Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés

Share Embed


Descrição do Produto

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva Barros, Fernando C.(1)*; Barroso, Carlos E.(2)**; Riveiro, Belén(3)***; Oliveira, Daniel V.(4)**; Ramos, Luís F.(5)**; Lourenço, Paulo B.(6)** [email protected], (2)[email protected], (3)belenriveiro@ uvigo.es, (4)[email protected], (5)[email protected], (6)[email protected]

(1)

* Faculdade de Arquitectura, Universidade do Porto ** ISISE, Escola de Engenharia, Universidade do Minho *** GEOTECH, Escola de Engenharia Industrial, Universidade de Vigo

RESUMO A região montanhosa transfronteiriça Gerês/Xurés (Reserva da Biosfera da UNESCO) caracterizou-se ao longo de séculos por uma economia rural baseada fundamentalmente na agricultura e na pastorícia. O uso sazonal do território, alicerçado na prática de uma transumância vertical entre aldeia e “branda” (ou curral) potenciou o aparecimento de peculiares formas arquitetónicas em alta montanha. Estas arquiteturas/abrigo, sitas em locais de difícil acesso, e erguidas com recurso exclusivo a materiais existentes no próprio local, eram materializadas através da utilização da técnica de falsa cúpula em granito. Desde o abrigo isolado, pequenas cabanas em currais, aglomerados de cortelhos em brandas de gado, ou construções (e conjuntos de construções), algumas com dois pisos, características das brandas de cultivo, onde se verificava uma maior permanência das comunidades locais, observamos uma diversidade morfo-tipológica e construtiva, variáveis do mesmo sistema, reveladora de uma adequada relação entre forma, técnica e função. De modo a estudar este património vernacular em risco, desenvolveu-se um projeto de investigação multidisciplinar e transfronteiriço, através de uma parceria multi-institucional, na qual foi possível empreender um estudo sobre as várias dimensões deste património, desde a componente territorial, histórica e cultural, até questões puramente arquitetónicas e construtivas. Na primeira fase, efetuou-se uma revisão da literatura e uma identificação do território em estudo, seguindo-se, numa segunda, um exaustivo levantamento geométrico, com recurso à tecnologia de varrimento laser, complementado com ensaios de caracterização física e mecânica dos granitos locais. Numa terceira fase, efetuar-se-á uma análise de segurança estrutural deste tipo de construções, através do desenvolvimento de modelos numéricos específicos, e por último, serão elaboradas orientações respeitantes à proteção, consolidação e intervenção neste património. Sendo um projeto ainda em curso, neste artigo apresentam-se as considerações e resultados referentes às análises morfo-tipológicas e construtivas realizadas até à data. Palavras-chave: falsa cúpula; património vernacular; brandas; currais; granito; varrimento laser.

Culturas Partilhadas

493

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

1 INTRODUÇÃO As arquiteturas de falsa cúpula representam uma das mais intrigantes e particulares formas no contexto do património vernáculo existente na paisagem rural portuguesa. Identificadas e abordadas em diversos estudos e inventários, realizados ao Portugal rural em meados do séc. XX (Cruz 1969, Dias 1947, Dias 1950, Oliveira et al 1994, Oliveira 1968, Sousa 1927), conclui-se, da sua identificação, a existência de grande diversidade de formas e tipologias, situadas nas várias regiões. De difícil definição relativamente à origem e cronologia, é certo que estas estruturas representam a reminiscência de um primitivismo construtivo, sendo de destacar o facto terem permanecido em uso até muito recentemente. Com a alteração dos regimes agro-pastoris tradicionais das últimas décadas, e com o claro envelhecimento e desertificação das áreas rurais, muitas destas estruturas encontram-se agora devolutas, sendo evidente o seu avançado estado de abandono. A investigação agora apresentada tem como objetivo fazer ponto de situação do que resta deste património ímpar, complementando análises existentes com novos dados científicos, possibilitados por métodos de levantamento e análise apoiados em tecnologia laser, pretendendo-se também alertar a comunidade científica e as instituições, para o crescente perigo de perda deste bem cultural. A investigação foi realizada por uma equipa multidisciplinar internacional, estabelecida entre a Universidade do Minho (ISISE), a Universidade de Vigo (GEOTECH), a Universidade do Porto

(FAUP), com apoio do Município de Arcos de Valdevez, tendo sido o primeiro caso de estudo a região transfronteiriça Gerês/Xurés (Parque Transfronteiriço e Reserva da Biosfera da UNESCO) [Unesco 2009]. Do ponto de vista da História da Construção, parece relevante esta abordagem contemporânea e científica, combinando dados já existentes, fornecidos pelas vertentes antropológica e etnológica (imaterial), com dados de material, morfo-tipológica e construtiva (material). Pretende-se deste modo caracterizar e compreender as origens e modos de edificação destas construções, entretanto caídas em desuso, sendo que o resultado desta investigação será relevante, também, para a necessária reflexão, e proposição, considerando as ameaças com que este património está confrontado. Para tal foi necessária uma cuidada caracterização construtiva, e o desenvolvimento de métodos de análise, que permitam estabelecer, com segurança, orientações para a avaliação, consolidação e intervenção destas estruturas, garantindo-se a sua conservação e eventual reutilização, sem colocar em causa o elevado valor patrimonial e cultural que lhe está intrínseco. 2 CONSTRUÇÃO EM FALSA CÚPULA ENQUADRAMENTO A falsa cúpula, ou falso arco, pode ser descrita como um sistema estrutural, constituído pela .sobreposição de camadas de alvenaria (pedra ou adobe), as quais se projetam em direção ao centro, através da sobreposição de sucessivos anéis

Fig. 1 - Exemplos de construções em falsa cúpula na região em estudo. Branda da Gêmea (Sistelo) [Barroso et al. 2016].

494

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

horizontais, ou em movimento de espiral, desde determinada altura, até ao topo (Oliveira et. al 1994, Oliveira1968, Rovero et.al 2014). Considerado como um sistema de menor relevância por grande parte da comunidade científica, é por esse motivo um dos menos estudados, no que aos sistemas construtivos vernáculos diz respeito. À luz da literatura científica publicada, o seu comportamento estrutural funciona através do equilíbrio estático conseguido pela combinação da transferência vertical de forças entre as várias peças, com as ações horizontais resultantes do embricamento e atrito existente entre cada um dos blocos que constituem a sua alvenaria (Juvanec 2014). O conhecimento deste sistema, tal como a cúpula, o arco, ou abóbada, foi difundido por diversas civilizações, sendo utilizado em património vernáculo e em edifícios de carácter monumental, abrangendo diversas escalas e funções, desde abrigos, habitações e infra-estruturas, até palácios ou estruturas tumulares. A sua origem no tempo e no espaço é incerta, podendo remontar às civilizações da Mesopotâmia (cerca de 6000 anos), (Oliveira et.al 1994, Juvanec 2001), sendo significativa a sua presença ao longo de toda a bacia do Mediterrâneo. Do ponto de vista da histórica da arte de edificar, esta técnica construtiva é considerada como uma solução evolutiva intermédia, entre o sistema de pilar e viga e o de

arco e abóbada, [Juvanec 2014], sendo provável que lhes tenha precedido em muitas civilizações. Os estudos existentes sobre este tipo de estruturas subdividem-nas em dois grupos (Rovero et.al 2014, VVAA 2009): o primeiro (com menor número de ocorrências), é composto pelos edifícios de falsa cúpula cobertos por montículos de terra, como os da civilização micénica (Grécia, séc.XIV a.C.), ou os Tholoi etruscos de Populonia (Península Itálica, séc.VII a.C.), destinados a funções cerimoniais e funerárias; no segundo, e maior grupo, enquadram-se os edifícios de falsa cúpula sem montículo associado, nos quais se incluem a grande maioria dos edifícios vernaculares que recorrem a esta técnica. Atendendo à diversidade de edifícios presentes neste conjunto, pode-se assumi-los como o resultado da combinação de diversos fatores locais, nomeadamente as necessidades associadas a práticas como o pastoreio, a agricultura sazonal, e a combinação destes com a adaptação ao clima e aos materiais locais. No contexto português, a grande maioria dos exemplos corresponde a edifícios em falsa cúpula sem montículo associado, sendo que a sua função está principalmente ligada à pastorícia, nomeadamente edifícios-abrigo, de apoio a movimentos transumantes, podendo ser encontrados isolados, ou em conjuntos de edifícios. Estas tipologias são as mais representativas, se comparadas com outras funções também inventariadas, nomeadamente moinhos, ou

Fig. 2 - Património em Falsa Cúpula na bacia do Mediterrâneo [segundo Juvanec (VVAA 2009)]. 1 e 3 - Chozos de Viñas (Espanha); 2 Trullo (Itália); 4 - Habitações em terra (Síria); 5 - Abrigos ou cortelhos (Portugal); 6 - Safurdas ou Fornos (Portugal) (Barroso et al. 2016).

Culturas Partilhadas

495

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Fig. 3 - Morfologia em Falsa Cúpula em Portugal (Oliveira et al 1994) [Barroso et al. 2016].

Fig. 4 - Localização da região transfronteiriça Gerês/Xurés; Zonas de regadio para cultivo do milho e espigueiros em Bostelinhos (Cabana Maior) e Pastoreio extensivo na branda de Azevedo (Carralcova).

fornos. Em território nacional não foi registado o uso desta técnica em habitações permanentes (apenas para habitáculos sazonais), ao contrário de outros países, como na comuna italiana de Alberobello (região da Puglia), onde existem habitações designadas de Trulli (Guiseppe et.al 2014). Atendendo às características da falsa cúpula, Veiga de Oliveira e a sua equipa 1 organizaram morfologicamente as construções inventariadas em dois grupos: o primeiro grupo é composto por edifícios em que o intradorso da falsa cúpula se integra em parte da parede (CA), começando esta a partir do solo (CA1), ou de determinado ponto da secção da parede (CA2), não sendo evidente a distinção entre parede e cobertura; no segundo   Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e Benjamim Pereira [Oliveira et al 1994] 1

496

grupo o fechamento da falsa cúpula inicia-se apenas a partir do topo da parede (CB), sendo clara a distinção parede/cobertura. Edifícios do tipo CA foram inventariados em várias regiões do território nacional, ao passo edifícios do grupo CB representam uma resposta local à mobilidade agro-pastoril nas áreas de alta montanha da região transfronteiriça abordada neste estudo. 3 A FALSA CÚPULA NA REGIÃO TRANSFRONTEIRIÇA GERÊS/XURÈS 3.1 A REGIÃO - LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO

A região transfronteiriça Gerês/Xurés é uma área de montanha localizada no noroeste penin-

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

sular, conformada pelas serras do Gerês, Amarela e Peneda/Soajo (Portugal) e Leboreiro, Quinxo, Santa Eufémia e Xurés (Galiza). Esta região integra o Parque Nacional Peneda-Gerês e o Parque Natural da Baixa-Límia/Serra do Xurés, os quais conformam o Parque Transfronteiriço Gerês/ Xurés, Reserva da Biosfera da UNESCO. Ao elevado interesse ambiental, ecológico, geológico e paisagístico, uma das particularidades destes territórios é o elevado grau de antropização do espaço, fruto de uma intensa ocupação humana ao longo de milénios, incluindo períodos cronologicamente mais próximos, que vão desde a fixação de comunidades na Idade Média, à revolução suscitada pela introdução da cultura do milho (Zea Mays) a partir do séc.XVI, da qual resultou uma exploração agrícola intensiva das zonas de vale e meia encosta, apoiada pela produção extensiva de gado em alta montanha. 3.2 INTERACÇÃO ENTRE HOMEM E MEIO, NA CONSTRUÇÃO DE UM TERRITÓRIO

As arquiteturas de falsa cúpula presentes nesta região são o resultado da interação entre as culturas locais, baseadas em peculiares regimes agro-pastoris, e o meio geográfico no qual se inserem. As extensas serranias, que atingem os 1500m de altitude, impossibilitaram a fixação de comunidades de forma permanente nos pontos mais elevados, instalando-se as comunidades em zonas de vale, ou meia encosta, aproveitando a fertilidade dos terrenos de veiga e várzea, e gerindo as áreas de alta montanha, exploradas para a silvicultura e a pastorícia. A alta montanha, inabitada durante o inverno, revelou-se capaz para a exploração estival, devido aos pastos situados nas chãs próximas dos 1000m de altitude. As adversas condições geográficas, e a sábia relação entre homem e meio, baseou-se, assim, num conjunto de dualidades sociais, económicas e territoriais, sintetizadas em cada uma destas

comunidades: pastor/agricultor; verão/inverno; branda/aldeia; comunitário/privado; cortelho/ casa. Este sistema poderá remontar ao período de sedentarização das primeiras comunidades, as quais geriam o território através da força centrípeta e polarizadora do castro, a partir do qual administravam, eventualmente de forma sazonal, uma envolvente mais ou menos distante, destinada à agricultura e pastorícia. Félix Alves Pereira descreve a utilização do sistema de falsa cúpula nesta região nesse período, numa construção do castro de São Miguel-o-Anjo (a sudoeste da Serra da Peneda), de planta aproximadamente quadrangular, que denotava ter funcionado como um abrigo ou curral de gado, “com cerca de 1,40m de lado, em pedras pequenas irregulares e sem qualquer aparelho, com sinais de ter sido toscamente abobadada. O systema empregado nesta abobada rudimentar foi aquele a que os franceses chamam à encomblement, em que as pedras, conservando leitos horizontaes, avançam em ressaltos successivos para o interior da construcão até se juntarem. Este rude processo ainda é hoje usado em alguns logares mais sertanejos d’este concelho, e por esta forma cobrem as construcções circulares que ainda por lá existem” (Pereira 1895). Segundo Jorge Dias, essas construções ainda utilizadas em meados do séc.XX, apesar de construídas em data incerta, revelam a permanência de características construtivas ancestrais, considerando que “a vida do homem decorre por vezes em estádios infra-históricos”, implicando os modos de vida relacionados com o pastoreio “deslocações constantes dentro das largas áreas de pastos, e longas permanências longe das aldeias. Por isso, os pastores são forçados a construir abrigos, que pela sua simplicidade rústica e tendência conservadora, mantém através dos tempos as formas mais primitivas das habitações do passado” (Dias 1950). A peculiaridade de modo de vida destas comunidades, baseada na importância do núcleo fami-

Culturas Partilhadas

497

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Fig. 5 - Organização tradicional do território de alta montanha (Sistelo, Arcos de Valdevez):a - aldeia; b - área de cultivo em socalcos; c – branda (Barroso et al. 2016).

liar fixado nas aldeias, e da gestão das propriedades agrícolas nas suas imediações, complementado por um sistema de transumância vertical que explora a totalidade de um território agreste e contrastante, é prática já descrita nas Memórias Paroquiais de 1758: “Tem a serra sítios abrigados e com agoa, que nos mezes de Junho, Julho e Agosto produzem muita erva agreste a que chamam feno e ahi tem cazas e cortes a que chamam brandas adonde nos referidos mezes vão (asestir) muitos moradores das vezinhanças da serra com seus gados e criaçoens...” 2 A permanência durante longos períodos em zonas de altitude obrigou à construção de edifícios-abrigo, os quais adotaram diferentes tipologias, diretamente relacionadas com os ciclo de permanência nessas áreas. A função pastoril na humanização destas paragens de alta montanha é atestada quer pela toponímia (chã, prado(s), poulo, curro, curral de.., curral velho, alto das cortelhas, cabana de..., cortes, pardieiros, alto das bezerreiras), quer pela análise documental, observando-se que o pastoreio de gado vacum era importante já no séc.X, atendendo a documento da Condessa Mumadona Dias onde refere: “em Riba de Lima, a parte no Soajo em terras e pomares (...) e vacas quantas temos na Várzea e no Soajo e quantas possuímos nas encomunhões com os nossos colonos,” 3 que   Memórias Paroquiais de 1758 - Pároco de Vilela (Arcos de Valdevez) [Barros 2013]. 2

  citado em Barros (2013).

3

498

cedo incrementou a exploração dos prados de altitude, com a construção de currais, como o curial de Lamelas 4 (branda de Lamelas), ou curale de Cuco 5(branda de Porta Cuco), referidos em documentos régios do séc.XIII, ou as brandas de São Bento do Cando, Aveleira e Vale de Poldros, referidas em documentos monásticos do séc. XIII e XIV. 6 O território estrutura-se assim entre: a - zonas de vale e meia encosta, onde se implantam as aldeias, núcleos permanentes de povoamento concentrado, em estreita associação com b - áreas de cultivo (em socalcos); c - assentamentos de uso sazonal estival, localizados na alta montanha, designadas por brandas ou currais. Nas serras do Gerês e Amarela, o uso destas zonas é predominantemente pastoril, e os assentamentos, onde pernoitam as vezeiras, designam-se por currais, implantando-se aí as designadas cabanas ou fornos. Na serra da Peneda/Soajo o sistema é diferenciado, sendo mais comum a designação de brandas de gado, em alguns casos em regime de vezeira, noutros em regime familiar, designando-se os edi  Nas Inquirições de D. Afonso III no Julgado de Valdevez, de 1258, referentes a Sancti Salvatoris de Cabreiro. 4

  Na Carta de foro de Monte de Leboreiro quod vocatur Padron, datada de 1271 (Barros 2013). 5

  Segundo o Padre Bernardo Pintor, no artigo “Por Terras do Soajo - São Bento do Cando na freguesia da Gavieira” (1981), (Barros 2013). 6

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

Fig. 6 - Diferentes tipos de currais e brandas na região em estudo: a - Curral; b - Branda de Gado; c - Branda de Cultivo; d - Branda com função habitacional.

fícios por cortelhos, maioritariamente associados a uma pequena cerca designada por bezerreira. Na Serra da Peneda implanta-se as designadas brandas de cultivo (ou mistas), que associam o pastoreio e a prática da agricultura (centeio e batata) 7 ; o espaço agrícola é propriedade privada, tal como as construções, tendo a maior permanência no espaço ditado diferentes escalas no edificado, e maiores cuidados construtivos. As construções de falsa cúpula de um piso, aparecem conjugadas com outras mais complexas, conjuntos de construções, construções contíguas e comunicantes, e mesmo edifícios em falsa cúpula de dois pisos, por vezes designados por cardenhas. Observa-se uma maior complexidade na compartimentação do espaço, associando-se os edifícios aos espaços delimitados para pasto e cultivo, e conformando já uma rede de caminhos, delimitada por sistemas murários, bem como espaços de transição público/privado, entre o caminho e o edifício, aos quais se associam, ainda, estruturas de irrigação (poços e levadas). Nesta tipologia de brandas observam-se dispersos, junto às zonas de pasto/cultivo, edifícios de dois pisos, de planta retangular, e cobertura de duas águas, designados por casa de branda, palheiro, ou colmaço, as quais eram cobertas com colmo,   “huma serra toda fragoza e despenhada e aspera (...) e no tempo dos mezes de Verão como hé Junho, Julho e Agosto vão os moradores da dita freguezia apascentar à dita serra o gado vacum (...) E em algumas partes os pobres moradores fazem cachadas para o centeio” (“Memórias Paroquiais de 1758” - Pároco de Carralcova (Arcos de Valdevez) [Barros 2013]. 7

verificando-se, em épocas mais recentes, o recurso à telha. Em muitas situações estas casas estão volumetricamente associadas a edifícios de falsa cúpula, formando curiosos conjuntos. Um terceiro sistema transumante envolve a mudança de toda a família, representando um movimento cíclico bi-anual entre parte alta do planalto e parte baixa do vale, designado por brandas e inverneiras, ocorrendo em Castro Laboreiro (Melgaço). Materializado na duplicação dos núcleos, branda e inverneira apresentam características similares de aglomerado, e presença da função habitacional. Nas serranias do lado galego desta região este tipo de movimentos eram usuais nas Serras do Quinxo, Santa Eufémia e Xurés, em todos os casos com regimes pastoris similares à Serra Amarela e do Gerês, com predominância de subida de rebanhos comunais, em regime de vezeira, para locais designados de currais, ou curros, onde os pastores pernoitavam em edifícios desigandos por cabana, chivana, choza, ou casiña. (Carvalho 2006). Na serra do Leboreiro implantam-se as Cortes da Carballeira, branda de cultivo pertencente à povoação de Queguas (Entrimo), havendo também referência ao antigo povoado de Porcarizas, no Leboreiro, (Fernandez 1947), o qual era habitado sazonalmente por pastores.

Culturas Partilhadas

499

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

3.3 morfo-tipologias das arquitecturas de falsa cúpula

O sistema construtivo de cobertura em falsa cúpula em blocos de granito apresenta um elevado número de ocorrências na região. As razões para a sua implementação e proliferação estariam inicialmente relacionadas com a dificuldade de acessos na serra (que impossibilitaria o transporte de materiais e ferramentas), a existência em abundância de pedra (associada à escassez de outros materiais), e, sobretudo, a durabilidade apresentada pelo granito, capaz de resistir às agruras do clima serrano (com neves e geadas no inverno, e forte exposição solar durante o verão) (Oliveira et.al 1994). Os diferentes modos e ritmos de permanência, tiveram como consequência direta uma grande diversidade de modelos de organização do espaço, formas arquitetónicas e formas de erigir estas estruturas, de entre as quais se destacam: (a) Abrigos isolados, associados ao pastoreio livre, e de gado miúdo: são pequenas construções, feitas de grandes lajes graníticas, erigidas em pontos altos e isolados da serra, os quais aproveitam em muitos dos casos a pendente da encosta e rochedos existentes. São, “como o nome diz, meros refúgios contra as intempéries e as feras” [Dias 1950], não sendo habitual a função de pernoita para estes edifícios, muito menos a habitacional. (b) Cabanas, Fornos, Chivanas, ou Chozas, localizadas nos currais (Carvalho 2006, Cruz 1969, Dias 1947, Dias 1981, Fernandez 1947, Oliveira et. al. 1994): esta tipologia aparece praticamente em toda a região, pertencendo a aldeias onde vigorou o regime pastoril de vezeira, no qual os gados permaneciam na serra entre Maio e Setembro/ Outubro, guardados à vez pelos pastores. Na serra os espaços de pastoreio são de direito de uso da aldeia, estando delimitadas secularmente, e os terrenos correspondentes a cada vezeira separados por muros. Durante o dia o gado pasta livremente nas encostas, recolhendo à noite para os currais área de algumas centenas de metros quadrados,

500

delimitada por muro de alvenaria de junta seca, com cerca de 1m de altura. Em cada curral existe uma cabana, onde se abrigam e pernoitam os pastores, pertença comunitária, correspondendo aos vezeiros zelar pela sua conservação antes da subida dos gados para a serra. São de planta circular, com diâmetro que ronda os 2,5 a 3m, e altura máxima no interior entre os 2,4 e os 2,65m. A entrada é exígua, variando entre 80cm a 1m de altura. As paredes são em alvenaria de granito, em junta seca, fechando a cobertura em falsa cúpula de granito, a qual era revestida com torrões, e por vezes ervas, funcionando como isolamento térmico, e protegendo contra o vento e a chuva. (c) Casarotas da Serra Amarela e cortelhos, fornos e cabanas das brandas de gado da serra da Peneda/Soajo (Barros 2013, Carvalho 2006, Dias 1947, Dias 1950, Oliveira, Galhano, Pereira 1994): correspondem a aldeias onde o regime de vezeira não foi tão intenso, observando-se a subida dos gados durante período Maio a Setembro/Outubro, predominando a subida por grupos de vizinhos, ou familiares. Algumas destas brandas integram-se em sistemas transumantes com dois pontos de paragem: brandas equinociais (Maio a Julho e Setembro a Outubro), e brandas estivais (Julho a Setembro); descendo à aldeia de Novembro a Abril. Muitos destes edifícios são propriedade privada, embora se implantem entre extensas áreas de baldio, nas chãs de altitude entre os 700 e os 1000m. São áreas construídas, com aspeto de povoado primitivo, que podem ultrapassar a dezena de núcleos construídos. Em oposição ao curral único para todo o gado, aqui encontramos diversas cercas de pequenas dimensões, as bezerreiras (onde são guardadas as crias e as vacas em aleitamento, onde se guarda a lenha e se cozinha), associadas ao abrigo pastoril, denominado de cortelho, existindo em algumas brandas outras construções maiores, designadas por cabanas. Estas construções de planta aproximadamente quadrangular variam no seu interior entre os 1,75m a 2,5m, e os 2 a 2,8m de altura no

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

topo, sendo a porta estreita e baixa. Não há propriamente distinção entre parede e cobertura em todos os edifícios, pois ambas são constituídas por blocos não afeiçoados de granito, sobrepostos, e com junta seca, fechando numa falsa cúpula onde é difícil distinguir os anéis, devido à irregularidade das peças. A prática de revestir a construção pelo exterior com terra e vegetação também se verificou em algumas destas brandas. Em casos excecionais podem encontrar-se cortelhos de dois pisos, também em falsa cúpula. (d) Cortelhos, palheiros, ou cardenhas, nas brandas de cultivo (ou mistas) da Serra da Peneda (Barros 2013, Capela 2005, Carvalho 2006, Oliveira et al 1994): devido às especificidades da economia agrícola, os espaços de prado/poulo, bem como os edifícios, são privados. Os espaços exteriores são ordenados, com marcação de caminhos através de muros em alvenaria de granito junta seca, e acessos até às brandas em calçadas, de modo a garantir a circulação do carro de bois, para transporte das colheitas. Os ritmos de permanência são distintos dos espaços exclusivamente pastoris, pelo que o tipo de edificado apresenta outras características. É possível observar nestas brandas distintas fases de evolução, com pequenos núcleos de abrigos e cortelhos em falsa cúpula, de um piso, os quais se foram agrupando e formando conjuntos, muitas das vezes comunicantes entre si pelo interior. Outra das características destas brandas é a presença de abrigos de dois pisos, denominados de cortelhos, palheiros, ou cardenhos, os quais tem acesso independente a cada piso, e simplificando ao espaço mínimo a tipologia de casa da aldeia, pernoitam no inferior os animais, e no superior para o brandeiro. É habitual a presença de pedra de lareira num dos lados do espaço interior do piso superior. A separação entre pisos é feita com sobrado, em soalho de madeira, existindo algumas exceções em que a laje é feita por blocos de granito (ou xisto). A planta dos edifícios é na sua maioria retangular, apresentando-se alvenarias de granito de parede dupla (a

qual em muitos casos tem juntas argamassadas), cunhal qualificado, e blocos talhados nas ombreiras e padieiras dos vãos. As coberturas em falsa cúpula são também mais cuidadas, distinguindo-se os vários anéis que a conformam, trabalhando sempre em espiral, e de forma cruzada; as placas da cobertura são ligeiramente inclinadas para o exterior do edifício, permitindo uma melhor escorrência da água. As dimensões em planta destas estruturas são consideravelmente superiores às das restantes brandas, podendo variar entre os 2,5m a 2,7m na maioria dos casos, atingindo os 4,5m por 3,5m na branda de Real. A altura interna é também superior, sendo que o número de anéis da cobertura poderá rondar, ou ultrapassar a dezena, o que, contabilizando a altura total interna dos dois pisos, pode ultrapassar, em alguns casos, os 5m. As portas tem habitualmente entre 1,1 a 1,3m de altura, por 0,7m de largura. Uma das particularidades destas brandas é a complexidade tipológica presente em conjuntos de edifícios, os quais normalmente formam pátio de entrada para o caminho (provável reminiscência das bezerreiras), e se localizam entre este a zona de pasto/cultivo, tendo em alguns casos duas portas (uma para o pátio e outra para o poulo), o que significa que o edifício funciona como filtro entre público e privado. Nestes conjuntos é habitual a presença interligada entre os cortelhos em falsa cúpula e edifícios retangulares de duas águas, designadas por casa de branda, palheiros, ou colmaços. Outros casos de uso de falsa cúpula na região em estudo podem ser encontrados nas imediações das aldeias, ou mesmo no seu interior, junto às casas de habitação, em abrigos para animais, bem como na cobertura de moinhos. 4 LEVANTAMENTO DO CASO DE ESTUDO O aprofundamento da investigação seguiu o método de seleção de um caso de estudo, através da realização de levantamentos em dois grupos de edifícios (Grupo A: 41º58’26.6’’N 8º19’29.3’’W e

Culturas Partilhadas

501

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Fig. 7 - Esquema morfo-tipológico das construções em falsa cúpula da região [Barroso et al. 2016].

Grupo B: 41º58’19.5’’N 8º19’30.2’’W), localizados na branda da Gêmea (altitude 1010m), que juntamente com a branda do Alhal (altitude 740m) pertence ao lugar de Padrão (altitude 495m), Serra da Peneda, freguesia de Sistelo, concelho de Arcos de Valdevez. Atendendo à complexidade geométrica que caracteriza as estruturas em falsa cúpula, facilmente se pode concluir que os métodos de levantamento convencionais não seriam os mais eficazes para o nível de precisão pretendido. A fim de obter um modelo 3D preciso e uma imagem clara dos edifícios a analisar, foi realizado um levantamento com tecnologia de varrimento laser, utilizando um equipamento Faro Foco3D capaz de gravar coordenadas 3D de milhões de pontos relativos às superfícies dos objetos (Riveiro 2010). Uma vez recolhidos os dados no terreno, a informação foi processada de modo a criar modelos 3D através de nuvens de pontos, réplicas digitais dos edifícios em estudo, o que permitiu uma análise geométrica mais profunda. Os modelos foram estudados segundo parâmetros geométricos,

502

como dimensões verticais, horizontais, assim como através de diversos rácios geométricos, entre paredes e falsas cúpulas, com secções transversais, planos e elevações da base dos edifícios. Os modelos 3D permitiram compreender e analisar relações geométricas complexas presentes nos conjuntos de edifícios, muitas impercetíveis no local, mas observáveis com recurso à nuvem de pontos digital. Com base nos dados recolhidos, a análise foi organizada em grupos de características construtivas, medidas na nuvem de pontos 3D. 8 4.1 análise dos dados 4.1.1 - Morfologia e tipologia

Pela análise dos dados referentes ao corte vertical e à secção horizontal dos edifícios, conclui-se que cada edifício é organizado de acordo com um  Relativamente à análise pormenorizada dos dados obtidos e às imagens apresentadas neste artigo, consultar o artigo apresentado no Congresso Euro-Americano REHABEND 2016 (Barroso et al. 2016). 8

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

Fig. 8 - Vistas (V) dos grupos de edifícios onde foi realizado o levantamento com varrimento laser: Grupo A (V1, V3, V4 e V5) e Grupo B (V2, V6, V7 e V8) (Barroso et al. 2016).

eixo interno predominante; os abrigos com 2 pisos, apesar de mais altos, não apresentam maior área bruta construída; a forma predominante é a planta retangular, com cantos arredondados, à exceção dos edifícios mais pequenos, que apresentam forma circular. As paredes dos cortelhos em falsa cúpula, quando comparadas com os edifícios com cobertura de duas águas, são menos esbeltas. Aparentemente os edifícios têm uma proporção eminentemente vertical, sugerida pela sua forma cónica, mas uma análise atenta às suas dimensões, conclui que a sua proporção é eminentemente horizontal. A relação entre área bruta do edifício, área ocupada pela parede, e área útil, é manifestamente

desfavorável para esta técnica construtiva, na medida em que cerca de 50% da área bruta do edifício corresponde às zonas ocupadas pelas paredes, demonstrando assim que estas arquiteturas de falsa cúpula são considerados edifícios de massa elevada, sendo apenas otimizada esta relação para os casos de grupos de edifícios, por partilharem paredes de meação. 4.1.2 - Técnica construtiva

Pela análise realizada por observações in loco, levantamentos convencionais, e levantamentos laser, verifica-se que as alvenarias foram construídas com unidades de granito colhido no local. A proporção de placa é resultante da combinação

Culturas Partilhadas

503

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Fig. 9 - Vistas aéreas do Grupo A e Grupo B geradas com o varrimento laser (Barroso et al. 2016).

Fig. 10 - Exemplo de imagens do Grupo A e Grupo B geradas pela nuvem de pontos 3D. Vista Axonométrica, Vista Aérea, Perspectiva e Cortes ((a) e (b) - [Barroso et al. 2016]).

504

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

Fig. 11 - Secções Horizontais geradas pelo varrimento laser (Barroso et al. 2016).

entre foliação natural do granito e efeitos da erosão. A água penetra pelas juntas de foliação da rocha, expandindo quando congelada, destacando uma camada de rocha. Os blocos são utilizados preferencialmente nas paredes, sendo as placas aplicadas na falsa cúpula. Nestas brandas específicas, e devido ao tipo de granito disponível, as unidades de alvenaria que constituem as paredes de carga são em formato bloco (a fim de sustentar o impulso da cúpula e resistir às cargas horizontais), e as da falsa cúpula são predominantemente em formato placa (de modo a cobrir maior área horizontal, com o mínimo peso possível). A forma das placas da cobertura influencia diretamente a proporção largura/altura da falsa cúpula, sendo que as unidades maiores são utilizadas na metade inferior do cone, diminuindo de tamanho à medida que a falsa cúpula cresce em altura, para permitir a redução do diâmetro dos anéis, até à pedra de fecho. 4.1.3 - Síntese analítica da técnica construtiva

Foi feita uma tentativa de síntese desta técnica construtiva, para a região em estudo, abordando as ideias-chave: (a) os edifícios são construídos em paredes de alvenaria, seguindo a tradição local de junta seca (com ou sem fundação), maioritariamente de

aparelho muito irregular, com duplo paramento e com recurso a calços, sendo os vãos e os cunhais reforçados com blocos mais regulares e de maiores dimensões. O resultado é uma alvenaria pobre, com pouco travamento entre os blocos, e com uma estabilidade estrutural garantida à custa de paredes com baixa esbeltez e massa elevada; (b) a forma cónica da falsa cúpula, composta por um só paramento de alvenaria, que constitui o interior e o exterior, é construída sobre o volume estrutural das paredes, e a interligação entre ambas é realizada pelos blocos do primeiro anel da falsa cúpula. Nos cunhais a primeira camada da falsa cúpula é realizada com unidades de alvenaria maiores, o que resolve o problema geométrico de transição entre a caixa retangular e a cobertura cónica; (c) a alvenaria das falsas cúpulas foi edificada através do cruzamento das unidades de alvenaria, em balanço sobre o centro e em torno de um eixo central, desde o topo das paredes até à pedra de fecho. As unidades de alvenaria em balanço, apoiam em média 2/3 da sua secção sobre pelo menos duas outras unidades de alvenaria do anel inferior. Os vazios resultantes foram preenchidos com unidades pequenas e calços, de forma a garantir a estabilidade das placas. Do lado interior, observa-se também a colocação de calços, de forma a dar uma ligeira pendente às placas de

Culturas Partilhadas

505

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Fig. 12 – Vista, nuvem de pontos e modelo estrutural 3D de um dos edifícios da branda da Gêmea.

alvenaria, para permitir a drenagem das águas pluviais; (d) o equilíbrio estrutural da falsa cúpula é conseguido pela combinação da transferência vertical da carga resultante do peso próprio da estrutura (por compressão), estabilizada por forças horizontais (atrito) resultante da fricção entre as unidades de alvenaria que compõem a estrutura da falsa cúpula. A carga é transferida às paredes, que por sua vez, a encaminham para o solo de fundação. 5 CONCLUSÕES A investigação em curso tem como principal objetivo uma melhor compreensão sobre um tipo de património vernáculo relativamente desconhecido em Portugal, recorrendo a uma observação in-situ e a uma análise aprofundada sobre uma técnica construtiva remota. O grande potencial ecológico, turístico e económico destas construções tornou-se evidente, numa época em que o repensar sobre os usos da paisagem rural parece voltar a ganhar importância na opinião pública. Em comparação com outros métodos de pesquisa já testados, o potencial do uso do varrimento laser revelou-se um método de levantamento eficaz para realizar estudos precisos, neste tipo de geometrias complexas, sendo que através desta investigação foram conseguidos novos dados,

506

assim como a refutação de algumas ideias pré-estabelecidas sobre este tipo de património. Apesar da simplicidade dos seus princípios, o estudo demonstra que existe uma complexidade construtiva associada a estas arquiteturas de falsa cúpulas vernáculas e, simultaneamente, que apesar de uma grande proliferação do uso, existe uma grande criatividade e adaptabilidade nas formas de construir, tendo resultado numa grande variedade de formas, dimensões e estruturas. Os próximos passos da investigação prendem-se com o desenvolvimento de uma metodologia de preservação e reabilitação apropriados a este frágil património. Pretende-se também que esta se estenda ao restante território, melhorando-a com a incorporação de métodos de avaliação estrutural e levantamento de danos. Como ponto de chegada pretende-se a redação de diretrizes de preservação, associadas à reflexão sobre as estratégias de reutilização destas estruturas, que deveriam passar inicialmente pelo estabelecimento de um quadro legal mais adequado à proteção deste património rural vernacular. Estes serão os principais desafios a ultrapassar, de modo a garantir a sobrevivência desta herança cultural, reintegrando estas estruturas na vida das comunidades locais, e estabelecendo assim o laço que une o passado ao presente e ao futuro, desde os antepassados que a construíram às novas gerações que habitam esta região.

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Arquiteturas de Falsa Cúpula na Região Transfronteiriça Gerês/Xurés Enquadramento e Caracterização Construtiva

6 AGRADECIMENTOS Os autores expressam o seu agradecimento ao Município de Arcos de Valdevez pelo apoio prestado, assim como à Equipa de Sapadores Florestais do Gabinete Técnico Florestal Municipal e da Associação Florestal Atlântica, bem como aos proprietários da “branda” da Gêmea, por consentirem as ações de limpeza e levantamento realizadas.

O primeiro e o segundo autores agradecem à Fundação da Ciência e Tecnologia a atribuição das Bolsas de Doutoramento SFRH/BD/112646/2015 e SFRH/BD/86704/2012. O presente trabalho foi parcialmente financiado pelo FEDER através do Programa COMPETE e pela FCT no âmbito do projeto POCI-01-0145-FEDER-007633.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Barros, Fernando. 2013. “Construção do Território e Arquitectura na Serra da Peneda. Padrão (Sistelo) e as suas “brandas” - um caso de estudo”. Arcos de Valdevez: Ed. Município de Arcos de Valdevez Barroso, Carlos E.; Rivieiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Barros, Fernando C.; Lourenço, Paulo B. 2016. “Survey and Characterization of corbelled dome architecture in Northwestern Portugal”. In Rehabend 2016. Euro-American Congress. Construction Pathology, Rehabilitation Technology and Heritage Management . Burgos (Spain): U. Cantabria, G. de Tec. Edificación, U. de Burgos. pp. 195-204 Capela, José Viriato. 2005. “As freguesias do Concelho dos Arcos de Valdevez nas Memórias Paroquiais de 1758”. Arcos de Valdevez: Ed. Município de Arcos de Valdevez Carvalho, Elza. 2006. “Lima Internacional: Paisagens e Espaços de Fronteira”. Tese de Doutoramento em Geografia, ramo de Geografia Humana. Braga: Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho Cruz, João Amorim Machado. 1969. “Regime Comunitário Pastoril na Serra Amarela (Ermida - Ponte da Barca).” In Trabalhos do Instituto de Antropologia «Dr. Mendes Corrêa», Fac. de Ciências do Porto. Nº2. Fascículo 1-4, do Vol.XXI dos Trab. de Antropologia e Etnologia. Porto: Imprensa Portuguesa Dias, Jorge. 1947. “As Casarotas da Serra Amarela. Construções Megalíticas com uma inscrição”. In Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol.XI, fascículo 1-2, Instituto de Antropologia, Fac. de Ciências, Porto. pp. 189-191

Dias, Jorge. 1950. “Abrigos Pastoris na Serra do Soajo”. In Trabalhos de Antropologia e Etnologia, vol.XII, fascículo 3-4, Instituo de Antropologia, Faculdade de Ciências, Porto. pp. 350-354 Dias, Jorge. 1981. “Vilarinho da Furna. Uma aldeia Comunitária”; nota preliminar e prefácio de Orlando Ribeiro. Temas Portugueses. Imprensa Nacional Casa da Moeda (1ª Ed. 1948) Fernandez, X. Lorenzo. 1947. “Antiguas habitaciones de pastores na Sierra del Leboreiro”. In Cuadernos de Estudios Gallegos. VII. Santiago de Compostela: C. Sup.de Inv. Científicas Instituto Padre Sarmiento Guiseppe, S. Todisco, L; Monti, G. 2014. “Effective assessment methodology for trulli in Apulia, Italy”. In 9th International Masonry Conference. pp. 1-10 Juvanec, B. 2001. “Six thousand years, and more, of corbelling age of stone shelters”. In UNESCOICONAS International Congress. Juvanec, B. 2015. “Transformation between corbelling and lintel: Abrigo and Espigueiro”. In VERSUS2014 - Vernacular Architecture Towards a Sustainable Future. pp. 393-396 Oliveira, Ernesto Veiga; Galhano, Fernando; Pereira, Benjamim. 1994. “Construções Primitivas em Portugal”, 3ª Edição. Lisboa: Publicações Dom Quixote (1ª Ed. 1969) Oliveira, Ernesto Veiga. 1968. “Construções em Falsa Cúpula” in Geographica, nº16. pp. 65-79 Pereira, Felix Alves. 1895. “Castello de S. Miguel-o-Anjo. Notas de um reconhecimento”. In O Arqueólogo Português. Lisboa. Série 1. pp. 161-175

Culturas Partilhadas

507

Barros, Fernando C.; Barroso, Carlos E.; Riveiro, Belén; Oliveira, Daniel V.; Ramos, Luís F.; Lourenço, Paulo B.

Riveiro, B. 2010. “Validation of Non-Destructive Geomatic Techniques for the Dimensional and Structural Evaluation of Historical Masonry Structures.” University of Vigo Rovero, L.; Tonietti, U. 2014. “A modified corbelling theory for domes with horizontal layers”. In Constr. Build. Mater., vol.50. pp. 50-61

508

Sousa, Tude M. 1927. “Gerez (Notas Etnográficas, Arqueológicas e Históricas)». Coimbra VV.AA. 2009. “Earth domes and habitats. Villages from Northen Syria.” Ed. E. Brussels: C. Prog. 2000

2º Congresso Internacional de História e Construção Luso-Brasileira

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.