreas circundantes a elas) constitui-se uma complexa rede de relações de toda a ordem, atualmente cercadas pelas sociedades regionais/nacionais. Nos trabalhos de campo do GT realizados conjuntamente com os Mbyá-guarani inúmeros exemplos de plantas, animais, divindades e outros seres cosmológicos foram identificados pelos indígenas, demonstrando a relação forte e indissociável que traçam entre seus corpos/pessoas e estas “matas sagradas” essenciais a continuidade e manutenção mbyá. Além dos seres extra-humanos, os sítios arqueológicos identificados nas áreas vistoriadas pelo GT foram compreendidos pelos Mbyá como “marcas do caminhar dos avós” demonstrando uma relação de ancestralidade e imemorialidade com o território reivindicado (BAPTISTA DA SILVA et al., 2010). Ressalta-se ainda que as áreas diagnosticadas pelo GT diferem quanto às suas condições fundiárias, gerando dificuldades no processo de demarcação tendo em vista distintos interesses. Por um lado, os raros locais com bom estado de preservação ambiental e abundância de recursos naturais no sul do Brasil, na maioria já foram reservados para a criação de Unidades de Conservação Natural, não admitindo a presença humana no seu interior, como é o caso do Parque Estadual de Itapuã60. Por outro lado, propriedades privadas e empresas tendem a opor-se ao processo de demarcação de terras indígenas pelo fato de serem indenizados apenas pelas benfeitorias presentes em suas terras. No caso da Ponta da Formiga há o agravante do ponto de vista econômico que a empresa de celulose proprietária da área terá que desativar sua unidade de produção, correndo o risco de ser extinta (BAPTISTA DA SILVA et al., 2010). 60 Para análise da relação entre políticas ambientais e de demarcação de terras indígenas, analisando em particular o caso do Parque Estadual de Itapuã, ver Comandulli (2008). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
89
O TERRITÓRIO GUARANI PRÉ-COLONIAL NA REGIÃO DO LAGO GUAÍBA As pesquisas arqueológicas realizadas entre 1970 e 2010 na região do Lago Guaíba atestam a presença de uma ocupação pré-colonial intensa, associada a 37 sítios arqueológicos da Tradição Guarani. As primeiras pesquisas arqueológicas sistemáticas nesta área foram realizadas entre as décadas de 1970 e 1980 por Guilherme Naue, Pedro Augusto Mentz Ribeiro, Eurico Theófilo Miller e Sérgio Leite, estando estes acervos sob a guarda do Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (CEPA/PUCRS) e do Museu Arqueológico do Rio Grande do Sul (MARSUL). Projetos de levantamento arqueológico foram retomados nos anos 1990 através das atividades do Programa de Pesquisas Arqueológicas em Itapuã (RS), coordenado por Sergio Baptista da Silva, e do Projeto de Levantamento de Sítios Arqueológicos de Ocupação Indígena no Município de Porto Alegre, coordenado por Fernanda Tocchetto, estando os acervos derivados destas pesquisas sob a guarda do Museu Joaquim José Felizardo (MJJF), do Laboratório de Arqueologia e Etnologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (LAE/UFRGS) e do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul (MARS). Mais recentemente no âmbito da Arqueologia de contrato foram realizados salvamentos arqueológicos de sítios da Tradição Guarani sob efeito de impactos ambientais por Cláudio Baptista Carle, Beatriz Thiesen, Alberto Tavares Duarte de Oliveira, Gislene Monticelli e José Otávio Catafesto de Souza, recebendo estas atividades salvaguarda institucional do MJJF, CEPA/PUCRS e LAE/UFRGS. Estes trabalhos desenvolveram-se nos municípios de Porto Alegre, Guaíba, Eldorado do Sul, Viamão e Barra do Ribeiro e permitiram o registro de 33 sítios arqueológicos associados à Tradição Guarani. Nas áreas abrangidas especificamente por este GT foram identificados entre 1970 e 2009, 18 sítios arqueológicos da Tradição Guarani, dentre os quais quatro foram localizados pela primeira vez a partir de nossos trabalhos de campo, totalizando a amostragem de 37 sítios arqueológicos acima referida. A ênfase de nossas atividades foi registrar novos sítios e monitorar as condições de preservação de sítios arqueológicos já identificados nas áreas de interesse, registrando também suas coordenadas geográficas. Ressalta-se que as consultas ao Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, mantido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), e o levantamento bibliográfico realizado sobre o tema indicaram que os dados relativos à maioria 90
destas pesquisas ainda se encontravam inéditos, sendo restrito o número de publicações sobre o tema (BAPTISTA DA SILVA, 1992; CARLE e SANTOS, 2000; GAZEANO, 1990; GAULIER, 2001-2002; NOELLI, 1993; NOELLI et al., 1997; POUGET e THIESSEN, 2002; ROSA, S/D; ZORTEA, 1995). Tendo em vista estas limitações, realizou-se uma pesquisa documental junto aos acervos das Instituições depositárias destas coleções com o objetivo coligir dados relativos à localização e ao grau de integridade dos sítios arqueológicos no momento da pesquisa, conferir possíveis sinonímias no registro dos sítios e avaliar as condições de preservação dos acervos e da documentação de campo, estando os resultados sistematizados na tabela 01 e na Figura 01. Tabela 01 - Sítios Arqueológicos da Tradição Guarani na porção norte do Lago Guaíba localizados entre 1970-2010 Nome do Sítio
Sinonímia
Coordenadas
Intervenção
Município
Instituição
RS-119
RS-152: Ponte do Guaíba
Sem registro
Coleta de superfície
Eldorado do Sul
PUCRS
22J 0469 770
Coleta de superfície e sondagem
Eldorado do Sul
Não localizado
Arroio do Conde
6675 048
RS-SR-342: Santa Rita
Complexo Automotivo da Ford
22J 0469 294 6671 719
Escavação e datação: 540+60 AP 440+60 AP
Guaíba
PUCRS
RS-LC-71: Ilha Chico Manuel
RS-C-01
22J 0484 300
Escavação e datação:
Porto Alegre
MARSUL
RS-87: Romeu
Ponta do Chico
6651 800
MARS
610+50 AP
MJJF
Sem registro
Coleta de superfície
Porto Alegre
PUCRS
G1: Vila da Restinga
Sem registro
Coleta de superfície
Porto Alegre
FAPA
RS.JA-74: Lomba do Pinheiro 2
22J 0488 226
Escavação
Porto Alegre
FAPA
6669 014
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
91
Nome do Sítio
Coordenadas
Intervenção
Município
Instituição
RS-JA-01: Reserva Biológica do Lami
22J 0493 050
Coleta de superfície e sondagem
Porto Alegre
MJJF
RS-JA-02: Lami Bernardes*
22J 0493 025
Coleta de superfície e sondagem
PortoAlegre
MJJF
RS-JÁ-16: Ponta do Arado
22J 0481 711
Coleta de superfície e sondagem
Porto Alegre
MJJF
Porto Alegre
MJJF
6662 732
Coleta de superfície e sondagem
RS-JA-23: Praça da Alfândega
22J 0477 701
Escavação
Porto Alegre
MJJF
RS-JÁ-24: Rede DMAE
Sem registro
Escavação
Porto Alegre
MJJF
Morro do Osso
Sem registro
Registro
Porto Alegre
UFRGS
RS-88: Novo Lar dos Me-
Sem registro
Coleta de superfície
Viamão
PUCRS
22J 0493 665
Coleta de superfície
Viamão
PUCRS
RS-JA-07: Lajeado*
Sinonímia
6655 665
6654 372
6655 320 Morro São Pedro
22J 0490 337
Morro das Quirinas 6677 966
nores PA 300: Rogério Christo
Morro do Coco
6651 662
RS-LC-18: Morro do Coco
22J 0495 718 Registro 6651 542
Viamão
UFRGS
RS-272: Nei Bueno
Sem registro
Coleta de superfície
Viamão
PUCRS
22J 0498 081 Coleta de su6659 494 perfície
Viamão
MARS
RS-LC-01: Aldeia do Cantagalo
92
G4 Tekoá Jataity
FAPA
Nome do Sítio
Sinonímia
RS-LC-02: Colônia de Itapuã Pomar da Lagoa I
Águas Claras
Intervenção
Município
Instituição
Sem registro
Coleta de superfície
Viamão
MARS
22J 0513 106
Coleta de superfície e sondagem
Viamão
UFRGS
Coleta de superfície e sondagem
Viamão
MARSUL
Coleta de superfície
Viamão
MARSUL
6663 477
RS-LC-70: Ilha do Junco RS-LC-74: Praia da Pedreira**
Coordenadas
22J 0493 700 6141 900 RS-LC-03: Sitio da Pedreira-Morro do Fortaleza
RS-LC-75: La- RS-LC-04: Lagoa Negra* goa Negra I
22J 0495 161 6641 730
MARS
22J 0500 977 Coleta de 6641 531 superfície e sondagem
Viamão
22J 0496 400
Viamão
PUCRS
6645 300
Coleta superfície
RS-LC-39: Morro da Fortaleza*
22J 0495 200
Escavação
Viamão
MARSUL
RS-LC-08: Praia das Pombas**
22J 0496 303
RS-LC-06: Lagoa Negra II RS-323: Ilha das Pombas
PA 253
MARSUL MARS
6642 250
MARS Viamão
MARS
6643 308
Coleta de superfície
RS-LC-07: Praia do Araçá
22J 0496 150
Registro
Viamão
MARS
RS-LC-11: Praia da Onça
22J 0495 088
Coleta de superfície
Viamão
MARS
RS-LC-15: Praia do Sítio
22J 0495 594 Coleta de 6639 135 superfície e sondagem
Viamão
UFRGS
6640 750
6642 544
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
93
Nome do Sítio
Sinonímia
Coordenadas
Intervenção
Município
Instituição
RS-LC-16: Prainha
22J 0494 944 Registro 6638 618
Viamão
MARS
RS-LC-17: Morro do Farol
22J 0494 500
Viamão
UFRGS
22J 0489 112 Coleta de su6641 514 perfície
Barra do Ribeiro
PUCRS
RS-LC-22: Tekoá Porã
22J 0490 802 Registro 6640 887
Barra do Ribeiro
UFRGS
RS-LC-21: Tekoá Mareÿ
22J 0490 094 Registro 6639 842
Barra do Ribeiro
UFRGS
RS-LC-20: Tekoá Yma
22J 0487 816
Registro
UFRGS
635 842
Barra do Ribeiro
Arroinho I
22J 0486 318 Registro 6633 595
Barra do Ribeiro
PUCRS
RS-324: Tarumã
6638 400 Riocel Tekoá Karaguata’ity
Coleta de superfície e sondagem
*Possível associação com material lítico da Tradição Umbu/** Atualmente destruídos.
2.1. A Presença Guarani Pré-colonial nos Municípios de Guaíba e Eldorado do Sul Nos municípios de Guaíba e Eldorado do Sul estão registrados três sítios arqueológicos da Tradição Guarani, associados ao Delta do Jacuí. O sítio RS-199 (sinonímia RS-152: Ponte do Guaíba) foi pesquisado em 1972 por Guilherme Naue, tendo sido realizada coletas de superfície que geraram uma grande coleção lito-cerâmica. Embora não possua coordenadas geográficas registradas, a consulta ao acervo documental do CEPA/PUCRS indicou localizar-se a 150 metros à direita da BR 116, frente à antena da rádio Itaí, próximo da Ponte do Jacuí, município de Eldorado do Sul. O sítio estava associado a um terreno arenoso, perturbado pelas máquinas que retiraram areia do local, e abrangia uma área de 5.000 m2, sendo superficial e coberto por vegetação rasteira. A consulta à documentação de acervo permitiu concluir que as coleções dos sítios RS-199 e 94
RS-152: Ponte do Guaíba constituíam um mesmo conjunto, justificando a sinonímia aqui adotada. O sítio RS-56: Arroio do Conde também está registrado no acervo do CEPA/PUCRS a partir de pesquisas de Sergio Leite em 1975, porém seu acervo não foi localizado na Instituição. O acervo documental relativo a este sítio indica que este se localiza em parte na área do Instituto de Pesquisas Veterinárias Desidério Finamor, em Eldorado do Sul (pertencente à Guaíba até 1988) e em parte em uma propriedade particular, no município de Guaíba, sendo cortado pelo arroio que lhe deu nome. A intervenção realizou-se através de coletas de superfície e sondagens, tendo sido encontrado, além de conjuntos lito-cerâmicos, uma urna funerária associada a cinco dentes humanos de um indivíduo com idade entre 11 e 12 anos, sendo este sítio objeto da dissertação de mestrado de Francisco Noelli (1993). Em 1998 Cláudio Baptista Carle foi responsável pelo registro do sítio RS-SR-342: Santa Rita (sinonímia Complexo Automotivo da Ford) por ocasião do projeto de Licenciamento de Instalação do Distrito Automotivo do Município de Guaíba para a Empresa Ford do Brasil, contando com o apoio institucional do CEPA/PUCRS. O sítio localiza-se em um topo de colina, próximo ao Lago Guaíba, às margens da Estrada do Conde (Mato Alto), em meio a uma mata de eucaliptos, tendo sido escavado sob a coordenação de Klaus Hilbert, entre novembro de 1998 e janeiro de 1999, abrangendo uma área de 76 m2. O acervo é composto por 4.551 peças, entre fragmentos cerâmicos, artefatos líticos e vestígios arqueofaunísticos, tendo sido realizadas duas datações com os valores de 540+60 AP e 440+60 anos AP (CARLE e SANTOS, 2000).
2.2. A Presença Guarani Pré-colonial no Município de Porto Alegre No município de Porto Alegre pesquisas arqueológicas desenvolvidas entre 1970 e 2010 permitiram a localização de onze sítios da Tradição Guarani, associados principalmente aos pontais e uma ilha da zona sul da cidade, entre os bairros Belém Novo e Lami. Em 1970, Pedro Mentz Ribeiro registrou junto ao MARSUL o sítio RS-LC-71: Ilha Chico Manuel, situado em propriedade do Clube Veleiros do Sul, na encosta nordeste da ilha, junto ao trapiche e zona de casas, avançando para um pomar. Em 1991, o sítio foi novamente pesquisado por Sergio Baptista da Silva, no âmbito do projeto Programa de Pesquisas ArqueológiARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
95
cas em Itapuã (RS), tendo sido registrado como RS-C-01 (sinonímia). Foram realizadas na ocasião duas sondagens e novas coletas de superfície, encontrando-se esta coleção junto ao acervo da MARS. Em janeiro de 2000 o sítio foi objeto de uma escavação de 23m2, coordenada por Patrícia Gaulier, no âmbito do projeto Levantamento de Sítios Arqueológicos de Ocupação Indígena no Município de Porto Alegre, tendo sido obtida uma datação de 610 + 50 anos AP. A coleção decorrente encontra-se sob a guarda do MJJF e é formada por mais de 4.500 fragmentos cerâmicos, além de grande quantidade de vestígios líticos e arqueofaunísticos, analisados por Gaulier (2001-2002) e Rosa (s/d). Em 1971 Guilherme Naue registrou o sítio RS-87: Romeu (sinonímia Ponta do Chico), Bairro Belém Novo, situado na localidade de Ponta do Chico a 10 m do Guaíba, em área alagadiça, ocupada por uma lavoura. Foram realizadas coletas de superfície em uma área de 100 m2, gerando uma grande coleção lito-cerâmica que se encontra sob a guarda do CEPA/PUCRS. Em 1972, Sergio Leite localizou no Bairro Restinga, o sítio G1: Vila Restinga, tendo realizado coletas de superfície de cerâmica da Tradição Guarani, estando o acervo sob guarda da FAPA. Novas vistorias na área foram realizadas em 2010, sob coordenação de Alberto Tavares Duarte de Oliveira, por ocasião de acompanhamento arqueológico das obras de instalação de uma adutora do Departamento Municipal de Águas e Esgotos (DMAE). O sítio G1: Vila da Restinga não foi relocalizado, porém, no bairro Lomba do Pinheiro foi encontrada uma lâmina de machado polida junto ao terreno do Instituto Popular de Arte-Educação, indicando o potencial arqueológico da área. Por sua vez, uma ocorrência de fragmentos de cerâmica Guarani foi identificada em associação as escavações do sítio RS.JA-74: Lomba do Pinheiro 2, que trata-se de uma casa do século XIX, cuja ocupação foi datada entre 1830-1860 (OLIVEIRA, 2011). O projeto Levantamento de Sítios Arqueológicos de Ocupação Indígena no Município de Porto Alegre, coordenado por Fernanda Tocchetto, foi responsável pela localização de quatro sítios Guarani na zona sul de Porto Alegre, cujos acervos encontram-se nas dependências do MJJF. Em 1993, foram registrados no bairro Lami os sítios RS-JA-01: Reserva Biológica do Lami e RS-JA-02: Lami Bernardes, tendo sido realizadas coletas de superfície e sondagens. No primeiro, situado junto à trilha principal da Reserva Biológica do Lami, o material cerâmico distribuía-se em superfície por uma área de 360 m2, constituindo-se em um sítio sobre dunas, parcialmente destruído pela da extração de areia e cultivos, sendo baixa a densidade de material arqueológico. O segundo sítio também se localiza sobre uma duna, disperso em uma área de mais de 10.000 m2, apresentando melhores condições de preservação estratigráfica, com material em subsuperfí96
cie até a profundidade de 40 cm, associado a manchas de solo orgânico. Além de cerâmica, predomina no conjunto arqueológico grande quantidade de artefatos líticos lascados, levando os pesquisadores a sugerir a hipótese de uma possível ocupação caçadora coletora anterior à presença Guarani (Tradição Umbu). Em 1998, no bairro Belém Novo, foi registrado o sítio RS-JA-16: Ponta do Arado, tendo sido realizadas coletas superficiais e sondagens em áreas de roça, rodeadas por vegetação florestal. Embora o material em superfície seja pouco visível e escasso devido à cobertura vegetal, as sondagens realizadas em uma área de 2.000 m2 permitiram a identificação de cerâmica da Tradição Guarani em subsuperfície, distribuída em duas concentrações, associadas a uma camada húmica com profundidade de 15 cm (GAULIER, 2001-2002). Ainda em 2009 foi realizado o registro junto ao MJJF do sítio RS-JA-07: Lajeado, situado no bairro Lajeado, na localidade de Morro das Quirinas (sinonímias Morro São Pedro e Morro das Quirinas). O sítio encontra-se em um topo de morro, a 169 m de altitude, estando perturbado pela extração de terra preta para comercialização como adubo, já que se encontra associado a vertentes e a zonas de alagamento permanente (turfeiras). A identificação inicial deste sítio deu-se através de doação pelo proprietário ao MJJF de uma grande quantidade de fragmentos cerâmicos da Tradição Guarani coletados de forma assistemática e de uma ponta de projétil lítica. A vistoria arqueológica indicou a presença de fragmentos cerâmicos dispersos em superfície e em baixa densidade por uma ampla área perturbada pela extração de terra. Em 2001, ocorrências esparsas de ocupação Guarani pré-colonial também foram registradas na zona Central de Porto Alegre, através do monitoramento arqueológico das obras de instalação de dutos de telecomunicação ao longo da Rua dos Andradas. Esta obra foi registrada junto ao MJJF como um único sítio, RS-JA-23: Praça da Alfândega, tendo sido identificados fragmentos cerâmicos abaixo do aterro histórico da Rua dos Andradas, em frente à Praça da Alfândega (POUGET e THIESEN, 2002). Salvamentos arqueológicos posteriores na Praça da Alfândega no ano de 2006, registraram novas ocorrências de natureza semelhante. Igual situação refere-se à identificação em 2004 de fragmentos de cerâmica Guarani associado a escavação de duto de canalização na área central de Porto Alegre, obra registrada junto ao MJJF como sítio RS-JA-24: DMAE. Por fim, em 2008, José Otávio Catafesto de Souza identificou a ocorrência de cerâmica da Tradição Guarani na localidade de Morro do Osso, Bairro Sétimo Céu, registrando este sítio como Morro do Osso junto ao LAE/UFRGS.
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Presença Guarani Pré-colonial no Município de Viamão No município de Viamão foram registrados entre 1970 e 2009 18 sítios arqueológicos associados à Tradição Guarani, cujos núcleos principais estão associados ao Pontal do Morro do Coco, ao norte, e ao conjunto de enseadas e ilhas atualmente pertencentes à área do Parque Estadual de Itapuã, ao sul. Em 1971 Guilherme Naue registrou junto ao CEPA/PUCRS o sítio RS-88, situado em terreno cultivado próximo ao Novo Lar dos Menores. O sítio foi localizado pelos proprietários durante preparação do terreno para plantio, quando foi encontrada uma vasilha cerâmica. O conjunto artefatual apresenta grande quantidade de evidências lito-cerâmicas coletadas sobre uma superfície de 1.200 m2, em associação com material histórico, indicando perturbações estratigráficas. Em 1972 Naue registrou na porção oeste do Morro do Coco o sítio PA 300: Rogério Christo, tendo sido realizada na ocasião coletas superficiais que geraram uma coleção numerosa de vestígios lito-cerâmicos, atualmente sob guarda do CEPA/PUCRS. A documentação de campo original indicava uma área de dispersão de material de 130 m2, a uma distância de 20 m da linha da praia. Em 2008 por ocasião das atividades de campo do GT foram realizadas vistorias neste sítio, tendo sido identificado afloramento de cerâmica na linha de praia, porém em pequena quantidade, sendo suas coordenadas geográficas registradas. A realização de novas vistorias ao longo nas praias da porção leste do Morro do Coco, por sua vez, permitiram a identificação de um sítio da Tradição Guarani, RS-LC-18: Morro do Coco, que recebeu este número de registro de acordo com a numeração de catálogo do Programa de Pesquisas Arqueológicas em Itapuã (RS), coordenado por Sergio Baptista da Silva, entre 1989 e 1995. O sítio apresentava-se alterado, tendo sido identificado através de afloramentos esparsos de fragmentos de cerâmica ao longo de 30 m da linha de praia, em função da ação erosiva das cheias do Guaíba. Em 1976, foi ainda registrado por Naue junto ao CEPA/PUCRS o sítio Guarani RS-272: Nei Bueno, contudo sua documentação de campo e coleção não foram localizados no acervo da Instituição61. 61 Em 1973 Naue realizou pesquisas no Seminário de Viamão e na Chácara Nossa Senhora das Graças. No primeiro local foi identificado o sítio RS-132: Seminário, onde foi coletada em uma superfície de 400 m2 uma grande quantidade de artefatos líticos. Na segunda localidade, foram registrados dois sítios líticos de natureza semelhante ao caso anterior: RS-181: Chácara Nossa Senhora das Graças I e RS-182: Chácara Nossa Senhora das Graças II. Ambos locais distam poucos metros e neles foram realizadas coletas superficiais, tendo os sítios sido destruídos pela construção de uma Escola Municipal. A organização do acervo do CEPA/PUCRS aponta que ambas as ocorrências tratam-se de um único sítio, com duas áreas de concentração. 98
No âmbito do Programa de Pesquisas Arqueológicas em Itapuã (RS), coordenado por Sergio Baptista da Silva, foram identificados em 1989 outros dois sítios arqueológicos da Tradição Guarani em Viamão, registrados como RS-LC-01: Aldeia do Cantagalo (sinonímias G4 e Tekoá Jataity) e RS-LC-02: Colônia de Itapuã. O primeiro está localizado na localidade do Espigão, na Terra Indígena Tekoá Jataity, tendo sido registrado junto ao MARS por Sergio Baptista da Silva e Sérgio Leite no mesmo ano, justificando a sinonímia. O sítio encontra-se perturbado em função do plantio de roças de subsistência, a uma altitude aproximada de 80 m, sendo composto por sedimentos arenosos. Foram realizadas coletas assistemáticas de cerâmica da Tradição Guarani em duas distintas áreas, sendo uma destas o campo de futebol, formando um acervo de 22 fragmentos sob guarda do MARS. O segundo sítio situa-se na Vila de Itapuã, distribuindo-se o material em quatro distintos núcleos associados a áreas agrícolas com as seguintes dimensões: 70 x 40, 80 x 60, 70 x 70 e 60 x 100 m. Foram realizadas coletas superficiais e sondagens que produziram uma coleção de 33 fragmentos cerâmicos da Tradição Guarani e 53 vestígios de lascamento, sob guarda do MARS62. Ainda em 2009, a presença de um sítio arqueológico da Tradição Guarani no município de Viamão foi registrada junto ao LAE/UFRGS por José Otávio Catafesto de Souza na localidade de Águas Claras. Trata-se de uma urna funerária Guarani, associada a ossos humanos, descoberta ocasionalmente quando da construção de uma cerca, tendo sido o material arqueológico resgatado e o sítio registrado como Pomar da Lagoa I. O restante das informações sobre a ocupação Guarani pré-colonial no município de Viamão estão associadas à área atualmente compreendida pelo Parque Estadual de Itapuã, onde foram registrados 11 sítios arqueológicos da Tradição Guarani. As primeiras pesquisas arqueológicas nesta área foram realizadas em 1970 por Pedro Augusto Mentz Ribeiro, responsável pela localização de três sítios arqueológicos da Tradição Guarani, cujos acervos encontram-se no MARSUL. No extremo nordeste da Ilha do Junco foi registrado o sítio lito-cerâEmbora não haja registro de cerâmica da Tradição Guarani em associação a este contexto, uma avaliação preliminar da coleção sugere tratar-se de um sítio de extração de matérias-primas para a confecção de artefatos lascados e polidos que pode estar relacionado ao sistema de assentamento Guarani pré-colonial. No entanto, a ausência de estudos detalhados condicionou a não inclusão destes sítios líticos na relação aqui analisada. 62 No âmbito deste mesmo projeto, entre 1992 e 1994 foram registradas junto ao MARS outras seis ocorrências de presença de sítios da Tradição Guarani na Vila de Itapuã com as seguintes siglas: RS-LC-05: Vila de Itapuã I, RS-LC-09: Vila de Itapuã II, RS-LC-10: Vila de Itapuã III, RS-LC-12: Vila de Itapuã IV, RS-LC-13: Vila de Itapuã V e RS-LC14: Vila de Itapuã VI. Os acervos e documentação referentes as pesquisas de campo não foram localizados na Instituição depositária, justificando a não inclusão destes sítios no levantamento aqui apresentado. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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mico RS-LC-70: Ilha do Junco. Situado junto a linha d’água, o sítio distribuía-se por uma área de 150 m2, sobre solo arenoso, tendo sido parcialmente destruído pelas cheias. Foram realizadas coletas de superfície e uma sondagem que evidenciou material lito-cerâmico Guarani até a profundidade de 50 cm, em associação com sedimentos húmicos. Em vistoria realizada pelo GT foram visitados os prováveis pontos das intervenções anteriores, não tendo sido identificado material arqueológico em superfície. Optou-se por estabelecer uma coordenada aproximada para este sítio em função das descrições oferecidas pela documentação de campo original. Ribeiro também registrou junto ao MARSUL o sítio RS-LC-74: Praia da Pedreira, porém as informações originais são escassas, indicando apenas que foram realizadas coletas de superfície de cerâmica Guarani por uma área de 1.600 m2, junto à praia. Em 1990, vistorias realizadas por Sergio Baptista da Silva no local identificaram a presença de dois fragmentos cerâmicos em uma antiga área de cultivos entre a Praia da Pedreira e o Morro da Fortaleza, sendo esta ocorrência registrada como RS-LC-03: Sítio da Pedreira-Morro da Fortaleza. Em função da sobreposição das pesquisas, justifica-se a sinonímia aqui adotada, sendo a coordenada do sítio estimada pelos registros de campo de Baptista da Silva. Em 1994 em nova vistoria realizada por Andréa Zortea não foram identificadas nenhuma evidência em superfície. Naquela ocasião, as casas e prédios comerciais da Vila dos Pescadores dificultavam a visibilidade do solo, o mesmo se aplicando a Praia das Pombas e a Praia do Araçá (ZORTEA, 1995). Por ocasião dos trabalhos de campo do GT em 2009 o local foi novamente vistoriado e pode-se constatar que toda a área anteriormente ocupada pela Vila de Pescadores foi terraplanada em 1998 para a construção de vias de acesso e estacionamentos para o público que usufrui desta praia, destruindo as evidências arqueológicas deste sítio. O sítio RS-LC-75: Lagoa Negra também foi registrado por Pedro Augusto Mentz Ribeiro, estando situado a 30 m ao norte da Lagoa Negra, em associação a sedimentos arenosos cobertos por gramíneas. O sítio foi descrito a partir da presença de pequenos focos de material lítico aflorando em superfície, dispersos por uma área de 50 m de diâmetro, tendo sido coletado material lítico lascado, batedores, pedras com depressão semi-esférica e apenas um fragmento de cerâmica da Tradição Guarani, sob guarda do MARSUL. Em 1990 o sítio foi novamente pesquisado por Sergio Baptista da Silva, tendo sido realizadas coletas superficiais de material da mesma natureza, recebendo neste momento a designação de RS-LC-04: Lagoa Negra I. Em dezembro de 1991 e janeiro de 1992, foram realizadas intervenções a 400 m a leste do sítio anterior, perfazendo uma área de escavação de 10 m2 que atingiram a profundidade de 1 metro,
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recebendo este local a designação de RS-LC-06: Lagoa Negra II. O conjunto artefatual resgatado em ambas as intervenções é predominantemente lítico, encontrando-se sob a guarda do MARS. Tendo em vista as descrições de ocorrências discretas que compõe a ocupação pré-colonial da área, optou-se por manter o registro original, considerando os posteriores enquanto sinonímias, já que o sítio parece indicar um local de acampamento temporário, associado ao sistema de assentamento Guarani e/ou caçador coletor anterior (Tradição Umbu), tendo sido formado por várias ocupações discretas ao longo do tempo. Novas vistorias neste sítio realizadas em 2009 no âmbito do GT indicam que a área atualmente é coberta por pastagens para o gado, cujo pisoteio contribui para comprometer sua integridade. Também está sendo afetado por processos erosivos intensos, em função cheias da Lagoa Negra, apresentando afloramento de materiais líticos em superfície. Em 1980 Guilherme Naue registrou o sítio RS-323: Ilha das Pombas (sinonímia PA253), realizando coletas superficiais e sondagens em uma área de 600 m2. O sítio apresentava características superficiais, tendo sido resgatada uma significativa coleção lito-cerâmica sob guarda do CEPA/PUCRS. Suas coordenadas geográficas não foram registradas naquele momento, sugerindo-se aqui uma coordenada aproximada a partir das descrições da documentação de campo. Por sua vez, o sítio RS-LC-39: Morro da Fortaleza foi registrado em 1981 por Eurico T. Miller junto ao MARSUL, tendo sido identificado em uma área lavrada nos patamares planos da encosta oeste do Morro da Fortaleza, voltado para a Praia da Onça. Neste sítio foi realizada uma escavação de 20,25 m2, revelando uma rica coleção lito-cerâmica da Tradição Guarani, destacando-se ainda a presença de duas pontas de projétil. A coleção encontra-se atualmente sob a guarda do MARS e foi analisada por Zortea (1995). Por ocasião das atividades de campo do GT a vertente leste do Morro da Fortaleza foi vistoriada em 2009, porém não foram localizados vestígios arqueológicos pré-coloniais, não sendo possível o acesso pela vertente oeste através da Praia da Onça, pois a área não recebe manutenção há alguns anos e a circulação não é permitida pela administração do Parque. Entre 1989 e 1994, no âmbito do Programa de Pesquisas Arqueológicas em Itapuã (RS), coordenado por Sergio Baptista da Silva, foram localizados outros seis sítios arqueológicos da Tradição Guarani no Parque de Itapuã, tendo este trabalho sido objeto da dissertação de mestrado de Andrea Zortea (1995). Em 1990, foi registrado o sítio cerâmico RS-LC-08: Praia das Pombas que distava em torno de 15 m da linha d’água, aflorando cerâmica Guarani em superfície em decorrência da ação erosiva das águas de vertente. O principal fator de perturba-
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ção deste sítio naquele momento estava relacionado à presença de construções de alvenaria da Vila de Pescadores (ZORTEA, 1995). Vistoria realizada na Praia das Pombas durante os trabalhos de campo do GT em 2009 indicou que este sítio também teria sido destruído pela construção de benfeitorias no Parque em 1998, a semelhança do ocorrido com o sítio RS-LC-74: Praia da Pedreira. Em 1991, foi registrado o sítio RS-LC-07: Praia do Araçá, sendo identificada cerâmica da Tradição Guarani aflorando em função da ação erosiva de vertentes que deságuam na praia, descendo em torrentes e abrindo profundas aberturas no solo da encosta. Novas vistorias nesta área realizada em 1994 identificaram afloramentos de material cerâmico em baixa densidade na porção sul da Praia do Araçá, porém em nenhuma das ocasiões foram realizadas coletas superficiais (ZORTEA, 1995). Em vistoria realizada no âmbito do GT em 2009 não foram identificados materiais arqueológicos em superfície, porém destaca-se que as condições da Praia do Araçá naquele momento possuiam baixa visibilidade de solo em função da cobertura vegetal intensa e do acúmulo de dejetos trazidos pelas cheias do Guaíba, já que esta não sofre manutenção por parte da administração do Parque há alguns anos. As coordenadas registradas para este sítio são aproximadas, tendo em vista as informações presentes na documentação de campo dos trabalhos anteriores, destacando-se que as coleções referentes a este sítio não foram identificadas no acervo do MARS. Em 1993, foi localizado um sítio lito-cerâmico da Tradição Guarani no cordão arenoso da Praia da Onça, registrado junto ao MARS como RS-LC-11: Praia da Onça. A densidade de material era baixa, tendo sido coletados 20 fragmentos cerâmicos e 60 resíduos de lascamento. A consulta ao acervo do MARS permitiu a identificação somente do conjunto lítico, porém a cerâmica encontra-se descrita por Zortea (1995). Vistoria realizada em 2009 por ocasião dos trabalhos de campo do GT não permitiu a identificação de materiais aflorando em superfície. No entanto, as cheias do Guaíba por ocasião da inspeção haviam depositado grande quantidade de dejetos nas areias, bem como a cobertura vegetal tinha avançado significativamente em direção a linha de praia, em função da ausência de manutenção da praia pela administração do Parque. A coordenada aproximada aqui adotada baseia-se nas descrições do sítio oferecidas por Zortea (1995). Em 1994, foram ainda registrados os sítios RS-LC-15: Praia do Sítio, RS-LC-16: Prainha e RS-LC-17: Morro do Farol, cujos acervos estão sob a guarda do LAE/UFRGS. A documentação referente ao sítio RS-LC-15: Praia do Sítio é escassa, indicando apenas a realização de coletas de superfície, compondo uma coleção de 27 fragmentos cerâmicos. Em vistoria realizada em 2009 por oca-
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sião do GT foram identificados ao longo da linha da praia dois fragmentos de cerâmica da Tradição Guarani, que estavam deteriorados em função da ação das águas, sendo as coordenadas do sítio registradas a partir deste achado. No sítio RS-LC-16: Prainha a densidade de material arqueológico em superfície era menor tendo sido coletados sete fragmentos cerâmicos da Tradição Guarani que não foram identificados no acervo do LAE/UFRGS. Este material encontrava-se disperso na linha da areia, associados a um curso de água intermitente, e a um pequeno terraço, com 10 m de altitude, distante 45 m da linha da praia (ZORTEA, 1995, p. 71-72 e 104). Em vistoria no local realizada em 2008 no âmbito do GT foi identificada uma concentração de fragmentos de cerâmica da Tradição Guarani na beira da praia de onde foram tomadas as coordenadas aqui adotadas. Por fim, o sítio RS-LC-17: Praia do Farol corresponde a um sítio lito-cerâmico superficial, perturbado pela ação agrícola, estando cortado pela trilha que conduz ao Farol de Itapuã, do qual dista aproximadamente 300 m. As dimensões do sítio são de 14,4 x 17,7 m, estando situado sobre um patamar plano, na encosta do último promontório que separa o Guaíba da Lagoa dos Patos. O material arqueológico distribui-se em dois núcleos que receberam numeração de catálogo distinta. O acervo referente a este sítio é composto por 96 fragmentos cerâmicos, constantes do acervo do LAE/UFRGS (ZORTEA, 1995).
A Presença Guarani Pré-colonial no Município de Barra do Ribeiro: No município de Barra do Ribeiro estão registrados cinco sítios da Tradição Guarani, todos situados em áreas de preservação ecológica pertencentes a uma Empresa de Celulose, entre o Pontal da Faxina e o Pontal do Morro da Formiga. No Pontal da Faxinal, situa-se o sítio RS-324: Tarumã (sinonímia Riocel e Tekoá Karaguata’ity), pesquisado originalmente por Guilherme Naue em 1980. O acervo documental do CEPA/PUCRS indicava que o sítio localizava-se então em propriedade da Indústria Riocell, estando à beira do Guaíba, na praia de Tarumã. Apresentava grandes concentrações de material lito-cerâmico, distribuído por uma área de 42.500 m2, sendo coberto por vegetação rasteira e assentado sobre solo arenoso, em região de reflorestamento de eucaliptos, tendo sido realizadas coletas de superfície. O sítio foi novamente localizado em vistoria realizada no âmbito do GT em 2009 e suas coordenadas geográficas foram registradas,
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tendo sido identificada uma dispersão de cerâmica a partir linha da praia em direção à mata, cobrindo uma distância de mais de 150 m. Os Mbyá que acompanhavam a vistoria sugeriram que o nome deste sítio arqueológico fosse Tekoá Karaguata’ity (= aldeia da plantação de caraguatá pequeno), no entanto como este já estava registrado, foi considerada aqui a sigla original. Por ocasião dos trabalhos de campo do GT foram realizadas vistorias em 2009 no Pontal da Faxina e no Pontal da Formiga, tendo sido registrados três novos sítios da Tradição Guarani, de acordo com a numeração do catálogo do Programa de Pesquisas Arqueológicas em Itapuã (RS), coordenado por Sergio Baptista da Silva, entre 1989 e 1995. Os sítios receberam os seguintes nomes por sugestão dos Mbyá que acompanharam as vistorias: Tekoá Porã (= aldeia bonita/sagrada), Tekoá Mareÿ (= terra sagrada/pura/perfeita) e Tekoá Yma (= aldeia antiga) No Pontal da Faxina, aproximadamente 2 km a leste do sítio RS-324: em Tarumã situa-se o sítio RS-LC-22: Tekoá Porã. Está associado a uma duna, situada a poucos metros do Guaíba, com uma altitude máxima de 12 m. O material lito-cerâmico da Tradição Guarani é abundante, distribuindo-se em duas concentrações distantes aproximadamente 100 m, associadas à duna e a linha de praia. O sítio RS-LC-21: Tekoá Mareÿ localiza-se 1 km ao sul do anterior, em frente à Ilhota, apresentando também um bom estado de preservação, sendo possível observar manchas pretas de solo orgânico, gerados por ação antrópica. Ao todo foram identificados neste sítio cinco concentrações distintas de cerâmica e um polidor em canaleta, distribuídas por uma área de 160 m. Já o sítio RS-LC-20: Tekoá Yma localiza-se ao norte da baia que delimita o início do Pontal da Formiga, distando 4 km ao sul do conjunto de sítios anterior. Situa-se em áreas de dunas que distam 300 m do Guaíba. Apresenta baixa densidade de material cerâmico aflorando disperso sobre as dunas, associado a sedimentos arenosos e a vegetação de restinga. Ainda no Pontal da Formiga, o sítio Arroinho I foi registrado por Gislene Monticelli em 2007 por ocasião de trabalhos de levantamento arqueológicos contratados pela Aracruz Celulose, no âmbito do projeto Caracterização Arqueológica em Áreas de Interesse da Aracruz Celulose S/A no Estado do Rio Grande do Sul: Diagnóstico para Estudos de Impacto Ambiental, com apoio institucional do CEPA/PUCRS. O sítio está situado na vertente oeste do Morro da Formiga, entre as localidades de Mato Preto e o Arroinho63, tendo sido identificados fragmentos de cerâmica da Tradição Guarani e 63 Durante as atividades de campo do GT nesta mesma localidade também foi registrado em 2009 um sítio lítico, RS-LC-23: Itaty (= local de muitas pedras/onde as pedras estão nascendo/ tem vida). Este corresponde a uma alta concentração de lascas e núcleos, identificado em uma trilha na mata em função do tombamento acidental de uma árvore de grande porte, aflorando 104
uma lâmina de machado lítico polido em área de dunas, afetada atualmente pela ação de jipeiros que as utilizam para corridas clandestinas.
Refletindo sobre a Territorialidade e a Mobilidade Guarani Pretérita e Presente Analisando a distribuição e densidade dos sítios arqueológicos da Tradição Guarani na região do Guaíba observa-se um padrão de distribuição regular dos assentamentos, privilegiando determinados espaços estrategicamente posicionados no ambiente lagunar. Desde o Delta do Jacuí até a desembocadura na Laguna dos Patos, as aldeias antigas ocuparam preferencialmente os pontais, as ilhas e as baias, buscando locais abrigados da incidência do vento sul e privilegiando também a proximidade das margens do Guaíba, em detrimento das encostas graníticas. Esta orientação com relação ao sistema de ventos sinaliza, em grande parte, a importância dos deslocamentos aquáticos neste território, sugerindo que os sítios situados em ambas as margens do Guaíba, bem como nas ilhas, estavam integrados em uma mesma rede de sociabilidade, tratando-se, portanto, de um território com características socioculturais contínuas, circunscrito a um espaço geográfico disperso em função do ambiente lagunar. Assim como se configuram no presente os assentamentos mbyá, podemos pensar as ocupações guarani pré-coloniais do Guaíba enquanto “ilhas” articuladas por um complexo sistema sócio-cosmológico, compartilhando os recursos do território e conectando-se entre si também através dos “caminhos” das águas, ordenados pelo sistema de ventos e correntes. A hidrodinâmica do sistema lagunar do Guaíba é complexa e diversos fatores interferem no escoamento das águas, em especial a forte influência dos ventos. O Lago Guaíba é ao mesmo tempo, um canal de extensão de seus tributários e um reservatório interligado à Laguna dos Patos. Devido à grande extensão da superfície do Guaíba e as diversas situações de variação do nível de água, a ação de represamento da Laguna dos Patos resulta em um complexo campo de correntes com predominância no sentido natural do escoamento para o sul. Em geral, a velocidade das correntes é baixa, sendo a mínima de 6 cm/s com material em associação às raízes, sendo suas coordenadas UTM 22J 0485748/6634809. A ausência de artefatos diagnósticos, no entanto, limitou a possibilidade de afiliação cultural, não sendo computado conjuntamente entre as ocorrências da Tradição Guarani aqui referidas. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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vento norte e a máxima 15 cm/s com vento sul. As correntes só tornam-se mais intensas nos pontos de estrangulamento de fluxo como a Ilha da Pintada ao norte e a Ilha do Junco ao sul. Por sua vez, os ventos predominantes no Lago Guaíba ao longo do ano têm velocidade média de 2,5 m/s, advindo principalmente dos quadrantes E/SE. No inverno, com o deslocamento de áreas de maior pressão para o norte, há também maior incidência de ventos dos quadrantes N/NW e S/ SW e quando estes últimos atingem velocidades maiores de 7 m/s podem gerar padrões de ondas de até 0,55 m (NICOLODI, 2007; NICOLODI et al., 2010). De acordo com Knippling (2002), esta ação do vento sul seria atualmente um dos principais fatores que podem comprometer a segurança de navegação para barcos de pequeno calado no Guaíba. O aumento da intensidade dos ventos S/ SW nos primeiros dias após a passagem de uma frente fria pode ocasionar uma reversão de sentido de ondas geradas por ventos predominantes do quadrante E/SE. Este fenômeno é denominado “rebojo” e é favorecido pelas baixas profundidades do sistema Lagunar Guaíba-Patos, aumentando o tamanho das ondas e formando cavas quase verticais. As características hidrodinâmicas do Lago Guaíba apontam, por um lado, para uma facilidade de deslocamentos por canoas no período pré-colonial no sentido norte-sul e leste-oeste, tendo em vista o predomínio das correntes no sentido sul e dos sistemas de ventos do quadrante E/SE, ambos de baixa intensidade. Por outro lado, as alterações dos sistemas de vento com a entrada de frentes frias ao longo do ano, principalmente no inverno, podem gerar fluxos de ondas de maior intensidade, dificultando as possibilidades de atracagem, tendo em vista que o sistema de arrebentação se dá na proximidade das praias. Assim, posicionar as aldeias antigas na busca de proteção do vento sul, é um indício da importância dos deslocamentos aquáticos na integração entre as diversas áreas deste território. Exemplos desta seletividade estão representados por vários sítios que ocupam pontais, como é o caso do sítio Arroinho I, em Barra do Ribeiro, situado no melhor ponto de atracagem na vertente oeste da Ponta da Formiga, sendo protegido do vento sul pelo Morro. O mesmo se aplica ao sítio Rogério Christo, em Viamão, que ocupa uma praia protegida do vento sul, no sopé oeste do Morro do Coco e ao sítio da Ponta do Arado, em Porto Alegre, cujo posicionamento situa-se ao norte do pontal. Quando os sítios localizam-se em praias abertas, estas também estão posicionadas em locais de baixa incidência de ventos do quadrante sul pelas características do relevo local. Por exemplo, os sítios do Parque Estadual de Itapuã estão concentrados nas baias abrigadas do vento sul pelos morros graníticos da Fortaleza e do Pontal de Itapuã, sendo o mesmo padrão encontrado nos sítios
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do Parque do Lami, protegidos pelo Pontal do Morro do Coco, e no sítio Tekoá Yma, protegido pelo Pontal do Morro da Formiga. Quanto aos sítios situados nas praias da Ponta da Faxina, sua posição geográfica é oposta a incidências dos ventos do quadrante sul, facilitando inclusive o acesso por água a outras praias em Itapuã, 4 km a leste, e em Belém Novo e Lami, 12km ao norte. Já a ocupação das ilhas Chico Manuel, das Pombas e do Junco representam a materialização desta íntima conexão entre terra e água que norteou o processo de ocupação e exploração do território do Lago Guaíba no período pré-colonial. Deste conjunto de ocupações insulares, as escavações da Ilha Chico Manuel indicaram uma ocupação intensa e de caráter permanente, representando que a isolamento aquático não era um fator de limitação a ser considerado. Outro fator relevante para compreender o padrão de distribuição espacial destes sítios relaciona-se a distribuição dos recursos no território do Guaíba. As características geomorfológicas e fitogeográficas da área apontam para uma diversidade de paisagens de transição: entre morros graníticos e planícies aluviais, entre florestas e campos alagadiços. As características gerais dos solos da área indicam um predomínio de solos arenosos com baixos níveis de nutrientes, tanto nas planícies aluviais e quanto nos morros graníticos, sendo ambos intensamente afetados pela ação erosiva das flutuações pluviométrica. Somente nas encostas íngremes acumula-se um solo mais argiloso e profundo, com maior permeabilidade e maior retenção de água. Segundo Comandulli (2008), apesar das condições do solo tecnicamente parecerem desfavoráveis para agricultura, os Mbyá que viviam na área do Parque Estadual de Itapuã na década de 1970 adaptaram seus cultivos a estas condições, posicionando suas roças nas zonas de transição entre as encostas e as planícies, onde o solo apresenta-se mais favorável. Por outro lado, os trabalhos etnográficos de Freitas (2006) indicam que os Mbyá realizam um etnozoneamento ideal da paisagem dividido em três categorias: Yvy awaté (serras), Yvy á (encostas) e Yvy anguy (planícies). Yvy awaté corresponde “as partes mais altas e íngremes dos morros”, apropriadas à caça e a coleta. É reconhecido pela sua umidade e fertilidade, onde crescem as florestas que não podem ser cultivadas, pois são consideradas sagradas por conterem as nascentes e as cabeceiras dos rios, bem como serem guardiões das florestas. O cultivo e as construções nesta zona não são possíveis pela cosmologia Guarani por estar vinculada à cura, colocando desta forma em risco o equilíbrio e a continuidade do mundo. Em Yvy á, nas encostas dos morros, habitam os animais primordiais e são locais abundantes em remédios e fibras para artesanato. Embora não sejam áreas preferências para a agricultura, muitas vezes os Mbyá consideram as encostas locais propícios para construir aldeias, quando apresentam
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terrenos planos em meia encosta. É em Yvy anguy, as planícies, que os Mbyá encontram os lugares ideais para fazer aldeia e realizar cultivos, em função de suas condições topográficas. No sistema de assentamento guarani pré-colonial da região do Lago Guaíba as aldeias também estão distribuídas, preferencialmente, nas planícies aluviais, privilegiando uma localização próxima às praias. Embora as encostas graníticas apresentem possibilidades de ocupação, até o presente apenas dois sítios com estas características foram localizados no Morro da Fortaleza e no Morro do Farol, em Itapuã. Porém, a baixa produtividade dos solos da várzea alagadiça não parece ter sido um fator limitante para a ocupação guarani do Lago Guaíba, tendo em vista situações similares encontradas em outros locais de ambiente litorâneo e lagunar no norte e no sul do Estado (WAGNER, 2004; MILHEIRA, 2008)64. Também se pode aventar a possibilidade de as áreas de cultivo situarem-se igualmente nas zonas de contado entre planície aluvial e encosta, a semelhança do relatado por Comandulli (2008), estando os espaços domésticos próximos às praias. Além da importância do deslocamento por canoas que interligaria facilmente diferentes áreas do território do Lago Guaíba, esta escolha das praias em detrimentos das encostas para a localização das aldeias também pode ser pensada em função da ampla disponibilidade de recursos aquáticos. Neste caso, pode-se considerar tanto a abundância de peixes em todo o sistema lagunar, quanto a exploração da fauna típica dos banhados característicos das planícies aluviais, incluindo-se também uma maior disponibilidade sazonal de certas espécies de aves e peixes, com destaque para a tainha e a corvina. Do conjunto de sítios até o presente identificados na porção oriental do território do Lago Guaíba, apenas dois apresentam posições mais interiorizadas (Cantagalo e Morro São Pedro). Ambos os casos, porém, podem estar representando estratégias defensivas associadas ao período da Conquista, sendo a presença do colonizador um fator de alteração dos padrões de ocupação tradicional já registrado no litoral norte e do vale do alto rio dos Sinos (WAGNER, 2004; DIAS, 2003). De acordo com os modelos sobre territorialidade e mobilidade guarani pré-colonial defendidos por Noelli (1993), a densidade e profundidade temporal do registro arqueológico do Lago Guaíba pode ser entendida também em função de estratégias de manejo dos recursos da floresta subtropical, que ordenados por complexas redes sócio-políticas, ofereciam sustentação a ocupações de longa duração. Tomando por referência uma extensa revisão da bibliografia dos cronistas do século XVI a XIX, Noelli sugere que os padrões de distribuição 64 Para mais detalhes consultar Wagner e Milheira nos capítulos 2 e 6 deste volume. 108
de sítios de uma dada região devem ser interpretados em função do conceito de tekohá, entendido enquanto território de domínio utilizado de forma comunal e exclusiva pelos grupos familiares. Os tekohá eram formados por parcialidades ou famílias extensas (teii) que viviam isoladas em diversas aldeias ou agrupadas em uma mesma aldeia, em função das condições geográficas e políticas locais. Além do domínio específico da aldeia (amundá), o território do tekohá comportava as áreas de roças (cog) e a vegetação circundante (caa). As roças localizavam-se a diferentes distâncias das aldeias, sendo divididas em lotes familiares, cuja localização e tamanho eram definidos a partir do consenso com os demais ou arbitrado pelo chefe da linhagem (teiiru ou tuvichá), obedecendo a critérios relativos à posição hierárquica na família extensa. Através das fontes etno-históricas Noelli estima os lotes de roça para cada família entre 0,5 e 2 hectares, resultando em uma área cultivada de 30 a 120 hectares para uma aldeia de 60 famílias. Nas roças também eram introduzidas árvores frutíferas e plantas medicinais ou fornecedoras de matérias-primas, resultando na competição diferencial dos nutrientes por m2, o que criava resistência à disseminação de pragas e diminuição dos impactos da erosão. Assim, quando a produtividade dos cultivos diminuía, novas roças eram abertas em outros pontos, passando as antigas a corresponder a locais onde predominavam atividades de coleta, ficando em repouso por um período de no mínimo 20 anos para novamente ser transformados em roça. Na prática, o processo de abandono da roça traduz a conversão de um sistema de cultivo de curto prazo, em um sistema de agricultura agroflorestal de longo prazo, resultando na possibilidade de ocupação permanente do mesmo assentamento sem esgotar a capacidade produtiva dos solos, da flora e da fauna. Desta forma, o padrão de ocupação e colonização territorial guarani seria temporal e espacialmente contíguo, refletindo um modelo de mudança de sede de aldeia dentro de locais anteriormente manejados no tekohá. Uma aldeia poderia dividir-se em função do crescimento populacional ou por dissidência política interna, ocupando a nova aldeia a área mais externa dos locais manejados e a original permanecendo no mesmo sítio. Por sua vez, o tamanho da área de captação de recursos de um tekohá poderia variar em função do grau de reciprocidade do conjunto multi-comunitário, não sendo incomum a sobreposição de áreas de ação de distintos tekohá que mantivessem alianças políticas. A partir dos dados etno-históricos e tomando como referencia as disponibilidades de recursos associadas ao sítio do Arroio do Conde, Noelli estimou em torno de 50 km a área de captação de recursos de um tekohá ao longo do ciclo anual, a partir da sede da aldeia.
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Integrando o modelo territorial de Noelli aos dados aqui analisados, podemos pensar que a área de captação de recursos a qual o autor relaciona o sítio do Arroio do Conde poderia, na realidade, incorporar ambas as margens do Lago Guaíba. Assim, teríamos um território de domínio simbolicamente continuo, porém geograficamente descontínuo em função das águas do Lago. As estratégias de manejo de longa duração deste tekohá por pelos menos dois séculos é atestada pelas datações entre 600 e 400 anos atrás disponíveis até o presente para a área. Por sua vez, os 36 sítios já identificados podem estar representando tanto o deslocamento das sedes de aldeia neste tekohá ao longo do tempo, quanto à distribuição de aldeias contemporâneas estrategicamente situadas em distintos pontos da paisagem lagunar. Embora as cronologias ainda sejam restritas para a região do Guaíba, as datações mais antigas estão relacionadas ao sítio Ilha Chico Manuel situado em sua porção central, sendo compatíveis à cronologia inicial de ocupação do vale do Jacuí e do litoral norte, situadas entre 1.800 e 1.000 anos A.P. (NOELLI, 1999/2000, 2004). Desta forma, levando-se em consideração as lógicas de colonização através do manejo ambiental há indícios de uma ocupação guarani ainda mais antiga do território do Lago Guaíba, possivelmente associada à região do Delta do Jacuí. Embora as datas do sítio Santa Rita sejam mais recentes que as do sítio Ilha Chico Manuel, sua cronologia aponta para pelos menos 100 anos de contínua ocupação da região do Delta. Partindo desta lógica, as ocupações dos sítios Santa Rita e do Arroio do Conde, distantes entre si em torno de 4 km, estariam integradas, representando a circulação da sede de uma aldeia no ambiente manejado, incluindo neste conjunto as evidencias encontradas na outra margem do rio, no local onde é hoje o Centro Histórico de Porto Alegre. Já a distribuição dos sítios na paisagem lagunar segue um padrão similar, compatível com a lógica de colonização de novos espaços previamente manejados. Tendo em vista tratar-se de uma ocupação de longa duração, o processo de colonização da totalidade do território deve ter-se iniciado pelo Delta do Jacuí, e por motivos demográficos e/ou políticos, novos assentamentos dirigiram-se em direção ao sul para áreas previamente manejadas, atingindo a desembocadura com a Laguna dos Patos. Embora os recursos sejam abundantes e perenes em toda a região, podem-se perceber variações sutis de oferta entre determinadas áreas, como solos mais férteis para os cultivos ao norte junto ao Delta do Jacuí, maior concentração de florestas nas encostas voltadas para o sul da porção centro-leste do Lago Guaíba e maior diversidade de pesca e caça sazonal junto aos banhados do sul delimitados pelos Pontais de Itapuã e do Morro da Formiga. Sugere-se, assim, que na eminência da Conquista, o processo de colonização do território do
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Guaíba estaria completo, sendo representado por um padrão disperso de aldeias interligadas por laços de parentesco que ocupariam contemporaneamente pelo menos estes três pontos da paisagem, o que seria evidenciado por uma maior concentração de sítios arqueológicos nestas áreas (ver Figura 01). Estas são hipóteses que demandam ser testadas através da intensificação dos estudos arqueológicos na área, em particular através de uma ampliação das prospecções, de um melhor conhecimento da estrutura e variabilidade dos assentamentos através de escavações sistemáticas, da ampliação das cronologias e de estudos comparativos detalhados da cultura material. No entanto, a compreensão desta territorialidade guarani no passado, tem muito a aprender com o presente. Os dados etnográficos obtidos por estudos quantitativos e qualitativos realizados pelo NIT-UFRGS permitem afirmar que os coletivos mbyá-guarani presentes na região metropolitana de Porto Alegre têm como característica uma constante mobilidade entre as suas diversas aldeias (BAPTISTA DA SILVA et al., 2008). Os Mbyá hoje presentes no município de Porto Alegre não se caracterizam como “unidades comunitárias” constantes e homogêneas, mas são parte de uma ampla rede comunitária guarani (de relações de parentesco e afinidade) que abrange muitos outros grupos populacionais, não só em outros Estados brasileiros, mas também no Paraguai, no Uruguai e na Argentina. Uma parte considerável desta extensa rede desloca-se sazonalmente através de um arquipélago de áreas de tamanhos e caracteristicas fundiárias diversas que não estão limitadas às divisas do Estado do Rio Grande do Sul, nem às fronteiras nacionais brasileiras. Portanto, apesar da existência de famílias extensas cujos membros permanecem, não é incomum que também possua membros em diversos Estados brasileiros ou mesmo em outros territórios nacionais. Este fenômeno se dá por uma série de razões pautadas tanto em questões de ordem social, como em premissas cosmológicas. Atualmente, entre os Guarani os motivos do caminhar são diversos: existem deslocamentos por questões de saúde, em busca de tratamentos, sejam eles xamânicos, (junto aos anciões onde quer que estes estejam) ou médicos (junto aos hospitais), por motivos de relacionamento (casamentos e separações), por saudades de parentes ou ainda para evitar o agravamento de conflitos (na ótica guarani, se afastar dos problemas é a forma preferencial de resolução). Em um sentido cosmológico-religioso, o jeguatá (caminhar) possui grande importância, uma vez que é considerado inerente à condição humana guarani: caminha-se depois de um sonho premonitório ou de uma visão, bem como por conta da busca por um local mais adequado ao “modo de ser”. Diante dessas considerações, é possível compreender porque apenas 25,31% dos Guarani que foram cadastrados pelo estudo acima citado nasceram
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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no município de Porto Alegre, bem como porque somente 77,30% deles são nativos do território brasileiro (BAPTISTA DA SILVA et al., 2008). É possível compreender também o motivo da grande maioria dos Guarani residirem a apenas de 1 a 4 anos nas terras indígenas em que atualmente se encontram. Deste modo, motivos como visitar parentes ou buscar conselhos junto a um karaí (xamã) em específico, assim como seguir a orientação de sonhos ou buscar alegria e felicidade, impulsionam mudanças e deslocamentos constantes. Esta característica é parte de uma sociocosmológica na qual a premissa de fronteiras e divisas entre Estados e Nações parece não ter a mesma significação do que para pessoas com uma cosmovisão eurocêntrica. Trata-se de uma territorialidade espelhada em experiências de ocupações do passado, atualizadas pela memória, sonhos e indicações xamânicas, privilegiando a escolha por lugares contempladores de um ambiente propício para se viver, onde se façam presentes a mata (Ka’aguy porã) e determinados animais, constituindo um horizonte ecológico-cultural de terras. Além disso, a configuração atual das aldeias e acampamentos mbyá no Rio Grande do Sul permite analisar a constituição de seu socius. Gobbi (2008) e Assis (2009) trazem a discussão o termo kuery (designativo de coletivos em língua guarani), também utilizado para nomear o grupo de parentes relacionados e identificados a um deles, geralmente um senior, que os articula através de relações de consanguinidade e afinidade. Os kuery seriam coletivos formados pelos “entre si dos humanos”. Gobbi (2008) realiza uma caracterização dos acampamentos mbyá como constituídos por um kuery em mobilidade pelo território, ao passo que a maioria das aldeias indígenas com situações fundiárias mais estabelecidas (sejam áreas doadas por municipalidades, Estados ou regularizadas pela União), teria na sua constituição dois ou mais kuery, com localização espacial precisa e nucleada. Além disso, há uma forte distinção e diferenciação interna entre estes coletivos. Isto significa que atualmente há uma nucleação e atomização importante dos coletivos mbyá que se deslocam neste amplo território. Certamente, esta atomização não impede a intensa mobilidade acima referida, que se dá, de preferência, dentro destes coletivos, especialmente quando motivados por visitas e consultas a xamãs. Igualmente, se observa que a mobilidade em conjunto, abarcando uma quantidade expressiva de pessoas, num deslocamento definitivo de uma área para outra, dá-se a partir da lógica do kuery. Embora a noção de território e coletividade mbyá seja produto de uma situação histórica dada, as condições geográficas do Lago Guaíba, por ser o “lugar onde o rio se alarga”, podem ter contribuído significativamente para uma tendência similar no passado de descentralização territorial das famílias extensas (kuery). Estas, porém, se manteriam política e simbolicamente unidas no proces112
so de exploração de um mesmo domínio territorial, de um mesmo tekohá, compartilhando através das redes de parentesco e afinidades os recursos materiais e simbólicos mais abundantes em termos locais. Assim como hoje entre os Mbyá, a família extensa (kuery) seria a base da organização social no passado, porém configurada de maneira dispersa entre vários aldeamentos dispostos na amplitude do território, sendo a mobilidade espacial e a circularidade das pessoas através da via terrestre e fluvial a principal estratégia de manutenção dos laços sociais. Assim, os espaços escolhidos para ocupação pré-colonial se manteriam os mesmo em função da abundância de recursos locais, justificando os padrões nucleados de sítios observados junto a determinados compartimentos paisagísticos. Estes eram os lugares de reprodução do Ñandé Rekó que ao longo de séculos foram recorrentemente retomados pelos grupos familiares, num constante movimento de circularidade que buscava recriar o mundo cotidianamente através do caminhar pelas terras e pelas águas do tekohá do Guaíba.
AGRADECIMENTOS Aos organizadores pelo convite para publicação, em particular a Gustavo Wagner pelas sugestões incorporadas no presente trabalho. A equipe do Plano Operacional para a Identificação e Delimitação de Terras Indígenas nas Regiões Sul do Lago Guaíba e Norte da Laguna dos Patos, RS, em particular a Fernanda Neubauer, Mariana Araújo Neumann, Marilise Moscardin dos Passos, Michael J. Schaefer e Roberta Porto Marques que participaram das vistorias arqueológicas. Agradecemos também os Srs. Carlos Abreu de Oliveira e Adilson Oliveira que apoiaram as pesquisas arqueológicas no Parque Estadual de Itapuã e na Ponta da Faxina na categoria de informantes. Nossos agradecimentos também se dirigem aos coordenadores do MJJF, MARS, MARSUL, CEPA/PUCRS, LAE/UFRGS e FAPA, pelo acesso ao acervo documental das pesquisas de campo que originaram os acervos sob sua guarda. Por último, gostaríamos de agradecer aos Mbyá que nos acompanharam nas pesquisas de campo do GT, compartilhando conosco suas Belas Palavras.
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Figura 01- Sítios da Tradição Guarani no Lago Guaíba: 1) RS-JÁ-23: Praça da Alfândega; 2) Arroio do Conde; 3) RS-SR-342: Santa Rita; 4) RS-JÁ-16: Ponta do Arado; 5 ) RS-LC-71: Ilha Chico Manuel; 6) RS-JÁ-02: Lami Bernardes; 7) RS-JÁ-01: Reserva Biológica do Lami; 8) PA-300: Rogério Christo; 9) RS-LC-18: Morro do Coco; 10) RS-JÁ-07: Lajeado; 11) RS-LC-01: Cantagalo; 12) RS-323: Ilha das Pombas; 13) RS-LC-08: Praia das Pombas; 14) RS-LC-11: Praia da Onça; 15) RS-LC-70: Ilha do Junco; 16) RS-LC-39: Morro da Fortaleza; 17) RS-LC-74: Praia da Pedreira; 18) RS-LC-07: Praia do Araçá; 19) RS-LC-15: Praia do Sítio; 20) RS-LC-16: Prainha; 21) RS-LC-17; Morro do Farol; 22) RSLC-75: Lagoa Negra; 23) RS-324: Tarumã; 24) RS-LC-22: Tekoá Porã; 25) RS-LC-21: Tekoá Mareÿ; 26) RS-LC-20: Tekoá Yma; 27) Arroinho I (ilustração: Rafael Rizzi; fonte: NOCOLODI, 2007).
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CAPÍTULO 5 ASSENTAMENTOS LITORÂNEOS DA TRADIÇÃO TUPIGUARANI: UM EXEMPLO DO LITORAL CENTRAL DO RIO GRANDE DO SUL Jairo Henrique Rogge65
O litoral do Estado do Rio Grande do Sul tem sido bastante pesquisado, em termos arqueológicos, desde o início do século XX ou mesmo antes. Nos últimos anos, a pesquisa tem sido ainda mais intensa, tanto em sua parte norte (WAGNER, 2004 e 2009; BECKER, 2007 e 2009; ROGGE e SCHMITZ, 2010 entre outros) como no litoral central (SCHMITZ et al., 2006; PESTANA, 2007) e sul (RIBEIRO e CALIPPO, 2000; SCHMITZ et al., 2006; MILHEIRA, 2008) entre outros. Próximo à região em enfoque, entre os Balneários Pinhal e Quintão, da mesma forma já ocorreram algumas pesquisas arqueológicas anteriores. Vários sítios foram localizados por Miller (1967) e Ribeiro (não public.), na década de 1960, especialmente no entorno das Lagoas da Rondinha e da Cerquinha. Infelizmente, informações mais precisas da localização destes sítios são inexistentes, especialmente em função do longo tempo já decorrido daquelas pesquisas e também da falta de publicações mais detalhadas sobre eles. Por outro lado, pesquisas mais recentes foram realizadas pelo Instituto Anchietano de Pesquisas na região de Dunas Altas e Granja Vargas, no município de Palmares do Sul, ao longo da segunda metade da década de 1990 e primeiros anos do século XXI. A área coberta por essa pesquisa envolveu as coordenadas 30º 15’ e 30º 30’ de latitude sul e 50º 15’ e 50º 30’ de longitude a oeste de Greenwich. A compartimentação geomorfológica, conhecida como Planície Costeira, é formada, na sua maior parte, por sedimentos quaternários de origem praial, retrabalhados por intensa atividade eólica (TOMAZELLI e VILLWOCK, 2000). Existem localmente pelo menos três importantes zonas ecológicas, com características dife65 Arqueólogo do Instituto Anchietano de Pesquisas, professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos - UNISINOS, São Leopoldo, RS. Bolsista de produtividade do CNPq.
renciadas: um campo de dunas móveis atuais, que se estende da orla marítima até cerca de 3 km a 6 km para o interior, onde predomina em certos pontos uma vegetação baixa de gramíneas; mais para o interior encontram-se extensos banhados, restos de antigas lagunas pleistocênicas, onde predominam gramíneas e ciperáceas e uma abundante fauna palustre, especialmente aves e, no passado, cervídeos; separando o campo de dunas das áreas mais baixas de banhados, ocorre um extenso complexo de lagoas paralelas à linha de costa, cujas bordas voltadas para o continente deveriam ser totalmente cercadas por matas de restinga, das quais alguns relictos ainda hoje existem, mais ou menos preservados. Entre as matas de restinga, situadas sobre os terraços lagunares recentes e a beira das lagoas, existem ainda áreas pantanosas, cobertas por ciperáceas. É esta última zona ecológica, formada pelas lagoas, banhados e matas de restinga lindantes, que consideramos de maior importância para o estabelecimento humano pré-colonial, associada com a orla marítima, pois é onde podem ser encontrados a maior parte dos recursos oferecidos pelo ambiente e que foram explorados sistematicamente. Foram localizados, na área, vinte e dois sítios, representando principalmente a ocupação por populações portadoras da tradição ceramista Tupiguarani, em muitos casos associados à presença de cerâmica dos portadores da tradição Taquara e em menor escala, em um período anterior, ocupações pré-cerâmicas (ver Figura 01). As poucas ocupações pré-cerâmicas possuem datas entre os últimos séculos antes de Cristo e os primeiros séculos de nossa era (RS-LC-82 e RS-LC-97, datados, respectivamente, em 1.900 ± 40 anos A.P. (Beta-206105) e 2.170 ± 70 anos A.P. (Beta-200073). Eles estão localizados no lado ocidental do cordão de lagoas paralelas a linha atual de costa, mas que não possuem hoje ligação direta com o mar, distantes dele entre 5 km e 18 km. A maior parte desses sítios estão em área de mata de restinga ou que foram, no passado, áreas de cobertura vegetal mais densa; somente um (RS-LN-96) está em área alagadiça, bem mais para o interior, e que pode estar relacionado com os grupos cerriteiros que ocorrem no litoral mais ao sul. Os recursos explorados pelos ocupantes dos sítios pré-cerâmicos provêm tanto do mar, como das lagoas e banhados e como da mata de restinga e áreas abertas cobertas por campos. De uma maneira geral, estão muito presentes os peixes, os moluscos marinhos e a caça terrestre, mais abundante nas estações quentes do ano, entre novembro e março. Estão praticamente ausentes os animais indicadores da estação fria. O ambiente local específico pode, entretanto, ser considerado responsável por diferentes apropriações dos recursos disponíveis, mesmo em sítios pró116
ximos e com cronologia quase igual, como aconteceu com os sítios RS-LC-82 e 97. O primeiro tem numerosos restos de peixes de água doce e ausência de peixes de água salgada. O segundo tem numerosos restos de corvina, marítima, possivelmente porque a lagoa próxima deveria ter possuído um canal que a ligava ao oceano. No sítio que se localiza no campo alagadiço (RS-LN-96), em área bem mais afastada do mar e das lagoas, há muitos vestígios de veado-campeiro e cervo do pantanal, espécie que deveria ser muito abundante neste ambiente aberto. Os sítios pré-cerâmicos parecem representar sucessivos acampamentos estacionais; a falta de indicadores arqueofaunísticos ligados ao período frio sugere que se tratam de assentamentos realizados no período quente do ano, especialmente o verão. Os artefatos líticos, ósseos e conchíferos são inexpressivos e não atestam ligação com os sambaquis típicos do litoral Meridional do Brasil. Em alguns casos, sobre os estratos pré-cerâmicos ocorreram ocupações de grupos da tradição cerâmica Tupiguarani e, eventualmente, da tradição Taquara, que na maior parte das vezes ocorre em associação direta com aquela. A bem marcada ocupação Tupiguarani sobre o RS-LC-82, assentada sobre uma ocupação pré-cerâmica, foi datada por termoluminiscência em 563 ± 45 anos A.P., mostrando um grande intervalo cronológico entre os dois horizontes ocupacionais. Nos outros sítios em que se observa a mesma sobreposição, pode-se supor distância cronológica semelhante, ou ainda maior, embora não tenhamos dados concretos para afirmar isso. Existem também sítios tupiguarani não sobrepostos a ocupações pré-cerâmicas, mas quase sempre associados a um componente relacionado à portadores da tradição Taquara. RS-LC-80 é o mais característico deles, coberto parcialmente por mata de restinga e por sedimentos eólicos atuais, que encobriram e preservaram a camada de ocupação. Uma área escavada de 64 m2 evidenciou um horizonte de ocupação formado por uma lente contínua de moluscos marinhos, especialmente Mesodesma mactroides, com espessura média de 20 cm (ver Figura 02). Pouco mais de 800 fragmentos cerâmicos foram encontrados neste sítio, sendo que a maior parte deles estava diretamente associada a áreas de fogueiras e a buracos de estacas, que poderiam indicar o interior de uma pequena estrutura de habitação, de formato aproximadamente circular, com não mais que 6m de diâmetro. O vasilhame é, em geral, de tamanho mediano, com contornos infletidos ou compostos, além de duas formas menores, de contorno simples A maior parte possui decoração plástica, como o corrugado, o corrugado ungulado e o ungulado; raras são as vasilhas com decoração pintada (ver Figura 03). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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O material lítico associado é pouco abundante, composto por apenas 38 artefatos distribuídos entre lascas unipolares e bipolares, algumas com ação térmica, além de afiadores em canaleta, polidores e fragmentos naturais, sem indícios de ação humana. A matéria-prima predominante é o basalto, em poucos casos o arenito friável. Seus abundantes restos faunísticos estão predominantemente relacionados com ambientes aquáticos, como o mar e as lagoas próximas. A datação por C14 foi de 280 ± 50 anos A.P. (Beta-202366), uma ocupação consideravelmente tardia66. Em contraste com os demais sítios Tupiguarani da área, este parece representar um assentamento um pouco mais estável, mas mesmo assim de caráter sazonal. O restante dos sítios Tupiguarani da área apresentam muito menos material arqueológico e ocupam espaços também muito menores. A ocupação Tupiguarani, nessa região, parece ter-se realizado sob a forma de acampamentos temporários de pequenos grupos familiares. Como no sítio mencionado, nos outros também costuma haver cerâmica da tradição Taquara associada diretamente. A associação direta, e não a sobreposição, dos elementos tupiguarani com os de tradição taquara parecem indicar uma zona de fronteira onde portadores das duas tradições cerâmicas mantiveram, em um período relativamente recente, algum tipo de contato, possivelmente envolvendo a interação através de fluxo de objetos e pessoas. A ausência de assentamentos de maior porte e mais estáveis, associada às evidências de sazonalidade, pode indicar que estamos tratando de acampamentos voltados para a exploração especialmente dos recursos locais marinhos, associados àqueles das lagoas, banhados e matas de restinga. A origem dos grupos acampados poderiam ser as aldeias que se encontram mais para o interior da planície costeira. A matéria-prima utilizada na produção de artefatos líticos e da cerâmica parece atestar isso. Por outro lado, não podemos descartar a hipótese de que esses assentamentos, de cronologia recente, também possam estar relacionados a um momento crítico e desestruturador daquelas sociedades indígenas, que envolveu a rápida conquista67 do sul do Brasil e, especificamente do litoral, por populações de origem europeia. 66 Ocupações tardias para sítios Tupiguarani são igualmente referidas nos capítulos de Bandeira, Wagner e Milheira neste volume. 67 Para outros aspectos mais pontuais do impacto da Conquista Ibérica nas ocupações Tupiguarani ver capítulos de Wagner, de Dias e Baptista da Silva, e Milheira. 118
Figura 01- Mapa da região de estudo, com a localização dos sítios arqueológicos
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
119
Figura 02- Área escavada no sítio RS-LC-80 (acima) e distribuição espacial de parte do vasilhame cerâmico reconstituído junto às fogueiras e aos buracos de estacas
120
Figura 03- Reconstituição gráfica do vasilhame cerâmico da tradição Tupiguarani na região de Balneário Quintão
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Sigla
Município
RS-LC-80
Palmares do Sul
RS-LC-81
Palmares do Sul
RS-LC-82
Palmares do Sul
Utm 564365 6638544 564231 6638440
564151 6638305
Filiação cultural*
Datações
Tupiguarani e Taquara
280 ± 50 A.P. (Beta 202366)
Tupiguarani e Taquara
-
Sambaqui pré-cerâmico/Taquara/Tupiguarani
1.900 ± 40 A.P. (Beta 206105) para o pré-cerâmico 563 ± 45 (LVD 665) para a ocupação Tupiguarani
RS-LC-83
Palmares do Sul
RS-LC-84
Palmares do Sul
RS-LC-85
Palmares do Sul
RS-LC-86
Palmares do Sul
RS-LC-87
Palmares do Sul
RS-LC-88
Palmares do Sul
RS-LC-89
Palmares do Sul
RS-LC-90
Palmares do Sul
RS-LC-91
Palmares do Sul
RS-LC-92
Palmares do Sul
RS-LC-93
Palmares do Sul
RS-LC-94
Palmares do Sul
122
564273 6638365 564933 6637710 562790 6640402 562553 6640939 562530 6641038 561153 6641668 562181 6642068 562407 6636914 562279 6636884 562204 6636859 561918 6634928 561899 6634811
Sambaqui pré-cerâmico/Taquara
-
Taquara
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani (?)
-
Tupiguarani (?)
-
Tupiguarani e Taquara
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani (?)
-
Tupiguarani
-
Sigla
Município
RS-LC-95
Palmares do Sul
RS-LC-96
Palmares do Sul
RS-LC-97
Palmares do Sul
RS-LC-98
Palmares do Sul
RS-LC-99
Palmares do Sul
RS-LC-100
Palmares do Sul
Utm 561920 6634699 550097 6640104 559115 6625511 563007 6639958 563044 6639991 563018 6640050
Filiação cultural*
Datações
Tupiguarani (?)
-
Cerrito pré-cerâmico/ Taquara/Tupiguarani
1.760 ± 60 (Beta 206106) para o pré-cerâmico
Sambaqui pré-cerâmico/Tupiguarani e Taquara
2.170 ± 70 A.P. (Beta 200073)
Tupiguarani (?)
-
Tupiguarani
-
Tupiguarani (?)
-
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
para o pré-cerâmico
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CAPÍTULO 6 ARQUEOLOGIA E HISTÓRIA GUARANI NO SUL DA LAGUNA DOS PATOS E SERRA DO SUDESTE Rafael Guedes Milheira68
INTRODUÇÃO A história das populações Guarani na Laguna dos Patos, assim como em toda porção sul do Estado do Rio Grande do Sul é pouco conhecida e tangencialmente incorporada à historiografia tradicional. Os relatos sobre as populações indígenas pré-coloniais raramente ultrapassam as primeiras páginas dos livros de história regional, sendo geralmente tema incorporado em capítulos relativos aos “primeiros habitantes da terra”. Tratados como habitantes de uma natureza intocada, os grupos indígenas, idílicos, romantizados e idealizados como elementos naturais, compõem narrativas históricas apenas para justificar a posse da terra pelas populações do velho mundo a partir do século XVI e XVII. Tanto portugueses como espanhóis viram as populações indígenas, ora como aliadas, ora como empecilho às estratégias de dominação territorial. Forçosamente integrados ao modo de vida colonial: Carijós, Tapes, Patos, Charrua e Minuano – índios de diferentes etnias – foram sendo incorporados à vida dos campos, da lida do gado, da vida nas charqueadas, nos aldeamentos missionários, nos fortes e nas ruas dos aglomerados urbanos em formação a partir dos séculos XVII e XVIII. Sofreram perdas territoriais significativas, buscando estratégias de aldeamento e refúgio como maneiras de manter-se existindo através de um histórico de rupturas. 68 Professor do Bacharelado em Antropologia/Arqueologia e do Programa de Pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal de Pelotas. Pesquisador do LEPAARQ/UFPel -
[email protected].
Esse processo histórico de impactantes mudanças sociais e culturais que teve como palco o ambiente pampeano sofreu uma forte ruptura com a chegada das populações Guarani em torno do século XII, quando os mesmos começaram seu processo de expansão territorial em direção à planície costeira da Laguna dos Patos. Iniciou-se, neste momento, um processo de interação com os grupos construtores de cerritos que habitavam tradicionalmente as áreas úmidas e alagadiças às margens da Laguna e seus afluentes, desde, pelo menos, 2.400 anos A.P.. Ainda um segundo momento de intensificação de ocupação destes espaços é conhecido e teve um forte impacto na configuração social do ambiente pampeano e costeiro. Trata-se da chegada dos novos imigrantes europeus no século XIX. Italianos, alemães e franceses na região da Serra dos Tapes incorporaram uma nova visão de mundo que se refletiu no uso sistemático da Mata Atlântica. Com um comportamento exploratório dos ambientes naturais para a preparação de áreas de plantio, tornou-se prática comum o enfrentamento direto desses imigrantes do velho mundo com os refugiados indígenas que habitavam as matas da Serra. Assassinados, aprisionados, aldeados e culturalmente ameaçados ao longo da História, os grupos Guarani e as demais populações indígenas da região resistiram através de diferentes estratégias. Não somente a documentação histórica escrita demonstra essa resistência, mas outros elementos também demonstram essa continuidade. A paisagem e seu repertório toponímico, por exemplo, manifesta a forte presença indígena na região. Laguna dos Patos e Serra dos Tapes, ambos os estratos geográficos pertencentes ao bioma pampa do sul do Brasil, que focamos neste estudo, denotam perfeitamente a importância terminológica incorporada à paisagem Meridional, pois, tanto os termos Patos como Tapes sugerem, e são ponto de discussão, uma origem indígena (IHERING, 2003 [1907]). A própria cidade de Pelotas, cujo nome provém de uma embarcação feita de couro amplamente utilizada pelas populações que habitavam a margem da Laguna dos Patos tem uma grande contribuição ameríndia em sua formação, porém, bastante negligenciada pela historiografia tradicional. Se atualmente a presença ameríndia é limitada, em grande medida, à nomenclatura dos acidentes naturais e em limitadas terras que acolhem pequenas famílias (LIEBGOTT, 2010), no passado, a presença indígena foi massiva e bastante complexa em termos culturais. Dados arqueológicos tem demonstrado que a ocupação indígena no pampa gaúcho ultrapassa um período de dois mil anos. A ocupação Guarani, mais recente, não deve ter ocorrido antes de 900 anos atrás (NAUE et al., 1968; 1971). A documentação histórica registra a presença dos Carijó ainda no século XVI (MONTEIRO, 1992), período de intensificação dos
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processos conflitivos nos quais esses grupos foram envolvidos após a chegada das populações europeias. Seguindo nesta linha, documentos históricos também apontam para uma inserção conturbada na vida urbana pós século XVIII na região (AL-ALAM, 2008). Atualmente, o sul do Estado do Rio Grande do Sul comporta alguns focos de aldeamentos Mbyá-Guarani, como a aldeia da Pacheca, no município de Camaquã e o acampamento do Morro Farroupilha, no município de Pelotas (LIEBGOTT, 2010). Articular fontes arqueológicas, etno-históricas e etnográficas é um desafio. Partir desta articulação e demonstrar que as rupturas históricas da história indígena regional resultaram de um processo contínuo extremamente dinâmico, complexo, multicultural e conflitivo entre o período pré e pós-contato é o objetivo central deste trabalho. Buscaremos apresentar o panorama histórico desde os dados arqueológicos e históricos, que demonstra uma massiva ocupação Guarani na região até a atualidade, em que a presença indígena é bastante limitada e circunscrita espacialmente.
O CONTEXTO MULTICULTURAL DA OCUPAÇÃO INDÍGENA PRÉ-COLONIAL NA LAGUNA DOS PATOS A partir dos dados arqueológicos do litoral gaúcho, mais especificamente, da margem da Laguna dos Patos, desde o período pré-colonial foi traçado um panorama multicultural da laguna que envolve quatro culturas arqueológicas que ocuparam o litoral ao longo dos últimos 6 mil anos. Esses grupos culturais foram agentes do processo histórico-cultural, dominando regiões amplas na costa litorânea e, por vezes, articulando-se entre si através de diferentes formas de contatos culturais. Ao longo da história da Laguna dos Patos vemos que as diferentes populações que ocuparam este ambiente tiveram distintos interesses estratégicos na ocupação do espaço e buscaram assentar-se de diversas formas a fim de contemplar esses interesses. De forma breve, apontaremos aqui os diferentes grupos humanos que habitaram este ambiente lagunar antes da chegada das populações Guarani, com algumas características de implantação na paisagem. 1) Sambaquis: grupos de pescadores-caçadores-coletores, construtores de estruturas feitas com conchas e areia com funções distintas (residências, cemitérios, demarcadores territoriais, mirantes da paisagem), que ocuparam a região de Restinga na Laguna dos Patos, tendo ligação com o mar. Sua ocupação
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na região é conhecida apenas pela localização dos sítios arqueológicos (RIBEIRO e CALLIPO, 2000; RIBEIRO et al., 2004) sem que, no entanto, estudos aprofundados tenham sido realizados e que nos permitam ter uma noção maior de sua temporalidade, geografia e inserção ambiental. Da mesma forma, essa falta de estudos impede que tenhamos conhecimento sistemático sobre a composição desses sítios, sua funcionalidade, processos de formação e cultura material. É provável que estes sambaquis da restinga da Laguna dos Patos tenham relação com os demais sambaquis da costa litorânea do sul do Brasil, atingindo uma profundidade temporal de até 5 ou 6 mil anos A. P., porém, esta cronologia é apenas relativa, não ultrapassando o nível hipotético resultado da ausência de datações absolutas. 2) Povos Jê do Sul: grupos ceramistas conhecidos historicamente como Kaingang, de matriz cultural Macro-Jê. Ocuparam a porção norte da Laguna dos Patos a partir de 1300 A.P até a atualidade. Em termos arqueológicos, esta cultura de grupos falantes de língua Jê foi definida através do estilo tecno-tipológico da cerâmica como tradição Taquara e sítios arqueológicos em superfície. Segundo Noelli (1999-2000), esses grupos foram forçados a abandonar seus territórios, primeiramente pelo contato com as populações Guarani, em torno de 700 A.P. Os Guarani teriam lhes empurrado para longe dos grandes rios e recursos hídricos de grande parte do litoral, confinando-os nas terras altas da floresta de Araucária do sul do Brasil, no planalto Sul-brasileiro. A partir do século XVI, com a chegada dos colonizadores europeus, intensifica-se o processo de conquista das terras dos grupos Jê do Sul, modificando amplamente seu panorama de ocupação territorial (NOELLI, 2004b). 3) Grupos cerriteiros: grupos de pescadores-caçadores-coletores que habitaram a região pampeana e litorânea do sul do Estado do Rio Grande do Sul, o território uruguaio e o Nordeste argentino. Na região da Laguna dos Patos são comumente encontrados em áreas alagadiças (banhados), sendo estas construções monticulares datadas de 2.500 A.P. até 200 A.P. (SCHMITZ, 1976). Os “Cerritos de índios” são entendidos, arqueologicamente, como resultado da ocupação dos grupos Charrua e Minuano e são interpretados como áreas de moradia, cemitérios, demarcadores de fronteiras sociais, monumentos de memória e identidade e marcos paisagísticos. Foram construídos no ambiente pampeano pelos grupos ameríndios, a partir de aproximadamente 5.000 A.P. até, pelo menos, 200 A.P., quando então, dadas às transformações sociais e culturais vinculadas ao processo colonizatório, pararam de ser construídos (SCHMITZ, 1976; MAZZ e BRACCO, 2010).
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4) O quarto grupo cultural conhecido pela literatura arqueológica é composta pelos Guarani. Provenientes da Amazônia habitaram a porção Meridional da Laguna dos Patos a partir de aproximadamente 900 A. P., até a atualidade (NOELLI, 1999-2000, 2004a). Ocuparam a região da laguna através de um processo de expansão territorial conhecido como “enxameamento” (BROCHADO, 1984), que envolve crescimento demográfico e, consequentemente, construção de novas aldeias em busca de novas terras cultiváveis e novos locais de caça, pesca e coleta. Buscaram ocupar a região da Laguna em áreas mais altas com presença de dunas e paleodunas, próximos de áreas com vegetação de Mata Atlântica e mata de restinga. A presença dos grupos Guarani, assim como os construtores de cerritos, foi bastante documentada na região da Laguna dos Patos e o litoral Sul do Brasil como um todo, o que nos permite construir um panorama histórico dessas populações a partir da ótica do conquistador europeu. Esse processo de conquista a partir do século XVI causou um forte impacto às populações ameríndias da costa litorânea, gerando uma grande mudança cultural através de um intenso processo de escravização, assassinatos e violência (ver mapa de distribuição das culturas indígenas pré-coloniais na bacia hidrográfica da Laguna dos Patos em Figura 01).
OS GUARANI E OS CERRITEIROS NA COMPOSIÇÃO DE UM AMBIENTE MULTICULTURAL ✓ OS CERRITOS O ambiente Meridional da Laguna dos Patos, quando da chegada das populações Guarani não era desabitado. Ao longo dos terrenos alagadiços e úmidos localizados nas margens da Laguna e à beira do canal São Gonçalo, até a Lagoa Mirim, habitavam populações de grupos pescadores-caçadores-coletores adaptados a ambientes charcosos. Os vestígios de sua cultura são bastante peculiares e perceptíveis a longas distâncias na paisagem. Trata-se de montículos de terra construídos para várias finalidades. As interpretações sobre os cerritos comumente seguem a linha ecológico-adaptacionista em que os montículos de terra serviriam como plataformas secas para implantação das tolderias - casas feitas com uma estrutura arquitetônica bastante simples, assemelhando-se a um para-vento feito de palhas e esteios. As escavações arqueológicas realizadas nos
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montículos de terra têm demonstrado frequentemente a ocorrência de áreas de atividade relativas a estruturas de combustão e produção de alimentos, assim como, depósitos de alimentos em áreas periféricas aos montículos que podem ser interpretados como áreas de lixeira do espaço da aldeia (MAZZ e BRACCO, 2010; BONOMO, POLITIS e GIANOTTI, 2011). Além disso, é abundante a ocorrência de vestígios arqueobotânicos e zooarqueológicos, desde a base até o topo destes montículos, indicando que esses grupos indígenas mantinham sua economia baseada em práticas de pesca, caça e coleta. Entre os recursos aquáticos mais comuns identificados no registro arqueológico, os peixes como a miraguaia, corvina, bagre, tainha, siri azul, etc. sugerem ter sido extremamente importantes na dieta alimentar (SCHMITZ, 1976; MAZZ e BRACCO, 2010; ULGUIM, 2010). A caça é amplamente representada pelo veado-campeiro, roedores de pequeno e médio porte como os ratos do banhado, preá, etc. Entre os botânicos utilizados pelos cerriteiros poucos são os estudos que permitem ter certeza do que era coletado nas matas e o que era cultivado. Dados de paleobotânica de diferentes contextos da Argentina e Uruguai têm indicado a presença de botânicos como o milho, feijão, amendoim, batata doce, abóbora e sementes de um narcótico chamado chamico (MAZZ e BRACCO, 2010, p. 258), indicando uma horticultura incipiente e de pequena escala (BONOMO, POLITIS e GIANOTTI, 2011). A diversidade alimentar e as fontes de matéria-prima utilizadas como instrumentos e construção das residências indica que os grupos que construíam os cerritos praticavam uma economia de amplo espectro, explorando o ambiente alagadiço e úmido de distintas maneiras (BRACCO, PUERTO e INDA, 2008). Com datações que recuam a aproximadamente 4500-5000 A.P. os primeiros cerritos construídos às margens da Lagoa Mirim, no território uruguaio, sugerem se tratar de grupos com um alto sistema de mobilidade, que construíam os montículos como áreas de ocupação sazonal para permitir ou facilitar a captação dos recursos nos ambientes úmidos (MAZZ e BRACCO, 2010; MAZZ e GIANOTTI 1999). Ao princípio da construção desses montículos, os mesmos não aparentavam uma preocupação na estruturação orgânica do espaço de vivência, sendo as áreas dos montículos representativas de acampamentos simples. Segundo Mazz e Bracco (2010) e Bonomo, Politis e Gianotti (2011), ao longo da história de ocupação e construção desses montículos de terra, os grupos construtores de cerritos foram adaptando-se plenamente às condições dos ambientes charcosos, passando a defender os seus territórios de incursões de populações de outras regiões, bem como, disputando seus territórios de domínio internamente. Em torno de 4 a 5 mil anos, no período formativo americano, as populações huma-
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nas apresentaram uma série de mudanças nos aspectos sociais e econômicos. O aumento da temperatura mundial propiciou uma clara melhora nas condições de vida, expressado em diminuição da mortalidade infantil e um aumento demográfico. A melhora na produtividade permitiu novos complexos econômicos, a ocupação de novos assentamentos e o surgimento de novas formas de organização social e política (os cacicados). A construção de cerritos sugere esse aumento demográfico e ilustra claramente um processo de constante fragmentação da paisagem com estratégia de apropriação da natureza, de controle social e gestão dos recursos. Como indicadores arqueológicos desses processos de mudanças sociais em ampla escala, observa-se que os cerritos passam a ter dimensões proeminentes na paisagem, alcançando 5 e 6 metros de altura. Há casos em que os montículos foram estendidos ou interligados por plataformas de terra, como uma espécie de terraplenagem (MAZZ e GIANOTTI 1999). Trata-se, portanto, da complexificação dos espaços das aldeias, em que os montículos deixaram de ser apenas locais de moradia sazonal, para se tornarem espaços sistematicamente cuidados e manejados ao longo de sua História. Os cerritos adquiriram um status simbólico cada vez mais importante pela sociedade, pois, além de servirem de área de moradia e descarte de lixo, se tornaram locais de sepultamento dos mortos. Há muitos casos, inclusive, de montículos que sugerem terem sido construídos exclusivamente para a deposição ritual dos mortos. No ambiente da Laguna dos Patos há mais de uma centena de cerritos identificados (PERNIGOTTI e ALMEIDA, 1961. NAUE et al., 1968; 1971, SCHMITZ, 1976). Estudos realizados ainda nos anos 1970 indicaram que a ocupação dos cerritos na Laguna dos Patos estaria relacionada à exploração sistemática dos recursos lacustres, como peixes (miraguaia, corvina, bagre) e crustáceos como o siri-azul. Os cerritos seriam áreas de ocupação sazonal que serviam como acampamentos para pesca e exploração do ambiente lacustre nas estações quentes do ano (primavera e verão). A tecnologia cerâmica estudada corroboraria tal interpretação. Cerâmicas com formas simples foram tratadas em seus aspectos funcionais como “cerâmica utilitária” (SCHMITZ, 1976), servindo de suporte para a manipulação dos pescados - a base da dieta alimentar desses indígenas -. A “cerâmica utilitária” seria usada de forma expediente, sem haver, portanto, a necessidade de aprimoramentos tecnológicos e/ou estéticos nas cerâmicas. Os instrumentos líticos também seguiriam a mesma lógica funcionalista, em que, a simplicidade tecnológica corroboraria a interpretação de um padrão de uso expediente, provavelmente implicando na manipulação incipiente de botânicos, dos pescados e da caça e para confecção de outros instrumentos líticos.
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Chama atenção no contexto de ocupação dos cerritos da Laguna dos Patos a presença de cerâmicas com decorações associadas geralmente às vasilhas cerâmicas dos grupos Guarani. Decorações corrugadas, unguladas e até mesmo com pinturas, sugerem que houve algum tipo de contato cultural entre os construtores de cerritos e as populações Guarani que habitaram a serra do Sudeste e margens da Laguna dos Patos. Nesse caso, a porção Meridional da Laguna dos Patos seria uma área de fronteiras culturais entre ambos os grupos indígenas, fronteira esta que se estabeleceu dentro de um contexto de ocupação humana referente a uma História milenar de longa duração (ver quadro cronológico para ocupação pré-colonial da Laguna dos Patos em Figura 02). Cerritos semelhantes aos estudados e publicados por Schmitz (1976) têm sido identificados na região do município de Pelotas e Capão do Leão (veja mapa com a localização dos sítios arqueológicos identificados no município de Pelotas em Figura 03). Até o momento já foram mapeados 24 cerritos, sendo um deles localizado na Ilha da Feitoria, cujas datações primeiramente publicadas por Loureiro (2008), apontam que se trate de um sítio construído em torno de 1000 anos A.P. usado como acampamento para pesca lacustre, mas com indícios de uso como moradia permanente (ver também ULGUIM, 2010; GARCIA, 2010; BELLETTI, 2010). Outros cinco cerritos localizam-se na margem da Lagoa do Fragata, onde foi identificado há aproximadamente 30 anos atrás uma coleção de materiais líticos composta por dois zoólitos, representando um tubarão branco e uma ave columbiforme, além de duas bolas de boleadeira mamilares; materiais esses que são comumente associados à cultura sambaquieira e dos grupos construtores de cerritos, respectivamente (ver estudos sobre estas coleções em RIBEIRO et al., 2002; MILHEIRA, 2005; GONZALEZ e MILHEIRA, 2004). Por fim, no banhado do Valverde, na beira do canal São Gonçalo e da Laguna dos Patos, foi identificado um complexo de 18 cerritos, os quais se encontram ameaçados por empreendimentos imobiliários. Até o momento foi escavado um cerrito desse complexo do Valverde, o qual apontou ser um montículo possivelmente utilizado para várias funções como acampamento sazonal para pesca, moradia permanente e área de descarte, questões estas que serão melhor estudadas futuramente.
✓ OS GUARANI No período que antecede à ocupação europeia na região pampeana, além da ocupação dos grupos construtores de cerritos, são conhecidas também dezenas de localidades que se referem às antigas aldeias e acampamentos dos gru-
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pos Guarani. Na região da Serra dos Tapes, pesquisas arqueológicas vêm sendo realizadas desde os anos 1970, inicialmente pelos pesquisadores do PRONAPA com o mapeamento de sítios arqueológicos e o estudo das coleções cerâmicas dos mesmos, a fim de propor um panorama de caracterização histórico-cultural das ocupações indígenas pré-coloniais. Poucos estudos foram feitos com relação aos sítios arqueológicos atribuídos às ocupações Guarani, construindo-se apenas uma breve caracterização desse processo histórico, fator esse que coloca as pesquisas atuais em um patamar ainda bastante especulativo e hipotético. Ou seja, pouco se conhece sobre a cronologia de ocupação das aldeias e a composição do território, muito pouco foi explorado no sentido de entender a articulação entre as aldeias, os acampamentos, as áreas de captação de recursos e a relação dos Guarani com outras culturas. Devem ser destacados alguns trabalhos que nos trazem dados fundamentais para o entendimento da história de ocupação regional Guarani. A pesquisa de Carle (2002) apresenta dados sobre uma aldeia Guarani localizada no Povo Novo, município de Rio Grande. Esse trabalho objetivou analisar o sítio numa perspectiva sistêmica em que os artefatos e estruturas identificadas foram pensados principalmente do ponto de vista funcional. Informações densas foram geradas a partir dessas pesquisas como a discussão das formas de habitações e espaços funcionais da aldeia. Mais recentemente, Pestana (2007) trouxe à luz alguns dados sobre aldeias pré-coloniais Guarani localizadas na restinga da Laguna dos Patos, RS. Além disso, o autor apresentou também um estudo tecnotipológico da indústria cerâmica dos sítios, propondo também a possibilidade de contatos culturais entre os Guarani e as demais tradições arqueológicas de grupos ceramistas (tradição Taquara e Vieira). No litoral norte da Laguna dos Patos as pesquisas coordenadas pelo Prof. Dr. Pedro Ignácio Schmitz, nos anos 1990, trouxeram discussões sobre a cronologia de ocupação regional, funcionalidade dos sítios arqueológicos Guarani, dieta alimentar, tecnotipologia, relações interculturais e estratégias de ocupação sistêmica do ambiente, assim como foi dada uma grande contribuição para a discussão de padrão de assentamento dos grupos Guarani no litoral (ROGGE, 1997; 1999; 2004; 2006. SCHMITZ, 2006). A descrição de sítios acampamentos temporários Guarani compostos por conchas vem problematizar as formas de assentamento e o padrão de exploração lacustre desses grupos até então bastante desconhecido pela Arqueologia. Esses estudos permitiram avançar também na discussão de ocupação sistêmica e mobilidade regional Guarani, na medida em que foi proposta, por essa pesquisa, a ocorrência de sítios que atendem a necessidades específicas do sistema de assentamento, apresentando-se indicadores
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de baixa mobilidade e um quadro cronológico de ocupação. Considerado uma “instalação mais permanente”, o sítio RS-LC-80 foi datado através da técnica de termoluminescência em 563 ± 45 anos A.P., enquanto que a datação radiocarbônica do mesmo sítio deu uma data mais recente: 280 ± 50 anos A.P. – (Beta Laboratory Inc.n nº 202366) (SCHMITZ, 2006). Na região do município de Pelotas foram mapeados até o momento 22 sítios arqueológicos Guarani no litoral e na Serra que remontam às antigas aldeias e acampamentos Guarani localizados na margem da Laguna dos Patos e na Serra do Sudeste. Nas praias do município de Pelotas foram identificados 07 sítios, entre os quais foram escavados os sítios PS-02-Camping, PT-01-Sotéia, PT-03-lagoinha e PS-03-Totó (para dados detalhados ver MILHEIRA 2008). Os sítios Sotéia e Lagoinha se localizam na Ilha da Feitoria e foram entendidos como acampamentos destinados à coleta de recursos lacustres. Entre os acampamentos estudados, destaca-se o sítio Camping que se extende numa área de aproximadamente 50m de raio. Neste sítio arqueológico foi identificada uma estrutura de deposição de refugos composta por uma lente de sedimento cinza escuro em formato côncavo de aproximadamente 20 cm de espessura, associada a materiais cerâmicos e arqueofaunísticos. Além disso, escavou-se também uma segunda estrutura em que se pôde evidenciar um pote articulado e semi-inteiro (ñaetá com decoração escovada), em que, no seu interior se encontravam dezenas de fragmentos de cerâmica de outras vasilhas, tratando-se, neste caso, de uma estrutura de combustão (Figura 04). Esse contexto foi datado através da técnica de AMS em 380 ± 50 AP, sendo a data calibrada colocada numa faixa temporal mais ampla, situada entre os anos 1450 a 1660 da Era Cristã ou 500 a 290 A.P. (Beta Laboratory Inc., n° 234205). O sítio Totó, por sua vez, com uma área de aproximadamente 200 m de raio foi interpretado como uma aldeia. Através de uma bateria de sondagens e escavações de trincheiras e áreas amplas foi identificada uma urna funerária na barranca do arroio Totó e uma estrutura de terra preta com formato elipsoidal. Esta estrutura foi escavada primeiramente através de sondagens e trincheiras (MILHEIRA, 2008) e, em um segundo momento, atingindo-se uma área ampla de 72 m² com plotagem individual de peças, cujo método permitiu obter-se a tridimensionalidade dos vestígios arqueológicos da área do sítio (ALVES, 2012). Essa estrutura de terra preta apresentou duas áreas que chamam atenção. A primeira delas é um pacote de sedimento cinza escuro à beira do arroio Totó associado a milhares de peças arqueológicas como fragmentos de cerâmica, artefatos líticos, arqueofaunísticos e arqueobotânicos. Essa estrutura foi interpretada como uma área de lixeira, tendo sido datada pelo método radiocarbônico em 530 ± 40 AP
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(protocolo Beta 237665), cuja data quando calibrada nos dá uma idade situada numa faixa temporal mais ampla, entre os anos 1390 a 1440 AD ou 560 a 510 AP (MILHEIRA, 2008; MILHEIRA e ALVES, 2009). A segunda área que chama a atenção situa-se ao lado da área de lixeira e compõe o piso da casa Guarani, onde foram identificadas estruturas de combustão como fogos e fogões para cozinhar e aquecer o espaço residencial (Figura 05). Esse espaço residencial também teve datação radiocarbônica entre os anos 1330 a 1340 A.D. ou 620 a 510 A.P. de 510 ± 40 A.P. (protocolo Beta 282128) anos, sendo, possivelmente, contemporânea à área de lixeira (ALVES, 2012). Se, de um lado há sítios arqueológicos intepretados como aldeias e acampamentos localizados na margem da Laguna dos Patos, por outro lado, na região da Serra do Sudeste foi identificada uma série de antigas aldeias Guarani. Em meia encosta e topo de morro localizados na bacia hidrográfica do arroio Pelotas, os sítios arqueológicos apresentam uma ampla dispersão de fragmentos de cerâmica associados a manchas de terra preta que remetem a pisos de habitação do espaço das aldeias. O sítio PSGPA-04-Ribes destaca-se nesse contexto, extendendo-se por uma área de meia encosta alcançando aproximadamente um raio de 250m, onde se apresentam três manchas de terra preta comumente definidas pela literatura especializada como pisos de habitação (NOELLI, 1993). O sítio Ribes apresentou-se com um baixo potencial de pesquisa na área das habitações antigas, uma vez que o histórico uso da terra para plantio, a exemplo dos demais sítios arqueológicos da mesma região, causou uma grande impactação no solo arqueológico, desconfigurando o contexto de deposição. Porém, em meio a um pequeno afloramento granítico dentro do espaço do que seria a aldeia chamou a atenção pelo achado de uma vasilha cerâmica nos anos 1980, a qual, pelas características narradas pelo proprietário da terra sugere se tratar de uma urna funerária. Ao averiguar o local do achado percebeu-se que se tratava de uma fossa do tamanho de uma urna funerária e, para nossa surpresa, no perfil da fossa foi possível observar uma segunda vasilha. Sendo assim, as pesquisas no sítio arqueológico tiveram seu foco deslocado para a área das urnas funerárias, e, buscando-se um registro adequado do espaço arqueológico realizou-se a escavação de uma área de 15m². A urna funerária escavada é uma vasilha do tipo cambuchí guaçú, cuja borda foi fraturada por ações naturais. Estava depositada em sentido vertical, com um pote do tipo cambuchí guaçú emborcado como tampa, que foi retirado inteiro. Fazendo parte do contexto funerário ainda havia uma vasilha do tipo ñaetá acima da urna, provavelmente depositado ali como oferenda no ritual de sepultamento (Figura 06). Em seu interior não foi identificado qualquer tipo de vestígio de esqueleto humano nem mesmo carvão que pudesse gerar uma amostra para datação, logo, a única possibilidade de data-
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ção foi através da técnica de Termoluminescência, apontando a idade de 510 ± 70 A.P. ou o ano de 1.440 da Era Cristã (protocolo 1968 do LVD-FATEC). Essa datação chama atenção, não somente por permitir que tenhamos um horizonte cronológico para as ocupações Guarani na Serra do Sudeste, mas, sobretudo, porque sugere que as ocupações nesta serra sejam contemporâneas às ocupações no litoral da Laguna dos Patos. Neste sentido, pode-se pensar que haja algum tipo de interação entre as aldeias do litoral e do interior da Serra, fator esse que é corroborado também pela presença de artefatos líticos identificados na aldeia do Totó e nos acampamentos do Camping, da Sotéia e Lagoinha. Nesses sítios arqueológicos litorâneos, sobretudo no sítio Totó, foram identificados artefatos líticos confeccionados em matérias-primas variadas como o quartzo, granito, calcedônia, basalto, arenito friável e silicificado, os quais são inexistentes na região litorânea do município de Pelotas. Entre estas matérias-primas as mais próximas que poderiam ser aprivisionadas pelos Guarani do litoral seriam o quartzo e o granito que ocorrem na Serra do Sudeste, justamente onde se localizam as aldeias antigas estudadas. Esses materiais poderiam ser captados com uma estratégia simples, em que os indivíduos poderiam ter acesso relativamente fácil, visto que as fontes de matéria-prima distam em torno de 30 km do litoral. Por outro lado, uma estratégia mais sofisticada deveria ser estruturada para o aprovisionamento de calcedônias, arenitos e basaltos para a confecção de instrumentos líticos. Com base na carta geológica do Estado do Rio Grande do Sul é possível definir que estas matérias-primas são exóticas ao ambiente lagunar, pois, a calcedônia poderia ser adquirida a, pelo menos, 200 km do litoral, o arenito friável e silicificado a 130 km e os basaltos a 120 km.69 Dessa maneira, se levarmos em consideração que os sítios arqueológicos litorâneos e serranos são contemporâneos e que as rochas sugerem que havia estratégias de captação que articulam ambos os ambientes, podemos pensar que havia interação entre estes distintos estratos geográficos pelas populações Guarani. Esta interação sugere que havia um sistema de assentamento Guarani articulado, de um lado, entre as aldeias serranas, provavelmente ocupadas tradicionalmente pelas chefias mais reconhecidas e, de outro lado, pelas aldeias 69 Esta interpretação desconsidera, num primeiro momento, a possibilidadede que tais tipos de rochas sejam identificáveis em cascalheiras de grandes rios com energia suficiente para transpostar estas matérias-primas em forma de seixos do interior do Rio Grande do Sul até o litoral, ou mesmo, que ocorram afloramentos de tais matérias-primas mais proximas do litoral do que estamos propondo. Entretanto, estamos lidando com uma lacuna em termos de dados geológicos robustos que permitam inferir o contrário, ou seja, a ausência de uma descrição sistemática dos afloramentos litológicos litorâneos e das cascalheiras nos grandes rios que deságuam na Laguna dos Patos impede que tenhamos uma noção mais clara das práticas de aprovisionamento de rochas. 136
do litoral que podem ser entendidas como indicadoras do processo de anexação territorial em operação pelos Guarani em torno do século XVI. Este modelo de interpretação adéqua-se ao modo de organização territorial dos grupos Guarani, tema este bastante discutido pela literatura especializada. Segundo autores como Noelli (1993), Assis (1996) e Soares (1997), a organização territorial Guarani constitui-se a partir de diferentes dimensões espaciais, desde a casa ou oka, onde reside a família nuclear; a aldeia ou amundá, onde reside a família extensa ou teýy; o conjunto de aldeias inseridas em um território ou teko’á e o conjunto de teko’á que forma um território amplo, como uma nação, guará. Por definição, o teko’á se constitui como o conjunto de aldeias (amundá) e acampamentos (tapýi)70, interligados por caminhos (piabirú), compondo um território de domínio e influência simbólica, limitado por acidentes geográficos como rios, morros, arroios etc.. Esses limites, além de serem definidos pelos aspectos simbólicos são também estabelecidos através das alianças políticas que determinam graus de prestígio e status social nas relações entre aldeias. É a dimensão espacial que permite a plenitude da vida Guarani em seus aspectos econômicos e simbólicos. Ou seja, é na amplitude de vivência e constituição do teko’á que os indivíduos e os coletivos Guarani podem desenvolver seu modo de ser, adquirir, aprender e reproduzir o ñande rekó (o ethos). Do ponto de vista econômico o teko’á pode atingir, segundo Noelli (1993), um raio de 50 km, abrangendo neste espaço vários tipos de ambientes, cujas características físicas e os pontos estratégicos para exploração de seus recursos seriam mapeados frequentemente pelos grupos, constituindo as partes do território. Trazendo os dados apresentados para a discussão sistêmica do conjunto de sítios Guarani da margem área de estudo, podemos inferir que os mesmos sejam elementos de um teko’á que se articula entre a região litorânea e serrana. O teko’á do arroio Pelotas, como denominamos o território de domínio estudado, abrangeria então uma área de pelo menos 35 km de raio, havendo duas porções: a) A serra, onde se encontram aldeias em áreas de topo de morro e meia encosta. Nesta região, os Guarani poderiam desenvolver com plenitude suas formas de cultivo, diversificando sua dieta alimentar, complementando, possivelmente, com recursos lacustres provenientes do litoral, através de uma esfera de interação de bens e alimentos, operada pelas relações de mutualidade entre parentes e chefias que integram o território de domínio. Na serra, devido ao 70 Denominados pelos Guarani como tapýi (NOVAES, 1983; ASSIS, 1996), estes acampamentos se localizavam geralmente às margens dos rios, córregos e lagoas e eram ocupados sazonalmente. Eram bastante simples em suas estruturas arquitetônicas e eram usados como estruturas auxiliares para o controle dos recursos na paisagem, para coleta de moluscos e manipulação de alimentos, recursos estes utilizados para o abastecimento da aldeia. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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tipo de ambiente em que os Guarani estariam mais bem adaptados, habitariam as chefias mais antigas e tradicionais, com maior poder de influência e decisão sobre as distintas esferas do teko’á. Seria a região onde o território de domínio estaria mais bem consolidado e estruturado por uma ocupação mais antiga; de onde teria partido, inclusive, o processo de expansão em direção ao litoral. b) No litoral, por sua vez, se encontram as aldeias como a do Totó e os acampamentos à margem da laguna. No litoral os Guarani poderiam ter acesso a recursos lacustres, sobretudo os distintos tipos de frutos do mar que complementariam a dieta alimentar dos aldeamentos, contribuindo para o equilíbrio econômico do sistema de ocupação Guarani. Como se trata de uma área possivelmente ocupada para complementar um processo de expansão territorial de origem serrana, a porção litorânea do teko’á do arroio Pelotas pode ser pensada também como uma área periférica do território de domínio regional. Neste espaço “marginal” as chefias de menor prestígio teriam assumido uma postura de negociação não necessariamente belicosa frente aos grupos construtores de cerritos, habitantes das terras baixas litorâneas há mais de dois mil anos. A interação política com os cerriteiros pode ter sido fundamental para que os grupos Guarani aprendessem práticas de manejo florestal nos terrenos com menor produtividade agrícola do litoral, assim como adquirissem conhecimentos importantes sobre os pontos estratégicos para otimizar a captação dos recursos lacustres, conhecimento este que requer um amplo reconhecimento do potencial paisagístico e ambiental da região de ocupação. Esse processo de expansão do território de domínio Guarani iniciado em torno do século XII e que se intensifica ao redor dos séculos XV e XVI, partindo do interior serrano em direção ao litoral, teria sido “barrado” pela chegada das populações do velho mundo, ainda no século XVI e, mais fortemente a partir do século XVII. As práticas belicosas e violentas, historicamente conhecidas, que foram desenvolvidas pelos europeus para a captura de escravos e para o domínio territorial geraram um ambiente de terror e genocídio na região, não fugindo à regra geral conhecida em todo litoral brasileiro.
A HISTÓRIA E O PRESENTE DOS GUARANI NA REGIÃO DE PELOTAS Várias são as denominações que constam nos registros históricos sobre as populações indígenas que habitaram a região do atual município de Pelotas. 138
Evidentemente estas denominações devem ser problematizadas, pois apresentam classificações regionais forjadas pelos europeus, seguindo uma lógica eurocêntrica e generalista para com as parcialidades indígenas. Aliás, grande parte dos relatos e narrativas realizadas pelos europeus, a partir do século XVI foram realizados por militares e clérigos, ambas as classes interessadas na conquista territorial e religiosa, respectivamente. Neste sentido, as classificações das culturas humanas do “Sertão do Patos” (MONTEIRO, 1992), como fora descrita inicialmente esta região, foram realizadas a fim de tecer um panorama genérico dos “gentios”, em que constassem suas fraquezas, habilidades, modo de vida e organização social, religiosidade e crenças, dispersão territorial, tecnologias, estratégias e capacidade de guerrear. Neste sentido, as denominações comumente associadas às populações de grupos falantes da língua Tupi-Guarani: Tapes, Tapuias, Patos, Carijós e Arachãnes, etc., devem ser entendidas como generalizações culturais estereotipadas que atenderam às necessidades dos conquistadores em operar uma lógica belicosa e moralista. Não são denominações que permitem, de um ponto de vista antropológico, compreender plenamente as parcialidades culturais e étnicas dos coletivos humanos, trazendo apenas um espectro dos povos ameríndios que habitaram a Serra do Sudeste e as margens da Laguna dos Patos. Além da generalização das parcialidades, sistematicamente a documentação histórica do século XVI em diante traz o termo “índio”, categoria esta que vai sendo homogeneizada paulatinamente nos censos regionais e que dificulta, ao ofício do historiador, de compreender o papel e a contribuição de cada etnia em particular no processo histórico regional. Ou seja, fica cada vez mais difícil saber se os documentos falam dos Guarani ou dos Charrua-Minuano, uma vez que o termo “índio” passa a ser comumente utilizado. Isso implica em afirmar que a História Guarani, por excelência, confunde-se ou integra-se a uma História indígena regional. A paisagem do município de Pelotas é bastante representativa da presença indígena. Termos como arroio Pelotas, Serra dos Tapes, e Laguna dos Patos, denotam a nomeação das localidades e acidentes geográficos, apontando a importância dos grupos indígenas como ocupantes da região. O próprio termo Patos que dá nome à laguna, possivelmente resulta da ocupação dos índios Patos. Sobre isto Ihering (2003 [1907]), em seu clássico texto onde articula fontes históricas, como o artigo de Félix F. Outes: “El puerto de los Patos”, em que reproduz vários mapas antigos do Brasil e Paraguai com indicações sobre as diversas parcialidades indígenas, aponta a relação entre o nome da Lagoa e a “tribo dos Patos”, grupos de origem Guarani que, assim como os Carijó, teriam habitado o litoral Sul-brasileiro. Esse estudo foi apresentado pelo autor de maneira incon-
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clusiva, pois as fontes são lacunares a respeito da existência de grupos indígenas chamados Patos. Neste sentido, o termo comumente encontrado na cartografia antiga: “sertão dos Patos”, poderia relacionar-se também às aves palmípedes, o Pato Real (Cairina moschata). O arroio Pelotas, um dos principais corpos hídricos que banha o município de Pelotas e que empresta seu nome à cidade, também pode ter seu nome relacionado à presença dos grupos indígenas. As “pelotas” eram embarcações feitas de couro usadas como transporte de carga. Embora não seja descartada a hipótese de que estas embarcações tenham origem marroquina e tenham sido trazidas para a região pelos espanhóis, as “pelotas” foram amplamente utilizadas pelas populações indígenas que habitaram a região Lagunar, sendo seu uso descrito no período escravista das charqueadas pelo francês Jean Baptiste Debret, dado este corroborado por Osório (1997, p. 54), em seu livro a “Cidade de Pelotas” ao comentar que: “[...] as “pelotas” foram primitivamente usadas pelos indígenas rio-grandenses. A “pelota”, conforme Saint Hilaire (2002 [1887], p. 269), é um tipo de piroga: “[...] é simplesmente um couro cru ligado nas quatro pontas e que, desse modo, forma um barco que se pode confundir pela aparência com as sacolas de papel onde se põe biscoitos. Enche-se a pelota de objetos, ata-se nela uma corda ou tira de couro. Um homem, a nado, prende a corda entre os dentes e faz passar assim a piroga” (Figura 07).
Os relatos etnográficos de cronistas, viajantes e pesquisadores apresentam um panorama de ocupação dos índios Guarani na região da Laguna dos Patos já a partir do século XVI em áreas bastante amplas. De acordo com Monteiro (1992), nesse período, a região litorânea entre a Laguna dos Patos e Cananéia era ocupada pelos Carijós. Regionalmente os Guaranis eram denominados Tapes (PÔRTO, 1955 apud SUSNIK, 1979-1980), enquanto que nas margens da Laguna dos Patos eram também denominados Arachãs ou Arachanes, os quais foram descritos como ocupantes das ilhas lagunares, como a Ilha dos Marinheiros e seu arquipélago, Ilha da Torotama e Leonídio (IHERING, 1912; METRAUX, 1948). Segundo Gutierrez (2001, p. 32), os Tapes foram descritos em função das guerras travadas em defesa de suas terras ainda no século XVIII, quando se instalavam no litoral de Rio Grande as primeiras ocupações coordenadas pelo brigadeiro José da Silva Pais, que pretendia fundar o presídio Jesus-Maria-José, expulsar os espanhóis de Montevidéu e terminar com o bloqueio à Colônia do Sacramento. Só foi possível a fundação de Rio Grande em 1737 quando Silva Pais 140
auxiliou na formação de duas defesas à margem do canal São Gonçalo: uma no passo da Mangueira e outra no arroio. Na manutenção dessas defesas Cristóvão Pereira envolveu-se em lutas contra os Tapes, conforme as crônicas de Simão Pereira de Sá: “Os tapes mais escandalizados que temerosos entraram por vingança a afugentar e debandar o gado vacum, que cobria a fertilíssima campanha [...] e com tanta fortuna que cabendo mais de cem tapes a cada português, [...]. Abalizaram meia légua de terra a seu costume bárbaro para a escaramuça, e com todas as vantagens, brandindo as lanças, entraram na peleja, que não foi refutada dos nossos, por não perderem fugindo, o que havia ganho pelejando. Depois de durar largas horas a batalha, perderam terreno e, feridos das nossa espadas, conheceram os perigos e se retiraram com tanto medo e confusão que nos deixaram com os mortos um importante despojo de cavalos, gado e bestas muares, o que tudo foi com muitos prisioneiros ao alojamento do Coronel, o qual honrou o valor com boas palavras e estimou a vitória por nos custar o excesso, e desigualdade, só sete feridos e um morto.” (PEREIRA DE SÁ, 1969, p. 101 apud GUTIERREZ, 2001). Através das incursões, os Tapes eram capturados e escravizados e, Segundo GUTIERREZ (2001), trabalhavam nas diversas construções que se executavam no canal de Rio Grande e entorno. Foram usados na construção de dois núcleos populacionais distintos erguidos entre 1738 e 1749: o do Porto (atual cidade de Rio Grande), onde se situava o forte Jesus-Maria-José e algumas moradias; e o do Estreito. Em 1758, foi doado o rincão de Pelotas a Tomaz Luiz Osório, por seus feitos na guerra Guaranítica, onde foram implantadas sete charqueadas, seis na margem esquerda do arroio Pelotas e uma na Laguna dos Patos. O rincão possuía os seguintes limites naturais: Laguna dos Patos; sangradouro da Mirim, atualmente chamado de canal São Gonçalo; arroios Pelotas e canal Correntes. Porém, a implantação do núcleo saladeril só se deu a partir de 1780, após a expulsão dos espanhóis (1763-1776) e do tratado de Sto. Ildefonso (1777) (GUTIERREZ, 2001, p. 41). Em 1780 a região de Pelotas é cotada para receber a Real Fazenda, devido às suas qualidades em termos de recursos naturais e pela presença de índios que poderiam ser usados como mão-de-obra: Sobre esta região o secretário da junta da Fazenda do Rio Grande do Sul de 1775, Sebastião Francisco Bettamio fez 29 observações: “[...] entrando-se pelo sangradouro da Mirim, três ou quatro léguas [19,8km a 26,4km], há muitas e admiráveis rochas de boa pedra, havendo portos de mar que dão lugar à entrada de embarcações grandes, e chegam quase ao pé dos cerros; que ali se transporte ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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a pedra para a vila, [...] uma companhia de cento e cinquenta ou duzentos índios trabalhadores, e que estes se empreguem de baixo da direção de pessoa inteligente em quebrar e arrancar pedras de toda a qualidade [...]. 9ª - No mesmo sítio em que se corta pedra, há barro para telha e tijolo, e como na aldeia há índios que sabem fazer estes dois materiais, [...] 12ª - Nas mesmas margens do sangradouro da Mirim em pequena distância, consta-me haverem excelentes madeiras, em cujo corte se podem empregar alguns índios, [...].” (BETTAMIO, 1980, p. 156 apud GUTIERREZ, 2001, p. 51).
Nota-se, com este breve histórico dos séculos XVIII e XIX, que envolvem a formação de Pelotas e seu desenvolvimento urbano que os grupos indígenas passaram por uma série de rupturas culturais, sendo forçados a abandonarem seus locais de moradia tradicional, que foram mapeados arqueologicamente, para servirem de mão-de-obra nas estâncias de gado e construção dos povoados formados a partir do século XVIII. Além do uso dos indígenas “locais”, era comum que indígenas aprisionados em outras regiões do Brasil fossem trazidos para incorporarem a mão-de-obra local e a defesa das povoações (NAUE et al., 1971; MONTEIRO, 1992; NOELLI, 1999-2000). Juntamente à perda territorial por parte dos grupos indígenas houve uma queda demográfica brutal na região registrada no início do século XIX. Um censo que demonstra o baixo número de indígenas na região foi apresentado por Saint Hilaire, quando de sua visita à Capitania do Rio Grande do Sul (atual município de Rio Grande). Informado pelo cura da paróquia de Rio Grande, esta capitania teria em 1819: “5.125 indivíduos, a saber: 1.195 brancos, 1.388 brancas, 17 índios, 26 índias, 61 mulatos livres, 98 mulatas livres, 32 negras livres, 38 negros livres, 1.391 negros e mulatos escravos, 879 negras e mulatas escravas” (SAINT-HILAIRE, 2002 [1887], p. 77). Esses números podem ter sido limitados à contagem de pessoas na área limítrofe da zona urbana em formação, sendo as comunidades indígenas interioranas descartadas do censo. Em função das datações arqueológicas em cerritos localizados no município de Rio Grande apresentarem ocupações em torno de 200 A.P. e pela grande quantidade de vestígios arqueológicos regionais, esperaríamos uma quantidade maior de indígenas recenseados. Essa projeção, logo, demonstra que há um descompasso bastante claro entre os dados arqueológicos e os dados históricos. Escravizados, aprisionados, fugitivos e utilizados como mão-de-obra, os indígenas que sofreram a esse processo de violência étnica passaram a engrossar a massa de pobreza da cidade de Pelotas, somando-se a homens livres, negros fugidos e alforriados. É interessante notar que já no século XIX há um
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aumento considerável de investimentos da administração pública na cidade de Pelotas, quando esta ainda era a Vila São Francisco de Paula, para a manutenção da ordem social e urbana e controle dos “criminosos”, categoria esta em que muitos indígenas foram enquadrados. Um ofício da Câmara relata ao Presidente da Província que uma força de 457 soldados na ativa e 95 na reserva formavam a Guarda Municipal (AL-ALAM, 2008, p. 65). Nota-se com isso um aumento no interesse em controlar os “criminosos”, que seriam, de acordo com a Câmara “homens da fronteira, pessoas desconhecidas, e escravos” (AL-ALAM, 2008, p. 66). O investimento só aumenta com o tempo. Em 1840-50 já se fala de um corpo Policial e não mais uma Guarda Municipal que se soma à Santa Casa de Misericórdia de Pelotas como aparelhos de manutenção do poder e da ordem social, pois: “um dos maiores objetivos destas instituições seria o de tirar de circulação das ruas os indesejados, os desordeiros, os pobres” (AL-ALAM, 2008, p. 85). A Casa de Correção Pelotense localizava-se à beira do arroio Santa Barbara, na zona da “Cerquinha”, assim como a forca que fora constituída na antiga Praça das Carretas (atual Praça Vinte de Setembro ou, como ela é conhecida popularmente: Praça dos Enforcados), estabelecida ali em 1850, próximo de onde foram registradas aldeias indígenas ainda no século XIX. Esta região recebeu investimentos municipais, conforme CASTRO (1944): “[...] num ato de reconhecimento e de justiça, a mandar levantar, alto aterro, em torno da área que ocupavam, a fim de que quando as águas do arroio ficassem cheias e transbordantes, não fosse prejudicar as habitações dos nativos [...] como esses acampamentos ficassem por de traz das “Cercas”, ficou por isso denominado “Cerquinhas”.
Com a implantação da Casa de Correção e da forca nesta localidade e com o estabelecimento do aparato de controle social em seu entorno, a administração pública buscou ordenar e controlar essa zona marginal da cidade. Esta interpretação leva a crer que as comunidades indígenas remanescentes localizadas naquela área estavam sujeitas ao mesmo tipo de preconceito social, sendo sua existência focada pelos administradores como uma ameaça urbana. Porém, não estavam de todo isoladas, pois segundo Al-Alam (2008), havia circulação rotineira de pessoas em embarcações e comerciantes, e, até mesmo, era comum a prática das lavadeiras na margem do arroio. Isso reforça ainda mais a ideia de integração de indígenas à malha urbana em formação no século XIX, os quais, na mesma lógica de servirem como mão-de-obra, passaram a incorporar postos de trabalho “legalizado”, como demonsARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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tra novamente AL-ALAM (2008, p. 89), ao comentar que 11 índios policiais foram internados na Santa Casa de Misericórdia de Pelotas entre 1849-1855. Esta prática de incorporar indivíduos indígenas no corpo policial da cidade também foi relatada por Euclides Franco de Castro, em uma crônica sobre a história de Pelotas publicada no jornal Princesa do Sul (1944, p. 19): “Ezequiel Franco possuía as suas custas 12 índios para o serviço policial da cidade e para capturar escravos foragidos. Naquela época, como o serviço de vigilância policial era determinado em lei e prestado gratuitamente por particulares, houve quem se aproveitasse dos seus índios para esse mister. [...] Havia índios pagos por particulares para esse serviço [...].
O contrário também ocorria. Comumente, indígenas se tornaram “criminosos”, pois, segundo Al-Alam (2008) conforme o registro de entrada e saída de presos internados na mesma instituição hospitalar, entre os anos de 1848 e 1853, 2 (6,9%) eram índios. Atualmente na Serra dos Tapes, na localidade da Colônia Santa Helena, Rincão da Cruz, 8º Distrito do município de Pelotas, localiza-se a terra indígena, não homologada, denominada na língua Mbyá-Guarani de Kapi’i Ovy (Capim Verde). A área possui aproximadamente 23 hectares, distando cerca de três quilômetros da região central da Colônia Maciel e oito quilômetros da BR 392. A área ocupada pela família incluindo casas e roça tem menos de um hectare, na encosta de um morro. Segundo informações orais dispersas, o local é habitado com regularidade há cerca de 30 anos e a atual parentela está no local há quatro anos. Esta parentela vive em condições de infraestrutura precária, sem comprometimento por parte dos órgãos governamentais responsáveis e por parte da sociedade em geral, mantendo-se apenas do sustendo de sua pequena roça e seu artesanato, assim como da solidariedade de alguns poucos vizinhos. Esta terra é formalmente um parque ambiental (Parque Farroupilha), sob a responsabilidade do governo municipal, sem que seja feito qualquer tipo de investimento que auxilie as famílias que ali habitam.
DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Após esse relato histórico que procuramos traçar nesse texto, em que fica claro que as relações conflituosas entre os ocupantes do velho mundo e as 144
populações indígenas foram bastante intensas do ponto de vista da violência física e moral, não surpreende que o sul do Estado do Rio Grande do Sul tenha se tornado uma região onde a presença indígena foi “silenciada”. Por silenciamento entendemos não somente que as vozes indígenas foram caladas, pois, atualmente, poucos são os indivíduos que se identificam como índios e buscam seus direitos, mas, além disso, o silêncio a que nos referimos, diz respeito também à historiografia tradicional que insiste em desconsiderar a contribuição das populações indígenas no processo histórico regional. Como dito na primeira parte do texto, os livros de História regional quando se referem às populações indígenas os apresentam de uma forma extremamente resumida, raramente ultrapassando as duas ou três primeiras páginas introdutórias71. O índio é tratado nestes textos como o habitante original da terra, o selvagem, o bravio. Romanceado, o índio se torna um personagem que atua apenas no primeiro ato da peça histórica, cuja participação consiste em arrumar o palco e abrir as cortinas para o teatro da civilização - que se inicia no segundo ato. Basta um breve olhar sobre a historiografia tradicional para vermos trechos que reforçam nossa argumentação, que relega o elemento indígena a um segundo plano no processo histórico pampeano. Em seu livro intitulado “Sociogênese da Pampa Brasileira”, datado de 1927, o historiador renomado Fernando Osório escreveu o que podemos chamar de um tratado sociológico que narra a epopeia da formação da “raça” gaúcha, a qual se fundamenta, sobremaneira, nos atos heroicos de indivíduos europeizados, cuja força e bravura teriam sua origem na capacidade belicosa dos portugueses e espanhóis. Aos indígenas, na narrativa do autor, coube apenas sua função em servir de mão-de-obra e como peão de guerra: “[...] em nenhum outro território americano teve o índio, como no Rio Grande, incorporado espontaneamente a função social que exerceu, ao cabo de decênios nas milícias e no cenário das estâncias” (OSÓRIO, 1927, p.41-42). Após servir “espontaneamente” em sua função social em “defesa da Pátria Brasileira”, como quer o autor, o indígena lentamente deixa a cena social em prol da arianização da “raça gaúcha”: “Proclama-se, ainda hoje, que nenhum desequilíbrio étnico apresenta o Rio Grande, cujos habitantes são os mais arianizados do Brasil, bem como o fato, aqui insofismável, da tendência, para a homogeneidade, com o predomínio das características nacionais, brasileiras, nos grandes grupos que repre71 Por exemplo, ver os títulos que versam sobre a formação da cidade de Pelotas, cujas obras são frequentemente citadas na historiografia tradicional: Magalhães (1993, 2000) e De León (2011 [1993]). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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sentam oitenta por cento, talvez, da nossa população de origem estrangeira” (OSÓRIO, 1927, p. 42-43). É ainda interessante destacar uma nota colocada em sua obra, que remete ao trabalho de Oliveira Vianna, intitulado “Evolução do Povo Brasileiro”, de 1923. Nesta nota consta que: “É rápida, no extremo-sul, a destruição da população negra. Em menos de um vintênio (quadro do recenseamento de 1872 a 1890) o seu coeficiente, que é de 18,3 cai a 8,7, com uma grande redução, portanto, de 9,6%. Por sua vez, o elemento indígena conserva-se, por assim dizer, estacionário, apresentando mesmo uma pequena redução de 0,5. Ao passo que é magnífico o movimento ascensional do tipo ariano, que, em 1872, representa quase 60% da população e que, em menos de vinte anos, em 1890, passa a representar os seus 70%. Mais 26%, portanto, do que a média geral do país” (OSÓRIO, 1927, p. 42). A secundarização da presença indígena também é visível nos poucos museus da região, sobretudo nos museus da cidade de Pelotas. Os dois principais museus históricos da cidade: O Museu da Baronesa e o Museu Histórico da Biblioteca Pública Pelotense carecem de uma narrativa sobre as populações indígenas que elucide a contribuição destes na conformação da História regional. O Museu da Baronesa glorifica, conforme Al-Alam (2008, p.22), “as histórias dos barões, dos coronéis, da elite branca agrária e urbana da cidade de Pelotas [...] como um modo de legitimação das desigualdades sociais do presente”. No Museu Histórico da Biblioteca Pública Pelotense, composto por um acervo bastante variado de instrumentos de culturas estrangeiras, assim como materiais que remontam à História gloriosa da região, a marginalização da História indígena não é diferente. Destacam-se os objetos provenientes das Missões jesuíticas, objetos do século XIX, quadros, bustos de heróis da História, objetos de curiosidade pelo exótico como um narguilé Árabe e quatro vasilhas cerâmicas Guarani, pontas de flecha pré-coloniais, bolas de boleadeira, etc.. Com certa conformação, poderíamos descrever o acervo do Museu Histórico da Biblioteca Pública Pelotense como um “gabinete de curiosidades exóticas”, que combina diferenças, exotismos e objetos que não dialogam entre si, a não ser pelo simples fato de terem sido feitos pela mão humana (BRUNO, 1996). Somam-se ao descaso com a história indígena o fato de que grande parte da coleção do Museu Histórico da BPP estar sendo perdido sistematicamente. Em trabalho realizado anteriormente (MILHEIRA, 2006) constatou a perda de mais de 80% do acervo arqueológico pré-colonial, conforme o montante de peças que constavam originalmente no livro tombo do acervo. Além disso, o discurso de marginalização da História indígena deste Museu integra-se à falta de
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ações patrimoniais e de memória da administração pública da cidade de Pelotas, cujo desinteresse pela História indígena é evidente pela ausência da temática indígena em todas as festividades e datas históricas. Esta postura referente às populações indígenas não ficou limitada ao campo da disciplina de História ou ao espaço dos museus, mas permeia todo o campo das humanidades, inclusive a própria Arqueologia. O termo pré-história foi levado a cabo no Brasil, tendo sido incorporado de forma incisiva no cabedal teórico desenvolvido pelos arqueólogos, sobretudo, com a implantação do Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA). Com a instituição desse programa no Brasil entre os anos 1965-70, os princípios teóricos histórico-culturalistas tornaram-se hegemônicos e seus adeptos viram nesta proposta generalista e empirista uma estratégia adequada para o desenvolvimento da pesquisa arqueológica no Brasil. O viés político do programa, que assumia ares de neutralidade, veio a formar um grupo de arqueólogos que, de certa forma, desvinculou o fazer arqueológico das discussões indigenistas da época. Além dos aspectos institucionais e políticos, um problema preocupante do programa foi o modelo de organização do conhecimento gerado a partir dos trabalhos de campo e laboratório. O esquema de generalização do processo de ocupação foi definido através dos conceitos de tradições e fases. A organização desses conceitos empiricamente elaborados promoveu uma ruptura entre o registro material das culturas indígenas pretéritas e presentes. Nesse sentido, as tradições e fases desvincularam, por exemplo, os Tupi-Guarani pré-coloniais dos Tupi-Guarani pós-coloniais. De forma explícita, foi pensada uma dissociação entre cultura material e língua, nomeando-se a Tradição Ceramista Tupiguarani, que passou a ser escrita sem hífen, em contraposição à língua Tupi-Guarani que continuaria a ser escrita com hífen. Essa perspectiva está relacionada ao pressuposto de que o registro material proveniente dos sítios arqueológicos “pré-históricos” não teria correlação necessária com as populações indígenas do período pós-contato, propondo-se, portanto, a desarticulação da História indígena através do isolamento de dois períodos - anterior e posterior ao contato - sem levar em consideração a continuidade histórica, pois, conforme Noelli (2008): “O princípio norteador da Tradição Tupiguarani não tem por objetivo estabelecer a continuidade entre contextos arqueológicos e culturais, seguindo o pressuposto ‘tratar a cultura de uma maneira artificialmente separada dos seres humanos’, enunciada por Meggers (1955, p. 129)” (Noelli, 2008, p. 23). A herança teórica que adquirimos foi, portanto, a constituição de modelos interpretativos desprovidos de significado histórico-social, visto que as análises descritivas e empiristas, baseadas em procedimentos comparativos de
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atributos estilísticos e tecnológicos, permitiram tão somente a composição de classificações e estudos taxonômicos que dão conta de diferenças formais dos objetos e dos sítios arqueológicos, mas pouco contribuíram para o conhecimento da História e da cultura indígenas de maneira essencial. A adoção da perspectiva da descontinuidade histórica foi responsável pela organização de um esquema teórico que vislumbra os sistemas sociais indígenas como estruturas fechadas em si mesmas, separadas e cristalizadas em bolhas, sendo uma formada pelo período anterior ao contato e a outra pelo período pós-contato. Nesse esquema, o contato (ou processo de colonização europeia) é o bloqueio entre as duas bolhas, um marco de referência temporal isolante de duas metades. Essa metáfora pode ser encaixada naquilo que Viveiros de Castro (1999) chamou de estereótipos sociais vinculados aos conceitos de índio naturalmente selvagem e índio civilizado, em que: “[...] o mundo social ameríndio anterior ao contato com os europeus é visto em ermos descontinuístas, estáticos e naturalizantes. Como se a história só começasse, para esses povos, a partir do momento em que eles começassem a se transformar em apêndices do Estado nacional. É só a partir dali que eles se tornam objetiva e subjetivamente ‘desnaturalizados’, isto é, históricos, situacionados [...]. Dá-se com isso, a impressão falsa de que os índios viviam, ‘de certo modo’, dentro de universos sociológicos e cognitivos insulares, sem nenhuma noção de alteridade e nenhum dispositivo interétnico até o advento desnaturalizante dos europeus” (VIVEIROS DE CASTRO, 1999, p. 167).
A descontinuidade histórica e cultural indígena, o rompimento entre o período anterior e posterior ao contato, constituída em parte, pela forma empirista e descritivista de pensar a cultura material indígena, levou os pesquisadores a comporem estereótipos sociais que não levam em consideração a História indígena em larga escala ou, em outras palavras, uma história indígena de longa duração. Além disso, segundo Noelli e Ferreira (2007), o PRONAPA permitiu aos seus idealizadores reestruturar os fundamentos de uma Arqueologia colonialista, inaugurada ainda no século XIX. Essa reestruturação teórica, na verdade, teria somente efetivado uma releitura das obras evolucionistas vigentes no Brasil imperial e republicano, dando continuidade a uma postura “degeneracionista”72. 72 Segundo Noelli e Ferreira (2007), o “degeneracionismo” diz respeito ao modo como as sociedades indígenas foram compreendidas no processo histórico brasileiro e mesmo latino-americano. A degeneração social e cultural indígena foi uma premissa teórica clara entre os cientistas dos séculos XIX e XX, que viram, em primeiro plano, na estrutura cultural indígena 148
Esta visão descontinuista passou a ser questionada somente nos anos 1980, quando uma forma nova de pesquisa em Arqueologia passou a tomar corpo no cenário nacional brasileiro. Com uma perspectiva histórica vertical que busca uma relação direta entre as populações ameríndias do período pré e pós-contato, a tese de Brochado (1984), pode ser considerada um marco referencial para uma nova abordagem arqueológica, o que fica claro nas palavras do próprio autor: “Gostaria, nesta tese, de contribuir no sentido de que as futuras histórias da América pré-colombiana possam oferecer uma visão mais integrada e significativa do que a mera descrição de formas culturais e do seu arranjo em sistemas de referência geográfica e cronológica. Portanto, a primeira coisa que considerarei aqui é que a Arqueologia do leste da América do Sul deve ser vista como a pré-história das populações indígenas históricas e atuais. Se não forem estabelecidas relações entre as manifestações arqueológicas e as populações que os produziram, o mais importante terá se perdido. Assim, as conotações etnográficas das tradições e estilos não devem ser evitadas, mas, pelo contrário, deliberadamente perseguidas” (BROCHADO, 1984, p. 1). Neste contexto de descaso teórico concretizado em uma perspectiva descontinuísta da história indígena Guarani e de silenciamento das vozes dos nativos na historiografia tradicional os ameríndios persistem. Ocupando apenas limitadas porções de terra que não garantem nem mesmo as condições mínimas de subsistência, uma vez que as terras indígenas são desprovidas de água potável e saneamento básico; são localizadas em regiões onde os recursos hídricos são contaminados e poluídos e sem as matas para a garantia do sustento, limitando a plenitude da vida Guarani. Em suas terras, segundo Liebgott (2010), dependem de políticas assistencialistas das esferas de governo municipal e/ou estadual e, sendo relegados a um plano marginal também pelas políticas públicas nacionais, embora a constituição de 1988 seja muito clara quanto aos seus direitos. O silenciamento às vozes coincide com o apagamento das fontes históricas escritas e materiais da presença indígena na região, pois, além dos vestígios arqueológicos sistematicamente destruídos em nome do “progresso”, os documentos escritos raramente são conservados, contribuindo para a amnésia social e histórica, como comenta Al-Alam (2008, p. 95): “[...] muitos destes documentos foram destruídos em conturbações sociais (revoluções, motins) ou naturais (enchentes, incêno cerne da involução sócio-cultural a que esses se mantinham e, em segundo plano, nas barreiras ambientais, o empecilho ao desenvolvimento sócio-cultural. Além da análise epistemológica, o que preocupa ainda mais os autores é que essa premissa ainda circula na produção acadêmica contemporânea, sendo necessário degenerar a teoria degeneracionista. ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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dios). Ou então que preciosos anexos foram remetidos para o governo central no Rio de Janeiro e devem estar sob a custódia do Arquivo nacional. Mas, certamente, o que deve ter contado para o descaso com a preservação deste patrimônio documental foi o investimento persistente de nossas administrações públicas na amnésia social. Trata-se, sem dúvida, de uma memória seletiva que descartou os traços dos desclassificados, dos delinquentes, dos pobres em geral”.
Em um contexto de condições historicamente desfavoráveis os coletivos indígenas resistem às imposições do Juruá – homem branco -. Mesmo após centenas de anos ainda mantêm suas tradições, sua língua, seu sistema simbólico, sua arte: Resistem! Cabe às novas gerações de cientistas sociais e humanos apontarem o silenciamento e a amnésia social ideologicamente coordenadas, buscarem as fontes históricas escritas e materiais e darem ouvidos às reinvindicações dos direitos civis garantidos na Constituição brasileira aos grupos indígenas.
Figura 01- Mapa da região sul do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Destaque para a região das bacias hidrográficas da Laguna dos Patos e Lagoa Mirim com a localização dos sítios arqueológicos das diferentes culturas indígenas.
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Figura 02- Quadro cronológico da ocupação dos grupos construtores de Cerritos e dos grupos Guarani na região da Laguna dos Patos. Elaboração: Tiago Attore.
Figura 03- Mapa do município de Pelotas com a localização dos sítios arqueológicos Guarani e dos construtores de cerritos.
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Figura 04- Contexto da estrutura de combustão escavada no sítio acampamento Guarani denominado PS-02-Camping, datada de 380 ± 50 AP. Foto: Rafael Milheira.
Figura 05- (a) Contexto de escavação do piso de habitação da aldeia Guarani do sítio PS-03-Totó, datado de 510 ± 40 AP; (b), (c), (d) artefato lítico e fragmentos de vasilhas cerâmicas de uso quotidiano; (e), (f), (g) contexto da estrutura de lixeira, datada de 530 ± 40 AP, localizada à beira do arroio Totó, lindeira à habitação. Fotos: Aluisio Gomes Alves.
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Figura 06- Contexto da estrutura funerária escavada no sítio aldeia Guarani denominado PSGPA-04-Ribes, datada de 510 ± 70 AP. Foto: Rafael Milheira
Figura 07- Ilustração de uma “Pelota”. Extraído de Osório (1997).
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CAPÍTULO 7 LA CUESTIÓN GUARANÍ COMO UN PROBLEMA DE PERSPECTIVA Antonio Lezama73 María Farías Gluchy74
INTRODUCCIÓN La interpretación histórica de los restos arqueológicos identificados como guaraníes requiere, necesariamente, de una precisa definición de lo que identificamos como “cultura Guaraní”. La definición de “lo Guaraní”, a su vez, depende, en buena medida, de la perspectiva en la que el investigador se sitúa. No es lo mismo situarse desde una perspectiva continental, que regional, sub-regional o local. Desde una perspectiva continental, entendida como un intento de clasificación de los grupos culturales al momento de la conquista, la presencia cultural Guaraní – o más precisamente Tupí-Guaraní - comprende, de acuerdo a los datos etnohistóricos, toda la vertiente atlántica sudamericana hasta el Río de la Plata afectando, incluso, a aquellos grupos que identificamos como “no Guaraníes”. Desde ese punto de vista la interpretación del registro arqueológico no puede dejar de tener en cuenta la existencia de una “lengua general”, desde las Guyanas hasta el Plata, una fluida comunicación marítima y fluvial y claros testimonios de la circulación de noticias y de gentes. A su vez, la existencia de esa intensa red de comunicaciones y el intercambio cultural que supone nos lleva a plantear el tema de la difusión de prácticas y comportamientos cuando estas son compatibles con los desarrollos locales y trasladar al escenario prehistórico 73 Universidad de la República, Uruguai – UDELAR. 74 Fundação Universidade do Rio Grande – FURG.
el problema de la definición de identidades culturales y su trascendencia en el desarrollo histórico. A título de ejemplo señalemos que la difusión del cristianismo en la Europa no romana y sus innegables consecuencias no supuso, necesariamente, la pérdida de las trayectorias locales.
Cual fue el peso del difusionismo en la definición de la “cultura Guraní”? En casi todos los trabajos, etnográficos, históricos o arqueológicos, la presencia “Guaraní” es el fruto de la “expansión” de dicha cultura desde un, discutido, punto de origen. De ser así deberíamos poder contestar preguntas del tipo: ¿Es la expansión fruto de un extraordinario crecimiento demográfico? ¿Del desarrollo de una poderosa estrategia militar? ¿Que sucedió con los habitantes originales de los territorios ocupados? Preguntas que, prácticamente (solo la última), no se formulan. Ese expansionismo conservador, recordemos que su definición etnológica/arqueológica es estática, cuyo resultado constata la etnología, debe ser, necesariamente, probado por la arqueología. Ahora bien, si la definición etnológica era imperfecta, su definición arqueológica, como concuerdan todos los investigadores que tratan el tema, es aún más imperfecta, limitándose a la presencia o ausencia de determinados rasgos en la fabricación y decoración de la cerámica. La debilidad de la definición arqueológica es tal que ha llevado a los arqueólogos - y es todo un mérito de la ciencia arqueológica - a la necesidad de hablar de “guaranitización” en aquellos contextos arqueológicos en los que, encontrándose algunos elementos “guaraníes”, la casi totalidad del resto del registro arqueológico indica la continuidad de situaciones anteriores. A partir del paradigma difusionista una de las preocupaciones que ha tenido la etnografía y también la arqueología es ubicar el lugar geográfico que dio origen a este grupo. Locus geográfico a partir del cual se expandieron por diferentes vías por buena parte del continente. El intento no siempre resultó bien sustentado o con una insuficiente base empírica. La dilucidación brindada a través de esta corriente de pensamiento, carece de claridad explicativa en cuanto a lo sucedido con los grupos étnicos que ya estaban asentados en el momento de la supuesta expansión guaraní. Una tal forma de ver el pasado asume implícita o explícitamente o bien un “vacio” demográfico previo a su ingreso, o bien un expansionismo arrollador que sometió o exterminó a los que se interponía a su frente. 156
El resultado de la aplicación del paradigma difusionista fue la percepción de una entidad étnica homogénea expresada en la presencia de elementos de su cultura material y pautas de comportamiento comunes, obviando o colocando en segundo plano toda heterogeneidad. Existe una amplia gama del registro arqueológico que aparece claramente sub representados u obviados en ellos resultados de la indagación arqueológica, como por ejemplo el patrón espacial de asentamiento, la estructura intra-sitio, la industria lítica y ósea, variabilidad en el tratamiento de los muertos, entre otros, que deberían ser evaluados con mayores detalles. Este estilo de vida guaraní, además es concebido sin mayores modificaciones o congelado a lo largo de cientos o miles de años. Más recientemente, a partir de la década del sesenta del siglo XX, e desarrollo de los enfoques funcional y procesual de los datos arqueológicos por parte de los académicos estadounidenses, representó una sustitución del interés por la etnicidad a cambio de una renovada preocupación por como operaban y cambiaban las culturas prehistóricas. Una despersonalización del pasado a favor de los procesos. Se considera que este cambio de paradigma no brindó a la arqueología las suficientes herramientas teóricas-metodológicas para que aportasen mayores reflexiones. El tema guaraní tiene una enorme complejidad, donde cada uno de sus enunciados constituye por sí mismos un desafío a la heterodoxia. La complejidad del estudio de lo “guaraní” hace que para su comprensión, sea necesario deconstruir su propio concepto. Esta desconstrucción exige una complementariedad entre distintas formas de relecturas, aquellas que provienen de los conceptos que hacen al plano arqueológico como las que nacen desde la etnohistoria. Para esta propuesta proponemos, en primer lugar, la revisión de los conceptos de estilo/etnia, estilo/función, que forman parte de la construcción e interpretación arqueológica de los restos identificados como guaraníes y en segundo lugar una revisión de la información etnohistórica, realizada desde una perspectiva regional y tratando de detectar en ella aquellas tendencias de “larga duración” (en el sentido braudeliano) que allí se manifiestan.
Los Conceptos de: Estilo/Etnia, Estilo/Función en la Interpretacion Arqueológica Las dificultades que planteaba su definición en el campo de la antropología, como era definida o utilizada en la arqueología y su relación ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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directa en la construcción de lo guaraní. De la misma manera se pensó en lo oportuno de revisar el concepto de “estilo” desde el punto de vista arqueológico y su relación con el concepto de etnicidad. Se consideró que esta era una vía posible para cuestionar arqueológicamente el rasgo más visible del axioma guaraní, la cerámica. El concepto de estilo lleva consigo diversas dificultadas y se advierten diferentes definiciones del concepto desde distintas posturas teóricas. ¿Cómo es definido? ¿Cuál es su función? ¿En donde reside? ¿Es usado por los arqueólogos para definir que asuntos? ¿Semejanzas estilísticas pueden ser vistas como expresión de etnicidad? Las respuestas a estas preguntas siguen continúan en la arena del debate. A continuación se presenta una breve síntesis de las diferentes posturas acerca del concepto de “estilo y sus dicotómicos etnia y función. En la escuela histórico cultural el estilo fue concebido como equivalente a grupo étnico. Como una forma tradicional “del hacer” de los grupos, y una manera de identificar culturas. Los artefactos u otros vestigios arqueológicos son considerados como representantes de las ideas de sus fabricantes. Reflejan las ideas compartidas que abarca la cultura extinguida, estos conceptos compartidos fueron llamados conceptos normativos o “plantillas mentales” (WATSON, LE BLANC e REDMAN, 1974, p. 80). Los arqueólogos utilizaban el estilo para realizar seriaciones, cronologías y casi siempre relacionan culturas arqueológicas con grupos étnicos actuales. Esta identificación ha sido dependiente de la premisa de que ciertas entidades culturales son monolíticas en el tiempo (JONES, 1997). En la escuela histórico cultural se consideraba que lo estilístico es diagnóstico por definición, e implica la manera en la que las variaciones morfológicas o formales entre los artefactos refleja las unidades históricoculturalmente significativas de la tradición étnica (SACKETT, 1982). Los objetos que se veían como estilísticamente similares eran interpretados como histórico-culturalmente vinculados en una secuencia donde uno había engendrado al otro. La tarea del arqueólogo era ordenar el registro arqueológico en unidades histórico-culturales distintivas de tradiciones étnicas, conocidas bajo diversos rótulos como estadios, culturas, industrias. De acuerdo a patrones de similaridad y diferencias artefactuales exhibidas por los conjuntos representativos de diferentes segmentos espacio-temporales del contexto arqueológico. En la “Nueva arqueología” el estilo es concebido en términos funcionales, designan elementos no adaptativos. Si bien no reniegan de la existencia del estilo lo separan totalmente de lo tecnofuncional. Detrás de las ideas adaptacionistas
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evolutivas subyace el principio costo-beneficio. La confección eficiente de un artefacto para una finalidad o finalidades dadas estará pautada por determinadas restricciones (ej. tecnológicas, forma, función, etc.). No obstante existe cierto umbral de variabilidad, es decir un artefacto pensado para una función o funciones determinadas puede ser llevado a cabo de distintas maneras, la variación dentro de este umbral es la que ha sido definida como estilística. Todo lo que queda fuera de lo tecnofuncional es el estilo, el cual cumple roles funcionales pero dentro de otro orden: ideofuncional y sociofuncional Binford define el estilo como un residuo e independiente de las variaciones funcionales y tecnológicas (BINFORD, 1965, p. 199). Los seguidores de la “nueva arqueología” reconocen que los artefactos expresan la ideología, la sociedad y la tecnología de quien fabrica un artefacto (MCPHERSON, 1997), pero el estilo (que serían un elemento no adaptativo) no interesa en el análisis. El desarrollo de los enfoques funcional y procesual de los datos arqueológicos representó una sustitución del interés por la etnicidad, a cambio de una nueva preocupación por como operaban y cambiaban las culturas prehistóricas. Una despersonalización del pasado a favor de los procesos. Robert Dunnell asienta las bases del evolucionismo neodarwiniano en su artículo “Evolutionary theory in archaeology” (1980). Este autor planteó la existencia de la dicotomía entre estilo y función desde una perspectiva evolucionista y procesualista. Hace esta diferenciación conceptual pues las funciones de los artefactos pueden ser definidas en términos de procesos evolutivos, mientras que en el estilo solo participan procesos estocásticos Dunnell (1978) define al estilo como elementos de diseño adaptativamente neutral, cuya función es la de transmitirla a la información social si es funcional. Con relación a la discusión sobre el tema de donde reside el estilo, el autor señala que es en cualquier elección que no tenga efecto en la adaptación genética del grupo de referencia. De acuerdo a Dunnell los rasgos que posen valor selectivo a través del tiempo pueden depender de la selección natural o de un conjunto de condiciones exteriores. Los rasgos que son adaptativamente neutros poseen un comportamiento diferente: su frecuencia no puede ser directamente estimada en términos de selección o de contingencias externas, pero si proceder de procesos aleatorios (O’BRIEN e LEONARD, 2001, p. 1-23). Para el pos-procesualismo el estilo es una forma referencial de hacer y de ser (HODDER, 1982). El estilo desempeña un papel activo en las estrategias sociales debido a su contenido simbólico, tiene función en la reiteración del sistema de creencias social e individual así como de la autoexpresión y la expresión grupal. Se expresa en las características codificadas de forma y contexto. Para esta
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postura el arqueólogo debería utilizar el estilo para comprender la expresión simbólica contextual y llegar al conocimiento simbólico de ese grupo. Hodder opina que los arqueólogos no pueden aspirar a identificar todos los grupos étnicos que existieron en el pasado, pero pueden identificar la etnicidad si por ella entendemos los mecanismos por los cuales los intereses de los grupos utilizan la cultura para simbolizar su organización interna en oposición y en competencia con los intereses de otros grupos (HODDER, 1979, p. 452). Los contenidos simbólicos están vinculados a las relaciones sociales y económicas entre los grupos étnicos, el estatus doméstico, a los grupos de edad y sexo. Ítems diferentes de la cultura material son manipulados por los diversos segmentos sociales para reforzar, legitimar, o rechazar identidades o poderes. Pero los ejemplos etnográficos en la región de Baringo manejados por Hodder han puesto en cuestión diversos postulados de los marcos explicativos norteamericanos (ej. la teoría de la interacción). En la región de Baringo obsevó que existía una amplia distribución geográfica de artefactos semejantes (ligados al mundo masculino) entre grupos culturales distintos. Mientras las calabazas decoradas eran exclusivas de uno de estos grupos y estaban relacionadas al mundo femenino (HODDER, 1982). Una amplia distribución geográfica de artefactos semejantes puede darse entre grupos culturales diferentes, por ejemplo si estos están ligados al mundo masculino. En tanto que otros artefactos exclusivamente femeninos son altamente diferenciados entre los mismos grupos, Hodder (1982) asume que no siempre se puede identificar categorías sociales o grupos lingüísticos, porque la cultura material no esta siempre necesariamente empleada para expresar competencia interna o externa. Muchas contradicciones étnicas pueden estar escondidas en el material arqueológico. Siguiendo este razonamiento parece válida la advertencia que no todas las semejanzas estilísticas pueden ser vistas como expresión de etnicidad. Existen riesgos al interpretar el registro arqueológico en forma simplificada. En esta perspectiva, la etnicidad no es un conjunto atemporal, inmutable de rasgos culturales (creencias, valores, ritos, reglas de conducta, lengua, prácticas de vestuario o culinarias, etc.) transmitidos de la misma forma de generación en generación en la historia del grupo. Hay una serie de factores que provoca acciones y reacciones entre un grupo y los otros en una organización social que no cesa de evolucionar Otra posición es la de Wiessner (1983). Define estilo como la variación formal en la cultura material que transmite información sobre identidad personal y social. La comprensión de la variación de estilo depende fuertemente de la comprensión del comportamiento que la generó.
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La autora considera que hay por lo menos dos aspectos distintos dentro del estilo y cada uno tiene diferentes referencias y diferentes tipos de información, generan distintos modelos de variación y por lo tanto requieren distintos tipos de análisis (op. cit.). Distingue entre “estilo emblémico (emblemático) y “estilo asertivo”. Define al estilo emblémico como la variación formal de la cultura material que tiene un referente diferente y transmite un claro mensaje a un sector definido de la población en relación con la conciencia de afiliación e identidad. Tiene una distribución inequívoca y discreta (op. cit.). El estilo asertivo es definido como la variación formal en la cultura material, la cual es personal y basada en la información que soporta la identidad individual. La postura de Wiessner se piensa que presenta grandes dificultades para separar los atributos estilísticos que contengan información social y aquellos que señalan diferencias o semejanzas personales principalmente en el registro arqueológico. Sacket por su parte define al estilo como inherente a la elección de los grupos dentro de un amplio espectro viable y alternativo de acabar algo funcional. El estilo es una variación isocréstica (isochrestico) (SACKET, 1986) por lo tanto reside en todos los aspectos de la variedad del artefacto, incluso en aquellas dimensiones en las cuales aparece como explícitamente funcional (JONES, 1997, p. 121). El concepto de estilo isocréstico es opuesto a la utilización deliberada de estilo, describiendo la selección que hace el hacedor del instrumento entre las opciones disponibles siempre que no afecten la función de la herramienta. Se asume entonces que algunas de estas variaciones isocrésticas pueden correlacionarse con lo étnico. Sackett argues that style resides in the choices made by artisans, particularly choices that result in the same functional end. He calls the results of such choices isochrestic variation, variants that are “equivalent in use” (SACKETT, 1982 apud HEGEMON, 1992, p. 522). En los abordajes neoevolucionistas la dicotomía estilo-función, etniaestilo han sido discutidos ampliamente. Para esta corriente no todo la similaridad es producto del mismo proceso (LEONARD, 2001). Los autores de esta postura hacen una distinción entre las similaridades que corresponden a procesos homólogos y las que tienen procesos análogos. Los homólogos: son producto del relacionamiento histórico y los análogos son el producto de respuestas similares para condiciones similares o convergencia evolutiva (LEONARD, 2001, p. 65-97). El problema del arqueólogo es saber cuales
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similaridades son homólogas y cuales son análogas para averiguar el flujo de la información cultural. Los arqueólogos evolucionistas hacen una distinción entre las tecnologías bajo la operación directa de la selección natural y aquellas que no lo son (DUNNELL, 1978; METZAER, 1981; NEIMAN, 1995 apud LEONARD, 2001). Un agente desgrasante que permita cerámicas de paredes más delgadas y que permita que el maíz pueda ser procesado más eficientemente, y con mayor poder nutritivo y haga posible que más gente pueda ser alimentada utilizando menos combustible, tiene consecuencias directas en términos de reproducción, y queda, por consecuencia, bajo la selección natural. Los símbolos utilizados para decorar estas vasijas, con todo, resulta poco probable que queden bajo la selección y su presencia es más probable que resulte de relacionamientos históricos u homólogos (LEONARD, 2001). Pero hay casos en que la pintura muchas veces es considerada como marca cultural o de relacionamiento históricos cuando en realidad puede tener un valor tecnofuncional. Algunas cerámicas están pintadas y pulidas alrededor de los labios, estas características hacen que el recipiente sea más efectivo en el momento de volcar su contenido, se reduce el desperdicio del líquido al traspasarlo a otro u otros ceramios (RICE, 1987; LEONARD, 2001, p. 83). For example, many attributes, we have a number of ideas to be evaluated. For example, many of the pots are polished and painted around the lip. Chris Van Pool has proposed that this trait might be functional, as polished and painted rims reduce spillage (RICE, 1987). Reduced spillage is a clear evolutionary advantage. This aspect of our research is just beginning, and we need to understand how small differences in technology may have led to major changes in reproduction (LEONARD, 2001, p. 83). De acuerdo a Siân Jones (1997) los artefactos son utilizados en prácticas sociales y estructuras sociales. El material cultural es polísémico y su significado debe variar según el momento e historia social particular, juega un activo rol en las estructuras de las prácticas culturales. Lo étnico es como se expresan determinados hábitos en términos de comportamiento y decisiones en un momento histórico y con unas condiciones sociales determinadas. Esto es lo que permite la objetivación de las diferencias entre los grupos: es lo étnico (JONES, 1997). Formas y estilos distintivos en la cultura material pueden ser mantenidos activamente y quedar detenidos en el proceso de señalización de la etnicidad, aunque otras formas y estilos traspasar los límites étnicos (BARTH, 1969; HODDER, 1982). El abordaje desarrollado por Jones sugiere que la elección de
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formas y estilos culturales distintivos utilizados en la señalización de los límites étnicos no es arbitraria. Por el contrario, la expresión autoconsciente de la etnicidad a través de la cultura material se vincula al carácter estructural del habitus75, el cual se infunde en todos los aspectos de las prácticas culturales y de las relaciones sociales que caracterizan una modalidad particular.
ETNIA/ESTILO: UNA PERCEPCIÓN REDUCCIONISTA? UN CASO DE ESTUDIO, SOBRE EL RIO URUGUAY En el caso de lo “guaraní”, el resultado del paradigma difusionista fue la percepción de una entidad étnica homogénea justificada por la presencia de elementos de su cultura material y pautas de comportamiento comunes, obviando o colocando en segundo plano toda heterogeneidad. Sin testear otros ítem del registro arqueológico, por ejemplo, el propio patrón espacial de asentamiento, el material lítico entre otros. Este estilo de vida guaraní, además, es concebido sin mayores modificaciones o congelado a lo largo de cientos de años. Una premisa básica de la interpretación que debe ser discutida y analizada es la insistencia con que los arqueólogos han asociado ciertos tipos particulares de cerámica – ej. tratamiento externo corrugado - con el grupo guaraní. Algunos atributos diagnósticos, percibidos primariamente como estilísticos, han diferenciado en el registro arqueológico a los guaraníes de otros grupos. Se ha soslayado o colocado en un plano secundario, no obstante, el hecho de que tras muchos de los atributos que se entienden por estilísticos son plausibles explicaciones funcionales y fundamentalmente tecno-funcionales. La bibliografía arqueológica relacionada al guaraní no ha hecho una mayor diferencia de estas cuestiones y cuando se ha definido lo guaraní ha sido a través de una percepción reduccionista del tipo: etnia/estilo. Una perspectiva que quiebre la dicotomía 75 La pertenencia a una clase subalterna supone el uso y consumo de elementos simbólicos que definen a ese sector social. También es inherente la producción y resemantización de los signos que forman parte de la cultura de las personas. Bourdieu explica este fenómeno con la noción de habitus, que se constituye por el conjunto de aprendizajes que se interiorizan en el individuo y que reproducen lo social. El habitus es una parte fundamental de la pertenencia a un sector social, junto con su ubicación en el modo de producción. Claro que puede ser modificado por circunstancias internas o externas al individuo, aunque para Bourdieu el consumo de signos entra en el campo de la estética popular, caracterizada por el pragmatismo y el funcionalismo, y le da preeminencia a la clase dominante como “el lugar por excelencia de las luchas simbólicas” (BOURDIEU, 1990, p. 30). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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estilo/tecno-función a favor de un campo integrado, y los abordajes conscientes de los ítems del registro como entidades polisémicas abren nuevas sendas para la interpretación. [...] As Shanks and Tilley (1987, p. 97) have indicated, a particular material form may remain the same, but its meaning will alter in different contexts; it will be ‘consumed in different ways, appropriated and incorporated into various symbolic structures according to historical tradition and social context’ On this basis it cannot be assumed a priori that similarity in material culture reflects the presence of a particular group of people in the past, an index of social interaction, or a shared normative framework (SHANKS and TILLEY, 1987 apud JONES, 1997, p. 126).
Si asumimos el acabado externo corrugado, el rodete y el desgrasante tiesto molido como tecno-funcional, se podría considerar como análogos76 (en términos de O’BRIEN e LEONARD, 2001) a los artefactos que presentan éstas características en América del Norte y en la América Meridional Atlántica. No hay conexión histórica ni física alguna. El tratamiento de superficie externo es un rasgo que ha sido observado en diversos conjuntos arqueológicos. El mismo puede ser explicado como una adaptación tecno-funcional para optimizar las vasijas destinadas a cocinar alimentos (RICE, 1987, p. 232). Además la utilización de tiesto molido mejora el comportamiento térmico del ceramio (RYE, 1981, p. 39-65). Por lo tanto, una función posible, dentro de las diversas que admite ese rasgo, es el aumento de la superficie del ceramio para optimizar la absorción del calor del fuego. Contribuyendo a esta interpretación el tratamiento externo corrugado se observa en conjunción a diseños cónicos, los cuales favorecen asimismo un aprovechamiento óptimo de la fuente de calor (FLORINES, 1998). Este tipo de tratamiento externo también facilita la manipulación y transporte del ceramio. “Rough surface provide a better grip, for example, for carring a heavy, wet vessel and may also improve heat transfer in cooking” (RICE, 1987, p. 203). Asumir una tal interpretación debilita la interpretación estócastica de este rasgo presente en muchas partes del mundo. No obstante, pueden observarse variaciones estilísticas (isocréticas en el sentido de Sakett) en la forma que se expresa el tratamiento externo corrugado. Estas variaciones sí poseen valor diferenciador, pueden representar desde diferencias personales intergrupales o grupales. Una forma de percibir heterogeneidad donde antes se percibía homogeneidad. 76 En oposición a homólogo. 164
En la América Meridional Atlántica el paquete tecnológico alfarero atribuido con exclusividad a la marca étnica guaraní estaba disponible para quien lo requiriera. Dependía de ciertas circunstancias adaptativas el utilizarle o no, siendo un tecnología más eficiente que otras por su durabilidad, ahorro de combustible, y compatibilidad con tamaños de contenedor mayores, entre otras ventajas. El punto de vista que sostiene esta argumentación explora alternativas al axioma que sostiene que determinados atributos de los conjuntos alfareros pueden ser considerados apriorísticamente como marcas étnicas. Existieron indiscutibles vínculos y conexiones históricas y físicas entre los grupos humanos de esta porción del continente, sin embargo, estos complejos procesos aparecen simplificados tras la búsqueda de las rutas de difusión de una cierta etnia expansiva que a su paso sustituye o margina a otros grupos étnicos. La introducción de una duda permite interrogar al registro hacia otras posibles interpretaciones, derivadas fundamentalmente de una percepción más compleja de la mutación permanente de los grupos étnicos y de sus interacciones. Es significativo mencionar que ya en la década del 50 Serrano mencionaba la posibilidad que el corrugado fuera una técnica anterior ya existente, a la estructuración cultural de los guaraníes. La cerámica guaraní es lisa, pintada o corrugada. La segunda de ellas es la más característica y constituye por sí sola el índice de más alto valor para afirmar la presencia de la cultura guaraní. La cerámica corrugada tiene casi el mismo valor pero su presencia en culturas que no son guaraníes hace pensar que esta técnica del corrugado sea anterior a la estructuración cultural de los guaraníes (SERRANO, 1952, p. 128). También Menghin (1957) advierte que la impresión corrugada es de filiación preguaraní, de un sustrato panamazónico que fue adaptado y muchas veces conservado por otras entidades. Menciona que se halló cerámica corrugada en sitios diferentes y en momentos cronológicamente tempranos para el NW Argentino, planteando una génesis también distinta (CAGGIANO, 1991, p. 131). Con las apreciaciones de Menghin se plantea nuevamente el problema cronológico. No hay dataciones suficientes para verificar si el corrugado es anterior o no a las formas clásicas pintadas de los guaraníes. De la misma manera no tenemos fechados para los ceramios pintados “guaraníes” en el Uruguay que se han hallado con poca frecuencia (ACOSTA Y LARA, 1979). De hecho, falta una base de datos, no existen dataciones para confirmar o no la antigüedad del corrugado en el Rio Uruguay ni en el delta del Paraná. La datación más antigua que se tiene es de 1030 D.C. en territorio misionero procedente del sitio Panambí (SEMPÉ, 1988 apud CAGGIANO, 1990, p. 429).
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La más temprana es en la isla Martín García 1545 D.C. (CIGLIANO, 1968). La explicación clásica de la presencia de rasgos guaraníes (básicamente alfarería), en el Rio de la Plata, consideraba su irrupción en coincidencia con el momento de la conquista. La datación obtenida, por termoluminiscencia para una urna corrugada con enterramiento, del sitio Arroyo Negro (Departamento de Rio Negro, Uruguay) es de 1.410 D.C. (GLUCHY, 2005). Es por lo tanto 100 años anterior a cualquier contacto con el europeo. De acuerdo a la interpretación aquí sustentada, se puede afirmar que el paquete tecnológico: rodete, antiplástico y formas cónicas ya era conocido, coexistiendo con el paquete tecnológico de las culturas básicas del litoral. Para someter a prueba esta hipótesis, no es suficiente la información disponible, es necesario continuar con la prospección y excavación de nuevos sitios logar una cantidad suficiente de dataciones para incrementar su fiabilidad teniendo en cuenta el error estadístico del método. Si el componente cultural alfarero del litoral, del 1400 decidieron adoptar el paquete tecnológico (rodete, antiplástico, formas cónicas, corrugado), la interrogante es saber por qué optaron por una tecnología diferente. La respuesta para esta interrogante en este momento sólo puede realizarse a nivel de hipótesis, que deben contrastarse contra el registro. Sin embargo, algunas reflexiones pueden ser hechas sobre esta cuestión. Los cambios tecnológicos se suceden en los grupos humanos cuando estos necesitan optimizar o mejorar distintos aspectos de sus estrategias de supervivencia. La tecnología cerámica que poseyeron los alfareros del litoral durante más de un milenio, era básicamente el modelado de la forma partiendo de una masa de arcilla o el pastillaje. Los antiplásticos utilizados incluían una variedad de aditivos (arena, ceniza, carbonatos, etc.) de irregular respuesta al estrés térmico. Asimismo, estos antiplásticos sumado a la técnica de modelado incide negativamente complicando el curado del material, lo cual dificulta formas mayores e inflexiones. La limitación esencial de esta tecnología es que no permite obtener contenedores de grandes volúmenes, mayores a 10 litros de capacidad (FLORINES, 1998, p. 180). No hay vasijas mayores descritas en la literatura para el componente alfarero básico del litoral. El nuevo paquete tecnológico (rodete, antiplástico de tiesto molido, formas cónicas y corrugado) posibilita trasponer esta limitante de los contenedores. Hipotéticamente se puede plantear que alguna de las variables que se mencionan a continuación pudieron influir en este cambio: necesidad de almacenar, problemas demográficos, estrés ambiental, conflicto, etc.. Aun en el caso de detectar alguno de estos indicadores en el registro arqueológico, se nos plantea el clásico dilema de que fue primero: el cambio
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a nivel tecnológico induce transformación social o es al contrario los cambios sociales son los que demandan una nueva tecnología.
AMBIENTE CULTURAL GUARANÍ O CULTURA “PAN-GUARANI” Desde una perspectiva continental, entendida como un intento de clasificación de los grupos culturales al momento de la conquista, la presencia cultural Guaraní – o más precisamente Tupí-Guaraní - comprende, de acuerdo a los datos etnohistóricos, a toda la vertiente atlántica sudamericana hasta el Río de la Plata. La revisión de la información etnohistórica nos indica un ambiente de intenso intercambio, desde las guyanas hasta el plata, cuyo principal elemento es la existencia de una “lengua general”, lengua que no puede mantenerse sin una permanente comunicación. Comunicación que es refrendada por numerosos testimonios sobre la circulación de noticias, de objetos y de gentes. Pero hay además un rasgo técnico que, entendemos, no ha sido suficientemente ponderado hasta el presente y que es la clave del sistema de comunicación, consistente en el dominio de la navegación fluvial y marítima. Basta observar el mapa hidrográfico del continente para darse cuenta que el área de influencia Tupí-Guaraní está directamente vinculada a las vias de navegación y comprender que dicha técnica permite intensidades de comunicación, por las distancias recorribles, por los volúmenes de gentes y cosas transportables, por los tiempos implicados, absolutamente incomparables con el transporte pedestre.
LA NAVEGACIÓN INDÍGENA Son numerosas las referencias al permanente ejercicio de la navegación de cabotaje (es decir, sin alejarse de la costa), las que no dejan lugar a dudas sobre la extensión de esta actividad (VARNHAGEN, 1927, p. 38, 266, 348, 354; ANCHIETA, 1933, p. 307; SOUTHEY, 1862, p. 119; LÉRY, 1580). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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El jesuita José Anchieta, testigo clave por su profundo conocimiento del medio, destaca constantemente cómo los indios se desplazan por “mar y tierra”. En una carta de su autoría fechada en 1565, encontramos un texto muy elocuente sobre las características técnicas y las dimensiones sociales y económicas que había alcanzado la navegación indígena. Respecto de los tamoyos, indios de la bahía de Guanabara, señala que: tenían aparejadas docientas o más canoas, que hacen, cada una, de la corteza de un solo árbol, poniéndoles otros pedazos de la misma corteza por bordas, muy bien atados con lianas, y son tan grandes que llevan cada una de ellas veinte a veinticinco y más personas, con sus armas y victuallas; y algunas más de treinta, y pasan las olas y mares tan bravos que es cosa espantosa y que no se puede creer, ni imaginar, sino quien lo ve y mucho mejor quien las pasa y si se les inunda, se tiran todos al agua, y la sacan a la playa, o en el mismo mar la desagotan y vuelven a meterse en ella, y van su camino, y sucede muchas veces que la gran furia de la tempestad se las hace pedazos, y ellos en su camino se van a tierra (ANCHIETA, 1933, p. 203, carta fechada en 1565). La navegación permitía también el rápido desplazamiento sobre kilómetros de distancia, trayectos que, por otra parte, eran sumamente dificultosos por tierra (Fernández de Oviedo, apud MEDINA, 1908c, p. 98; MEDINA, 1908b, p. 152, 256, 258, 314; DOCUMENTOS, 1925, p. 15). El conocimiento de las rutas parece estar ampliamente difundido entre los pobladores de la región. Es así que cuando Sebastián Gaboto llega al Río de la Plata en 1527, Francisco del Puerto, sobreviviente del viaje de Solís de 1516, le advierte con detalles sobre las dificultades de navegación existentes en el Paraná. En particular, la navegación indígena de la costa atlántica a la altura del territorio uruguayo es confirmada por varios testimonios (Ver LEZAMA, 2009). Entre ellos destacamos el que resulta de la pregunta 55ª del juicio realizado a Sebastián Gaboto a la vuelta de su expedición de 1527 (MEDINA, 1908b, p. 438, 466): […] sabe que, yendo la dicha armada a la isla de los Lobos, en el paraje de la tierra de los beguacharrúas, vinieron a las naos dos canoas de indios de la dicha nación [...] y el Capitán les preguntó por una lengua indio que era de la dicha nación que traía el dicho Capitán en la dicha nao (todos los resaltados son propios).
Tenemos referencias de que muchos de estos desplazamientos eran masivos, de grupos enteros, con su corolario en cuanto a relaciones inter e intra grupales: intercambio de genes, de regalos, ataques por sorpresa, robos y saqueos, etc. En este sentido Gabriel Soares de Sousa nos informa que los tupinambás de la Bahía eran enemigos de otros tupinambás vecinos: “e faziam168
se cruel guerra uns aos outros por mar; onde se davam batalhas navaes em canôas” (SOARES DE SOUSA, 1938, p. 362). Cuando Francisco de Mendoza llega al río Paraná, viniendo desde el Perú en 1543, le salen al encuentro “300 canoas de indios” quienes “comenzaron a levantar las palas en alto en señal de amistad” (DÍAZ, 1836, p. 70). La construcción de embarcaciones implicaba una actividad económica destacable en el contexto de una economía con una mínima acumulación de esfuerzo social; llegando a utilizarse como medio de pago. Sebastián Gaboto, en 1527, fue informado por Francisco del Puerto como “los chandules (guaraníes) que son indios desta mesma jeneración questan sesenta o setenta leguas el paraguay arriba” obtenían los metales preciosos trocándolos por “quentas e por canoas” (RAMÍREZ, 1528 apud RELA, 2001, p. 111). Existían distintos tipos de embarcaciones indígenas. Normalmente eran canoas monoxilas, fabricadas con un solo tronco, llamadas “igará”. Varnhagen realiza numerosas observaciones sobre la actividad naval de los indígenas y señala que algunas eran enormes, remadas hasta por 60 hombres, pero que “outras vezes era só uma cortiça de arvore, com pontaletes no meio, e apertada com cipós, para ficar convexa, e lhes chamavam ubás” (VARNHAGEN, 1927, p. 38). Capistrano de Abreu, por su parte, describe otro tipo de embarcación empleado en la costa norte del Brasil, construida con paja, lo que nos está mostrando una variedad de tecnologías que a su vez son reflejo de la inversión en comunicación realizada por estas sociedades: (las embarcaciones eran), de uma palha comprida como a das esteiras de tabúa que fazem em Santarem, a que elles chaman periperi, a qual fazem em molhos muito apertados com umas varas como vimes [...] com estes molhos atados em umas varas grossas, faziam uma feiçao de embarcaçoes, em cabiam dez a doze indios, que se remavam muito bem [...] muitas vezes fazerem os Caetés dessa palha tamanhas embarcaçoes que vinham nellas, ao longo da costa, fazer seus saltos aos Tupinambás junto da Bahía, que sao cincoenta leguas (VARNHAGEN, 1927, p. 38). También el francés Jean de Léry, quien residiera en 1557-58 en el establecimiento francés de Río de Janeiro hizo observaciones sobre las características de las embarcaciones indígenas y su utilización. Destaca la capacidad de las canoas, que podían contener hasta cincuenta personas y la técnica de navegación de cabotaje: Cuando van por el agua (lo que hacen seguido) costeando siempre la tierra y sin entrar mar adentro, se acomodan en sus barcas que denominan Ygat, las cuales (son) fabricadas cada una de ellas de una sola corteza de árbol, que pelan expresamente de arriba hacia abajo a esos efectos, son sin embargo tan grandes, que cuarenta o cincuenta personas pueden caber en una de ellas. Así
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bogando parados según su costumbre, con un remo chato en sus dos extremos, al cual sostienen por el medio, dichas barcas (chatas como son) no se hunden en el agua más de lo que lo haría un tablón, son muy gáciles de conducir y manejar. Es verdad que no podrían soportar el mar un poco fuerte y agitado, y menos la tormenta: pero cuando el tiempo está calmo, nuestros salvages van a la guerra, como verán algunas veces más de sesenta (canoas) en una flota, las que siguíendose de cerca van tan rápido que inmediatamente se las pierde de vista. Esas son entonces las armadas terrestres y navales de los Tupinambás en los campos y en el mar (JEAN DE LÉRY, 1580. traducción nuestra). Es en el marco de la nueva realidad surgida del dominio de la navegación en que debemos comprender las transformaciones culturales que se producen en las cuencas del Amazonas, del Plata y toda la costa Atlántica en los últimos cuatro milenios. Es ella la que conforma nuevos “territorios” -cuyo corazón son las vías de circulación y no las tierras adyacentes- donde se expresan las nuevas modalidades culturales. Es en el marco de estos que debemos entender lo particular y lo general de los comportamientos identificados. A su vez, la existencia de esa intensa red de comunicaciones y el intercambio cultural que supone nos lleva a plantear el tema de la difusión de prácticas y comportamientos cuando estas son compatibles con los desarrollos locales y trasladar al escenario prehistórico el problema de la definición de identidades culturales y su trascendencia en el desarrollo histórico. ¿De qué estamos hablando cuando señalamos diferencias arqueológicas? Y, recíprocamente: ¿de qué estamos hablando cuando señalamos semejanzas? Nuestra hipótesis es que la generalización de la técnica de la navegación en canoas, con la necesaria interrelación que esta supone generó un ambiente cultural único -que bautizamos como “panguaraní”- caracterizado por compartir múltiples prácticas culturales, conjuntamente con la permanencia de adaptaciones locales; ambiente que, en lo fundamental, es el resultado de la transformación de las poblaciones que originalmente ocupaban la región.
ALGUNOS DATOS DE LA REALIDAD ETNOHISTÓRICA AL MOMENTO DEL CONTACTO La documentación histórica tampoco deja dudas al respecto. Todos los cronistas coinciden en la masiva presencia de la cultura tupí-guaraní en la región,
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desde el Amazonas hasta el Plata y desde el Atlántico hasta los contrafuertes andinos. Por ejemplo, en la carta que Luis Ramírez - miembro de la expedición de Gaboto- dirige a su padre en 1528 desde la desembocadura del San Salvador en el Río Uruguay, en el “puerto de las naos”, leemos: […] aquí con nosotros está otra generación que son nuestros amigos los cuales Se llaman guarenis y por otro nombre chandris estos andan derramados por esta tierra y por otras muchas [...] Estos señorean gran parte de esta india y confinan con los que habitan en la sierra (i.e. los Andes) (RAMÍREZ, 1528 apud RELA, 2001, p. 108).
También concuerdan en la extensión y la intensidad de sus comunicaciones a lo largo de miles de kilómetros de ríos y costas (MEDINA, 1908, p. 260). Citemos al respecto a Alvar Núñez Cabeza de Vaca, quien en 1541, cuando describe a las poblaciones que encuentra en su travesía desde Santa Catalina hasta Asunción, afirma que “esta generación de los guaranies es una gente que se entienden por su lenguaje todos los de las otras generaciones de la provincia” (CABEZA DE VACA, 1853, p. 558). En el mismo sentido, Eurico Schmidel, quien vino con Pedro de Mendoza en 1536 (testigo valioso por su larga experiencia en la región y porque su testimonio, destinado al público alemán, no está pensado para justificar su actuación como normalmente sucede con los autores ibéricos) (CHASE, 1964, p. 28) señala, en 1554, que los tupíes “tienen idioma parecido (al de) los Carios (guaraníes), con los que bien poca es la diferencia que hay” (SCHMIDEL, 1903, p. 281). Otra prueba de la extensión de la presencia guaraní la aporta el padre José de Anchieta, integrante del primer grupo de jesuitas enviado al Brasil que llegó en 1549 junto al primer gobernador de Bahía, Thomé de Souza. En 1584, desde el colegio jesuita que fundara en San Pablo de Piratininga, Anchieta refiere que: “Todo êste gentio desta costa, que também se derrama mais de 200 leguas pelo sertao, e os mesmos Carijós (carios o guaraníes) que pelo sertao chegam até ás serras do Perú, teem uma mesma lingua que é grandissimo bem para su conversao” (ANCHIETA, 1933, p. 302). También Gabriel Soares de Sousa, respecto de las poblaciones de la costa del Brasil, en 1587 traza un panorama común desde Pernambuco al Río de la Plata: “Aunque los Tupinambás se dividan en bandos, y estén enemistados unos con otros, todos hablan una misma lengua, que es casi general por la costa del Brasil, y todos tienen las mismas costumbres en su modo de vivir y gentilidades” (SOARES DE SOUSA, 1938, p. 364). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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La elección de la lengua tupí-guaraní como instrumento de comunicación entre las distintas parcialidades es un fenómeno precolombino que demuestra el prestigio de la cultura tupí-guaraní en toda el área. La lengua es un vehículo cultural y la preponderancia del tupí-guaraní es fundamento suficiente para suponer que numerosos rasgos del comportamiento cultural de sus hablantes se difundieron junto a su lengua. El valor del tupí-guaraní como “lengua general” (según la expresión de varios cronistas) queda claro desde las primeras expediciones que llegan al área sudatlántica, señalándose, con relación a la cuenca del Plata, que indios de otras parcialidades tenían “ynterpretes guaranies” a través de los cuales se comunicaban con los españoles77 Otro aspecto a considerar es el de las alianzas bélicas – que siempre aparecen como variables y circunstanciales – que se establecían entre distintas parcialidades, incluyendo generalmente algún componente panguaraní (MEDINA, 1908b, p. 261, 468). Estas alianzas implican desplazamientos de personas y convivencias más o menos prolongadas entre miembros de distintos grupos. En estas circunstancias necesariamente deben comunicarse, intercambiar ritos, costumbres, informaciones y, seguramente, genes. A este respecto son reveladores los constantes episodios de alianzas entre parcialidades que se producen durante la conquista de la cuenca del Plata. Mencionemos el caso de Buenos Aires que, luego de su segunda fundación, sufrió el ataque de “gente de varias naciones” – entre ellos querandíes y charrúas - encabezado por Tabobá, cacique guaraní elegido “por voto común de todos los aliados” (LOZANO, 1874, p. 240). Complementando este panorama hay continuas referencias a la circulación de noticias y diversas evidencias de que los indios conocían lo que sucedía aun a miles de kilómetros de distancia. También tenemos testimonios de desplazamientos sin que se explicite los motivos: estando Gaboto en Sancti Spíritus, tiene noticias por intermedio de un grupo de “Querandíes” que estaba de visita entre los “Chandules” de las riquezas de los Andes, así como de las dificultades del camino hacia el oeste debido a la falta de agua; e incluso le informan “que de la otra parte de la sierra (Andes) confinaba la mar y según dezian crecia y menguaba mucho y muy supito” (MEDINA, 1908a, p. 163). Sabemos asímismo que a Gaboto se le advirtió que “si quería ir por tierra a las minas del Paraguay, que habían de pasar por unas 77 “Información de los méritos y servicios del Capitán Gonzalo de Mendoza” Asunción, Febrero 15 de 1545), testimonio de Nicolás Colina, In: SCHMIDEL (1903, p. 383). 172
marismas o lagunas que duraban espacio de tres días, e que habían de dormir una noche en las dichas lagunas”78. Definido este “ambiente panguaraní” de permanente comunicación y circulación de gentes, objetos e ideas, es necesario plantear el problema de cuál era efectivamente el grado de diferenciación entre las distintas parcialidades indígenas distinguidas por los primeros cronistas, como los “Charruases, Guaraníes, Chanaes, Chanaes, Atembures, Carcaraes, Carandíes y Atambúes”, mencionados por Diego García al final de su Memoria referida a los acontecimientos que protagonizó en 1527, quien, marcando claramente la dificultad de considerarlos como pertenecientes a etnias separadas, señala que “todas estas generaciones son amigos e están juntos e hácense buena compañía” (MEDINA, 1908c, p. 244). Como hemos visto, los investigadores que se han ocupado de este tema han estado más preocupados por encontrar diferencias – que sin duda las hay - que identidades y similitudes. La actual discusión del concepto de “etnia” con relación a lo “guaraní” permite hacerse una idea de la complejidad del problema (GLUCHY, 2000). Con respecto a lo que nos ocupa, señalamos que en las actuaciones realizadas como consecuencia de la expedición de Gaboto (1527) se emplean indistintamente, como si fueran equivalentes – tanto en las preguntas como en las respuestas - las denominaciones “chaneses timbúes” y “charrúas timbúes” (MEDINA, 1908a, p. 185, 190, 199). Debe tenerse en cuenta que las diversas denominaciones pueden referirse tanto a distintas familias o caciques – dentro de la misma etnia - o algún aspecto particular, a los ojos del “otro”, de su comportamiento. Lafone – traductor y comentarista de Schmidel - sostiene que “los Timbú derivaban su sobrenombre de los adornos que se ponían en las narices, y fueron los Guarani quienes se lo aplicaron” (SCHMIDEL, 1903, p. 59). El problema de la identificación de los grupos por los nombres que les atribuyen los cronistas e historiadores es que esas denominaciones no implican necesariamente distancias culturales. En este sentido es interesante la referencia que aporta Díaz de Guzmán con relación a los indios timbúes de la zona de Santa Fé: “todas las veces que se les muere un pariente, se cortan una coyuntura del dedo de la mano, de manera que muchos de ellos estan sin dedos por la cantidad de deudos que se les han muerto” (DÍAZ, 1836, p. 10), práctica cultural que luego encontraremos referida a los charrúas y minuanes de la Banda Oriental 78 Interrogatorio presentado por Sebastián Caboto en el pleito que le sigue Catalina Vázquez - Sevilla, 27 de Agosto de 1530 (Archivo de Indias, PATRONATO, 1-2-1/8, ramo IV, pieza I, fols. 67-79). Testimonio de Juan de Valdevieso, “gentil-hombre de la armada”, In: MEDINA (1908b, p. 466). ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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y el Entre Ríos. Inversamente, encontramos descripciones de rasgos culturales reconocidos por la historia y la arqueología como típicamente tupí-guaraníes referidos a parcialidades que, de acuerdo a la visión tradicional, no pertenecerían a ese grupo. Por ejemplo, Félix de Azara describe el uso del “tembetá” –adorno facial característico de los tupí-guaraní- entre los charrúas (AZARA, 1896, p. 191). Por su parte, Lozano menciona a los “timbues, quiloasas y colastinés” como “naciones del distrito de Santa Fé” que practicaban el canibalismo (LOZANO, 1873, p. 428), comportamiento que es típicamente tupí-guaraní79. Asímismo, esos documentos están generalmente destinados a justificar acciones personales, normalmente frente a jurados europeos, por lo que, en ese contexto, la descripción que se haga tanto de los amigos como de los enemigos está pensada para justificar o condenar los hechos en cuestión. Tampoco debe restarse importancia a las dificultades que presenta la comprensión de la fonética y fonología de las lenguas indígenas, aun para aquellos europeos que se abocaron a esa tarea, como lo hicieran los sacerdotes jesuitas. Uno de ellos, Antonio Vieira, quien vivió en Brasil desde 1641, menciona que muchas veces, pese a “estar com o ouvido applicado á boca do Barbaro, e ainda do intérprete [...] nao percebem os ouvidos mais que a confusao” (VARNAGHEN, 1927, p. 25). También debemos considerar que, muy probablemente, aunque la base cultural sea la misma, la adaptación a distintos ecosistemas – estamos hablando de un área que abarca la tercera parte de Sudamérica - debe haber determinado comportamientos distintos. Anchieta señala claramente estas diferencias de comportamiento – en función de los ecosistemas, diríamos hoy - en el interior del propio grupo tupí-guaraní (ANCHIETA, 1933, p. 329).
LAS TRANSFORMACIONES PROVOCADAS POR EL DESCUBRIMIENTO Y LAS LIMITACIONES QUE ESTAS IMPONEN AL MODELO ETNOLÓGICO Otro elemento que no ha llamado la atención de los investigadores es preguntarse sobre la desaparición, luego de consolidada la realidad colonial, con las parcialidades identificadas como guaranies que habitaban en la zona: ¿Qué pasó con los Guaraníes de Asunción, y los “Guaraníes de las Islas”? ¿Qué pasó 79 Por otros comportamientos cf. LAFONE. In: SCHMIDEL (1903, p. 60), DE ANGELIS, apud DÍAZ (1836). 174
con los Carios, Chandules, Carijós, Querandíes y otros sinónimos de “Guaraní” que poblaban la cuenca del plata? Prácticamente desaparecen en las primeras décadas de la conquista y será recién, Misiones Jesuíticas mediante que el término “Guaraní” vuelve a hacerse popular en documentos y crónicas. ¿Son los mismos “guaraníes”? Los supervivientes de los que ocupaban toda la cuenca. ¿Son un grupo marginal que escapó a los estragos de la conquista? ¿Son otras parcialidades rebautizadas por obra de los jesuitas? ¿Cómo desapareció lo que, de acuerdo a todos los cronistas constituía la mayor concentración demográfica en la región? La explicación militar/sanitaria es completamente débil. ¿Dónde están las masacres y genocidios? ¿No hubo testimonio de epidemias que aniquilan poblaciones enteras? ¿Porqué sobreviven los indios de San Pablo? La falta de respuesta a esas preguntas nos lleva a la necesidad de reconstruir el relato histórico asumiendo que la llamada “conquista” del Río de la Plata comienza con la derrota militar de los castellanos y forzosa alianza con las poblaciones locales. Serán los europeos los que se acojan a la cultura panguaraní y no a la inversa. El problema es que estos, los indios, en su mayoría, los autoidentificados como “guaraníes, simplemente cambian su nombre y pasan a formar el contingente “blanco – conquistador” del que nos hablan los documentos. A partir de ese cambio el “indio” pasa a ser el que quedó fuera de la posibilidad de cambiar de identidad. Sin embargo, cambio de nombre no implica cambio de pautas culturales y, en los hechos, serán indios discriminando indios.
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CAPÍTULO 8 OS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS GUARANI DO LITORAL SUL DO BRASIL, URUGUAI E ARGENTINA: REGISTROS ATÉ 2013 Francisco Silva Noelli80 Rafael Guedes Milheira81 Gustavo Peretti Wagner82
O objetivo principal da lista de sítios Guarani das planícies costeiras da Região sul do Brasil, Uruguai e Argentina é a pesquisa e o reconhecimento público do patrimônio arqueológico. O reconhecimento do patrimônio arqueológico é fundamental para o seu destino futuro, tanto para a preservação e cumprimento da legislação e das normas vigentes sobre proteção e gestão, quanto para a sua valorização pelas comunidades locais. Na medida em que cresce o interesse pelo tema, seja de parte dos pesquisadores e da sociedade, desenvolvem-se parâmetros para a preservação e identificação com o patrimônio arqueológico. A distribuição geográfica litorânea mostra que, em nível mais geral, os sítios e demais evidências arqueológicas Guarani ocorrem entre a Baía de Paranaguá e a foz dos rios Uruguai e Paraná, mais a zona costeira da Província de Buenos Aires até o sul do rio Salado. Estes sítios integraram uma grande rede de assentamentos em uma vasta área do Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai, cuja antiguidade remonta há pelo menos dois mil anos. (BROCHADO, 1984; NOELLI, 2004). Poucos estudos regionais deram conta de investigar a articulação espacial e temporal da maioria dos sítios arqueológicos, para verificar os tipos de relação entre os ocupantes dos assentamentos. A busca de elementos arqueológicos e 80 Professor aposentado da Universidade Estadual de Maringá, Paraná.
[email protected] 81 Professor do Bacharelado em Antropologia/Arqueologia e do Programa de Pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal de Pelotas. Pesquisador do LEPAARQ/UFPel -
[email protected]. 82 Arqueólogo e Historiador. STRATA – Consultoria em Arqueologia e Patrimônio Cultural –
[email protected].
históricos para estabelecer os processos de ocupação local/regional e quais foram os tipos de relação entre os sítios nessas escalas, também é um objetivo do futuro que está sendo gradativamente construído. Considerando que as conclusões sobre os vazios demográficos devem ser enfrentadas com cautela deveriam sugerir novas propostas de investigação. Especialmente pelo fato dos Guarani não originarem, no passado, assentamentos isolados. Como demonstram as evidências arqueológicas e históricas, eles, ao contrário do que se verifica nos últimos 200 anos, construíram redes de aldeias inter-relacionadas. Algumas áreas pesquisadas não apresentam evidências de forma consistente e repetida, como é o caso do município de Joinville e adjacências, parcialmente investigados desde o início do século XX, como mostra Dione Bandeira no capítulo 1. Outro exemplo é a extensa faixa costeira entre o sul do município de Rio Grande e as cercanias de Colônia do Sacramento, que também não apresentam registros consistentes e repetidos da presença Guarani, apresentando, contudo, uma alta densidade de sítios do tipo Cerrito, com destaque para a bacia da Lagoa Mirim, Laguna dos Patos e litoral norte uruguaio (SCHMITZ, 1976; MAZZ, 2010). Entendemos que o caso de Joinville é consequência do foco sobre as áreas de investigação, mais dirigido às partes próximas do oceano em demanda dos sambaquis, enquanto que o interior raramente foi alvo de levantamentos sistemáticos. No caso da faixa entre o sul de Rio Grande e Colônia do Sacramento, deve-se a uma conjuntura de limitações ecológicas para os padrões de assentamento Guarani, associada à elevada densidade de cerritos e, proporcionalmente, uma alta taxa demográfica dos Minuanos e Charruas. Vários indícios revelam que as áreas mais distantes das praias são praticamente desconhecidas e ignoradas pelos arqueólogos, apesar do seu grande potencial para ocupação Guarani. É o caso dos terrenos não alagadiços das planícies, das faldas de morros e dos baixos cursos dos rios entre Paranaguá e o rio Mampituba, constituindo áreas cobertas por Mata Atlântica de porte variado, onde existe abundância dos recursos explorados tradicionalmente, justamente as áreas com o maior potencial para a ocupação Guarani. O reconhecimento arqueológico da ocupação do vale do Maquiné, no Rio Grande do Sul, é o maior exemplo do que poderá ser encontrado ao norte do Mampituba. Assim, há muitos temas e problemas inteiramente abertos à pesquisa. Um deles é a necessidade de buscar uma definição mais elaborada dos sistemas de exploração e assentamento entre a linha de praias e o interior. Prevemos que essa faixa com largura média de 40-10 km ainda revelará uma quantidade muito maior de registros de sítios em relação ao número atual.
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Existem, por outro lado, áreas pesquisadas perto da praia há muitas décadas, por vários arqueólogos, com acúmulo de informações e a constatação de importante concentração de sítios. É o caso da longa faixa entre Florianópolis e Rio Grande, que apresenta uma continuidade e densidade importantes, mesmo na zona de matas ciliares e de capões de mato junto da Lagoa dos Patos. Apenas um trecho de 50 km do litoral sul de Santa Catarina é pouco conhecido, da margem norte do rio Mampituba até o sul do rio Araranguá. Os deltas dos rios Paraná e Uruguai também possuem diversos registros de sítios, mas o levantamento arqueológico é muito incompleto em relação à grande extensão do território onde estão inseridos. A quantidade de registros locais ou regionais também é um problema a ser enfrentado, pois existem casos onde um único assentamento foi considerado como diferentes sítios arqueológicos. Tal problema resulta do modo como os arqueólogos concebem os Guarani, especialmente quando adotaram a teoria da degeneração, que aceita apenas o pressuposto de que eles tinham baixa demografia e ocupavam pequenas aldeias por curto período, por causa de supostas limitações ambientais (cf. NOELLI e FERREIRA, 2007). Outras vezes o pressuposto foi registrar cada mancha de terra preta ou cada concentração de fragmentos cerâmicos como um sítio, mesmo que elas estivessem perto de outras manchas ou concentrações. Tais predições, pelo menos no Brasil, foram possíveis por causa de uma deficiência crônica, baseada no costume de aceitar o resultado de prospecções apressadas, metodologicamente incompletas ou erradas, raramente revisadas por pesquisas arqueológicas dedicadas a estabelecer os limites espaciais e cronológicos de cada sítio arqueológico. Outro problema em relação às lacunas de registros arqueológicos surge quando consideramos as cidades litorâneas de médio e grande porte. Por exemplo, Paranaguá, Guaratuba, Florianópolis, Joinville, São José, Porto Alegre, Torres, Capão da Canoa, Tramandaí, Osório, Pelotas, Rio Grande, e a zona metropolitana de Buenos Aires, possuem evidências registradas no final do século XIX e início do século XX. Contudo, atualmente, tais registros são praticamente inacessíveis, encontrando-se embaixo das crescentes malhas urbanas, fato que leva ao emprego de pesquisa sobre a história local, contatos mais estreitos com as comunidades, etc.. O impacto sobre essas evidências arqueológicas também é causado pelas pequenas cidades, vias rodoviárias e ferroviárias, portos, grandes obras, condomínios, extração de sedimentos, etc.. Tais empreendimentos são implantados nos terrenos mais elevados da Planície Costeira, aqueles mais secos e propícios ao assentamento humano, geralmente onde as populações indígenas também faziam suas aldeias e acampamentos. Porém, mesmo com a
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necessidade de maiores e mais articuladas pesquisa futuras, a lista de sítios que apresentamos revela um quadro de ocupação Guarani no sul do Brasil, Uruguai e Argentina.
RIO GRANDE DO SUL83 O litoral norte do Rio Grande do Sul apresenta um sistema de ocupação e povoamento Guarani circundante às regiões lacustres e terraços fluviais, conforme demonstrado por Gustavo Wagner no capítulo 2. No entanto, a maioria dos vales fluviais que descem do Planalto Meridional e alimentam o rosário de lagoas costeiras foram pouco investigados, sendo conhecidos apenas os cursos médio e inferior do rio Maquiné, bem como o curso Inferior do rio Três Forquilhas. Contudo, tais dados nunca foram efetivamente sistematizados e analisados. Apenas Dias (2003) empreendeu a caracterização das ocupações Guarani para o vale do Rio dos Sinos, que nasce no litoral norte, mas tem curso voltado para a Depressão Central do Estado. As pesquisas realizadas no litoral central do Rio Grande do Sul revelam que os Guarani ocuparam e exploraram ambientes distantes da sua tradicional área de cobertura florestal, como mostra Jairo Rogge no capítulo 5. Nesta parte há pouca cobertura florestal e predomínio das matas ciliares, capões de mato, banhados e superfícies arenosas e/ou dunas. A planície a oeste de Osório-Pinhal, que se estende pela várzea do rio Gravataí e conecta o litoral à Bacia do Guaíba, também é pouco conhecida, apesar dos vários registros de sítios. Logo ao sul, na restinga que divide o Oceano Atlântico da Laguna dos Patos, o levantamento preliminar constatou um padrão de ocupação semelhante ao dos litorais central e norte (PESTANA, 2007). A Bacia do Guaíba foi detalhadamente estudada por Adriana Schmidt Dias e Sergio Baptista da Silva no capítulo 4 onde as praias, pontais e promontórios graníticos foram priorizados nas prospecções. No entanto, quando examinamos a Laguna dos Patos, uma continuidade do Guaíba, verificamos a imensidão das áreas com pouco ou nenhum levantamento na margem oeste e na porção Setentrional (especialmente na zona das lagoas no entorno da Lagoa do Casamento, dos rios e dos banhados). Podemos incluir o baixo vale dos rios que descem o Escudo Cristalino e as diversas ilhas da laguna. A exceção é o médio-alto rio Camaquã, que também revelou concentração de registros arqueológicos. 83 Ver os Mapas 01 e 02 com a localização dos sítios Guarani entre o Estado do Paraná e a Argentina. 180
A porção Meridional da laguna dos Patos é pesquisada desde a década de 1950, onde foram mapeados, datados e estudados sítios que compõem domínios territoriais articulados entre o litoral e o Escudo Cristalino, conforme Milheira no capítulo 6. Contudo, devido a grande extensão dessa área, resta ainda muito espaço para ser investigado, na própria laguna, no rio São Gonçalo e nos seus vários afluentes. O Litoral sul do Rio Grande do Sul é uma área pouco investigada. Houve pesquisa na porção Meridional, no município de Santa Vitória do Palmar (SCHMITZ, et al. 1997), onde predomina a cerâmica da Tradição Vieira, com escassas evidências de cerâmica Guarani. Mas a extensa área do Banhado do Taim e das zonas de influência das Lagoas Mirim e Mangueira ainda precisa de investigações para que seja possível definir os limites da expansão Guarani na região.
SANTA CATARINA O conhecimento dos arqueólogos sobre litoral catarinense é muito heterogêneo. No litoral norte, o trabalho de Bandeira no capítulo 1 problematiza exatamente a quase total ausência de sítios Guarani, sobretudo na baía de Babitonga. Apesar de tais evidências, a região ainda precisa de um levantamento mais amplo e exaustivo. No litoral central, por sua vez, há um aumento considerável de sítios Guarani, sobretudo no entorno de Florianópolis, onde muitas pesquisas revelaram um panorama ocupacional bastante intenso, com uma cronologia regional que alcança 900 A.P. Contudo, a porção entre os municípios de Biguaçu e o sul de Joinville revelou poucas evidências além dos sambaquis, facilmente encontrados devido a sua monumentalidade e ao processo de fabricação de cal e extração de material para pisos rodoviários. Consideramos de fundamental importância o levantamento das planícies e dos baixos vales que deságuam nos oceanos, a exemplo dos rios Tijucas, Itajaí e Itapocu, praticamente ignorados até o presente. O litoral sul do Estado de Santa Catarina é, sem dúvida, uma das regiões mais pesquisadas do litoral brasileiro. Como mostramos acima, existe uma continuidade de sítios entre Laguna e Araranguá. Contudo, as planícies no entorno de Laguna e de Tubarão também são quase desconhecidas, assim como os baixos vales da região.
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PARANÁ É o Estado brasileiro com menor incidência de sítios Guarani, cuja baixa quantidade de registros é proporcional a curta extensão do litoral, com pouco mais de 80 km. Em compensação as baías de Guaraqueçaba, Paranaguá e Guaratuba, mais as diversas ilhas litorâneas abrigam centenas de sambaquis, registrados desde os anos 1940 (BIGARELLA, 1950-1951; RAUTH, 1974; BLASI e outros, 1987). A maioria dos baixos cursos dos rios presentes nos vales da Serra Geral foi pouco investigada, constituindo áreas para futuras pesquisas. Os sítios Guarani foram registrados principalmente por Fernandes (1947) e por Chmyz (1976, 2002). Considerando a grande quantidade de registros para Curitiba e áreas próximas, é muito grande o potencial para ocorrência de sítios dos ricos ecossistemas dos vales que ligam o planalto curitibano ao litoral, por um raio aproximado de 70 km a partir de Paranaguá.
URUGUAI O litoral Atlântico do Uruguai, devido a sua cobertura vegetal predominantemente campestre, também apresenta escassa presença Guarani, cujo padrão de assentamento de aldeias é dependente de áreas com cobertura arbórea. A baixa frequência de sítios Guarani talvez pudesse ser explicada pelo fato de que tanto o litoral atlântico como a bacia hidrográfica da lagoa Mirim tenham sido massiçamente ocupadas pelos construtores de cerritos (BRACCO et al., 2008, MAZZ, 2010). Sabe-se, através de dados arqueológicos, que os construtores de cerritos ocuparam os corpos lagunares litorâneos e os banhados desde, pelo menos, 4500 A.P., mantendo pleno domínio territorial até a chegada, primeiros das populações Guarani no atual Rio Grande do Sul e, depois, a partir do século XVII, pelos europeus. Nesse sentido, a baixa ocorrência de sítios Guarani na faixa atlântica uruguaia pode ser decorrente da impossibilidade da manutenção do seu sistema tradicional de assentamento dentro ou à beira das florestas e mata ciliriares, associada à resistência dos Minuano e Charruas. Sabe-se que um dos fatores fundamentais para a escolha dos assentamentos é o meio ecológico que permita o manejo agroflorestal e a implantação da agricultura de coivara, fundamentais para a economia Guarani (BROCHADO, 1984; NOELLI, 1993). No litoral uruguaio são poucos os locais que permitem reproduzir esse padrão de
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assentamento, basicamente restritos a bacia do rio Uruguai. Consideramos que a expansão para os territórios ao sul da Lagoa Mirim poderia ter ficado restrita à caça e coleta em incursões pontuais. Consideramos ainda, com base em dados arqueológicos e históricos, que ocorreram diversos tipos de relação política entre os Guarani, os Minuano e os Charrua, sendo um tema que ainda precisa ser investigado.
ARGENTINA A zona metropolitana de Buenos Aires, as ilhas do delta do rio Paraná e partes do litoral da Província de Entre Ríos, forneceram registros sítios Guarani desde a década de 1870. Contudo, diversas razões mantiveram as pesquisas de levantamento arqueológico de baixa intensidade, resultando em poucos registros em proporção ao grande tamanho do território argentino no litoral do rio da Prata. Felizmente, a recente retomada das investigações sobre a Arqueologia Guarani promete um futuro promissor para novas descobertas, especialmente para apresentar um panorama mais exato sobre a quantidade de sítios na região (Pérez et al 2009). Um aspecto importante das novas pesquisas é a descoberta de cerâmica Guarani ao sul do rio Salado (ALDAZABAL, 2008; ALDAZABAL, WEILER e EUGENIO, 2005). Aldazabal (2008, p. 78) sugere que a presença dessa cerâmica produzida localmente, com predomínio do tratamento de superfície corrugada, poderia ser resultado da “incorporação de uma nova tradição [...] provavelmente resultado de intercâmbios”. Esta cerâmica possui características com “estreita relação com os Estilos da área norte da Província [de B. Aires] e do Litoral mesopotâmico, que sustentam a hipótese de um corredor costeiro norte-sul” (ALDAZABAL, 2008, p. 79). Acreditamos que o aspecto mais importante a ser destacado é a continuidade dos sítios e evidências arqueológicas, mesmo que com uma baixa frequência de registros e apesar das dificuldades impostas pela região metropolitana bonaerense e cidades litorâneas. Porém, apesar das pesquisas mostrarem que havia boa adaptação em relação à exploração da fauna e a produção local da cerâmica, ainda sabe-se pouco sobre o conjunto dos sítios e sua densidade. A tabela de sítios Guarani do litoral apresenta os seguintes itens: ✓ Estado da federação brasileira em ordem alfabética: Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina. Para a Argentina e o Uruguai não apresentamos as províncias e departamentos devido à dificuldade de obter informes precisos sobre ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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o município e localidade do registro. Na Argentina predominam os registros das Províncias de Buenos Aires e Entre Ríos. ✓ Cidade de localização dos sítios: No caso do Uruguai e da Argentina, apresenta-se a província de localização dos sítios quando a cidade não foi mencionada pela fonte. No caso do Brasil existem lacunas onde as fontes não citam município ou localidade; também haverá diferença entre a nossa tabela e as informações das publicações anteriores a criação dos novos municípios a partir de 1997. Também haverá diferenças em relação aos trabalhos recentes que copiaram automaticamente os dados do CNSA, que se encontra desatualizado para muitos registros anteriores a 1997. ✓ Localidade: Esse campo traz informações sobre o nome das localidades dos sítios. ✓ Nome do sítio: Há casos de sítios que são nomeados por extenso e há casos de sítios que apenas recebem numeração, geralmente a mesma numeração das siglas de cadastro. ✓ Sigla: esse item apresenta as siglas dos sítios conforme foram publicadas e no CNSA-IPHAN. Há casos em que as siglas também reproduz o nome dos sítios. Há casos de sítios que nunca foram cadastrados no CNSA e, portanto, não receberam sigla. Também ocorrem situações de sítios cadastrados mais de uma vez, possuindo mais de uma sigla. ✓ Coordenadas: apontamos as coordenadas UTM dos sítios arqueológicos. Em muitos casos, foram publicadas originalmente como coordenadas geográficas (graus, minutos e segundos), que convertemos para UTM, para padronizar as referências. Muitos sítios ainda não contêm suas coordenadas geográficas, sobretudo nas publicações mais antigas, totalizando 290 (44,20%) com coordenada e 656 (55,80%) sem informar. ✓ Datação: Este campo apresenta as datações dos sítios publicados. As datações são apresentadas como Anno Domini (AD) ou em data radiocarbônica (AP = antes do presente), dependendo da fonte de referência. Buscou-se, quando publicado, manter a informação do protocolo dos laboratórios. ✓ Método de datação: esse campo refere-se ao método utilizado pelos autores para a realização das datações: (TL = termoluminescência), (C¹⁴ = carbono quatorze). ✓ Fontes: nesse campo estão as publicações consultadas para compor a tabela. Buscou-se apontar o máximo de fontes sobre cada sítio arqueológico, oferecendo todas as informações possíveis à pesquisa. Para o Brasil, além das publicações, foi consultado o Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA), onde existem registros que não foram publicados na literatura da Arqueologia sobre os Guarani. 184
AGRADECIMENTOS Agradecemos aos colegas: Juliano Campos, Marco Aurélio Nadal De Masi, Eliane Chim, Cleiton Silveira, Vanderlise Machado Barão, Luciana Peixoto, Charles Miranda, Dione da Rocha Bandeira e Jairo Henrique Rogge pela disponibilização de dados que permitiram enriquecer a tabela dos sítios arqueológicos Guarani do litoral sul do Brasil. Agradecemos também a acadêmica Daiane Marin pelo auxílio na editoração da tabela e Jonathan Duarte Marth pela elaboração dos mapas.
Mapa 01: localização dos sítios Guarani entre o Uruguai e Argentina.
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Mapa 02: localização dos sítios Guarani no litoral sul do Brasil.
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CAPÍTULO 9 O ESPAÇO DOS GUARANI: A CONSTRUÇÃO DO MAPA ARQUEOLÓGICO NO BRASIL, PARAGUAI, ARGENTINA E URUGUAI84 Francisco Silva Noelli85
A produção de conhecimento arqueológico sobre os territórios dominados pelos Guarani por mais de dois mil anos, está em construção desde 1872. Apesar da grande quantidade de pesquisas, o mapa ainda está longe de estar completo, constituindo para o futuro um trabalho enorme aos arqueólogos e historiadores. Não bastasse a dificuldade para registrar os pontos relativos aos sítios arqueológicos e históricos no espaço geográfico, existe outro desafio igualmente hercúleo, que é a análise e a interpretação dos processos históricos relativos à ocupação, manutenção e perda territorial em nível local e regional (considerando as redes de relações entre territórios com aldeias associadas que constituíam os “guarás”). Sem falar de temas ainda pouco conhecidos, como demografia, relações interétnicas, ecologia histórica e variações de estilo tecnológico da cerâmica em nível regional. O mapa que se apresenta aqui é uma contribuição ao esforço de sistematizar as informações atualmente conhecidas, passo inicial para os desafios apontados acima. Ele foi composto na Tulha, prédio do Laboratório de Arqueologia, Etnologia e Etno-História da Universidade Estadual de Maringá, entre 1999 e 2002, a partir das informações acumuladas por mim, em parceria com Josilene Aparecida e Carlos Panek Jr, para o banco de dados do projeto de História da Arqueologia na Região Sul do Brasil (a sustentação mais detalhada do conteúdo deste trabalho foi desenvolvida anteriormente em Noelli, 1993, 1996, 1998, 2000). A distribuição Guarani alcançou grande parte do leste da América do Sul, principalmente as bacias dos rios Paraná e Paraguai. Os dados históricos permi84 Este capítulo é uma versão modificada do artigo publicado na Revista de Indias e na revista Tellus (NOELLI, 2004a, b). 85 Professor Aposentado da Universidade Estadual de Maringá.
tem estimar que no começo do século 16, quando os europeus chegaram, os Guarani viviam seu ápice geográfico e demográfico, com uma população que poderia superar os dois milhões de pessoas. Desde os primeiros contatos no rio da Prata, ao redor de 1513, a população diminuiu vertiginosamente com a introdução de vetores infectocontagiosos do Velho Mundo, com as guerras e a escravidão. Sucessivamente, a foz do rio da Prata, os litorais dos estados de Santa Catarina e do Paraná e os campos de Curitiba ficaram vazios, ou quase, até 1580. Foi o prelúdio do que ocorreria em outras regiões até o final do século 17, quando restavam poucos núcleos Guarani com grande densidade populacional no Mato Grosso do Sul e no Paraguai. Ao redor de 1700, no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, oeste de São Paulo, Uruguai e províncias de Buenos Aires, Entre-Rios, Corrientes e Misiones, haviam grupos isolados, com tamanho ínfimo em comparação ao século 16. As investigações arqueológicas, históricas, etnográficas e de linguística histórica comparada, permitem a percepção do processo da ocupação Guarani. De acordo com Rodrigues (1964, 1986, 2000; URBAN, 1992), a família linguística Tupi-guarani, da qual a língua Guarani é afiliada, teve origem no sudoeste da Amazônia, no atual estado de Rondônia. A hipótese linguística é um recurso para fazer frente à falta de dados arqueológicos Guarani naquela região, orientando a interpretação do início do processo de expansão para o sul. Segundo os arqueólogos, a exemplo de Brochado (1984) e Noelli (1998, 2000, 2008), a origem amazônica pode ser confirmada por estudos comparados de cultura material. Em termos etnológicos, a classificação mais aceita concebe a cultura Guarani essencialmente amazônica, com poucos traços adotados de culturas de fora daquela região (MÉTRAUX, 1928; VIVEIROS DE CASTRO, 1986; NOELLI, 1993, 1996; RODRÍGUEZ, 2000). Brochado construiu um modelo para as rotas de expansão Guarani, desde Rondônia. Dispomos de evidências arqueológicas no Mato Grosso do Sul. As principais rotas foram os rios Paraguai e Paraná, subindo seus afluentes até os interflúvios, sempre no interior das selvas onde abriam clareiras para instalar suas aldeias, roças, trilhas e outras atividades ecológicas e sociais. Novas pesquisas acrescentam a Bolívia como espaço ocupado pelos Guarani. Devagar e gradualmente (NOELLI, 1993, 1996, 2000; BALÉE, 2000), ocuparam e colonizaram uma grande parte dos Estados meridionais do Brasil, o Paraguai oriental e os bosques e matas galerias do Uruguai e do nordeste argentino. Esta estratégia conformou todo o processo de colonização e inspirou os modelos de Lathrap (1970) e Brochado (1984), que, seguindo e modernizando os princípios do difusionismo, sugeriram que as rotas de expansão foram os rios maiores, gradualmente subindo pelos menores até os interflúvios. Os dados conhecidos indicam
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que o processo de ocupação Guarani ocorreu através de uma autêntica guerra de conquista, que não respeitou as populações das regiões dominadas. Os registros arqueológicos mostram que os sítios foram instalados em áreas anteriormente ocupadas por populações não guarani, aparentemente expulsas ou assimiladas. A baixa variabilidade dos registros arqueológicos Guarani é uma prova de que não ocorreu uma mudança no estilo tecnológico, na forma dos artefatos e nos padrões de subsistência. A regra foi, ao contrário, a manutenção daqueles traços culturais, cujos sítios datados em um período de mais de 1500 anos, em várias regiões, não apresentaram distinções consideráveis até agora. Em algumas áreas, como a fronteira Tupinambá-Guarani do alto rio Paranapanema, correspondendo a atual divisa dos Estados de São Paulo e Paraná, é possível ter ocorrido um fluxo bilateral de estilos tecnológicos e artefatos, como mostram alguns sítios típicos Guarani e Tupinambá, assim como algumas vasilhas resultantes da mescla de formas entre ambos os estilos (PIEDADE, SOARES, 2000). Mas, isto parecer ser um caso raro, pois os Tupinambá são falantes de uma língua da família Tupi-guarani e possuem elementos culturais muito semelhantes aos Guarani. Nos aspectos sociopolíticos, a maioria das fontes aponta para a tendência de incorporar gente não guarani, aparentemente integrada como escrava, eventualmente aliada, sob o ñande reko (ethos ou “modo de ser” Guarani, cf. MELIÀ, 1986). A cultura material conhecida de três mil sítios arqueológicos (NOELLI s.d.), aparentemente mostra que a incorporação não trouxe mudanças consideráveis, mas ainda não é possível determinar seu efeito na organização social e outros aspectos da cultura Guarani. Sob uma unidade linguística e cultural, as aldeias Guarani se apresentavam como agrupamentos independentes, circunstancialmente inimigos, compostos de comunidades de estrutura e dimensões variáveis. A distribuição Guarani logo foi percebida pelos europeus na fase inicial da exploração em 1515 (todas essas expedições podem ser estudadas no livro de Mello (2005), a mais completa obra sobre o tema). O reconhecimento precoce deveu-se à presença de um pequeno grupo de náufragos da expedição de Juan Díaz de Solís, estabelecidos na área do rio Massiambu, em frente ao sul da ilha de Santa Catarina (MEDINA 1897, 1908a). Logo foram incorporados como aliados do tuvichá (cacique) Tupã Vera, casando-se com suas filhas e sobrinhas. Por doze anos o grupo consolidou relações políticas com os Guarani, criando uma base de apoio logístico para os europeus e aproveitando a extensa rede Guarani para explorar regiões distantes. A sua exploração mais conhecida começou por volta de 1521, liderada por Aleixo Garcia (c. 1521) que, com vários Guarani, foi do litoral catarinense até a Bolívia, atravessando o interior de Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul, onde o mataram quando retornava. Um dos sobreviventes
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voltou ao Massiambu para informar a seus companheiros sobre as populações e aquelas terras. Outra exploração que uma parte deste grupo participou, foi ao delta do rio da Prata (c. 1521), aonde o navegador português Cristóvão Jacques levou Melchor Ramírez como intérprete. A base de Santa Catarina também serviu como porto para as expedições de Rodrigo de Acuña (1526), Sebastián Caboto (1527-1530) e Diego Garcia (1528-1530). Caboto explorou o rio da Prata, subindo os rios Uruguai e Paraná (até a ilha de Yaciretá) e, o rio Paraguai até 60 léguas adentro (MEDINA, 1897b, 1908b; GANDÍA, 1937; MELLO, 2005). Entre os cronistas destas expedições, destacou-se a consideração de Luis Ramírez (1528), como o primeiro a mostrar as relações entre os Guarani de diversas regiões. Ele escreveu que “aqui conosco está outra geração, que são nossos amigos, os quais se chamam Guarenís e, por outro nome Chandris: estes andam derramados por esta terra e por outras muitas, como corsários, á causa de serem inimigos de todas [as] outras nações e de muitas outras… Eles dominam grande parte desta Índia”. A carta explica com detalhes a expressão “derramados pela terra e outras muitas”, declarando que os Guarani de várias partes do rio da Prata eram aparentados ou da “mesma nação”. Este feito marcaria muitas outras cartas e documentos da burocracia europeia. Durante a conquista, depois de 1535, os espanhóis subiram pelo rio Paraguai até o Pantanal, investigando outra vasta área do interior e verificando onde viviam os Guarani, que corresponde aos Estados do Mato Grosso do Sul e do Mato Grosso, e ao Paraguai oriental. A região do médio rio Paraguai e do Pantanal foi várias vezes explorada, sempre em companhia de aliados Guarani que viviam na área de domínio da aldeia de Lambaré, perto de onde os espanhóis fundaram Asunção em 1537. No final de 1541, começo de 1542, outra marcha liderada por Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, percorreu a pé o longo trecho do litoral norte de Santa Catarina até Asunção, fazendo novo reconhecimento do interior do Paraná e da sua ligação com o Paraguai, abrindo uma rota muito usada no século 16. Posteriormente, em 1543, os espanhóis subiram novamente o rio Paraguai até o Pantanal em busca de ouro e de uma via de comunicação com o Peru. Na década de 1550, o território Guarani entre os rios Paranapanema e Tietê foi explorado a partir de Ciudad Real, fundada em 1557, na foz do rio Piquiri, Estado do Paraná. Depois, foram fundadas Santa Fé, Jerez de la Fronteira e Villa Rica, que serviram como base para a exploração do interior do Mato Grosso do Sul, Paraná e Santa Catarina. A última parte dos territórios Guarani que foram explorados foi o interior do Rio Grande do Sul, na década de 1620, com as primeras missões jesuítas e os ataques dos bandeirantes de São Paulo (GANDÍA, 1936, 1937). Esses assentamentos coloniais também foram ponto de partida de
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inúmeros surtos epidêmicos, que causaram grande impacto e perdas na demografia indígena. Em todas essas zonas, os Guarani foram reconhecidos pelos europeus como sendo populações com elementos culturais homogêneos, com uma língua, com hábitos, meios de subsistência e organização política e social similares. As informações coloniais sobre um padrão material, cultural e político aparentemente uniforme, relativo a uma grande região, possuem paralelo nas evidências materiais, elaboradas com um estilo tecnológico comum, com mais semelhanças que diferenças, até quando existe distância temporal e espacial entre os sítios arqueológicos. Essas considerações históricas possibilitaram uma compreensão mais ampla do contexto da distribuição das evidências arqueológicas Guarani. A evidente continuidade histórica e o panorama do século 16, ajudam a delimitar o espaço máximo ocupado pelos Guarani na pré-história e a refletir a respeito do processo de expansão e distribuição geográfica desde a Amazônia.
OBJETIVO Este trabalho tem por objetivo a apresentação do mapa (ver mapa no fim do texto) da distribuição dos dados de aproximadamente três mil registros arqueológicos Guarani. As fontes da Arqueologia são publicações, teses, dissertações, monografias, relatórios e catálogos institucionais do Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia, que somam mais de 1500 títulos (CIGLIANO et al. 1963; MELIÀ et al. 1987; NOELLI s.d.; KIPNIS et al. 1995). Os dados selecionados foram inseridos em um sistema georeferenciado, construído pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Brasil). Sua distribuição aparece marcada nos territórios dos municípios, departamentos ou províncias, devido à escala possível nesta publicação. O marcador empregado para estabelecer a localização dos sítios é fundamentalmente a cerâmica, o elemento distintivo da cultura material no registro arqueológico Guarani. A cultura material Guarani, entendida aqui como um “fenômeno social total, que é simultaneamente material, social e simbólico” (PFAFFENBERGER, 1988), possui elementos regulares e constantemente reproduzidos. Este padrão é notável na cerâmica, distinto das vasilhas não guarani. A minha proposição procura compreender o fenômeno antropológico da reprodução constante da cultura material e da tecnologia Guarani, materializada nas evidências arqueológicas e ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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históricas conhecidas até o século 17. Concordo com Dobres e Hoffman (1994), que tecnologia significa “o meio material de fazer artefatos, um fenômeno cultural dinâmico em razão da ação social, da visão de mundo e da reprodução social”. A produção da cultura material Guarani precisa ser considerada dentro da noção de estilo tecnológico, isto é, “da maneira como os indivíduos fazem o seu trabalho, incluindo as escolhas feitas por eles no que refere aos materiais e técnicas de produção” (REEDY, REEDY, 1994). É bom recordar com Hegmon (1992), que estilo refere-se a um determinado modo de fazer algo ou alguma coisa, e que esse modo de fazer implica em opções determinadas entre várias alternativas. Esta perspectiva ajuda explicar o fenômeno da reprodução do estilo tecnológico por mais de 1500 anos em uma vasta região. A chave sociológica, assim acredito, era a comunicação constante entre as áreas Guarani, pois a cultura material também é “um corpus de artefatos, comportamentos e conhecimentos transmitidos de geração a geração, e utilizados nos processos de transformação e utilização do mundo material” (SCHIFFER, SKIBO, 1987). A reprodução das práticas agrícolas e do sistema econômico, típicos do padrão amazônico (Balée 1994), incluindo a adaptação aos diversos ambientes, é a outra chave explicativa do fenômeno dessa ampla reprodução.
O MAPA DE DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA GUARANI Considerei aqui somente a distribuição geográfica, sem tratar dos processos regionais de ocupação, já estudados preliminarmente por Brochado. A complexidade da ocupação, considerando as diferenças ecológicas entre as regiões e o contato com as populações, será apresentada futuramente, devido ao grande volume de informações. Entretanto, alguns pressupostos devem ser considerados: 1) não há sítios arqueológicos isolados, nem sequer na periferia externa dos territórios Guarani, mas existem muitas áreas sem surveys regionais completos; 2) não há sítios em áreas campestres, sem mata, mas existem sítios em áreas desmatadas há muito tempo, até séculos, pelos europeus. Contudo, há sítios em áreas de transição da floresta para o campo (mas sempre situados na mata), ou sítios arqueológicos em áreas de cobertura florestal limitada, como as estreitas matas de galeria do delta do rio da Prata, do litoral da Província de Buenos Aires e da margem do rio Uruguai, abaixo de São Borja; 192
3) a relação com a altitude acima do nível do mar demonstra adaptação a distintos climas, desde o nível do mar até 900-1000 m, incluindo as áreas mais frias da Serra Geral, no estado do Paraná; 4) o mesmo ocorre em relação ao solo, com ocupações em todas as classes, do mais pobre ao mais rico; 5) em geral, a duração da ocupação dos assentamentos era longa e poderia chegar a mais de cem anos, como demonstram os solos antropogênicos de cor preta; 6) o esgotamento do solo de uma roça não forçava o abandono do assentamento, mas levava à rotação dos cultivos, abrindo novas clareiras anualmente e deixando os gastos em descanso por vários anos. O conjunto de dados arqueológicos mostra claramente que os assentamentos sempre formavam redes, pois em nenhuma área de distribuição existe isolamento significativo. Isso encontra paralelo nos dados históricos, cujos exemplos de isolamento resultaram do colapso demográfico causado pelos europeus. As redes não tinham apenas uma função defensiva e econômica, objetivos fundamentais do comportamento conquistador e da necessidade de manter territórios, mas incluíam outros aspectos práticos e simbólicos necessários à existência de uma sociedade, principalmente o intercâmbio de pessoas, objetos, informações e conhecimentos. Não foi em vão que os primeiros espanhóis escreveram que os Guarani viviam organizados em “províncias”, às vezes identificadas com um tuvichá principal, como foi o caso de Tupã Vera e outros muitos descritos nos séculos 16 e 17. As redes regionais e a estrutura política e social de alianças, sustentadas pelo intercâmbio permanente, explicam a reprodução constante da cultura material e de outros elementos do ñande reko. O estilo tecnológico da cerâmica, com suas regras e padrões reproduzidos por mais de 1500 anos, é uma prova material da reprodução e afirmação do comportamento tradicionalista Guarani. A relação com a floresta é outro aspecto fundamental que marca os sítios arqueológicos Guarani, que também foi anotada por cronistas, historiadores e antropólogos (SCHADEN, 1974; MELIÀ, 1986; NOELLI, 1993). Ali, com trabalho coletivo, abriam clareiras para suas aldeias e roças, através do desmatamento de espaços previamente definidos, seguido da queima da vegetação derrubada. Estes feitos materializavam os locais essenciais para a subsistência e a vida social. Regiões cobertas por extensas florestas eram entrecortadas por milhares de quilômetros de trilhas entre as aldeias vizinhas ou distantes, entre as aldeias e suas diversas áreas de atividades econômicas, como roças, pesqueiros, portos, áreas de coleta, aldeias abandonadas, fontes de matéria-prima lítica e cerâmica; e de atividades diversas, cemitérios e locais rituais (NOELLI, 1993).
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
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Dentro das redes regionais e no interior das matas, os Guarani desenvolveram sua expansão ao ritmo do crescimento demográfico, resultando as novas aldeias da fição das antigas. As novas eram geralmente situadas no limite do tekohá, o território de circunscrição política de uma aldeia. Não foi uma difusão da cultura material no sentido mais tradicional do conceito, mas a expansão geográfica e demográfica de suas populações que deixou uma imensa quantidade de sítios arqueológicos.
A CERÂMICA GUARANI Os dados arqueológicos Guarani não devem ser confundidos com aqueles incluídos sob o rótulo Tupiguarani (sem hífen), um conceito criado no Brasil pelo Programa Nacional de Pesquisas Arqueológicas (PRONAPA, 1970; Terminologia 1976), para “tratar a cultura de uma maneira artificialmente separada dos seres humanos” (MEGGERS, 1955). O conceito Tupiguarani abarca sem distinção a cultura material relativa a 60 povos falantes das línguas do tronco Tupi. A cerâmica é o principal marcador do registro arqueológico Guarani. A técnica de construção básica é o acordelado, o enrolamento espiralado (coiled) de cilindros de argila, com queima geralmente incompleta. Brochado e colegas (LA SALVIA, BROCHADO, 1989; BROCHADO, MONTICELLI, NEUMAN, 1990; BROCHADO, MONTICELLI, 1994; BROCHADO, NOELLI, 1998), sugerem um modelo classificatório da cerâmica, baseado na taxonomia Guarani histórica, dividido em 6 classes principais de vasilhas: 1) yapepó (panela); 2) cambuchi (talha); 3) ñaetá (caçarola); 4) ñaé (prato); 5) cambuchí caguabã (taça); 6) ñamopyú (tostador). A forma destas classes possui variações de acordo com uma ordem de combinações de segmentos, ou “unidades padrão de formas definidas, que superpostas, darão o contorno da vasilha” (LA SALVIA, BROCHADO, 1989, p. 116). Existem onze divisões de formas distribuídas em três classes estruturais de vasilhas, de acordo com Sheppard (1956): 1) não restringidas, as quais podem apresentar contornos: (1) simples, (2) composto, (3) infletido e (4) complexo; 2) restringidas simples (5) e dependentes, com contorno infletido (6), composto (7) ou complexo (8); 3) restringidas independentes com contorno infletido (9), composto (10) ou complexo (11). 194
Os pratos, taças, caçarolas e tostadores são mais frequentes na classe 1 e as panelas e talhas pertencem às classes 2 e 3. A base das vasilhas pode ser cônica, arredondada ou plana. O tratamento da superfície é dividido em cinco técnicas principais, que as vezes são combinadas: 1) alisado; 2) corrugado; 3) ungulado; 4) pintado; 5) escovado. O alisado é mais comum nas vasilhas que não vão diretamente ao fogo, como os pratos, copos e talhas. O corrugado é mais comum nas vasilhas que vão ao fogo, como as panelas, caçarolas e tostadores, mas também ocorre nas talhas e pratos. O ungulado é mais comum nas vasilhas de menor tamanho, especialmente os pratos (eventualmente está misturado ao corrugado). O pintado (preto o marrom e vermelho sobre engobe branco) é mais comum nas vasilhas que não vão ao fogo, como as talhas e as taças, usadas para servir e tomar as bebidas fermentadas alcoólicas. O escovado se usa como o corrugado. Ainda se conhece a incisão, os estampados, os acanalados, os nodulados e os roletados. As formas possuem tamanhos distintos, divididos em grandes, médios e pequenos, mas sempre há uma regra de proporção para a forma do corpo. As panelas e talhas são as maiores vasilhas, chegando a um metro de altura e conter até pouco mais de cem litros. As caçarolas também chegam a diâmetros de sessenta/setenta centímetros por vinte e cinco centímetros de altura, e até dez ou doze litros de coberturacidade. Uma panela pode conter entre dez e cem litros, mas sua forma se altera apenas na proporção (Brochado, Monticelli, Neuman 1990). É possível que o tamanho da vasilha varie com o contexto e com o dono: 1) a panela maior se usava para fazer o cozido da família extensa; a menor para a família nuclear; 2) o prato pequeno é individual, o grande é coletivo; 3) a taça pequena é individual, a grande é um objeto de prestígio pessoal (os Guarani valorizavam o grande bebedor, que às vezes poderia ser chefe, líder religioso, conselheiro, guerreiro, etc.). Ainda não são conhecidas todas as funções das vasilhas e nem foi concluído o sistema de classificação, que necessita de novos estudos estatísticos e o complemento da análise química dos restos orgânicos nos fragmentos cerâmicos e nas vasilhas inteiras. Os tamanhos médios, as miniaturas, as formas intermediárias e tipos incomuns ainda não possuem suas classificações e funções definidas com segurança.
A DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DOS SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS GUARANI Os quadros regionais estão incompletos, como se pode ver no mapa de distribuição dos sítios Guarani. Os vazios representam mais a falta de pesquiARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
195
sas arqueológicas que propriamente a ausência de ocupação em boa parte das áreas. Também há algumas distorções na escala espacial, quando foi possível marcar apenas um departamento ou província, como no Uruguai e Paraguai. Abaixo se descreve as regiões que possuem sítios arqueológicos Guarani. São, respectivamente, os estados brasileiros do Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul; o Paraguai oriental, o nordeste de Argentina e o Uruguai.
MATO GROSSO DO SUL O predomínio dos registros está na metade sul do Estado, concentrada na bacia do rio Paraná, no quadrante oeste. A Figura 1 mostra uma grande área a leste, sobreposta ao Pantanal, mas os sítios estão limitados no entorno da cidade de Campo Grande. Alguns municípios da parte central também indicam presença Guarani, mas nesta parte a investigação é incipiente e os achados são isolados. Apesar dos vazios arqueológicos no Mato Grosso do Sul, as fontes históricas dos séculos 16 e 17 mostram que em grande parte do seu interior existiam núcleos Guarani (LEONHARDT, 1927-1929; CORTESÃO, 1951-1970), incluindo alguns que alcançavam o sudoeste de Goiás (MACHAIN, 1939; CABEZA DE VACA, 1986). São relevantes, mas pouco investigadas, as informações históricas que mostram as relações políticas e familiares entre os núcleos Guarani de várias partes do Estado. Alguns sítios estão datados, revelando uma ocupação antiga, que chega a 1.248 ± 150 anos antes do presente (A.P.), Na margem do rio Paraná, município de Brasilândia (MARTINS, KASHIMOTO, TATUMI, 1999). Considerando o contexto da bacia do rio da Prata e as datações mais antigas ao sul, é provável que no futuro os achados permitam datas próximas de 2.000 A.P. As datações e os dados históricos revelaram que esta área foi continuamente ocupada até o século XXI, e que a presença brasileira confinou os Guarani em certas áreas pelo interior. A região norte, especialmente ao longo do rio Miranda, está revelando novos sítios. A margem do rio Paraná é a área mais bem conhecida, com levantamentos sistemáticos entre a boca do rio Paranapanema e o rio Pardo, cerca de 200 km ao norte. A amostragem revelou que a densidade e a distribuição são similar a outras áreas arqueológicas Guarani, confirmando a regra de que não há ocupações isoladas.
196
SÃO PAULO A presença Guarani está restrita a porção oeste do Estado, próxima do rio Paraná, vizinha do Mato Grosso do Sul e ao longo do baixo e médio rio Paranapanema, na fronteira com o Estado de Paraná. É provável que sejam localizados sítios um pouco mais distantes destas áreas, para o interior de São Paulo, mas não muito por causa da existência de uma fronteira consistente dos Jê e Tupinambá, que impediu a expansão Guarani ao levante e ao norte, a partir da transição do baixo ao médio rio Tietê. As fontes históricas dos séculos 16 e 17 confirmam os limites arqueológicos e tratam de uma grande densidade demográfica Tupinambá na metade leste do Estado. As datações indicam que a ocupação é antiga, cerca de 1.200 A.P. Na transição para o alto rio Paranapanema. Há várias datas próximas de 1.000 A.P., no médio-alto rio Paranapanema (MORAIS, 2000). As datas mais antigas em áreas próximas, no Estado do Paraná, indicam que se encontrarão ocupações mais antigas em São Paulo.
PARANÁ A ocupação está bem distribuída pelo Estado, em todas as principais bacias hidrográficas há evidências arqueológicas Guarani. As fontes históricas, a partir de análise estimativa de Melià (1986), indicam que o Paraná era densamente povoado por aproximadamente um milhão e meio de pessoas no começo do século 17. Na metade oeste do Estado, a extinta Província do Guayrá, às margens dos principais rios do interior, Tibagi, Pirapó, Iguaçu, Ivaí e Piquiri, apresentam áreas onde se verifica a contiguidade dos sítios, que se encontra a intervalos regulares, geralmente próximos da foz dos afluentes e riachos, em intervalos médios de dois quilômetros. As zonas interfluviais e o curso dos afluentes maiores também possuem um padrão similar aos grandes rios, com uma distribuição constante de sítios. Em muitas partes as ocupações se entendem para os interflúvios, distantes dos rios maiores, uma mostra da dimensão e amplitude das redes de ocupação. A adaptação às altitudes elevadas e mais frias da Serra Geral não foi uma barreira para os Guarani. A ocupação do interior foi uma forma de adaptação gradual, pois o domínio paulatino das terras acompanhou a ascensão por uma linha de 550 km, a partir dos 200 metros de altitude no rio Paraná até os 1.000 ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
197
metros acima do nível do mar de Ponta Grossa-Curitiba. Já a transição litoral-interior, pelo contrário, é marcada pelas altas escarpas da Serra Geral, com uma ascensão abrupta do nível do mar até os 1.000 metros. Todavia, a dificuldade do terreno não impediu que fosse utilizado como caminho para o interior, até a área de Curitiba e aos territórios dos rios Tibagi, Piquiri e Ivaí. Se não fosse pela densa ocupação dos Jê na área centro-sul, os Guarani teriam dominado todo o Paraná, excetuando as partes campestres. As datações revelam que todo o Paraná já estava ocupado pelos Guarani ao redor de mil anos antes do presente. Mas existem datas anteriores, cuja média mostra que a ocupação de várias áreas retrocede até 1500 A.P. Nas ocupações mais antigas, no rio Paraná, alcançam 2.000 A.P. As datações do Paraná e do Rio Grande do Sul são a evidência cabal da antiguidade da presença Guarani na bacia do rio da Prata e indicam que as regiões mais ao norte, como São Paulo e Mato Grosso do Sul, deverão, no futuro, apresentar datas próximas de 2.000 A.P., devido à rota de expansão principiada em Rondônia. As fontes dos primeiros contatos com os europeus ilustram os dados arqueológicos, como o exemplo legado por um dos primeiros espanhóis que caminharam do litoral de Santa Catarina até o Paraguai. Em 1541, segundo Alonso Riquelme de Guzmán (1942), companheiro do adelantado Alvar Nuñez Cabeza de Vaca, o caminho “veio sempre por terra povoada de indios de geração Guarani”. Outras fontes dos séculos 16 e 17 repetem ou detalham mais a respeito dessa povoação e da sua distribuição pelo território atual do Paraná.
SANTA CATARINA A ocupação é bem conhecida no litoral, no alto e médio rio Uruguai e partes do médio rio Iguaçu. O interior e a fronteira centro-norte com o Paraná são predominantemente campestres e quase não apresentam evidências dos Guarani. Mas as partes não pesquisadas arqueologicamente ainda são muitas, como as bacias dos rios Peperi Guaçu e Peperi Mini, na fronteira com Argentina, onde os dados históricos informam que havia povoação. Todo o litoral apresenta sítios, cuja data mais antiga chega a 900 A.P., na ilha de Santa Catarina (DE MAIS, 2001). Dos vales cobertos com Mata Atlântica que chegam ao litoral, parece que somente as partes mais baixas foram ocupadas. Talvez apenas o vale do rio Itajaí foi dominado pelos Guarani até o seu alto curso. Ao longo da linha marcada pelas cristas altas da Serra Geral, com até mil
198
metros de altitude, e na zona de transição da Mata Atlântica para os campos de cima da serra, parece que tampouco houve ocupação, devido à presença dos Jê. De toda extensão do litoral, somente a porção nordeste foi mais densamente ocupada pelos Guarani, como na zona dos vales dos rios Itajaí e Itapocu, territórios de passagem para o interior do Estado do Paraná (Campos de Curitiba, alto-médio rio Iguaçu). As datas de Paraná, Rio Grande do Sul e Argentina indicam que o este de Santa Catarina deverá apresentar uma ocupação que alcance mais de 1500 A.P.
RIO GRANDE DO SUL Uma grande parte do Estado foi ocupada pelos Guarani, excetuando os campos do nordeste rio-grandense e da Campanha, onde começa o Pampa. A bacia do rio Uruguai favoreceu a ocupação do interior, pelos muitos vales dos grandes e médios afluentes que nascem próximos da região central. A cobertura destas partes foi outro grande atrativo para os Guarani. As datações chegam até 1.800 A.P. no centro do Estado e há muitas datas entre 1.300 e 1.000 A.P., indicando que fora do Rio Grande do Sul, ao norte, serão encontradas datas mais antigas, especialmente nos rios Paraná e Paraguai. A relação entre as datações do Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina são chaves para a percepção do caminho da expansão desde o norte, sendo que o litoral de Santa Catarina foi o último espaço a ser dominado. O processo teria várias frentes e as bacias dos rios Paraná e Uruguai foram os caminhos para o sul, especialmente para as províncias de Corrientes e Entre-Rios, e a margem do rio Uruguai. O Rio Grande do Sul foi a última fronteira conquistada pelos europeus, a partir de 1605, com incursões de uns poucos missionários jesuítas e, desde 1615-1620, com expedições de colonos de São Paulo, caçadores de escravos. Os relatos também confirmam os dados arqueológicos, informando que havia muita gente no interior e no litoral.
PARAGUAI ORIENTAL Apesar da quantidade de dados históricos sobre a grande população Guarani no Paraguai, as informações arqueológicas são poucas. Mas as conheciARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
199
das refletem bem o que atestam os registros escritos do tempo da conquista. A região oriental do país, onde predominam as selvas, é a parte onde os Guarani eram dominantes. A porção ocidental, quando se afasta do rio Paraguai, das mostras de diminuição da densidade dos sítios arqueológicos, acompanhando a transição da floresta às paisagens abertas e campestres do “deserto” chaquenho. Mas a bacia do rio Bermejo parece ser o camino dos Chiriguano, um ramo Guarani que ocuparam parte da Bolívia. O pouco que é conhecido da cultura material, dos sítios arqueológicos (VERA, 1930, 1941; SCHMIDT ,1932, 1934; PERASSO 1978; PALLESTRINI, 1988), e dos objetos expostos nos vários museus locais das pequenas cidades da fronteira paraguaio-argentina, são indício incontestável da Arqueologia do futuro. É provável que o Paraguai possua um contexto como do Paraná e do Rio Grande do Sul, com muitas datações antigas e sequencias regionais que mostram a contínua e densa presença Guarani.
NORDESTE DE ARGENTINA A região que compreende as Províncias de Misiones, Corrientes, Entre-Rios e Buenos Aires, forma o nordeste argentino. A porção dessa área dominada pelo rio Paraná possui florestas úmidas e serras baixas. A porção sul, especialmente Entre-Rios e Buenos Aires, é dominada por áreas inundáveis compostas por cordões arenosos que servem como base às matas de galeria, e possuem em seus interflúvios serras baixas cobertas de floresta (PÉREZ et al., 2009). A quantidade de sítios e as datações até 1200 A.P. (Yaciretá), no médio rio Paraná, e 900 A.P. (Oberá), no médio rio Uruguai, atesta a presença da ocupação, que chegou aos limites da adaptação ecológica do padrão Guarani. Naquelas partes foram ocupados até os últimos espaços da mata galeria, incluindo os raros locais secos cercados por áreas inundáveis, como a parte central dos Esteros de Iberá e as ilhas do rio Paraná. As datas do vizinho Rio Grande do Sul indicam que em Misiones e Corrientes é muito provável que sejam encontradas datas ainda mais antigas que as conhecidas e que o principio da ocupação alcance cerca de 2.000 A.P. em Misiones e Corrientes. Os registros da expedição de Caboto revelam grande densidade ao norte da Província de Entre-Rios, como também indicam várias áreas de ocupação na sua porção sul. Também revelam a presença no interior, ainda pouco conhecida pela Arqueologia, tanto pelos relatos dos ataques dos Guarani ao forte de Sancti Spíritu, como do conhecido relato do cosmógrafo Alonso de Santa Cruz sobre o uso das ilhas do baixo rio Paraná para a agricultura. 200
A costa bonaerense e interior próximo, até o sul do rio Salado (Aldazabal 2008), apresentam 18 sítios com evidências arqueológicas Guarani, reapresentando uma presença significativa que marca, talvez, uma expansão incipiente por volta do século 16 (ou pouco antes). Mas as poucas investigações e o acelerado crescimento da metrópole que encubriu e destruiu os sítios, tornam limitados os conhecimentos no presente. O cenário da presença Guarani na foz do rio da Prata ainda não há foi bem compreendido por muitos pesquisadores, inclusive os mais recentes, que agora tratam de povos “guaranizados” na região (PÉREZ, 1993, 1998). Esta incompreensão, reproduzida desde o final do século 19, foi baseada no uso parcial das fontes históricas disponíveis, associadas a uma perspectiva estática que ignorou o processo histórico nos territórios indígenas às margens do rio da Prata. Não se percebeu que a presença europeia trouxe importantes modificações na demografia e na territorialidade nativas, começando pelas expedições de João de Lisboa (1513-14) e Juan Díaz de Solís (1515). As fontes mais antigas demonstram claramente que a presença Guarani na foz do rio da Prata era consistente e marcada por conflitos bélicos com os Charruas, Timbús e outras populações que ali viviam há muito mais tempo, bem adaptadas ao ambiente inundável e que lutavam contra os invasores Guarani que procuravam pelas restritas áreas de vegetação arbórea. Parece que as limitações ambientais impostas a uma sociedade sedentária e agricultora limitaram o crescimento demográfico observado nas outras regiões, prendendo os Guarani às poucas áreas de mata galeria. A presença europeia desequilibrou a balança em detrimento dos Guarani, com a introdução dos vetores infectocontagiosos, que certamente mataram mais que as armas e causaram um colapso demográfico em pouco tempo. Depois de Solís outras expedições estiveram na foz do rio da Prata, como a de Fernando de Magalhães (1519) e Cristovão Jacques (1521), cujos tripulantes também puderam trazer enfermidades letais. Os dados sobre a presença destes vetores são explícitos somente com a expedição de Sebastián Caboto (1528-1530), cujos homens já entraram doentes nas terras argentinas e uruguaias do rio da Prata. Creio que isto é a chave para compreensão da modificação da territorialidade, pois o colapso liberou espaços para que os Charruas e outros grupos voltassem às terras que os Guarani lhes tomaram séculos antes. O contexto proporcionado por essas primeiras fontes geralmente foi ignorado e mal interpretado pelos historiadores e arqueólogos, que se basearam nas fontes escritas a partir de 1530 e que já mostram outro cenário, sem os Guarani e dominado pelos Charrua, Timbús e outros, descritos pelas expedições de Martim Afonso de Sousa (1531), Pedro de Mendoza (1535) e posteriores. A seleção de dados feita pelos pesqui-
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
201
sadores levou à criação de um panorama étnico onde se apagam as importantes mudanças ocorridas entre 1513 e 1530, período em que os Guarani entraram em colapso e praticamente desapareceram.
URUGUAI Quase tudo que se acaba de dizer serve ao território uruguaio. A pouca área com vegetação florestal limitou a ocupação Guarani à bacia do rio Uruguai e de seus afluentes maiores, como o rio Negro e as matas de Tacuarembó. Evidências também foram encontradas no nordeste do país, na bacia da lagoa Mirim e do rio Jaguarão. A maioria dos sítios se encontra na zona de mata galeria do rio Uruguai, com uma continuidade da ocupação as cercanias da ilha de Martín García e pouco depois de Colônia, onde há evidências de vegetação arbórea de grande tamanho.
CONSIDERAÇÕES FINAIS Este capítulo procurou mostrar os aspectos mais gerais da distribuição de evidências em aproximadamente três mil sítios arqueológicos atribuídos aos Guarani, cuja extensão territorial está entre as maiores alcançadas por falantes de uma língua pré-colombiana na América. Os dados arqueológicos e históricos mostram cabalmente que se trata de pessoas que reproduziram basicamente os mesmos traços culturais durante dois mil anos, de forma admirável, que revelam uma contínua comunicação entre as diversas regiões, como argumentei acima. Estes dados arqueológicos corroboram o que descreveram os primeiros exploradores e os demais conquistadores nos séculos 16 e 17. Agora o trabalho dos pesquisadores está dirigido aos estudos regionais, com o objetivo de revisar as generalizações que não perceberam as peculiaridades locais, tanto dos elementos culturais, quanto das adaptações ambientais e das distintas estratégias de relação dos Guarani com populações não guarani. Também se começa a introduzir abordagens antropológicas mais sofisticadas, com novas pautas de investigação da cultura material e social. A ampliação das áreas de pesquisa arqueológica deverá preencher os vazios do mapa apresentado aqui. As demandas atuais de
202
investigação estão colocando em campo equipes em número nunca antes visto, e este feito contribuirá certamente para que o mapa da ocupação Guarani, assim como o conhecimento dos processos regionais, seja mais completo na próxima década. AGRADECIMENTOS: A Oscar Calávia Sáez e José Henrique Rollo Gonçalves pelo convite para escrever este texto. A Luiz Felipe Viel Moreira e Amílcar Dávila de Mello, pela leitura atenta. A Marcos Rafael Nanni, pela elaboração da Figura 1.
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
203
Cidade
Belén de Escobar
Belén de Escobar
Belén de Escobar
Berisso
Buenos Aires Buenos Aires Buenos Aires
Ilha Martín García
Ilha Martín García
Estado/País
Argentina
Argentina
Argentina
Argentina
Argentina Argentina Argentina
Argentina
Argentina
Ilha Martín García
Ilha Martín García
Las Conchas Magdalena Monte Grande
La Florida
Localidade Foz do rio Carabelas Foz do Arroyo Paycarabi Próximo do Rio Carabelas
Arenal Central
El Arbolito de Molina
x Palo Blanco Las Conchas Magdalena Monte Grande
x
Nome do sítio Foz do rio Carabelas
x
x
x x x
x
x
x
Sigla
405 +35 AP (Grn-5146)
x
22H 384763/ 62171111
x x x
x
x
x
x
Datação/ Método
x
x x x
x 22H 423690/ 6141409
x
x
Coordenadas
Vignati 1936; Bogan 2005; Capparelli 2005; Pérez et al. 2009
Burmeister 1872 Ameghino 1918 Ameghino 1918 Outes 1916, 1917; Lothrop 1932; Vignati 1936; Howard 1948; Cigliano 1968; Bognanni, Capparelli e Pérez 2012
Torres 1911; Outes 1918 Cigliano 1966; Cigliano, Schmitz e Caggiano 1971
Torres 1911; Outes 1918
Torres 1911
Fonte
TABELA DE SÍTIOS GUARANI DO LITORAL SUL DO BRASIL, URUGUAI E ARGENTINA
CAPÍTULO 10
206
Cidade
Buenos Aires
Ilha Martín García Escobar
La Plata Prov. Buenos Aires
San Fernando
Tigre x
x x
Prov. Buenos Aires
Prov. Buenos Aires
Prov. Buenos Aires
Estado/País
Argentina
Argentina Argentina
Argentina Argentina
Argentina
Argentina Argentina
Argentina Argentina
Argentina
Argentina
Argentina
Arroyo Largo x
Foz do rio Luján Arroyo San Juan
Arroyo Fredes
Punta Lara Arroyo Martínez
Ilha Martín García Tigre
Ilha Paycarabí
Localidade
Juancho
La Loma
Los Molles
Arroyo Largo Arazatí
Arroyo Malo x
Arroyo Fredes
Punta Lara Kirpach
Puerto Viejo Anahí
Isla Paycarabí
Nome do sítio
x
x
x
x x
x x
x
x x
x x
x
Sigla
x
x
x
x x
x
x
x
x x
x x
690 ± 70 AP (UGA 10789) / C¹⁴
22H 356911/ 6216087
x x
x
x x
x
Datação/ Método
x
x
x
Coordenadas
Fonte Torres 1911; Ameghino 1918 Outes 1917; Pérez et al. 2009 Lafón 1971 Bruzzone 1931; Pérez et al. 2009 Pérez et al 2009 Torres 1911; Outes 1918; Vignati 19411946; Loponte e Acosta 2003-2005, 2007; Pérez et al 2009; Mucciolo 2007, 2008; Acosta et al 2008; Pérez et al. 2008; Acosta e Mucciolo 2009 Lothrop 1932; Aparicio 1948; Serrano 1972; Caggiano 1983; Tapia 1999 Ambrosetti 1895 Outes 1918; Howard 1948; Pérez et al. 2009 Sosa 1957 Aldazabal 2008; Aldazabal, Weiler, Eugenio 2005 Aldazabal 2008; Aldazabal, Weiler, Eugenio 2005 Aldazabal 2008; Aldazabal, Weiler, Eugenio 2005
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
207
Antonina
Guaratuba
Guaratuba
Guaratuba
Guaratuba
Guaratuba
Paranaguá
Paranaguá
Paranaguá
Paraná
Paraná
Paraná
Paraná
Paraná
Paraná
Paraná
Paraná
Antonina Antonina
Paraná Paraná
Paraná
Cidade
Estado/País
Porto Cajú
Vila Emboguaçu Capela do Bom Jesus
Rio Laranjeiras
Rio Braço Seco
Miringava
Rio Fincão
Rio Guanxuma
centro urbano
Ponta do Pita centro urbano
Localidade 22J 732950/ 7182819
Sambaqui nº 40 x
Sambaqui Ponta do Pita II x
22J 729163/ 7138369 22J 739754/ 7141690 22J 738948/ 7143367 22J 738888/ 7140043 22J 735205/ 7139740 x
Sambaqui nº 26 Sambaqui nº 65 Sambaqui nº 66 Sambaqui nº 69 Sambaqui nº 71 PR - P 67 x x
Morro do Ricardo
Barra do Fincão
Miringava
Braço Seco
Rio Laranjeiras Vila Emboguaçu x Chácara Paiva
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
Sigla
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Leão 1900, 1919 Leão 1900; Martins 1925; Chmyz 2002 Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Bigarella 1950-1951; Chmyz 1976, 2002; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Chmyz 2002; CNSA 26671 Leão 1900; Martins 1925; Chmyz 2002 Museu Paranaense; Chmyz 2002
208 Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva Balneário Atlântico
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Marambaia Antena Balneário Atlântico Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio do Sal
Arroio Grande
Rio Grande do Sul
Arroio Chasqueiro
Parque Tupancy
Arroio do Sal
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Paraná Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
centro urbano “baixada paranaense” (litoral)
Paranaguá Paranaguá até Caiobá
Paraná
Localidade
Cidade
Estado/País
Sr. Miguel (Sítio do Chasqueiro 48)
Valdecir Gonçalves
Pousada da Lagoa
Antena Balneário Atlântico 9
Marambaia 3
Parque Tupancy
Itapeva 5 Balneário Atlântico 2
Itapeva 4
Itapeva 3
Itapeva 1
x
RS - LN - 302 RS - LN - 314 RS - LN - 317 RS - LN - 319 RS - LN - 321 RS - LN - 322
x 22J 614558/ 6745503 22J 612596/ 6743571 22J 613078/ 6743588 22J 612944/ 6743620 22J 612530/ 6738600
RS - LN - 92 RS - LN - 264 RS - LN - 266 RS - LN - 267 RS - LN - 268 RS - LN - 295
Lagoa Itapeva I
x
x
vários sítios
x
22J 611850/ 6737102 22J 605586/ 6727490 22J 612185/ 6737715 22J 604829/ 6729319 22J 603894/ 6732094 22J 604357/ 6732675
x
x
x
Coordenadas
Sigla
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Rogge e Schmitz 2010 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971
Rogge e Schmitz 2010
Rogge e Schmitz 2010
Rogge e Schmitz 2010
Becker 2007; CNSA 35172 Rogge e Schmitz 2010; CNSA 02125 Rogge e Schmitz 2010; CNSA 02127 Rogge e Schmitz 2010; CNSA 02128 Rogge e Schmitz 2010; CNSA RS02129 Rogge e Schmitz 2010; CNSA RS02147 Wagner 2004; Rogge e Schmitz 2010; CNSA 02155 Rogge e Schmitz 2010; CNSA RS02168
Fernandes 1947
Fonte Fernandes 1947; Chmyz 2002
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
209
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Foz da Canhada Foz do Arroio Grande Farol e Ponta Alegre Farol e Ponta Alegre x Pontal da Formiga Pontal da Faxina Pontal da Faxina Praia do Tarumã Pontal da Formiga Arroio do Curtume
Arroio Grande
Arroio Teixeira
Barra do Ribeiro
Barra do Ribeiro
Barra do Ribeiro
Barra do Ribeiro
Barra do Ribeiro
Camaquã
Arroio Grande
Arroio Grande
Arroio Grande
Arroio Grande
Arroio Grande
Arroio Grande
Arroio Sarandi Reserva do Mato Grande Reserva do Mato Grande Reserva do Mato Grande
Localidade
Arroio Grande
Cidade
RS-274 A: Willy Hoff 1
Arroinho I
Tarumã - Riocel
Tekoá Porã
Tekoá Mareÿ
x Camping/Arroio Teixeira Tekoá Yma
x
x
x
x
x
x
RS - AG - 32C
Nome do sítio
x RS 274 -A
RS 324
x RS - LN - 130 RS - LC - 20 RS - LC - 21 RS - LC - 22
x
x
x
x
x
x
Sigla RS - AG 32C
x
x 22J 487816/ 6638420 22J 0490094/ 6639842 22J 0490802/ 6640887 22J 0489112/ 6641514 22J 0486318/ 6633595
22H 0316955/ 6440062 22H 341036/ 6440469 22H 341123/ 6440449 22H 340514/ 6441142 22H 329395/ 6423134 22H 329266/ 6455682 22H 335048/ 6412433 22H 335435/ 6412833
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Dias e Silva 2012 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00745
Dias e Silva 2012 Dias e Silva 2012; CNSA 01989
Dias e Silva 2012
Dias e Silva 2012
Becker 2007
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2008
Pereira 2005, 2008
Fonte
210 Arroio do Curtume Arroio Velhaco do Sul Arroio Velhaco do Sul x x x x
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
x x x x Arroio Caititu
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Costa do Sutil
Costa do Sutil
x
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Localidade
Cidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Amarante Rodrigues
Francisco Rodrigues
Zeferino Nunes Dejalmo Martins Ribeiro Manuel Santana (Bolicho) Luiz Lacerda (Venda) Manoel dos Santos B. Martins
Emilio Alves Farias RS-279 A e B: Ataíde Rodrigues Lucas - 1 e 2
Alarico Meireles RS-277-A: Wladislau Schmievski - 1 RS-277-B: Wladislau Schmievski - 2
Nome do sítio RS-274 B: Willy Hoff 2 RS-275-A: Jocó Pedro Bernard - 1 RS-275-B: Jocó Pedro Bernard - 2
RS 286
RS 285
RS 284
RS 283
RS 282
RS 281
RS 280
RS 279
RS 278
RS 276 RS 277 -A RS 277 -B
Sigla RS 274 -B RS 275 -A RS 275 -B
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00753 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00754 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00755 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00756 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00757 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00758 Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00759 Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00760
Fonte Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00746 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00747 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00748 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00749 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00750 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00751 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00752
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
211
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Costa do Sutil x x x x x x x x x x x
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Camaquã
Costa do Sutil
x
Camaquã
Camaquã
Costa do Sutil
Localidade
Camaquã
Cidade
RS 364
RS 363
RS 362
RS 361
RS 360
RS 359
RS 358
RS 357
RS 356
RS 355
RS 354
Manuel A. Gouveia
Antonio Costa
RS-349
Manuel A. Gouveia
Nome do sítio
RS 364
RS 363
RS 362
RS 361
RS 360
RS 359
RS 358
RS 357
RS 356
RS 355
RS 354
RS 353
RS 352
RS-349
RS 287
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00761 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00050 Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00053 Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00054 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00055 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00056 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00057 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00058 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00059 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00060 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00061 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00062 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00063 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00064 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00065
212
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Praia do Barco Praia do Araçá x Capororoca Capororoca Capororoca
Capão da Canoa
Capão da Canoa
Cidreira
Cidreira
Cidreira
Cidreira
Arroio Teixeira
Capão da Canoa
x
Arroio Teixeira
Capão da Canoa
Capão da Canoa
Lagoa Itapeva
Capão da Canoa
Lagoa dos Quadros
x
Camaquã
Capão da Canoa
x
Camaquã
Lagoa dos Quadros
x
Camaquã
Capão da Canoa
Localidade
Cidade
Capororoca 4
Capororoca 3
Capororoca 2
x
Praia do Araçá
Praia do Barco 1
Ramalhete 1
x
Lagoa dos Quadros
Curumim 1 Arroio Teixeira TG + T Arroio Teixeira TG + T
RS 367
RS 366
RS 365
Nome do sítio
x RS - LC - 71 RS - LC - 72 RS - LC - 73
x RS - LN - 32 RS - LN - 40 RS - LN - 06
RS 09
RS 367 RS - LN - 104 RS - LN - 93 RS - LN - 94
RS 366
RS 365
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Marsul; CNSA 1298
Marsul; CNSA 1299
Marsul; CNSA 1346
Marsul; CNSA 35733 Koseritz 1884a, 1884b; Kosertiz 1928
Marsul; CNSA 35732
Marsul; CNSA 35758
Paldaof 1900
Marsul; CNSA 35176 Becker 2007; CNSA 35173 Becker 2007; CNSA 35174 Schmitz 1958; Goldmeier e Schmitz 1983; De Masi e Schmitz 1987; CNSA 35353
Fonte Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00066 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00067 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00068
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
213
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul x x
Guaíba
Guaíba
Imbé Velho Imbé Velho X X X Praia do Bacopari
Imbé
Imbé
Maquiné
Maquiné
Maquiné
Mostardas
Imbé
Imbé
Guaíba
Eldorado do Sul
Balneário Santa Terezinha Balneário Santa Terezinha
x D. Pedro de Alcântara D. Pedro de Alcântara São Pedro - 150 m da BR 116 Inst. Desidério Finamor Complexo Automotivo da Ford
Cidreira-Torres D. Pedro de Alcântara D. Pedro de Alcântara
Eldorado do Sul
Localidade
Cidade
LII 14
Sítio do Biólogo RS - 152 Ponte do Jacuí
x Mário Boeira Martins
Walter Medeiros
Pavão 1
Gustavo Machado Gustavo Machado B
Santa Terezinha 2
Santa Terezinha 1
Ponte do Rio Jacuí (cat 152 GB 089)
RS - 119
Santa Rita
Arroio do Conde
LII 05
Elmar Fernandes
RS 228 RS 228 -B RS - LN - 03 LQQ 01 RS - M - 35 RS - LC - 05
RS 56 RS - SR - 342 RS 119 RS 152 RS - LN - 17 RS - LN - 18
RS 119
x
Sigla
x
Nome do sítio
x 22J 581331/ 6709081 22J 588622/ 6706669 22J 554987/ 6621744
x
x
22J 586787/ 6692881 22J 587357/ 6694229
x
x
x 22J 469770/ 6675048 22J 0469294/ 6671719
x 22J 612846/ 6748626 22J 613032/ 6749197
Coordenadas
x
x 756 ± 100 AP (SI-412)
x
x
x
x
x
x
x
x 540+60 AP 440+60 AP
x
x
x
x
Datação/ Método
Pestana 2007
Marsul; CNSA 15710 Monticelli et al., 2003; Wagner 2004 Stuckenrath e Mielke 1970
Marsul; Wagner 2009 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00968 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 01292
Marsul; Wagner 2009
CNSA 01841
CNSA 01808
Dias e Silva 2012
Fonte Roquette-Pinto [1906] 1970 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004 Monticelli et al., 2003; Wagner 2004 CEPA PUCRS; CNSA 36310, 36343 Leite 1975; Noelli 1993, 1997
214 Aguapé Pq. Nac. Lagoa do Peixe Pq. Nac. Lagoa do Peixe Pq. Nac. Lagoa do Peixe Pq. Nac. Lagoa do Peixe Pontal do Cristovão Pereira Pontal do Cristovão Pereira Chácara Sr. Ildefonso Chácara Sr. Ildefonso Pq. Nac. Lagoa do Peixe Arroio da Caveira Potreirinho Passo Fundo
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Osório
Osório
Rio Grande do Sul
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Mostardas
Passo Fundo
Bacopari
Mostardas
Mostardas
Localidade
Cidade
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
x
Faz. São Pedro A
Caveira 1 Granja do “Rubinho”
Parna III
Ildenfonso Braga B
Ildenfonso Braga A
Chico Bóis B
Parna II A. Adolfo de Araújo A Sambaqui Chico Bóis A
Parna I
Carambola
Bacopari 1 João Emílio de Sousa
Nome do sítio
RS - LN - 16
x
RS 82
Sigla RS - LC - 49 RS - LC - 51 RS - LC - 52 RS - LC - 53 RS - LC - 54 RS - LC - 55 RS - LC - 11 RS - LC - 12 RS - LC - 43 RS - LC - 44 RS - LC - 61 RS - LC - 67
22J 574816/ 6688838
x
x
x
Coordenadas 22J 555092/ 6621580 22J 540098/ 6606289 22J 511114/ 6558136 22J 517306/ 6562921 22J 516081/ 6561322 22J 507997/ 6556534 22J 483681/ 6561920 22J 483671/ 6561557 22J 490154/ 6557202 22J 511544/ 6557093 22J 519551/ 6565962
x 520 ± 200 AP (SI-410) 540 ± 100 AP (SI-411)
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Leite 1995; Schmitz e Sandrin 2009; Wagner 2009
12ª SR IPHAN
Marsul; CNSA 35317 Goldmeier e Schmitz 1983
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
215
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Passo Fundo x Lagoa Pinguela Lagoa do Peixoto Lagoa Pinguela Lagoa do Peixoto Lagoa dos Barros Faxinal Faz. S. João do Paraíso Lagoa dos Barros
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Conceição do Arroio x
Osório
Osório
Osório
Osório
Faz. do Arroio
Osório
Osório
Localidade
Cidade
x Ramalhete 2 - Km 93
FIAT
Romário M. Machado
Lagoa dos Índios
José Raupp I
Calipso
Lagoa dos Barros I
Jazida da Figueira
Pinguela Camping
Peixoto
Pinguela
Palmital
Faz. São Pedro B
Nome do sítio
x RS - LN - 36
RS 08 RS - LN - 95
Sigla RS - LN - 07 RS - LN - 29 RS - LN - 30 RS - LN - 31 RS - LN - 106 RS - LN - 107 RS - LC - 76 RS - LN - 47 RS - LN - 51 RS - LN - 64
x
x
x
x
x 22J 564642/ 6680717
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Marsul; CNSA 01369
Marsul; CNSA 00967 Becker 2007; Schmitz e Sandrin 2009 Schmitz 1958; Goldmeier e Schmitz 1983; De Masi e Schmitz 1987; CNSA 00962 Becker 2007; CNSA 00972 Koseritz 1884a, 1884b; Kosertiz 1928; Ihering 1895
Marsul; CNSA 00971 Jacobus 1994; CNSA 00969
Marsul; CNSA 35757 Becker 2007; CNSA 01360 Becker 2007; CNSA 00975
Marsul; CNSA 01359
Marsul; CNSA 01358
12ª SR IPHAN
Fonte
216 Morro Alto Lagoa dos Quadros Lagoa Negra Faz. Pontal
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Morro Alto
Osório
Lagoa Peixoto Arroio Caraá Arroio Caraá Várzea do Padre Lagoa da Caieira x
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Osório
Lagoa da Pinguela
Morro Pelado
Morro Alto - Faxinal
Localidade
Osório
Cidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
x
Raul Moro Fazenda do Casqueiro
Torre 116 Torre 135 / Torre 136
Areal Moro
Lauro Rodrigues
Drink Shampoo Km 95.500
Fazenda Pontal
Lagoa Negra
Bassani 3 Lagoa dos Quadros 1
Bassani 2
Bassani 1
Nome do sítio
x RS - M - 16
903
x
x
LLE 02
LAA 02
LAA 01
RS - LN - 35 RS - LN - 37 RS - LN - 48 RS - LN - 38 RS - LN - 33 RS - LN - 34
Sigla
22J 575605/6688295
22J 582912/6693678
x
x
x
22J 574398/ 6693925
22J 571385/ 6694478
22J 572145/ 6695381
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x 474 ± 200 AP (SI-410) / C¹⁴
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método 870 ± 100 AP (SI 4120) 1070 ± 110 AP (SI-413) / C¹⁴
Wagner 2004 Stuckenrath e Mielke 1970
CEPA PUCRS
CNSA 02743
CNSA 02742
Marsul; CNSA 01363 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004; CNSA 02308 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004; CNSA 02307 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004; CNSA 02309
Marsul; CNSA 01362
Marsul; CNSA 01370
Marsul; CNSA 00966 Jacobus 1994; CNSA 00970
Jacobus 1994; Schmitz e Sandrin 2009; CNSA 01368
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
217
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Quintão x Quintão Lagoa da Lavagem Lagoa da Porteira Granjas Vargas Granjas Vargas Granjas Vargas Granja Vargas Bacupari x x Lagoa do Quintão
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Quintão
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Quintão
Localidade
Palmares do Sul
Cidade
RS-LC-100 Leonardo B. Silveira
RS-LC-99
Bacupari
Chácara do Leão
Faz. João Terra
Faz. Duas Lagoas
Faz. Duas Lagoas
IRGA
IRGA
RS - LC - 85
RS-LC-83
Lagoa da Porteira 1 Lagoa da Porteira 2 Lagoa da Porteira 3
Nome do sítio
RS 65
RS - LC - 80 RS - LC - 81 RS - LC - 82 RS - LC - 83 RS - LC - 85 RS - LC - 88 RS - LC - 89 RS - LC - 90 RS - LC - 92 RS - LC - 94 RS - LC - 96 RS - LC - 97 RS - LC - 99 RS - LC -100
Sigla
x
22J 563018/6640050
22J 563044/6639991
22J 559173/6625477
22J 550142/6640209
22J 561899/6634811
22J 562204/6636859
22J 562407/6636914
22J 562181/6642068
22J 561153/6641668
22J 562790/6640402
22J 564236/6638381
22J 564143/6638303
22J 564263/6638473
22J 564370/6638546
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x 563±45 AP (LVD 665) / TL
Datação/ Método 280 ± 50 AP (Beta 202366) / C¹⁴
Rogge 2006 CEPA PUCRS; CNSA 01754
Rogge 2006
Rogge 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006; Rosa 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006; Rosa 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006 Rogge 1999, 2006; Rosa 2006 Schmitz 1997; Rogge 2006
Rogge 1999, 2006; Schmitz 2006 Rogge 1999; Rosa 2006; Schmitz 2006 Rogge 1999, 2006; Schmitz 2006
Fonte
218 Lagoa do Quintão Lagoa do Quintão Lagoa do Quintão Lagoa do Quintão Lagoa do Quintão Lagoa do Quintão Quintão Praia do Laranjal Colônia Z-3
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Palmares do Sul
Pelotas
Pelotas
Pelotas
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Lagoa do Quintão
Palmares do Sul
Praia do Laranjal Ilha da Feitoria Ilha da Feitoria
Pelotas
Pelotas
Pelotas
Praia do Barro Duro
Localidade
Cidade
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Lagoinha
Sotéia
Totó
Camping
Arroio Sujo
Hospital
Quintão - Praia
Nome do sítio Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira Leonardo B. Silveira
PT 05
PT 01
PS 03
PS 02
PS 01
PP 01
RS 171
RS 72
RS 71
RS 70
RS 69
RS 68
RS 67
RS 66
Sigla
22J 4004220/6502560
22J 4035980/6500022
22J 0386716/6489544
22J 0388810/6490949
22J 0389668/6491882
22J 0382932/6486256
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x 380±50 AP (Beta 234205) / C¹⁴ 530±40 AP (Beta 237665) 510±40 AP (Beta 282128) / C¹⁴
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Milheira 2008a, 2008b; Milheira e Alves 2009; Alves 2012; CNSA 02832 Milheira 2008a, 2008b; CNSA 02547 Milheira 2008a, 2008b; CNSA 02548
Milheira 2008a, 2008b; CNSA 02831
Milheira 2008a, 2008b Milheira 2008a, 2008b; CNSA 02829
Fonte CEPA PUCRS; CNSA 01755 CEPA PUCRS; CNSA 01756 CEPA PUCRS; CNSA 01757 CEPA PUCRS; CNSA 01758 CEPA PUCRS; CNSA 01759 CEPA PUCRS; CNSA 01760 CEPA PUCRS; CNSA 01761 CEPA PUCRS; CNSA 36364
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
219
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Laranjal Santa Tereza Várzea do Gravataí Vila Mapa Vila Nova Ponta Chico Manoel Lami Lami Morro São Pedro/ Morro das Quirinas
Pelotas
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Centro Praça Brigadeiro Sampaio Lomba do Pinheiro
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Belém Novo
Porto Alegre
Porto Alegre
Porto Alegre
Laranjal
Localidade
Pelotas
Cidade
Lomba do Pinheiro
Rede DMAE
Praça da Alfândega
Ponta do Arado
Lajeado
Bernardes
Sr. Romeu Reserva Biológica do Lami
Vila Nova
Vila Mapa
x
Santa Tereza
José Hillal
Campo de Tiro/ Vila Assunção
Nome do sítio
RS - JA - 16 RS - JA - 23 RS - JA - 24 RS - JA - 74
RS 87 RS - JA - 01 RS - JA - 02 RS - JA - 07
x
x
x
x
RS 94
Sigla RS 170/ PSG 17
22J 0488226/6669014
x
22J 477701/6677 966
22J 0481711/6655 320
22J 0490337/6662732
22J 0493025/6654372
22J 0493050/6655665
x
x
x
x
x
x
22J 0380237/6484664
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Dias e Silva 2012
Dias e Silva 2012 Spalding 1939, 1940, 1943, 1967, s.d.; Noelli et al. 1997; CNSA 02265 Pouget e Thiesen 2002; Dias e Silva 2012 Dias e Silva 2012; CNSA 02294
Dias e Silva 2012
Dias e Silva 2012
Noelli et al. 1997 Couto 1940; Bettiol 1966; Noelli et al. 1997 CEPA PUCRS; CNSA 01776
CEPA PUCRS; Milheira 2008a, 2008b; CNSA 02830 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 00980 Porto Alegre 1906; Noelli et al. 1997 Porto Alegre 1906; Noelli et al. 1997
Fonte
220 Vila Restinga Morro do Osso Bairro Passo da Areia
Porto Alegre
Porto Alegre
Itapuã Ponta do Coco x x Povo Novo
Porto Alegre
Porto Alegre
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul Povo Novo
Morro do Espírito Santo
Porto Alegre
Porto Alegre
Ilha Chico Manoel
Localidade
Porto Alegre
Cidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Fazenda Soares
RS-LS 96 José Pedro Legerman
RS-LS 20
Rogério Christo
Ilha das Pombas
Espírito Santo
Passo da Areia
Morro do Osso
Sítio Vila Restinga
Ilha Chico Manoel
Nome do sítio
RS - RG - 02
PA 300 RS - LS - 20 RS - LS - 96 RS - LS - 45
RS 323
x
x
x
G1
RS - LC - 71
Sigla
22J 382832/6469100
22J 382875/6466837
22J 380992/6474380
22J 380911/6474710
22J 0493665/6651662
x 22J 0496400/6645300
x
x
x
22J 0484300/6651800
Coordenadas
LEPAN/FURG
LEPAN/FURG
Fonte Spalding 1939, 1940, 1943, 1967, s.d.; Silva 1992; Noelli et al. 1997; Dias e Silva 2012; CNSA 00988 Noelli et al. 1997; CNSA 35337 Caldre e Fião 1943; Noelli et al. 1997 Caldre e Fião 1943; Noelli et al. 1997 Spalding 1939, 1940, 1943, 1967, s.d.; Noelli et al. 1997 Dias e Silva 2012; CNSA 01988 Noelli et al. 1997; Dias e Silva 2012; CNSA 02005
x CNSA 01081 890±40 AP (SI 1190) Naue, Schmitz e Becker 580±50 AP 1968; Naue, Schmitz, Va(Beta 64560) lente, Becker, La Salvia e 510±60 AP Schorr 1971; Goldmeier (Beta 64284) e Schmitz 1983; Carle / C¹⁴ 2002; CNSA 35460
x
x
x
x
x
x
x
x
610+50 AP
Datação/ Método
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
221
Cidade
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Estado/País
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Lagoa Caiubá
Arraial de Fora
Arraial de Fora
Arraial de Fora
Quitéria
Localidade
Denis Lauwson
Pedro Barros
João B. Faria
José S. Figueiredo
Lacides A. Gonçalves
Nome do sítio
RS - RG - 11
RS - RG - 10
RS - RG - 09
RS - RG - 08
RS - RG - 03
Sigla
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Schmitz 1976; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 01051 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Schmitz 1976; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35445 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35446 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Schmitz 1976; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35447 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35448
222
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Quinta
Quinta
Quinta
Arraial de Fora
Rio Grande
Povo Novo
Barra Falsa
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Capão Novo
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Localidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Cidade
Estado/País
Floriano Fonseca
Floriano Fonseca
Floriano Fonseca
Quinta
Valpírio M. Borges
Pesqueiro
Edmar M. Costa
Nome do sítio
RS - RG - 31
RS - RG - 30
RS - RG - 29
RS - RG - 22 RS - RG - 28
RS - RG - 16
RS - RG - 12
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 15017 Brochado 1974; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35462 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35452; 36125 Schmitz 1976; CNSA 36220 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 36221 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35456 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35457
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
223
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Cidade
Estado/País
Taim/Lagoas Flores e Nicola
Povo Novo
Povo Novo
Pesqueiro
Vieira
Quitéria
Localidade
Roger Llopart
Fazenda José Lerchmann
Álvaro Bastos
Álvaro Bastos
Álvaro da Silva
Marcelino A. Brancão
Nome do sítio
RS - RG - 38
RS - RG - 36
RS - RG - 35
RS - RG - 34
x
x
x
x
x
22H 0378719/6455490
RS - RG - 32/RS 413
RS - RG - 33
Coordenadas
Sigla
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Ribeiro 2006; CNSA 01071 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35464 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35465 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35466 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35467 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35468
224
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Taim/Lagoa das Flores
Arraial de Dentro
Rio Grande
Ilha do Leonídio
Magalhães
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Barra Falsa
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Vieira
Ilha da Torotama
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Barra Falsa
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande do Sul
Localidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Cidade
Estado/País
Faz. Terra 17
Nair Vieira
Alberto T. Pereira
Rosalvo Costa
Justiniano Nunes
Levi Magalhães
Fam. Zogbi
Oscar Mendes
Nome do sítio
RS 51
RS 46
RS 44
RS 43
RS 39
RS 299
RS 15
RS - RG - 49
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
22J 380838/6475770
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Fonte Schmitz 1976; Goldmeier e Schmitz 1983; Schmitz 2006; CNSA 35433 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; CNSA 36207 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 35454 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; CNSA 36230 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; CNSA 36234 CEPA PUCRS; CNSA 36235 CEPA PUCRS; CNSA 36237 Naue, Schmitz e Becker 1968; Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; CNSA 36242
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
225
Localidade Taim Arroio Martins Distrito Industrial x x x x x Quitéria Quitéria Quitéria Quitéria Quitéria Quitéria Vila de Nossa Senhora da Conceição do Estreito
Cidade
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
Rio Grande
São José do Norte
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Mirim 01 Quitéria Barreira 3-01 Quitéria Barreira 3-02 Quitéria Barreira 3-03 Quitéria Barreira 3-04 Fazenda Pedro Oliveira Fazenda Adir Jesus de Quadro Aldeia Nossa Senhora da Conceição do Estreito
Placidino
Marcelino
Manuel
Fernando Lopes
Mujica
Nelson R. Oliveira
Quitério Pereira
Nome do sítio
RS - LC - 01
x
x
x RS - LS - 103 RS - LS - 104 RS - LS - 105 RS - LS - 106
x
x
x
x
x
RS 54
RS 52
Sigla
22J 421376/6478291
22H 351638/6400706 22 H0382686/6457896 22H 0382660/6457599 22H 0382684/6457374 22H 0382555/6457263 22H 0382753/6457529 22H 0381763/6455835
22J 377139/6470677
22H 379393/6455660
22J 378505/6461810
22J 379538/6459662
22H 389265/6442334
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Pestana 2007
Ribeiro 2006
Ribeiro 2006
Vidal 2012 Ribeiro 2006; CNSA RS02241 Ribeiro 2006; CNSA RS02242 Ribeiro 2006; CNSA RS02243 Ribeiro 2006; CNSA RS02244
Telles 2010
Telles 2010
Telles 2010
Telles 2010
Ferreira e Alves 2009
Fonte CEPA PUCRS; CNSA 35243 CEPA PUCRS; CNSA 35245
226
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Passinhos Curral Velho Curral Velho Capão Capão da Areia Capivaras Capivaras Bojuru Bojuru Bojuru Bojuru Bojuru
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
Capivaras
São José do Norte
Capivaras
Capivaras
São José do Norte
São José do Norte
Localidade
Cidade
Barranco E
Barranco D
Barranco C
Barranco B
Barranco A
Areias Gordas A
Antenor Paiva
Dilmo Martins
Romeu A. Costa Dilmo Martins/ José Érico Weber
Sermi M. Miguel
Passinhos 1
Capivaras 3
Capivaras 2
Capivaras 1
Nome do sítio
RS - LC - 07 RS - LC - 08 RS - LC - 24 RS - LC - 26 RS - LC - 27 RS - LC - 28 RS - LC - 29 RS - LC - 30 RS - LC - 31 RS - LC - 32 RS - LC - 33 RS - LC - 34 RS - LC - 35
Sigla RS - LC - 03 RS - LC - 04
22J 468138/6502545
22J 468776/6503105
22J 469086/6503434
22J 469791/6504207
22J 469936/6504439
22J 400856/6473288
22J 398219/6474473
22J 472053/6514453
22J 472102/6514495
22J 450606/6500795
22J 472689/6514841
22J 404352/6473906
22J 398219/6474473
22J 397798/6476043
22J 398593/6477249
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007 Pestana 2007; CNSA 02524 Pestana 2007; CNSA 02524
Pestana 2007 Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971; Pestana, 2007; CNSA 02513 Pestana 2007; CNSA 02514 Pestana 2007; 12ª SR IPHAN
Pestana 2007
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
227
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Bojuru Bojuru Bojuru Passinho Passinho Capão da Areia Pq. Nac. Lagoa do Peixe Guarita Capivaras Bojuru Velho Bojuru Velho Bojuru Velho Divisa Capão da Areia Capão da Areia Capão da Areia
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
São José do Norte
Localidade
Cidade
Antônio Farias
João Castro
João Castro
Elísio Firmino
RS 57
Bojuru Velho
Bojuru Velho C
Ângela Waise
Parna VI
Parna IV
Passinho III Sambaqui Capão da Areia
Passinho II A, B
Bojuru Velho B
Bojuru Velho A
Barranco F
Nome do sítio
RS 61
RS 60
RS 59
RS 58
RS 57
RS 56
Sigla RS - LC - 36 RS - LC - 37 RS - LC - 38 RS - LC - 40 RS - LC - 41 RS - LC - 59 RS - LC - 63 RS - LC - 67 RS - LC - 68 RS - LC - 69
x
x
x
x
x
x
x
22J 402502/6461691
22J 491933/6532990
22J 493162/6534605
22J 477667/6510033
22J 402553/6471430
22J 403905/6472907
22J 464533/6498410
22J 464481/6498378
22J 470033/6504545
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
LEPAN; 12ª SR IPHAN CEPA PUCRS; CNSA 01746 CEPA PUCRS; CNSA 01747 CEPA PUCRS; CNSA 01748 CEPA PUCRS; CNSA 01749 CEPA PUCRS; CNSA 01750 CEPA PUCRS; CNSA 36252
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
Fonte
228
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Campo Comprido Campo Comprido
Tavares
Tavares
Tavares
Campo Comprido
Campo da Honra
Tavares
Tavares
Campo da Honra
Tavares
Costa de Cima
Guarita
Tavares
Tavares
Capão da Marca
Tavares
Costa de Cima
Capão Comprido
São Lourenço do Sul
Tavares
Faz. Timbaúva
São Lourenço do Sul
Ponta Rasa
Localidade
Jacinto Inácio Monumento Balmário
São José do Norte
São José do Norte
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Cidade
Estado/País
Lino Azevedo Pires de Lima A Lino Azevedo Pires de Lima B Estevaldino Rodrigues A Sidnei da Silva Machado Levi Faria dos Santos
Campo da Honra B
Campo da Honra A
João R. Silva
Capão da Marca A
Dr. Crisanto Manuel M. Machado
Balmário
Sítio Jacinto Inácio 46b
Arroio do Inhame
Nome do sítio
RS 237 RS - LC - 09 RS - LC - 14 RS - LC - 18 RS - LC - 19 RS - LC - 20 RS - LC 45/79 RS - LC - 46 RS - LC - 56 RS - LC - 57 RS - LC - 58
RS 158
Sítio 47 Sítio Jacinto Inácio 46b
Sigla
22J 482939/6521371
22J 483129/6521982
22J 482935/6521322
x
22J 492771/6554573
x
x
22J 0492838/6534314
22J 484548/6536092
22J 483358/6522052
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Pestana 2007
Pestana 2007
Pestana 2007
LEPAN; 12ª SR IPHAN
CEPA PUCRS; Pestana 2007; CNSA 01768
LEPAN; 12ª SR IPHAN
LEPAN; 12ª SR IPHAN
Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971 CEPA PUCRS; CNSA 01847 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 01211 Pestana 2007; CNSA 02515 Pestana 2007; CNSA 02541 Pestana 2007; 12ª SR IPHAN
Fonte Naue, Schmitz, Valente, Becker, La Salvia e Schorr 1971
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
229
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Capororoca Rincão dos Linhares Capororoca Rincão dos Linhares Pta. Cristovão Pereira Capão Comprido Capão Comprido Lagoa do Bonito Pq. Nac. Lagoa do Peixe Farol Capão da Marca Farol Capão da Marca Tavares Terra de Areia Lagoa Itapeva Lagoa Itapeva Lagoa dos Quadros
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Terra de Areia
Terra de Areia
Terra de Areia
Terra de Areia
Tavares
Tavares
Tavares
Tavares
Localidade
Cidade
Sanga Funda
Manoel João
Oliveira Cardoso
Km 50.540
Parna V RS-75-Dona Conceição RS-78-Dona Conceição Luiz Antônio Lisboa
Bonito
Pontal 1 Estevaldino Luis Rodrigues II Napoleão Araújo Brum - Pontal 2
Taroca 2
Capororoca I
Taroca 1
Capororoca II
Nome do sítio
949 RS - LN - 39
946
898
RS 80
RS 78
RS 75
Sigla RS - LC - 60 RS - LC - 62 RS - LC - 62 RS - LC - 63 RS - LC - 64 RS - LC - 64 RS - LC - 65 RS - LC - 66 RS - LC - 66
x
x
x
x
x
x
x
22J 490320/6530631
x
22J 485399/6524270
22J 482618/6520849
x
x
22J 495426/6538872
x
22J 494580/6538502
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Marsul; CNSA 01340
CEPA PUCRS
CEPA PUCRS
CEPA PUCRS
Pestana 2007 CEPA PUCRS; CNSA 01764 CEPA PUCRS; CNSA 01767 CEPA PUCRS; CNSA 01769
Marsul; CNSA 00923
Pestana 2007 Pestana 2007; CNSA 00927
Marsul; CNSA 00926
Marsul; CNSA 00922
Pestana 2007
Marsul; CNSA 00921
Pestana 2007
Fonte
230
Terra de Areia
Rio Grande do Sul
Torres
Torres
Torres
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Itapeva
Itapeva
Itapeva
x
Lagoa Itapeva
Terra de Areia
Torres
Lagoa Itapeva
Terra de Areia
Km 50,540/BR101
Lagoa Itapeva
Terra de Areia
Terra de Areia
Lagoa Itapeva
Terra de Areia
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Cornélios
Terra de Areia Lagoa Itapeva
Localidade
Cidade
Estado/País Rio Grande do Sul
Caixa dágua
Balneário de Itapeva
RS - LN - 02
Darci Leal
Família Nunes
Sítio do Areal
Lomba da Folia
Sítio do Lima Onildo R. de Aguiar
Manoel João
Nome do sítio Fazenda S. Antônio- irmã da Giza
LII 07 RS-LN - 02 (Hilbert) RS-LN - 03 (Hilbert) RS-LN - 04 (Hilbert)
LQQ 02
LII 13
LII 12
LII 11
LII 10
LII 09
Sigla RS - LN - 96
22J 619475/6748422
22J 619319/6747987
22J 619638/6748631
22J 614451/6745569
22J 588047/6723795
22J 594497/6727148
x
22J 593274/6727399
22J 592392/6727968
22J 592756/6728786
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Wagner 2004; CNSA 02436
Wagner 2004; CNSA 02433
Wagner 2004
Fonte Becker 2007; CNSA 00973 Monticelli et al. 2000; Wagner, 2004; CNSA 02249 Monticelli et al. 2000; Wagner, 2004; CNSA 02248 Monticelli et al. 2000; Wagner, 2004 Monticelli et al. 2000; Wagner, 2004 Monticelli et al. 2000; Wagner, 2004 12ª SR IPHAN; Monticelli et al. 2003; Wagner 2004 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
231
Torres
Rio Grande do Sul Castelinho
Campo do Cortume
x
Torres
Rio Grande do Sul
Itapeva
Torres
Torres
Rio Grande do Sul
Itapeva
Castelinho
Torres
Rio Grande do Sul
Itapeva
Itapeva
Itapeva
Localidade
Torres
Torres
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Torres
Torres
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul
Cidade
Estado/País
RS - LN - 22 Entre Itapeva e Lagoa do Jardim
RS - LN - 21
RS - LN - 19
RS - LN - 10
RS - LN - 09
RS - LN - 08
Camping Itapeva
RS - LN - 06
Nome do sítio
RS 204
Sigla RS-LN - 06 (Hilbert) RS-LN - 07 (Hilbert) RS-LN - 08 (Hilbert) RS-LN - 09 (Hilbert) RS-LN - 10 (Hilbert) RS-LN - 19 (Hilbert) RS-LN - 21 (Hilbert) RS-LN - 22 (Hilbert) x
22J 615442/6746763
22J 618726/6747011
22J 621442/6752213
22J 620863/6750616
22J 620914/6749950
22J 621014/6750413
22J 621211/6750704
22J 619867/6748648
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Wagner 2004 Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 01278
Wagner 2004; CNSA 02450
Wagner 2004; CNSA 02448
Wagner 2004; CNSA 02441
Wagner 2004; CNSA 02440
Wagner 2004; CNSA 02439
Wagner 2004; CNSA 02438
Wagner 2004; CNSA 02437
Fonte
232 Arroio Mato Morto x x x BR 101
Tramandaí
Três Cachoeiras
Três Cachoeiras
Três Cachoeiras
Três Cachoeiras
Três Cachoeiras
Rio Grande do Sul Chimarrão
Arroio Mato Morto
Tramandaí
Lagoa
Tramandaí
Mato Morto
Pontal
Tramandaí
Tramandaí
x
Tramandaí
Tramandaí
x
Tramandaí
Tramandaí
BR 101
Localidade
Torres
Cidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Chimarrão
Jazida de Areia 5
Irmãos Broda
Mário Mengue
Cemitério
Mato Morto 3
Mato Morto 2
Lagoa do Armazém Passo Fundo - M 16 Praia de SantaTeresinha 1 e 2 - M 17 Sambaqui Mato Morto
Família Machado TG da Lagoa de Tramandaí TG da Lagoa do Armazem
Nome do sítio
LII 01
x
LII 04
LII 03
LII 02
RS - LN - 17 RS - LN - 14 RS - LN - 42 RS - LN - 43
BAM 06 RS - LN - 248 RS - LN - 249 RS - LN - 15 RS - LN - 16
Sigla
22J 599090/6736438
x
22J 603730/6740383
22J 601645/6739759
22J 601504/6739654
x
x
x
x
x
x
x
x
22J 618659/6755700
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Marsul; CNSA 01302 Monticelli et al., 2003; Wagner 2004 Monticelli et al., 2003; Wagner 2004 Monticelli et al., 2003; Wagner 2004 Monticelli e Domiks 1998; CNSA 02103 Monticelli et al. 2003; Wagner 2004; CNSA 02303
Marsul; CNSA 01301
12ª SR IPHAN
Goldmeier e Schmitz 1983; CNSA 01290
CNSA 00965
Marsul; CNSA 01289
Becker 2007
Becker 2007
Fonte Monticelli et al. 2003; Wagner 2004; CNSA 02297
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
233
laguna dos Patos Itapuã
Viamão
Viamão
Viamão
Rio Grande do Sul
Itapuã
Itapuã
Praia da Onça
Viamão
Viamão
Itapuã
Viamão
Itapuã
Morro do Coco
Viamão
Viamão
Itapuã
Viamão
Itapuã
Itapuã
Viamão
Viamão
Praia do Sítio
Viamão
Itapuã
Viamão Itapuã
Distrito do Espigão
Viamão
Viamão
Localidade
Cidade
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Ponta dos Coatís
x
Nei Bueno
Praia da Pedreira
Morro da Fortaleza
Praia do Araçá
Praia da Onça
Morro do Coro Pedreira - Morro da Fortaleza
Morro do Farol
Prainha
Praia do Sítio
Praia das Pombas
Colônia Itapuã
Nome do sítio Aldeia do Cantagalo
x
x
RS 272
RS - LC - 07 RS - LC - 39 RS - LC - 74
RS - LC - 08 RS - LC - 15 RS - LC - 16 RS - LC - 17 RS - LC - 18 RS - LC - 03 RS - LC - 11
Sigla RS - LC - 01 RS - LC - 02
x
x
x
22J 0495161/6641730
22J 0495200/6642250
22J 0496150/6640750
22J 0495088/6642544
22J 0495161/6641730
22J 0495718/6651542
22J 0494500/6638400
22J 0494944/6638618
22J 0495594/6639135
22J 0496303/6643308
x
22J 0498081/6659494
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Dias e Silva 2012 Silva 1992; Dias e Silva 2012 Zortéa 1995; Dias e Silva 2012 Silva 1992; Noelli et al. 1997; Dias e Silva 2012; CNSA 35379 Dias e Silva 2012; Zortéa 1995 Dias e Silva 2012; CNSA 01313 Dias e Silva 2012; CNSA 01940 Porto Alegre 1906; Silva 1992; Noelli et al. 1997 Spalding 1939, 1940, 1943, 1967, s.d.; Noelli et al. 1997
Dias e Silva 2012
Dias e Silva 2012
Fonte Silva 1992; Dias e Silva 2012 Silva 1992; Dias e Silva 2012 Silva 1992; Zortéa 1995; Noelli et al 1997; Dias e Silva 2012 Zortéa 1995; Dias e Silva 2012
234
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Estado/País
Praia de Xangrilá Fazenda Nunes Fazenda Nunes Fazenda Nunes Fazenda Nunes Fazenda Nunes Fazenda Nunes x x x x
Xangrilá
Xangrilá
Xangrilá
Xangrilá
Xangrilá
Xangrilá
Xangri-lá
x
x
x
x
Águas Claras
Viamão Itapuã
Jardim Lisboa
Viamão
Viamão
Itapuã/Lagoa Negra
Localidade
Viamão
Cidade
Posto do Salim
Sítio do Gringo
Fazenda Lucita I Aldeia de Itapeva TG/Taquara
Nunes 6
Nunes 5
Nunes 4
Nunes 3
Nunes 2
Nunes 1
Capão Alto - M 19
Ilha do Junco
Pomar da Lagoa I
Nome do sítio Lagoa Negra I (ex RS-LC-04: Lagoa Negra I e RS-LC-06: Lagoa Negra II) Novo Lar de Menores
RS - LC - 70 RS - LN - 19 RS - LN - 20 RS - LN - 21 RS - LN - 22 RS - LN - 23 RS - LN - 24 RS - LN - 26 RS - LN - 115 RS - LN - 122 RS - LN - 124 RS - LN - 128
x
RS 88
RS - LC - 75
Sigla
x
x
x
x
22J 588376/6704544
22J 589695/6703442
22J 589554/6703589
22J 589485/6703752
22J 589479/6703939
22J 589429/6704088
22J 592905/6704099
22J 493700/6641900
22J 513106/6663477
x
22J 500977/6641531
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Marsul; Wagner 2009
Marsul; Wagner 2009 Marsul; CNSA 35166; Wagner 2009
Dias e Silva 2012 Silva 1992; Noelli et al. 1997; Dias e Silva 2012; CNSA 00989 Ribeiro 1982; CNSA 02115; Wagner 2009 Miller 1967; CNSA 35162; Wagner 2009 Miller 1967; CNSA 35163; Wagner 2009 Marsul; CNSA 35164; Wagner 2009
Dias e Silva 2012; CNSA 01402 Dias e Silva 2012; CNSA 01777
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
235
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Localidade x x x x x x x x x x x x x x x x
Cidade
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Aldeia Gaivota TG/DNIT/Duplicação 101 TG/Sítio da Torre Telefônica Família Raulino Passo da Caveira
Ilda Borges Aldeia Tupiguarani Tapera/Osório Profa. Eroni Behenck
Osvaldo Boff
Margareth Weber Luiz Nolasco de Souza
Hilário Maggi
Jazida do Valter Fazenda Prof. Luiz C. Hainzerender Aldeia do Guerreiro Aldeia TG da Itapeva João Fernandes Neto
Nome do sítio
Sigla RS - LN - 129 RS - LN - 131 RS - LN - 132 RS - LN - 134 RS - LN - 141 RS - LN - 142 RS - LN - 143 RS - LN - 144 RS - LN - 146 RS - LN - 151 RS - LN - 154 RS - LN - 157 RS - LN - 158 RS - LN - 166 RS - LN - 167 RS - LN - 170 x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Fonte
236
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Localidade x x x x x x x x x x x x x x x x
Cidade
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
TG da Itapeva
Campo Bonito
Lagoa dos Quadros
Sítio da Lagoinha
Noir Evaldt Boff Sítio da Olaria Km 51 Sítio da Sanga Funda
Morro dos Lippert
Família Scheffer
Sítio do Alegre Sítio Pedro Machado Martins (Boró)
Sítio do Cemitério
Família Behenck Sítio do Marino Jorge Sítio do Juca Fernandes
Nome do sítio Pedro Raulino Passo da Caveira
Sigla RS - LN - 171 RS - LN - 172 RS - LN - 178 RS - LN - 179 RS - LN - 181 RS - LN - 182 RS - LN - 183 RS - LN - 184 RS - LN - 186 RS - LN - 189 RS - LN - 202 RS - LN - 203 RS - LN - 209 RS - LN - 212 RS - LN - 218 RS - LN - 220 x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
237
x x x x x x x Morro Alto x x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Rio Grande do Sul
Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
x
x
x x x
x
x
x
x
Localidade
Cidade
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul
Jazida da Formiga
Mariante Gomes
Orlando José Bohn
Lindomar Conceição Viegas (Bado)
TG da Areia TG da Lagoa do Horácio
TG da Lagoa Negra TG da Lagoa do Ramalhete
TG do Pontal
TG da BR 101 TG da Lagoa da Pinguela TG da Lagoa do Peixoto
TG da Perdida TG da Lagoa dos Barros
TG do Faxinal
Nome do sítio
Sigla RS - LN - 222 RS - LN - 225 RS - LN - 234 RS - LN - 238 RS - LN - 239 RS - LN - 240 RS - LN - 241 RS - LN - 242 RS - LN - 243 RS - LN - 247 RS - LN - 251 RS - LN - 65 ABC RS - LN - 70 ABC RS - LN - 71 RS - LN - 72 x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Fonte
238
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Rio Grande do Sul Santa Catarina
x Caverazinho Rio dos Porcos Rio dos Porcos
Araranguá
Araranguá
Araranguá
Araranguá
Araranguá
Campo Mãe-Luzia
Araranguá Barra Velha Morro dos Conventos
Hercílio Luz
Araranguá
Araranguá
Hercílio Luz
Araranguá
Rio Parati
Araquari
Caverazinho
x
x
Araranguá
x
x
Lagoa Mãe-Luzia
x
x
Araranguá
Localidade
Cidade
Aldeia do Trevo Campo Mae Luzia 01 Campo Mae Luzia 02
Aldeia da Lagoa Mãe-Luzia Morro dos Conventos Ceramico Roça do Mato Alto
Darci Azevedo Pedro Rubem Prestes Sambaqui da Foz do Rio Parati Aldeia da Mangueira do Marcelino Escola Isolada Caverazinho Aldeia do Levandoski Aldeia da Roça de Milho Aldeia da Roça de Melancia
Nelson Müller
Nome do sítio
x
x
x
x
ARA 010 SC - LS - 06
ARA 005 ARA 006 ARA 007 ARA 008 ARA 009
x
Sigla RS - LN - 77 RS - LN - 80 RS - LN - 86
22J 660610/6802215
22J 660532/6802444
22J 6796400/649851
22J 644465/6795496
x
22J 663557/6805711
22J 6627471/6803943
22J 6599921/6801688
22J 657746/6800919
22J 6796114/649820
22J 6805800/663838
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x 610 ± 60 AP (LVD-FATEC) / TL
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Lavina 2000; Lino 2007
Lavina 2000; Lino 2007
De Masi 2007 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01090
12ª SR IPHAN
Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01103
Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01092 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01093 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01100 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01101 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01102
Gualberto 1908
Becker 2007
Becker 2007
Becker 2007
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
239
Rio dos Porcos Arroio do Silva Balsa Morro dos Conventos Figueirinha Lagoa do Rodeio Comunidade de Palmeira Pântano do Sul Pântano do Sul Pântano do Sul Pântano do Sul Pântano do Sul Pântano do Sul Pântano do Sul
Araranguá Balneário Arroio do Silva Balneário Arroio do Silva
Balneário Gaivota
Balneário Gaivota
Florianópolis
Florianópolis
Florianópolis
Florianópolis
Florianopólis
Florianopólis
Florianopólis
Florianópolis
Santa Catarina
Caiacanga Açu
Rio dos Porcos
Araranguá
Balneário Gaivota
Localidade
Cidade
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Florianópolis 44 Dunas do Pantano do Sul II Dunas do Pantano do Sul III Dunas do Pantano do Sul IV Ponta da Caiacanga- Açu/Florianópolis 41
Florianópolis 40 Dunas do Pântano do Sul I
Florianópolis 39
Palmeira
Lagoa do Rodeio
Aldeia da Balsa Cemitério B. Gaivota 1
Arroio do Silva
Nome do sítio Campo Mae Luzia 03 Campo Mae Luzia 04
FLN 066
x FLN 004 FLN 062 FLN 062 FLN 063 FLN 063 FLN 064 FLN 065
x
x
x ARA 011
x
x
Sigla
22J 738182/6926640
22J 745299/6924707
22J 744827/6924784
22J 745053/6924754
x
22J 745023/6924780
x
x
22J 640131/ 6782169
22J 636150/ 6777849
x
22J 6568461/6794444
22J 654809/6794312
22J 661354/6803135
22J 661055/6802904
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Rohr 1984; CNSA 00343
CNSA 00341 Lavina 1988; CNSA 00342
Rohr 1977; CNSA 00340
Rohr 1984; CNSA 00281 Chmyz 1976; Rohr 1977, 1984; CNSA 55244 Rohr 1977; Farias e Kneip 2010, CNSA 00339 Chmyz 1976; Rohr 1977, 1984; CNSA 55245
IPAT/UNESC; Lavina 2000
IPAT/UNESC; Lavina 2000
IPAT/UNESC; Lavina 2000
IPAT/UNESC; Lavina 2000 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01106
Lavina 2000; Lino 2007
Lavina 2000; Lino 2007
Fonte
240
Florianópolis
Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Lagoa da Conceição
Florianópolis
Tapera x x x Jurerê
Florianópolis
Florianópolis
Florianopólis
Florianopólis
Florianopólis
Base Aérea
Dunas da Lagoa da Conceição
Rio Tavares
Florianópolis
Florianópolis
Santa Catarina
Localidade
Santa Catarina Santa Catarina
Cidade
Estado/País
Rio do Meio
Tapera Rua das Garcas Campeche Costeira do Pirajubaé Ponta da Caicanga-Açu
Base Aérea
Rendeiras
Lagoinha do Rio Tavares/Florianópolis 42 Dunas da Lagoa da Conceição/Florianópolis 43
Nome do sítio
x
x
x
x
22J 738182/6926640
22J 744057/6940470
22J 746843/6934710
22J 739918/6934533
SC - LF - 02/ FLN 058 x
x
22J 750549/6943743
x
22J 7423308/6956038
Coordenadas
SC - LF - 01
FLN 068 FLN 069
FLN 067
Sigla
x
x
x
x
1400 ± 70 A.D. / C¹⁴
x
x
x
x
Datação/ Método
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
De Masi 1999
Rohr 1971; CNSA 00346 Schmitz 1959; Rohr 1959; Chmyz 1968, 1976; Prous e Piazza 1977; Schmitz, Verardi, De Masi, Rogge e Jacobus 1993; CNSA 55195 Rohr 1959, 1966; Chmyz 1976; Prous e Piazza 1977; Schmitz 1988; Silva 1988; Silva, Schmitz, Rogge, De Masi e Jacobus 1990; Silva 1990; Chmyz 1976; Schmitz, Verardi, De Masi, Rogge e Jacobus 1993; CNSA 55240
Rohr 1984; CNSA 00345
Fonte Piazza 1965; Chmyz 1976; Prous e Piazza 1977; Rohr 1984; CNSA 00344
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
241
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina x Ingleses Praia do Campeche x Campeche Dunas da Lagoa da Conceição Naufragados
Florianopólis
Florianópolis
Florianópolis
Florianopólis
Florianópolis
Florianópolis
Rio Vermelho Praia da Ferrugem Praia do Rosa Praia da Gamboa I Gamboa Praia do Rosa Armação da Piedade x
Florianópolis
Garopaba
Garopaba
Garopaba
Garopaba
Garopaba
Gov. Celso Ramos
Guaramirim
Florianópolis
Localidade
Cidade
SC-VI-69
Praia do Rosa Armação da Piedade
Garopaba 3
Praia da Gamboa 2
Porto Rio Vermelho 1 Aldeia da Praia da Ferrugem Aldeia da Praia do Rosa
Naufragados
Florianópolis 44
Lagoinha
Pantano do Sul II
Valda 1 Povoado do Campeche
Nome do sítio Dunas do Pantano do Sul V
x SC - VI - 69
x
x GRB 002 GRB 003
x
x
x
x
x
x
x
22J 754385/6953086
SC PRV - 01 x
22J 739868/6919008
x
22J 748616/6938503
22J 745372/6924565
22J 562790/6640402
22J 744823/6924872
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
910 A.D. / C¹⁴
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Wiener 1876 Eble 1973; Eble e Scatamacchia 1974
Bandeira 2004
IPAT/UNESC; Lavina 2000 Rohr 1984; Farias e Kneip 2010; CNSA 00405 Rohr 1984; Farias e Kneip 2010; CNSA 00406
IPAT/UNESC; Lavina 2000
Rohr 1984 Simas 1997 (com. Pessoal) Bigarella 1949; Rohr 1960; Duarte 1971; Lavina 2000; De Masi 1999; De Masi 2007; CNSA 55227
Rohr 1971
Rohr 1969
Rohr 1961
Lavina 1988 Montardo e Bandeira 1993
Fonte
242
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Lagoa dos Esteves Lagoa dos Esteves Lagoa dos Esteves Lagoa do Faxinal Lagoa dos Esteves Lagoa dos Esteves
Içara
Içara
Içara
Içara
Içara
Içara
Lagoa dos Esteves
Içara
Barra Velha
Içara Lagoa dos Esteves
Lagoa dos Esteves
Içara
Içara
Praia do Rincão
Urussanga Velha
Içara
Içara
Lagoa dos Esteves
Içara
Lagoa dos Esteves
Rio Uruguai
Ibirama
Içara
Localidade
Cidade
Aldeia do Pomar Aldeia Condomínio Bouganville Aldeia Lagoa do Giassi Aldeia do Camping Viana
Aldeia do Arseno Aldeia da Esc. Isolada da Lagoa dos Esteves Aldeia do Mussuline
Luquinha do Zé Pequeno Aldeia Sebastião Geraldo Aldeia do Camping Vieira Aldeia do Areal do Mussuline Aldeia do Cemitério da Lagoa dos Esteves
Praia do Rincão III
Praia do Rincão II
Ibirama I
Nome do sítio
x
x
x
IÇA 011 IÇA 012 IÇA 013
IÇA 009 IÇA 010
IÇA 004 IÇA 005 IÇA 007 IÇA 008
IIR 001 IÇA 002 IÇA 003
Sigla
22J 6806193/665314
x
x
22J 665272/6807103
22J 665572/6805042
22J 666277/6808413
22J 667245/6808984
22J 665644/6807591
22J 6805042/665572
x
x
22J 668478/6809435
x
x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x 720 ± 70 AP (LVD-FATEC) / TL
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
IPAT/UNESC; Lavina 2000 IPAT/UNESC; Lavina 2000; Campos 2010
IPAT/UNESC; Lavina 2000
Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 56021 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 56026 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01105
Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 56016 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01095
CNSA 00428 Farias e Kneip 2010; CNSA 01089 Lavina 2000; Lino 2007; CNSA 01104
Fonte Farias e Kneip 2010; CNSA 00983 Farias e Kneip 2010; CNSA 00425 Farias e Kneip 2010; CNSA 00426 IPAT/UNESC; Lavina 2000; Farias e Kneip 2010; CNSA 00427
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
243
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Penha Centro da Cidade Sambaqui Vila Nova
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imaruí
Penha
Praia do Rincão Barreiros do Rio D’Una Barreiros do Rio D’Una Barreiros do Rio D’Una
Içara
Imbituba
Lagoa dos Esteves
Içara
Santa Catarina
Lagoa dos Esteves
Içara
Imaruí
Terra Firme
Içara
Imaruí
Pedreiras
Içara
Barra Velha
x
Içara
Içara
Localidade
Cidade
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Santa Catarina
Campo de Aviação
Imbituba 13
Imbituba 12
Eugeniano B Borges
Eugeniano B Borges
Balsinha 7
Balsinha 6
Balsinha 5
Praia do Rincão I
Urussanga Velha Aldeia do Campestre Aldeia do Camping Silva
Pedreiras
Lagoa dos Freitas Acampamento da Plataforma da Barra Velha
Nome do sítio
x IMA 004
x
x IMI 011 IMI 012 IMI 013 SC PEST - 18 SC PEST - 19
x
x
x
x
x
x
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
x
x
22J 665314/6806671
22J 666999/6808104
22J 673150/6814732
22J 671920/6812157
22J 668977/6807260
22J 673700/6812150
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
CNSA 00449
Rohr 1984
Rohr 1984
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Rohr 1984; CNSA 00441
Rohr 1984; CNSA 00440
Rohr 1984; CNSA 00439
Farias e Kneip 2010
Lavina 2000; Lino 2007
Lavina 2000; Lino 2007
Lavina 2000; Campos 2010 Lavina 2000; Campos e Lino 2003; Campos 2010 Lavina 2000; Campos e Lino 2003; Campos 2010
Fonte IPAT/UNESC; Lavina 2000; Campos 2010
244
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Santa Catarina
Foz do Rio de Una x x x x Roça Grande x
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Enseada de Imbituba Morros de Itapirubá
Nova Brasília Enseada de Imbituba
Imbituba
Imbituba
Nova Brasília
Itapirubá
Imbituba
Imbituba
Localidade
Cidade
Cerâmico da Torre
Km 295
Km 265
Engenho
Awyra
Araçatuba
entre as dunas entre as dunas, perto do caminho do Mirim perto da ponta de Itapirubá campo perto do sambaqui do Rio de Una
Nova Brasília
Aldeia da ZPE
Itapirubá 1
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
IMA 023 IMA 025
Sigla IMA 014
22J 725733/6872707
22J 722920/6865345
22J 722920/6865345
x
22J 726874/6880844
22J 727217/6886890
x
x
x
x
22J 725493/6877980
22J 726040/6876650
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x 1000 ± 110 AP 810 ± 85 AP1040 ±110 AP 715± 75 AP 1050 ±150 AP / TL
Datação/ Método
De Masi 2007
Silva 1999; De Masi 2007
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Abreu 1928, 1944
Abreu 1928
Abreu 1928
Abreu 1928
Lavina 2000; Lino 2007; Farias e Kneip 2010; Milheira 2010; CNSA 01087 Silva 1999; Farias e Kneip 2010
Rohr 1984; CNSA 00459
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
245
x x Praia do Rosa Alto Arroio Arroio Arroio Sambaqui Dunas de Guaiúba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Imbituba
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Morro Bonito
Morro Bonito
Morro Bonito
Morro Bonito
Guaiúba
Localidade
Cidade
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Morro Bonito IV
Morro Bonito III
Morro Bonito II
Morro Bonito I
Guaiúba
Dunas de Guaiúba
Darcí S. de Souza
Arroio 2
Arroio 1
Alto Arroio
Nome do sítio Cerâmico do Engenho Cerâmico Nova Brasilia Aldeia Canto do Norte
JUU 04
JUU 03
JUU 02
JUU 01
SC - LL - 70
x
x
x
x
x
x
x
x
Sigla
22J 698650/6834316
22J 696340/ 6833244
22J 697129/6833686
22J 699077/6833937
22J 723446/6868740
x
x
x
x
x
22J 731529/6886518
22J 725736/6876186
22J 725456/6872707
Coordenadas
x
520 ± 50 AP (Beta 262753) / C¹⁴ 510 ± 40 AP (Beta 262754) / C¹⁴ 440 ± 40 AP (Beta 262755) / C¹⁴
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
11ª SR IPHAN; Silva 1999 Eble e Schmitz 1972; Prous e Piazza 1977; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010
11ª SR IPHAN; Silva 1999
11ª SR IPHAN; Silva 1999
11ª SR IPHAN; Silva 1999
11ª SR IPHAN; Silva 1999
11ª SR IPHAN; Silva 1999
De Masi 2007
De Masi 2007
Fonte
246
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Riachinho Riachinho
Jaguaruna
Albardão
Jaguaruna
Jaguaruna
Olho D’água
Jaguaruna
x
Olho D’água
Jaguaruna
Jaguaruna
Olho D’água
Jaguaruna
x
Olho D’água
Jaguaruna
Jaguaruna
Olho D’água
Jaguaruna
Jaguaruna
Olho D’água
Jaguaruna
Riacho dos Franciscos
Olho D’água
Olho D’água
Localidade
Jaguaruna
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Cidade
Estado/País
Riachinho III
Riachinho II
Jaguaruna IV
Campo Bom V
Laranjal I
Olho d’agua X Albardão do Morro Bonito
Olho d’agua IX
Olho d’agua VIII
Olho d’agua VII
Olho d’agua VI
Olho d’agua V
Olho d’agua IV
Olho d’agua III
Nome do sítio
x
x
x
x
JUU 37
JUU 34
JUU 17
JUU 16
JUU 15
JUU 14
JUU 13
JUU 12
JUU 11
JUU 10
Sigla
22 J 693663 6830145
22 J 693486 6829626
22 J 692520 6832583
22 J 686029 6825335
22J 701597/6832366
x
x
x
x
x
x
x
22 J 682657 6823373
22 J 680214 6817362
Coordenadas
x
x
x
x
440 ± 40 AP (Beta 262751) / C¹⁴
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
CNSA 00659 Rohr, 1969; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010; CNSA 00662 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011
CNSA 00643
CNSA 00642
CNSA 00641
CNSA 00640
CNSA 00639
CNSA 00638
Fonte Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010; CNSA 00636 Rohr, 1969; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; CNSA 00637
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
247
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina
Riachinho
Jaguaruna
Morro Bonito
Morro Bonito
Morro Bonito
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Arroio Corrente
Localidade
Cidade
Estado/País Santa Catarina
Morro Bonito VI
Morro Bonito V
Morro Bonito IX
Laranjal VII
Laranjal VI
Laranjal V
Laranjal IV
Laranjal III
Laranjal II
Arroio Corrente V
Riachinho IV
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Sigla
22J 698595/6834588
22J 698456/6833956
22J 697989/6832294
22 J 695957 6828063
22 J 699507 6829595
22 J 699343/ 6829452
22 J 699271 6829441
22J 700993/6832429
22J 702185/6832251
22 J 691901 6825308
22 J 693422 6830444
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x 470 ± 40 AP (Beta 280654) / C¹⁴
Datação/ Método
Fonte Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010
248
Cidade
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Estado/País
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Riacho dos Franciscos
Olho D’água
Olho D’água
Campo Bom
Morro dos Encruzos
Morro Bonito
Morro Bonito
Morro Bonito
Localidade
Riacho dos Franciscos III
Riacho dos Franciscos II
Riacho dos Franciscos I
Olho d’água II
Olho d’água I
Campo Bom IV
Morro dos Encruzos
Morro Bonito X
Morro Bonito VIII
Morro Bonito VII
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Sigla
22J 700504/6832738
22J 700811/6833030
22J 700003/6833329
22 J 678615 6816241
22 J 675956 6813757
22 J 688393 6824414
22J 691910/6835037
22J 697350/6833662
22J 0696050/6832600
22J 697808/6834415
Coordenadas
x
x
x
x
x 560 ± 40 AP (Beta 280652) 920 ± 60 AP (Beta 280653) / C¹⁴
x
x
x
x
Datação/ Método
Rohr 1969; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010
Fonte Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Rohr 1969; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
249
Arroio da Cruz
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina x
x
x
x
Jaguaruna
Faz. Arlete
Jaguaruna
Santa Catarina Santa Catarina
Ilhota
Jaguaruna
Riacho dos Franciscos
x
Jaguaruna
Santa Catarina
Riacho dos Franciscos
Localidade
Jaguaruna
Jaguaruna
Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Cidade
Estado/País
Jaguaruna 38/Arroio Corrente
Jaguaruna 37/Arroio Corrente III
Jaguaruna 36/Arroio Corrente II
Jaguaruna 16
Jaguaruna 34/Arroio Corrente I
Faz. Arlete
Jaguaruna 14
Costa Lagoa I / Jaguaruna 33
Sibelco
Samae
Nome do sítio
x SC - J - 18 / JUU 52 SC - J 20 SC - J - 24 / JUU 53 SC - J - 25 / JUU 54 SC - J - 26 / JUU 48
x SC - J - 16 / JUU 30 SC - J 17
x
Sigla
22 J 693854/6826920
22 J 692626/6825302
22 J 692699/6826787
x
22 J 693326/6827328
x
x
x
22J 695611/6832335
22J 702781/6832549
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x 550 ± 60 AP (Beta 262752) / C¹⁴
Datação/ Método
Rohr 1969, 1984; Farias e Kneip 2010; CNSA 55587 Rohr 1969, 1984; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; CNSA 55588 Rohr 1969, 1984; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010; CNSA 55582
LAU Rohr 1969, 1984; Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010; CNSA 55586 Rohr 1969, 1984; CNSA 55564
Rohr 1969, 1984; CNSA 55564 Rohr 1969, 1984; CNSA 55561
Fonte Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010 Milheira 2010; Milheira e DeBlasis 2011; Farias e Kneip 2010
250 Albardão Laranjal Albardão Albardão x x
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Jaguaruna
Joinville
Santa Catarina
Km 37 BR 101
Laguna
Laguna
Santa Catarina Morro da Glória
Poço Grande
Joinville
Santa Catarina Santa Catarina
Itacoara
Torneiro
Localidade
Jaguaruna
Cidade
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País
Caieira
José M. Costa
Poço Grande
Itacoara
Riachinho V
Jaboticabeira IV
Jaguaruna 53
Jaguaruna 52
Jaguaruna 50
Jaguaruna 48
Jaguaruna 47
Nome do sítio
SC - LL - 29
x
x
SC - LJ - 57
x
x
Sigla SC - J - 41 / JUU 33 SC - J 42 SC - J 44 SC - J 47 SC - J 48
22J 718209/6850914
x
22J 0714993/7073270
x
22 J 694050 6828647
22J 698064/6836589
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
340 ± 35 AP / TL
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
11ª SR IPHAN; Silva 1999 Abreu 1928; Meggers 1968; Beck 1971, 1972; Hurt 1974; Prous e Piazza 1977; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988; CNSA 55619
Rohr, 1969 Tiburtius, Bigarela e Bigarela 1950-1951; Prous e Piazza 1977; Neves 1988; Schmitz, De Masi, Verardi, Lavina e Jacobus 1992; Bandeira 2000 Piazza 1974; Bandeira, 2004; 2012; Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Rohr 1969, 1984; CNSA 55567 Rohr 1969, 1984; CNSA 55568 Rohr 1969, 1984; CNSA 55571 Rohr 1969, 1984; CNSA 55538 Rohr 1969, 1984; CNSA 55537
Fonte
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
251
x x x x Ribeirão Pequeno
Laguna
Laguna
Laguna
Laguna
Laguna
Palhoça
Palhoça
Palhoça
Palhoça
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Congonhas
Laguna
Praia de Fora Massiambu Três Barras Massiambu
Palhoça
Palhoça
Palhoça
Palhoça
Albardão
Albardão
Pinheira
Pinheira
Localidade
Cidade
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Aviãozinho
Três Barras
Posto Massiambu
Praia de Fora
Nestor C Santos
Saturnino A Santos
Nestor M. Matos
Sabino J. Silveira
Taquaruçu
Bentos II
Bentos I
Cerâmico Peixaria
Cerâmico KM 308
Congonhas 1
Nome do sítio
x
x
x
x SC PEST - 04 SC PEST - 08 SC PEST - 11 SC PEST - 16 SC PEST - 24
x
x
x
x
Sigla SC - LL - 30
22J 733382/6920104
x
x
x
x
x
x
x
22 J 705517/6853000
22J 716275/6856430
22J 716540/6856075
22J 719334/6859518
22J 716307/6855519
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
11ª SR IPHAN; Silva 1999 11ª SR IPHAN; Silva 1999; De Masi 2007
11ª SR IPHAN; Silva 1999
CNSA 00739
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Assunção, 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
De Masi 2007
De Masi 2007
Fonte Beck 1971, 1972; Rohr 1984; CNSA 55842
252 Praia da Pinheira Maciambu
Palhoça
Palhoça
Paulo Lopes
Paulo Lopes
Paulo Lopes
Paulo Lopes
Paulo Lopes
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Massiambu
Palhoça
Est. P/ Gamboa x x x x
Paulo Lopes
Passo de Torres
Passo de Torres
Passo de Torres
Passo de Torres
Gamboa
Gamboa
Costa do Morro
Dunas de Gamboa
Gamboa
Localidade
Cidade
Estado/País Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Passo de Torres V
Passo de Torres IV
Passo de Torres III
Passo de Torres II
Paulo Lopes
Manuel F. Pereira
Vitauro Lopes
Amadeu A Moisés
x
Ildefonso Vieira
Maciambu I
Praia da Pinheira II
Faz. S. Inês
Nome do sítio
x
x
x
x
x SC PEST - 06 SC PEST - 07 SC PEST - 17 SC PEST - 21 SC PEST - 22 SC PEST - 23
x PAC 004
Sigla
22J 622251/6759338
22J 622800/6759327
22J 622661/6759419
22J 622357/6759427
x
x
x
x
x
x
22J 733120/6918236
x
22J 733216/6919925
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010
Farias e Kneip 2010; CNSA 55711
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Eble e Reis 1976
Fonte 11ª SR IPHAN; Silva 1999; De Masi 2007 Rohr 1984; Farias e Kneip 2010; CNSA 00742 Rodrigo Lavina, com. Pessoal; De Masi 2007
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
253
Rio Novo x Arroyo Viscaíno
Sombrio Depto. Colonia Depto Río Negro
Depto Río Negro
Depto. Rocha Depto. Rocha
Uruguai
Uruguai Uruguai
Bopicuá Banhado de San Miguel Punta del Diablo
Guarita
Sombrio
x
São Martinho
Guarita
x
São Martinho
Sombrio
x
São Martinho
x
x
São Francisco do Sul
São Martinho
Ilha do Linguado
x
Passo de Torres
Araquari
Localidade
Cidade
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Uruguai Uruguai
Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina Santa Catarina
Estado/País Santa Catarina
Isla Larga Punta del Diablo
Bopicuá
Aldeia do Rio Novo Riachuelo Arroyo Viscaíno
Guarita 2
Guarita 1
São Martinho 08
São Martinho 05
São Martinho 03
São Martinho 02
Ilha do Linguado II Sao Francisco do Sul
Passo de Torres I
Nome do sítio
x x
x
x x x
SM 08 ARA 013 ARA 014
SM 05
SM 03
SM 02
x
x SFS 042/ Sambaqui nº 27
Sigla
x x
x
x x x
x
x
22J 699365/6886511
22J 699264/6886618
22J 698988/6888256
22J 699797/6889112
22J 738705/7096862
22J 733164/7081956
22J 623309/6763975
Coordenadas
x x
x
x x x
x
x
x 505-305 AP / C¹⁴ 1280 AD 1320 AD 1420 AD / C¹⁴
x
x
x
x
Datação/ Método
IPAT/UNESC Coirolo 1990 Ovalle 1968 Ovalle, Bernal, Schmitz e Becker 1972; Díaz 1977 Mazz 2001; Blanco e Bracco 1999 Baeza e Bosch 1973
11ª SR IPHAN; Silva 1999
11ª SR IPHAN; Silva 1999
De Masi 2007
De Masi 2007
De Masi 2007
De Masi 2007
Carle 2012
Farias e Kneip 2010 Bigarella, Tiburtius e Sobanski 1954; Chmyz 1976; Martin, Suguio, Flexor, Azevedo 1988; CNSA 00906
Fonte
254
Depto. Rocha
Depto. San José Depto. Soriano Depto. Soriano
Depto. Soriano
Depto. Soriano
Depto. Soriano
Depto. Soriano
Depto. Soriano Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres
Uruguai
Uruguai Uruguai Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Cidade
Estado/País
x
x
Arroyo Cebollati
Isla del Vizcaíno
Isla Naranjo
Isla del Infante Colonia La Concordia Rincón de la Higuera
Puerto La Tuna Yaguareté Isla de los Lobos
Cabo Polonio
Localidade
1E
1B
Cebollati
Isla del Vizcaíno
Isla Naranjo
Isla del Infante Colonia La Concordia Rincón de la Higuera
La Tuna Yaguareté Isla de los Lobos
Cabo Polonio
Nome do sítio
x
x
x
x
x
x
x
x
x x x
x
Sigla
x
x
x
x
x
x
x
x
x x x
x
Coordenadas
x
x
x
x
x
x
x
x
x x x
x
Datação/ Método
Prieto et al. 1970
Prieto et al. 1970
Coirolo 1990
Sosa 1957; Coirolo 1990 Sosa 1957; Ovalle, Bernal, Schmitz e Becker 1973 Araujo 1900; Devincenzi 1926-1928; Sosa 1957; Ovalle 1969; Ovalle, Bernal, Schmitz e Becker 1973; Trakalo 1987; Coirolo 1990; Farias, Femenias, Iriarte e Florines 2001
Sosa 1957
Fonte Baeza, Bosch, Femenías e Bosch 1973; Bosch, Bosch, Pinto, Pinto e Baeza 1973; Mazz 2001 Sosa 1957; Baeza e Bosch 1973; Trakalo 1987 Díaz 1977 Figuera 1892; Sosa 1957 Figuera 1892; Sosa 1957; Ovalle, Bernal, Schmitz e Becker 1973
ARQUEOLOGIA GUARANI NO LITORAL SUL DO BRASIL
255
Fray Bentos Fray Bentos
Nuevo Berlín
Uruguai Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Uruguai
Cidade Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres Depto. Treinta y Tres
Estado/País
Arroyo La Yeguada
Punta Negra Isla Román
Puntal de Gabito
x
x
x
x
Localidade
Punta Negra Isla Román Paradero Nuevo Berlín
Puntal de Gabito
2D
2C
2B
2A
Nome do sítio
x
x x
x
x
x
x
x
Sigla
x
x x
x
x
x
x
x
Coordenadas
x
x x
x
x
x
x
x
Datação/ Método
Prieto et al. 1970 Ovalle, Bernal, Schmitz e Becker 1973; Trakalo 1987 Cabrera 1995 Ovalle 1968; Ovalle e Bernal 1969
Prieto et al. 1970
Prieto et al. 1970
Prieto et al. 1970
Prieto et al. 1970
Fonte
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SOBRE OS AUTORES:
Adriana Schmidt Dias: Graduada em história pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Mestre em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Doutora em Arqueologia pelo Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo. Professora dos Cursos de licenciatura e bacharelado em História e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Antonio Lezama: Graduado em História pelo Instituto Artigas, Uruguai. Mestre e Doutor em Arqueologia pela l’École des Hautes Études en Sciences Sociales de Paris. Professor de Argueologia no Centro Universitario de la Regional Este e Diretor do Centro de Investigación del Patrimonio Costero, Universidad de la República, Uruguai. Dione da Rocha Bandeira: Graduada em Ciências Biológicas, mestrado em Antropologia Social pela UFSC e Doutorado em História pela UNICAMP. Professora e vice-coordenadora do mestrado interdisciplinar Patrimônio Cultural e Sociedade da UNIVILLE. Coordenadora do Curso de especialização em Arqueologia da UNIVILLE. Arqueóloga do Museu Arqueológico de sambaqui de Joinvile – MASJ. Francisco Silva Noelli: Graduado em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Mestre em História pelo Programa de Pós-Graduação em História na mesma instituição. Cursou Doutorado em Ciências Sociais pela UNICAMP. Professor aposentado da Universidade Estadual de Maringá, Paraná. Gustavo Peretti Wagner: Graduado em História pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Mestre, Doutor e Pós-doutor em História pelo Programa de Pós-Graduação em História daquela Instituição. Pós-doutorado em Antropologia/Arqueologia junto ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal da Bahia. Arqueólogo e Pesquisador junto a STRATA - Consultoria em Arqueologia e Patrimônio Cultural. Jairo Henrique Rogge: Graduado em Geologia, Mestre e Doutor em História pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos. Professor do Curso de licenciatura em História e do Programa de Pós-Graduação em História na mesma instituição.
María Farías Gluchy: Graduada em Ciências Antropológicas pela Universidad de la República del Uruguay (UDELAR), Mestre e Doutora em História pelo Programa de Pós-Graduação em História da PUC-RS. Professora do Curso de bacharelado em Arqueologia da FURG. Mariana Araújo Neumann: Graduada e Mestre em História pela UFRGS. Atualmente é arqueóloga do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Rafael Guedes Milheira: Graduado em História pela UFPEL, Mestre e Doutor em Arqueologia pelo MAE-USP. Professor do Curso de bacharelado em Antropologia com linha de formação em Arqueologia e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da UFPEL. Professor do Programa de Pós-Graduação em Patrimônio Cultural da UFSM. Coordenador do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal de Pelotas (LEPAARQ-UFPEL). Sergio Baptista da Silva: Graduado em letras pela UFRGS, Mestre em Antropologia Social pela UFGRS e Doutor em Antropologia Social pelo MAE-USP. Professor no Departamento de Antropologia, no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social e no Curso de especialização em Educação Profissional Integrada à Educação Básica na Modalidade Educação de jovens e adultos: proposta diferenciada para indígenas, na UFRGS. Coordenador do Núcleo de Antropologia das Sociedades Indígenas da UFRGS (NIT-UFRGS).
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