Artigo - Teoria do Ensino da Literatura -

June 28, 2017 | Autor: Tamara Costa | Categoria: Ensino de Literatura, Importância da Literatura para Língua Portuguesa
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ – UECE
CENTRO DE HUMANIDADES – CH
TEORIA DO ENSINO DA LITERATURA

Literatura para quê? - Abordagem sobre o ensino de literatura "funcional" e constituinte do estudo de língua portuguesa

Tamara Costa Mesquita
Graduanda do curso de Letras Português/Licenciatura (UECE)
Orientadora: Profª. Ana Vládia

Resumo
Através do levantamento da importância da literatura, das dificuldades para o seu ensino e dos avanços e sugestões daqueles que alcançaram êxito na transformação do ensino da língua portuguesa em algo que possa ser obtido através da vivência da leitura, da escrita e da análise linguística, este artigo tem por fim contribuir para as reflexões sobre a metodologia de ensino de literatura tomada pelas escolas hoje e qual o objetivo desse ensino. Para isso, buscaram-se produções relacionadas ao assunto de autores que buscam a melhoria do ensino da língua portuguesa como um todo.
Palavras-chave:Ensino de literatura; Leitura; Literatura.


Abstract
Through the survey of the importance of literature, the difficulties for their education and advances and suggestions from those Who have achieved success in the transformation of the Portuguese language into something that can be obtained through the experience of reading, writing and linguistic analysis, this article aims to contribute to there flections on literature teaching methodologies taken by schools today and what the purpose of this teaching. For this, it sought to productions related to the subjec to fauthors who seek theim provement of the Portuguese language as a whole.
Key-words:Literature teaching; Reading; Literature.

Introdução
O ensino de literatura, geralmente, é tomado por muitos alunos de Ensino Médio como disciplina obrigatória para o vestibular, mas sem função na vida prática, como um amontoado de dados históricos, nomes de autores e características a serem "decorados" de períodos ditos literários, quase uma extensão das aulas de história. Contribuem para essa perspectiva, o ensino tradicional e dissociado das disciplinas relacionadas à língua, a formação dos professores e a abordagem de alguns materiais didáticos, relacionados neste artigo, cuja proposta é também apontar as soluções desenvolvidas por autores como Lívia Suassuna, Iran Ferreira, Wanderley Elias Coelho e outros que buscam o ensino pragmático e afetivo de literatura.
Primeiro, apontar-se-á as motivações para o estudo da literatura, em seguida, os fatores que contribuem para a falta de interesse de muitos alunos pela disciplina e que prejudica o gosto pela leitura, principalmente, das obras clássicas. Acitar-se: aulas tradicionais de literatura (que costumam ser expositivas, apenas descrevendo as características dos períodos literários), a formação dos professores (advindos da cultura de aulas expositivas, tendem a reproduzi-las) e a abordagem dos materiais didáticos (que induzem às aulas expositivas, quando predominam em sua composição as descrições dos períodos literários, trazendo poucos textos e sem incluir outros de perspectiva contemporânea). Depois, serão lançadas as propostas e sugestões para composição de um ensino pragmático da língua, sem divisões entre as matérias que a compõem (gramática, literatura e produção textual).
Por fim, serão dadas as considerações finais.
Desenvolvimento
Por que estudar literatura?
Qual a utilidade do ensino de literatura para estudantes que almejem exercer funções ligadas às áreas das exatas? Qual a função da literatura para a vida? Ou melhor, como costumam perguntar os alunos da educação básica, "para que preciso disso para minha vida?". São perguntas que necessariamente precisam ser respondidas pelo professor, independente de qual disciplina seja, é preciso saber qual a utilidade que o conteúdo ministrado terá para a vida dos alunos, pois, conforme Libâneo (1999), teórico de pedagogia, "O ensino é um processo, (...) obedece a uma direção, orientando-se para objetivos conscientemente definidos; implica passos gradativos, de acordo com critérios de idade e preparo dos alunos".
Assim, considerando o grifo feito aqui, os objetivos devem ser conscientes, ou seja, o estudante precisa saber da utilidade prática do que lhe está sendo ensinado e cobrado para que saiba.
Olga de Sá, em uma publicação feita a um site, levanta questionamentos similares aos aqui colocados: "Nesta época de tanta ciência e tecnologia, para que publicar textos de Literatura? Quem por eles se interessaria? [...]". E propõe a seguinte resposta:
"As perguntas sobre os grandes temas da vida humana se tecem nos poemas e nas obras de ficção. A Literatura, já o disse de outra maneira Roland Barthes, não responde às perguntas, fechando-as; porque as amplia, multiplica suas respostas. Não pretende atingir nenhuma "verdade"; pretende abrir nossa mente para as inúmeras percepções de mundo, que existem nos universos mentais das pessoas.Mas do que precisamos, dizem os homens práticos, é de soluções, de respostas, de expedientes úteis, de resolver os problemas da cidade e do campo.Então, para que Literatura? Para levantar questões fundamentais, abrir nosso mundo pequenino, feito de minúsculos fatos do dia-a-dia, ao grande painel da reflexão humana. (...)A leitura é o meio que temos para conviver com valores e ideias de outros universos, no espaço e no tempo, inacessíveis, de outro modo, à experiência humana.".
(SÁ, 2012)

O trecho de forma clara e simples propõe que a literatura tenha como função abrir a mente das pessoas para várias interpretações de mundo, o que nos falta tanto (a interpretação de mundo), justamente, no mundo em que a tecnologia predomina, mas há pouca reflexão sobre a vida e ela mesma, embora encurte espaços e facilite a transmissão de informação. Há ainda a peculiaridade de que a literatura não propõe respostas prontas, ou soluções, como querem os homens práticos, mas multiplica as respostas ao levantar questionamentos fundamentais. Assim, a literatura leva a pensar e refletir.
Outro aspecto é também abordado pelo trecho, a importância da leitura. A literatura está intimamente ligada à leitura, embora não seja isso o que foi aprendido por muitos durante o ensino médio, devido à forma tradicional de ensino, baseado em um estudo bibliográfico e histórico da literatura, conforme será visto posterior neste artigo.
Sobre a leitura vale ressaltar que, não se trata de mera decodificação nem mesmo aquisição de ideias contidas em um texto, mas conforme define a Leal (2003 apud FULGÊNCIO & LIBERATO, 2015):
"A leitura é o resultado da interação entre o que o leitor sabe e o que ele retira do texto, não estão querendo dizer 'retirar' no sentido de pinçar do texto as respostas. Muito pelo contrário, estão querendo dizer exatamente (...) algo existe no texto como uma rede de amparo à compreensão feita. Quanto mais o leitor aprende a fazer uso das pistas textuais para relacioná-las ao que ele já sabe, mais ele compreende o texto.".

Ou seja, durante a leitura são acionados conhecimentos prévios do leitor, considerando outro ponto de vista levantado pela autora sobre a leitura como um "processo de emissão e verificação de previsões". Então, mais que conhecimento prévio, é preciso que o leitor tenha alguma expectativa sobre o que será lido.
Esses aspectos devem ser considerados, principalmente, considerando o tema aqui exposto sobre o ensino de literatura, onde serão tratadas as dificuldades encontradas no ensino médio, não somente a respeito da disciplina literatura, como do conjunto que compõe o ensino da língua portuguesa, pois, apesar da divisão feita, como se tratassem de assuntos distintos a gramática, a literatura e a produção textual, estes constituem uma unidade, de modo que a formação de um bom usuário da língua, não somente na fala como na escrita, está compreendida através da leitura e produção de textos, também colocado no texto de Lívia Suassuna, Iran Ferreira de Melo e Wanderley Elias Coelho, na obra Português no ensino médio e formação do professor.
A partir disso, compreendendo a leitura como processo importante na construção do conhecimento sobre a própria língua e considerando que é sobre ela que se projetam os outros conhecimentos, tomamos que é fundamental o ensino de literatura de forma direta para a construção dos conhecimentos sobre a própria língua, pois, como será visto, as análises linguísticas e até mesmo gramaticais devem ser apontadas sobre um texto concreto e funcional, e não em trechos e fragmentos, como se vê em muitos materiais didáticos. E, de forma indireta, contribui servindo de base, posto que componha o processo de aprendizado da língua e os significados dos enunciados, para o ensino de outras disciplinas que, de todo modo, dependem da língua para serem transmitidos.
Outra perspectiva dada como motivação para o ensino da literatura, considera a formação do indivíduo, conforme já estabelecido no texto Olga de Sá, mas tem direcionamento maior para a ética e a afetividade, resgatados por Gabriel Perissé que através de sua obra Filosofia, ética e literatura – uma proposta pedagógica, propõe a estética de Alfonso López Quintás. A obra trata não somente sobre a literatura como também de aspectos ligados à educação de modo geral, trazendo noções da filosofia da educação, considerando inclusive os parâmetros curriculares nacionais, que apresentam dificuldades em sua aplicação no Brasil, assim como também houve na Espanha, país de origem de Quintás. No fundo, o objetivo é demonstrar que é possível conceber de forma ativa e prática o ensino nas diversas disciplinas visando à formação humana, seguindo o que os PCN propõem.
Conforme Gabriel Perisséescolheu basear sua obra em Quintás,pois:
"Sua abordagem filosófica da educação poderia perfeitamente servir (...) como diretiva para (...) assumir os valores formativos inerentes aos PCN (mas também, no futuro, os valores formativos de toda e qualquer proposta educacional emanada de órgãos públicos ou mesmo de uma entidade particular) e delineasse propostas de concretização de uma atitude pedagógica voltada para a formação integral dos alunos.".
(2004; 7)

Além da formação humana, aponta características a serem apropriada pelo professor para alcançar os objetivos da aula como o entusiasmo ("O entusiasmo entusiasma"), exemplificando com o seu entusiasmo influenciado por Quintás, que por sua vez fora atraído (entusiasmado) por Romano Guardini. Nos demais capítulos são estabelecidos outros aspectos como o diálogo e o encontro, o âmbito, entre outros de tendência mais afetiva.
Dificuldades no ensino de literatura
De acordo com o que já fora posto sobre o ensino de literatura, sabe-se que prevalece um modelo de ensino a rigor tradicional, que transforma algo que deveria ser voltado para a leitura, em um momento para referenciar a modelos de períodos literários, datas e biografias de autores, perdendo o sentido da análise do texto literário e da comparação do que fora escrito com o que se está produzindo atualmente.
A seguir, as discussões sobre algumas das causas para a manutenção desse modelo antigo são dispostas.
Aula tradicional
Considera-se aquicomo aula tradicional, o ensino baseado na aula meramente expositiva, vinculada a uma visão de que o ensino da língua consiste na norma culta gramatical, de modo que a literatura e a produção de textos são levadas sem análise de textos de fato, pois o ensino da gramática é realizado sobre fragmentos, a literatura considera aspectos históricos e características padrão de períodos literários e a escrita é tratada como redação escolar, sem finalidade prática, senão a correção de erros gramaticais, com base em modelos predeterminados e fixos. Aliado a isso, há ainda a separação das três matérias, como se não estivessem correlacionadas, perpetuando um ensino fragmentado da língua.
Na obra, Português no ensino médio e formação do professor, os capítuloscinco e doze, respectivamente, A literatura no ensino médio e O projeto didático: forma de articulação entre leitura, produção de texto e análise linguística, tratam justamente, o primeiro, sobre como "trabalhar o texto literário sem torná-lo pretexto para o ensino-aprendizagem de outras questões, como, por exemplo, algumas noções gramaticais" (Martins, 2006; 83), "trabalhar a literatura em sala de aula, visando à motivação dos alunos para análise e interpretação" (idem), considerando a aparente concorrência desta com as novas tecnologias de informação que costumam ser mais atrativas e também proporcionam "possibilidades de o indivíduo ficcionalizar, imaginar" (idem).
O segundo considera o que foi colocado no início deste tópico sobre a divisão das disciplinas que compõem o ensino da língua portuguesa, "as práticas desarticuladas" (Suassuna et al, 2006; 227) das atividades de leitura e escrita "que se reduziam, respectivamente, à identificação de informações ou mensagens explícitas na superfície do texto e à produção de redações tipicamente escolares (...)" (idem). Além do
"(...) ensino da língua como simples sistemas de normas, conjunto de regras gramaticais, visando a produção correta do enunciado comunicativo culto, lança mão de uma concepção de linguagem mascarado pensamento que é preciso moldar, domar, para, policiando-a, dominá-la, fugindo ao risco permanente de subversão criativa (...). Por isso, na escola, os alunos não escrevem livremente, fazem redações, segundo determinados moldes(...)".
(LEITE, 1997, p. 24 apud SUASSUNA et al, 2006, p. 228)

Percebe-se pelo trecho, segundo a autora, o quão pode ser prejudicial o ensino baseado em regras que tendem a desenvolver o mecanismo de reprodução e não de uma construção criativa, a partir do que se percebe da língua e de outros usos dados a ela, como demonstra tão bem a literatura, através dos textos que muitas vezes quebram as regras e, justamente, pelo estranhamento causado por isso, tornam-se obras de arte.
O uso do texto como pretexto é bastante criticado por ambos os capítulos, cujos autores buscam desenvolver um modo de ensino que o utilize com fim concreto e faça uso da análise linguística, ao invés da gramatical, concebendo a percepção semântica dos recursos expressivos da língua.
Dessa forma, são colocadas as problemáticas do ensino que veio sendo transmitido até então pelas escolas, que conforme os autores dos referidos capítulos, dificultam o processo de construção da língua e o uso pelos estudantes conforme suas necessidades reais. No terceiro tópico, serão abordadas as propostas levantadas nos dois capítulos aqui considerados para investigação dos problemas acarretados nas transmissões do método antigo de ensino da língua portuguesa.
Abordagem do material didático

As situações, apontadas no subtópico anterior, costumam ser apoiadas pela abordagem de alguns materiais didáticos, considerando a separação do estudo da língua em três disciplinas, que pode transmitir a ideia de que sejam de fato matérias isoladas entre si. Essaafirmação é colocada por Lívia Suassuna, Iran Ferreira e Wanderley Elias Coelho, no mencionado capítulo doze, do livro Português no ensino médio e formação do professor, através de citação atribuída a Bridi (1998:122):
"(...) estudos de língua que negligenciam o texto e suas implicações constitutivas (...) estão, hoje, na contramão da História. Entretanto, na prática das salas de aula e dos livros didáticos em geral, o que ainda se vê é que perdura a separação constante e persistente entre Língua e Literatura (...). O divórcio entre língua e literatura, além de, por si só, corresponder a uma aberração, por inconsequente em relação à natureza delas mesmas, é, no mínimo, um desserviço a todos, pois a língua é sempre reinventada na literatura (...)".
(BRIDI, 1998, p. 122 apud SUASSUNA et al, 2006, p. 228)

E, no caso do estudo da literatura, a vinculação de que esta consista na mera assimilação de datas, nomes de autores pertencentes a um período literário e suas características típicas, como se todos os escritores contemporâneos estivessem em uma dessas escolas literárias, seguindo rigorosamente suas regras para serem classificados dessa forma, desconsiderando outras obras destes que não se enquadrem às descrições.
O parágrafo anterior corresponde a alguns dos pontos articulados por Hélder Pinheiro, cujo texto concentra-se especificamente na análise dos livros didáticos de literatura do ensino médio (Bunzen, 2006; 103 -116), ao longo de quinze anos, considerando ganhos e aspectos que faltam ser melhorados. Por isso, aqui será retratado com certo afinco por retratar exatamente as características e as problemáticas do livro utilizado no ensino de literatura.
Inicialmente, cita colocações de Osman Lins e Lígia Chiappini de Moraes Leite, o primeiro sobre o caráter comercial desses livros, que tendem a seduzir o leitor para sua compra. A outra, além dessa perspectiva, acrescenta o fato de que muitos deles costumam dar respostas prontas ao estudante, contribuindo para a tendência a reprodução de conceitos. Essas colocações apontam que a qualidade pode estar comprometida devido à necessidade de tornar o material mais suscetível a compra.
Ainda a esse respeito, o autor menciona sobre o problema gerado pela preferência, quase geral, por livros didáticos cuja editora, de grande porte, localiza-se no sudeste, por isso, dada a produção de um mesmo material para todo o país, não há referência a escritores e obras regionais.
Os manuaissempre ocorrem em coleções ou volumes únicos, geralmente, estes se tratam da união dos volumes delas. Também há casos daqueles que reúnem língua portuguesa e literatura, cabendo ao último a menor parte (considerando que o livro comum possua poucos textos literários, imagina-se o quanto deve ficar ainda mais restrita sua inclusão sob essa condição). Coincidem na abordagem, tratando em ordem cronológica os períodos literários e alguns mencionam a literatura portuguesa.
De modo geral, o autor pontua os seguintes problemas encontrados, pois os livros são de fato muito parecidos: poucos textos literários, geralmente, apenas fragmentos, inclusive no caso de textos líricos, e quando aparecem, têm objetivo de apontar características de um período, ocultando casos particulares; omissão de referências bibliográficas; o trabalho com as figuras de linguagem através de trechos, dissociados da compreensão geral do texto; e a questão mencionada anteriormente, sobre a padronização de um material para todas as regiões, desconsiderando os autores regionais.
A exceção a alguns dos problemas apontados reside em uma obra particular, por sinal, sem novas edições, que foi disponibilizado durante a década de sessenta, chamado Literatura brasileira em curso, de Dirce Riedel, Carlos Lemoas, Ivo Barbieri e Therezinha Castro. A peculiaridade em relação aos demais se demonstra no que os próprios autores mencionam: "(...) não obriga a uma única via de leitura. (…) O livro é desmontável, podendo ser armado de muitas maneiras, a critério de quem lê ou estuda". Além disso, conforme Hélder Pinheiro, há maior diversidade de gêneros e não oferece respostas prontas, o que exige mais reflexão do professor, ao que ele atribui a não continuidade desse material.
Sobre as mudanças ocorridas nos livros didáticos de literatura, pontua que as principais foram em aspectos visuais, com a inclusão de mais imagens de obras de arte, o que é benéfico. Entretanto, a quantidade de textos, o que de fato seria mais relevante haver acréscimo, houve inclusão pouco sensível. Considerando que o tamanho dos livros também ficou maior.
Conforme já comentado no princípio deste subtópico, critica também o fato de se estudar mais a história da literatura do que as próprias obras, obedecendo a uma sequência cronológica, tida como mais importante, e que não permite aprofundamento maior em um autor. Exemplifica, inclusive, sobre como são estudadas as obras de Carlos Drummond de Andrade, atendo-se muitas vezes somente a alguns tipos de poesia, por conterem traços que marcam determinada época, esquecendo que o poeta não se restringiu somente a eles.
Os aspectos levantados permitem uma visão para além do livro didático como instrumento laboral do professor, que muitas vezes não dispõe de tanto tempo para elaborar aulas melhores, nem mesmo se questionar sobre o que os alunos estão construindo a partir do que está sendo visto em sala de aula. Embora seja papel do professor a percepção sobre o que está sendo ensinado e para o quê, conforme será visto no subtópico seguinte.
Formação dos professores
Muito do que se afirma e defende a respeito da Didática, praticada em sala de aula, está ligado diretamente ao professor, que a depender de sua formação pode reproduzir ou contribuir para a transformação do meio em que vive.
Nesse sentido, pontua-se sobre a contribuição, talvez a mais influente de todas, do professor no ensino da língua portuguesa, não desconsiderando o poder da escola e sua política pedagógica que incide diretamente sobre ele. Mas, que não reduz a responsabilidade daquele que rege diretamente o conteúdo a ser visto em sala de aula.
Cabe aqui ressaltar as dificuldades de professores não somente em constituir a junção dos fragmentos do ensino da língua e direcionar o ensino da gramática no sentido da análise linguística, relacionado à leitura e à constituição de um texto, como também, em seguir o que é proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais, que na teoria articulam exatamente com o que se objetiva para a formação dos alunos quanto indivíduos pensantes e direcionados à ética e cidadania. Mas, na prática, constituem, assim como em outros países, Espanha e Argentina, por exemplo, conforme relatado por Gabriel Perissé, citando López Quintás, apenas arquivos teóricos para as quais os professores não foram orientados a colocá-los em prática.
Sobre isso, é apontado por Gabriel Perissé, parafraseando um tema quintasiano (referência a Alfonso López Quintás):
"(...) se dizemos a um professor a um professor de física que, em suas aulas, deve ensinar ética, falar de tolerância, de cidadania, ele dirá que não estudou ética, mas física, e que não sabe o momento certo de falar sobre os temas transversais que a nova lei de ensino exige que sejam abordadas em suas aulas (...). Porque tudo ficou sem controle, sem orientação, mas há uma cobrança muito grande. Antes de preparar um professor de história para ensinar ética vão e cobram que ele ensine ética (...). E se vocês, no Brasil, com a implantação dos PCN, não corrigirem os problemas a tempo, será terrível. Os professores perderão horas e horas em congressos, em reuniões, e tudo inutilmente. ".
(QUINTÁS, 1999, p. 71 apud PERISSÉ, 2004, p. 5).

De acordo com Quintás, não é somente no Brasil que há problemas com a assimilação e a colocação em prática do que é disposto nos parâmetros curriculares. O que não torna menos preocupante, visto que é fundamental o alinhamento desses parâmetros para uma efetiva educação padronizada, que garanta condições iguais a todos os indivíduos. Quintás dedicou-se ao entendimento das diretrizes adotadas em seu país e desenvolveu um trabalho reconhecido para suprir as dificuldades dos professores, conforme Perissé, foram mais de dez anos para a implantação. Do mesmo modo, Perissé busca seguir na compreensão dos PCN para "concretização de uma atitude pedagógica voltada para a formação integral dos alunos".
Através de uma perspectiva de tendência afetiva, propõe a noção de entusiasmo, a partir das descrições a respeito disso de Quintás,
"O entusiasmo não é passageiro, não é pessimista, não é reducionista, não é niilista. Pois nasce de uma resposta ao apelo do "quem das coisas" – expressão genial de Guimarães Rosa no conto "Cara-de-bronze" – essa presença pessoal, presença iluminadora, presença real identificada com a verdade e a beleza e, que corresponde ao verbo, no qual o personagem "vê-se a si mesmo e vê todas as criaturas" (...). O "quem" da realidade pede-nos um encontro com o seu caráter eloquente e amoroso, e esse encontro, realizado, realiza-nos enquanto pessoas. Daí, por conseguinte, nasce o entusiasmo.".
(PERISSÉ, 2004, p. 13-14).

Pela caracterização dada ao que seja entusiasmo, como algo maravilhoso, que atrai os outros, pois "O entusiasmo entusiasma", ou seja, pessoas entusiasmadas conseguem contagiar os outros, e que se entusiasmam também. Então, Perissé transmite um apelo ao professor, de que ele mesmo se entusiasme, em sua vida pessoal e profissional, para que assim contagie seus alunos,
"que busquem, descubram, realizem e encarnem pessoalmente os valores entusiasmantes, o que pressupõe vencer atitudes indiferentes, conformistas (...) e desenvolver a sensibilidade para o valor, (...) capacidade de responder à exigência de participação que a vida nos apresenta."
(PERISSÉ, 2004, p. 15).

Outra perspectiva da formação do professor considera especificamente o ensino da língua, assim, o professor formado pelo curso de Letras. Sobre esse aspecto, a professora Ms. Abniza Pontes de Barros Leal (ARAÚJO, 2015; 106), afirma que os currículos dos Cursos de Letras aparentam "criar dois espaços mágicos" em que seja possível dissociar a literatura e o ensino "pontual" da língua (no sentido do ensino de gramática e seu uso linguístico), pelo que ela pode perceber pelos discursos de alunos de Letras, quando informam serem bons leitores e manterem boa escrita, embora não saiba explicar os porquês dos usos adequados.
A partir dessa percepção, pontua as situações em relação ao professor em formação para que tenha informado sobre essa diferença entre literatura e ensino "pontual" da língua, dentre as quais se destaca o fato de que:
"(...) as práticas de leitura no espaço escolar (...) ainda são orientadas apenas por uma perspectiva reduzida do que lhe é mais importante: compreender e ter posicionamento sobre textos lidos. Ler, então, além de significar-se apenas a interpretar minimamente o texto não aparece, muitas vezes nesse contexto, como algo que demanda um conjunto de conhecimentos."
(ARAÚJO, 2015; 106)

Assim, deve se considerar também que os professores em formação, em maioria, descendem de uma forma de ensino tradicional que muito contribuiu para a visão fragmentada do ensino da língua portuguesa e, mesmo com certo direcionamento teórico, muitas vezes puramente teórico, não é tão simples adotar uma forma de ensino que oriente a leitura e, consequentemente, o estudo de literatura, aliado a uma perspectiva de análise linguística, compreendendo as estruturas formadoras de sentido no texto.
Propostas para o ensino pragmático e "unificado" da língua portuguesa
Conforme as problemáticas levantadas serão relacionadas as propostas e possíveis soluções encontrada pelos teóricos mencionados em prol do ensino de língua portuguesa que atenda as necessidades reais de uso e considerando de forma não fragmentária.
O primeiro ponto, que buscava como motivar os alunos à análise e interpretação de textos literários, em um momento de aparente concorrência entre ela e às novas tecnologias da informação, e trabalhar o texto literário sem torná-lo pretexto para o ensino-aprendizagem de outras questões, como normas gramaticais. Teve algumas das soluções apontadas pela autora, Ivanda Martins: a mudança do antigo paradigma do texto literário como "universo de signos agradáveis, tranquilizadores e decorativos, que 'ajuda' o aluno a escrever sem erros (...), e indicar as datas das obras 'principais' e a biografia dos seus autores" (2006; 90) para a busca de uma leitura que não englobe somente clássicos, como também textos contemporâneos e haver a possibilidade de comparação destes com os clássicos.
Perceber, através da leitura dos textos, o caráter atemporal delas e sua função simbólica e com possibilidade de ajudar as pessoas a compreenderem a si próprios, sua comunidade e o mundo, conforme feita de citação de Beach & Marshall. Evitar trabalhar por meio de textos fragmentados e buscar diferentes formas de o aluno apresentar sua leitura (dramatizações, recontar através de outras linguagens como desenhos, pintura).
Sobre a questão das novas tecnologias, aponta que o papel da escola seria o de direcionar esses usos para os objetivos escolares, já que a literatura busca adaptar-se às diversas modalidades de divulgação, pois "autores e leitores assumem papéis ainda mais dinâmicos, diante da interatividade dos meios eletrônicos" (2006; 97), cabendo assim ao professor envolver-se também.
O segundo considera a divisão das disciplinas que compõem o ensino da língua portuguesa, "as práticas desarticuladas" das atividades de leitura e escritae o ensino de língua como mero conjunto de regras gramaticais, ao que conseguiu êxito através da pedagogia de projetos, tomar o ensino "unificado" da língua portuguesa, no sentido de que, através de um projeto pedagógico, cuja articulação previa a conexão dos conhecimentos, conseguiu-se estabelecer uma situação que recupera "o movimento intrínseco à prática da linguagem: ler o que o outro disse; comparar com um outro jeito de dizer de um outro sujeito; verificar outras formas de dizer e ter o próprio texto lido (...)" (BUNZEN, 2006; 232-233).
Antes da proposta do projeto pedagógico, consideram que "o ensino da língua se efetive através (...) da leitura, da produção de textos e da análise linguística" e que, conforme Geraldi, tornem o ensino da língua focada no texto e nos usos da língua. Paralelo a isso, consideram o trabalho com projetos vantajoso por apresentar "a possibilidade de tratar os conteúdos de modo articulado". Apresentam, conforme Gandin (2002, apud Bunzen, 2006) algumas vantagens da pedagogia de projetos:
"a) possibilita o estudo de temas vitais, de interesse dos alunos e da comunidade; b) permite e requer a participação de todos, de modo que o aluno não fica apenas na postura passiva(...) c) abre perspectivas para a construção do conhecimento, a partir de questões concretas; d) oportuniza a experiência da vivência crítica e criativa(...) f) cria um clima propício à comunicação, à cooperação, à solidariedade e à participação."

A prática do projeto em questão foi realizado no Colégio de Aplicação (CAp) da Universidade Federal de Pernambuco, em uma turma de 2º ano, cujo desenvolvimento dos temas foi satisfatório, através da proposição de um levantamento histórico da escola, em que os alunos precisaram realizar entrevistas e dossiê histórico, com o objetivo de um "protagonismo crítico do aluno sobre a realidade dele mesmo", considerando que:
"(...) a abordagem do uso da língua em sala de aula deve atender a interesses dos alunos envolvidos em interações autênticas. O conhecimento e a discussão acerca da língua devem ser pertinentes na medida em que ela é descrita e usada de modo a considerar suas funções semânticas, pragmáticas, textuais e discursivas em situações concretas de funcionamento."
(BUNZEN, 2006; 235).

De modo que esses objetivos foram de fato atendidos, conforme apontado por seus autores, inclusive no que cerne à literatura, considerando que foram utilizados textos literários e não literários, a fim de propor uma reflexão sobre a descrição da realidade.
O terceiro ponto, sobre a abordagem do material didático, açõessão sugeridas para sala de aula, como: perceber na interação com os alunos o tipo de leitura adequada, cuidando também para acrescentar novas experiências a eles e não se restringir ao livro didático.
A perspectiva da importância de utilizar obras na íntegra e de apresentar os casos particulares aos alunos, o que a sequência cronológica e perfis de épocas não permitem. Dessa forma, incluir novos materiais.
Chega-se a considerar a possibilidade do trabalho sem os livros didáticos nas aulas de literatura. Entretanto, o próprio autor admitiu sua dependência do material de didático no início do magistério e percebe que muitos são os que dependem, quase exclusivamente, deles.
A quarta situação, da formação do professor, supõe-se pela abordagem de Perissé a busca pela compreensão dos Parâmetros Curriculares e a necessidade de o professor manter-se entusiasmado para fazer com que "os alunos entrem livre e voluntariamente (...) e experimentem o conhecimento como algo mais empolgante (...) do que se poderia tentar convencê-los mediante uma exposição objetivista" (PERISSÉ, 2004, p. 16).
Por outro lado, sob ponto de vista de Leal (2015)há a crítica aos professores, cujas atividades visam a mera decodificação e pelo fato de que não são dadas oportunidades maiores de participação dos alunos na aula, considerando haver simulação do momento em que o aluno deveria formular hipóteses, mas que são desconsideradas pelo professor e, em que não fica clara a importância de levantar hipóteses antes da leitura do texto e, assim, "O leitor em formação não põe em ação os seus esquemas de conhecimento, para fazer associações entre o que já sabe e o que vai encontrar no texto" (ARAÚJO, 2015; 110).
Dessa forma, a autora coloca que o professor seja o mediador do processo de leitura, mas que não seja apenas ele o leitor do texto, conforme as práticas observadas e aponta como saída "pautar as ações docentes por uma metodologia de ação -> reflexão -> ação" (ARAÚJO, 2015; 114).
Considerações finais
Portanto, há muitos desafios na educação escolar para a efetivação do ensino da língua portuguesa de forma a se construir no conjunto leitura, análise linguística e escrita. Observam-se alternativas que, inclusive, destinam a aplicação prática da teoria dos Parâmetros Curriculares Nacionais, além da melhoria do ensino de literatura.
Os professores precisam perceber que o ensino de literatura compreende mais que o resgate de características padrão de escolas literárias, e que pode se encontrar o sentido da vida através da leitura de obras literárias, sejam clássicas ou não, e que as comparações podem gerar boas reflexões sobre os objetivos dos textos e os recursos utilizados para obtê-los.
Assim, considera-se o universo da literatura intradisciplinar na língua portuguesa, como prática da leitura, análise linguística aplicada a um texto real; e interdisciplinar, que considera também a percepção histórica, filosófica entre outras disciplinas envoltas à literatura.
E, sim, o material didático serve como apoio ao professor, mas não se pode restringir-se a ele. É preciso incluir novas visões aos alunos, novos textos, ao mesmo tempo em que não se deve esquecer que ele também possui suas próprias leituras e precisar construir a partir delas, não somente sua percepção dos textos, como do mundo. Por isso, é de grande valia a participação ativa do aluno nas aulas e que este possa praticar o uso da língua de forma pragmática, e não restrita a mera correção gramatical.
Referências Bibliográficas

ARAÚJO, Adriana da Silva et al. Reflexões linguísticas e literárias.Fortaleza: Hbm, 2015.
BRIDI,M.V. (1998).Língua e literatura: uma falsa dicotomia.Em: Anais do 6º Congresso Brasileiro de Língua Portuguesa, PUC/SP,São Paulo, pp.119 - 123.
BUNZEN, Clecio; MENDONÇA, Márcia. Português no Ensino Médio e formação do professor. São Paulo: Parábola, 2006.
FULGÊNCIO, L.; LIBERATO, Y.G.Como facilitar a leitura. São Paulo: Contexto, 2003.
PERISSÉ, Gabriel.Filosofia, Ética e Literatura: uma proposta pedagógica. São Paulo: Manole, 2004.
LEITE, L.C. (1997).Gramática e literatura: desencontros e esperanças. In: Geraldi, J. W. (org.). O texto na sala de aula.São Paulo: Ática, pp. 17-25.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2013.
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