As atividades da Comissão da Anistia, o seu impacto para a formação e mobilização de jovens brasileiros para a defesa dos direitos humanos e fortalecimento da democracia

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A Comissão da Anistia, criada através da Medida Provisória 2.151 em agosto de 2001, faz parte do Ministério da Justiça, e passou a ser parte integrante (e de caráter definitivo) da estrutura governamental do Estado brasileiro em 2002, por consequência da aprovação de Lei n. 10.559 (Ministério da Justiça 2006). Tem o objetivo de analisar os pedidos de indenização e de promover a reparação em razão das violações de direitos fundamentais sofridas pelos cidadãos que foram impedidos de exercer atividades econômicas por motivação exclusivamente politica durante o período da ditadura, a saber, de 18 de setembro de 1946 até 05 de outubro de 1988. (Ministério da Justiça 2006).
Apesar de, a ação de proporcionar a implementação do direito à reparação moral e econômica ser de suma importância e de extrema validade, o trabalho da Comissão de Anistia vai além disso, uma vez que, este organismo configura-se um espaço de reencontro, de reconciliação do Brasil com seu passado (Comissão da Anistia do Ministério da Justiça a 2007), como também um lugar onde o dialogo é essencial; tornando-se possível compreender o que de fato foi a ditadura no Brasil, também como quais foram as consequências sofridas por aqueles que se mantiveram firmes e convictos dos ideais democráticos. Dessa forma, esta Comissão não atua simplesmente sendo um agente de reparação moral e econômica, mas como um instrumento de promoção e proteção dos direitos humanos, principalmente dos direitos à verdade, à justiça, à memória e à reparação; visando fortalecer e aprofundar o processo e as instituições democráticas do Estado brasileiro (Comissão de Anistia a 2007).
De acordo com Genro e Abrão (2009), a história mostra que é preciso lembrar para não repetir jamais. Se faz necessário manter uma politica de preservação da memoria histórica e de afirmação dos valores democráticos com a finalidade de sinalizar para as gerações futuras a importância de se preservar os ideias democráticos e todos os direitos e deveres que isso implica (como o direito à liberdade de expressão, de assembléia, de pensamento, assim como o respeito à vida, entre outros) e apontar quais são as ações e comportamentos que são injustificáveis e que devem ser condenados em uma democracia (tortura e desaparecimento forcado para citar alguns). Por consequência dessa politica de preservação da memoria histórica, acredita-se que a Comissão de Anistia pode ser um instrumento para a promoção da paz e estabilidade na nação brasileira, assim como pode promover a importância da proteção e promoção dos direitos humanos e aprofundar os ideais democráticos em todo o território brasileiro (Arnould e Sriram 2014).
Entendendo a importância de seu, papel a Comissão de Anistia, vem desenvolvendo importante atividades com o objetivo de impactar a formação e mobilizar as gerações mais novas para a defesa dos direitos humanos e o fortalecimento da democracia no Brasil, afim de que, a história, realmente, mostre aquilo que não deve ser repetido, jamais. Essas atividades fazem parte do projeto "Anistia Politica: educação para a democracia, cidadania e os direitos humanos", implantado em 2008, cujo objetivo é a construção de politicas de memória e verdade referentes ao período de repressão ditatorial e que são realizadas através de práticas educativas à respeito dos direitos humanos, com o intuito de aprofundar o processo de justiça de transição no Brasil. (Abrão et al 2010).
Uma dessas atividades são as Caravanas da Anistia que são "sessões públicas itinerantes de apreciação de requerimentos de anistia politicas acompanhadas por atividades educativas e culturais promovidas pela Comissão da Anistia" (Abrão et al 2010). As Caravanas têm por finalidade resgatar, preservar e divulgar a memória politica do país , mas também elas têm a importante tarefa de garantir uma ampla participação da sociedade civil nos atos reparatórios oficiais. Uma vez que, elas acontecem nos lugares aonde as violações ocorreram, as Caravanas trazem a história para mais perto da população, criando um ambiente de reflexão, e de diálogo sobre as consequências do governo ditatorial na vida dos cidadãos e da suma relevância que a democracia (Abrão et al 2010) e seus ideias tem para a população.
Dessa forma, as Caravanas permitem que as novas gerações obtenham um conhecimento aprofundado de uma parte importante da historia da nação (que ate então só conheceram em livros e nas aulas na escola) e participem ativamente de sua continuação como parte integrante – uma vez que são testemunhas das ações de reparações realizadas pelo Estado brasileiro. Em razão dessa participação, ha um aumento de confiança no Estado por parte da sociedade em geral, pois aquele que antes cometia terríveis violações agora, não somente reconhece seus erros publicamente, mas também pede perdão por eles (dando a palavra àqueles que por tantos anos tiveram sua voz roubada, sendo impedidos de se expressarem livremente, devolvendo assim os direitos da liberdade de expressão, de pensamento e de participação da vida pública à toda a sociedade brasileira que por tantos anos tiverem seus direitos humanos violados pelo mesmo Estado que deveria protege-los e garantir a proteção desses direitos). Como afirmou Abrão e Cardozo "Ao reconhecer seus erros, o Estado contribui para o engrandecimento da democracia, afirmando a necessidade de constante vigilância para que as liberdade públicas conquistadas sejam sempre valorizadas e fortalecidas" (em Coelho e Rotta 2012 p.24).
É importante ressaltar que, o fato das Caravanas acontecerem aonde os perseguidos sofreram violações por parte do Estado (ao invés de ocorrerem no Distrito Federal) também é de suma relevância para as vitimas e seus familiares, uma vez que, permite que haja o resgate da dignidade humana de forma mais profunda (Abrão et al 2010), resgatando o sentimento de "pertencimento", de orgulho, de ser parte integrante e ativa dessa pátria amada chamada Brasil. O pedido de desculpas oficial por parte do Estado, assim como a materialização desse pedido através da "Declaração de Anistiado Politico" constitui uma prova, uma evidência de que a luta não foi em vão, mas que ela foi importante, legítima e agora, reconhecida como parte integrante e crucial para a volta da democracia no país – prova essa que agora poderá ser mostrada aos familiares, vizinhos e sociedade em geral como um reconhecimento da luta, dos percalços, das violações sofridas e dos esforços feitos por aqueles que sabiam da importância e do valor que a democracia tem, que acreditavam que um Brasil mais justo e livre não era só um sonho mas um alvo a ser alcançado, e que pagaram sim, um preço altíssimo para que hoje as gerações futuras pudessem viver nesse sonho que agora virou uma realidade.
De acordo com Greiff, esse reconhecimento por parte do Estado está interligado com a possibilidade de devolver "a condição de cidadão às vitimas, de restaurar a confiança entre cidadãos e de promover a solidariedade social"(2006, p.323), uma vez que a confiança e a solidariedade estão interligadas a cumplicidade surgida a partir da socialização dos testemunhos das vitimas da ditadura, o que causa um impacto positivo e grande sensibilização e compreensão pela sociedade em geral. Portanto, as Caravanas da Anistia possuem a característica de poder resgatar a cidadania, de integrar aqueles que antes foram excluídos da vida cívica e pública do país, com a finalidade de construir uma sociedade mais fraterna, justa e unida pela solidariedade social (Abrão et al 2010).
Outra atividade importante da Comissão de Anistia consiste no projeto "Marcas da Memória"; que reúne depoimentos, sistematiza informações e incentiva iniciativas culturais que permitam a disseminação de informações afim de que toda a sociedade possa conhecer o passado e assim, extrair lições valiosas para o futuro (Comissão de Anistia b 2010), reiterando a posição convicta da Comissão de que é através do conhecimento do passado que é possível identificar e aprender com os erros cometidos, afim de que eles não mais aconteçam. Ou seja, pelo conhecimento do passado torna-se possível moldar o futuro.
O Marcas da Memória tem a finalidade de incentivar ações realizadas por grupos da sociedade civil relacionadas aos temas tratados pela Comissão de Anistia, buscando pluralizar e multiplicar as iniciativas de acesso à memoria e busca da verdade que ainda encontram-se centralizadas na esfera governamental (Comissão de Anistia b 2010). O objetivo desse projeto é que as diferentes visões e narrativas sobre esse passado sombrio da história do Brasil possibilitem uma troca de experiências que agreguem valor e que impactem positivamente a sociedade de forma geral (principalmente as novas gerações), ajudando na formação de cidadãos mais conscientes, críticos e ativos na vida cívica e política da nossa nação. Brasileiros que verdadeiramente entendem o que significa ser cidadão – tornando-se sujeitos comprometidos com a democracia, com o avanço do país de forma a integrar e beneficiar a todos, com os direitos humanos, com a verdade, transparência e a justiça.
Como a própria Comissão de Anistia (b 2010, p: 04) declara:
"Espera-se, com este projeto, permitir que todos conheçam um passado que temos em comum e que os olhares históricos anteriormente reprimidos adquiram espaço junto ao público para que, assim, o respeito ao livre pensamento e o direito à verdade histórica disseminem-se como valores imprescindíveis para um Estado plural e respeitador dos direitos humanos."
Com o objetivo de promover um trabalho eficiente alcançando os melhores resultados possíveis, as ações da Marca da Memória estão divididas em quatro áreas (Comissão de Anistia b 2010):
Audiências Públicas: que são atos e eventos para promover processos de escuta publica dos perseguidos políticos sobre o passado e suas relações com o presente. Exemplos disso são as sessões temáticas ocorridas em 2008 sobre as diferentes categorias profissionais de trabalhadores e sindicalistas demitidos arbitrariamente na ditadura.
História Oral: entrevistas com perseguidos políticos baseada em critérios teórico- metodológicos próprios da História Oral. É importante ressaltar que, essas entrevistas são realizadas em parceira com as Universidades Federais de Pernambuco, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro e que todas essas entrevistas ficarão disponíveis no Memorial da Anistia e poderão ser acessadas nas bibliotecas e centros de pesquisa dessas universidades para acesso da juventude, sociedade e pesquisadores.
Chamadas Públicas de fomento à iniciativas da Sociedade Civil: Através dessas chamadas a Comissão seleciona projetos de preservação, de memória, de divulgação e difusão advindos de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e Entidades Privadas Sem Fins Lucrativos. Vale ressaltar que como resultado dessas chamadas livros, documentários, materiais didáticos e informativos foram criados; houve ainda exposições artísticas, pecas teatrais, palestras e musicais, entre outros.
Publicações: com a finalidade de publicar uma coleção de livros de memorias dos perseguidos políticos, dissertações e teses de doutorado sobre o período da ditadura e a anistia, além de reimprimir ou republicar outras obras e textos históricos e relevantes e registrar anais de diferentes eventos sobre anistia politica e justiça de transição. É importante frisar que, todas as publicações são distribuídas de forma gratuita, especialmente nas escolas e universidades.
É necessário apontar que, a Comissão de Anistia ainda realiza outras atividades de caráter educativo e social; por exemplo as Anistias Culturais – que são atividades reflexivas desenvolvidas por meio da cultura e da pedagogia, a partir de fatos históricos e datas marcantes no processo de luta pela redemocratização do país. As Anistias Culturais tem o objetivo de realizar ciclos de Debates e Mostras Culturais no âmbito do Ministério da Justiça (Comissão de Anistia c 2010). Ainda pode-se destacar o lançamento da revista semestral sobre o tema, uma série feita em parceria com a TV Brasil em comemoração dos 50 anos do golpe militar, a construção do Memorial da Anistia Política do Brasil (um espaco nacional de memória e homenagem constituído por um museu e um centro de documentação, são complementadas por iniciativas focais), dentre outros.
Com o exposto acima, percebe-se assim que a Comissão de Anistia tem realizado atividades crucias para o avanço da democracia no nosso país e o avanço de princípios e valores essenciais (como os direitos humanos, a verdade, transparência e justiça) para que os ideias democráticos achem solo férteis nas mentes da população, tornando cada vez mais enraizados e fortes na cultura brasileira. Trazendo esse importante tema para a esfera popular (através de trabalhos de caráter social e educativo como as Caravanas da Anistia e as Marcas da Memória), a Comissão tem ensinado, fomentado o diálogo e a troca de experiências e engajado gerações mais jovens a participarem mais ativamente do debate e da vida politica da nossa nação; formando jovens mais conscientes dos seus direitos e dos seus deveres, enquanto membros dessa pátria Brasil, mostrando que é somente através desse engajamento que será possível criar um país cada vez mais consolidado democraticamente e que tenha por base a justiça, a verdade, a transparência, os direitos humanos e o respeito por todos os cidadãos.

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