As coleções do Museu Nacional no século XIX: patrimônio cultural e identidade nacional pela perspectiva dos naturalistas

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VI Semana Nacional de Museus na UNIFALMG / XII Semana Nacional de Museus

Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões Universidade Federal de Alfenas, de 12 a 16 de maio de 2014.

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REALIZAÇÃO

PROMOÇÃO

APOIO

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Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões Universidade Federal de Alfenas, de 12 a 16 de maio de 2014.

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ORGANIZAÇÃO

Coordenação: Claudio Umpierre Carlan Luciana Menezes de Carvalho

Comissão Avaliadora dos anais da VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG: Aline Rocha de Souza Ferreira de Castro Anderson Marques Garcia Bruno César Brulon Soares Cláudio Umpierre Carlan Diogo Jorge de Melo Eurípedes Gomes da Cruz Júnior Fernanda Magalhães Pinto Luciana Menezes de Carvalho

Arte gráfica do CD-ROM: Maria Regina Fernandes da Silva

Equipe: Agueda Bueno Almeida Novais

Gilmara Aparecida de Carvalho

Ana Paula Passos

Jemima Rodrigues Costa

Eloíse Iara Braghini David

Lárame Silva Carvalho

Evandro Cassimiro de Moraes

Lucimar Aparecida da Costa Benini

Edinea Silva Carlan

MarlyTeodora Nogueira

Gabriel Barreto Lopes

Rosalia Menezes de Carvalho

Local (do evento): Universidade Federal de Alfenas, Auditório Leão de Faria - Rua Gabriel Monteiro da Silva, 700. Centro, Alfenas, MG, Brasil.

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Universidade Federal de Alfenas, de 12 a 16 de maio de 2014.

APRESENTAÇÃO A Semana Nacional de Museus é uma das ações da Política Nacional de Museus do Ibram, construída e proposta de forma articulada, que tem como característica o trabalho integrado e democrático entre as instituições museológicas brasileiras (IBRAM, 2009). A escolha do tema é feita pelo Conselho Internacional de Museus – ICOM para o Dia Internacional dos Museus, dia 18 de maio, para que suas instituições possam utilizá-lo com o objetivo de valorizar sua posição perante a sociedade. Segundo o ICOM, o tema para este ano é os vínculos criados pelas coleções dos museus – nos recorda que os museus são instituições que possibilitam criar laços entre “os visitantes, as gerações e as culturas do mundo” (ICOM, 2014). Na atualidade, esta relação tem sofrido grandes mudanças por meio de diferentes abordagens e tecnologias, levando inclusive os museus a repensarem sua missão tradicional e encontrar novas estratégias que tornem suas coleções mais acessíveis aos diferentes públicos. Ainda: “Por ser uma instituição que conserva e transmite o passado, o museu também está fincado no presente. Por essência é o guia entre as gerações, dando a possibilidade às gerações presentes e futuras de conhecerem melhor suas origens e história.” (ICOM, 2014). Seguindo este desafio, o Museu da Memória e Patrimônio organiza a VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG / “Museus e Patrimônio: As Coleções criam Conexões”, entre os dias 12 e 16 de maio de 2014. Este ano, como nas edições anteriores, abrimos espaços para apresentação de Comunicações, com o envio prévio de Documentos de Trabalho. Os documentos de trabalho estão aqui publicados nos Anais da Semana, que possuem ISSN desde 2011, juntamente com textos de nossos convidados e, como adendo, um conjunto de textos do Museu de História Natural da UNIFAL-MG. Elaborado por Luciana Menezes de Carvalho. Museu da Memória e Patrimônio da Universidade Federal de Alfenas.

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PROGRAMAÇÃO 12 de maio 18h – Credenciamento 19h – Solenidade de Abertura 19h30min – Apresentação Musical: “Madrigal Renascentista da UNIFAL-MG” 20h – Conferência de Abertura: “Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões”, Profa. Dra. Tereza Scheiner (Vice-Presidente do Conselho Internacional de Museus - ICOM, PPG-PMUS UNIRIO / MAST) 21h30min – Congraçamento 13 de maio 09h – Palestra: “Museus e objetos de Museus como uma plataforma para o diálogo entre gerações”, Msc. Gevorg Orbelyan (Museólogo e vice-diretor do Museu de História de Yerevan, Armênia) 10h40min – Palestra: “Quando nenhuma coleção faz conexão”, Dr. Damon Monzavi (Diretor de Marketing, Museu de Gemas, Irã) 12h – Almoço Apresentações/Comunicações coordenadas por Luciana Menezes de Carvalho. 14h - “As coleções do Museu Nacional no século XIX: patrimônio cultural e identidade nacional pela perspectiva dos naturalistas”, por Walter Francisco Figueiredo Lowande. 14h20min – “Museu e História: coleção numismática do Museu Histórico Nacional. Um patrimônio brasileiro”, por Claudio Umpierre Carlan. 14h40min – “Ações educativas no Museu Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek

em São José dos Pinhais – PR: Conexão com a Cidadania”, por Cecília Szenkowicz Holtman.

15h – “Coleções Numismáticas: preservação da história por meio das cédulas, moedas e medalhas”, por Luciano Alves Teixeira. 15h20min – “Museu Imaginado e suas zonas de contato – o caso da Festa do Divino Espírito Santo”, por Bárbara Pereira Mançanares e Luiz Carlos Borges. 15h40min – Intervalo Apresentações/Comunicações coordenadas pelo Prof. Dr. Claudio Umpierre Carlan. 16h – “A utilização da luz visível e do ajuste cromático como procedimento para a

documentação científica por imagem de bens culturais. Estudo de caso: um objeto cerâmico da coleção de arte popular do MHNJB-UFMG”, por Alexandre Cruz Leão e Agesilau Neiva Almada.

16h20min – “A Arqueologia como Ferramenta Didática em Museus”, por Mickaela Schwab Muniz. 16h40min – “Museu de cada um, patrimônio de todos nós: brincando de construir ideias sobre museus e patrimônios no Sul de Minas Gerais”, por Luciana Menezes de Carvalho, Evandro Cassimiro de Moraes, Gilmara Aparecida de Carvalho, Lucimar Aparecida da Costa Benini e Rosalia Menezes de Carvalho.

14 de maio 09h – Palestra: “As conexões formam Museus e Patrimônio: uma experiência em Montevidéu, Uruguai”, Prof. Lic. Arturo Toscano (Diretor do Museu Nacional de Antropologia de Montevideu) 10h40min – Palestra: "Coleções e conexões: o sentido das coisas no Musée du Quai Branly", Prof. Dr. Bruno César Brulon Soares (Professor do Curso de Museologia – UNIRIO; Vice-Presidente do Comitê Internacional de Museologia do ICOM) 12h – Almoço 14h – Oficina: “Animação como uma ferramenta de comunicação de museus”, Msc. Gevorg Orbelyan (Museólogo e vice-diretor do Museu de História de Yerevan, Armênia) 15 de maio 06h - Saída para Ouro Preto 13h - Almoço em Ouro Preto 14h - Museu de Arte Sacra 15h - Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas

16h - Museu da Inconfidência 17h - Tour pelo Centro Histórico de Ouro Preto 19h – Livre 16 de maio 09h40min - Saída para Mariana de Trem (opcional) 10h30min - Saída para Mariana de ônibus da UNIFAL-MG 11h - Visita ao Trem da Vale (espaço cultural) 11h30min - Tour pelo Centro Histórico de Mariana 14h - Almoço 15h - Retorno à Alfenas

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CONVIDADOS P.

As conexões formam Museus e Patrimônio: O Patrimonial Por-venir, Montevideo, Uruguay Arturo

Toscano



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Gevorg Orbelyan – Museums and Museum objects as a

platform for dialogue between generations

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Bruno César Brulon Soares – As coleções de museus criam

conexões: percursos da musealização no Musée du quai Branly Damon Monzavi – When no collection makes connection

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Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

AS CONEXÕES FORMAM MUSEUS E PATRIMÔNIO: O PATRIMONIAL POR-VENIR, MONTEVIDEO, URUGUAY Lic. Arturo Toscano1 Resumen El estudio de caso analiza la puesta en valor del patrimonio y gestión de un territorio de la ciudad de Montevideo excluido culturalmente e impactado ambientalmente. Los protagonistas de la gestión patrimonial son los vecinos residentes quienes mediante su organización y seguimiento de las actividades del Día del Patrimonio se suman y participan del proyecto interdisciplinario “Lo Patrimonial Por-venir” e inciden en la política cultural de gobierno de la Alcaldía del Municipio F, Montevideo. El Proyecto “Lo Patrimonial Por-venir” ha sido realizado en el 2012 por un numeroso equipo de técnicos y vecinos. El mismo dio lugar a una publicación colectiva de varios autores, actualmente en prensa de la cual reseñaremos aspectos parciales deteniéndonos en los que hemos participado particularmente dentro de la perspectiva museológica.

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Director del Museo Nacional de Antropología. i

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1. Características del Territorio El Municipio F es una de las siete jurisdicciones político-administrativa del Gobierno de la ciudad de Montevideo, ubicado en la periferia Noreste de la planta urbana. Parte de sus características residen en el crecimiento histórico que tuvo lugar en los años 1940-50 debido al emplazamiento de numerosos emprendimientos industriales que alcanzaron a emplear a más de 15.000 familias que constituyeron gran parte de la población residente en el territorio. Impacto ambiental Un hábitat otrora caracterizado por la riqueza de la biodiversidad de la cuenca de los bañados del Arroyo Carrasco, poblado originalmente por pequeñas chacras con actividades agropecuarias fue impactado por el precipitado crecimiento urbano sin planificación ni cuidados ambientales. Actualmente presenta un paisaje deteriorado y fragmentado debido al impacto contaminante de los antiguos complejos industriales y las consecuencias de una gestión de área marginal y de segregación territorial. Por un lado, una trama formal con sectores de gran deficiencia en mantenimiento y servicios, y por otro la realidad de la informalidad urbana. El Municipio F alberga el número más elevado de asentamientos irregulares de la capital, más de 80, cerca de 90.000 personas, con distintas características y grados de precariedad, pobreza e indigencia. Fragmentación social Pedro da Costa2 reseña la actual caracterización del Municipio F señalando que los cambios en el patrón de desarrollo económico de los últimos treinta años tuvieron, como correlato, el creciente deterioro de la estructura productiva del país y, específicamente de la zona, y cita del informe de PLEADEZ (2005:5) “El cierre de industrias, el deterioro de espacios productivos, el crecimiento de la economía (…), la segregación urbana, económica y social y una calidad de vida decreciente, han destruido no solamente el tejido productivo, sino todo el entramado social, los colectivos de trabajadores y sus distintas expresiones de participación, el conjunto de servicios conexos (…) provocando la actual fragmentación social que atraviesa todo el zonal”. El referido autor menciona la última publicación del “Atlas socio-demográfico y de la desigualdad” (2013), señalando que gran parte de la periferia montevideana presenta altos valores de población con carencias críticas, entre 40% y el 60% del total de sus habitantes. En el Municipio F la pobreza alcanza al 64% de los niños

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da Costa, P. “El Día del Patrimonio en el Municipio F” en Lo Patrimonial Por-venir, IMM en prensa.

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menores de seis años, un número muy por encima del promedio nacional de 26,1% para esa franja, según resulta del censo de 2011. Exclusión cultural Este sector noreste de la ciudad, Municipio F, históricamente

fue relegado

y

excluido de la acción cultural de todos los gobiernos de la ciudad de Montevideo al grado que no existen prácticamente en el territorio el reconocimiento de referentes de patrimonio tradicional. Los residentes de la zona advierten esta falta de equidad en la distribución del patrimonio tradicional al grado que han sido influenciados por dicha visión centralista asumiendo dificultad para poder reconocer el potencial de su acervo patrimonial y su producción artística. La concepción centralista capitalina de la gestión de la cultura y el patrimonio se reproduce a escala departamental y se expresa geográficamente permitiendo visualizar su distribución y condensación en las capitales y dentro de éstas en sus distintas centralidades preferenciales. El territorio del Municipio F a pesar de su densidad poblacional históricamente no fue contemplado con los beneficios de la gestión de la política cultural de centralidades preferenciales. La historia de las conmemoraciones nacionales del Día del Patrimonio iniciadas en 1995 da testimonio de cómo toda su actividad cultural festiva nació y se concentró en sus primeros 8 años en el centro preferencial de la ciudad vieja de Montevideo. A partir del 2003 en oportunidad en que se afianzó el reconocimiento de las concepciones del patrimonio intangible por parte de la Comisión Nacional del Patrimonio Cultural de la Nación comenzó a irradiarse geográficamente a nivel nacional y también departamental la profusión de actividades conmemorativas del Día del Patrimonio. Es así que comenzó a generarse un desborde festivo de dicho evento que forcejea, por la vía de los hechos, una explosión de los considerados teóricos del concepto del patrimonio y su gestión a nivel nacional. Al respecto corresponde destacar las

reflexiones teóricas

realizadas por el Prof. Arqto. Nery González sobre el estudio del patrimonio y su evolución cuando en 2007 señalaba: […] el vínculo patrimonio-monumento-nación ya no ocupa el centro de la escena. Allí se ha instalado -y parece que para quedarse-, una visión dominantemente antropológica del patrimonio, donde lo inmaterial gana terreno y asume un neto protagonismo. […] hoy el universo de bienes “patrimoniables” tiende a confundirse con el universo de bienes culturales, de todo lugar y de todo tiempo. En esa perspectiva, lo patrimonial se convertirá en un escenario inabarcable, en el que se diluye todo contenido concreto y operable, o se afianzará como una construcción socialmente condicionada por un contexto político-cultural concreto, donde importará más que la colección de elementos a los que se asigna un papel explícito de bien cultural protegido, el relato que une y da sentido a las partes. Un relato iii

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que puede operar como plataforma desde donde “gerenciar” en un contexto democrático y con vista a la consolidación de un proyecto compartido, aquello que la comunidad asume como un “capital social” acumulado por generaciones. […] afrontemos la tarea de situar lo patrimonial en el buen sentido que tuvo y ya no tiene, no como ancla -que ata al pasado-, sino 3 como memoria proyectada hacia un mejor futuro.

2. Condiciones que generaron el Proyecto En el año 2010 se crea la nueva jurisdicción política-administrativa del Municipio F configurando

un nuevo territorio a administrar mediante la incorporación de diferentes

barrios pertenecientes a otras jurisdicciones. La nueva disposición política demandó conocer y dar a conocer los atributos del nuevo territorio. Ante esta nueva demanda se puso en relieve la labor iniciada por los vecinos en 2008 en la organización y seguimiento de las actividades del Día del Patrimonio dentro del territorio del Municipio F. La información y nueva perspectiva que aportó el relevamiento de los atributos culturales registrado por los vecinos en el Grupo Organizador Local del Día del Patrimonio fue valorado y ponderado por el equipo de Trabajo Social del Municipio F. La Prof. Laura Paulo4 menciona sobre el tema que […] la estrategia desarrollada con respecto al patrimonio en el Municipio F, no se centra tanto en el rescate de bienes excepcionales sino que contengan un fuerte significado para los residentes. Se pone énfasis en los procesos colectivos que el patrimonio pueda generar como forma de contribución a una política cultural en la que los participantes de esos procesos, se sientan reconocidos. Simultáneamente -en su momento- se asumió que esa tarea no estaba fundada en investigaciones que recogieran dos de las principales vertientes de conocimiento: el estudio profundo de cada valor patrimonial y el estudio del público objetivo. La necesidad de una investigación sobre la atribución de sentido a los valores del territorio y la necesidad de desarrollar un análisis crítico y revisiones al respecto, fue lo que propició la definición de nuevos proyectos para el año 2012.

Consecuentemente el referido equipo de Trabajo Social promueve un proyecto con la participación conjunta de la Cátedra de Políticas Sociales de la Licenciatura de Trabajo Social-FCS-UdelaR, la Cátedra de Museología de la Tecnicatura Universitaria en Museología-FHCE-Udelar, el Museo Nacional de Antropología y el Museo Nacional de Historia Natural. Esta conjunción de instituciones permite implementar el Proyecto “Lo Patrimonial Por-venir” financiado por la Comisión Sectorial de Extensión y Actividades en el Medio de la UdelaR. La interrelación y sinergia de las mencionadas instituciones tiene

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González, Nery (2007). EL PATRIMONIO COMO PROYECTO DE FUTURO (o sobre la conveniencia de barajar y dar de vuelta) Revista Relaciones / junio de 2007,Montevideo. http://blogs.montevideo.com.uy/hnnoticiaj1.aspx?5331,1321. 4 Laura Paulo, La Activación Social de los Valores Patrimoniales en Lo Patrimonial Por-venir, IMM en prensa. iv

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lugar debido a las condiciones de convergencia que venían desarrollando en sus respectivos ámbitos. Como antecedentes del campo de la investigación señalamos que en el 2011 el Museo Nacional de Antropología y el Museo Nacional de Historia Natural (MNHN y MNA) comienzan a ejecutar el diseño de la segunda versión del Álbum Digital. El nuevo diseño enfatiza una visión y construcción colectiva de la gestión del patrimonio donde las coordenadas temáticas del patrimonio natural y patrimonio cultural se integran en una perspectiva holística fundamentada en la interacción de la comunidad y su territorio. Esta propuesta da lugar a la identificación y realce de la diversidad de comunidades (rurales o urbanas) que enmarcadas en sus diferentes territorios (de distintas escalas) atesoran la riqueza y diversidad del patrimonio nacional. El Álbum Digital II pretende no solo captar la participación individual del ciudadano sino también promover y estimular la participación colectiva de la comunidad. Se procura involucrar a la comunidad, haciéndola protagonista de una acción social en la tarea de reconocer, describir y documentar los testimonios naturales y antropológicos que integran la identidad patrimonial de cada localidad a través de una interfaz presencial e informática de los citados Museos Nacionales. El nuevo Álbum Digital no solo permitirá la documentación y búsqueda individual de bienes patrimoniales sino también la documentación y búsqueda de las unidades patrimoniales que encierran las comunidades y sus territorios, permitiendo identificar el repertorio de los recursos culturales y naturales que se integran holísticamente en un territorio, en función de la interacción de la comunidad. Se trata de una puesta en valor y gestión del patrimonio cultural y natural que se realiza a expensas de la iniciativa ciudadana que participa en forma individual o colectiva para contribuir e integrar una plataforma digital que lo socializa vía web y lo legitima por la vía de los hechos. El involucramiento y recreación en la socialización que le asigne la comunidad le confiere el valor y el uso social que asegura el sentido y la función transformadora sociocultural. La propuesta del Álbum Digital se relaciona con la tradición teórica de los Museos comunitarios latinoamericanos5 que afirman la concepción de la función social y transformadora que deben brindar los Museos y las instituciones gestoras del Patrimonio al

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Georgina DeCarli (2004) Vigencia de la Nueva Museología en América Latina: conceptos y modelos. In: Revista ABRA, Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad Nacional, Editorial EUNA, Costa Rica.

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servicio de la comunidad, para desarrollar una recreación cultural que contribuya a mejorar la calidad de vida de sus ciudadanos.

3. Implementación del Proyecto El proyecto “Lo Patrimonial Por-venir” se desarrolló a través de un proceso de consultas con los vecinos, que culminaron en una jornada de discusión abierta sobre los lineamientos de la política patrimonial en el territorio Municipio F, que permitiera su revisión y ajuste en función de lo que los vecinos re-conocen como expresiones culturales. El relevamiento de campo se desarrolló a través de entrevistas y mesas redondas donde se registró el parecer y sentir de los vecinos en torno a sus identidades tangibles e intangibles. La tarea fue realizada por equipos integrados por estudiantes de Trabajo Social y de Museología. Vecinos, coordinadores, docentes y estudiantes ensayaron e intercambiaron una singular vivencia sobre las distintas concepciones del patrimonio y las diferentes alternativas de su gestión. El trabajo de campo posibilitó […] el intercambio desde lo vivencial, hicieron emerger valores latentes, recuerdos aletargados. Poco a poco esos valores fueron recolocados en los discursos y asociados a la idea de patrimonio. Así, la concepción conservacionista y monumentalista tan arraigada en el marco referencial del común de la gente, paulatinamente fue dejando paso a definiciones democráticas de lo relevante en el territorio y en la historia de sus residentes. El proceso desarrollado fue muy movilizador; los relatos se tradujeron en forma de imágenes vivas, asociadas a sonidos, rutinas, sensaciones y sentimientos hacia los diferentes elementos identificados como valiosos. En todos los casos despertaron la preocupación de los habitantes frente a lo perdido, con cierto anhelo, pero a la vez entusiasmo frente a su posible activación.6

Lo Patrimonial Por-venir: consideraciones El Proyecto Lo Patrimonial Por-venir constata que la convocatoria de la celebración nacional del Día del Patrimonio provocó y generó en forma espontánea un relevante proceso cultural por parte de los vecinos de un área deteriorada ambientalmente y de marcada vulnerabilidad social: Municipio F. Dicho evento pone en relieve la importancia que tiene el Día del Patrimonio, ya no como jornada oficial sino como profundo movimiento cultural

6 Ana Bajac et al, “Hallazgos del Proyecto” en Lo Patrimonial Por-venir, IMM en prensa.

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nacional que convoca y provoca las potencialidades culturales y patrimoniales de las más diversas comunidades del país. Los protagonistas lograron explicitar el sentimiento de exclusión cultural y social existente. Sin embargo, no quedaron anclados en el nivel de la denuncia sino que lo trascendieron. La labor de

identificar y profundizar la

puesta en valor de su propio

patrimonio así como reivindicar su sentimiento de identidad, significó un movimiento que busca expandirse. A partir de un paisaje deteriorado ambientalmente y fragmentado culturalmente, los vecinos lograron construir socialmente un nuevo territorio. La conjunción de residentes y actores externos comprometidos con la temática, coadyuvaron a montar una nueva escena a partir de los elementos ya presentes. La puesta en valor del potencial velado de su patrimonio que no había sido explicitado ni reconocido, posibilitó el comienzo de una representación diferente. El paisaje estigmatizado históricamente es zurcido, relacionado y unificado, mediante paseos culturales a través de la visita de locaciones estratégicas. Así, la nueva identidad patrimonial es construida socialmente con dedicación y constancia de un trabajo que es sostenido mensualmente a lo largo de cada año. Se destaca que la presente acción cultural se desarrolló y fluyó en el marco de la fiesta del Día del Patrimonio, lejos de la antigua peregrinación solemne a monumentos arquitectónicos e históricos, para abocarse a todos los extremos de lo que implica una festividad de recreación cultural y social. Los vecinos interactúan festejan y disfrutan de distintas maneras las dos jornadas que hoy convocan a las expresiones más amplias del patrimonio de acuerdo a la selección y legitimación de los propios vecinos. Se trata de una fiesta nacional que celebra la libre expresión democrática de sus diversos patrimonios y actividades socio-culturales. El énfasis de festividad anual que se le asignó a la programación y celebración del Día del Patrimonio, dio el marco propicio para contener esta experiencia de participación genuina. Contribuyó a profundizar el conocimiento y comunicación entre los vecinos y los diferentes barrios que conforman el Municipio F. Esta festividad con perfil de turismo cultural, incentivó a mantenerse activa a lo largo del año. Prepararse para recibir a los visitantes y “mostrarse a los otros desde sus propios lugares” con sus mejores atributos y capacidades culturales (artesanías, danzas, teatro, comidas y monumentos) y por otro lado a los que se disponen a visitar para “conocer y disfrutar de los otros” que desean recibirlos y exhibir su “patrimonio”. Esta estrategia se profundizó cuando tomaron la iniciativa de convocar la visita de escuelas rurales para realizar el paseo cultural del Municipio F.

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La connotación de festividad y recreación socio-cultural de este evento sienta las bases para el desarrollo del turismo cultural, ámbito a partir del cual se dan las condiciones para generar una producción económica que tiene la particularidad de convocar infinitos servicios complementarios que otorgan oportunidades en toda la estructura social. Incluir en la visita cultural la principal Usina de Residuos de Montevideo, algo “que no queremos ver” transformándolo en una suerte de museo de sitio constituye

una

importante propuesta que genera una relevante experiencia educativa. Se trata del predio donde se concentra la basura de casi toda la capital, que constituye un enclave de altísimo impacto y poco conocido por la población responsable de su existencia. Esta forma de organizar el patrimonio en el Municipio F, logra integrar tan peculiar lugar al recorrido del paseo cultural, con la finalidad de movilizar al visitante ante su volumen y problemática. De esa forma, se promueve la toma de conciencia ciudadana con el cuidado responsable que debemos tener en el consumo y en la gestión de los residuos. El éxito del Grupo Organizador Local en la invención del paseo cultural por su heterogéneo territorio, es reconocido, apoyado y retroalimentado por los propios auspiciantes del transporte que expresan interés y colaboración todos los años. Ya no hay que anticipar una solicitud ante la empresa y esperar si será atendida o no. Ahora es la empresa quien reconoce que el Municipio F tiene un proyecto consolidado para el cual se reservan las habituales unidades para el traslado gratuito de los visitantes. La experiencia testimonia que la debida gestión del patrimonio constituye una poderosa herramienta de transformación social cultural y económica. de las comunidades y de la nación. Afianzar la identidad, memoria y autoestima significa recomponer y vitalizar la matriz social, promoviendo su interacción social constructiva y solidaria de los miembros de la comunidad y su territorio. Se confirma que la protección del patrimonio no se restringe a la legitimización que tradicionalmente se requería para dar curso a su protección jurídica y física sino que se debe forjar atendiendo simultáneamente a su componente de carácter funcional y servicial ciudadano. Tan importante como la protección e integridad física del bien, es la acción de velar por la integración conceptual del bien con sus diferentes significados tanto los del pasado como los del presente. El uso de la versatilidad simbólica del patrimonio por parte de la comunidad asegura su funcionamiento en el presente, sea para su recreación como para un uso social pragmático atendiendo las necesidades del presente y las aspiraciones del futuro. Nos encontramos ante un territorio donde el Gobierno Municipal enfrenta un gran desafío y ha comprobado los alcances de la proyección social y económica que encierra la viii

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gestión democrática del patrimonio cultural. Motivo por el cual asume el compromiso de seguir trabajando en su desarrollo como inversión valedera para afianzar la mejor gestión política de su ciudadanía. Visto los antecedentes del devenir de la gestión del patrimonio del Estado uruguayo, el gobierno del Muncipio F protagoniza un nuevo rumbo en el desarrollo social poniendo a prueba la gestión del patrimonio como verdadera herramienta de trabajo para transformación cultural-social y económica en favor de sus vecinos. Respecto a la caracterización teórica del presente Estudio de Caso del Munipio F, consideramos que se inscribe en el diagnóstico que realiza Keilyn Rodríguez Sánchez (2012)7 sobre los movimientos contemporáneos de la museología que denomina La Musa del Poder: hacia un Museo Integral con la sociomuseología. Refiere siguiendo a Dos Santos (2010). […] que “La sociomuselogía es un campo de investigación y práctica que deriva de la madurez de la nueva museología Latina conocida desde el siglo XX como museología comunitaria. Se caracteriza por poseer una perspectiva del rol social del Museo y de la herencia, como herramientas de empoderamiento por parte de los grupos humanos. 8

Keilyn Rodríguez sigue su diagnóstico y cita

los planteos de

Giménez-Cassina

9

(2010) de acuerdo a los cuales nosotros inscribiríamos Lo patrimonial por-venir en el enfoque Latino, que […] se denomina Sociomuseología y se vincula con el concepto de Museo Integral que considera que comunidad-territorio-herencia conforman una sola unidad. En este caso, el grado de poder de la comunidad es mayor (que el enfoque anglosajón) especialmente en el concepto de la exposición y la forma en que debe ser presentado un tema de herencia o identidad al público. Por lo anterior, los proyectos deben iniciar con la comunidad y luego el Museo facilita su gestión junto con ella mediante procesos de trabajo cooperativos que enriquecen la memoria de la herencia. Se trabaja con grupos de discusión dirigidos por un profesional. Este enfoque se ha desarrollado en espacios urbanos que han sido golpeados por la globalización y donde lo local ha requerido un espacio de expresión identitaria.

Finalmente concluimos que se trata de la puesta en marcha de una nueva estrategia socio-cultural donde se ha iniciado una novedosa experiencia académica interdisciplinaria. Investigadores del campo social, de la museología y de los Museos Nacionales han comenzado a operar conjuntamente generando un primer estado fermental. Este proceso deberá tener un seguimiento y una evaluación para ir analizando y plasmando paso a paso 7

Rodríguez Sánchez, K 2012. Las Musas de principio del siglo XXI: indicios del cambio educativo museal, Revista Electrónica “Actualidades Investigativas en Educación” Universidad de Costa Rica Volumen 12, Número 2 Mayo-Agosto p. 1-15. 8 Dos Santos, Paula A. (2010). To Understand New Museology in the 21st Century. Sociomuseology 3: To Understand New Museology in the 21st Century. Cuadernos de Sociomuseología, 3 (37), p. 512. 9 Giménez-Cassina, Eduardo. (2010). Who I am? An Identity Crisis. Sociomuseology 3: To Understand New Museology in the 21st Century. Cuadernos de Sociomuseología, 3 (37), 25-42. ix

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las numerosas propuestas sugeridas por los equipos integrados por vecinos, estudiantes y docentes motivados e involucrados por la gestión del patrimonio cultural.

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MUSEUMS AND MUSEUM OBJECTS AS A PLATFORM FOR DIALOGUE BETWEEN GENERATIONS Gevorg Orbelyan1

We are surrounded by objects. Our lives are spent identifying, using and judging objects…they are things precious, beautiful, boring, frightening, lovable. We are so used to objects… but objects have their existence largely unknown to the senses. -Richard Gregory (1970, p.11).

As it is known museums are institutions dedicated to preserving and interpreting the primary tangible evidence of humankind and the environment. In their function, the museums differ significantly from other cultural and scientific organizations. The cultural inheritance, part of which is reserved and exhibited in the museums, is the pride and wealth of every nation in the world. Museums have been founded for a variety of purposes - to serve as recreational facilities, scholarly venues, or educational resources; to contribute to the quality of life in the areas where they are situated; to attract tourism to a region; to promote civic pride or nationalistic endeavor; or even to transmit overtly ideological concepts. Given such a variety of purposes, museums reveal remarkable diversity in form, content, and even function. Yet, despite such diversity, they are bound by a common goal - the preservation and interpretation of some material aspect of society’s cultural consciousness. Museums from different time periods have had multi-functional activities and functions that served as unique platforms of information exchange for generations. Why do people visit museums nowadays? There are many papers, various researched articles and studies regarding this question. It is also commonly established that museums are institutions that preserve and communicate the past, yet they are grounded in the present. Museums are the link between generations, as they allow present and future generations to better comprehend their origins and history. 1

Museologist, Deputy Director – Yerevan History Museum, Yerevan Municipality. xi

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Historically, museums have only targeted broad audiences.

While occasionally

museums have addressed programs to a particular audience (primarily a particular age group, community or ethnic group), these activities focused on audiences in general, constituting only a small portion of museum activities. Over the past years, museums have become more active and lively as a result of international exchanges, progressive experimentations and modern technologies. However, new technological advancements allow museums to address various diverse groups with appropriate levels of discourse for each particular group. Some examples of such advancements include modifications of online exhibits with suitable information for specific age groups, ethnic groups and minorities, as well as adjustments for viewers with different educational levels or prior museum knowledge. Thus, exhibitions and curatorial materials (the information) will vary in presentation depending on a specific target audience, such as specific linguistic minorities, specific ethnic groups, middle school students, people without an art history background, etc. In order to enhance the audience’s interaction with the museum objects, various techniques, such as selecting words that are universal and understandable by most in describing the objects; annotations and developing mark-up standards can be facilitated. As it is known the profiles of museums directions are different, and are guided by their orientations. For example the history museum becomes a place that offers visitors unique objects, texts and publications. Moreover, this museum showcases narratives that may be organized in a number of ways, including what we might call creating an available past or, alternatively, commemorating the past and reinforcing identity projects. The art museum becomes a place for visitors to reflect on their senses and preferences, as well as demonstrate their cultural understandings. The art museum also serves as forum of escape from everyday world, allowing the viewers to immerse themselves into the world of art. The science museum encourages critical thinking and analysis, specifically in the field of science. All of these modes exist side-by-side in various museums, along with the functions of objects and texts, that together deliver knowledge and define a standard. Education, in this sense, represents the possibility of providing learners (visitors) a space where heterogeneous and even conflicting interpretations meet.

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So, should museums use their objects to transmit accurate information or to transfer authority for interpretation to visitors? In the article “The Object of Experience”2, the author describes how one experience objects in and says, “I am not claiming that the explication of the functional dualism of texts (embodied in museum) does away with the paradox of museum education thus articulated. Yes, the goal of museum education is to transmit correct information about art, science, or history by teaching visitors the code and how to decode it. In fact, entry into the code is an important part of the museum’s potential social role. After all, withholding information does museum visitors no good. Thus, experience shows that these goals seem to be more aligned with the other function of museum objects and are affiliated with museum education as well. Yes, the goal of museums is to invite visitors into its meaning, that is, to help make experiences, draw on what visitors already know, or contemplate the alternative possible meanings of museum objects. As a result, museums are the tools that allow visitors to interact with objects in multiple ways. How then, is this invitation done that allows one to acknowledge why the “standard” information transmitted by objects is privileged, and creates alternative interpretations of objects (and ways of interacting with objects) that are encouraged rather than constrained? Humans are curious creatures in nature, thus, we like to learn and explore new thing. Learning does NOT simply mean to know how to read, multiply fractions, memorize part of a cell or remember historical events.

For more than two hundred years ago, it was thought that

learning and motivation were tightly intertwined3. When trying to understand and to improve a practice, such as learning from objects, it makes sense to look at practitioners. Historians, scientists, curators, educators, exhibition developers, and designers are all concerned with the interpretation of objects. Each of these professionals in their communities has developed a disciplinary “toolkit” filled with established modes of inquiry, evidentiary criteria and accepted patterns of analysis to help with their objectrelated work. The different perspectives of these communities are reflected in the relative strengths and weaknesses of their toolkits. A disciplinary toolkit of an educator, for example, may have pedagogical strengths that contrast with the strengths of visual explanations of an

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“Perspectives on object-Centered Learning in Museums”, Sally Duensing, University of Bristol and the Exploratorium , 2002, (London). 3 Learning from Museums, Visitor Experiences and the Making of Meaning, John H.Falk and Lynn D. Dierkinc, pages 177-178, Altamira Press, 2000 (USA). xiii

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exhibit designer. Considering how practitioners use objects in their work, we have the means to introduce similar methods to learners who are interested in reconsidering the ways they interact with and use everyday objects in their lives. For instance, the purpose of historic sites was initially focused to preserve and inspire patriotism, and as we can see, education was a later development. History museums have been criticized for failing to shift the focus from objects to people, activities, and ideas. A shift like this presents a unique challenge to a history museum and the objects therein. The key issue however, lies in the simple power of being in the presence of objects from the past. Witnessing an object first hand is quite different from seeing it in the book or reading about it. The experience itself generates an air of authenticity and gives the sense that one is experiencing the past directly. Yet, regardless of the object’s authenticity, we cannot experience the past directly. Museums essentially display historical objects apart from their original context; therefore, the museum setting mediates the historical experience. Displays encourage meanings that may add to or detract from the types of historical conclusions learners draw from an object4. The curators of history museums are sensitive to these issues and work to display objects within an appropriate historical context. Helping visitors to see both the object and the display setting is a unique challenge for history museums. Curatorial presence in the form of contextualizing display settings is thus a key component in the learners’ (visitors’) use of objects in history museums. As I mentioned above, there are some cases and modes of research about museum objects: -

Objects of experience

-

Objects of design

-

Object of Conversation

-

Object of questions

-

Object in Context

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Learning from Museums, Visitor Experiences and the Making of Meaning, John H.Falk and Lynn D. Dierkinc, pages 191-199, Altamira Press, 2000 (USA). xiv

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Objects in History and Science museums

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Objects in Art Museums Hence, it becomes clear, that the museums, and the educational activities through

museums as a learning space, are quite seriously correlated with each other. But museums can use their spaces for other purposes as well. Perhaps in the museums from all over the world, the most direct idea of the generations is that a “museum” acts as a platform, that allows us to imagine it as a place where conversations occur without being necessarily mediated, at least directly, by museum staff. Some museums allow their conference rooms to be used as a site for book club discussions. In such cases, museum staff may participate. Moreover, museums might have even organized the theme for the book club, women and art for instance, but this initiates a conversation, not a lecture – it is intended as a platform for discussion rather than a podium for telling. Therefore, it is essential to understand, that one of the most valuable roles of the museum is to serve as a platform for conversations, as well as other interactions between people and not just for dissemination of sanctioned information.

Museum objects and their ideology The objects before arriving to the museums Passing from father to son or mother to daughter, the objects establish an inseparable connection between not only people who currently own the objects, but their distant relatives as well. Moreover, these objects also become a strong link between people who have been separated in time and place by establishing a sense of connectedness and unity. (For instance the objects old, worn, wrinkled and even broken and cracked objects are more precious than gold to the owners). Regardless, these even in such conditions, all objects come (appear) to the museums and become part of some intricate collections. Each museum object in the permanent exhibition has its own history and value. And sometimes it seems that all of these things, are the starting point of a long and sincere, substantive conversation.

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Often, the museum objects are relics of the past - in many cases relocated in time, place, and circumstance from their original context, communicating themselves directly to the viewer in a way not possible through other media. Museum objects are often considered to be the carriers of socio-cultural and scientific information, as well as carriers of authentic sources of knowledge and emotions, cultural and historical value, and of national heritage. As it is known, the museum object is an artifact/relic of reality - it is an important part of the museum collection as it’s intended to be kept at the museum for a long time, representing the current time or event. Another important factor is that museums objects should be able to attract, entice and draw visitors, as well as expres reality. Museum objects are highly representative, usually possessing unique characteristics, preserved to this day in a single or a very limited number. The unique museum object has a particular scientific and cultural value. So we should ask ourselves a question - what role does heritage and inheritance play in our lives? As humans, we inherit characteristics and genes from our ancestors. Consider this interesting theory, which hypothesizes that all people are born with all the qualities and abilities to become a genius, but it is favorable conditions and the environment that contribute to the development of the genius. For example, some people in middle ages began to draw and write music, whereas others remained the same. Hence, apparently there were incentives that contributed the development of their special talents. As a result, one can conclude that such contributions that expressed hereditary characteristics were activated by biological mechanisms. Also, the heritage is a socio-psychological phenomenon. It is not due to genetics. In the human psyche, memory is one of the special, key qualities. Accordingly, each individual has his/her own memory and history associated with this memory, which functions as some sort of a special code. And if you take away this memory, you will destroy the person or even the nation. Similarly, museum objects can also contain memory, certain information, and history. For example, the spatial and chronological arrangements of xvi

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museum objects show us an orderly sequence of historical events, helping learners interpret history as it was. It is up to the visitors to interpret and “read” the history of objects. Therefore, each museum makes efforts to represent the museum objects in the best possible ways. Each museum exhibit is a message from the past. And if we move forward by this slogan, we'll understand why the museum objects are subjects of research. For some visitors, museum objects are the reflections of the past, their origins and their history. Statistical evidence shows, that Yerevan History Museum visitors can be divided into subgroups. Those who are interested in objects before the Great Revolution (Soviet Period), such as photographs, documents, etc., are above 50 years old. Since these people have lived in this time period, the museum allows them to reminisce and refresh memories of their past. Moreover, for the visitors between the ages of 21 to 50 years old, the museum and its objects are also intriguing, since they provide information about a time period this group hasn’t seen nor lived, but heard from older generations.

Thus, it is obvious that museums and museums

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objects serve as a platform of dialogue between generations. Irrespective to gender, class or position in society, people like to visit museums as every person would find something interesting that would speak to their soul. In order to attract such a diverse group of visitors, including high school students and even kindergarteners, museums make tremendous efforts to make this happen. For instance, our museum has organized excursions, game-excursions, lesson-excursions, quizzes, literary evenings, and performances to attract diverse groups of people. Additionally, our staff has developed two educational programs about the history of Yerevan city. These programs are aimed towards visitors of different ages (4-75 years and older), allowing them to interact with the museum and its objects in ways that are appropriate for their specific age group. For example, the permanent educational programs for children have been formulated to provide the future generation with a rich source of knowledge about their ancient capital. Permanent educational programs: 

“Gitunik” (special educational program for 4-8 year old children)

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On this topic I had a research in our museum about visitors and it was published in the Museological Journal “Museum” (Association of museum workers and friends), p.177-183, 2009, Yerevan. xvii

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“Recognize your city Yerevan” (special program for the pupils of junior, upper secondary and high school 7-17 years) These programs differ from those of other institutions in that they are available at any

time of the day during museums hours. Analysis shows that such activities help the museum to attract a larger audience, and in turn increase the number of the visitors. In my opinion, such educational programs, exhibitions and activities require hard work and effort. Thus, many museums try to incorporate experimental, expositional, digital and virtual aspects in their exhibitions, which are consistent with the 21 st century. Some of these new approaches include, but are not limited to integrating music, theatre, cinema, etc. in the exhibitions. It is interesting to note, that almost always, visitors attempt to touch objects in the museums as they approach closer. Why do people do this? I believe that one of the reasons why people touch objects in the museums is because we, as humans, rely heavily on our senses. Touching intensifies our perceptions, allowing us to better interpret the tactile (tangible) object. This type of behavior is also evident in churches and cathedrals, where people try to touch walls or statues. On the other hand, touching museum objects often makes people feel important, as they can boast about it to others, who haven’t had the opportunity to visit the museum and see or even touch the objects. Usually, one might assume that these people think to themselves (and brag to others) “ohh … here is an object (instrument) from the 5th century and I touched it”. Research is an integral part of every museum. Additional research is required to reveal the full history and meaning of each object beyond its physical appearance. As an example, in our museum we have a variety of objects - documentations, photographs, household items, personal items, archeological, ethnographical, etc. A few years ago the scientific staff of our museum conducted a research on famous families of Yerevan from 19-20th century. Using papers and documentations from our museum gave researchers the opportunity to publish a book, called “Notable families of Yerevan”. The book was very popular and raised interest in many, acting as a unique bridge to link various generations while shedding light on historical, interesting events from these prominent families’ pasts. The book had such high demand, that our staff commenced to work on the second edition of the book (which will be published later this year), this time, incorporating even a larger number of families. xviii

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Image 1: Book “Notable Families of Yerevan”

I wholeheartedly agree with ICOM’s (International committee of Museums) suggested theme for International Museum Day for 2014, which is: “Museum collections make connections”. As you may know, the ICOM Advisory Committee proposes an exhibition theme annually, allowing museums to promote their expositions within a special theme to the public. Using such a technique, museums from all over the world act as a whole, reminding us that museums are living institutions that help create bonds between visitors, generations and cultures around the world. In conclusion, I would like to represent the project that our museum has proposed to complete in relation with the main topic of ICOM/MID. We have planned to install a Symbolic Tree (lineage) in the museum's foyer. We will hang photos of noble families (duplicates) in special antique frames with their names on the tree. During the opening reception, we will invite the descendants of these families as guests of honor.

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Image 2: The Symbolic Tree

We have decided to make this an interactive exhibition, thus, an announcement will be made to the public to bring photos of their grandfathers, grandmothers, and other ancestors, as well as any questions regarding their lineages to the opening reception. The visitors will be allowed to hang these photos and writings about their ancestors (questions, thoughts, ideas) on the Symbolic Tree. This kind of activity will give the event a more interactive function, with the main purpose of arranging future research. Beside the Symbolic Tree, in the main lobby of the museum we will organize a special exhibition about these families, their personal belonging items, documentations, house hold items, etc. from our museum collection. Additionally, as a museum night6 event, we will decorate the museum's main entrance from the outside, as well as the road closest to the main entrance. The installations will include lanterns of tribal families with symbolic names lit with candles at night.

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Since 2011, ICOM has been sponsoring the European Night of Museums, which is held every year on the Saturday closest to the International Museum Day. In 2014, both events will coincide since the European night of Museums will take place during the night of the 17th to the 18th of May. The European Night of Museums was created in 2005 by the French Ministry of Culture and Communication. On this occasion, the closing time of the museums is postponed to approximately one in the morning, which allows the public to visit the participating museums by night, for free. This year will celebrate the tenth edition of the European night of Museums. By welcoming the public during the night, museums invite them to visit the collections in a different, unusual and more sensory way. Many animations are offered during this event which is attended by numerous young people and families. The public participates in great xx

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The main purpose of this event is to utilize museum collections as a special tool that will aid in working with the community and the audience, allowing us to connect and share information via heritage, and most importantly, via museum objects (photos) themselves. In conclusion, we can state that each museum in the world should focus on developing a lively communication platform that provides access, interaction and social space to meet audience needs. A platform that encourages individual points of view, but provides access to usable authoritative information as the audience desires, all the while collecting, relating, creating and donating activities7 without forgoing its commitment to collective memories. As a final note, I’d like to say that the future museums for the next generation platform will also need to consider the following “what if” scenario – what if the aim of available and virtual exhibits (objects) was to gather visitors or participants, in order to set up a dialogue and integrate the more relevant insights into a new perspective? The gathering would take place in the museums where the objects remain, revealing key ideas and thoughts on how knowledge and technology come together, cutting across cognitive, educational, and psychological disciplinary boundaries.

numbers to this festive event: The European Night of Museums is present on the Internet and the social networks, with a great visibility. 7 Ben Schneiderman, Leonardo's Laptop: Human Needs and the New Computing Technologies, MIT Press, 2002. xxi

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AS COLEÇÕES DE MUSEUS CRIAM CONEXÕES: PERCURSOS DA MUSEALIZAÇÃO NO MUSÉE DU QUAI BRANLY Bruno César Brulon Soares1 Em geral, os museólogos do século XXI foram treinados a pensar que as conexões humanas, os laços que estabelecemos entre uns e outros e entre humanos e não-humanos – isto é, as coisas – são responsáveis por criarem as coleções de museus. Isto porque em geral são mesmo as conexões que criam coleções; nossas conexões com o passado, em primeira instância nos museus tradicionais, conexões com aquilo que nos distingue, com os Outros que definem a nossa ipseidade, ou com nós mesmos, nos museus em que exercitamos as nossas identidades. O tema proposto pelo ICOM para o ano de 2014 volta o olhar museológico do século XXI, em alguns contextos “viciado” em ver relações sociais como o objeto primordial dos museus, para as coleções musealizadas, elas mesmas criadoras de conexões. Não se trata, com efeito, do retorno a uma museologia tradicional que coloca no coração dos museus as coleções de objetos materiais. Ao contrário, trata-se de um convite a um olhar sobre as coleções considerando os laços sociais que elas podem gerar. Estudamos

amplamente

as

implicações

das

realidades

sociais

sobre

as

representações dos museus. Mas poucas vezes reconhecemos que os museus, através de suas representações – em grande parte construídas por coleções – também criam, alteram, manipulam, transformam as realidades sociais ao estabelecerem novos laços (por vezes, inesperados) entre humanos e não-humanos. Museus criam e alteram a ordem social tanto quanto são criados por ela. Imaginar que as relações são ditadas e comandadas pelos humanos, e que os objetos nos museus apenas re-apresentam essas relações constituintes da realidade não enquadrada pela musealização, é limitar a ação dos não-humanos, ou, em outras palavras, a sua agência. Considerando simetricamente a agência de humanos e não-humanos, como propõe o antropólogo Bruno Latour, tem-se que tudo aquilo que modifica o estado das coisas ao fazer alguma diferença é, presumivelmente, um ator na “relação” (LATOUR, 2005, p.71). Sendo assim, não há uma hierarquia estabelecida para diferenciar sujeitos de objetos. Uma coisa também pode ser estudada como um ator na equação sujeito-objeto – ou, ao menos, como um atuante, se não apresentar ainda figuração. Isso não significa, é claro, que esses participantes ‘determinam’ a ação, ou que “os martelos ‘impõem’ o martelar 1

Professor e Coordenador do Curso diurno de Museologia – UNIRIO. Museólogo, Historiador, Mestre em Museologia e Patrimônio e Doutor em Antropologia. xxii

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no prego”. Os objetos não são as causas da ação humana, mas também não são meros intermediários existindo apenas em função dela. É claro que somos nós que criamos as coleções que figuram nos museus. Todavia, uma vez criadas, utilizadas e colocadas em performance, as coleções criam conexões que são delas próprias. E, por vezes, são elas – através de sua agência – que determinam as ações humanas, e não o contrário. Lembremos do papel das relíquias na Europa medieval, em torno das quais se construíam relicários luxuosos, em torno dos quais, por vezes, se construíam imponentes catedrais, em torno das quais toda uma cidade e uma vida social se organizava. Eram os peregrinos que seguiam as relíquias e não as relíquias que seguiam os peregrinos. Quem determina a ação e o percurso de quem? Foi buscando entender “a vida social das coisas” (APPADURAI, 2007) que eu me propus a acompanhar, em minha tese em antropologia, o percurso de uma coleção para compreender a constituição da cadeia museológica no contexto francês.

Musealização e descolonização Uma cadeia museológica (SOARES, 2012) é o enquadramento teórico que podemos dar às instâncias organizadas em cadeia por meio das quais se desenvolve o processo de musealização que perpassa os museus mas que não se limita a essas instituições. Podemos considerar que a cadeia museológica tem início no campo, onde os objetos são coletados, abarcando todos os processos que se seguem de identificação, classificação, higienização, acondicionamento, seleção, exposição, e até a sua extensão sobre os públicos, os colecionadores privados, o mercado de objetos, e os diversos outros agentes indiretamente ligados a ela. A musealização, na prática, é o processo que envolve um objeto que entra na cadeia museológica, do momento em que ele é adquirido por um museu (por compra, doação, coleta, ou outros meios) até o momento em que ele é exposto para um público. Neste processo que marca, de maneira irreversível, na maioria dos casos, a vida de um objeto em vias de se musealizar, o objeto é alterado para fazer parte de uma realidade museológica. Tendo em seu cerne o princípio de um “guardar para transmitir” (GODELIER, 2007, p.85), a musealização é o ato de produzir objetos inalienados e inalienáveis, que têm a função de ‘representar o irrepresentável’. Ao eleger artefatos que serão destituídos de sua função original, ao ‘roubar-lhes a alma dando-lhes uma outra’, a musealização altera a realidade das coisas transformando presenças em significados. Estes objetos que perdem a sua utilidade, mas que representam o invisível, são aqueles que Pomian chama de xxiii

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“semióforos” (POMIAN, 1984, p.71). Para o autor, seria possível alargar a noção de utilidade a ponto de atribuí-la a objetos cuja única função é a de se oferecerem ao olhar. Todas essas coisas que supostamente ‘morrem’ para o mundo social em que nasceram ao perderem a sua função original são ressocializadas nas coleções e nos museus, tornando-se objetos de uma função singular, a de serem expostos ao olhar. Contudo, esses ‘objetos do olhar’ não morrem totalmente para a sociedade de onde vêm; na verdade, adquirem uma nova vida social, ou iniciam uma nova etapa em suas trajetórias. Na lógica traçada por Maurice Godelier sobre as coisas dadas, vendidas e guardadas, o guardar não é separar as coisas das pessoas porque é nesta união que se afirma uma identidade histórica que se deve transmitir (GODELIER, 2007, p.88). Com efeito, se dar é transmitir o valor das coisas e das pessoas, ligando-as umas às outras em uma relação que parte do plano do profano, guardar é uma forma de transmitir com mais intensidade aquilo que há para além da matéria objetal das coisas, e portanto toca o plano do sagrado. Estes objetos musealizados, podendo ser pensados analogamente aos objetos sagrados e preciosos pelo valor que lhes é atribuído, funcionam, segundo Godelier, como objetos de crença, que têm natureza imaginária antes de ser simbólica na medida em que essas crenças possuem sobre a natureza e sobre as fontes de poder e de riqueza um conteúdo imaginário. Segundo o autor, estes podem ser caracterizados como substitutos simbólicos dos seres humanos, ou “equivalentes imaginários da vida” (GODELIER, 2007, p.71). A musealização, assim, seria fruto deste fluxo imaginário que, para Godelier, precede as representações simbólicas e pode vir a modificá-las. Pensar os museus como agentes, portanto, implica em vê-los inseridos em uma vasta cadeia de trocas, que é constantemente atualizada e transformada. A visita ao Musée du quai Branly, principal expressão da curiosidade exótica entre as instituições nacionais da França atualmente, constitui uma viagem aos imaginários formados durante o vasto período das colonizações. Aquilo que o museu apresenta aos seus visitantes é a possibilidade de exercitar o imaginário colonial em uma viagem cenográfica e estética para o interior das próprias concepções de alteridade que marcam a relação com o patrimônio extraeuropeu neste país. A reencenação da relação colonial no museu, disfarçada na ênfase dada ao valor artístico dos objetos, alimenta a curiosidade do público e uma suposta ‘paixão’ pelas artes primeiras, que ainda buscam legitimação como ‘arte’ nos museus da França. O Musée du quai Branly representa a síntese perfeita deste cenário de transformação de valores –

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transformação esta que tem como um de seus objetivos proscritos, o de manter certas expectativas do passado sobre os objetos herdados da colonização. No caso da França, é impossível negar a influência da colonização no desenvolvimento dos museus. Estes foram, por muito tempo, financiados e comandados pelo império colonial, servindo aos interesses da metrópole. Considerando que a expansão europeia, particularmente a que se deu no decorrer do século XIX, teve consequências brutais na história ‘alterada’ dos povos que ela tocou, Georges Balandier é um dos primeiros a defender que esta situação de submissão, e a condição de “assujeitamento” que lhe era decorrente, condicionou de forma avassaladora as reações e as identidades desses povos “dependentes”, bem como de outros povos já emancipados (BALANDIER, 1951, p.5). O conjunto de movimentos posteriores que buscaram alternativas às relações de dominação que decorreram de tal expansão e que foram estabelecidas neste contexto, pode-se chamar de descolonização. Sendo criados e comandados pelos colonizadores, os museus etnográficos da metrópole não tiveram um contato direto com as populações das colônias que tomavam como objetos de estudo. Além de definir um contexto político complexo e de deixar uma herança de relações desiguais entre as diferentes populações e ‘civilizações’, em particular entre o dito Ocidente e o restante do mundo, a situação colonial 2, como definida por Balandier (1951), provocou uma dificuldade interpretativa das populações estudadas com implicações políticas por parte dos antropólogos e dos museus. A distância entre a metrópole e suas colônias estabeleceu uma distância epistemológica entre a antropologia dita “cultural” e a antropologia “aplicada” (BALANDIER, 1951, p.6), de modo que havia uma dificuldade recorrente em se pensar as coisas – e, entre elas, os objetos dos museus – nos contextos em que foram retiradas. Seria somente com o desenvolvimento progressivo de uma consciência pós-colonial sobre o saber antropológico e as práticas museológicas que estas instituições, marcadas pelo colonialismo, seriam confrontadas com outros meios de adquirir conhecimento sobre esses povos através de práticas comunicativas que, segundo Johannes Fabian (2001, p.176), demandavam que ambos os lados fossem capazes de “transcender os confins de suas culturas alcançando um solo comum, ou transitando, [...] indo e vindo entre as superfícies em que se fixavam”. Se definindo como “o lugar onde as culturas dialogam”, o quai Branly foi constituído como instituição-agente pela democratização das estéticas extraeuropeias. 2

A noção de “situação” não corresponde aqui àquela proveniente da filosofia existencial. Ela se refere, como explica Balandier, à noção encontrada em autores das ciências sociais como H. Wallon que utilizou a expressão “situação colonial”, ou como em G. Gurvitch, sob o nome de “conjuntura social particular”, ou mesmo na noção de “fenômeno social total” (ou fato social total) na obra de Marcel Mauss. Ibidem, p.38. xxv

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É a partir da disseminação, na França, do pensamento de Claude Lévi-Strauss, que muitos autores apontam o marco de uma revolução intelectual para a antropologia, quando é inaugurado o estruturalismo3. É impossível deixar de destacar que neste ponto da história dos museus etnográficos, estes têm o seu desenvolvimento marcado pela trajetória particular de Lévi-Strauss. Ao reformular o pensamento antropológico de sua época, ele acaba por gerar, indiretamente, uma restauração definidora da prática museográfica, se tornando, ele mesmo, um agente da cadeia museológica francesa. Um projeto museológico singular do final do século XX seria responsável por desencadear um amplo processo de reflexão. A ideia do colecionador e marchand Jacques Kerchache4 (1942-2001), de criar um novo museu dedicado às artes primitivas, obedecendo a um modelo de museu de arte já estabelecido na França, seduziu o presidente francês Jacques Chirac (1932- ) que fez deste projeto, desde 1995, uma das maiores realizações de sua presidência. Segundo Chirac, a quem foi atribuído o epíteto de “advogado dos esquecidos”5, a instituição inteiramente dedicada às artes e às civilizações da África, Ásia, Oceania e Américas nasce de uma vontade política de “fazer justiça às culturas ditas extraeuropeias” (CHIRAC, 2007), reconhecendo o lugar que estas ocupam na herança cultural da Europa. Contudo, a crítica da maior parte dos especialistas diz respeito ao fato de o universalismo pretendido por Chirac se aplicar apenas às culturas desaparecidas ou situadas fora da história, e de todo modo sem relação de nenhum tipo com aquelas do presente6. O Outro não é bom para se pensar, nessa perspectiva eminentemente levistraussiana, se ele não for percebido como selvagem, como primitivo, objeto distante. Neste sentido, pode-se observar uma confusão de épocas nas exposições que se define marcadamente no seio do Musée du quai Branly através do uso da Austrália como continente primeiro da arte, mas onde objetos vistos como primitivos podem ser colocados ao lado de obras de arte contemporânea (aqui definida pela contradição de uma arte atual vista como primitiva). A negação da contemporaneidade está, assim, no princípio do funcionamento do museu porque a desativação dos ícones da arte tribal é o que torna a 3

Cf. DOSSE, François. Le moment ethnologique dans la culture française. Le débat - Histoire, politique, société. n. 147, nov.-déc., p.100-111. Gallimard, 2007. p.100. 4 Galerista e amante das artes primitivas, Kerchache realizou numerosas viagens de estudos entre os anos 1958 e 1980, na África, na Ásia, nas Américas e na Oceania, tendo produzido um inventário crítico de grandes coleções de esculturas. A partir de 1960 ele abre uma galeria de Belas Artes em Paris, na qual iria expor desde arte contemporânea às artes primitivas. Neste período ele conheceria André Breton, que exerceu grande influência sobre o seu pensamento e as suas práticas. A partir dos anos 1970 ele participaria de diversas exposições importantes no mundo, como curador, especialista ou consultor. 5 “L’avocat des oubliés”, como se referiu a ele François Fillon, em homenagem à Chirac, em novembro de 2011. Le Figaro, 24 de novembro de 2011. Disponível em: . Acesso em: 23 de dezembro de 2011. 6 Cf. AMSELLE, Jean-Loup. Rétrovolutions. Essais sur les primitivismes contemporains. Paris : Éditions Stock, 2010. p.62. xxvi

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alteridade consumível pelas elites de forma ampla, o que explica a conquista de um vasto público pela instituição nos últimos oito anos. Como é celebrado pelo diretor da instituição, Stéphane Martin, o Musée du quai Branly está hoje, após seus primeiros anos de existência, entre as quatro instituições culturais mais visitadas de Paris, com cerca de 1,35 milhão de entradas a cada ano (MARTIN, 2011, p.8). Este feito expressa o sucesso da universalização das artes primeiras no cenário cultural francês, fazendo com que os objetos coletados nas colônias sejam vistos atualmente por um público mais amplo do que aquele que frequentava as galerias do Musée de l’Homme no passado. Assim, ao fugir da perspectiva cientificista sobre os objetos, o novo museu induz o seu público a desenvolver um olhar sobre as obras expostas que não se limita à mera visão das peças, mas que é balizado por uma imaginação estética sobre elas. A criação deste museu significou, pois, a consequência mais evidente da transformação pela qual passaram os museus etnográficos no final do século XX. LéviStrauss, testemunho do desenvolvimento desses museus ao longo de sua carreira e ator privilegiado dessas transformações, faz um convite à reflexão acerca das diferenças entre o projeto do Musée du quai Branly e o Musée de l’Homme. Tendo, desde “Race et Histoire”7 na década de 1950, estabelecido que uma cultura só pode ser considerada Outra “em relação a uma segunda que lhe faz espelho, através de uma relação de diferenciação e reflexo” (LÉVI-STRAUSS, 1952), Lévi-Strauss iria se colocar contra a representação dos povos de culturas diferentes da europeia como uma realidade etnográfica em si mesma, isto porque, segundo ele, “um museu etnográfico não podia mais, como em sua época, oferecer uma imagem autêntica da vida das sociedades as mais diferentes da nossa” (LÉVISTRAUSS, 1996). A partir desta afirmação ele iria autorizar os procedimentos da cadeia museológica colocada em prática em nome do projeto de um museu para as artes primeiras. O que dá a coerência ao Musée du quai Branly não é, como era o caso do Musée de l’Homme, uma utopia intelectual enraizada na conjuntura política dos anos 1930, mas sim uma noção que estaria mais próxima da ordem dos mitos, a de que a ideia de “Artes primeiras” permite conciliar exigências contraditórias (L’ESTOILE, 2007, p.251). O lugar da imaginação está reservado neste museu dos Outros: as sombras, o mistério e o jardim planejado para produzir distâncias simbólicas autorizam ao público compor a sua própria imagem idealizada da viagem ao universo que se pretende desconhecido. Diante de uma crise do olhar, os museus etnográficos, que já haviam perdido o monopólio da etnografia, passam a questionar o seu papel, e os grandes museus etnográficos franceses são levados a repensar a sua função. Aqui vale lembrar que, se na 7

“Raça e História”. xxvii

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França o lugar consagrado da etnologia durante a maior parte do século XX eram os museus, no resto do mundo o processo de legitimação desta disciplina escapava à cadeia museológica desde o final do século XIX8. Na medida em que o exótico se torna cada vez mais familiar, são postas em prática formas extremas de se experienciar as diferenças. A ‘viagem no ser’, ao invés da ‘viagem do ser’ é preferida. Busca-se mais a proximidade com si mesmo – e com as próprias sensações – do que o encontro com um Outro distanciado.

A vida dos objetos e a vida de um museu O museu é um fluxo de coisas, e esta pode parecer uma afirmativa desafiadora, porque denota a natureza transitória de nossa própria realidade social. Um museu – como uma coisa social, em si mesmo – pode ser pensado e desconstruído de maneiras variadas, através de diferentes arranjos. Aqui foi escolhido entender os museus de acordo com o conjunto de suas práticas expressas em uma cadeia museológica que é produtora de enunciados e de valores nas sociedades, e não meramente a partir da representação idealizada que, algumas vezes, fazemos deles. No caminho inicial em direção ao platô das coleções9, espaço onde estão expostas as coleções permanentes de objetos da África, Ásia, Oceania e Américas, no Musée du quai Branly, somos levados a confrontar as nossas próprias expectativas sobre o que está por vir. Uma longa rampa curvilínea conduz o visitante ao coração do museu, o prelúdio da ‘viagem’ proposta, onde os quatro continentes ‘extraeuropeus’ se encontram em um mesmo discurso e em uma só performance. A grande rampa dá ao visitante a oportunidade de refletir; ao mesmo tempo em que ela é simplesmente o meio para se chegar às coleções, ela seduz o público, e envolve a percepção e os sentidos. Isto acontece porque ao longo da vasta extensão percorrida por aqueles que decidem embarcar nesta viagem museal, foi colocada, a partir do ano de 2010, uma instalação do artista escocês Charles Sandison, encomendada pelo museu para ocupar este espaço, onde antes eram projetadas imagens pontuais sobre as populações representadas 8

A razão para a especificidade da etnologia francesa é, para alguns autores, o fato de a antropologia física, ligada aos museus de história natural, ter mantido certa primazia no quadro das ciências até as décadas de 1920 e 1930, quando seria criado o Musée de l’Homme. Por muito tempo perdurou uma rivalidade no cenário intelectual francês, entre esta antropologia física, por um lado, que lidava com fatos mesuráveis e portanto estava mais próxima de ser reconhecida como ciência, e a etnografia mais “amadora”, ou a descrição das culturas, por outro, que precisou ‘criar’ os seus testemunhos, através dos objetos etnográficos nos novos museus. CONKLIN, Alice L. Civil Society, science, and empire in late republican France: the foundation of Paris's Museum of Man. Osiris, 2nd Series, Vol. 17, Science and Civil Society (2002). p.262. 9 Denominação dada pelo museu, em francês, ‘plateau des collections’. xxviii

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em uma outra instalação artístico-etnográfica10. A obra de arte contemporânea que leva o nome de “La Rivière” contém em si a intenção explícita de convidar o público a uma “viagem no tempo e no espaço, nos imaginários dos povos não europeus” 11. Ao subir a rampa o visitante é, a cada passo, envolvido no fluxo do rio de palavras retiradas da exposição de longa duração do museu, projetadas de modo a fazer da distância (física), entre a entrada do museu e as suas coleções, um caminho a ser interpretado. Se compõe neste processo uma nova noção do objeto etnográfico12, construído e reconstruído no olhar distanciado, que a todo tempo ‘faz acreditar’ numa autenticidade inventada ao provocar a imaginação. Está posta uma contradição aparente neste projeto, e ela é uma das chaves para se entender a noção do autêntico nos museus etnográficos: se por um lado, o conceito de obra de arte está em grande parte ligado à noção do único e do objeto insubstituível, por outro, contrariamente, o objeto etnográfico deve ser da ordem do comum – ou, ao menos, é o que prescreviam os manuais de etnografia destinados a servir de base para as missões etnográficas que compuseram historicamente as coleções do Musée de l’Homme, que figuram hoje nas vitrines do quai Branly. A questão da autenticidade de obras de arte para as ciências sociais remete recorrentemente à longa discussão que opõe a ciência ao prazer estético. A partir da suposição disseminada segundo a qual a análise científica poderia destruir a especificidade da obra de arte e a sua contemplação (BOURDIEU, 1998, p.10), tem-se colocado como um grande desafio o de se pensar objetos etnográficos como arte. Este, desproblematizado nos olhos de colecionadores e marchands, foi foco de críticas incisivas a partir do momento em que o projeto do Musée du quai Branly passou a ser divulgado e, mais ainda quando o museu abriu as suas portas em 2006. Tendo adotado a linguagem artística como a principal via de comunicação para tratar de objetos etnográficos, o museu das ‘artes primitivas’ ou ‘primeiras’ deu início a um grande campo de debates colocando em prática uma tentativa explícita e eloquente de se ‘descolonizar’ coleções através da arte.

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Entre junho de 2006 e junho de 2009 a rampa do museu era ocupada pela obra intitulada “L’Autre marche” (“A outra caminhada”), instalação assinada por Trinh T. Minh-ha et Jean-Paul Bourdier que tinha a intenção de marcar ‘a passagem do Outro em Si’, evocando por meio de imagens projetadas no chão a concepção asiática de que o caminhar sobre a terra é algo sagrado. Esta foi substituída por “La Rivière”, que passou a ser exposta a partir de março de 2010. 11 Texto explicativo sobre a obra “La Rivière” no Musée du quai Branly. 12 Na época em que escreveu o seu “Manuel d’ethnographie”, Marcel Mauss afirma, nos “comentários preliminares”, que a etnografia comparada só terá algum efeito de valor se ela “se fundar sobre comparações de fatos e não de culturas”. A principal fonte para estas comparações era o objeto etnográfico coletado pelos etnógrafos no campo, de acordo com os critérios prescritos por pensadores como Mauss e Marcel Griaule. MAUSS, Marcel. Manuel d’ethnographie. Paris : Éditions Payot, 2002. p.21. xxix

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A afirmação da irredutibilidade da obra de arte, que supostamente a impede de ser explicada pela ciência, se justificaria no fato de esta escapar indefinidamente a qualquer forma de explicação (GADAMER, 1991, p.197 apud BOURDIEU, 1998, p.10). Todavia, se considerarmos, como o faz Bourdieu (1998, p.15), que o amor sensível pela obra de arte pode se realizar através de um tipo de “amor intellectualis rei”, como uma forma de assimilação do objeto ao sujeito e de imersão do sujeito no objeto, de modo que um se vê submetido ao outro pelos sentidos e também pela mente, então, pode-se pensar que a análise científica das condições sociais da produção e da recepção da obra de arte, ao contrário de reduzi-la ou de destruí-la, pode servir para intensificar a sua experiência. Assim, chega-se a uma antes improvável acepção da ciência como meio através do qual se poderia compreender a obra de arte, ou, ao menos, compreender a sua adoração. A partir de uma perspectiva recentemente disseminada, a arte não vem mais sendo percebida como o ponto de partida do questionamento da sociologia da arte, passando a ser vista como o seu ponto de chegada (HEINICH, 2008, p.28). O que é colocado agora no primeiro plano das pesquisas não é algo interior à arte (abordagem tradicional centrada nas obras), nem exterior a ela (abordagem socializante centrada nos contextos). O que interessa é, na verdade, o que produz a obra de arte e o que é produzido por ela. Isto quer dizer que a obra passa a ser percebida como qualquer outro elemento de uma sociedade. Assim, a sociologia – particularmente a francesa e a americana – vai considerar não mais a arte e a sociedade, nem a arte na sociedade, mas a arte como sociedade, interessando-se pelo funcionamento do meio em que se formam a arte, seus autores, suas interações, sua estrutura interna. O que significa dizer que ela não concede mais um privilégio de princípio às obras selecionadas pela história da arte, mas que volta-se, segundo esta corrente, igualmente para os processos dos quais elas são a causa ou a resultante. Isto quer dizer, ainda, que qualquer obra é digna de ser estudada como arte, se assim for considerada. A análise sociológica, então, engendra uma epistemologia da experiência artística. Antes da rampa há uma longa história guardada nas sombras pelo Musée du quai Branly, mas que se faz presente subterraneamente no interior de suas paredes mais ou menos permeáveis. Diante do hall de entrada do museu, não se pode deixar de notar a presença de uma figura que é tão enigmática quanto reveladora. A escultura em questão é a cabeça moai, de 1,85 m de altura e 1,40 m de largura, esculpida em rocha vulcânica, proveniente da ilha de Páscoa, no oceano Pacífico. Não é simplesmente pela imponência de sua forma que ela ocupa lugar de destaque na entrada do quai Branly. Para o olhar desapercebido, esta é apenas mais uma das “chefs-d’œuvre” exibidas no museu, mas, para qualquer conhecedor da história dos museus etnográficos da França, aquele fora um emblema de outro momento relevante no desenvolvimento da etnologia francesa. xxx

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A escultura moai, que pertencera à antiga coleção do Laboratório de Geologia do Muséum national d’histoire naturelle, foi, no passado, eleita para figurar na entrada do Musée d’Ethnographie du Trocadéro, a partir do momento de sua reabertura, após este ter sido reformulado, em 1930. A sua presença no quai Branly, antes do embarque, na rampa sinuosa, à viagem proposta no platô das coleções, chama a atenção para o fato de que aquele espaço guarda – nos bastidores de sua performance – a história dos museus etnográficos da França. Ela evoca, com a sua presença, diretamente uma genealogia de projetos de museus que antecederam o Musée du quai Branly. Esta profundidade histórica é característica da coleção do museu, que constitui uma das coleções etnográficas formada por alguns dos objetos mais antigos reunidos na Europa. A coleção do quai Branly13 é o resultado de uma vasta história de coleta que compusera progressivamente os acervos do Musée de l’Homme e do Musée national des Arts d’Afrique et d’Océanie (MNAAO)14. Ela apresenta, entre as peças mais antigas, objetos provenientes dos gabinetes de curiosidades dos reis da França e da aristocracia. Entre eles figuram na coleção, por exemplo, peças Tupinambá, vindas do Brasil, cuja entrada na França data do século XVI, o que se confirma pelos arquivos do museu, provavelmente das décadas de 1550 e 1560, e estas correspondem às tentativas dos franceses de se instalar no Brasil neste período. Logo, trata-se de uma coleção que possui objetos cuja coleta data de mais de 400 anos, contendo um vasto acervo que poderia contar a história da própria coleta etnográfica, a partir do século XIX. Estes foram fruto dos exploradores e aventureiros, e depois dos cientistas e etnólogos, incluindo desde objetos importantes da missão francesa à Groelândia, na década de 1930, até coleções famosas e “espetaculares”15 – como as define o conservador do quai Branly, André Delpuech – como as que pertenceram a Claude LéviStrauss ou a André Breton.

A arte como linguagem 13

A coleção do museu, no período em que esta pesquisa foi realizada, compreende um total de 267.417 objetos, sendo 236.509 objetos proveniente do laboratório de etnologia do Musée de l’Homme, e 22.740 do antigo MNAAO. Desde 1998 até 2012 o museu adquiriu 8.168 objetos a esta coleção. Do total de objetos, 3.600 são expostos. Informações consultadas no site do Musée du quai Branly. Disponíveis em: . Acesso em: 8 de outubro de 2012. 14 Originalmente criado na ocasião da exposição colonial de 1931 como ‘museu permanente das colônias’, este foi renomeado em 1935 como museu da França do além-mar (Musée de la France d’Outre-mer), e, depois, novamente por André Malraux, em 1960, quando recebeu o nome de museu das artes da África e da Oceania. Em 1990 ele passa a pertencer aos departamentos dos museus da França, e se torna o museu nacional das artes da África e Oceania. Após perder a sua coleção para o Musée du quai Branly, ele deixa de existir no Palais de la Porte Dorée, onde havia sido criado, dando lugar à Cité nationale de l’histoire de l’immigration (Cidade nacional da história da imigração), inaugurada em 2007. Do museu anterior restou apenas o seu antigo “aquarium tropical” que figurava na exposição e ainda pode ser visitado pelo público. 15 DELPUECH, André. Comunicação pessoal. Musée du quai Branly, Paris, 13 de dezembro de 2011. xxxi

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A linguagem da arte permite ao Musée du quai Branly associar mundos distantes, amalgamar culturas que antes haviam sido separadas pela etnologia e pelas salas e vitrines dos museus etnográficos ditos clássicos. Se no Musée d’Ethnographie, bem como no Musée de l’Homme, a arte estava incorporada à etnografia, sendo estes museus de etnografia também fontes de inspiração para os artistas, ao contrário, no Musée du quai Branly a lógica é inversa: é a etnografia que está incorporada na arte, caracterizando um museu de arte que pode servir de centro de pesquisa para etnógrafos. Servindo simultaneamente à arte e à etnologia, o quai Branly se apresenta como plataforma se permitindo ser usado por diversos agentes. O museu-plataforma é visto como centro de gravidade para abordagens distintas (ainda que controladas) e variadas experiências sobre o patrimônio musealizado. Por outro lado, assim como a arte torna possível experiências diversas, é preciso constatar que a arte também exclui. Como uma linguagem dominante, a linguagem artística nos museus europeus – como já demonstraram Bourdieu e Darbel (2011 [1969], p.104) – opera como uma ferramenta de distinção. Segundo os autores, partindo do fato de que a obra de arte se apresenta como uma individualidade concreta que não permite jamais que se deduzam os princípios e as regras que definem um estilo, a aquisição dos instrumentos que tornam possível a familiaridade com a linguagem artística só se opera por meio de um longo processo de familiarização, que atravessa a educação. A “ilusão do gosto puro e desinteressado”, que não depende senão de uma subjetividade e que não tem por finalidade senão o deleite, é revelada pela correlação das práticas estéticas com a pertença social e os “hábitos sociais do gosto”, a “distinção” pela posse de “bens simbólicos” (educação, competência, linguística ou estética) (HEINICH, 2008, p.73). Neste sentido, o Musée du quai Branly é um museu voltado para a elite francesa reificar o seu ‘gosto’ por um gênero de arte que agora encontra o seu espaço de legitimação e de permanência. Para os ingênuos, os leigos ou os não introduzidos às “artes primeiras”, resta apenas o espaço para a imaginação pura, por vezes transitória e pouco significativa – que já é bastante, se esta não tivesse direcionada para a imaginação dos ‘Outros’ como ‘selvagens’ relegados ao ‘fim do mundo’16. Assim, Bourdieu (2009, p.14) chama a atenção para o fato de que as relações de comunicação, que são por excelência relações de trocas linguísticas, são também relações de poder simbólico, que excluem ou incluem pessoas em determinados processos sociais, gerando uma hierarquização do mundo social. Se o gosto pelo belo é o resultado de uma racionalização, de uma emoção suscitada pela decifração da arte como arte (isto é, uma inteligibilidade da arte), então, para os não iniciados, a

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O “but du monde” como uma ilusão de grande representatividade na cultura francesa, desde nos museus até na televisão. xxxii

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experiência será exclusivamente sensorial, correndo o risco, no caso do quai Branly, de se basear nos estereótipos do senso comum. Por fim, o objeto no museu se encontra duplamente qualificado já que este não pode ser definido somente como museu de arte, ou como museu de ciência ou de etnografia. Este é um museu etnográfico, que está baseado na etnografia para assegurar a ‘justiça’ da entrada de um objeto na cadeia museológica, mas que recorre, por outro lado, à arte para que estes mesmos objetos estejam ‘ajustados’ entre si mesmos e em relação ao olhar do observador contemporâneo – que já não busca a fidelidade da ciência, mas que se atrai, em grande medida, por uma beleza familiar das peças ‘exóticas’.

A arte como experiência A partir do momento em que o próprio trabalho etnográfico passa a ser visto como subjetivo e a experiência do etnógrafo como impossível de ser representada por objetos, deixa de existir uma hierarquia de valores entre o objeto de arte e o objeto etnográfico, isto é, um não é mais legítimo do que o outro, já que as duas categorias se referem a distintas formas de se imaginar a diferença. O que existe, de fato, são situações ou encontros em que o espectador pode experimentar o autêntico a partir do contato com uma obra. A museologia da apresentação, das técnicas expositivas, vem, de um certo modo, relativizando o valor do original e chamando a atenção para seus substitutos – virtuais, materiais, falsificações das mais diversas naturezas – de modo que o objeto musealizado é muito mais apresentação e discurso do que matéria autêntica. Esta face da autenticidade nos museus diz respeito a um efeito sensório-motor que, segundo Bernad Deloche (2002, p.48), envolve o visitante em uma experiência sensível. A partir de um olhar que toca as coisas corporalmente, o observador é conduzido a percorrer com os olhos o objeto exposto, explorando “a tensão entre verticalidade e horizontalidade, o jogo dos oblíquos, etc.” Assim, diante da Victoire de Samothrace, no Musée du Louvre, o olhar do visitante “se eleva a partir da base da escultura seguindo o movimento de torção que o enlaça até as asas”. Esta experiência sugere e induz o deslocamento físico do visitante no espaço do museu. Mas Deloche garante que a experiência estética não para aí, uma vez que ela suscita um leque de variadas imagens, “um verdadeiro delírio na consciência do visitante”. E, então, o espectador pode perfeitamente imaginar a escultura sobre a proa de um navio ou em um jardim, e estas imagens se sobrepõem umas às outras, de maneira puramente sensível até uma percepção racional. As pesquisas e entrevistas realizadas por Brigitte Derlon e Monique Jeudy-Ballini (2008) com colecionadores das artes primeiras revelaram que o sentimento que desperta xxxiii

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uma obra em exposição não depende necessariamente de sua autenticidade, mas da percepção de que ela seja autêntica. No caso das artes primeiras, a emoção diante do objeto – qualificada como estética – é aquela suscitada pelos objetos através de sua percepção sensível, mobilizada sobretudo pela visão, o toque e o odor (DERLON & JEUDYBALLINI, 2008, p.54), isto é, a simples consciência de sua presença. Tal emoção é considerada primeira porque, antes de qualquer racionalização, ela opera sensivelmente no sujeito confrontado com o objeto, dando a alguns o sentimento de se estar sendo re-enviado à experiência de uma relação primordial com o mundo (DERLON & JEUDY-BALLINI, 2008, p.56). Os objetos, assim, são portadores de mundos imaginados, e a sua ‘verdade’ depende tanto da sua capacidade de evocar estes mundos como da capacidade do observador de imaginá-los. Nesse sentido, o segredo ‘guardado’ nos objetos pode produzir um efeito de coisa sagrada no observador – efeito este que é possível de ser evocado através da arte. Constituído, notadamente, de tudo o que se pode ignorar a seu respeito, a parte secreta do objeto também é feita daquilo que o seu detentor (ou o observador, nos museus) imagina da sua função primeira, religiosa de preferência, que faz dele um mediador com o intangível. Portanto, ao abolir os contextos na apresentação dos objetos, o Musée du quai Branly abre espaço para a imaginação e a criação produzindo novas conexões com coleções já conhecidas do público; como resultado desta abordagem, no caso deste museu, aquilo que é imaginação pode ser naturalizado como realidade. Diferentemente da maioria das experiências intelectuais, a experiência artística será de tipo afetivo, mas ela não implicará na abolição dos sujeitos nesse encontro com o objeto, já que não se trata de uma experiência meramente contemplativa, mas de uma resposta ao contato com a arte. O objeto, pois, não é estritamente uma coisa: no museu-teatro, ele pode se tornar uma realidade mascarada, presa à sua definição material restrita. Dito de outro modo, é a vontade de se conhecer o que está por detrás do objeto (que não equivale a uma busca real por esse conhecimento) que nutre um laço místico que o observador pode estabelecer com ele. Se, por sua vez, o conhecimento do contexto original do objeto pode ser, eventualmente, prejudicial à experiência estética, a razão não é a da sua incompatibilidade com o distanciamento necessário do espectador, mas, inversamente, o fato de ele se opor ao “investimento fantasmático do colecionador” (DERLON & JEUDYBALLINI, 2008, p.100) ou do visitante de um museu. É preciso o desconhecimento para se poder imaginar e sonhar. A experiência estética, assim, contém em si um paradoxo, sendo ela também uma experiência cognitiva que requer a falta de conhecimento como premissa. Ela se beneficia do espaço existente entre o cognitivo e o emotivo para se tornar em si um modo de conhecimento. Ela é uma experiência simultaneamente afetiva e analítica. Ao xxxiv

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mesmo tempo em que as artes primeiras demandam uma liberdade cognitiva, muitas vezes, algum conhecimento sobre a obra pode ser necessário para dar asas à imaginação. Neste sentido, existiria uma congruência entre o conhecimento estético intuitivo de um objeto e a sua significação anterior de tipo etnológico. Contrariando uma ideia da universalização da experiência artística, no campo estabelecido a partir da interação entre aquele que percebe e aquele que é percebido, a compreensão da obra suporia “a capacidade de se deixar afetar por ela”, instantaneamente e de modo evidente, então a experiência estética das artes primeiras não estaria completamente livre de um tipo de condicionamento social como pensaram inicialmente os surrealistas. Com efeito, o que não consideraram aqueles que inventaram o quai Branly é que para se permitir ‘tocar’ pelas obras é preciso pertencer a uma categoria específica que está predisposta a desenvolver um certo imaginário sobre elas. O problema de ter a emoção suscitada pelo belo como critério, uma vez que o museu segue os critérios estabelecidos por colecionadores, é o de que, no caso destes últimos, o valor subjetivo atribuído aos objetos depende estritamente da intensidade que os artefatos liberam em cada pessoa (DERLON & JEUDY-BALLINI, 2008, p.56). Se uma hierarquia das artes primeiras é traçada com base nas emoções de cada um, como atestam os colecionadores privados, como adotar os mesmos critérios do mercado (variantes e arbitrários), em um museu nacional? Ao inventar um novo estatuto para o objeto etnográfico, o de obra de arte, a museologia do quai Branly produz uma nova concepção da autenticidade. Nela as diferentes formas de autentificação podem ser cruzadas e combinadas de maneira irrestrita. Com efeito, a noção de autenticidade está totalmente ligada à ideia de origem. Mas a origem, em si, no caso das artes, pode se fazer presente na repetição, na falsificação, e tem mais a ver com a experiência de uma origem presumida do que de uma continuidade real. A presente fala teve como objetivo não o de buscar uma definição para o ‘autêntico’, mas sim o de investigar como por meio de que conexões com o real este vem sendo encenado no Musée du quai Branly atualmente.

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WHEN NO COLLECTION MAKES CONNECTION

Dr. Damon Monzavi1

The theme of ICOM for 2014 is: collections make connections. But the question is that, Do we need a huge collections to make connections? Can we make connection by educational program or non-collection- oriented vision? This article try

to establishing a sustaining

mechanism by which Unifal can preserve, and present the history of university which can foster greater communication and meaningful collaboration in the coming years, not only with the students but also with people of the city. The physical appearance of the museum is historical. It is located in city center. Besides exhibitions, science concept is crucial for educational activities. The history of Unifal is not only the past. It is also present and future. Today is history of tomorrow. People make the history of museum by their works and activities every day. Museum of the Unifal could focus on the history, artefacts, and documents of the history of the university but can also providing learning experiences about the development of the university and its program. Its objectives are to engage the public in alfenas themselves, to provide the means and knowledge - through public programs and exhibits - with which the public might learn about the past and the future of university. The paper will consider the Museum as the anchor development in the city’s cultural renaissance acting as an agent of economic regeneration, social change and community empowerment through presenting both past histories as well as present issues and debates in a rapidly changing city and effect of university on city. The Museum has a pivotal role to play in explaining and presenting the city’s uniquely diverse and ever-changing character and to provide a platform for citizens to express themselves, their city and their issues within the museum. Our mission is to provide our audiences an understanding of the physical place of the university, their city and their multifaceted heritages as university is also part of city heritages. If we succeed in achieving this vision and advancing our missions we will become centers of 1

Gemstone Museum of Drayay-e-nour, Iran, Tehran.

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learning that build bridges of understanding between peoples and breaking down barriers between university and people, as ICOM 2005 theme also was. Unifal museum can make integration with society. It can play social rules in society. As, Luiz Antonio Bolcato Custodio, the Chair of ICOM Brazil, wrote “Museums are – or should be – mirrors of society, its development and culture, both past and present. And what other social institution, if not museums, can properly fulfill this reflective role between groups and cultures? They can make connections with locals and community. Unifal can build bridges- between professionals, communities and their cultures. Demographers estimate today 47% of the world’s population live in cities. Since 1928 the population of the world’s cities has increased tenfold, from 360 million to more than 3 billion. Half of this growth has occurred since 1970. It is not an exaggeration to declare that the urbanization of the earth's population has been the most consequential phenomenon of the past century. The migration from the countryside to metropolises continues at a rapid pace as does the immigration of diverse people across political boundaries into cities. The United Nations estimates that 75,000 individuals move from rural areas and across national borders into urban centers daily. There are students from different cities, villages, different countries of origin, different believes, different traditions and religious in Unifal. These people are part of history of university. Museums are having hard times to compete with all other ways of amusement. So the number of visitors is decreasing. Imagine the museum in local places with mostly local visitors like alfenas. New approaches are needed that have to be sophisticated enough to adequately meet quality standards of these institutions, but also attractive for the masses at the same time. We will survey different aspect of non-object- oriented strategies of museums around the world for Unifal.

Children: Our project can aim at one of our long-term preventive conservation strategies with emphasis on children. Concentrating on children is the right approach to make the coming generations more responsible for our cultural heritage. Starting with theoretical lessons would not make children interested at all. So we chose a practical approach. Children become familiar with technologies which student in university learning. Also museum will participate children in simple exam of how technologies and sciences work. xxxviii

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Mathematics lab: Colorful Mathematic world is one of the science education activates of the museum. The activity which is held for groups, aims to contribute to children in enjoying mathematics and sciences, is held in museum hands-on gallery. The experiment and puzzle sets can design to be useful for families to enjoy all together. These activities will be organize by students related to this area from university. It is possible to have different kind of labs as: Chemistry lab, biology lab, physic labs, pharmacy lab.

Science and technology workshops: Another educational activity, which could specifically designed in the concept of science, is Science and technology workshops. In this workshops, experiments from university of alfenas sets, help to teach children about science and technology and about what they will learn in university in future, Children do experiments in this workshops.

Educational packs: Science concept can also see in the content of education packs and projects of the Museum. Education packs are designed also for primary and kindergarten school children. Within the primary school pack which is developed for science and mathematics lessons in the schools besides social studies, language, and painting lessons, objects are used as Tools to explain the topics of sound and light; mechanical force and motion. Children can experience the chemistry lesson and physics in museum while very exciting music which has collected will play to effect on their excitement which cause more urge of learning. Kindergarten schools children experience the science which only they can sense it in university. Experts will invite as guests to some of these workshops. These experts are students and they will conclude even if they are educated: how their education help them or if not what kind of experience they have and how they can learn it in university.

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History and weaponry: Another project that museum will do for both students of school and university is designing and re making the ancient weapon and clothes to students feel the history by their own hand their own brain and heart. The advantages of this project is not only that the connection with audiences but also is that the material which will be built can add to collection of the museum and make more connection with more people and the family of producers also.

Children exhibitions: After participating in museums labs or workshops, children will be asked to draw a painting or making what they learned during the visit. These material of children will collect and will exhibits later. This presents a solid basis for a positive attitude of coming generations towards museums and our cultural heritage.

Web: The World Wide Web has emerged as a powerful communications medium. With the development of new technologies, organizational websites are getting bigger and more complex, using design elements such as sound and motion to engage users’ attention. So, how users respond to the ways designers and developers present information on the museum web in a dynamic form which incorporates sound and motion. We will focuses on evaluating the communicative effectiveness of museum website to see if certain ways of presenting dynamic content are more effective than others. The method will use consisted of observing users while they try to accomplish specific tasks.

Private collections: In the last decade, an increase in the number of private and local collections and exhibitions has been noted, which is certainly a reflection of broader socio-political changes. A large part of movable cultural heritage is preserved and presented within non-institutional gatherings. We can make cooperation between museum lovers and collectors and the field of profession related to university of alfenas. There are many ways that people who has collections related to university history can participate in an exhibition. We should let people to involve with xl

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university especially retired professors and students of previous years. Although museum of Unifal is about history of museum but this museum can promote museum lover more and join more people to museum. Inviting people who has insect collection, stamps, money and other things to exhibit in Unifal museum and use the knowledge of student or teacher of university as expert to develop more information about these collections. It can give more identity to audiences to make better feeling and also a great chance for student to practice what they learned.

Student’s activities: One of the exhibition we can do in alfenas is exhibition of exploration of students. It could be as insect, grass, flower, stones and other things around the alfenas and Brazil or any kind of objects related to universities lessons. Unifal can exhibit all student collection with their names What are the benefit of these exhibitions? 1- Student get more interested in science and educational program, even as much as they work they will get more involve and try to understand and learn more about the objects they collect. 2- They will receive more identity between their friends, families and society. 3- The connection between museum and student get tidier. 4- Many collections will gather. Managing and organizing them with students could be possible. Students get more involve in museum sciences and could be good members even in future after graduation. 5- The collections could be a source for research for university and researchers. 6- The collection of nature objects can cause a directory of state and town and more identity not only to university but also to town. 7- Students will have a practical background for their future. 8- The collection can contain spices of insect or plants which they are new or first time in Brazil or the state. Because always new insect can find anywhere, these new spices could be a good source for further research or uses by researchers and agricultural centers.

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Membership and Patronage: How we deals with building a large, diverse audience and have a supportive community. When we speak of community, we also are speaking of the major issue of converting single-time visitors to repeat visitors and then to members and patrons. Members are potential volunteers also student who graduate and it is possible staffing the museum with volunteers, students, retired persons; reproduction of museum artefacts in textbooks, magazines; reproduction of museum art on gifts, cards, T-shirts; exhibition exchange between 2 or more museums; inviting school groups, clubs, conventions to visit; photographers who use the museum as background can be done by help of members and volunteers.

Family day: It is possible to make a family day each month, kids will dress up in costumes; high school students will perform plays in the theater; students will perform music in small theaters; the place will fill with people doing many different things. Unifal can offer an exceptional sociable experience. Sociability is not surprising at museums since most museum visitors come in family or friendship groups.

Helping people to know around: Unifal Museum can offer more creative experiences as a category of learning experiences. Museum can help its visitors become creative. Science section can help visitors work with science experiments conducted by resident scientists and teachers. In Natural History section, visitors can work with curators on improving collections, their documentation and organization, or in exploring for new specimens. In history section, visitors can work with curators to explore historical landmarks which played a significant role in the development of neighborhoods and cities. Visitors can catalog their neighborhood’s development and its treasures, acting as archeologists who uncover major objects of the past.

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Media: Audiences does not just happen they will create -News doesn’t just happen, they are made, Media needs new stories from every day. Different program of Unifal can make different news for media and media can make connection between museum and people.

Connection between schools and university: Schools can participate in university classes to be introduce to the future education. Students of different branches can introduce their field for children who are interested in offers new kinds of thematic, practical and holistic activities

The memory of the museum competition: As Metropolitan art museum did a campaign. The Met launched the institutional Advertising campaign and Unifal can do same but different in alfenas. The campaign positioned about the memory student, teacher and people had in university or about university. All of these material can exhibits during a competition and later as a source for museum history by university people. Competition for students of universities is about the photos which they took by mobile or camera from university, classes or tour and any kind of paper which related to university can cause a good atmosphere in university and documenting the history of university for future.

Facebook and twitter On twitter and facebook people can shares their ideas about the museum. Unifal can make competition also on twitter some of these questions can be about the museum visitors’ experiences about science. The people who will give the right answer or interesting answers are awarded with gifts from the museum store.

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Conclusion: Museum identity refers to science and history, independent and not referring to any museum subject directly. Brand identity of the museum is related to themes of culture and science history Museum will have an image which is inviting for educational environment for science. We will expect that schools aim to transfer the image of the museum to their corporate identity maybe on web, Facebook, twitter or mouth to mouth marketing. This means primary schools and kindergarten schools maybe will assume that museum image of Unifal is reputable for families. This can be defined as a potential for a museum to be a science and history museum brand. However museum history interpretations related to history of the Unifal but with educational program and activities of the museum will supporting the history of university. The communication with schools and families aim to bring students and teachers to the museum. A post visit process is important to create brand loyalty. Visitors can follow bulletin, social media after their visits but it is very optional. They will follow, if they are well motivated while they are in the museum if they use web and social media often or participate in museum program in future. So museum program should be on process to encourage people to participate and visit the museum again. Educational activities doesn’t have specific marketing and public relations activity which is important to reach children and families and to other people. Every activity must have a unique strategy. The history of the university is also the history of town the history of the students and teachers with different religious with different cultures and different tradition. Alfenas museum can collect the information about student about their past and their families. If museum has the related science like sociology or history branch students and professor can work on this subject in a room in museum with the name of tradition and culture room. This could give the university museum the opportunity to create understanding between different ethnic groups by showing the positive impact of cultural differences throughout history. Through a common knowledge of the University City’s history we can ensure a better understanding between different groups of the population as a basis for a better life for all city’s people.

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In this paper, student, professors and people of city are considered as tools and not just target of the museum communications strategies, in order to discover the student potential communication power. So museums can be social actors and engine of social changing process. Needs connected with intercultural, intergenerational, interethnic relations management. The new generations can do a lot to help Museum to play its role in facing this new challenge and developing its mission. So museums can use these potentials to improve themselves. It is not only collections make connections but there are many other factors which can be useful also making positive rule in Alfenas people life. To make appositive difference in the quality of people’s lives. One of this way is how parent get proud of the university which their children studied, study or will study there. By different way we mentioned Unifal can Plan. And innovative ideas. Providing the specific needs or wants of audience and meting them. The Alfenas museum can provides experimental, delightful, inoperative and informative sphere by educational programs and non-object- oriented vision by different ways mentioned in the paper. On the other hand, is it an opportunity for the museum to use this dynamic and enticing concept of science, which is subject to the museum education, for creating the museum brand and strengthening the museum connections with people.

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VI Semana Nacional de Museus na UNIFALMG / XII Semana Nacional de Museus

Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões Logomarca do ICOM para o Dia Internacional dos Museus 2014.

Universidade Federal de Alfenas, de 12 a 16 de maio de 2014.

DOCUMENTOS DE TRABALHO P. Helena Cunha Uzeda, Luciana Mota Gaspar, Marcia Luiz do Nascimento e Luis Otavio Raibolt Vidal Fernandes – Museu

Histórico da Cidade do Rio de Janeiro: Capacitação e Aprimoramento de Técnicos da Área Museológica

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Alexandre Cruz Leão e Agesilau Neiva Almada – A

utilização da luz visível e do ajuste cromático como procedimento para a documentação científica por imagem de bens culturais. Estudo de caso: um objeto cerâmico da coleção de arte popular do MHNJB-UFMG

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Claudio Umpierre Carlan – Museu e História: Coleção

Numismática do Museu Histórico Nacional. Um Patrimônio Brasileiro

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Cecília Szenkowicz Holtman – Ações Educativas no Museu

Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek em São José dos Pinhais, Paraná: Conexão com a Cidadania

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Luciana Menezes de Carvalho, Evandro Cassimiro de Moraes, Gilmara Aparecida de Carvalho, Lucimar Aparecida da Costa Benini e Rosalia Menezes de Carvalho - Museu de

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cada um, patrimônio de todos nós: brincando de construir

ideias sobre museus e patrimônios no Sul de Minas Gerais Walter Francisco Figueiredo Lowande - As coleções do

Museu Nacional no século XIX: patrimônio cultural e identidade nacional pela perspectiva dos naturalistas

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Álea Santos de Almeida e Adriana Olinto Ballesté – A

Construção Participativa do Museu Virtual de Instrumentos Musicais

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Mickaela Schwab Muniz - A Arqueologia como Ferramenta

Didática em Museus

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Bárbara Pereira Mançanares e Luiz Carlos Borges - Museu

Imaginado e suas zonas de contato – o caso da Festa do Divino Espírito Santo

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Camila dos Reis Silva e Luciana Menezes de Carvalho -

Museus interioranos e abordagens educacionais: considerações sobre possibilidades de conexões socioculturais entre instituições - o caso do Museu Carlota Pereira da Silva

Coleções Numismáticas: preservação da história por meio das cédulas, moedas e medalhas Luciano

Alves

Teixeira

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MUSEU HISTÓRICO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO: CAPACITAÇÃO E APRIMORAMENTO DE TÉCNICOS DA ÁREA MUSEOLÓGICA Helena Cunha de Uzeda1 Luciana Mota Gaspar2 Marcia Luiz do Nascimento3 Luis Otavio Raibolt Vidal Fernandes4

Resumo: Com a finalidade de atender a urgência da conferência do acervo do Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, a Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro concedeu bolsas de estágio com o objetivo de realizar a conferência das existências do Museu. Um convênio firmado entre a Secretaria Municipal de Cultura – SMC e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) possibilitou a realização do projeto. Orientados pela professora do curso de Museologia da Unirio Helena Uzeda e supervisionados pela Museóloga do Museu Marcia Nascimento, o trabalho proporcionou aos bolsistas a capacitação e o aprendizado das atividades básicas em higienização, acondicionamento, pesquisa, registro fotográfico e catalogação do acervo museológico, bibliográfico e arquivístico sob a guarda do Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro.

Palavras-chave: Museu Histórico, Treinamento prático, Conferência do acervo, Catalogação. Abstract: In order to meet the urgency of the collection conference's of the Historical Museum of the City of Rio de Janeiro, the Governance of Rio de Janeiro has awarded grants for internships with the objective of holding the conference of the museum existing stocks. An agreement signed between the Secretary of Culture (SMC) and the Federal University of the State of Rio de Janeiro (UNIRIO) enabled the realization of the project. Oriented by Professor of the course in Museology Helena Uzeda and supervised by Marcia Nascimento, museologist of the museum, the work provided to the fellows capacity building and learning the basic activities in conservation, packaging, research, photographic documentation and cataloging the museum, bibliographical and archival collections in the custody of the Historical Museum of the City of Rio de Janeiro.

Keywords: Historical Museum, Practical Training, Conference of the Collection, Cataloging.

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Coordenadora do projeto / UNIRIO. Gerente / Museu Histórico da Cidade. 3 Museóloga / Museu Histórico da Cidade. 4 Museólogo / Museu Histórico da Cidade. 2

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1. Características gerais e descrição breve do projeto Visando atender a urgência da conferência do acervo do Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e a Secretaria Municipal de Cultura da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (SMC) assinaram um convênio de cooperação técnica em 2011. O convênio visa oferecer treinamento prático complementar aos alunos do curso de Museologia/UNIRIO como parte do projeto desenvolvido pela gestão do Museu Histórico da Cidade (MHCRJ) “Conferência: levantamento das existências do Museu Histórico da Cidade”. A contrapartida da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO tem sido a supervisão da professora de museologia da Escola de Museologia da UNIRIO, além do fornecimento de transporte diário consistindo na ida para o MHCRJ e retorno dos alunos à UNIRIO, realizado sob a forma de três viagens ao dia, considerando a localização de difícil acesso do Museu. Inserido no parque natural da Gávea, uma Unidade de Conservação Municipal próximo às comunidades da Vila Parque e da Rocinha. O Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro (MHCRJ), foi criado em 1934 na administração do prefeito Pedro Ernesto. É uma instituição museológica, que guarda um acervo de aproximadamente 24.000 bens culturais que datam desde o século XVI. Seu acervo constitui-se de importantes registros do desenvolvimento social e urbano da Cidade do Rio de Janeiro, incluindo mobiliário, numismática, armaria, escultura, pintura, gravura, fotografias e documentos bibliográficos. Dentre os quais estão divididos em Acervo FUNARJ, pertencentes ao Governo do Estado do Rio de Janeiro e o Acervo pertencente à prefeitura do Rio de Janeiro. O projeto além de proporcionar a capacitação e o aprimoramento de graduandos em museologia, ele visa conferir o acervo localizado no Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro. Identificando seus objetos, as peças transferidas, “desaparecidas” e as possíveis baixas no acervo.

2. Desenvolvimento do projeto 2.1 Antecedentes (histórico do projeto) Diante da necessidade da conferência do acervo sob a guarda do Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, o convênio entre a Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, teve início efetivo em 2011 com dez estagiários. A museóloga Marcia Nascimento, que já conhecia a 2

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Instituição e seu acervo, e inteirada das exigências das tarefas a serem desenvolvidas, ficou responsável pela orientação dos estudantes de Museologia envolvidos no projeto, coordenado pela museóloga e professora do curso de Museologia da UNIRIO, Helena Uzeda. O objetivo era realizar, a pedido do Governo do Estado e da Prefeitura, a conferência do acervo sob a guarda do museu, verificando sua catalogação e suas numerações, a localização do acervo, higienizando as peças, quando necessário; digitalizando suas imagens fotograficamente, digitando novas fichas de catalogação, em substituição às antigas em papel;

conferindo

os dados principais dos objetos; acondicionando

adequadamente o acervo. Durante o ano de 2012, conseguiu-se cumprir um dos objetivos primordiais, que é a manutenção atualizada da documentação do acervo, o que permitirá futuramente que o público interessado tenha acesso aos dados do acervo para estudo e pesquisa. Os estagiários, reduzidos atualmente para sete, estão em fase de finalização do inventário, estando ocupados ainda com o processo de embalagem e transporte do acervo para cômodos seguros no interior da instituição para que seja possível iniciar as obras de restauração do prédio do Museu, prevista para o início de 2014. O projeto vem sendo executado por sete discentes da Escola de Museologia da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO, na condição de estagiários bolsistas da Secretaria Municipal de Cultura, conforme publicação no Diário Oficial do Município, sob a supervisão da museóloga Márcia Nascimento (COREM 0781-I) e a coordenação da museóloga Profa. Drª Helena Cunha de Uzeda (COREM 0538-I) da Escola de Museologia da UNIRIO. ◦

Marco teórico (referencial teórico)

Seguindo as orientações da nova Lei do Estágio (LEI Nº 11.788 DE 25/09/2008), segundo a qual: § 1º O estágio faz parte do projeto pedagógico do curso, além de integrar o itinerário formativo do educando. § 2º O estágio visa ao aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho.

Dessa forma, as atividades buscam colocar em cooperação o treinamento dos estudantes e a preservação do acervo do museu, seguindo as técnicas preconizadas pela

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pedagogia da área museológica. Algumas publicações que servem de base para o desenvolvimento crítico teórico museológico e a prática direta com o acervo:

2.2 Metodologia aplicada Ao chegar ao museu, o grupo de dez estagiários teve um treinamento sobre como manusear o relatório de bens patrimoniais (Relatório carga), e o Thesaurus para acervos museológicos de Helena Dodd Ferrez e Maria Helena Bianchini. Cada acervo possuía uma especificidade de informações, reunindo dimensões, técnica e demais informações. Como exemplo uma medalha pertencente a Coleção Pedro Ernesto, além de suas informações principais; título, autor, dimensões, classe, o acervo conta com um histórico, identificando as exposições que já participou. Para o processo de higienização e acondicionamento foi preparado um conjunto de modelos de envelopes feitos em papel alcalino. Foi elaborado também um modelo de ficha, com campos que satisfizessem o sistema de catalogação da FUNARJ (Governo do Estado) para que os dados conferidos pela equipe pudessem ser transferidos, sem lacunas de informação, para os arquivos daquela instituição. Cada bolsista preenche a lápis uma ficha relativa a cada objeto do acervo, tarefa realizada, sob a supervisão da museóloga Marcia Nascimento, de segunda à quinta-feira, sendo a sexta-feira destinada à transferência do conteúdo de cada uma das fichas para arquivo digital – Documento em formato DOC - Word 97-2003 ® da Microsoft, com a inserção da imagem digitalizada do objeto. Sendo um estagiário responsável por fazer o registro fotográfico do objeto, realizado por meio de câmera digital Sony Cyber-Shot 4.1 mega pixels em uma superfície preparada com fundo branco. Imagens em JPEG com tamanho entre 4, 5 MB e 100 dpi. Posteriormente essa imagem é inserida em documento word referente a ficha catalográfica digital. Mantendo no computador o backup das imagens e também uma cópia em HD externo. As obras são localizadas e conferidas no próprio local onde estão mantidas nas dependências do museu, sendo realizada uma análise de suas condições para registro em sua ficha, na qual constarão seus números de identificação, dados fundamentais e o laudo sobre seu estado de conservação. Diante das condições precárias de acondicionamento das obras em suporte de papel e levando em conta o aspecto pedagógico do estágio, a coordenação do projeto considerou

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que seria importante garantir a conservação preventiva desse acervo e aproveitar a oportunidade para refazer os envelopes protetores das obras, utilizando papel neutro.



Etapas

Etapa 1: Treinamento dos estagiários para as diferentes etapas do trabalho e apresentação da metodologia do trabalho. Etapa 2: Localização das fichas catalográficas. Etapa 3: Conferência e checagem de informações. Etapa 4: Remarcação do acervo com um número novo de patrimônio, preenchimento da nova ficha reduzida e inserção de número de patrimônio novo na ficha catalográfica bem como alteração dos dados como condição física do objeto. Etapa 5: Nessa etapa, cada estagiário de posse das fichas preenchidas fará a alimentação da planilha que tem os seguintes itens: Nº ordem, nº de patrimônio, nº de coleção, nome de obra, autor, localização da peça e estado de conservação, nome do estagiário, data do preenchimento e observações gerais. Etapa 6: Distribuição das fichas de catalogação (grandes e pequenas) em seus respectivos arquivos de origem.

3. Resultados esperados Até o término de 2014 a conferência de 24.000 mil bens culturais do acervo e em paralelo o treinamento dos graduandos. A possibilidade da Instituição reabrir suas portas ao público apôs o término do trabalho de conferência e a pesquisa do acervo.

4. Resultados obtidos 5

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A oportunidade dos estudantes do curso de Museologia participarem do projeto aprimorando experiências,

conhecimentos

e

desenvolvendo

uma

aplicação

prática

importante para a carreira profissional. Ter uma excelente mão de obra, formada em longo prazo pela UNIRIO/Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro. Sendo assim ao final do trabalho os bolsistas estando aptos a desenvolver um trabalho na área museológica no que tange desde a conferência de objetos até o acondicionamento. O resultado positivo da parceria Prefeitura do Rio de Janeiro e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) garantindo a valorização e a proteção do patrimônio cultural.

Considerações finais Os museus fornecem a perspectiva histórica, garantindo a dinâmica da memória coletiva, a continuidade, a cultura; transportam uma informação no tempo, entre esferas espaço-temporais diferentes, proporcionando o diálogo entre o ontem e o hoje, entre as diversas gerações; procedem a comunicação com o invisível, com as terras longínquas, trazem a memória das pessoas os acontecimentos de um tempo que já passou. (GUEDES, 2009).

O inventário está relacionado diretamente a conferir aquilo que é a alma de todo museu, seus objetos. A premissa dessa atividade é impedir o desaparecimento de bens culturais de valor histórico e artístico nacional, além de quantificar os objetos, checando a localização das peças e o seu estado de conservação. Sendo a aplicação de um inventário parte da missão dos museólogos e conservadores.

Referências BRASIL. Lei Nº 11.788 de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes. Brasília. p. 1-6, 2008. Legislação Federal. FERREZ, Helena Dodd; BIANCHINI, Maria Helena S. Thesaurus Para Acervos Museológicos. Rio de Janeiro: Fundação Nacional Pró-Memória, Coordenadoria Geral de Acervos Museológicos, 1987.2v. GUEDES, Angela Cardoso. Museus, documentação e transmissão cultural. In: Museus e Comunicação: exposição como objeto de estudo. 2009. MARSTINE, J. (Ed). New Museum, Theory and Practice: na introduction. Oxford, UK: Blackwell, 2007. MENEZES, Ulpiano B. de. A exposição museológica: reflexões sobre os pontos críticos na pratica contemporânea - Simpósio o processo de comunicação dos museus de Arqueologia e Etnologia, 1993.

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Imagens MUSEU HISTÓRICO. Imagem do projeto / Estagiárias Gleice Mayer e Manoela Cardoso realizando a medição e catalogação de recortes de jornal. 2012. 1 álbum. color: 8,39 x 12,96 cm. MUSEU HISTÓRICO. Imagem do pôster / Semana de Integração Acadêmica UNIRIO 2012. 2012. color; 10,95 x 12,94 cm. Tabela MUSEU HISTÓRICO. Ficha catalográfica reduzida com os principais campos a serem preenchidos. 2011. 14,0 x 10,0 cm. MUSEU HISTÓRICO. Ficha catalográfica completa. 2011. 25,0 x 18,0 cm.

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Anexo Figura 1 - Imagem do projeto / Estagiárias Gleice Mayer e Manoela Cardoso realizando a medição e catalogação de recortes de jornal

Fonte: Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro Figura 2 - Imagem do pôster / Semana de Integração Acadêmica UNIRIO 2012 – Evento na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro ao qual estudantes participantes de bolsas apresentam seus trabalhos, oralmente ou sob a forma de pôster.

Fonte: Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro 8

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Tabela – Ficha catalográfica reduzida com os principais campos a serem preenchidos. Números de Patrimônio (FUNARJ / MHC) Titulo do Objeto, Autor, Classe Genérica, Classe Específica, Estado de Conservação, Localização e Observações.

COLEÇÃO OBJETO TÍTULO AUTOR CLASSE GENÉRICA CLASSE ESPECÍFICA CONDIÇÃO LOCALIZAÇÃO OBSERVAÇÕES

MHC QUADRO DE IDENTIFICAÇÃO E LAUDO NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO FUNARJ novo FUNARJ MHC anterior

Boa

Regular

Ruim

Em risco

RESPONSÁVEL DATA: Fonte: Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro

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Tabela – Ficha Catalográfica Completa

COLEÇÃO IMAGEM

OBJETO

NÚMERO DE IDENTIFICAÇÃO FUNARJ novo FUNARJ anterior

COLEÇÃO

TÍTULO Observações:

ORIGEM Data produção/ Execução (local de de produção)

PROCEDÊNCIA

-----

DATA DE ENTRADADO OBJETO NO CLASSE GENÉRICA MUSEU CLASSE ESPECÍFICA AUTORIA/CATEGORIA Observações: ----DIMENSÕES Tridimensional Largura Altura Profundida Diâmetro --------de ---- ----Estojo / caixa – base/ suporte Material/técnic ---a Largura Altura Profundida Diâmetro --------de ---- ----CONDIÇÃO

Bidimensional Largura Altura Moldura Material/técni ---ca Largura Altura --------BOM REGULAR

Profund ----idade

Profun ----didade RUIM

Observações: MATERIAL TÉCNICA 10

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DESCRIÇÃO

MARCAS E INSCRIÇÕES Tipo: INSCRIÇÃO Transcrição: Observações: ----VINCULAÇÃO À PESSOA Observações: ----VINCULAÇÃO A EVENTO Observações: -----

Localização: Observações: -------------

Pessoa que realizou o registro Data do registro Observações:

Fonte: Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro.

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A UTILIZAÇÃO DA LUZ VISÍVEL E DO AJUSTE CROMÁTICO COMO PROCEDIMENTO PARA A DOCUMENTAÇÃO CIENTÍFICA POR IMAGEM DE BENS CULTURAIS. ESTUDO DE CASO: UM OBJETO CERÂMICO DA COLEÇÃO DE ARTE POPULAR DO MHNJB-UFMG. Alexandre Cruz Leão1 Agesilau Neiva Almada2 Resumo: Este trabalho propõe apresentar e discutir os procedimentos de documentação científica por imagem como ferramentas essenciais no processo de conservação e restauração de obras de arte. A técnica utilizada é a de Luz Visível, com o objetivo de gerar a imagem final cromaticamente ajustada pelo uso de cartela de referência cromática. Os procedimentos descritos referem-se à produção (captura) e o tratamento (processamento) das imagens digitais.

Palavras-chave: Documentação científica por imagem; ajuste cromático, fotografia.

Abstract This paper presents and discusses the procedures for the scientific imaging as essential tools in the conservation and restoration process of the works of art. The Light Visible is adopt with the aim of the produce the final image chromatically adjustable from color target. The procedures relate to the production (capture) and treatment (processing) the digital images.

Keywords: Scientific imaging; chromatic adjustment; photography.

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Professor de Fotografia e Imagens Científicas do Departamento de Fotografia, Teatro e Cinema da Escola de Belas Artes (EBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), [email protected]. 2 Bacharel em Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis, Escola de Belas Artes (EBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), [email protected]. 13

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INTRODUÇÃO Os registros e exames diagnósticos por imagem são recursos essenciais no

processo de conservação e restauração de uma obra de arte, podendo também colaborar na documentação e tratamento de coleções de museus. Os profissionais conservadorrestaurador e museólogo devem estar amparados por estas ferramentas para que se tenha um maior entendimento sobre o objeto trabalhado, e por consequência, permitir que estes recursos o auxilie na formulação da proposta de tratamento. Além disto, estes exames e recursos serão utilizados como informação documental do objeto, integrando assim o dossiê de tratamento. Aos registros e exames diagnósticos por imagem denomina-se Documentação Científica por Imagem, cuja atuação está voltada, principalmente, para as fotografias realizadas na faixa da luz visível com o uso de gerenciamento de cores (LEÃO, 2005), infravermelho, falsa cor de infravermelho, fluorescência de ultravioleta, radiografia (raios-X), colorimetria aplicada, dentre outras (iLAB, 2012). A documentação científica por imagem é uma ferramenta que possibilita, de forma clara e eficiente, o registro por imagens científicas da obra de arte, identificando os principais elementos que a caracterizam. Assim, além de constituir um registro, possibilita consultas para esclarecimentos de dúvidas, confirmação de informações e constatação de procedimentos. Desta maneira deve-se, portanto, ser gerada de forma criteriosa, buscando sempre registrar o máximo de informações que a constitui; tentando assim a eliminação de erros que possam comprometer a qualidade e o entendimento da imagem do objeto. A fotografia de luz visível com a realização de ajuste cromático se difere do uso de gerenciamento de cores, uma vez que não é gerado o perfil de cores e nem mesmo é fundamental o uso de cartelas de referência cromática com múltiplas cores, como a cartela Colorchecker de 24 amostras, que é mais eficiente em termos colorimétricos (R-POZEILOV, 2008). Para o ajuste cromático a cartela de referência de cores contendo tons de cinza (cinza, cinza claro e cinza escuro) é o suficiente. Este mecanismo permite uma documentação mais criteriosa do que a reprodução de imagens como costumeiramente os conservadores-restauradores e museólogos lançam mão para a documentação da obra que está sendo estudada/restaurada. A discussão essencial que se faz neste trabalho é a importância de utilizar uma ferramenta, de fácil e rápida aplicação, que possibilita um ganho na imagem que será de grande relevância nas informações cromáticas que integrará toda a documentação produzida durante o processo de tratamento de uma obra de arte. 14

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Os procedimentos aqui definidos para a realização dos ajustes cromáticos foram aplicados em imagens produzidas durante o processo de intervenção em um objeto cerâmico, com características de escultura, elaborado em barro cozido e devidamente policromado, pertencente ao acervo da coleção de Arte Popular do Museu de História Natural e Jardim Botânico da Universidade Federal de Minas Gerais (MHNJB-UFMG), Belo Horizonte, Minas Gerais e tem por título “Moringa com tampa”. Peça esta restaurada no primeiro semestre de 2013, no curso de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis, Escola de Belas Artes (EBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), como objeto de estudo do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), realizado pelo autor Agesilau Neiva Almada. A coleção de Arte Popular do MHNJB-UFMG é composta por 823 itens, em sua maioria cerâmica, sendo 200 peças oriundas do Vale do Jequitinhonha, confeccionada por diversos autores. A peça em questão tem autoria atribuída a Ulisses Pereira, e no acervo é possível encontrar outras peças com as mesmas características que também podem ser atribuídas ao respectivo autor. A realização deste procedimento de documentação poderá possibilitar ao Museu, no futuro, adotá-lo devido a sua facilidade, para as demais peças do acervo e também para outras pertencentes às demais coleções do Museu. Este procedimento é perfeitamente realizável, não dependendo de grandes investimentos por parte do Museu e também do corpo funcional (conservadores-restauradores e museólogos), e permite gerar uma documentação de boa qualidade técnica.

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PRODUÇÃO DA IMAGEM No processo de produção das imagens de uma obra de arte, alguns fatores são

essenciais para preservar todos os detalhes do original, fatores estes que são fundamentais no processo de análise, diagnóstico e intervenção da peça. O ambiente em que serão produzidas as imagens é um fator importante, sendo necessário que ocorra em um local adequado e devidamente preparado para que a qualidade das imagens reflita a realidade projetada pela obra original. Para isto devem-se levar em conta, principalmente, duas questões: a iluminação do ambiente e o equipamento fotográfico que se está utilizando. No processo de produção fotográfica a luz tem um papel fundamental, porque é ela que definirá a geração de imagens com a qualidade que se necessita. Ela permitirá que o objeto, devidamente iluminado, ao ser fotografado, consiga traduzir todas as nuances e detalhes que a peça apresenta. Para isto tem que se levar em conta a intensidade, o posicionamento, a qualidade da lâmpada e também o tipo de equipamento de iluminação a ser utilizado. 15

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Para se fotografar objetos planos, bidimensionais, como é o caso das pinturas sobre tela, pinturas murais e parietais, por exemplo, será necessária a utilização de uma fonte de luz de igual intensidade de ambos os lados (direito e esquerdo). No caso de objetos tridimensionais, como é o caso das esculturas e dos objetos cerâmicos, poderá ser utilizado fontes de luz com diferentes intensidades, o tipo da luz deverá ser suave, sendo um lado com maior intensidade que o outro, possibilitando assim, dar volume à imagem do objeto que se está fotografando; este procedimento evita a produção de uma imagem em que o objeto se veja planificado (efeito de imagem “chapada”). O uso de rebatedores, caso se faça necessário, poderá ser utilizado, porém de cor branca para não interferir na qualidade da luz, e assim evitar distorções no processo de captura. Outro fator importante no processo de captação da imagem é a qualidade do equipamento fotográfico. Deve-se utilizar sempre câmeras e objetivas de alta qualidade, tripé e acessórios necessários ao bom desempenho dos equipamentos. O equipamento fotográfico deve ser capaz de gerar imagens com alta resolução espacial (acima de 10 MegaPixels), formato de arquivo RAW 3, que gera arquivo sem compressão, e permitir o uso de objetivas intercambiáveis. Também deve ser capaz de permitir a configuração manual de velocidade do obturador, abertura de diafragma e ISO 4, além de outras importantes funções, como por exemplo: o ajuste do balanço de branco e do EV (Valor de Exposição). O equipamento também deve ser colocado num tripé para manter a câmera fixa e utilizar o autodisparo, recurso que evita a movimentação indesejada do equipamento e seus reflexos na imagem. Um ponto importante que deve ser levado em conta e que complementa o processo de captura da imagem é a utilização de uma cartela de referência de cores, devidamente colocada junto à obra. Deve ser colocada à frente do objeto, em inclinação e, preferencialmente, na área central do enquadramento fotográfico. Esta cartela permite, após a captura da imagem, os ajustes cromáticos e também pode permitir o gerenciamento de cores na etapa de processamento da imagem. Duas cartelas de referência cromática têm sido bastante utilizadas na área de documentação por imagem de bens culturais: a Color Checker® de 24 amostras de cores, fabricada pela X-Rite, que possui a informação

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Formato de arquivo sem compressão, onde são gravadas as informações de luz capturadas pelo sensor e não processadas. Cada fabricante atualmente desenvolve o formato RAW próprio (a extensão do arquivo RAW da Nikon é NEF, da Canon CR2, da Sony ARW, etc). 4 O ISO (InternationalOrganization for Standardization) indica a sensibilidade do sensor à luz, e quanto maior mais sensível o sensor fica à luz, o que poderá ocasionar perda de qualidade da imagem em função do aparecimento do “ruído” provocado pela interferência elétrica/eletrônica. 16

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cromática referenciada no espaço de cor L*a*b*5, cores consistentes e com pouco ou nenhum metamerismo quando vista sob diferentes condições de iluminação;outra opção é a cartela em escala de cinza QPcard, modelo 101 ou 102, que apresenta três padrões de cores: cinza claro, cinza médio e cinza escuro, cujos tons são usualmente chamados de branco, cinza e preto. Essa cartela é de fácil uso, possuindo a finalidade de realização do ajuste do WB (balanço de branco) e o ajuste fino exposição. Essa cartela não é utilizada para a geração de perfil de cores, pois possui apenas tons de cinza, sendo, contudo, muito eficiente para a realização de ajuste cromático com boa precisão, além do baixo custo de investimento. Ambas as cartelas possuem superfícies sensíveis, sendo importante o manuseio com cuidado, evitando contato direto com as amostras de cores. Quando manuseada indevidamente, manchas, causadas pela gordura das mãos, e abrasões, podem danificar facilmente a informação cromática das cores de referência, o que invalidaria a função da cartela. Sob o ponto de vista do ambiente onde são geradas as imagens, este deve possuir estabilidade na iluminação e para isso o uso de luz artificial é o mais indicado, uma vez que a luz natural sofre modificações constantemente durante o dia. As fotos do objeto cerâmico “Moringa com tampa” foram realizadas no laboratório de

fotografia

do

curso

de

Conservação

e

Restauração

de

Bens

Culturais

Móveis/EBA/UFMG, utilizando equipamento fotográfico digital Nikon ® D300 e iluminação artificial: fontes de luz contínua, cada uma com 03 lâmpadas cuja temperatura de cor é de 5000 K e Índice de Reprodução de Cores (IRC) de 95; posicionados em ângulo oblíquo à peça, proporcionando uma luz suave, em que a iluminação de um lado foi mais intensa do que o outro. Foram utilizados todos os padrões de produção descritos anteriormente: câmera em módulo manual, máxima resolução; ISO 100 (melhor qualidade da imagem); estabilizador de imagem desligado; foco em posição automático; balanço de branco em luz do dia, compensação de exposição (EV) em “0”; fotometria realizada pelo auxílio de fotômetro profissional; autodisparo; e imagens em formato RAW. A obra foi apoiada em uma mesa negra, utilizando um fundo preto. A câmera foi fixada em tripé, de frente para a obra. Utilizou-se um suporte de acrílico para sustentar a peça na sua posição de exibição e assim realizou-se a captura das imagens. Produziu-se uma primeira imagem utilizando uma cartela de referência cromática da Color Checker®, cujas amostras de cores de interesse foram os tons de cinza, que serviu como imagem de referência. Os parâmetros fotométricos foram: diafragma = f/14, velocidade = 1/8, ISO = 100 5

Espaço de cor onde os valores L*, a* e b* são mapeados em um sistema de coordenadas tridimensionais. Os valores L* representam a luminosidade, valores a* o eixo vermelho/verde, e valores b* o eixo amarelo/azul. 17

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e distância focal = 85 mm (equivalente ao formato 35 mm). Em seguida foram capturadas as imagens do objeto em suas diferentes faces (frente, verso, lateral esquerda e lateral direita, vista superior e vista inferior), condizentes com suas características e formato.

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PROCESSAMENTO DA IMAGEM Faz parte do processamento da imagem a realização de ajustes finos nas imagens

produzidas, utilizando softwares de tratamento de imagens e cartelas de referência cromática presente no momento da fotografia junto ao objeto. Estes ajustes objetivam melhorar a qualidade das imagens fotográficas e também torná-las mais próxima da imagem que se vê do objeto. É importante salientar que este processo não dever ser confundido com a manipulação ou alteração da imagem, e sim de correção de possíveis perdas ocorridas decorrentes do processo de produção das imagens, seja através de uma distorção do processo de iluminação, seja pela perda natural de nitidez causada pelo equipamento fotográfico, ou até mesmo por alguns erros na configuração deste equipamento e de definição dos parâmetros para a produção das imagens por quem esteja produzindo-as. Para a realização do tratamento das imagens geradas para a peça “Moringa com Tampa” foi utilizado o software Adobe® Photoshop® na versão CS5, juntamente com seus aplicativos Adobe® Bridge CS5 e o Adobe®CameraRaw (ACR). Este procedimento engloba dois momentos: o primeiro consiste no ajuste da temperatura de cor por meio da amostra cinza da cartela e, em seguida, a correção da exposição (amostras branca e preta da cartela), levando em conta os padrões definidos pelo fabricante da cartela de referência cromática ou valores colorimétricos obtidos por equipamentos de colorimetria, como espectrofotômetros. Apesar de este trabalho abordar exclusivamente a aplicação do ajuste cromático nas imagens capturadas, outros ajustes finos podem ser aplicados na imagem a fim de dar uma qualidade maior, como é o caso do recurso de melhoria da nitidez, utilizando as ferramentas Unsharpmask e procedimentos pelo uso do filtro High-pass, ferramentas também pertencentes ao pacote Photoshop ®. O tratamento realizado na peça “Moringa com tampa” foi iniciado com a utilização do aplicativo BRIDGE do Adobe Photoshop® que permite a leitura e também a padronização das informações geradas em RAW no Adobe® Photoshop®. Neste aplicativo foram abertas as imagens a serem trabalhadas, todas com a extensão .NEF (extensão do arquivo RAW da Nikon®). Os procedimentos foram realizados a partir da imagem que possuía a cartela de referência cromática, utilizando o Adobe CameraRaw® (OPEN IN 18

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CAMERA RAW). Com a abertura da imagem com a cartela de referência uma nova caixa de diálogo foi aberta; nesta caixa é que se aplicaram os ajustes. Este software permite a realização dos ajustes cromáticos supracitados e detalhados a seguir. O procedimento de tratamento foi iniciado pela definição da temperatura de cor utilizando o primeiro conta-gotas (White Balance Tool) localizado na barra superior da tela, no lado esquerdo; clicando sobre as áreas de cinza (3a e 4a amostras de cores da faixa cinza da cartela Color Checker®), a fim de obter a melhor imagem com equilíbrio de cores mais adequado. Deu-se continuidade ao processo com a correção da exposição. Para isto foi utilizado o segundo conta-gotas (localizado ao lado do anterior na barra de ferramenta – Color Sampler Tool). Clicou-se com o conta-gotas em três pontos sobre a área preta e três pontos sobre a área branca. A definição de três pontos em cada uma das cores (branco e preto) tem por objetivo fazer uma comparação entre eles e definir apenas um ponto (que represente a média dos três). Os resultados encontrados referem-se aos valores cromáticos no modo de cor: R (Vermelho), G (Verde) e B (Azul). A partir dos valores encontrados e levando em conta os valores de referência definidos para a cartela de referência de cores (Colorchecker) que tem por padrão: BRANCO: 243 e PRETO: 52 procedeu-se assim o ajuste da exposição, levando em consideração as amostras “branca” e “preta” da cartela. O “branco” é ajustado no EXPOSURE e o “preto” no BLACKS. Primeiro movimentou-se o cursor do EXPOSURE até que os valores RGB estivessem próximos aos valores de referência para o branco, que é 243. Em seguida movimentou-se o cursor do BLACKS até que os valores RGB estivessem próximos dos valores de referência para o preto, que é 52. Nas Tabelas 1 e 2 tem-se o comparativo dos valores colorimétricos em RGB, antes e depois da aplicação do procedimento de ajuste de exposição das imagens, portanto após a correção de “balanço de branco”, pois a imagem apresentava maior intensidade de azul e este procedimento ajustou tal desvio cromático.

TABELA 1 - Valores RGB para o BRANCO RGB

ANTES do ajuste cromático

DEPOIS do ajuste cromático

R G B

251 248 246

246 243 240

Fonte: Elaborado pelos próprios autores.

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TABELA 2 - Valores RGB para o PRETO RGB

ANTES do ajuste cromático

DEPOIS do ajuste cromático

R G B

52 52 52

52 52 52

Fonte: Elaborado pelos próprios autores.

Realizado o ajuste na imagem que contém a cartela de referência de cores, os mesmos ajustes foram aplicados às demais imagens geradas. Para isto foram abertas todas as imagens pelo Bridge no ACR e através da ferramenta SELECT ALL foram selecionadas todas as imagens que se desejou aplicar o ajuste, e utilizando a ferramenta SYNCHRONIZE, os ajustes foram automaticamente aplicados em todas as imagens selecionadas. Após a aplicação do procedimento de tratamento das imagens é possível fazer uma comparação entre as duas imagens, aquela obtida pela câmera durante o processo de captura da imagem (imagem original) e aquela que foi ajustada cromaticamente pelo processo aqui apresentado. Nas Figuras 1 e 2 tem-se o objeto com a cartela de referência cromática demonstrando o antes e o depois do ajuste cromático. Nas Figuras 3 e 4 têm-se também o antes e o depois do objeto sem a cartela de referência cromática.

Figura 1: Imagem original Pináculo (RAW) com ajustes na câmera fotográfica e cartela de referência cromática. Foto: Claudio Nadalin V. da Costa, 2013.

Figura 2:Imagem com cartela de referência cromática, processada com o ajuste cromático. Foto: Claudio Nadalin V. da Costa, 2013.

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Figura 3: Imagem original Pináculo (RAW) com ajustes na câmera fotográfica Foto: Claudio Nadalin V. da Costa, 2013.

Figura 4: Imagem processada com o ajuste cromático. Foto: Claudio Nadalin V. da Costa, 2013.

Verifica-se que o ajuste cromático corrigiu as cores da imagem original (obtida pela câmera), que se encontrava um pouco mais escura e opaca, fruto das limitações cromáticas na etapa de geração decorrentes da iluminação utilizada e também pelo processo natural de perda gerado pelo equipamento fotográfico. A aplicação do ajuste cromático permitiu uma melhor visualização das cores originais da peça – nota-se que fazendo uma comparação do tom terracota da peça após o ajuste cromático ela está mais nítida e mais homogênea; e apresenta um equilíbrio com as demais cores da peça. Isto faz com que a imagem produzida se aproxime mais do objeto real. É possível também ressaltar os detalhes da fratura e também a decoração em vermelho, que está sobre o pé de apoio direito, está mais visível. Neste caso, especificamente, analisando os dados das Tabelas 1 e 2 é possível notar que as condições que foram geradas as imagens estavam bastante adequadas, e a variação de RGB é muito pequena o que comprova que o ajuste cromático produziu uma correção muito sutil nas imagens. No entanto foi de suma importância porque, mesmo em condições ideais, recuperou as pequenas deficiências da iluminação artificial e também as distorções geradas pelo próprio equipamento fotográfico.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS No processo de tratamento e/ou intervenção de uma obra de arte é muito comum,

durante a formação da documentação fotográfica, a produção de fotos que permita tão 21

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somente o registro do estado de conservação (fotos iniciais), etapas de restauro e fim de processo, sem muita preocupação com uma qualidade satisfatória destas imagens. A utilização de métodos adequados na produção de fotografias, tanto na produção quanto no tratamento de imagens, é um fator de grande importância para garantir uma documentação fotográfica de qualidade e assim permitir que estas imagens estejam mais próximas da realidade, ou seja, que sejam condizentes com o objeto original. Além disto, uma documentação criteriosa e de qualidade pretende facilitar o entendimento, o registro da obra, processos de intervenção e também auxiliar, no futuro, na solução de possíveis problemas e/ou falhas de registro escrito dos processos. A utilização de uma metodologia consistente é de fundamental importância para o sucesso da documentação fotográfica de uma obra de arte, visto que este processo além de auxiliar aos profissionais da museologia e conservação-restauração, seja em uma instituição ou em um ateliê, podem subsidiar no futuro possíveis estudos e novas intervenções que porventura a obra tenha que passar. A aplicação deste trabalho em um processo de intervenção de uma obra pertencente a uma coleção de Arte Popular do MHNJB-UFMG possibilitou a formatação de um procedimento de documentação que não era utilizado e desconhecido pelo Museu. E assim, com a realização deste trabalho e a divulgação do trabalho na instituição é possível que conservadores-restauradores e/ou museólogos do respectivo Museu possam utilizar estes procedimentos durante a produção da documentação por imagem das demais peças da coleção, uniformizando assim o processo de documentação e registro de imagens na instituição.

REFERÊNCIAS LEÃO, Alexandre Cruz. Gerenciamento de cores para imagens digitais. 2005. 135 f. Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) – Escola de Belas Artes, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2005. PROJETO DO LABORATÓRIO DE DOCUMENTAÇÃO CIENTÍFICA POR IMAGEM – iLAB, Apoio as atividades de ensino, pesquisa e extensão. Escola de Belas Artes, Universidade Federal de Minas Gerais, 2012. R-POZEILOV, Yosi A. Digital photography for artconservation. Yosi A. R-Pozeilov, 2008.

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MUSEU E HISTÓRIA: COLEÇÃO NUMISMÁTICA DO MUSEU HISTÓRICO NACIONAL. UM PATRIMÔNIO BRASILEIRO. Cláudio Umpierre Carlan1

Resumo: A moeda, como documento, ultrapassava os limites geográficos do poder que a emitia e definia ideologicamente não só um povo, mas também a civilização a que este pertencia. Como corpus principal, apresentaremos a coleção numismática do Museu Histórico Nacional, importante acervo arqueológico brasileiro, ainda pouco estudado.

Palavras-Chaves: Museus, Moedas, Coleção, História. Abstract: The coin, as a document, exceeded the geographical limits of the power emitted and the ideologically defined not only people, but also to civilization to which it belonged. As a main corpus, we will present the numismatic collection of the National Museum of History, important archaeological collection Brazilian yet understudied.

Keywords: Museums, Coins, Collection, History.

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Pós Doutorando em Arqueologia pelo NEPAM / UNICAMP; Doutor em História Cultural (UNICAMP); Professor Adjunto 3 de História Antiga da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG); Professor do Mestrado Profissional em História Ibérica (PPGHI / UNIFAL-MG). Grupo de Pesquisa: Arqueologia Histórica da UNICAMP; Península Ibérica: da Antiguidade Tardia a Reconquista. E.mail: [email protected] 23

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Introdução

As nações procuram no passado, legitimar seu poder, status de potência, herdeira natural do Império Romano ou do Mundo Carolíngio. Utilizaram uma série de símbolos associados tanto a arte, quanto aos padrões ideológicos de uma época. O então Papa João Paulo II, numa tentativa de legitimar a União Europeia, invocou o Império de Carlos Magno, como uma primeira união dos povos europeus, pós Roma. A iconografia, as relações de poder ligadas a uma certa representação, é mais que um meio de comunicação, de linguagem, de exposição dos grandes mistérios, da mitologia, religião, cultura, política ou sociedade. A revolução da imagem como meio de comunicação, inicia outros caminhos (FERNÁNDEZ-ARENAS: 1984, 75). No passado, esses objetivos estavam restritos a contemplação de uma elite. As coleções de Augusto em Roma, ou de Carlos Magno estavam abertas apenas para o ciclo mais íntimo do governante. Com nascimento do Estado-Nação, os objetos passam a pertenceram a uma rede de exposição pública, contemplados em Coleções, salões e museus. Nesse sentido, a moeda, a ciência numismática de uma maneira em geral, seguiu esse mesmo rumo. Na Grécia, em Roma ou na Espanha Medieval, o possuidor de uma determinada espécie monetária estranha, esse objeto falava-lhe pelo metal, nobre ou não, em que era cunhada, pelo tipo e pela legenda. O primeiro informava-o sobre a riqueza de um reino e os outros dois elementos diziam-lhe algo sobre a arte, ou seja, o maior ou menor aperfeiçoamento técnico usado no fabrico do numerário circulante, sobre o poder emissor e, sobretudo, sobre a ideologia político-religiosa que lhe dava o corpo. É dentro deste último aspecto que pretendemos explorar a fonte numismática. Os símbolos que habitam a numismática estão dotados sempre de uma clara organização hieroglífica, pois procedem do fato de que essas imagens difundidas se articulam sempre com o idioma figurado, no qual o poder se expressa secularmente. Trata-se, segundo de la Flor, do surgimento de representações de águias, leões, como também de torres, cruzes (FLOR: 1995, 183), da fênix, de imperadores ou de personagens pertencentes a uma elite político-econômica, que representam a órbita de ação do poder, chegando ao ponto em que a numismática pode ser definida “como um monumento oficial a serviço do Estado.” Lembramos ainda que, como

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afirma Cassirer, “...em lugar de definir o homem como um animal rationale, deveríamos defini-lo como um animal symbolicum.” (CASSIRER: 1977, 70). Desse modo, a iconografia, e toda a sua simbologia, aparece de fato como testemunho mais evidente do imaginário de uma determinada civilização. Esses signos mantém com seu objeto uma relação causal de contiguidade física natural. Como exemplo podemos citar as letras ou símbolos gregos localizados no campo das moedas. Eles indicam que as amoedações foram realizadas por casas monetárias de origem ou influência cultural grega. Realizando uma comparação com o exergo, comprovamos esta relação. Greenwell, no século XIX, já defendia a posição importante das cidades gregas, principalmente de Cyzicus como centro de cunhagem (GREENWELL: 1887, 9). Infelizmente, as coleções museológicas no Brasil sempre foram negligenciadas pelos centros acadêmicos. No caso específico da História, destaque sempre foi a documentação escrita, textual. A iconográfica e arqueológica, relacionada com a Cultural Material, ficaram em um plano secundário. O fenômeno da formação de importantes coleções nasceu de um grande interesse despertado pela História, Arqueologia e Numismática no final do século XIX. No Brasil, por exemplo, Ramiz Galvão, diretor da Biblioteca Nacional, em 1880 começa a organizar a coleção numismática brasileira, com o acervo de 13.941 moedas, doadas pelo comendador Antônio Pedro de Andrade (VIEIRA: 1995, 23), dessas, 4.420 foram cunhadas na Antiguidade. Todo esse acervo numismático existente na Biblioteca Nacional – assim como em outras instituições como o Arquivo Nacional, Casa da Moeda, "foram organizados no Museu Histórico Nacional a partir de 1922". Também desse período começa a circular a Revue Numismatique, organizado pelo numismata francês Jules Maurice. Em Barcelona são editados o Memorial Numismático Español (1866), e a Revista de Ciencias Históricas (1880). Importantes periódicos científicos que ajudaram a legitimar, e propagar, uma série de pesquisas acadêmicas.

Colecionismo: Origem e Importância. A ideia de coleção e preservação é mais antiga do que podemos imaginar. Nas sociedades pós modernas, definimos colecionismo como um passatempo, hobby. Objetos das mais variadas categorias são agrupados em grupos pré determinados. 25

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Esses grupos, dependendo do colecionador, poderão ser amplos (coleção de selos de vários países ou períodos) ou particular (coleção de selos brasileiros). Segundo o historiador romano Suetônio (69-141), Otávio Augusto, primeiro imperador de Roma, possuía hábito de colecionar moedas, das mais variadas regiões do império. Apenas pessoas do seu círculo pessoal teriam acesso a essas peças. Com o desmembramento do Império Romano do Ocidente, em 476, os primeiros reinos germânicos procuravam estabelecer um elo com o passado. Como se fossem o legítimo herdeiro de Roma. O rei visigodo Égica (610 – 702), na primeira metade século VII, conseguiu fazer de seu filho, Wittisa (? – 710), seu sucessor. Com esse objetivo, associou-o ao seu governo. Esses dois personagens aparecem reunidos nas moedas do período: o rei no anverso e o herdeiro no reverso. Pelo mesmo motivo os reis Égica e Wittisa surgem juntos e coroados em algumas peças do final do século VII. Nos terços de soldo ou tremissis, moeda romana de ouro criada no ano de 385, pelo usurpador Máximo, utilizada pelos reis visigodos, identificamos na legenda, EGICA REX WITTISA REX CONCORDIA REGNI. Pai e filho apresentam-se ante seu reino como uma dinastia, embora ainda um não tivesse sucedido ao outro. Nessas peças, o rei e o príncipe estão representados de lado, face a face, com uma cruz entre ambos. Em alguns exemplares cunhados em Toledo, Égica e Wittisa seguram e erguem a cruz. Notamos nesse modelo, a união de dois mundos: Romano e Germânico (vulgarmente conhecido como bárbaro). Porém, a titulação principal, rei (rex), comum entre os invasores bárbaros, não era popular em Roma. A partir do século VIII, Carlos Magno (742 – 814), promoveu o chamado “renascimento carolíngio”, no qual a atividade colecionista alcançará um grande impulso. Recolher, recuperar, preservar o que restava da cultura greco-romana, abalada pelas invasões, tornaram-se atividades regulares firmando a “atividade colecionista” como uma atividade cultural (SANTOS: 1995, 137). O imperador bizantino, Constantino VII Porfirogêneto (905 – 959), institui que, por ocasião das grandes festas religiosas, militares e políticas, fossem exibidas as coleções de propriedade real. O próprio termo grego porfirogêneto, significa nascido da púrpura. Constantino VII teria nascido na sala púrpura do Palácio Imperial de Constantinopla. Sendo filho legítimo do Imperador Leão VI, o sábio.

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Notamos nessas passagens uma forte influência romana. No caso da moeda, a legenda, inscrições em latim, a cruz representando a Igreja e a designação da CONCORDIA, comum nas cunhagens romanas dos séculos IV e V (CONCORDIA MILITVM). Tanto os visigodos, como os demais reinos bárbaros, e até mesmo os Estados Modernos europeus do século XV e XVI, utilizaram os padrões e tipos monetários romanos como base. Durante o renascimento do século XV, os mecenas italianos financiavam um grande número de artistas, cujo estilo e o tipo de pintura mesclavam com as ideologias e mensagens políticas. A arte como uma forma de poder, e os vestígios do poder representados nas formas de arte (STAN: 1995, P. 281). Aliado a esse “retorno” ao Mundo Clássico, começaram a colecionar tudo o que lembrava, ou pertencia, a Antiguidade Greco-Romana. Esculturas, mosaicos, moedas, enfeitavam os jantares e recepções. O anfitrião exibia a todos o seu poder e riqueza, aliado a um retorno à grandeza do passado. A elite adotaria uma série de símbolos externos para destacá-las, e com esse fim aplicariam os materiais de que dispunham, com particular preferência pelos de caráter singular e preciso. Isso deve ter-se manifestado em todas as ordens do poder, que se em nossos dias estão perfeitamente diferenciados. Naqueles “remotos” tempos estariam seguramente reunidos numa única pessoa, que seria ao mesmo tempo chefe militar, legislador e chefe religioso . Essa pessoa, para distinguir-se dos outros, adotaria algum elemento diferencial, que não demoraria em converter-se em símbolo daquela circunstância. As casas dinásticas e membros nobreza iniciaram as suas coleções particulares, realizando uma associação de seus domínios com os do Império Romano. Os jetons (francês), tokens (inglês), gettone (italiano), são os melhores exemplos desse período. Essas moedas de funções variadas eram cunhadas por particulares, por isso, sem valor legal. Eram numárias comemorativas distribuídas em ocasiões especiais, como festas e audiências. Luis XIV (1638 – 1715), o qual havia herdado as coleções de Carlos V e do Cardeal Mazzarino, utilizou amplamente essas cunhagens. Ele é representado com uma coroa de louros, como os antigos césares romanos. Funcionários são designados para agrupar e catalogar esse material.

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As coleções reais francesas, instaladas inicialmente nos castelos de Blois e Fontainebleau, a partir de 1683, são transferidas para Versailles e Louvre, sendo ampliadas. O “Rei-Sol”, diariamente, visitava o acervo, explicando para os funcionários como deveriam ser expor as peças. (BABELON: 1981, 61). Os jovens Estados Nacionais, desejosos de recuperar a sua origem, através dos vestígios do passado, realizaram verdadeiras expedições para conhecer tanto as obras antigas, quanto o seu local de origem. No século XVIII, a Inglaterra através da Society of Dilettani, se preocupou em organizar várias campanhas arqueológicas para conhecer, estudar e analisar, as antigas ruínas greco-romanas. As obras, em sua grande maioria, eram retiradas e levadas para Londres, enfeitando os mais variados palácios da nobreza. Em sua origem, o colecionismo desenvolvido durante a renascença, estava retido às casas dinásticas e à nobreza, únicas com condições financeiras e bagagem cultural para iniciar e manter uma coleção. Séculos depois, industriais ricos e sedentos de cultura adotaram esse costume. Era um meio de mostrar para a sociedade seu poder, financeiro e cultural, sobre os demais. Na Inglaterra, por exemplo, era comum o matrimônio entre membros da nobreza decadente com os “novos ricos”, comerciantes e industriais. Com a formação dessas coleções particulares no século XVIII, elas vão sendo ampliadas durante boa parte do século XIX. Muitos desses colecionadores, ou seus familiares, doaram partes dos acervos para museus estatais. Como ocorreu com Comendador Antônio Pedro de Andrade, que doou sua coleção numismática para Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Mais tarde o acervo foi anexado ao Museu Histórico Nacional. Toda a catalogação e inventário seguiram modelo criado pelo Diretor do Gabinete Imperial e professor de Antiguidade da Universidade de Viena, Áustria, Joseph Hilarius Eckhel, em 1775. Eckhel utilizou um novo critério para organização dos acervos numismáticos antigos. Não em ordem alfabética, como o costume da época, mas sim em dois departamentos distintos: moedas gregas, cunhadas em cidades gregas ou sobre sua influência. Nesse caso são adicionadas regiões da Península Ibérica, Ásia e África, baseada no contato dessas civilizações com o Mar Mediterrâneo. E moedas romanas, cunhadas sobre a autoridade de Roma, em todo o Império, seguindo ordem cronológica de cunhagem.

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Ainda nesse período, escreveu Catalogus Musei Caesariensis, analisando a coleção do Gabinete Numismático da Áustria Imperial, tendo como base científica seu novo método. Porém, sua obra mais importante, escrita entre 1792 – 1798, Doctrina Numorum Veterum, Doutrina das Moedas Antigas, dividida em oito volumes, serviu de modelo para a organização dos gabinetes numismáticos europeus e americanos. No Brasil, as principais coleções iniciaram com chegada da família real portuguesa em 1808. Além dos acervos particulares, D. João VI, encorajou a elite local no desenvolvimento de "hooby". Com retorno do monarca, grande parte das peças lusitanas ficaram no Brasil. D. Pedro II, foi o herdeiro e colecionista nato.

O Museu Histórico Nacional: Cem Anos de Independência A construção das nações desde o século XIX, até o início do XX, baseava-se num processo de expansão e unificação nacional. Essa construção político-social, geográfica e econômica, articulava-se a restruturação ritual e simbólica da nação para a qual intelectuais, artistas e produtores culturais foram cooptados (CHAGAS, GODOY: 1995, 36). Essa simbologia passava, por exemplo, através da criação de bandeiras, hinos, selos e outros. Através da arquitetura, pintura, escultura, música, medalhística e literatura, a nação vai sendo construída simbolicamente. Segundo Hobsbawn, se houve um momento em que o princípio da nacionalidade do século XIX triunfou, esse foi ao final da Primeira Guerra Mundial, em 1918 (HOBSBAWN: 1990, 159). Exatamente nesse momento, iniciavam-se os preparativos para a comemoração dos 100 anos de independência, e o Brasil necessitava de um museu que indicasse a trajetória da nação, no tempo, destacando os traços da História Nacional.

Figura 1

Acervo e Foto: Cláudio Umpierre Carlan. Alfenas, Janeiro de 2013. 29

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Anverso: Coroa de louros circundando estrela (ao centro) e o valor de 1000 réis. Acima, Brasil, abaixo o ano de cunhagem 1924, durante a Presidência de Artur Bernardes (1922-1926). Essa moeda entrou em circulação 2 anos após as comemorações de 100 anos de Independência. A coroa de louros, simbolismo da imortalidade, emblema romano da vitória, tanto nas armas como do espírito (CHEVALIER. GHEERBRANT: 1997, 581). No reverso, imagem da República (imagem feminina), com cornucópia, símbolo da felicidade e fecundidade, representação de várias divindades greco-romanas (Fortuna, Constância, Ceres, Baco, Abundância).

O MHN foi criado pelo decreto número 15596, de 02 de agosto de 1922 pelo então presidente da República, Epitácio Pessoa (1919-1922), com a função de museu voltado para a História do Brasil. Iniciou as suas atividades no dia 11 de outubro daquele mesmo ano, integrado à Exposição Internacional comemorativa do Centenário da Independência do Brasil, instalado em duas galerias nas dependências do antigo Arsenal de Guerra, (transferido para a ponta do Caju em 1908), ampliadas e decoradas para servirem como "Palácio das Grandes Indústrias", um dos pavilhões mais visitados da Exposição. A política de aquisição trazia para o museu insígnias militares, religiosas e nobiliárquicas, que reunidas retratavam a glória do passado, a nobreza do povo brasileiro, as forças emergentes da nação. Vargas, durante o Estado Novo (19371945), foi um dos grandes incentivadores, doando vários objetos pessoais para coleção. Assim sendo, foi entregue ao público, bens culturais até então dispersos, em outros órgãos institucionais, ou pouco valorizados (CHAGAS, GODOY: 1995, 39). Podemos citar como exemplo a coleção de numismática que se encontrava na Biblioteca Nacional, desde o final do século XIX. Atualmente o MHN ocupa todo o conjunto arquitetônico da antiga ponta do Calabouço, local se encontrava instalado originalmente o Forte de Santiago, construído em 1603, ao qual se acrescentou a Prisão do Calabouço (1693) - destinada a escravos fugitivos -, a Casa do Trem (1762) - depósito do "trem de artilharia", responsável pelo deslocamento de armas e munições, o Arsenal de Guerra (1764) e o Quartel (1835) (CARLAN: 2013, 29). Não se pode falar sobre a coleção numismática do MHN sem mencionar o fundo reunido anteriormente na Biblioteca Nacional, que serviu de base. Criada em 1810, durante a regência de D. João, a Biblioteca Nacional havia inaugurado em 1880, sob a direção de Ramiz Galvão, uma ofensiva para reunir uma coleção de moedas e 30

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medalhas, sobretudo brasileiras, que se encontrava em caráter transitório no Museu Nacional. Galvão não conseguiu que o fundo numismático viesse para a Biblioteca durante a sua administração. Mas é considerado como iniciador da coleção numismática naquela instituição. Em um relatório de 1881, dirigido ao Barão Homem de Melo, ministro de Império, que doou 114 moedas e 10 medalhas, Galvão utilizou diferentes argumentos para alcançar seus objetivos: A Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, exmo sñr., não possuía moedas nem medalhas por um vício de organização que é fácil de explicar; quando criada, pensou-se que esses trabalhos eram antes objetos de curiosidades, e por isso os deixaram fazendo parte do Museu Nacional...É todavia incontestável que moedas e medalhas são antes de tudo documentos subsidiários da história, e que por conseqüência o seu lugar próprio não é ao lado das coleções de história natural...o lugar da numismática é ao lado da história, e o da história é na Biblioteca Nacional. Pensando assim todas as grandes bibliotecas da Europa tem a sua seção de numismática [...] (VIEIRA:1995, 98).

Segundo Poliano, é bem possível que Gustavo Barroso, primeiro diretor do MHN, usou uma argumentação semelhante para conseguir a transferência da coleção da Biblioteca Nacional para o Museu Histórico (POLIANO: 1946, p.p. 9-10). O primeiro lote de peças, composto por 406 moedas e 6 medalhas, foi doado a biblioteca em setembro de 1880. Nos anos seguintes, o acervo continuou a crescer, por meio de compras, ou doações. Como, por exemplo, a doação da coleção do comendador Antonio Pedro de Andrade compreendia 13.941 moedas e medalhas, entre outros núcleos expressivos; 4.559 moedas e 2.054 medalhas portuguesas; e 4.420 moedas da Antiguidade. O comendador Antônio Pedro foi o maior doador individual da coleção numismática da Biblioteca Nacional / MHN (VIEIRA: 1995, 100). Nascido em Funchal, Ilha da Madeira, em 1839, emigrou para o Brasil com 16 anos. Trabalhou como jornalista no Correio Mercantil, e no Jornal do Comércio. Como bancário, trabalhou no Banco Comercial do Rio de Janeiro, do qual foi gerente, diretor e por fim presidente (DUMANS: 1940, 216). Seus núcleos mais orgânicos distribuem-se entre moedas de Portugal e colônias (4.599); romanas e bizantinas (4.420 peças); moedas brasileiras (2.337 peças); medalhas portuguesas (1.101 peças) e brasileiras (950 peças). É também possível que alguns exemplares sejam precedentes das coleções da família imperial, legadas pelo imperador D. Pedro II, constituída desde o Primeiro Reinado e composta de 1.593 moedas e 545 medalhas, por ele doadas ao Museu Nacional em 1891 e incorporadas pela Biblioteca Nacional em 1896. 31

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Em 1922, quando o Museu Histórico Nacional foi criado, o decreto que o instituiu também determinou que o acervo numismático existente na Biblioteca Nacional – assim como em outras instituições como o Arquivo Nacional e a Casa da Moeda – fosse para ali transferido. No momento em que se efetivou a cessão, a coleção total ultrapassava as 48 mil peças. Hoje chega a aproximadamente 130 mil.

Considerações Finais A moeda mostra-se uma excelente fonte, pois, a partir de sua análise encontramos diversos aspectos que abrangem a série na sua totalidade. Ou seja, aspectos políticos, estatais, jurídicos, religiosos, econômicos, mitológicos, estéticos. Podendo informar sobre os mais variados retrospectos

de uma sociedade,

testemunha determinadas relações culturais importantes para o historiador. Mas também não podemos esquecer que as amoedações, como documentos, não são reflexo de uma simples troca comercial ou aquecimento na economia. Identificam um outro

acontecimento

paralelo,

uma

materialidade,

constituída

por

camadas

sedimentares de interpretações: “o documento, é assim, pensado arqueologicamente como monumento (JENKINS: 2001, 11). Nesse sentido, as amoedações configuravam significados e mensagens do emissor (imperador, membros de sua família ou pessoas que circulavam próximas ao poder) para seus governados. Continham símbolos que deveriam ser entendidos ou decifrados pelo receptor. Como os símbolos urbanos, que representavam a cidade ou algum habitante importante, ou as insígnias dos imperadores romanos que vão reaparecer no Sacro Império Romano – Germânico, durante o governo de Frederico II (1194 – 1250) (CARLAN: 2013, 176). O estudo da coleção numismática do Museu Histórico Nacional, possibilitounos o levantamento de questões fundamentais, relativas à natureza do simbolismo e da propaganda existentes nas numárias. Questões que, no entanto, não tivemos a oportunidade de analisar com mais profundidade. Desta forma, não pretendemos que os resultados a que chegamos em nosso trabalho sejam vistos como tendo um caráter definitivo e acabado. Novas hipóteses e novos objetivos nortearão os trabalhos realizados com esses acervos museológicos.

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Agradecimentos: Agradecemos aos colegas da Universidade Federal de Alfenas, em especial a amiga, museóloga Luciana Carvalho pela oportunidade de trocarmos ideias, a Ciro Flamarion Cardoso (in memorian), Lygia Martins Costa, André Leonardo Chevitarese, Maria Beatriz Florenzano, Vera Lúcia Tostes, Eliane Ney, Rejane Vieira, Paula Aranha, assim como o apoio dos seguintes órgãos acadêmicos: Laboratório de Arqueologia Pública (LAP-NEPAM / Unicamp), CNPq, FAPESP e FAPEMIG. A responsabilidade pelas ideias restringem-se ao autor.

Referências CARLAN, Cláudio Umpierre. Moeda e Poder em Roma: um mundo em transformação. São Paulo: Annablume, 2013. CHAGAS, Mario de Souza. GODOY, Solange de Sampaio. Tradição e Ruptura no Museu Histórico Nacional. In: Anais do Museu Histórico Nacional, volume 27, Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional, 1995. CHEVALIER, Jean. GHEERBRANT, Alain. Dicionário de Símbolos. 8a. ed. Tradução: Vera Costa e Silva, Raul de Sá Barbosa, Ângela Melim, Lúcia Melim. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1994. FERNÁNDEZ-ARENAS, José. Teoría y Metodología de la Historia del Arte. Barcelona: Editorial Anthropos, 1984. FLOR, Fernando R. de La. Emblemas Lectures de La Imagem Simbólica. Madrid: Alianza Editorial, 1995. FUNARI, Pedro Paulo Abreu. ORSE JR., Charles E. SCHIAVETTO, Solange Nunes de Oliveira. Identidades, discurso e poder: Estudos da arqueologia contemporânea. São Paulo: Annablume / FAPESP, 2005. FUNARI, Pedro Paulo Abreu e PELEGRINI, Sandra C.A. Patrimônio Histórico e Cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006. GREENWELL, Willian. The Electrum Coinage of Cyzicus. London: Rollin and Feuardent, 1887. HOBSBAWN, E.J. Nações e Nacionalismo desde 1780: programa, mito e realidade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990. HUNT, Lynn. A Nova História Cultural. Tradução de Jefferson Luís Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1992. POLIANO, Luis Marques. A Numismática no Museu Histórico Nacional. In: Revista Numismática. Números 1-4. São Paulo: Sociedade Numismática Brasileira, 1946. ROMAN IMPERIAL COINS IN THE HUNTER COIN CABINET, UNIVERSITY OF GLASCOW. London: Oxoford University Press, 1977. SANTOS, Lucila Moraes. Coleções no Museu Histórico Nacional: a coleção Souza Lima. In: Anais do Museu Histórico Nacional, volume 27, Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional, 1995. VIEIRA, Rejane Maria Lobo. Uma grande coleção de moedas no Museu Histórico Nacional? In: Anais do Museu Histórico Nacional, volume 27, Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional, 1995.

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AÇÕES EDUCATIVAS NO MUSEU CASA DA CULTURA PADRE KAROL DWORACZEK EM SÃO JOSÉ DOS PINHAIS - PARANÁ: CONEXÃO COM A CIDADANIA Cecília Szenkowicz Holtman 1

Resumo: Ao tratar do tema estabelecido pelo Icom para a Semana Nacional de Museus deste ano, “Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões”, este artigo procura analisar a construção de uma cidadania no contexto da diversidade cultural existente no Brasil, através de ações educativas realizadas junto às coleções museológicas, tanto no seu aspecto material quanto imaterial para que a mesma se desenvolva de uma forma crítica, consciente, e que possa, ao reconhecer as afinidades e distinções, superar a diferenciação social em busca de uma coexistência plural, exemplificando isso com ações realizadas no museu Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek, que se localiza em São José dos Pinhais – Paraná.

Palavras-chave: Museus. Coleções. Cidadania.

Abstract: By treating the theme established by Icom for National Museums Week this year, "Heritage and Museums: The Collections create connections", this paper analyzes the construction of citizenship in the context of the cultural diversity in Brazil, through educational activities next to museum collections, both in its material and immaterial aspect so that it develops a critical, conscious way, and you can, recognizing the affinities and distinctions, overcoming social differentiation in search of a plural coexistence, illustrating this with shares held in the museum Casa de la Cultura Father Karol Dworaczek which is located in São José dos Pinhais, Paraná state of Brazil.

Keywords: Museums. Collections. Citizenship.

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Graduanda em Licenciatura em História pela UEPG – PR; Coordenadora do museu Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek, em São José dos Pinhais – PR.

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Introdução Seja qual for sua tipologia, os museus são locais privilegiados na promoção da cidadania. Mas para que isso ocorra se faz necessário que suas ações se articulem de forma que as pessoas da comunidade em que o mesmo se encontra possam se apropriar de seu patrimônio cultural e exercer plenamente seu papel de cidadãos. Trabalhar a educação patrimonial nos museus não significa apenas guardar ou expor peças que contam a história de um lugar ou um grupo de pessoas, mas sim dar oportunidade aos indivíduos para que possam realizar uma análise daquilo que se encontra em seu entorno, compreendendo, a partir daí, sua trajetória histórico-temporal, reforçando não apenas sua auto-estima, como também o desenvolvimento de sua alteridade. Magaly Cabral (2004, p.56) coloca a educação museal como compromisso, ao afirmar que: “Educação em museu é essa dinâmica de compartilhar e negociar a ressignificação com o público a partir de bens musealizados.” Ao conectar as pessoas com suas histórias, através de suas coleções e por meio de suas ações educativas, museus, como a Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek buscam cumprir esse compromisso sócio-político dos museus para o desenvolvimento da cidadania. Criada em 2006, de acordo com o Decreto Municipal nº 1.541, a Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek se localiza no centro da Colônia Murici, em São José dos Pinhais. Esta localidade recebeu a terceira etapa do programa de colonização implantado pelo governo imperial para a província do Paraná. Para esta colônia destinaram-se vinte famílias de imigrantes oriundos de terras polonesas, que desembarcaram no Brasil em 1878. (HOLTMAN, 2012, p.09) É uma instituição pública, vinculada à municipalidade por meio da Secretaria Municipal de Cultura. Seu acervo é composto por peças doadas pela comunidade e que fizeram parte do cotidiano das famílias locais, desde o início da colonização, até meados da década de 1970. Através destas peças, pode-se analisar e visualizar como era o dia-a-dia das famílias polono-descendentes, tanto nos afazeres do lar como na lavoura. Em sua missão estão registrados “o resgate e preservação do patrimônio cultural da etnia polonesa, oportunizando também o contato com as artes em geral.” (HOLTMAN, 2012, p.11)

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1. Entendendo o conceito de Ação Educativa Como ações que trabalham a educação patrimonial, entendem-se todas as atividades culturais e artísticas que se desenvolvem dentro do espaço museológico e que podem ser avaliadas e reconhecidas tanto pelas pessoas que trabalham na instituição quanto por aquelas que a visitam (COSTA, 2006, p.75). Estas atividades não se limitam apenas aos objetos, representantes de um patrimônio material local, mas devem principalmente, e, através dos mesmos, promover a redefinição do patrimônio imaterial da comunidade em que está inserido o museu. Magaly Cabral novamente explica: É no espaço entre objetos em exposição e o público, que emerge e ganha corpo o patrimônio intangível presente em todos os museus. A cada novo visitante, sentidos são atribuídos aos objetos, geralmente referentes a memórias do lugar de origem, lembranças de costumes, tradições, sabores vivenciados na infância. Percepções despertadas por acontecimentos significativos para o visitante. E é nessa interação sujeito/objeto, mediada pelo educador que acontecem vivências culturais transformadoras. (2004, p.54)

Quando estes objetos passam a ter um significado histórico-social para uma coletividade, reafirmam o direito dos indivíduos de exercitarem sua cidadania por meio da manutenção de suas memórias e suas manifestações, tanto no aspecto tangível quanto no intangível (PARANÁ, 2000, p.29). Mas, para que isto ocorra, é preciso que o museu, através de uma gestão democrática e participativa, promova estratégias que estimulem o desenvolvimento das mesmas. Quando o museu se percebe como agente de valorização e promoção do patrimônio cultural, e assume este compromisso, aplica em seu espaço o que preconiza a Política Nacional de Museus (BRASIL, 2003), cujos princípios orientadores estabelecem, entre outros: 2. Valorização do patrimônio cultural sob a guarda dos museus, compreendendo-os como unidades de valor estratégico nos diferentes processos identitários, sejam eles de caráter nacional, regional ou local; 3. Desenvolvimento de processos educacionais para o respeito à diferença e à diversidade cultural do povo brasileiro frente aos procedimentos políticos de homogeneização decorrentes da globalização. (BRASIL, 2003, p.09)

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O Estatuto de Museus (BRASIL, 2009, p.04), em seu artigo 29 coloca como compromisso dos museus as ações educativas2, que devem estar presentes no cotidiano da instituição não apenas como mais uma atividade entre outras realizadas, mas como um norte, figurando, inclusive, no corpo do Plano Museológico3, instrumento que planeja e organiza o trabalho na instituição museológica. Para desenvolver a valorização do patrimônio e os processos educacionais que respeitam a diversidade cultural, os museus reforçam a perspectiva educativa, construindo, assim, uma pedagogia museal fundamentada em três conceitos: educação patrimonial, ação educativa e função/missão educativa dos museus. (STUDART, 2004, p.44) Apesar de soarem como semelhantes, estes conceitos são distintos e diferem das práticas e ações que ocorrem na instituição museológica. Studart (2004, p.44) explica que a educação patrimonial, enquanto área de conhecimento da museologia é a educação a partir do patrimônio cultural. Já a ação educativa é tudo aquilo que se faz concretamente em termos educacionais nos museus, e a função/missão educativa, é aquilo que lhe cabe educacionalmente, aquilo que está definido em seu plano museológico. Isso significa que, ao propor ações educativas, a equipe do museu deve levar em consideração a sua missão, não criando ações desconectadas de sua realidade. Também suas ações devem utilizar o seu patrimônio cultural disponível, tanto nos aspectos tangíveis quanto intangíveis. Principalmente, devem ter como referencial, os diferentes tipos de público que visitam a instituição.

2. As Ações educativas e a coleção museológica da Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek É por meio do contexto estabelecido pelo museu que determinadas coleções e objetos ganham sentido (CURY, 2004, p.90). E este contexto se dá quando as equipes do museu tomam parte na vida destas coleções e objetos, seja através da catalogação, pesquisa, curadoria, comunicação ou educação. Mas, ao mesmo tempo em que o museu dá sentido às suas coleções e a demonstra através da comunicação, o público visitante também reinterpreta os objetos a 2

Art. 29: Os museus deverão promover ações educativas, fundamentadas no respeito à diversidade cultural e na participação comunitária, contribuindo para ampliar o acesso da sociedade às manifestações culturais e ao patrimônio material e imaterial da Nação. (BRASIL, 2009, p.04). 3 Art. 46: O Plano Museológico do museu definirá sua missão básica e sua função específica na sociedade e poderá contemplar os seguintes itens, dentre outros: (...) IV – detalhamento dos Programas (...) e) Educativo e Cultural. (BRASIL, 2009, p.06). 37

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partir de suas próprias experiências e as informações disponibilizadas durante a ação educativa. O que acontece, neste momento é uma troca simbólica de conhecimentos e ressignificações, onde o sentido patrimonial é negociado entre os sujeitos (museu e público) numa prática social que amplia o sentido de pertencimento, de cidadania. Julião (2006, p.29) ressalta a importância dos pequenos museus, dedicados à memória local, pois são espaços como estes que vão de encontro com as necessidades de autoconhecimento diante das imposições estabelecidas pela globalização. A Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek, em São José dos Pinhais – Paraná, pode ser considerada um desses espaços que se contrapõem ao que Augé (1999, apud CABRAL, 2004, p. 31) chama de “não-lugares” - espaços sem personalidade impostos pela política neoliberal - já que se localiza numa pequena Colônia de descendentes de imigrantes poloneses e traz em sua coleção, fragmentos da história local, possibilitando ao visitante, através de suas ações educativas, uma leitura singular de uma das vertentes que compõem o leque pluriétnico brasileiro. Isso pode ser observado na leitura do Plano Museológico da instituição, que traz como objetivo geral: Promover ações culturais, permitindo ao público visitante aprender, em um sentido amplo, o bem cultural, com vistas ao desenvolvimento de uma consciência crítica e abrangente da realidade que o cerca, ampliando as possibilidades de expressão dos indivíduos e grupos nas diferentes esferas da vida social, bem como resgatar, conservar, pesquisar, comunicar e exibir, para estudo, educação e entretenimento, o patrimônio material e imaterial relacionado à cultura polonesa no município de São José dos Pinhais. (HOLTMAN, 2012, p.11).

Ao examinar o programa de exposições4, atenta-se para o fato de que as curadorias que envolvem as coleções permanentes deverão observar a missão e os objetivos da instituição. Já o programa educativo e cultural5 apresenta, além da visitação monitorada de seu acervo, oficinas de artesanato típico polonês, como o Wycinanki (recortes e colagens de papel para formação de figuras) e o Bibuly (confecção de flores em papel crepom), numa ação educativa que procura resgatar as tradições e o saber fazer, conciliando o material e o imaterial. Outras ações documentadas no Plano são as palestras sobre imigração e cultura polonesa e o projeto A Hora do Conto Polonês, atividades voltadas principalmente para o público estudantil e que apresentam, segundo o Livro de Registros de Atividades (2012), a

4 5

Ibid. p. 18 HOLTMAN, Loc. Cit. 38

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maior procura6. Estas informações permitem refletir sobre o alcance desses programas e sua aceitação pelo público. O projeto A Hora do Conto Polonês, ao trazer as lendas e mitos do folclore de outro país, propicia o contato com outras culturas, permite aos participantes uma conexão com um mundo que tanto pode ser diferente, quanto pode fazer parte do seu. Isso porque, apesar da comunidade local ser descendente de imigrantes poloneses que trouxeram consigo seu patrimônio cultural, quando da imigração, o contato com outras etnias, bem como o processo de nacionalização que se estabeleceu, principalmente a partir da Era Vargas, em 1938, acabou por limitar esta conexão, limitando o contato com a literatura polonesa. (RENK, 2009, p.148) Assim, aliado às lendas, a visitação da coleção permanente ganha um novo sentido, reaflorando a infância dos adultos e estimulando a criatividade das crianças. Quando o público visitante ouve histórias sobre imagens e personagens que depois identificam na exposição, uma nova interpretação dos objetos é feita, uma reapropriação de conceitos que promovem, além da análise crítica, uma construção identitária, pautada na alteridade. Por meio de ações educativas ligadas à Literatura, como o projeto da Hora do Conto, as coleções museológicas adentram no plano do imaginário sem perder as evidências históricas. “O ato de se contar uma história, é um momento mágico. É quando a imaginação de quem ouve vai de encontro às informações que a humanidade traz desde seu surgimento” (HOLTMAN, 2012, p. 05). Basso (s/d., p.03), em seu relatório sobre a Literatura Infantil nos primeiros anos escolares e a Pedagogia de Projetos, reforça: Experiências felizes com a literatura infantil (...) são aquelas em que a criança interage com os diversos textos trabalhados de tal forma que possibilite o entendimento do mundo em que vivem e que construam, aos poucos, seu próprio conhecimento.

Assim, construindo discursos a partir do patrimônio cultural musealizado, a equipe do museu pratica uma ação educativa eficaz e de qualidade, voltada para a inclusão social e cultural, fundamentada no respeito às diferenças.

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Segundo dados extraídos do Livro de Registros, no ano de 2012, o número participantes do projeto A Hora do Conto Polonês foi de 1318 alunos. Já para as palestras aliadas às visitas monitoradas ao acervo, o total foi de1071 alunos das redes municipal, estadual e particular. 39

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Considerações finais Ao analisar as ações educativas realizadas em pequenos museus locais, como a Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek, em São José dos Pinhais – Paraná, percebe-se que estas são as portas de acesso que conectam as coleções museológicas ao patrimônio cultural da comunidade onde se inserem, pois, através do objeto, revelam o contexto histórico, trazendo para o público a vivência das manifestações culturais e ampliando a compreensão daquilo que os cerca, seja no aspecto material ou imaterial, natural e/ou social. Judite Primo (2006, p.92) ressalta que: “A tarefa de uma política cultural referente ao patrimônio não é resgatar ou valorizar apenas as referências passadistas de uma sociedade, e sim tudo aquilo que é culturalmente representativo.” É de responsabilidade dos museus, portanto, a difusão, entre os cidadãos, do patrimônio cultural que os cerca. São as referências identitárias, divulgadas através das coleções museológicas que permitem aos indivíduos se localizarem dentro de uma sociedade globalizada, tornando-os atores no processo de desenvolvimento sócio-cultural. Nas palavras de Costa (2006, p.74): Neste aspecto, o Museu, assim como a exposição, possui um papel de instrumento, entre outros, da implementação do patrimônio numa dinâmica de desenvolvimento. Na verdade, é preciso fazer o patrimônio falar, comunicar, com uma linguagem acessível a todos.

E essa comunicação se dá por meio das ações educativas, que conectam as gerações passadas às futuras, materializando a existência dos indivíduos e promovendo sua continuidade. Ao interagir entre o sujeito e o objeto, a ação educativa articula as demandas da comunidade com o conhecimento já adquirido, incentivando a compreensão do presente e propiciando uma melhor atuação desta no futuro, garantindo o desenvolvimento sustentável e duradouro através de seu patrimônio cultural. Afinal, o patrimônio cultural é o marco da vida cotidiana, a base para a construção de um futuro de qualidade - que, mesmo sendo global não é homogêneo - ao dar o sentido de pertencimento às diferentes comunidades para que as mesmas possam reconhecer-se na pluralidade e assim exercitar plenamente sua cidadania.

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REFERÊNCIAS: BASSO, C. M. A Literatura Infantil nos primeiros anos escolares e a Pedagogia de Projetos. Disponível em: http://www.ufsm.br/lec/02_01/CintiaLC6.htm Download em 28 de março de 2012. BRASIL. Política Nacional de Museus – Memória e Cidadania. Brasília, DF, MinC, Maio de 2003, 37p. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wpcontent/uploads/2010/02/politica_nacional_museus_2.pdf download em 15 de janeiro de 2013 (cópia impressa). ______. Lei nº 11.904 de 14 de janeiro de 2009. Institui o Estatuto de Museus e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2009/Lei/L11904.htm Acesso em 15 de janeiro de 2014. CABRAL, M. Museus e o patrimônio intangível: o patrimônio intangível como veículo para a ação educacional e cultural. In: MUSAS – Revista Brasileira de Museus e Museologia, v. 1 n. 1. Rio de Janeiro, IPHAN, 2004, p.49-59. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wpcontent/uploads/2011/04/musas/pdf. Download em: 15 de janeiro de 2013. ______. O educador de museu frente aos desafios econômicos e sociais da atualidade. In: MUSAS – Revista Brasileira de Museus e Museologia, v. 1 n. 1. Rio de Janeiro, IPHAN, 2004, p.27-33. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wpcontent/uploads/2011/04/musas/pdf. Download em: 15 de janeiro de 2013. CASA DA CULTURA PADRE KAROL DWORACZEK. Livro de Registro de Atividades. São José dos Pinhais, 2012/2013. COSTA, E. P. Princípios básicos da museologia. Curitiba, Coordenação do Sistema Estadual de Museus/Secretaria de Estado da Cultura, 2006, 100p. CURY, M. X. Os usos que o público faz do museu: a (re)significação da cultura material e do museu. In: MUSAS – Revista Brasileira de Museus e Museologia, v. 1 n. 1. Rio de Janeiro, IPHAN, 2004, p.87-106. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wpcontent/uploads/2011/04/musas/pdf. Download em: 15 de janeiro de 2013. HOLTMAN, C. Acervo fotográfico particular. 1 CD, color, 2012. ______. Acervo fotográfico particular. 1 CD, color, 2013. ______. Plano Museológico da Casa da Cultura Padre Karol Dworaczek. São José dos Pinhais, Secretaria Municipal de Cultura, 2012, 33p. ______. Projeto A Hora do Conto Polonês. São José dos Pinhais, 2012, 09p. JULIÃO, L. Apontamentos sobre a História do Museu. In: Caderno de Diretrizes Museológicas I. Brasília, Ministério da Cultura/ IPHAN/ Departamento de Museus e Centros Culturais, Belo Horizonte: Secretaria de Estado da Cultura/ Superintendência de Museus, 2006, 2ª edição, p. 17-30. PARANÁ. Discutindo Gestão Cultural. Curitiba, Secretaria de Estado da Cultura – Fórum dos Representantes das Regionais de Cultura do Paraná, 2000, 66p. PRIMO, J. A museologia como instrumento estratégico nas políticas culturais contemporâneas. In: MUSAS – Revista Brasileira de Museus e Museologia, v. 2, n.2. Rio de Janeiro, IPHAN, 2006, p.87-93. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wpcontent/uploads/2011/04/Musas2.pdf. Download em: 15 de janeiro de 2013. RENK, V. E. Aprendi a falar português na escola! O processo de nacionalização das escolas étnicas polonesas e ucranianas no Paraná. Tese (Doutorado em História da Educação) Curso de Pós-Graduação em Educação, área de Concentração em História da Educação. Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009, 242p. STUDART, D. C. Conceitos que transformam o museu, suas ações e relações. In: MUSAS – Revista Brasileira de Museus e Museologia, v. 1 n. 1. Rio de Janeiro, IPHAN, 2004, p.4148. Disponível em: http://www.museus.gov.br/wp-content/uploads/2011/04/musas/pdf. Download em: 15 de janeiro de 2013.

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ANEXO FOTOGRÁFICO:

Figura 1: A inserção da Casa da Cultura Pe. Karol Dworaczek na paisagem local. HOLTMAN, 2013.

Figura 2: Oficina de Bibuly com grupo da terceira idade (nome do grupo não foi identificado). HOLTMAN, 2012.

Figura 3: Palestra sobre imigração e cultura polonesa, com a escola municipal Professora Rosi Machado Marchesini. HOLTMAN, 2013. 42

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Figura 4: Alunos do Colégio Estadual da Colônia Murici interagindo com as peças do acervo permanente sobre agricultura. HOLTMAN, 2013.

Figura 5: Projeto A Hora do Conto Polonês, apresentando a lenda da formação da Polônia, com o CEI De Olho no Futuro. HOLTMAN, 2012.

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MUSEU DE CADA UM, PATRIMÔNIOS DE TODOS NÓS: BRINCANDO DE CONSTRUIR IDEIAS SOBRE MUSEUS E PATRIMÔNIOS NO SUL DE MINAS GERAIS Luciana Menezes de Carvalho1 Evandro Cassimiro de Moraes2 Gilmara Aparecida de Carvalho3 Lucimar Aparecida da Costa Benini4 Rosalia Menezes de Carvalho5

Resumo O presente documento de trabalho visa apresentar, como estudo de caso, o projeto "Museu de cada um, patrimônios de todos nós: brincando de construir ideias sobre Museus e Patrimônios no Sul de Minas Gerais", iniciado em 2012 e efetivado em 2013 por meio do registro na PróReitoria de Extensão da Universidade Federal de Alfenas. O presente projeto consiste em desenvolver atividades que visem a Educação Patrimonial, com crianças de 05 a 12 anos das redes públicas, particulares e projetos sociais e, concomitantemente, planejar e elaborar propostas de educação patrimonial para a comunidade acadêmica da UNIFAL-MG, a serem desenvolvidas em 2015. Assim, propomos que em 2014, assim como 2013, seja voltado primeiramente ao público infantil (por entendermos que será necessário atuar, de formas isoladas, sistemáticas e particulares com cada tipo de público), com atividades próprias para sua faixa etária, e visando atingir o maior número de crianças da Região. Nossa proposta é explicitar, na prática, como todo tipo de museu e de patrimônios são importantes, sejam os constituídos pela UNIFAL-MG ou pelas próprias crianças. Visamos reforçar que patrimônios estão em todos os lugares, bastando que alguém reconheça e tome como seu.

Palavras-Chave: Museu, Museologia, Patrimônio, Memória. Projeto de Extensão.

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Museóloga (Unirio), Mestre e Doutoranda em Museologia e Patrimônio (Unirio/Mast); Diretora do Museu da Memória e Patrimônio da Universidade Federal de Alfenas. 2 Graduando de História (UNIFAL-MG). 3 Membro da Comunidade Externa. Historiadora e servidora municipal em Paraguaçu, MG. 4 Graduanda de História (UNIFAL-MG). 5 Membro da Comunidade Externa. Professora de Ensino Fundamental. 44

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1. Considerações iniciais: situando o Projeto “Museu de cada um, patrimônios de todos nós: brincando de construir ideias sobre Museus e Patrimônios no Sul de Minas Gerais”

“- Museu? Que negócio é esse? Não é lugar que guarda coisa velha? (QUINZINHO) - Claro que não, Quinzinho! Os museus são como pontes, portas e janelas. (BELINHA) - Uai, não entendi! (QUINZINHO) - Eles ligam e desligam mundos! Os museus guardam e mostram para a gente sonhos, sentimentos que ganham forma através das imagens, cores e sons de cada coisa que tem lá dentro. É como se a gente se transportasse para outra época, como para a época dos nossos avós, por exemplo. (BELINHA) - Nossa, que legal! Parece uma máquina do tempo... (QUINZINHO) [...] - Sério? Mas como eu consigo ver esse museu que está em todo lugar? (QUINZINHO) - Por meio do nosso patrimônio, da herança dos nossos antepassados, das lembranças que formaram a história da nossa cidade. Através da nossa arte, das nossas danças, dos nossos costumes. Até aquela receita de família que a nossa vó usa para fazer comidas gostosas é nosso patrimônio! (BELINHA) - Então patrimônio é tudo aquilo com o qual a gente se relaciona e recorda com o coração?” (QUINZINHO)6

Desde os primeiros passos do Museu da Memória e Patrimônio da Universidade Federal de Alfenas, trabalhar os conceitos de Museu e Patrimônio sempre foi uma profunda inquietação. Tal premissa permeou o planejamento e a execução da sua primeira exposição. Mas, surgiu-nos outra questão: qual a ideia de Museu e Patrimônio que o público que visitará essa exposição possui? Tal premissa tornou-se importante considerando que esta seria a primeira experiência de museu (em sua forma tradicional ortodoxa) que a cidade de Alfenas7 possuiria.

Assim

entendemos que, antes de qualquer outra exposição, era necessário trabalhar os conceitos de museu e patrimônio e como estes foram construindo-se ao longo do tempo até chegar ao Museu da Memória e Patrimônio e sua relevância local. Considerando as questões acima apontadas decidimos, como “pedra fundamental”, implantar a exposição “Sobre Muitas Coisas: A Importância do Museu e da Preservação do Patrimônio da Unifal-MG”. Conforme constava no texto de apresentação da exposição e delineamos anteriormente, entendíamos que era de suma importância, antes da inauguração do Museu da Memória e Patrimônio, discutir

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Fala dos fantoches Quinzinho & Belinha, durante as apresentações do Projeto. 45

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os conceitos de Museu e Patrimônio – instâncias estas que fazem parte de nossa trajetória entre passado, presente e futuro. Nossa proposta não foi a de apresentar respostas absolutas, mas sim questionamentos e reflexões e também não intencionávamos que nosso público apreendesse tudo em uma primeira visita, estimulando-os a voltarem outras vezes. Museus, em sua grande maioria, partem do pressuposto que as pessoas sabem o que é Patrimônio e, consequentemente, Museu. Sim, a proposição está correta, as pessoas sabem, ou pelo menos, estabelecem suas próprias ideias. Mas será que os conceitos do público dialogam com os nossos? Desejamos, portanto, implantar novamente uma proposta que dialogasse com a exposição citada mas que possuísse diferentes abordagens, visando tratar conceitos de Museu, Memória, Patrimônio, atuando numa vertente que dedicasse à Educação Patrimonial 8. Assim, durante os meses de agosto de 2012 e janeiro de 2013, um grupo formado por 01 docente de História, 03 estudantes de Ciências Sociais, 04 estudantes de História, 02 historiadoras, 02 membros da comunidade externa e 01 museóloga elaboraram um projeto piloto de Educação Patrimonial. A partir de dois meses de reflexões teóricas sobre os conceitos de Museu e Patrimônio o grupo, em conjunto, estabeleceu cada passo da execução da proposta. As atividades foram realizadas considerando as seguintes etapas: 1. Primeiro contato e apresentação dos conceitos de Museu e Patrimônio - No primeiro encontro, trabalhamos os conceitos de Museu e Patrimônio, como uma forma de iniciar a proposta. Essa atividade foi apresentada em fantoches (de 5-10 min) e depois apresentação de powerpoint com fotografias (tanto do Brasil, de Minas Gerais e do bairro onde ocorre a atividade) para enquete “O que é Patrimônio?”. Convidamos as crianças para levarem, no encontro seguinte, objetos que considerassem importantes; 2. Aplicação do conceito de Museu - No segundo encontro, com os objetos delas, montamos uma pequena exposição para que elas pudessem entender a dinâmica das seleções e dos museus, com direito a legendas elaboradas por elas. Ainda, cada criança foi convidada a apresentar seu objeto, onde mostramos que os objetos ganham importância cultural nas relações que estabelecemos com eles; 3. Aplicação do conceito de Museu, Patrimônio Material e Imaterial - Neste momento propomos que as crianças visitassem as dependências expositivas do Museu da Memória e Patrimônio, para conhecerem uma instituição museológica. Em seguida tivemos 7

Localizada no interior do Estado de Minas Gerais e onde se localiza a referida universidade e seu museu. 8 Conceito a ser discutido neste trabalho. 46

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brincadeiras e brinquedos (tradicionais e/ou do cotidiano) para interação junto com as crianças. Finalizamos toda a atividade com um lanche composto por comidas tradicionais da conhecida “quitanda” (lanche da tarde) mineira. Assim, nossa proposta consiste em apresentar o projeto nominado “Museu de cada um, patrimônios de todos nós: brincando de construir ideias sobre Museus e Patrimônios no Sul de Minas Gerais” de um a três momentos (dependendo da distância do espaço a ser executado), baseados nos acima descritos, com crianças de 05 a 12 anos das redes públicas, particulares e projetos sociais. O projeto é voltado para o público infantil por entendemos que será necessário atuar, de formas isoladas, sistemáticas e particulares com cada tipo de público. O título nos permite desenvolver e reforçar a ideia de que os museus dizem respeito aos seus idealizadores – o grupo ou a comunidade a quem ele deve representar; e que patrimônios são constituídos por todos os seres humanos – todos podem identificar aquilo que lhes é mais importante. O presente trabalho visa apresentar este projeto, incluso as bases teóricas que nos orientam, abaixo apontadas, dialogando com a temática do evento: “Museus e Patrimônios: As coleções criam conexões”; em seguida apresentaremos relatos de experiências dos voluntários que atuam no projeto; e finalizando teceremos nossas considerações e perspectivas para o ano de 2015.

2. Patrimônios criando conexões: o projeto e suas bases Sobre a importância da Educação Patrimonial, citaremos um profissional do Patrimônio da cidade de Alfenas: Outro importante instrumento de avanço em prol da preservação e valorização do Patrimônio Cultural Brasileiro é a Educação Patrimonial. A expressão Educação Patrimonial deriva da tradução de Heritage Education (inglês) e foi mencionada pela primeira vez no Brasil na década de 1980 por ocasião do I Seminário de Educação Patrimonial realizado no Museu Imperial em Petrópolis, Rio de Janeiro. [...] A Educação Patrimonial é, portanto, todo trabalho educacional que conduza a sociedade a uma mudança de atitude: ao invés de espectadores da proteção do patrimônio, sejam atores desse processo (LEMOS JUNIOR, 2011, 10-11).

A interessante abordagem de Clésio Lemos Junior, membro da comunidade de Alfenas, ao longo de seu artigo é a defesa pelo direito à Educação Patrimonial. Se assim pensarmos, nossa postura em relação a museus e patrimônios pode tornar-se outra. Devemos sempre levar em conta se dialogamos com o público sobre o que entendemos como Museu e Patrimônio com o que estes entendem. 47

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José Reginaldo Gonçalves ressalta que são muitos os estudos que identificam como início da constituição da categoria “patrimônio cultural” fins do século XVIII, concomitantemente com as formações dos Estados Nacionais. Mas, ao pensar patrimônio enquanto categoria de pensamento, suas manifestações são milenares e em ampla dimensão geográfica, incluindo nas denominadas “culturas primitivas”, porém sendo apenas na modernidade ocidental onde encontramos “os contornos semânticos específicos que ela veio assumir” (2007, p. 213). Segundo Gonçalves, baseado em Weiner, podem ser identificados na maioria das sociedades e em diferentes contextos “bens alienáveis”, “cuja natureza é definida pela impossibilidade social e simbólica de circularem amplamente, desenhando assim hierarquias fundamentais” (ibidem). Faz-se necessário, então, verificar a possibilidade de transitar com esta categoria em diferentes sistemas sociais e culturais, ou seja, “como é possível usar a noção de patrimônio em termos comparativos? Em que medida pode nos ser útil para também entender experiências estranhas à modernidade?” (ibidem). Segundo Gonçalves, a noção de patrimônio é confundida com a de propriedade e, em sua maioria, com uma propriedade que é herdada, em detrimento de uma propriedade adquirida. No entanto, podemos afirmar que até no senso comum patrimônio é associado com bens adquiridos, não somente herdados. Estes bens especiais

nem

sempre

possuem

“atributos

unicamente

utilitários”



mas,

simultaneamente, “significados mágico-religiosos e sociais”, constituindo-se, como declara, “verdadeiras entidades, dotadas de espírito, personalidade” (2007, p. 214). Segundo aponta, as ênfases na categoria patrimônio na atualidade tem ressaltado seu caráter “construído” ou “inventado” que, para o autor, é decisivo na compreensão desta categoria. No entanto, quando estes patrimônios são nomeados pelo Estado e não encontram reconhecimento junto à população, o que se está em prova não é tanto a concepção de patrimônio nas sociedades modernas e sim o fato de que ser patrimônio não depende tanto das agências estatais. Para García Canclíni, em geral, é como se o patrimônio fosse da competência exclusiva de restauradores, arqueólogos e museólogos, que ele denomina “os especialistas do passado” (1998, p. 160). Para este autor, este modelo de patrimônio existe como “força política” na medida em que é teatralizado. Como exemplo, cita as comemorações, monumentos e museus. Ser culto, então, é apreender um conjunto de conhecimentos, em grande medida icônicos, sobre a própria história, e também participar dos palcos em que os grupos hegemônicos fazem com que a

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sociedade apresente para si mesma o espetáculo de sua origem (GARCIA CANCLINI, 1998, p. 162).

No campo da Museologia, Mónica Risnicoff de Gorgas (2008) define Museu como uma construção permanente em conjunto com a dinâmica social, como um espaço de poder e como um agente de dinamização cultural. Aponta como dificuldade a responsabilidade que o Museu tem na construção de seu conceito ante a comunidade. O patrimônio, por sua vez, é um ato comunicacional e possui um caráter fundamentalmente solidário, constitutivo das identidades e da dinâmica dos grupos que compartilham deste substrato – como produtores ou consumidores (SCHEINER, 2004). Não basta, enquanto profissionais, que cobremos dos órgãos públicos e/ou instituições de ensino que se responsabilizem e/ou abram espaços para a tão referida Educação Patrimonial se não fizermos isto em nossos próprios museus. Se não transmitimos ao público as bases que nos orientam. O processo comunicacional e pedagógico do Museu não ocorre apenas pela via formal das operações didáticas controladas, oriunda do logos, mas também perpassa por uma relação espontânea entre a capacidade imaginante do indivíduo e o discurso do Museu. O Museu estabelece então um verdadeiro diálogo com o indivíduo – ou uma comunidade priorizando a emoção, a imaginação e o sentimento para, através deles, oferecer a razão. O Museu constitui-se portanto não apenas no ambiente tangível em que as coisas existem, porém na relação, de forma espontânea (SCHEINER, 1998). É também importante reconhecer que o relacionamento com o patrimônio é uma história de emoções, fortemente influenciada pelas sutilezas relacionais entre o ambiente geográfico e nosso universo sensível. Esse reconhecimento e valorização do patrimônio possuem um poderoso componente emocional, fundamentado no sentimento de pertença de cada indivíduo ou grupo desenvolve na relação com seu ambiente. (SCHEINER, 2005). Gonçalves também reitera estas premissas: mais do que o que se atualmente ressalta como necessário à manutenção dos patrimônios – ser uma atividade consciente e deliberada dos indivíduos – está a necessidade que estes tem de ressonância junto ao grupo. O conceito de ressonância utilizado pelo autor é o de Greenblatt: Por ressonância eu quero me referir ao poder de um objeto exposto atingir um universo mais amplo, para além de suas fronteiras formais, o poder de evocar no expectador as forças culturais complexas e dinâmicas das quais ele emergiu e das quais ele é, para o expectador, o representante (GREENBLATT apud GONÇALVES, 2007, p. 215). 49

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O autor ainda ressalta que os especialistas do patrimônio têm se dedicado a um movimento contrário ao de permitir a ressonância, quando se debruçam em um “trabalho cuidadoso de eliminar as ambiguidades” – as percepções pelos sentidos. Gonçalves destaca que é justamente a ambiguidade, aspecto definidor da sua natureza, que permite uma efetiva “comunicação realizada existencialmente no corpo e na alma dos seus proprietários” (GONÇALVES, 2007, p. 215). Patrimônio, tal como o Museu enquanto fenômeno sócio-cultural, existe na e por uma relação muito específica que se tem nas diferentes realidades, perpassando pela identidade e pela memória, instâncias importantes na definição e constituição de seres pensantes, com uma vida e história para contar. Assim, preservar o sentido de presença e pertença é um modo eficaz de garantir o equilíbrio social e um caminho pacífico para o desenvolvimento econômico. Desejamos que todos os afetados durante a execução deste projeto – direta e indiretamente – percebam que Patrimônio, Memória e Museu não são apenas instâncias identitárias de (re) conhecimento de nós mesmos, mas também do Outro, construindo assim laços fortes.

3. Os frutos do projeto: relato de experiências dos voluntários Citaremos aqui, na íntegra, alguns relatos de voluntários do projeto: “O Museu em seu espaço consegue ter um diálogo com a sociedade, ajudando no seu desenvolvimento, que se faz em sua principal função: presentificar os acontecimentos através da memória e exibir patrimônios, sejam este materiais e imateriais. Na Educação Patrimonial transmitimos estes conceitos a sociedade, no caso deste projeto, adaptamos diferentes diálogos com as crianças, nas escolas. Estas compreendem com clareza o que é um Museu, o reconhecendo como um espaço de memória, que guarda ''coisas'' especiais para a humanidade ou para aquela determinada sociedade. É incrível como em uma conversa sobre patrimônio, estes alunos conseguem fazer uma ótima interpretação do assunto, reconhecendo rapidamente que patrimônio pode ser a sorveteria da praça, a floresta amazônica ou muito mais perto, a receita de doce que nossa avó faz. Especialmente quando levamos as crianças até o Museu, podemos perceber sua reação ao compreender que aquele espaço também é seu, que ele pode estar lá e que é possível dialogar com cada espaço do Museu, que também é um centro de pesquisa.”

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“Acredito nos Museus como espaços de educação não-formal, mas essenciais na construção da cultura, da memória das comunidades. As ações deste projeto são capazes de ajudar os alunos em suas relações sociais e, bem mais que isso, os faz se reconhecerem como atuantes na história. E a nós, integrantes do projeto, nos propicia aprender com as diferenças, nos faz compreender novas linguagens. Cada experiência nos estimula a aprender mais e repassar este conhecimento”. (Evandro Cassimiro de Moraes, discente de História). “Trabalhar com Educação Patrimonial nas escolas com crianças tem sido uma experiência muito marcante. Lembro-me de um fato que me chamou muito a atenção: quando pedimos que elas trouxessem de caso algo que lhes fosse de muito valor, um menino trouxe um celular. Ao perguntarmos porque este celular era muito importante para ele, ele declarou que sua avó havia lhe dado antes de falecer, e por isso lhe era muito importante. E tantas outras experiências no decorrer de nossas atividades.” (Rosalia Menezes de Carvalho, professora do ensino fundamental e membro da comunidade externa). “Meu nome é Lucimar Aparecida da Costa Benini, tenho 22 anos e sou graduanda em História pela Universidade Federal de Alfenas e faço trabalho voluntário no museu da instituição. O trabalho voluntário não é algo que fazemos por imposição de alguém. É um compromisso livremente assumido por cada um. Ao doarmos não esperamos nada em troca, mas caso eu venha necessitar, espero que alguém faça por mim amanhã. Nesse tempo em que me encontro inserida nesse grupo, conheci muitas pessoas, crianças, adultos e adolescentes, e nada mais feliz do que ter como resposta um sorriso lindo estampado no rosto de cada um deles. Ao nos doarmos, acabamos nos respondendo a um impulso humano básico: o desejo de ajudar, de colaborar, de compartilhar alegrias, de aliviar sofrimentos, de distrair e etc. Solidariedade, altruísmo e responsabilidade são sentimentos profundamente humanos e também virtudes, que faz de cada ser humano uma pessoa melhor. Em cada lugar que passamos formos marcados de uma forma, e a alegria era muito e a gratificação ainda maior. No CVT do bairro Santa Luzia é um exemplo, as crianças curiosas para saberem quem era o famoso Quinzinho e a belíssima Belinha, a alegria em querer conhecer o “Nosso Museu” e a formas como se sentiram acolhidos e felizes em conhece-lo. De uma coisa eu tenho certeza, que em parte me sinto realizada em poder levar um pouco de alegria para essas crianças, que muitas vezes não são enxergadas por 51

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todos. Os lugares que moram fazem com que as julguemos marginais, fazendo-as ser exclusas do social. E não é isso o que o nosso grupo faz, mas sim, fazer com que as mesmas venham compartilhar, conhecer e contribuir para o conhecimento, fazendo com que sejam inclusas na sociedade. Não é uma atividade fria, racional e impessoal. É relação de pessoa a pessoa, oportunidade de se fazer amigos, viver novas experiências, conhecer outras realidades. Ao nos preocuparmos com os outros, ao nos mobilizarmos por causas de interesse social e comunitário, estabelecemos laços de solidariedade e confiança mútua que nos protegem a todos em tempos de crise, que tornam a sociedade mais unida e fazem de cada um de nós um ser humano melhor. Sei que durante o tempo em que eu estiver em Alfenas buscarei de contribuir de alguma forma para que esse projeto continue e que possamos possibilitar e levar muito mais alegrias para essas crianças e jovens. Obrigada a todo o grupo Educação Patrimonial por terem me dado a oportunidade de fazer parte.”

4. Considerações finais: um projeto e um museu criando conexões O presente projeto baseia-se nas seguintes frentes de ação: Pré-atividades Neste período foram discutidas as bases teóricas que orientarão as atividades a serem desenvolvidas. Esta fase já foi desenvolvida no período de agosto a novembro de 2012. No entanto, a qualquer momento em que a equipe julgar necessário, serão rediscutidas as abordagens e conceitos a serem trabalhados. Vale ressaltar que toda a equipe já apresentada construiu este projeto e as atividades propostas, e portanto não trata-se de uma abordagem idealizada por um docente e/ou especialista. Atividades - As atividades foram divididas em três partes: 1. Primeiro contato e apresentação dos conceitos de Museu e Patrimônio - Neste momento, trabalhamos com as crianças a premissa de que as instâncias museu e patrimônio não estão além delas: elas mesmas constroem, identificam e percebem seus patrimônios. Ainda, visamos o entendimento de que museu está além do senso comum "lugar de coisas velhas”. Ele pode ser visto, em sua concepção macro, como o próprio mundo em que vivemos; 2. Aplicação do conceito de Museu - No segundo encontro, o objetivo é entender, na prática, como se constitui um museu. Museus, em sua maioria, são constituídos por objetos que 'contam' mais sobre nossas histórias pessoais do que sobre si mesmos. 52

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Faz-se necessário entender que Museu se constitui exatamente nesta relação que estabelecemos com nossas identidades e memórias, a partir destes “fragmentos” de nossas relações; 3. Aplicação do conceito de Museu, Patrimônio Material e Imaterial - Neste momento explicitamos, na prática, como todo tipo de museu e de patrimônios são importantes, sejam os constituídos pela UNIFAL-MG ou pelas próprias crianças. Visamos reforçar que patrimônios estão em todos os lugares, bastando que alguém reconheça e tome como seu. Caso a atividade seja desenvolvida em outro município e não seja possível o deslocamento – tanto da equipe quanto das crianças – por mais de um momento, todas as atividades serão condensadas em um só encontro, de até 04 (quatro) horas de duração. Neste caso, as atividades serão pré-estabelecidas pela equipe, de acordo com cada caso e necessidade. Ainda, ocorreram as seguintes atividades: Dia 14/03/2013 - Apresentação na 4ª. Festa do Marolo; Dia 26/09/2013 – Atividade "Relembrando" no Cáritas, com atividades que visaram reforçar o entendimento das crianças sobre o conceito de museu e patrimônio - desenhos, conversas e brincadeiras de "Caça ao Tesouro", com dicas que remetiam aos conceitos apresentados. Ainda

no

ano

de

2014,

juntamente

com

o

grupo,

intencionamos

elaborar/planejar propostas de educação patrimonial para a comunidade acadêmica, cujo recorte espacial e de grupo será decidido durante este processo, a ser apresentado no relatório final à Pró-Reitoria de Extensão. Já recebemos convites para darmos continuidade às apresentações nas cidades de Paraguaçu (no Centro Social Juvenato) e Divisa Nova, na Região Sul Mineira. Reforçamos, através desta proposta, que ensino com extensão e pesquisa aponta para uma formação contextualizada às questões da sociedade contemporânea (entendendo, portanto, educação patrimonial como uma questão da sociedade contemporânea): Ao reafirmar o compromisso social da Universidade como forma de inserção nas ações de promoção e garantia dos valores democráticos, de igualdade e desenvolvimento social, a extensão se coloca como prática acadêmica que objetiva interligar a universidade, em suas atividades de ensino e pesquisa, com as demandas da sociedade. (UFRJ, 2006).

O projeto propicia a todos os membros oportunidades de (re) aprendizagem sobre conceitos de museu, patrimônio, memória e cultura, na troca de experiências, 53

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leituras e saberes entre os profissionais presentes no projeto e os discentes e, mais ainda, (re) aprendizagem sobre si mesmo com a vivência possibilitada pela execução da proposta.

Agradecimentos À Pró-Reitoria de Extensão; ao Prof. Dr. Claudio Carlan; aos demais voluntários: Agueda Bueno de Almeida Novais; Ana Paula Passos Pereira; Camila dos Reis Silva; Carlos Antônio da Silva; Eloíse Iara Braghini David; Gabriel Barreto Lopes; Jemima Rodrigues Costa; Lárame Silva Carvalho; e Marly Teodora Nogueira.

Referências BRAYNER, Natália Guerra. Patrimônio Cultural Imaterial: Para saber mais. IPHAN/Minc: 2007. Catálogo. p. 18-23. CARVALHO, Luciana Menezes de; SCHEINER, Tereza. Construindo o “discurso” do Patrimônio: das organizações internacionais e institutos nacionais a uma relação profunda entre o homem e o patrimônio – o caso do Marolo, em Paraguaçu, Minas Gerais. In: II SEMINÁRIO DE INVESTIGAÇÃO EM MUSEOLOGIA DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA E ESPANHOLA. Argentina, 2010, p. 446-460. CHAGAS, Mário. Imaginação Museal: Museu, Memória e Poder em Gustavo Barroso, Gilberto Freyre e Darcy Ribeiro. 2003. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Programa de PósGraduação em Ciências Sociais - PPCIS. Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ, Rio de Janeiro, 2003. FUNARI, Pedro Paulo A.; PELEGRINI, Sandra C. A.; RAMBELLI, Gilson (orgs.). Introdução. In: Patrimônio Cultural e Ambiental. Questões legais e conceituais. São Paulo: Unicamp/Nepam, 2009. p. 9. GARCIA CANCLINI, Néstor. Culturas Híbridas: estratégias para entrar e sair da Modernidade. Trad. Heloísa Pezza Cintrão, Ana Regina Lessa. 2ª ed. São Paulo: EDUSP, 1998. GONÇALVES, José Reginaldo Santos. Antropologia dos Objetos: Coleções, Museus e Patrimônios. Coleção Museu, Memória e Cidadania: Rio de Janeiro, 2007, 256p. LEMOS JUNIOR, Clésio Barbosa. Patrimônio Cultural: Conceitos, proteção e direito pela Educação Patrimonial. In: Anais da III Semana Nacional de Museus na Unifal-MG: p. 1-14. 2011. Museums and Tourism. ICOM NEWS, vol. 62, nº 1, ano 2009. O QUE É MUSEU? Disponível em: < http://www.museus.gov.br/sbm/oqueemuseu_apresentacao.htm >. Acesso em: 15 dez. 2012. REFERÊNCIAS para uma Política Institucional de Integração Ensino – Pesquisa - Extensão na UFRJ: subsídios para o Seminário de Flexibilização Curricular. UFRJ, 2006. Disponível em: < http://www.sr5.ufrj.br/historico_noticia/agosto/flexibilizacao_curricular.pdf >. Acesso em: 29 jun 2009. SCHEINER, Tereza. Apolo e Dionísio no templo das musas – Museu: gênese, idéia e representações na cultura ocidental. 1998. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social) – Escola de Comunicação Social, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1998. 152 p. Orientador: Paulo Vaz. _________. As bases ontológicas do Museu e da Museologia. In: SIMPÓSIO MUSEOLOGIA, FILOSOFIA E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA E CARIBE. ICOFOM LAM, Coro, Venezuela, Subcomitê Regional para a América Latina e Caribe/ICOFOM LAM, p. 133-164, nov/dez 1999.

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Imagens Autoria: Museu da Memória e Patrimônio, 2013.

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AS COLEÇÕES DO MUSEU NACIONAL NO SÉCULO XIX: PATRIMÔNIO CULTURAL E IDENTIDADE NACIONAL PELA PERSPECTIVA DOS NATURALISTAS Walter Francisco Figueiredo Lowande1

Resumo Neste artigo trataremos das estratégias discursivas empreendidas por meio das coleções do Museu Nacional, sobretudo no que diz respeito aos objetivos de construção de uma ideia de nação e de identidade nacional. Para isso apresentaremos os principais aspectos das práticas expositivas dessa instituição ao longo do século XIX, a fim de demonstrar as diferentes feições museográficas que a ideia de nação assumiu por força dos anseios do poder público e dos paradigmas biológicos e antropológicos em vigor. Desse modo, veremos que, embora a ideia de nação tenha se orientado neste período principalmente pela de “civilização”, as estratégias discursivas de produção de identidades possuem sua própria historicidade e complexidade.

Palavras-chave: Museu Nacional. Identidade nacional. Coleções. Discurso museográfico. Abstract In this paper we will focus on museographical discursive strategies of National Museum, especially with regard to the aims of building an idea of nation and national identity. Then we will present the main aspects of the National Museum exhibition practices throughout the nineteenth century in order to demonstrate the different museographical features that the nation idea has taken under the wishes of the government and to biological and anthropological paradigms of that time. Thus, we will see that, although the nation idea had been guided primarily in nineteenth century by the other idea of “civilization”, the discursive strategies of identity production had their own historicity and complexity.

Keywords: National Museum. National identity. Collections. Museographical discourse.

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ICHL/UNIFAL-MG. 57

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O Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, tem sido legitimado nesses seus quase dois séculos de existência por um papel que seus funcionários nunca deixaram de cumprir: o de tentar atestar materialmente a existência de um ente cultural autônomo a que se poderia chamar de nação. No entanto, a ideia de nação possui uma historicidade que lhe é própria, sempre na dependência de uma articulação convincente entre experiência do passado e expectativa do futuro. Isso torna a autenticação de uma identidade nacional tarefa complexa, sempre a cobrar uma atualização narrativa que dê conta dessa carência de sentido emanada da necessidade de pertencimento a uma nacionalidade. Neste artigo pretendemos captar a historicidade da construção narrativa da ideia de nação por meio das exposições do Museu Nacional, focando na forma pela qual suas coleções foram constituídas e expostas no século XIX, de modo que possamos perceber como se forjou, desde então, uma ideia específica de patrimônio cultural brasileiro.

1.

Identidade nacional e coleções museográficas Em primeiro lugar, pensamos “nação” como um conceito histórico moderno, na

esteira das proposições de Reinhart Koselleck (1999, 2004, 2006). Trata-se, portanto, de um signo linguístico que contém em seu interior tanto uma concepção de passado que se pode vivenciar por referência à experiência do tempo pretérito, quanto uma concepção de futuro que se pode ser previsto com base numa ordenação dessa mesma experiência até o tempo presente. A partir do momento em que o conceito de nação pode ser pensado nesses termos, ele permite igualmente uma ação no mundo social orientado pelo sentido que fornece. Contudo, essa espécie de “metaconceitualização” dos conceitos históricos, por si só, não explica como eles operam no mundo social fornecendo sentido para as ações cotidianas e produzindo identidades coletivamente partilhadas. Esses conceitos históricos precisam fazer referência a narrativas históricas, pois é por meio delas que o passado adquire um sentido considerado válido e conectado ao presente. As narrativas históricas operam com um conjunto de elementos cujo intuito é garantir que o passado sobre o qual se fala é verdadeiro – ou seja, que as experiências do passado podem ser verificadas nos seus indícios (GINZBURG, 1990) que subsistem no presente –; que apoiam a seleção dos dados recolhidos com base nos valores do presente; e, por fim, que fornecem sentido para esse conjunto de dados com base em ideias de sentido consideradas válidas por meio de argumentações teóricas. Jörn Rüsen (2001), por exemplo, mostra como as narrativas 58

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historiográficas cumprem essa função de suprir carências de sentido e de identidade a partir de uma “matriz disciplinar” própria à historiografia. François Hartog (2013), por seu turno, exemplifica como, em diferentes “regimes de historicidade”, o patrimônio histórico foi usado na frança como forma de legitimação do Estado nacional. O patrimônio histórico e cultural cumpre na produção dessas narrativas um papel primordial. Por serem visíveis e até palpáveis, determinados bens tendem a ser protegidos e cristalizados no tempo a fim de confirmar certas visões narrativas do mundo em detrimento de outras. Por exemplo: a partir do momento em que habitações construídas na América Portuguesa no período que antecede a independência política brasileira são tidas como espaços privilegiados para a compreensão da formação cultural brasileira, os restos dessas habitações passaram a ser protegidas como prova dessas “narrativas formativas”2. Mas a historiografia (ou seja, os textos de história) não é a única forma pela qual um conceito histórico pode se amparar em busca de sentido. As coleções museográficas também cumprem esse papel. Ao ordenar no espaço os próprios artefatos do passado de modo a indicar como um determinado aspecto da vida humana se desenrolou no tempo, por meio de uma disposição cronológica dos objetos ou pela mera apresentação de uma alteridade apoiada no tempo ou no espaço, o museu produz sentido de forma potencialmente mais eficaz que um texto de história, que apenas consegue se referir indiretamente aos indícios apresentados em sua própria presença imediata num museu. Gunter Kress e Theo van Leeuwen (2006) chegam mesmo a propor uma gramática para a comunicação por meio de imagens. Por sua vez, Ulpiano Menezes (2005) tem insistido de modo convincente no potencial de produção do conhecimento histórico ao qual nos referimos por meio dos acervos museológicos. Além disso, o museu, sobretudo em sua forma tradicional (à qual podemos ligar o Museu Nacional do Rio de Janeiro), possui um apelo comunicativo especial que o aproxima do mundo do sagrado. Está claro que os museus, tradicionalmente, foram pensados como espécies de templos cívicos, nos quais se deve adentrar com respeito e devoção pelas relíquias únicas ali depositadas e exibidas. Os livros de história, em sua reprodutibilidade cada vez menos limitada, sobretudo na era da digitalização, dificilmente podem competir com a aura de autenticidade que o caráter único do museu oferece (cf. BENJAMIN, 2000). A própria necessidade de deslocamento para tomar contato com o conhecimento à disposição

2

Aqui fazemos menção ao caso do SPHAN, criado em 1937 e ainda hoje atuante. A literatura sobre o patrimônio histórico e artístico nacional protegido pelo SPHAN é hoje abundante, e, a fim de não nos repetirmos aqui, nos restringiremos a fazer menção a uma tentativa de análise dessa historiografia em LOWANDE, 2013a. 59

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em um museu lembra as peregrinações às cidades santas, às quais os fiéis se dirigem em busca do sagrado. Mas algo ainda deve ser escrito aqui sobre a especificidade que o conceito de nação adquire entre no Brasil. A nação é sempre pensada tendo por base uma tradição; no entanto, trata-se de uma tradição que se liga a uma dada ideia de futuridade, isto é, de um ente em transformação. Dependeria daqueles que se vêm investidos da identidade nacional realizar esse futuro prometido, tempo ideal em que a pátria concederia a seus filhos as tão sonhadas prosperidade e felicidade a que estariam destinados. Acontece que essa futuridade precisa se apoiar em outro conceito histórico, pois a busca de um futuro nacional deve seguir um modelo que já se sabe eficaz por intermédio de algum conhecimento tido por válido. No Brasil, e essa é nossa principal hipótese, esses conceitos auxiliares foram, respectivamente, o de “civilização”, de “progresso” e de “modernidade”, sobretudo por se tratarem de conceitos ligados diretamente a discursos considerados científicos3. Chamamos aqui de “civilização” o modelo ideal de Estado que, à época do Império, era representado pelas nações europeias. “Progresso”, por sua vez, era a marcha ordeira que devia seguir a nação brasileira, por meio de um rumo cientificamente orientado, de modo a se equiparar com as sociedades cujo avanço tecnológico servia de modelo para as outras ainda em situação de atraso, como o Brasil. Por fim, “modernidade” é o estágio alcançado autonomamente por nações que passariam a reconhecer sua originalidade, percebendo então a necessidade de pensar em modelos próprios de modernização, desvinculados de padrões culturais importados e tomados como ineficazes para formações histórico-sociais específicas, a exemplo da brasileira. Essas tipificações acima esboçadas não se apresentam, obviamente, de forma pura nos períodos que serão enfocados, e nem correspondem a qualquer tipo de consenso absoluto. No entanto, nos permitem compreender de que forma as ideias de nação correspondiam mais diretamente às exigências do poder em períodos diversos do Estado brasileiro, e, nesse sentido, o Museu Nacional serve com uma importante evidência de como o poder público investia na construção de determinados modelos de identidade coincidentes com suas expectativas de ordem social. Neste artigo focaremos na ideia de uma “nação civilizada nos trópicos”, conforme apresentada pelas coleções do Museu Nacional no século XIX.

3

Poderíamos ainda falar num conceito de “desenvolvimento”, este um pouco mais recente, se não nosso contemporâneo. 60

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2.

“Nação e civilização nos trópicos” O “Museu Real” foi criado pelo Decreto de 06 de junho de 1818, por D. João VI,

num contexto de transferência do complexo institucional centralizador da Corte para o novo centro tropical do Império Português. Assim se justifica, no texto legal, a criação dessa instituição museológica: Querendo propagar os conhecimentos e estudos das sciencias naturaes no Reino do Brazil, que encerra em si milhares de objectos dignos de observação e exame, e que podem ser empregados em beneficio do commercio, da industria e das artes que muito desejo favorecer, como grandes mananciaes de riqueza: Hei por bem que nesta Côrte se estabeleça hum Museu Real [...]4

As “ciências naturais” são tomadas nesse decreto como condição da produção de “riqueza” no Reino do Brasil por meio de seus três “mananciais”: o comércio, a indústria e as artes. No entanto, “riqueza” deve ser tomada aí tanto em seu sentido material quanto simbólico. Do ponto de vista material, o estudo dos elementos naturais brasileiros deveria gerar saberes úteis relacionados à exploração econômica do meio. Do ponto de vista simbólico, a nação portuguesa precisava exibir um alto nível de conhecimento e de domínio da sua própria natureza, exuberante, mas ainda pouco conhecida em seus domínios americanos, pois, sobretudo a partir do Iluminismo, o grau de desenvolvimento científico e tecnológico de um povo passa a ser visto como indicador do seu estágio civilizacional. Desse modo, os dois tipos de riqueza concorriam para o mesmo fim: o engrandecimento da nação portuguesa, agora centrada em seu domínio tropical. O advento da independência política brasileira

trouxe consigo

questões

fundamentais de cunho identitário: em que medida a nova nação seria diferente de Portugal? Ela poderia se equiparar às nações europeias? Manoel Salgado Guimarães (1988) nos forneceu importantes elementos para compreender como esse problema foi processado por meio da historiografia produzida no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB). No século XIX, a vida social passava a ser organizada mundialmente em torno da ideia de um “concerto das Nações” definidas por identidades e projetos específicos. No entanto, o modelo de nações brancas europeias esbarrava na diversidade étnica do território brasileiro. Tratava-se de uma população mestiça e desigual. Mas era necessário criar uma cultura horizontalizada em que se destacasse o que de europeu havia no Brasil, ou seja, a herança portuguesa da nova nação, e o conhecimento que passou a se produzir sobre esse legado inseria-se igualmente num projeto de dominação das elites detentoras do poder político e econômico do Estado-nação em processo de cunhagem.

4

Arquivo Central do IPHAN, Série Inventários, AA01/M033/P01/Cx. RJ104/P. 02. [Decreto de 06 de junho de 1818], s.l., s.d. Cópia imp., 2p. 61

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Guimarães demonstrou o modo pelo qual esse projeto ideológico foi construído por intermédio das narrativas historiográficas produzidas no âmbito do IHGB. Tratava-se de uma “concepção herdada do iluminismo, de tratar a história enquanto um processo linear e marcado pela noção de progresso”, no qual se tentaria “recuperar a cadeia civilizadora, demonstrando a inevitabilidade da presença branca como forma de assegurar a plena civilização” (GUIMARÃES, 1988, p. 11). Desse modo, produziam-se tanto “histórias exemplares”, sedimentando no panteão da história nacional a sua aristocracia branca, quanto se lançava mão de um saber etnográfico a definir o “outro”, no caso os indígenas e africanos cuja “inferioridade” demandaria a orientação pelo elemento branco. O então “Museu Real” (que se tornaria em seguida “Museu Imperial” para, finalmente, com o advento da República, passar a ser chamado de “Museu Nacional”) foi encarregado de fornecer, portanto, as evidências materiais desse duplo discurso: o da opulência nacional e o da elaboração racial de uma ideia de nacionalidade. E assim produzirá o seu próprio discurso sobre a nação.

3.

As riquezas naturais da pátria A princípio era o modelo do “gabinete de curiosidades” que prevalecia na

organização das coleções do Museu Nacional. Na verdade, esta ordenação expositiva perdurou ainda por muito tempo, como se depreende da matéria que o Correio da manhã do dia 9 de abril de 1947 dedicou à reabertura da instituição após a reforma por que passou durante a gestão de Heloisa Alberto Torres: “O Museu Nacional perdeu o seu aspecto de casa de bric-à-brac, com mostruários apinhados de curiosidades que falavam mais aos olhos que à inteligência – para adquirir a de uma verdadeira escola de Etnografia e História Natural”5. Esse modo de expor objetos, no entanto, não deve ser considerado caótico ou aleatório. Comum aos museus de “história natural” que se multiplicam no século XIX (SCHWARCZ; DANTAS, 2008), na verdade esse modelo expositivo pautava-se na taxionomia moderna fundada por Carl von Linné, em que, grosso modo, os artefatos são dispostos lado a lado numa classificação hierárquica do mundo natural, numa gradação que 5

Arquivo Central do IPHAN. AA01/M033/P01/Cx. RJ104/P. 03, Recorte de jornal. O Museu Nacional em sua nova fase. Correio da manhã. Rio de Janeiro, 09.04.1947. A partir da gestão de Torres, os salões da antiga residência imperial passaram a expor os objetos guardados pelo Museu nos moldes de uma narrativa evolucionista, com base na ideia da evolução específica da fauna, flora e culturas autóctones brasileiras, mostrando a originalidade de sua inserção na cadeia evolutiva mais ampla, natural e cultural, do planeta (LOWANDE, 2012). Mas então já nos encontrávamos sob a vigência de uma ideia de nação que se orientava rumo à “modernidade”, e não mais sob os ideais de civilização trazidos do mundo europeu. 62

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ia da menor para a maior complexidade. Trata-se, portanto, de um discurso museográfico muito útil à perspectiva eurocêntrica que se forja como justificativa para a colonização de outros povos durante o século XIX: o dominado é apresentado como o exótico inferior e incivilizado por meio das coleções adquiridas nas viagens exploratórias do colonizador 6. Luiz de Castro Faria destaca a respeito do período português do Museu (18181822) o seu caráter utilitário, a pequena participação da instituição na vida cultural da capital e a desorganização de seu acervo7. Heloísa Bertol Domingues também destaca o utilitarismo que marcou a instituição desde seu início (DOMINGUES, 2010, p. 647). O acesso público era ainda muito restrito, pois a mentalidade de “gabinete do príncipe”, acessível apenas aos espíritos mais dignos e ilustres, ainda prevalecia 8. No entanto, com o advento da independência política do país o acervo do Museu vai tomando corpo e logo já começa a se distinguir pelo valor de raridade de suas coleções, pela autoridade que começa a adquirir no que tange à produção de conhecimento sobre a flora, fauna e populações autóctones do território nacional e pelo reconhecimento internacional por meio da constituição de redes internacionais de intelectuais. Castro Faria menciona a “célebre coleção mineralógica de Werner”, que era o “orgulho do Museu Real e durante muito tempo foi provavelmente a única coleção cientificamente organizada do seu acervo heterogêneo”. Além disso, com base no primeiro inventário das coleções da instituição, produzido em 1838 durante a gestão de Frei Custódio Alves Serrão 9, pode afirmar que “já figuravam ali quase todas as coleções exóticas que hoje possuímos, de quase nada acrescidas posteriormente – a coleção egípcia [...]; a coleção africana; a coleção oceânica; a coleção da América boreal – todas elas ainda em exposição atualmente”10.

6

Um exemplo emblemático desse modelo expositivo é o conjunto de coleções obtidas pelo britânico James Cook e organizadas por Ashton Lever no Leverian Museum, ou simplesmente Holophusicon, à época um importante concorrente do British Museum (KAEPPLER, 2011). 7 Arquivo Central do IPHAN, série Inventários, AA01/M033/P01/Cx. RJ104/P. 02. FARIA, Luiz de Castro. As exposições de Antropologia e Arqueologia do Museu Nacional. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional/MES/MN, 1947. Datil., 24p, p. 1-2. 8 Em decreto datado de 24 de outubro de 1821 determina-se o seguinte: “[...] que faculte a visita ao Museu, na quinta-feira de cada semana, desde as 10 horas da manhã até 1 da tarde, não sendo dia santo, a todas as pessoas, assim estrangeiros como nacionais, que se fizerem dignas pelos seus conhecimentos e qualidades; e que para conservar-se em tais ocasiões a boa ordem e evitar-se qualquer tumulto, tem o mesmo Senhor [o Conselheiro Inspetor Geral dos Estabelecimentos Literários] ordenado pela repartição da Guerra que no referido dia se mandem alguns soldados da Guarda Real de Polícia para fazer manter aí o sossego que é conveniente” (Ibid., p. 2-3). 9 Nomeado em 1828 para o cargo de diretor do Museu, Frei Custódio, professor de física e de química na Escola Militar, “viria em princípio”, segundo Castro Faria, “dar maior realce ao papel de consultor sobre matérias de interesse econômico que o Museu desempenhava desde a fundação” (Ibid., p. 4). 10 Ibid., p. 5. Na última visita que fizemos ao Museu Nacional, em 2013, essas coleções continuavam em exposição. 63

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Ainda segundo Castro Faria é possível afirmar que as coleções indígenas já se destacavam. Afiguravam-se, a princípio, como mais um grupo de objetos curiosos, mas logo foram enriquecidas e se tornaram bastante significativas. Para tanto, concorreram os contatos de José Bonifácio de Andrada e Silva, ministro do Império, com os naturalistas que percorriam o território brasileiro (Natterer, Langsdorff, Sellow), “solicitando material para o Museu e oferecendo como recompensa todas as facilidades oficiais, que pudessem favorecer os seus trabalhos no interior das províncias”11. Outra iniciativa tomada no sentido de ampliação das coleções do Museu foi a circular dirigida aos presidentes de província por Estevam Ribeiro de Resende, Ministro do Império e mais tarde marquês de Valença, em que se determinava a remessa de “todos os produtos naturais dos seus territórios”

12

. Ainda no

relatório de 1838, lia-se que as coleções indígenas compunham-se de “vestimentas; carapuças, cetros de penas matizadas de diferentes cores; enfeites de forma as mais variadas; armas de caça, de pesca e de guerra e mais de duzentos artefatos diferentes, peculiares a muitas tribos dos aborígenes do Brasil”13. Não se deve imaginar, contudo, que esses dados significassem especial cuidado do Império para com a instituição museológica. Só depois de vários apelos as coleções do Museu Nacional puderam contar com maiores cuidados, e os artefatos etnográficos foram alocados numa divisão específica por força do regulamento de 3 de fevereiro de 1842, que criava o setor “De numismática, artes liberais, arqueologia, usos e costumes das nações antigas e modernas”14. De todo modo, podemos perceber que estava em movimento, ainda que de modo tímido, uma política pública de produção de discursos sobre a opulência nacional, sobre a diferenciação dos povos e sobre as especificidades da nação brasileira. As “coleções exóticas” mencionadas por Castro Faria, que antes ou pertenciam às coleções particulares dos Orleans e Bragança ou foram arrematadas em hasta pública, nos parecem figurar no Museu como que por uma espécie de imitação dos impérios europeus no que diz respeito à exibição do poder pela espoliação simbólica dos povos dominados – é certo que os artefatos do Museu não foram adquiridos pela guerra ou pelo patrocínio de expedições científicas próprias, mas ao menos poderiam dar assim a impressão de colocar o Império do Brasil ao lado das nações colonialistas, e não das colonizadas. Já as coleções advindas dos “produtos naturais” do território nacional – e aqui é necessário incluir as peças indígenas, pois que o “outro” à época era um objeto de estudo da história natural –, deveriam ter o encargo, nos dizeres de Ladislau Netto, de “ilustrar o

11

Ibid., p. 3. Ibid., p. 4. 13 Ibid., p. 5. 14 Ibid., p. 6. 12

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povo, dando-lhe pela melhor classificação e disposição dos objetos que possuía uma ideia aproximada dos dons e magnitudes da natureza de sua pátria”. As coleções ameríndias merecem nossa especial atenção, pois elas vão tomando corpo no Museu Nacional ao mesmo tempo em que se começa a esboçar uma cultura “indianista” no país, valorizadora do “tronco tupi”, seja por meio do IHGB ou de uma literatura romântica idealizadora do elemento indígena – nos moldes da percepção idílica do mundo medieval europeu em suas manifestações literárias românticas.

4.

Poligenismo racial A partir dos anos de 1840 é que o Museu Nacional começa a adquirir um papel

realmente estratégico na tarefa mais ampla de construção nacional. Em primeiro lugar, essa instituição estava diretamente ligada à descoberta de riquezas naturais nacionais, por intermédio de expedições ao interior do país, especialmente agrícolas e minerais, realizadas a partir da década de 1850 (KEULLER, 2008, p. 90). Por outro lado, o conhecimento das populações indígenas passava a ser valorizada, como já assinalamos, em meio a um cenário intelectual marcado por um movimento romântico, em que se prezava tanto pelas riquezas naturais do país quanto pelo conhecimento das populações “exóticas” de seu interior, sobretudo num momento em que se discutia a viabilidade de substituição da mãode-obra escrava pela indígena (cabe lembrar que o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro havia sido criado em 1838). Segundo Keuller, “conhecer e descrever os povos indígenas era a tarefa instituída pela etnografia, por isso a importância de se mapear as grandes famílias indígenas no Brasil classificando-as como selvagens ou civilizadas a partir de critérios como organização social e familiar, religião, aspectos da língua e técnicas” (KEULLER, 2008, p. 55). Heloisa Domingues destaca a inserção do Museu Nacional na política econômica brasileira de então. O Brasil portava-se como exportador de matérias-primas no cenário econômico mundial. Segundo a autora, para o Brasil, este movimento de explorações foi importante, pois significou a abertura de caminhos e o conhecimento do interior, desconhecido até mesmo por sua própria sociedade. As pesquisas que sobrevieram, como se sabe, serviram para desvendar conhecimentos sobre a natureza, cujas riquezas foram cantadas e decantadas em prosa e verso, consideradas símbolo da nação. O Brasil era representado pela opulência das suas riquezas naturais, cuja exploração científica resultou no colecionismo de objetos da natureza que fizeram a grandeza dos museus de história natural no século XIX, entre eles o Museu Nacional do Rio de Janeiro, que logo foi inserido na rede internacional das ciências naturais, estabelecendo relações de troca sistemática de material e de bibliografia com congêneres do mundo inteiro (DOMINGUES, 2010, p. 627-628). 65

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D. Pedro II foi, em grande medida, responsável pelo fortalecimento do Museu Nacional neste período. Regina Dantas e Lilia Schwarcz mostram como a coleção particular do Imperador e a do Museu Real por vezes se confundiam (SCHWARCZ; DANTAS, 2008). Além disso, o próprio D. Pedro II se incumbiu de dialogar com as instituições congêneres do mundo europeu e de receber coleções particulares, entregues ao Museu, em troca de títulos e benesses. Assim, o Imperador espelhava a feição que queria atribuir à jovem nação tropical, ou seja, a de um povo civilizado pela ciência, pelo conhecimento de suas riquezas naturais, fartamente representadas numa instituição que aos poucos deveria se comparar às melhores do gênero no mundo. Contudo, foi somente a partir da década de 1870 que a antropologia tomou destaque dentro do Museu Nacional. Esse período coincide, segundo Schwarcz, com a emergência de “um discurso científico evolucionista como modelo de análise social. Largamente utilizado pela política imperialista europeia, esse tipo de discurso evolucionista e determinista penetra no Brasil a partir dos anos 70 como um novo argumento para explicar as diferenças internas” (SCHWARCZ, 1993, p. 28)15. Havia agora, portanto, maior interesse pelo estudo de tribos ditas “botocudas” que pelas tribos “tupis”, uma vez que as primeiras, segundo os cientistas do Museu Nacional, aproximavam-se mais do homem primitivo16. O estudo dessas tribos faria do Brasil, desse modo, um importante locus de pesquisa científica, pois que poderia trazer importantes esclarecimentos acerca da origem da humanidade, dada a suposta proximidade, física e cultural, que os “botocudos” guardariam com os primeiros hominídeos. Embora apartados da civilização, considerados mesmo uma espécie distinta de ser humano, esses povos deveriam ser preservados pelo seu valor científico17. Esse período representou também outras mudanças na instituição. Em primeiro lugar, o Museu Nacional se tornou o mais importante centro de pesquisas na área das ciências naturais da América Latina, firmando seu prestígio junto ao governo imperial e, posteriormente, federal. Num cenário em que a biologia produzia o discurso científico mais autorizado para tratar da evolução humana, o Museu Nacional passou a ser uma importante 15

Com as gestões de Ladislau Netto (1870-1893) e de João Bastista de Lacerda (1895-1915), o Museu Nacional passa a ser reconhecido como uma das mais importantes instituições científicas da América Latina. Neste período é criada uma divisão específica para a antropologia, a importante publicação Archivos do Museu Nacional e são instituídos os primeiros cursos de antropologia do país. A instituição passa agora a se estruturar nos moldes dos grandes museus europeus congêneres, passando a participar ativamente do debate científico da época. Em 1882 é realizada a Exposição Antropológica Brasileira no Museu, com o consequente incremento de suas coleções. 16 Sobre essa visão reducionista a respeito das tribos indígenas nacionais, cf. MONTEIRO, 2001. 17 Embora houvesse outros naturalistas que, como Hermann von Ihering, primeiramente funcionário do próprio Museu Nacional e depois diretor do Museu Paulista, tivessem chegado a defender seu extermínio. A respeito desta polêmica, cf. BREFE, 2005. 66

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referência à época para a compreensão da cultura nacional, investigando cientificamente as possibilidades de seu desenvolvimento, a pertinência ou não da miscigenação e produzindo um conhecimento sistemático sobre um patrimônio nacional que era representado pelas riquezas naturais e científicas do país, incluindo-se aí suas diversas culturas “primitivas”. O patrimônio cultural da nação se confundia, portanto, com seu patrimônio científico. Cabe destacar que o caráter pedagógico do Museu Nacional foi “reforçado” no período. Keuller remarca “o caráter pedagógico sugerido às coleções do Museu Nacional [pela reforma de 1890] que serviam para informar o público sobre os conhecimentos das seções e também para mostrar-lhe a importância e incutir-lhe o ‘gosto’ pelas instituições científicas” (KEULLER, 2008, p. 72). Assim, buscava-se a valorização do conhecimento científico de modo a legitimar um discurso nacionalista de bases biológicas.

5.

Conclusões Vemos então que, nesse primeiro século de atividade do Museu Nacional,

predominou um “discurso etnográfico” (TURIN, 2011) específico. O fenômeno da alteridade humana passava a ser estudado a partir dos paradigmas oferecidos pelas ciências naturais, em especial pela biologia, dado o crescente descrédito das explicações teológicas sobre a origem da vida e as recentes descobertas sobre a evolução das espécies e da antiguidade do homem. Ante o problema da inserção ou não de negros e índios no mundo “civilizado” que se pretendia erguer no país, a antropologia física acabou defendendo a inaptidão desses grupos étnicos para uma vida civilizada. Medições antropométricas e exposições de crânios demonstravam não apenas a inferioridade dos grupos não-brancos, mas sua ahistoricidade. Se indígenas e negros eram tomados como tipos inferiores do ponto de vista biológico e, por conseguinte, incapazes de um desenvolvimento moral, seriam, portanto, incompatíveis com uma nação, que só existiria dentro de uma história em constante progresso. Esse foi o discurso etnográfico hegemônico que, na virada do século, era expresso não apenas em textos científicos, mas nas exposições organizadas no Museu Nacional, templo guardião do patrimônio científico da nação. Com o desenvolvimento da antropologia cultural, esse paradigma racista vai sendo aos poucos abandonado, sobretudo durante as gestões de Edgard Roquette-Pinto (19261935) e Heloisa Alberto Torres (1937-1955). Mas já então a antropologia, sobretudo aquela praticada no Museu Nacional, figurava como discurso autorizado para a definição da cultura e, por conseguinte, de uma identidade nacional. As coleções arqueológicas e etnográficas deviam ser protegidas pelo governo federal como patrimônio nacional (TORRES, 1937) e, antes mesmo da criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), 67

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em 1937, fundava-se, em 1933, o Conselho de Fiscalização das Expedições Artísticas e Científicas no Brasil, órgão federal dominado pelos membros do Museu Nacional (GRUPIONI, 1998), que visava impedir a saída do Brasil de material coletado em expedições realizadas no território nacional. O próprio Serviço de Proteção aos Índios passou a se preocupar cada vez mais, por conta da ação direta dos antropólogos do Museu Nacional neste órgão, com a proteção das tribos indígenas em sua totalidade, consideradas elas próprias um patrimônio cultural vivo (LOWANDE, 2014). Mesmo o SPHAN adotou o modelo conhecido pelo Decreto-Lei nº 25 de 1937 após tensas negociações com a centenária instituição museológica (LOWANDE, 2013b) e, além disso, o Museu continuou dirigindo as atividades que no SPHAN se relacionavam aos bens arqueológicos e etnográficos (SIMÃO, 2008). Por fim, as próprias exposições adquiriam um novo caráter, pautado numa narrativa evolucionista produzida com objetos, por meio da qual o Brasil era incluído, em sua especificidade, na cadeia evolutiva cultural e natural do globo. Forjava-se assim claramente uma noção de patrimônio cultural para além da pedra-e-cal18, a ser tutelado de forma centralizadora por uma nova nação, ou melhor, por um “Estado Novo”.

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Essa referência diz respeito a uma concepção pejorativa, forjada no interior da própria instituição, a respeito das ações desenvolvidas pelo SPHAN em sua “fase heroica”, pautada, segundo essa visão reducionista, apenas em artefatos arquitetônicos coloniais, construídos em grande medida a partir desses materiais (cf. LOWANDE, 2013a). 68

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A CONSTRUÇÃO PARTICIPATIVA DO MUSEU VIRTUAL DE INSTRUMENTOS MUSICAIS Álea Santos de Almeida1 Adriana Olinto Ballesté2

Resumo: Procurando intensificar o diálogo com o público, principalmente alunos e professores dos ensinos fundamental e médio investigamos uma forma de construção participativa para o Museu Virtual de Instrumentos Musicais. Com base em autores como Dudziak (2001), Muchacho (2005a, 2005b), Valente (2009) que discutem os conceitos de museu virtual, competência em informação, e as práticas e fins educativos do museu apresentamos os resultados parciais de uma pesquisa com professores de música da cidade do Rio de Janeiro.

Palavras chave: Museu virtual; educação; TICs; instrumentos musicais. Abstract: In order to intensify the dialogue with the public, especially students and teachers of primary and secondary education, we investigate how the Virtual Museum of Musical Instruments can be built in a participatory manner. Based on authors like Dudziak (2001), Muchacho (2005a, 2005b), Valente (2009) that discuss the concepts of virtual museum, information literacy, and the practices and educational purposes of the museums, we present the partial results of a survey with music teachers of the city of Rio de Janeiro.

Keywords: Virtual Museum; education; Information Technology and Communication; musical instruments.

1

Mestre em Museologia e Patrimônio pelo Programa de Pós Graduação em Museologia e Patrimônio da Unirio, e bolsista do Programa de Capacitação Técnica 2013 da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ. E-mail: [email protected]. 2 Doutora do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT. E-mail: [email protected], [email protected]. 70

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Introdução A formação das coleções museológicas envolve diversos aspectos políticos, históricos, econômicos e sociais. Dessa forma, quando observamos uma coleção de museu também estamos analisando uma seleção ou um recorte feito a partir de escolhas que determinam o valor dos itens escolhidos para serem preservados e lembrados. Para que as coleções sejam lembradas, elas devem ser divulgadas, e os objetos poderão estar disponíveis para engendrarem novas pesquisas, olhares e percepções diversas. Atualmente, uma prática comum de divulgação utilizada nos museus é a disponibilidade de informações e acervos digitais na Internet. Exposições, atividades educativas, catálogo de obras ganham um novo espaço virtual impulsionado pela grande visibilidade da Web (GOUVEIA; DODEBEI, 2007). O museu virtual pode proporcionar experiências que não poderiam ser vividas no mundo concreto. Este será o caso do Museu Virtual de Instrumentos Musicais que estará disponível na web a partir de junho de 2014. Nesse museu estará acessível de forma virtual a coleção do Museu Delgado de Carvalho, vinculado à Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) cuja exposição permanente foi desmontada em 2008 e os itens documentais armazenados em um arquivo na Biblioteca Alberto Nepomuceno da Escola de Música com um acesso restrito. Mas para que o museu virtual seja de fato um espaço útil, não restrito apenas a especialistas, atingindo um público mais amplo – estudantes, professores de música, amantes da música, curiosos - é fundamental conhecer os anseios e necessidades dos possíveis usuários. Levando em consideração que em muitos museus do mundo concreto, no Brasil e no exterior, os setores educativos têm proporcionado espaços de diálogos entre o acervo exposto e o público e, que esse público tem sido predominantemente de estudantes e professores decidimos iniciar uma pesquisa com professores de escolas públicas e privadas para conhecer um pouco do cotidiano escolar e coletar sugestões para o museu virtual com o intuito de construir um espaço virtual de forma participativa3. Queremos saber se a parte educativa de um museu virtual deve ter os mesmos propósitos de um museu do mundo

3

Este trabalho está sendo realizado com financiamento da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro – FAPERJ por meio do Edital FAPERJ Nº 28/2013 – Programa e Capacitação Técnica 2013. Além destas entrevistas que tem objetivo principal de construir a parte educativa do site, também está sendo realizado um trabalho de pesquisa, catalogação e documentação do acervo do Museu Delgado de Carvalho que será divulgado no site do Museu Virtual de Instrumentos Musicais. 71

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concreto. Quais devem ser os meios para que o museu se aproxime do público, principalmente o escolar? Neste artigo, discutiremos algumas das problemáticas e o quadro teórico que está embasando a pesquisa, e apresentaremos os resultados parciais das entrevistas já realizadas, transcritas, analisadas e interpretadas. Na primeira seção, apresentamos um breve histórico do acervo do Museu Delgado de Carvalho que será o primeiro acervo do Museu Virtual de Instrumentos Musicais. Na segunda, discutimos o conceito de museu virtual adequando-o ao nosso trabalho. Na terceira, discutimos questões teóricas relacionadas aos conceitos de competência em informação e função educativa dos museus. Na quarta seção, apresentamos, contextualizamos e analisamos os dados obtidos nas entrevistas, em seguida, nas considerações finais, realizamos algumas interpretações a partir destas análises.

Breve histórico do acervo O Museu Instrumental Delgado de Carvalho foi criado no final do século XIX, pelo primeiro diretor do Instituto Nacional de Música4, o compositor e maestro Leopoldo Miguéz, (1850 a 1902). O Museu destinava-se, segundo o Regulamento do Instituto Nacional de Música de 1900, citado por Brandão (2013, p. 42), ao estudo de história de música e organologia musical. Seu acesso era restrito, sendo o ingresso na sala do museu permitido somente aos alunos acompanhados por professores e ainda com a autorização do diretor. A partir da década de 1970, o museu é aberto ao público ficando seu acervo exposto em vitrines no corredor principal da Escola de Música. Em 2008, o museu foi desativado e os itens foram armazenados na Biblioteca da Escola de Música (CARDOSO, 2008).

5

O acervo inicial do Museu, descrito em inventário manuscrito6 por Leopoldo Miguéz, entre os anos de 1890-1895, contava com 49 instrumentos de diversas nacionalidades – Síria, Índia, Marrocos, Sudão, China, México, Estados Unidos e Brasil. Desses itens originais do acervo apenas 27 estão presentes atualmente no acervo. Em 1905, foi publicado um inventário, organizado e classificado pelo compositor Joaquim Tomas Delgado de Carvalho (1872-1922), que assumiu a responsabilidade, como ele mesmo afirma, pela 4

O Instituto Nacional de Música foi criado após a Proclamação da República, em 1889, derivado do Conservatório de Música, criado em 1848, no Rio de Janeiro, por Francisco Manoel da Silva (17951865). Em 1937, o Instituto é encampado pela Universidade do Rio de Janeiro e passa a se chamar Escola Nacional de Música. 5 Museu Delgado de Carvalho. http://www.musica.ufrj.br/index.php?option=com_content&view=article&id=79&Itemid=121. Acesso em 25 de abril de 2011. 6 Descoberto após o inicio do projeto pela bibliotecária Dolores Brandão. 72

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“inspeccção do Museu instrumental, Gabinete de acústica e Bibliotheca” (CARVALHO, 1905, p. 5). Esse inventário mostra que o acervo cresceu bastante contando, então, com 87 instrumentos musicais e 54 itens diversos como cartas, bilhetes, cartões postais, autógrafos. E somente na década de 1970 foram elaborados novos inventários, sendo alguns descobertos recentemente na biblioteca da Escola de Música. Atualmente o Museu conta com aproximadamente 80 instrumentos musicais e 40 itens documentais. Objetivando a reativação do museu foi proposto, em 2011, no Edital da FAPERJ de Apoio à Produção e Divulgação das Artes no Estado do Rio de Janeiro – 2011 o projeto intitulado Museu Virtual de Instrumentos Musicais Delgado de Carvalho, que prevê as seguintes ações: (1) o levantamento dos itens documentais; (2) a higienização e conservação dos itens do acervo do Museu para que possam ser expostos, fotografados e acondicionados; (3) o acondicionamento dos instrumentos musicais e dos itens documentais; (4) a organização, classificação e catalogação dos itens do acervo; (5) a fotografia e/ou filmagem digital dos instrumentos; (6) o desenvolvimento do Website do Museu Virtual contendo uma apresentação, o catálogo do acervo com imagens e áudios, linha do tempo, atividades educativas e exposições especiais. A divulgação e acesso desse acervo que, no mundo físico, está restrito a apenas alguns pesquisadores que podem ter acesso na Biblioteca Alberto Nepomuceno, na Escola de Música, no Rio de Janeiro, estará disponível de forma virtual, na Internet, mostrado de diferentes maneiras, por meio de áudios, vídeos, e exposições virtuais, jogos e propostas educativas. Com o museu virtual essa e outras coleções de instrumentos poderão ser fontes de pesquisa compartilhadas de forma lúdica e também formal com um número maior de pessoas em todos os cantos do planeta.

Museu Virtual Está cada vez mais evidente que as exposições interativas, a mídia eletrônica e as tecnologias digitais fazem parte do cenário de um museu no século XXI permitindo que um museu disponível na Internet possa ser visitado de qualquer parte do mundo a qualquer hora do dia (GRIFFITHS, 2003). Um museu virtual não tem a presença física de museólogos, nem de visitantes, não tem objetos físicos, nem catálogos palpáveis. Isso não significa dizer que as pessoas e os itens musicológicos não participam desse mundo virtual, mas que se estabelece uma nova forma de comunicação entre eles. Não é uma “desrealização”, como se poderia pensar, é

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uma “mutação de identidade”, as “coordenadas espaço-temporais” são deslocadas (LÉVY, 1996, p. 18). Muchacho (2005b) define o museu virtual como um museu sem fronteiras baseado em uma nova realidade, que pode ou não ter relação com a realidade do museu tradicional. O museu virtual é essencialmente um museu sem fronteiras, capaz de criar um diálogo com o visitante, dando-lhe uma visão dinâmica, multidisciplinar e um contacto interactivo com a colecção e com o espaço expositivo. Ao tentar representar o real cria-se uma nova realidade, paralela e coexistente com a primeira, que deve ser vista como uma nova visão, ou conjunto de novas visões, sobre o museu tradicional (MUCHACHO, 2005b, p. 582).

O Museu Virtual de Instrumentos Musicais existirá apenas no espaço da web, mas seus acervos serão provenientes de diversos locais. Inicialmente, escolhemos trabalhar com a preservação, documentação e divulgação do acervo do Museu Delgado de Carvalho. As coleções serão documentadas e expostas no formato digital. É importante, também, observar as mudanças engendradas pelas novas maneiras de interação do público com o espaço museológico agora situado também na web. Para Muchacho (2005b) o museu virtual pode contribuir com a linguagem expositiva e com os demais fazeres museológicos por meio de uma maior interatividade e acessibilidade, características marcantes dos espaços virtuais (MUCHACHO, 2005b). Assim, no âmbito das práticas de expografia, a Internet oferece novas possibilidades de apresentação e divulgação do patrimônio digital, que podem ir da utilização de áudios e vídeos para descrever os acervos, a criação de espaços expositivos que simulam as exposições que ocorrem nos museus físicos. Além disso, abrem-se as possibilidades de interatividade do público que no meio digital podem participar por meio de propostas educativas e lúdicas (HENRIQUES, 2004) – e neste sentido, “esse metamundo virtual se torna o laço de comunicação, de transações econômicas, de aprendizagem e de diversão das sociedades humanas” (LEVY, 1999, p. 146). Muchacho (2005a, p. 1543) aponta que para que isso ocorra é necessário existir uma preocupação com as necessidades e características do utilizador final, ou seja, com a usabilidade do museu virtual. Nesse sentido, para criar um museu virtual de instrumentos musicais que seja um espaço dinâmico, interessante e útil para estudantes, professores, pesquisadores, amantes da música e o público em geral, é fundamental o entendimento do funcionamento desse espaço virtual e da interação entre os usuários desse espaço. Para a criação do Museu Virtual de Instrumentos Musicais decidimos conhecer num primeiro momento o público de estudantes e professores visando criar propostas educativas específicas envolvendo o acervo e a linguagem musical em um ambiente virtual. 74

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Ações educativas para o Museu Virtual de Instrumentos Musicais A função educativa dos museus (e incluímos aí não apenas os museus com estruturas físicas, mas também os virtuais) torna-se cada vez relevante no contexto atual, onde estas instituições são entendidas como espaços que podem e devem contribuir para o meio social onde estão inseridas, sendo os setores educativos dos museus uma das maneiras de aproximação com o público em geral, especialmente professores e alunos de escolas. Por procurarem principalmente o diálogo reflexivo com o público, as ações dos setores educativos são também ações de comunicação dos acervos dos museus. Santos (2008) esclarece que o fazer museológico é caracterizado pelas ações de pesquisa, preservação e comunicação, que pretendem, assim como as práticas educacionais, transformar o meio social por meio da reflexão e do senso crítico. Valente (2009) explica que a educação, vista em sentido amplo e a cultura são inerentes ao processo de desenvolvimento do intelecto humano; e estão presentes em qualquer sociedade. São duas instâncias que caminham juntas, já que sempre o que é transmitido pela educação é algo que precede o indivíduo, algo que provem da cultura. Esta função educativa de caráter amplo sempre existiu e sempre existirá; entre os múltiplos e heterogêneos meios para seu desenvolvimento está à via da escola, uma das instâncias onde se dá a institucionalização da educação. Outro canal de educação institucionalizada é o museu, onde a função educativa sempre surgiu como inerente a esta instituição. Neste espaço os setores educativos dos museus se incumbem divulgar e dar acesso ao acervo dos museus a um maior e mais variado público. Considerando que os setores educativos evidenciam as relações entre educação e museu, e que os fins educativos justificam junto com outros aspectos a própria existência dos museus, a reflexão e a pesquisa para a criação dos setores educativos em museus torna-se bastante relevante e atual. Nos museus virtuais, que se configuram, também, como um espaço de educação, surgem questões específicas como a relação do público com as novas tecnologias, que requerem novas necessidades e habilidades, ou “competência em informação” (DUDZIAK, 2001, p. 36). Para ser competente em informação, o indivíduo precisa saber quando e quais são as suas necessidades de informação e, dominar estratégias de uso de fontes de informação, o que sugere que o mesmo tenha fluência e/ou leitura mínima de estratégias de busca.

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Visando as ações educativas do Museu Virtual de Instrumentos Musicais, procuramos saber se o público tem competência em informação e como se relaciona com as novas tecnologias. Além disso, em um museu virtual as visitas mediadas ou guiadas às exposições ou a espaços diversos dentro dos museus, ferramentas comuns utilizadas pelos setores educativos dos museus do mundo físico, podem ser pouco funcionais em um espaço virtual que não conta com a presença física de um educador e de um grupo de alunos. Será que existem outras maneiras de interação com as escolas que não sejam as visitas? Como as relações entre museu e educação podem ser evidenciadas no espaço de um museu virtual?

Resultados parciais das entrevistas Procurando responder a essas perguntas e visando à construção do espaço educativo do Museu Virtual de Instrumentos Musicais de maneira participativa e mais próxima da realidade educacional, elaboramos uma pesquisa com professores das redes pública e particular da cidade do Rio de Janeiro. Fizemos entrevistas qualitativas e usamos a metodologia de análise de conteúdo, que se baseia em inferências, oscilando entre os polos “[...] do rigor da objetividade e da fecundidade da subjetividade” (BARDIN, 2011, p. 15). Para a realização da interpretação por meio da análise de conteúdo, é necessário, antes de realizar a codificação dos dados, escolher unidades de análise, categorias de análise e regra de contagem. A unidade de análise escolhida foi o tema, que, segundo Bardin (2011), “[...] é a unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo certos critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura” (BARDIN, 2011, p.134). É geralmente uma frase condensada, uma espécie de resumo retirado de recortes realizados no texto. Após a identificação desses temas, os mesmos foram agrupados em categorias, que são classes com títulos genéricos, e que reúnem temas semelhantes. Deste trabalho inicial, geraram-se os quadros que informam as categorias de análise e os temas. Após esta codificação dos dados, foi feita, a partir do quadro teórico discutido anteriormente, a análise propriamente dita, e se chegou às interpretações dos dados. Optamos inicialmente por entrevistar professores que já tivessem utilizado recursos virtuais na sala de aula, mas depois percebemos a importância do diálogo com alguns professores que ainda não tinham trabalhado com esses recursos, mas que estavam abertos a conhecê-los.

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O roteiro de entrevistas foi elaborado com o objetivo de conhecer o cotidiano escolar de professores e alunos, e coletar sugestões visando aproximar o público escolar do Museu Virtual de Instrumentos Musicais. As temáticas abordadas no roteiro foram: perfil dos professores; o tipo de uso da Internet; os recursos costumam utilizar em suas aulas de música; a infra-estrutura da escola; o perfil dos alunos; seu relacionamento com os recursos da web; o conhecimento de outros museus virtuais e; as relações entre o trabalho em sala de aula e os museus em geral, inclusive o virtual. Entrevistamos professores de escolas públicas e de escolas privadas, mas nesse artigo, apresentaremos resultados de duas entrevistas feitas com professores formados em música de escolas públicas. Os entrevistados usam a Internet regularmente numa média de quatro horas diárias. Na Internet os professores: acessam e-mails e redes sociais, através das quais interagem com os alunos; utilizam a Internet para a preparação e pesquisa para as aulas; utilizam blogs onde tarefas, curiosidades e outros conteúdos sobre as aulas e a linguagem musical em geral são disponibilizados para os alunos (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013). As escolas onde os entrevistados lecionam possuem laboratórios de informática, mas estes, por motivos diversos, não estão em pleno funcionamento e disponibilizam poucos computadores para os alunos. Os laboratórios são multidisciplinares, usados por todas as turmas das escolas mediante marcação prévia de horário, o que dificulta a utilização da sala para as aulas de música. Nas aulas de música sempre que possível, os professores utilizam computador e datashow (muitas vezes um computador pessoal e datashow de propriedade da escola), pois percebem que a utilização desses recursos aproxima os alunos dos assuntos tratados nas aulas. As escolas possuem rede Wifi, mas esta também não funciona bem, por isso os professores realizam download de conteúdos diversos na Internet de casa, e levam estes materiais para sala de aula (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013). Os alunos dos professores entrevistados têm entre 12 e 16 anos e perfil sócioeconômico muito diversificado. A utilização de computadores, da Internet e das novas tecnologias em geral é algo que faz parte da vida destes adolescentes que tem uma forte relação com conteúdos audiovisuais. Eles têm acesso à Internet na escola, em lan houses, mas principalmente em casa e com mais freqüência ainda por meio do celular. Este último é com freqüência levado e utilizado em sala de aula, e os professores concordam que ao invés de proibir sua utilização, o melhor é aproveitá-lo em atividades – ambos já realizaram em sala de aula experiências neste sentido (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013).

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O principal uso da Internet pelos alunos são as redes sociais. Quando precisam pesquisar para realização de tarefas esbarram em algumas dificuldades: falta de discernimento sobre a confiabilidade dos sites, geralmente optando pelo primeiro oferecido pelo buscador, dificuldade de ler o que está no site e transformar este conteúdo em um texto escrito, frequentemente optando pelo recurso do “copia-cola” e realizando reproduções dos textos encontrados nos sites (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013). Um dos professores aponta que o papel do professor é justamente ensinar os alunos a pesquisarem na Internet, indicando outros usos da Internet além das redes sociais (LEME, 2013). Os professores vêem o museu do mundo físico como um local de educação que pode apoiar o trabalho que realizam em sala de aula – inclusive já realizaram visitas com Setores Educativos de museus da cidade do Rio de Janeiro. Apesar de nem todos os professores terem visitado museus virtuais, eles percebem possibilidades desses museus poderem ajudá-los tanto na preparação das aulas, quanto em atividades realizadas em sala de aula. Para os professores, um museu de instrumentos musicais seria útil principalmente na apresentação destes artefatos em sala de aula, conteúdo presente no cotidiano escolar dos dois professores. Atualmente para realizar a apresentação dos instrumentos nas aulas os professores utilizam os próprios instrumentos musicais (quando é possível), vídeos e áudios baixados da Internet (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013). Os professores sugeriram que esse museu virtual poderia estar mais próximo do público. Apontaram que o espaço virtual precisa ser bonito e atraente, que o acesso e a pesquisa no site precisam ser de fácil execução, também mencionaram a necessidade de o site disponibilizar áudios, vídeos, entrevistas com músicos sobre detalhes dos instrumentos musicais (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013). Especificamente com relação à pesquisa no acervo que o site disponibilizará, um professor sugeriu que a busca de instrumentos musicais seja feita por origem, por gênero musical e por classificação (cordofones, membranofones, idiofones, aerofones). Além disso, apontou que seria muito útil que o site disponibilizasse material para download – já que a rede Wifi da escola não funciona bem -, e que estes conteúdos poderiam estar disponíveis em formato de apresentações multimídia e separados por assunto (gênero musical, um instrumento musical específico, entre outros). Dessa forma, os professores poderiam acessar este material e adaptá-lo as suas aulas (GRUNWALD, 2013). Averiguamos, também, se seria interessante a disponibilização de jogos virtuais musicais destinados aos alunos e talvez ao uso em sala de aula. Os professores mostraramse bastante interessados na idéia, e afirmaram que estes jogos podem ser ferramentas muito úteis para o diálogo entre professores, alunos e conteúdos das aulas de música. Um 78

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professor inclusive já realiza experiências nesse sentido, utilizando jogos como quebracabeça e palavra cruzada que são projetados do computador. Para elaborar estes jogos o professor se inspirou em outros encontrados na Internet e os adaptou aos seus objetivos (GRUNWALD, 2013). Os dois professores afirmam que há poucos jogos virtuais musicais disponíveis na Internet, e quando existem são mais destinados a faixa etária da Educação Infantil, e não para adolescentes. Os professores esclarecem que há demanda e interesse por esse tipo de conteúdo virtual (GRUNWALD, 2013) (LEME, 2013).

Considerações finais As entrevistas demonstraram que professores fazem uso considerável da Internet em sua vida diária, a utilizam na preparação das aulas e também no próprio ambiente escolar. Os professores não têm maiores dificuldades para realizarem pesquisas, e conhecem os caminhos de pesquisa indicados por Dudziak (2001) anteriormente mencionados, sendo possível afirmar que os professores tem competência em informação assim com Dudziak (2001) definiu este conceito. As escolas não apresentam uma boa infraestrutura com relação a disponibilização de computadores e rede Wifi, mesmo assim os professores trazem as novas tecnologias para dentro da sala de aula ou por meio de material anteriormente baixado da Internet de casa, ou por meio do aproveitamento da Internet dos celulares que os alunos trazem para a escola. Isso demonstra que há grande interesse dos professores em trazerem conteúdos da web para o ambiente escolar, e neste sentido o Museu Virtual de Instrumentos Musicais provavelmente terá espaço e interesse para estabelecer parcerias com alunos e professores. O interesse no uso das novas tecnologias em sala de aula é conseqüência do fato dos professores perceberem que seus alunos, adolescentes entre 12 e 16 anos, têm grande intimidade com estas ferramentas e que de certa forma, por meio delas apreendem o mundo. Sendo assim, as novas tecnologias podem ser uma ferramenta de aprendizado importante também no ambiente escolar. Na Internet, os alunos parecem passar a maior parte do tempo nas redes sociais, e estão em processo de aquisição de competência em informação. Os professores estão atentos a esta questão e já tentam em sala de aula orientar os alunos em pesquisas na Internet, bem como mostrar outros usos que este espaço pode ter. Estes aspectos nos mostram que para que os alunos fizessem uso do Museu Virtual de Instrumentos Musicais, seria necessário estimulá-los. Neste processo os professores são nossos grandes parceiros, e podemos estabelecer um diálogo que será 79

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profícuo tanto para o museu que poderá atingir um público mais amplo, quanto para os professores, pois o museu seria útil não apenas para a transmissão de conteúdos acerca dos instrumentos musicais, mas também para o entendimento prático da pesquisa na Internet, algo que já está sendo trabalhado em sala de aula7. Enfim, parece que ao acolhermos as opiniões e sugestões dos professores estamos nos aproximando mais dos alunos. A pesquisa também está mostrando que a utilização de jogos virtuais pode ser um bom caminho para promover a aproximação entre o acervo do museu e os adolescentes. Até o momento, percebe-se que não existem muitos jogos relacionados à linguagem musical disponíveis na web, apesar de os professores reconhecerem o valor que estas propostas interativas poderiam ter no cotidiano escolar. Dessa forma, os jogos virtuais seriam mais um meio de divulgação do acervo de instrumentos musicais para o público específico de crianças e adolescentes. Por fim, cabe dizer que os professores percebem os museus (tanto os do mundo físico quanto os do mundo virtual) como espaços permeados pela educação em sentido amplo, assim como definido por Valente (2009). As entrevistas mostram que todo o espaço do site do museu terá fins educativos, e não apenas a parte que chamaremos de “Educativo”. Esta seção apenas enfatizará os aspectos educativos que permearão as exposições virtuais, os textos, entrevistas e a pesquisa no catálogo virtual. Os próprios professores não se restringem a dar sugestões apenas para a parte educativa, mas sim para todo o site. E confirmam que a usabilidade do site é um aspecto que precisa ser levado em consideração, assim como Muchacho (2205a, 2005b) descreveu. Especificamente na parte educativa as entrevistas indicam que ali podem estar disponíveis inicialmente materiais destinados a professores para dowload, os jogos anteriormente mencionados, sendo que todo este conteúdo precisa estar adaptado ao uso também dos celulares, principal meio de acesso à Internet dos alunos. Tendo em vista, que, o museu virtual conta, nesse primeiro momento, com o acervo do primeiro e maior museu de instrumentos musicais do Brasil, o Museu Instrumental Delgado de Carvalho, e, que tem como objetivo a incorporação de outros acervos e itens, esse ambiente virtual possibilitará o aprendizado, a exploração, a investigação e a geração de conhecimentos envolvendo a história dos instrumentos e da música no Brasil e no mundo. 7

No site do Museu Virtual de Instrumentos Musicais estará disponível um catálogo virtual dos instrumentos musicais. Cada instrumento terá uma ficha virtual que conterá curiosidades sobre aquele instrumento, vídeos, áudios, local de origem, descrição física, entre outras informações. O público poderá navegar e pesquisar a coleção online. 80

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Os resultados, embora ainda, parciais demonstram que vale a pena construir o Museu Virtual de Instrumentos Musicais de forma participativa, pois dessa forma teremos uma garantia de que o espaço virtual criado será utilizado e proveitoso educativamente e ludicamente.

Referências BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011. BRANDÃO, Dolores Castorino. Representação documentária de instrumentos musicais: contribuição para a organização do Museu Instrumental Delgado de Carvalho da Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2013 (Monografia de Especialização). Arquivo Nacional - UFRJ. CARDOSO, André. A Escola de Música e suas coleções especiais. In: Universidade e lugares de memória. Organizado por Antônio José Barbosa de Oliveira. Rio de Janeiro: UFRJ/FCC/SIBI, 2008, p. 203-220. CARVALHO, Delgado de. O Museu Instrumental do Instituto Nacional de Música do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1905. DUDZIAK, Elizabeth Adriana. A information literacy e o papel educacional das bibliotecas. São Paulo, 2001 (Dissertação de Mestrado em Ciência da Comunicação). ECAUSP. GOUVEIA, Inês; DOBEDEI, Vera. Memórias de pessoas, de coisas e de computadores: museus e seus acervos no ciberespaço. Musas – Revista Brasileira de Museus e Museologia. Rio de Janeiro, n.3, p. 93-100, 2007. GRIFFITHS, Alison. Media Technology and Museum Display: A Century of Accommodation and Conflict. MIT Communications Fórum. Disponível em: http://web.mit.edu/commforum/papers/griffiths.html. (Publicado em 2003). Acesso em: julho de 2013. GRUNWALD, Klaus. Professor do CIEP Operário Vicente Mariano (out. 2013). Entrevistadora: Álea Santos de Almeida. 2 arquivos .mp3 (42 min 39s; 37s). Entrevista concedida ao Projeto “Pesquisa, documentação e planejamento de atividades educativas para o Museu Virtual de Instrumentos Musicais Delgado de Carvalho”. HENRIQUES, Rosali. Museus virtuais e cibermuseus: A Internet e os museus. In: Memória, museologia e virtualidade: um estudo sobre o Museu da Pessoa. 2004. (dissertação de mestrado). Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologia de Lisboa. Disponível em: http://www.museudapessoa.net/adm/Upload/wg94C11092012191530XB8KO.pdf. Acesso em julho de 2013. LÉVY, Pierre. O que é virtual? São Paulo: Ed. 34, (1ª ed.1996). 2007. LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999. LEME, Mônica. Professora do Pedro II – Humaitá. (nov. 2013). Entrevistadora: Álea Santos de Almeida. 1 arquivo .mp3 (1h 12min 16s). Entrevista concedida ao Projeto “Pesquisa, documentação e planejamento de atividades educativas para o Museu Virtual de Instrumentos Musicais Delgado de Carvalho”. MUCHACHO, Rute. Museus virtuais: A importância da usabilidade na mediação entre o público e o objecto museológico. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/muchacho-rutemuseus-virtuais-importanciausabilidade-mediacao.pdf. (Publicado em 2005a). Acesso em julho 2013. MUCHACHO, Rute. O Museu Virtual: as novas tecnologias e a reinvenção do espaço museológico. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/muchacho-rute-museu-virtualnovas-tecnologiasreinvencao-espaco-museologico.pdf. (Publicado em 2005b). Acesso em julho de 2013.

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SANTOS, Maria Célia T. Moura. Museu e Educação: conceitos e métodos. In: ______________. Encontros museológicos: reflexões sobre a museologia, a educação e o museu. Rio de Janeiro: MINC/IPHAN/DEMU, 2008. p. 125-146. VALENTE, Maria Esther Alvarez. Educação e Museus: a dimensão educativa do museu. Museu e Museologia: Interfaces e Perspectivas/Museu de Astronomia e Ciências Afins. Organização: Marcus Granato, Claudia Penha dos Santos e Maria Lúcia de N. M. Loureiro. Rio de Janeiro: MAST, 2009, MAST Colloquia; 11.

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A ARQUEOLOGIA COMO FERRAMENTA DIDÁTICA EM MUSEUS Mickaela Schwab Muniz1

Introdução Em 2009 foram iniciados estudos arqueológicos por Richard O’Brien (Rathnadrinna Research Project) em Rathnadrinna, uma fortificação datada entre 700 e 800 d.C., encontrada em Cashel, na Irlanda. Foram realizadas escavações nos anos de 2012 e 2013, e em 2014 ocorrerá outra em um intuito de concluir tais estudos, já tendo sido desenvolvido um Trabalho de Conclusão de Curso voltado para as escavações em forma de artigo científico. A escavação programada para 2014 terá seus estudos em processo de encerramento e síntese, sendo desenvolvido simultaneamente a pesquisas na própria Irlanda, um projeto no Brasil voltado para tais escavações, no decorrer do Mestrado Profissional em História da Península Ibérica (UNIFAL), entretanto, mais aprofundado, se comparado ao Trabalho de Conclusão de Curso e com um caráter que também trabalha aspectos educacionais, não apenas acadêmicos. O projeto em si consiste em fazer uma comparação entre os povos contemporâneos da Península Ibérica e da Irlanda que viviam em fortificações construídas para diversas finalidades. Pretende-se, utilizando o Forte de Rathnadrinna como um dos materiais científicos para a análise, verificar tais motivos, semelhanças entre esses fortes, entre os costumes dos povos, focando principalmente na expressão religiosa e nos banquetes rituais celebrados na época, com base em uma revisão bibliográfica, a qual ainda está em processo de seleção, mas que pode ser exemplificada com trabalhos como “Los Banquetes y Rituales Colectivos en el Suroeste Peninsular” de Luis Berrocal Rangel. Após toda a fase de pesquisa, o projeto partirá para a construção de um sítio arqueológico dentro do Museu de Memória e Patrimônio da Universidade Federal de Alfenas, de forma a simular uma escavação. Essa construção ainda está em debate com relação à metodologia, havendo a possibilidade de ser física, espelhando o Projeto do Laboratório de Arqueologia Pública da UNICAMP “LAP nas Escolas”, desenvolvido por uma equipe de professores e estudantes de graduação e pós-graduação, dentre eles o

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Mestranda / UNIFAL- MG. 83

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Professor Doutor Pedro Paulo Funari. Outra possibilidade é que seja uma construção de um sítio arqueológico didático virtual, que será implementado e implantado como segunda alternativa. Ainda está em discussão as possibilidades, vantagens e desvantagens de cada método. O público alvo para utilização desse espaço seria, principalmente, alunos do Ensino Fundamental e Médio, inicialmente da cidade de Alfenas - MG, a fim de proporcionar uma vivência que consolide o ensino-aprendizagem da História Ibérica. A Arqueologia é uma área do conhecimento ampla e dinâmica, que levará a uma análise do que se está estudando de uma maneira interdisciplinar, e trata a história como é: complexa. Os artefatos arqueológicos evidenciarão a ocupação humana, demonstrando relações culturais e de poder, expressão religiosa, e a relação de um aspecto com o outro e de um povo com o outro.

Arqueologia, Museus e Sociedade A formação de um cidadão é composta de diversas instituições da sociedade. Uma delas é a escola, onde o ensino é sistematizado e programado, diferentemente da família, por exemplo. Entretanto, na atualidade estamos nos deparando com uma crise no ensino, que já é decorrente desde antes da época ditatorial. Por diversos meios, tenta-se emergir dessa crise, a qual, dentre diversas características, desvaloriza o “velho”, o passado. É a ditadura do consumismo, em que tudo é descartável e o “novo” tem grande valor. A proposta desse projeto é fazer com que o “velho” seja visto com outros olhos. A ideia de levar crianças para escavar é nova para elas, podendo fazer com que elas olhem para o estudo do passado como algo interessante. Com isso, o objetivo principal é alterar a organização dos círculos concêntricos pela introdução de uma concepção de historia local ou de “historia do lugar” que procura estabelecer articulações entre o mais próximo (ou o vivido do aluno) e a historia nacional, regional e geral ou mundial. (BITTENCOURT, 2011, p. 113). A arqueologia possibilita a articulação da história regional com a Nacional e a Mundial, ligando a história brasileira com as histórias que a compõem (Ibérica, Indígena e Africana) a partir dos objetos e dados arqueológicos que forem descobertos no sítio. A história local tem sido indicada como necessária para o ensino por possibilitar a compreensão do entorno do aluno, identificando o passado sempre presente nos vários espaços de convivência – escola, casa, comunidade, trabalho e lazer -, e igualmente por situar 84

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os problemas significativos da história do presente. (BITTENCOURT, 2011, p. 168). Com isso, a cidadania está sendo desenvolvida, assim como raciocínios críticos e uma formação mais “completa”. A influência do positivismo na historiografia brasileira é constante até os dias atuais, visto que nosso aprendizado é focado principalmente em fatos grandiosos e de grande relevância política, religiosa, etc. O estudo da Arqueologia traz a possibilidade do estudo do cotidiano, do local/regional, das pessoas “comuns”. Isso traz uma identificação do aluno com o objeto estudado, fazem deles mais próximos, incentiva-o a formar uma Memória própria, do seu povo, do seu próprio local. Tendo consciência de si e do seu meio, abre-se espaço para a educação em prol da preservação do Patrimônio Brasileiro, já que foi despertado um sentimento de “pertencimento” e, portanto, com valor e importância intrínsecos. Portanto, a problematização principal do projeto é relacionada à educação. Entretanto, as ferramentas a serem utilizadas serão a Arqueologia e a História Ibérica, a qual será utilizada para a compreensão da História Brasileira também. Como disse Machado (2009), a pesquisa arqueológica é realizada em benefício da comunidade, aproximando a Instituição (no caso, a UNIFAL) da mesma, inteirando-a numa proposta de valorização e preservação do Patrimônio Histórico e Arqueológico, pois o patrimônio “é mais que um testemunho do passado, o patrimônio é um retrato do presente, um registro de possibilidades políticas dos diversos grupos sociais, expressas na apropriação de parte da herança cultural." (apud Rodrigues, 1996). Assim sendo, visamos trazer de uma vivência uma forma de concretizar o ensinoaprendizagem em sala de aula. Essa vivência, mais detalhadamente falando, consiste em as crianças formarem grupos, sendo cada grupo designado a uma função, como em uma escavação: Geofísicos, Historiadores, Biólogos, entre outros. Tais grupos receberão atividades e um papel específico a desempenhar, todos orientados por um “Diretor de Escavação”. As atividades serão: preenchimento de fichas de descrição do solo, limpeza e classificação de artefatos encontrados, análise histórica do local, escavação do solo, análise geofísica, entre outras diversas atividades existentes em uma escavação. Assim, a partir de todos os dados coletados e informações discutidas, serão realizados relatórios parciais nos grupos, seguido de um relatório final. Com isso, as crianças poderão remontar parte da História Européia. Compreenderão a construção e utilização de fortificações pelos povos Irlandeses e Ibéricos, verão as diferenças, semelhanças e a relevância disso. Poderão constatar uma possível relação entre os dois países 85

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e de que forma uma cultura influenciou a outra e há influência até hoje, possivelmente até mesmo no Brasil. A Arqueologia é uma ciência Universal, ou seja, não possui nação. Por isso, o trabalho didático com as crianças auxiliará na construção de um fragmento de história mundial, o que já foi provado por Bittencourt que é de extrema importância na construção da História Nacional e, portanto, na formação do cidadão. Tratando-se de Península Ibérica, ainda é importante ressaltar que as pesquisas e sínteses realizadas pelas crianças as trará uma compreensão histórica de vários contextos, podendo inter-relacioná-los a ponto de não só construírem uma história Europeia, mas de descobrirem as próprias raízes, se considerarmos o Brasil como colônia e totalmente influenciado por Portugal, Espanha e outros países europeus.

Materiais e Métodos Empregados O projeto será iniciado com a formação de uma equipe, na qual haverá discentes do ensino básico, de graduação e professores já graduados, no intuito de incentivar o trabalho em equipe, promover interações importantes e ensino-aprendizagem, em que professor e aluno e os próprios alunos entre si encarnem uma postura cooperativa, incentivando também o espírito, a consciência coletiva. Essa equipe trabalhará, em um primeiro momento, recolhendo informações acadêmicas, documentais e arqueológicas sobre todos os pontos a serem tratados com as crianças durante a escavação, sendo o foco da pesquisa um estudo arqueológico e histórico de fortificações construídas na Espanha no período da Antiguidade, comparando a ocorrência destes com os encontrados na Irlanda. É importante ressaltar que toda essa bibliografia seja auxiliar na reconstrução histórica e arqueológica desse período e desses povos e que mostre sua interrelação, principalmente nos âmbitos cultural, político (poder) e religioso. Cabe ainda a eles selecionar essa bibliografia e organizá-la de forma a utilizar-se de pelo menos parte dela para o contato do aluno com os saberes acadêmicos sem deixar de lado métodos didáticos que facilitem a introdução dos alunos nesse meio. Isso traria uma proposta de diminuição da discrepância de saberes que vivemos entre os saberes acadêmicos e os escolares. A partir dessa coleta de dados, dá-se início à produção de um material didático com um enfoque tecnológico. Ainda está em processo de análise e decisão, mas esse material pode tomar a forma de um jogo de computador ou algo do gênero, com o intuito de trazer tecnologia às escolas ao mesmo tempo que o ensino se moderniza, “alcançando” essa nova geração tecnológica. Toda a esquematização do sítio arqueológico e das etapas de uma escavação 86

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poderá ser feita a partir dessa ferramenta didático-tecnológica. Logo após essa etapa, a réplica de um sítio Arqueológico pode ser construído no âmbito físico, possibilitando uma simulação do estudo do meio/trabalho de campo. Essa simulação leva o aluno à vivência da história, fazendo com que a aprendizagem seja mais efetiva. O sítio Arqueológico, após ser montado, entrará em fase de experimentação. Os alunos do ensino básico, tutorados pelo professor de História e pela equipe realizadora do projeto, serão introduzidos a todas as etapas de uma escavação, desde o reconhecimento e análise do local a ser escavado até o relatório final. Todas essas etapas serão baseadas nas escavações realizadas na Irlanda. Além da parte prática, como base também serão usados os relatórios parciais das escavações realizadas e o relatório final, que será compilado após a escavação desse ano. Outras referências bibliográficas também serão consultadas como modelo. A partir desse método, os alunos serão introduzidos à investigação histórica. Os artefatos encontrados serão analisados, limpos e acondicionados corretamente, desenhados e catalogados. Após toda a coleta de material em campo, os alunos serão conduzidos à análise e síntese de tudo o que viveram, de forma a construírem a história por si próprios, mas com base bibliográfica fundamentada, como artigos acadêmicos. Será proposto, então, que eles próprios criem uma forma de representarem essa história Ibérica e Irlandesa que descobriram. Para isso, podem ser propostos diversos recursos, como teatro, narrativa, música/poesia, curta-metragem, entre outros que ficaria a critério do próprio aluno, de acordo com sua preferência, disponibilidade e simpatia. O importante é que construam a própria história, analisem, critiquem e sintetizem por si próprios a partir do que viveram.

Considerações Finais Este projeto acaba de ser aprovado pela seleção do Mestrado Profissional em História Ibérica da Universidade Federal de Alfenas – MG. Estando em seu estágio inicial, não há resultados que possam ser apresentados no momento, contudo, o objetivo apresenta-se traçado. Tal objetivo divide-se em duas linhas: o da pesquisa acadêmica e o didático-educativo. A pesquisa acadêmica seguirá em uma revisão bibliográfica auxiliada pelo trabalho de campo em escavações na Irlanda e possivelmente na Espanha, relacionada às fortificações encontradas no período dos povos ali viventes, relacionando, analisando significando e sintetizando as evidências encontradas nos sítios. A linha didática segue com uma proposta de 87

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trazer a Arqueologia para a vida dos alunos do Ensino Básico, de forma que sejam utilizadas novas formas de consolidação da aprendizagem. Entretanto, o objetivo principal desse Mestrado é que haja um intercâmbio total entre o acadêmico e o escolar, de forma que essa “distância” entre esses dois conhecimentos se estreite, mostrando, portanto, que se pode criar uma

conexão

entre

Museu,

Universidade

e

Escola,

através

da

Arqueologia,

e

consequentemente, das coleções museológicas.

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Agradecimentos À museóloga Luciana Carvalho, pela oportunidade de trocarmos ideias; Claudio Umpierre Carlan e Pedro Paulo Funari pela orientação e apoio; a Richard O’Brien por me ceder a oportunidade de trabalhar em escavações e por todo o apoio.

Referências BITTENCOURT, C.M.F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004. BITTENCOURT, C.M.F. Saber histórico na sala de aula. 11a. ed. São Paulo: Contexto, 2006. MACHADO, N.L.T.G.; LOPES, S.N.; GHENO, D.A. HISTÓRIA, Arqueologia Histórica e a Problemática do Patrimônio: discussões acerca da preservação, turismo e educação patrimonial no Vale do Taquari – Rio Grande do Sul. São Paulo, 28 (1): 2009.

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MUSEU IMAGINADO E SUAS ZONAS DE CONTATO – O CASO DA FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO Bárbara Pereira Mançanares1 Prof. Dr. Luiz Carlos Borges2

Resumo: O presente trabalho busca analisar a Festa do Divino Espírito Santo do distrito de São Bartolomeu (MG), entendendo-a como um valor cultural. Para tanto, serão mobilizados conceitos relacionados às áreas da Museologia e do Patrimônio. A perspectiva aqui adotada parte do pressuposto de que o museu deve ser concebido, no campo sociocultural, não apenas como um espaço físico, mas, sobretudo, como um lugar de experiência cognitiva, educativa e formativa. Ao passo que é por se definir como valor que o patrimônio é capaz de refletir e refratar identidades locais. É, então, nesta acepção que, refletir sobre museu e patrimônio, embasa o tratamento teórico e analítico acerca da Festa do Divino Espírito Santo.

Palavras-chave: Museologia. Patrimônio. Festas religiosas. Abstract: This paper aims to analyze the Feast of the Holy Spirit which is held in the district of São Bartolomeu, in the State of Minas Gerais. For this purpose concepts related to the Museological and Heritage fields will be involved. The viewpoint adopted here assumes that museum must be conceived, in the sociocultural field, not only as a physical space, but mainly as a place for cognitive, educational and formative experience. As for heritage, it’s because it is best defined as value that it can reflect and refract local identities. So, it’s in this sense that reflecting on museum and heritage underlies the theoretical and analytical treatment of the Feast of the Holy Spirit.

Key words: Museology. Heritage. Religious Festival.

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Mestranda PPG-PMUS (UNIRIO/MAST). PPG-PMUS (UNIRIO/MAST). 90

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I.

Museu e Patrimônio

I.I. Da Mitogênese dos Museus à Concepção Moderna de Patrimônio: apontamentos iniciais (...) as origens são um começo que explica. Pior ainda: que basta para explicar. Aí mora a ambiguidade; aí mora o perigo(BLOCH, 2002:57).

Os significados das palavras mudam e variam - em gênero e em significado, por exemplo - constantemente nos diferentes contextos histórico-culturais. Alfredo Bosi faz uma analogia entre datas e pontas de icebergs. Da mesma forma, poderíamos sugerir que as palavras são, a princípio, a ponta do iceberg, mas se as analisarmos profundamente, encontraremos inúmeras cascatas de sentido. Isso significa dizer que as palavras têm um caráter fluido, dinâmico, em virtude de evidenciarem uma dupla inscrição: inscrevem-se na história e, ao mesmo tempo, trazem em si as marcas da história. Em vista disso, devemos atentar para o alerta do historiador Marc Bloch: não cair no encantamento do ídolo das origens e acreditar que a sua “irreal” existência baste para explicar toda a sua densidade. Razão pela qual uma reflexão rigorosamente crítica é exigida todas as vezes que se lida com teorias e, principalmente, com explicações e interpretações que visam dar conta da origem de um determinado fenômeno. Em especial e devido à circulação de hipóteses que vão da mitogênese a abordagens mais especificamente histórico-documentais, a ressalva de Bloch aplica-se aos museus. Devemos ter presente que a principal característica da mitogênese é a lonjura e a ancestralidade, isto é, tempo, espaço e evento inapreensíveis, seja documental, seja empiricamente. Ora, sendo a mitogênese uma forma de cosmofania (Sousa, 1995), só resta, para

explicá-la,

a

especulação,

mesmo

que

matematizada

(como

os

mitos

cosmogênicoscontemporêneos produzidos pela ciência). Entretanto, do ponto de vista simbólico, imaginário e ideológico, o mito, por ser uma narrativa desse tempo-espaço é uma permanência, um vestígio arquetípico presentificado e presentificante na estrutura profunda de qualquer sociedade. Os termos “museu” e “patrimônio” são alvos dessa obsessão pelas origens, o que torna, muitas vezes, repetitivas as explicações que enveredam por essa via. Em virtude do grande número de trabalhos já desenvolvidos que os abordam a partir de suas mitogêneses e etimologias, apenas tangenciaremos essa questão, a fim de nos debruçarmos sobre as concepções contemporâneas de museu e de patrimônio e, sobretudo, sobre aquelas que mais circulam nas produções brasileiras

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Dentre as muitas representações quanto à origem do museu, a mais comum é aquela que o relaciona ao Templo das Musas. Em um sentido mítico e religioso do termo, esses templos eram consagrados às Musas, entidades protetoras das artes e das ciências, e que possuíam a capacidade de inspirar os homens. O culto às Musas era bastante disseminado na Grécia e havia, em muitas cidades-estado, Musas particulares. Entretanto, em geral quando se fala em Musas, a referência é o elenco de nove Musas estabelecido por Hesíodo (COMMELIN, s.d.), as quais eram todas filhas de Zeus e Mnemosyne. Neste sentido, as Musas eram forças divinas capazes de tornar presente os fatos passados e futuros; sendo, também, a expressão criativa da memória. Uma das funções dos locais de culto às Musas, nos quais inúmeros objetos eram levados como oferendas, consistia em mediar as relações entre os homens e os deuses, entre o sagrado e o profano, entre o tempo histórico e o tempo divino. A razão disso é que, na semiosfera do mito, “o símbolo atua como unidade de comunicação – como arquétipo” (MELETÍNSKI, 1998: 32). As oferendas, além do sentido de sacrifício da qual estavam investidas, também eram destinadas à contemplação de peregrinos e visitantes (CHAUÍ, 2006:118). Segundo Poulot (2013:16), esses arquétipos antigos de túmulo e templo, “lugar de acúmulo de riquezas intelectuais e lugar de sacralização, representariam as raízes de uma antropologia da musealidade”, embora pudessem ser utilizados para outras finalidades3. As Musas integram o panteão em que se estrutura a religião cívica dos gregos (Vernant, 2006) e, como as divindades, intermediavam, em parte, algumas relações específicas entre os homens e os deuses. Em geral, conforme aponta Vernant, o tratamento dado aos deuses pelos pensadores e escritores gregos configurava-se mais propriamente ao arquétipo literáriode que fala Meletínski (1998). Vernant enfatiza, ainda, que havia uma distância entre deuses e homens, distância que não era anulada com nem a partir do sacrifício. Ao contrário, é o próprio sacrifício, entendido o ritual como signo, que demarca essa separação irredutível: ao sacrificar uma vítima aos deuses e consumi-la, os gregos não as transubstanciavam. Eles e os deuses consumiam (recebiam em comunhão) uma parte da vítima que, desde sempre, pertencia a cada um dos participantes do ritual. Neste sentido, o ritual grego de sacrifício aos deuses não pode ser subsumido inteiramente à dádiva. Segundo Scheiner (2008), no que respeita ao museu, cuja gênese remontaria às Musas, e, neste caso, o “Templo das Musas” não significa apenas a representação de um espaço físico, mas e principalmente a representação de um espaço de experiência 3

Como é o caso do Museu de Alexandria que consistia, ao mesmo tempo, em biblioteca, coleção e centro acadêmico. 92

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cognitiva, de presentificação das ideias, daquilo que é evocado, uma espécie de recriação do mundo através da memória. No entanto, remontar a origem do museu às Musas ou ao “templo das Musas” é reforçar, instituir ou consagrar, como história, um arquétipo literário. Podemos dizer que esses objetos, “oferendas”4 depositadas no Templo das Musas constituíam-se como semióforos (POMIAN, 1984)? De acordo com esse autor, os semióforos são objetos destituídos de valor funcional, e valem por seu poder simbólico. Segundo ainda Pomian, podemos atribuir aos objetos duas qualidades: a de coisa, quando valem por sua função ou utilidade; e a de semióforos, quando são valorados e cultuados devido à carga simbólica da qual estão investidos 5. Foi, assim, na condição de semióforos que tais objetos deram origem às primeiras coleções e à noção de patrimônio históricocultural (CHAUÍ, 2006: 117). Dessa forma, não é arbitrária a importância que determinadas tipologias de museus dão a elas6. Voltando à pergunta inicial, se as oferendas às Musas traziam em si uma dupla carga, sendo uma funcional (fazer a mediação, servir como objeto de culto e de exposição, servir para obtenção de alguma graça) e outra simbólica (religar homens e deuses, refletir e representar identidades culturais e anseios individuais), então elas não se enquadram na definição de semióforo. Advindo do direito romano, o termo “patrimônio” (patrimonium) compreendia tudo o que pertencia ao pater famílias.Para os romanos, o conceito de família abrangia não apenas a mulher e os filhos, mas também os escravos, bens móveis e imóveis, animais - ou seja, tudo aquilo que estava sob o domínio do senhor (CARLAN, FUNARI, 2010). Embora, o sentido de patrimônio como coisa ou bem que pertence a uma pessoa ou a uma instituição ainda persista, a concepção moderna de patrimônio, como aquilo que, por ter valor (histórico, documental, simbólico), deve ser protegido pelo Estado, advém do final século

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Os objetos “entrado num recinto sagrado passa, com efeito, para um campo rigorosamente oposto ao das actividades utilitárias. No interior deste recinto, “não se pode nem extrair pedras, nem tirar terra, nem cortar lenha, nem construir, nem cultivar, nem habitar”. Por isso os objectos tem aí apenas uma função: ser expostos ao olhar, quer nos edifícios sagrados que decoram, quer nas construções feitas expressamente para dispor as oferendas” (POMIAN, 1984: 57) 5 Essa perspectiva é passível de crítica. Para o autor, por exemplo, o objeto de museu é um semióforo, na medida em que saiu do circuito de utilidades para ser exposto e contemplado. Acreditamos que esse desvio de função não é a perda da utilidade do objeto, mas apenas um outro tipo de uso. Por outro lado, os objetos, na condição de produtos histórico-sociais, estão sempre imbuídos de carga simbólica. 6 “A missão de um museu é a de adquirir, preservar e valorizar suas coleções com o objetivo de contribuir para a salvaguarda do patrimônio natural, cultural e científico” (Código de Ética do Icom, 2006)”(ICOM, DESVALLÉES e MAIRESSE, 2013:32). Existem concepções de que os museus foram feitos para as coleções. Todavia, essa afirmação é problemática uma vez que existem modelos de museus que não possuem coleções ou que as coleções não estão em um ponto de destaque de seu projeto científico. 93

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XVIII7, no contexto histórico, politico e cultural, logo, ideológico, da consolidação da Revolução Francesa. Nesse período, muda-se o status das antiguidades nacionais com o intuito de desvincular os franceses da memória do Antigo Regime8. Com isso, há a promoção e a criação de símbolos que, reavaliando o passado, representassem o povo e a emergência de um novo Estado. Dentre as medidas tomadas, observam-se a desapropriação dos bens da monarquia e da Igreja, seja para a destruição, venda ou ressignificação simbólica. Esses bens, ao saírem do domínio clerical e monárquico,passariam a estar à disposição da nação, ou seja, devolvidos ao povo, ou ainda, nacionalizados. Para adotar medidas pertinentes ao destino desses bens foi criada, com a Constituinte de 1789, uma Comissão de Monumentos, a qual caberia inventariar e definir regras para a gestão desse patrimônio (CHOAY, 2006). Ainda em relação à noção de patrimônio, podemos distinguir duas maneirasde interpretá-lo que ora divergem entre si, ora se complementam. De um lado, temos uma noção de caráter antropológico e filosófico, segundo a qual patrimônio é valor, isto é, aquilo queum determinado traço cultural significa e tem importância para uma dada comunidade. De outro, uma concepção política, em geral, aceita pelo Estado e por agências supraestatais, de acordo com a qual patrimônio são bens que necessitam ser protegidos e que, para tanto, necessitam de leis específicas, cuja abrangência deve ser tanto planetária quanto local (nação, estado, município). Em suma, a fim de estabelecermos as bases que nortearão as análises e interpretações sobre a Festa do Divino Espírito Santo, tal qual se realiza e significa em São Bartolomeu, Minas Gerais, primeiramente, delineamos as primeiras concepções de “museu”, “coleção” e “patrimônio” que costumam ser difundidas e reproduzidas em uma lógica dos “mitos de origem”. Todavia, como dissemos anteriormente, as palavras sofrem modificações semânticas no tempo e no espaço, e nosso trabalho se pautará nas diferentes significações, nas cascatas de sentido atribuídas a esses termos contemporaneamente.

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De forma sucinta, podemos dizer que até o século XVIII, a seleção dos monumentos históricos era feita por antiquários e estetas, fazendo referência, basicamente, às antiguidades gregas e romanas, para fins de estudos históricos e de estilos arquitetônicos. Com a Revolução Francesa, essa seleção foi vinculada à tentativa de um projeto de nação, tentando unir grupos social e culturalmente heterogêneos. Dentro desse contexto que se dá a criação dos primeiros museus, inventários e o surgimento e consolidação da ideia de patrimônio nacional. (SANT’ANNA, 2003). 8 Algo semelhante ocorreu no Brasil após a destituição da monarquia e a proclamação da República. Prédios públicos que ostentavam emblemas monárquicos sofreram intervenção, seja com a troca de nomes, seja com a eliminação dos símbolos monárquicos e a sobreposição deles com emblemas republicanos. 94

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I.II. Políticas de patrimônio e suas relações com o campo museal Os campos do museu e do patrimônio vêm mantendo ao longo da história uma relação marcada por momentos de vinculação e de desvinculação. Um dos pontos de convergência entre esses dois campos consiste no fato do acervo de um museu se constituir em patrimônio da instituição, em termos legais. Como evidência histórica, basta pensarmos no contexto de criação de museus no pós-revolução francesa. Eles foram criados no intuito de abrigarem, protegerem e tornarem públicos o patrimônio da nação; tratava-se de uma estratégia visando “devolver” ao povo aquilo que, a partir dessa nova concepção de sociedade e de estado, agora lhe pertencia. Essa ideia dos museus como espaço de preservação patrimonial persiste na atualidade. Se, por um lado, não é difícil apontar momentos e razões de convergência entre museu e patrimônio, por outro, a dissociação entre eles fundamenta-se no fato do patrimônio não necessitar de um museu existir, até porque patrimônio não é uma coisa em si, mas o valor atribuído a ela. Outro ponto importante a salientar são as políticas públicas que são independentemente dirigidas a um e a outro. No escopo deste trabalho buscaremos traçar as aproximações e os momentos em que, analiticamente, museu e patrimônio interagem. Para isso, é necessário remontarmos ao inicio das políticas de preservação do patrimônio cultural nacional. Comumente situamos o início dos debates acerca da construção de uma identidade nacional, bem como a delimitação do patrimônio como representante da mesma,no contexto dos debates e da criação de dispositivos legais de proteção, nas décadas de 1920 e 1930. Todavia, Oriá Fernandes (2010) os remete ao século XIX, juntamente coma criação de instituições especificas no intuito de inserir o Brasil em uma lógica ilustrada, como os institutos históricos e geográficos e os museus. Na segunda metade do século XIX observamos um movimento de criação de museus.Lilia Schwarcz (2001)destaca como expoente da política imperial voltada para a afirmação civilizatória do Brasil, o Museu Nacional, o Museu Paulista e o Museu Paraense. Criados dentro do paradigma evolucionista, a composição de seus acervos bem como as interpretações e publicações em suas revistas serão influenciados por esse paradigma, a partir do qual o mundo é concebido e interpretado. Outro momento em que, apesar da distância tanto temporal, quanto política e ideológica, em relação ao Império, há também um movimento visando a criação de museus - concebidos (em um e outro momento) como um espaço educativo e formativo – é a primeira metade do século XX.É neste período que se situa a criação do Museu Histórico 95

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Nacional (MHN) como o grande espaço para pensar a cultura nacional e a preservação de um patrimônio nacional. Além das exposições, a função educativa do MHN evidenciou-se mediante duas iniciativas: o Curso de Museus, inaugurado em 1932, e a Inspetoria de Monumentos Nacionais, em 1934 – este seria, mais tarde, substituído com a criação do SPHAN. No período em que o MHN era dirigido por Gustavo Barroso, podemos circunscrever a institucionalização de um organismo federal responsável pelo patrimônio monumental brasileiro através de um museu. O MHN, muito antes das universidades e de órgãos responsáveis pela proteção do patrimônio nacional, já desempenhava atividades referentes à pesquisa, preservação, comunicação, formação e capacitação profissional (RANGEL, 2011). Ainda no que toca à década de 1930, há a elaboração do anteprojeto do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), elaborado por Mário de Andrade, que tinha como um de seus pontos fortes, a criação de museus para cada categoria de patrimônio identificada nos livros do “tombo”.Ainda nesse período ocorreu a aprovação do projeto de lei federal, de autoria de Rodrigo de Melo e Franco, que dava forma legal aos procedimentos visando a proteção do patrimônio. Em 1937, dá-se a instituição do “tombamento” pelo decreto-lei 25/37. Ele constitui-se como um procedimento legal pelo qual o Poder Público impõe restrições a um bem que seja considerado de interesse cultural, a fim de garantir sua preservação e proteção.Embora no anteprojeto de Mário de Andrade houvesse referências às paisagens, ao folclore, aos falares, cantos, medicina e culinária indígena enquanto constituintes da cultura brasileira, a lei do Tombamento limitou-se aosbens arquitetônicos e aos das artes plásticas, privilegiando uma política de tombamentos que ficou conhecida como pedra e cal. Deste modo, os objetos culturais que eram alvo de tombamento era, por exemplo, os edifícios e estatuárias representantes do estilo barroco. Mais tarde, ocorrerá uma modificação conceitual sobre o entendimento daquilo que representaria o patrimônio nacional. A figura de Aloísio Magalhães à frente do Centro Nacional de Referencias Culturaisfoi determinante para essa mudança de perspectiva. Passou-se, então, a contemplar um conjunto de bens que não eram consagrados pelo Tombamento. Do ponto de vista político, houve um afastamento conceitual em relação a uma história oficial e elitista, dando voz às outras camadas da população. Há também a própria ampliação do que se entende por cultura, na medida em que a Constituição de 1988 usa como matriz teórica a Antropologia. Segundo o artigo 216 da referida constituição, o patrimônio cultural brasileiro abarcaria os aspectos “materiais” e “imateriais”, como os 96

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saberes, formas de viver e criar, obras, objetos, documentos, conjuntos urbanos, etc (BRASIL, 1988).

II.

A museologia como suporte analítico do patrimônio cultural

Es el patrimônio, la herencia cultural, la razón primera de la Museologia (ARJONE apud GUARNIERI, 2010). A museologia pode ser entendida como “a ciência do Museu e de suas relações com a sociedade; é, também, a ciência que estuda a relação entre o Homem e o Objeto, ou o Artefato, tendo o Museu como cenário desse relacionamento” (GUARNIERI, 2010: 78). Uma vez que nos propomos a utilizar a Museologia como um suporte para a análise do patrimônio, julgamos necessário definir o que entendemos por museu. Observamos haver uma dilatação do termo museu, o que pode ser percebida pela existência de inúmeras adjetivações atribuídas a museu: museu clássico, comunitário, ecomuseu, museu virtual, museu de território, museu interior. Diante dessa variação conceitual, utilizaremos uma definição que, em certa medida, interliga essas tipologias. Para isso, utilizamos o verbete “museu” presente em Conceitos chave de Museologia, elaborado pelo ICOM9 em parceria com grandes nomes da museologia mundial. Segundo o referido texto, o museu pode ainda se apresentar como “uma função específica, que pode tomar a forma ou não de uma instituição, cujo objetivo é garantir, por meio da experiência sensível, o acúmulo e a transmissão da cultura entendida como o conjunto de aquisições que fazem de um ser geneticamente humano, um homem (DELOCHE apud ICOM, 2007: 66).

A partir dessa definição, trabalharemos um museu plural, onde as três funções estabelecidas por Peter Van Mensch – preservar, estudar e transmitir – ocorram a partir das singularidades de determinadas regiões e comunidades (MENSCH apud POULOT, 2013). Embora já na década de 1960 houvesse debates e práticas voltadas para um museu que privilegiasse a comunidade e a diversidade cultural, em oposição a uma cultura elitista (TILDEN, 1957; KINARD, 1971), é com a Carta de Santiago que se dá início à chamada 9

ICOM-Conselho Internacional de Museus surgiu em 1946 em Paris. Assim como a UNESCO, foi criado em meio às atrocidades feitas aos seres humanos e seus espaços de vivência e memória no pós-guerra. O panorama de domínio museal da época pode ser visto através dos grupos de trabalho constituídos que compreendiam as artes, arqueologia, história e sítios históricos, etnografia e artes populares, ciências mecânicas e naturais e museu para crianças. Nas décadas de 1960 e 1970 o ICOM assumiu o papel de articulador das exigências de utilidade social dos museus através da realização de conferencias e elaboração de documentos estruturados por seus diferentes comitês (POULOT, 2013). 97

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“Nova Museologia”, com tendências democratizantes e um deslocamento da ênfase no objeto para as relações deles com as comunidades, na construção de memórias e identidades.

Os

princípios

do

movimento

foram

enumerados

por

Varine

(apud

GONÇALVES, 2007: 90) da seguinte forma: 1.“o objeto está ao serviço do homem e não o inverso”; 2. “o tempo e o espaço não se fecham entre muros e paredes”; 3. “a arte não é a única expressão cultural do homem”; 4. “o profissional de museu é um ser social, um ator da mudança, um servidor da comunidade”; 5. “o visitante não é um consumidor dócil, mas um criador que pode e deve participar da construção do futuro”; 6. “a pesquisa, a conservação, a apresentação, a animação são funções, grupos de técnicas, mas em caso algum missões do museu”; 7. “por que o museu, para nós, é ou deve ser um dos instrumentos mais perfeitos que a sociedade se deu para preparar e acompanhar sua própria transformação”.

Com esses princípios, a relação homem-museu-objeto não se dá necessariamente a partir de um edifício, mas no território como um todo, espaço cultural e simbólico onde os homens se comunicam e se relacionam, onde resignificam e constroem suas narrativas identitárias e memoriais. Se museu e patrimônio apresentam ligações, como se dá a relação entre museu-patrimônio diante da expansão conceitual dos dois termos? Para buscarmos tangenciar essa relação, trabalharemos a Festa do Divino Espírito Santo de São Bartolomeu como um espaço museal, no qual são realizadas funções como estudo, preservação e transmissão do patrimônio cultural da localidade. III.

Festa do Divino Espírito Santo – um museu imaginado

O distrito de São Bartolomeu faz parte do município de Ouro Preto (MG). Há uma grande dificuldade quanto à realização de pesquisas sobre a sua fundação, devido à escassez de acervo documental. Localizado na nascente do Rio das Velhas – que é de suma importância para a história da mineração em Minas Gerais – o distrito aparece em documentação que relata existência de atividade humana no arraial desde 1704. As festas em homenagem ao Divino Espírito Santo realizadas no período colonial teriam sua origem em Portugal, no início do século XIV, idealizadas pela rainha D. Isabel, casada com o rei D. Diniz de Portugal – embora se tenha conhecimento de sua existência na França e na Alemanha. Os motivos que permeiam sua origem são vários e oscilam entre uma promessa feita pela Rainha Isabel para que cessassem as guerras entre seu filho e seu marido, e outros segundo os quais, ao ser proibida pelo rei de doar comida aos pobres, a Rainha Isabel saía às escondidas, com uma bandeja repleta de pães. Ao ser surpreendida pelo marido, ele lhe pede que retire o pano que cobria a bandeja para averiguar o seu 98

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conteúdo. Ao retirar o pano, ao invés de pães, ele viu pétalas de rosa. As duas intervenções – a promessa pelo fim da guerra e o milagre da conversão dos pães em pétalas de flores – teriam levado a Rainha Isabel a criar a festa em devoção ao Espírito Santo, que havia intercedido por ela e sua família. As Folias do Divino10 também teriam surgido nesse contexto para expandir a fé no Divino Espírito Santo e arrecadar donativos para a realização da festa, ou, “esmolar o Divino” (CASCUDO, 2012). A Folia saía envolta em muita alegria e acompanhada de instrumentos musicais e da bandeira com a pomba no centro, representando o Divino Espírito Santo. Durante os festejos, era permitida às Ordenações do Reino a distribuição de comida aos pobres e a coroação do Imperador simbólico (ABREU, 1999: 39). Em São Bartolomeu, há a presença da Folia do Divino, assim como a distribuição de comida e o cortejo do Imperador. Os chamados “foliões” passam nas residências juntamente com a bandeira do Divino, cantando e tocando canções para pedir esmola 11. Tanto a saída da bandeira como a festa – realizada nos dias que circundam 24 de agosto, data do padroeiro do distrito - são marcadas por muita alegria e devoção ao Divino Espírito Santo12. Talvez, até mesmo pela escassez de acervos históricos escritos para delinear datas de fundação, os habitantes reescrevam sua história – bem como a de seus antepassados –, datando-a a um tempo que remonta ao período colonial, demarcado pela celebração em homenagem ao Divino Espírito Santo e à sua bandeira. Deste modo, as homenagens ao Divino e a bandeira são tidos como elementos que existem há mais de 250 anos e que, no presente, resguardam os traços do passado, remetendo-os a uma linhagem de permanências e inserindo-os na tradição. Por meio das entrevistas realizadas com os moradores do distrito, nos deparamos com a dinâmica da oralidade e da memória, na qual as versões dos fatos, justamente por serem esses objeto e matéria de memória, estão em permanente mutação no tempo. A Festa pode ser dividida em dois grandes momentos: o período de peregrinação para a arrecadação de donativos para a festa; e a festa em si, no domingo, dia do Imperador do Divino. Para fazermos a análise da festa a partir da museologia, nos deteremos no primeiro momento, o da peregrinação da bandeira junto da Folia.

10

As Folias do Divino foram criadas para expandir a fé no Espírito Santo e arrecadar donativos para a realização da festa em sua homenagem. Todavia, existem festas que são realizadas sem a presença de uma Folia. 11 O termo esmola designa os donativos arrecadados para a realização da Festa do Divino. 12 Embora a celebração em homenagem ao Divino Espírito Santo aconteça, segundo o calendário católico, em Pentecostes, a festa é celebrada no distrito de São Bartolomeu no dia do santo padroeiro, devido a inviabilidade econômica de promover duas grandes festas. 99

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Para dar inicio a essa análise recorremos ao conceito de imaginação museal, qual seja, a liberdade e inventividade para pensar o museu enquanto representação de memórias corporificadas que podem ser lidas em qualquer parte. Seguindo essa lógica, casas, fazendas, escolas, fábricas, estradas de ferro, músicas, minas de carvão, cemitérios, gestos, campos de concentração, sítios arqueológicos, notícias, planetários, jardins botânicos, festas populares, reservas biológicas tudo isso poderia receber o impacto de um olhar museológico (CHAGAS, 2007:220).

Esses espaços, situações e experiências citados acima como a possibilidade de ação e interpretação por meio do olhar museológico constituem a relação do Homem com aquilo que está fora dele, ou seja, com os objetos e artefatos. Waldisa Russio definiu o objeto da museologia como o “fato museal”. Esse fato, por sua vez, seria a relação profunda entre o homem e o objeto (ou artefato) em variados níveis de consciência e apreensão, como a visão, a audição, o tato. Essa relação se dá em um enclave

específico,

o

museu

institucionalizado13.

Dentro

do

museu,

cenário

institucionalizado, que compreende desde “templo, laboratório, casa de objetos, centro de convívio, até o ecomuseu”, preocupa-se “com a relação homem-realidade ou homem-objeto, dentro de parâmetros de fidelidade, documentalidade e testemunhalidade” (GUARNIERI, 2010: 150). Por fidelidade entendemos a veracidade do documento ou testemunho. O termo documento, etimologicamente, tem como base a palavra docere, ou seja, ensinar. Trata-se, portanto, de algo que não apenas diz alguma coisa, mas ensina algo a alguém, da mesma forma que o testemunho testifica algo de alguém para outra pessoa. Sendo esses alguns dos parâmetros para a musealização e para a construção de uma memória musealizada, consideramos os versos cantados pela Folia como objeto-artefato, uma vez que documentam e testemunham uma realidade, ao mesmo tempo em que ensinam por meio de suas narrativas. O ensinar e narrar, nesse caso, são entendidos a partir do que Benjamin trata como um conselho sábio, que não está interessado “em transmitir o “puro em-si” da coisa narrada como uma informação ou um relatório” (BENJAMIN, 1987:205), mas “o saber, que vinha de longe – do longe espacial das terras estranhas, ou do longe temporal contido na tradição” (BENJAMIN, 1987: 203), que faz necessário recorrer “ao acervo de toda uma vida (uma vida que não inclui apenas a própria experiência, mas em grande parte a experiência alheia. O narrador assimila à sua substância mais íntima aquilo que sabe por ouvir e dizer)” (BENJAMIN, 1987:221). 13

Instituição no sentido de reconhecimento público e não apenas de um reconhecimento estatal. 100

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O primeiro momento da Festa, período de peregrinação da Folia do Divino com a Bandeira no intuito de recolher donativos, corresponde às premissas de um objeto museológico, uma vez que representam formas cristalizadas ou arquetípicas da memória e da identidade de determinado grupo. A Bandeira, com o bordado de uma pomba em seu centro representando o Divino Espírito Santo, é entendida pela comunidade como sendo a própria divindade. A Folia, ao sair tocando e cantando de casa em casa na presença da Bandeira, atua como um mediador cósmico. O processo de poetização, da narrativa pelo canto, assim como a construção de emblemas (como a bandeira) são meios de proceder à criação e difusão de arquétipos, tal como assinala Meletínski (1998). Podemos observar a partir daí que não há uma diferenciação, por parte da comunidade, entre os aspectos sagrados e profanos da festividade. Os elementos profanos como a música folclórica, instrumentos musicais e a bandeira são entendidos como componentes essenciais do ritual. Segundo Cornelius Castoriadis, o ritual não se comporta como um processo racional, porque se assim o fosse seria possível distinguir o essencial do secundário, seria possível identificar hierarquizações que são próprias da rede racional. Segundo este autor: “a colocação no mesmo plano, do ponto de vista da importância, de tudo o que compõem um ritual, é precisamente o indicador do caráter não racional do seu conteúdo (...) tudo aquilo de que o sagrado se apoderou é igualmente sagrado” (CASTORIADIS, 1982: 144). Os dois principais instrumentos musicais da Folia são a caixa surda e a viola. A caixa surda desempenha o papel de anunciar, nas localidades, que a Folia está passando – esse papel pode ser realizado também pela queima de foguetes, elemento sempre presente nas celebrações do Divino e alvo de polêmicas. Ao entrar nas casas, o “toque da folia” é iniciado com a viola. Há um vocal responsável pela “tirada” dos versos, ou seja, dentre os inúmeros versos existentes, o responsável pelo cortejo elege um. Após iniciar a “tirada”, os outros integrantes o acompanham. Existem três momentos específicos no que tange ao canto dos versos: o da chegada, quando eles pedem licença para entrar na casa; o de agradecimento à esmola que “cai” – esse possui inúmeras variações, pois cada situação ou pessoa a quem a esmola é ofertada exige um verso diferenciado; há versos para crianças, almas, festeiros, para curar pessoas doentes, etc.; o terceiro é o verso de despedida. Para finalizar, a caixa entra novamente em ação, encerrando o toque. Os versos são cantados na medida em que “chove” no prato de esmolas. A cada oferta, de dinheiro ou gêneros, e independente da quantidade, os foliões são “obrigados” a toca e a cantar, ora para agradecer, ora para fazer a ponte entre quem doa a esmola, a 101

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esmola e a divindade. Esses versos são cantados com variações e, segundo um dos foliões, eles conseguem passar por dez casas sem repeti-los. Os foliões, ao cantarem e tocarem nas casas, estão construindo narrativas e perpetuando o “dom de narrar”, uma vez que “o narrador retira da experiência o que ele conta: sua própria experiência ou a relatada pelos outros. E incorpora as coisas narradas à experiência dos seus ouvintes” (BENJAMIN, 1987:201). Cada verso conta a experiência, o compartilhamento da vivência do ambiente da festa. Seja durante a partida da comitiva, o pedido de licença para se entrar em uma casa, o agradecimento pela oferta, ou a despedida. No verso de partida narra-se a justificativa de ser da Folia, bem como a forma que se dá a sua peregrinação pela comunidade: “O Divino vai partir/Com sua missão/De levar a salvação/E alegrar o coração”; “O Divino vai partir/E reunir a multidão/Que cantará ao Divino/Junto aos foliões”; “O Divino vai em comitiva/Para levara fé e esperança/A tanta gente sofrida/Deixar sua bem aventurança”. Os participantes colocam em evidência dois pontos básicos para analisarmos a Festa e a Folia: 1) A missão da Folia é levar a salvação e alegrar o coração de seus fiéis. Isso significa dizer que a Folia faz a mediação e exerce ações atribuídas à Divindade, uma vez que o próprio “Divino” é quem vai, em comitiva, levar a “bem aventurança” ao povo; 2) A Folia pressupõem uma comitiva formada pelos chamados “foliões”, e reúne inúmeras pessoas para reverenciar a divindade por meio do canto. Nos versos de chegada a uma casa, a Folia observa se ela pertence a um homem ou a uma mulher, e é por meio dessa constatação que o verso é eleito e cantado. Se a casa em que paraa comitiva seja a do Imperador daquele ano, então o verso será apropriado à ocasião: “Senhor(a) dono da casa/Viemos hoje, em bom destino/E também pedimos esmola/Para a festa do Divino”; “Chegamos nesta casa/Com a bandeira na frente/O Divino Espírito Santo/Que abençoa esta gente”; “A chegada nesta casa/Com a bandeira na mão/Nós Também pedimos esmola/Pra fazer a procissão”; “Chegamos nesta casa/Com um ramo de flor/Chegando e dizendo/Viva Viva o nosso Imperador”.

A Folia pede licença ao dono ou dona da casa, e canta o motivo da sua presença: pedir esmola para a Festa do Divino. A Bandeira que, naquele momento não só representa, mas assume-se como o próprio Divino Espírito Santo, chega na frente,com o intuito de abençoar e, de certa forma, legitimar o pedido de esmola.Há, no total, cerca de 60 musicas que são combinadas de forma variada, de acordo com o responsável em “tirar os versos”: [...] são infinitas musicas. Porque cada música que eu tiro, quando sou eu que estou tirando as músicas, ela tem duas, três, quatro respostas, a mesma musica que a gente tira. (...) Se é uma música para um senhor, 102

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pode ser um senhor muito velho, um senhor mais novo, aí depende muito. Se é para uma criança... Se é para uma criancinha mais nova, precisa de um anjinho da guarda, se é uma mais adulta. (...) As músicas até para tirar são poucas mas as respostas são demais. Em torno de sessenta, setenta músicas que a gente tem (ENTREVISTADO 1, 2010).

A maioria dos versos cantados foram transmitidos pela oralidade. Os foliões que, antes disso, eram apenas fiéis, participantes ou admiradores dessa manifestação religiosa, aprendiam os versos quando a Folia passava em suas casas, no período que compreende junho a agosto: E1: Já aprendi quando a folia passava tocando de casa em casa há uns anos atrás, foi onde eu aprendi a tocar. Aliás, aprendi as musicas. A tocar não. A tocar eu aprendi a pouco tempo. Eu não sabia. Desde seis, sete anos de idade, oito anos quando passava lá em casa que era a noite. Aí quando cantava eu aprendia as musicas. Gravei e não esqueci mais. Hoje eu to aprendendo mais e to correndo atrás de mais musicas para poder aprender e deixar para as pessoas que queiram aprender (ENTREVISTADO 1, 2010).

Através do relato do Entrevistado 1, podemos avaliar a dimensão que a Folia ocupava no imaginário dos habitantes da localidade, bem como o empenho em se perpetuar a tradição, uma vez que próprio entrevistado desenvolve medidas de pesquisa e preservação dos versos: as ultimas que eu peguei foi do Pedro Rufino que saiu como chefe de bandeira e tocava também. Tocava viola, cavaquinho, tocava tudo. E os filhos dele, que são o Valdir e o Totonho Rufino acharam um papel todo já deteriorado, já comido por traças e copiaram e passaram para mim. E tem uma outra menina aqui do Capanema que ela sabe muita coisa. Ela era muito nova e já acompanhava a folia cantando. (...) E ela me ensinou uma três musicas e eu já toco essas músicas que ela me ensinou e ela pediu para eu ir lá para ela me passar o resto das letras que ela já sabe (ENTREVISTADO 1, 2010).

IV. Considerações Finais Ao entendermos os versos cantados pela Folia como objeto-artefato, constitutivo da memória e do ser humano enquanto homem cultural e historicamente situado, buscamos inserir o espaço de vivencia da Festa em uma perspectiva analítica cujo motivo condutor é um museu imaginado. Por meio das relações folião-fiel-versos é possível identificar as três funções de um museu, tal qual estabelecidas por Peter Van Mensch, como já mencionado, que seriam preservar, estudar e transmitir. Os foliões, ao pesquisarem sobre a existência de mais versos,ao dialogarem com os mais velhos, detentores da sabedoria inserida na tradição, estudam seu objeto-artefato e, na medida em que o fazem, inserindo-os em registros escritos e em seu repertório musical, desenvolvem ações de preservação,

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transmissão e comunicação aos outros membros das comunidades pelas quais a folia passa no período de peregrinação. Não compactuamos com percepções teórico-metodológicas de que tudo é “museu”. A partir desse trabalho, buscamos mostrar de que forma os conceitos da museologia podem ser úteis na interpretação e análise do patrimônio, aqui entendido como instância de valoração de bens culturais, por serem representantes da identidade e da memória de determinado grupo social.

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MUSEUS INTERIORANOS E ABORDAGENS EDUCACIONAIS: CONSIDERAÇÕES SOBRE POSSIBILIDADES DE CONEXÕES SOCIOCULTURAIS ENTRE INSTITUIÇÕES - O CASO DO MUSEU CARLOTA PEREIRA DA SILVA Camila dos Reis Silva1 Luciana Menezes de Carvalho2

Resumo: O seguinte trabalho tem por objetivo demonstrar como as coleções dos museus interioranos podem contribuir para o desenvolvimento de conexões socioculturais locais, como por exemplo, a (re) construção de identidades individuais e coletivas. Os museus interioranos são, em sua maioria, pequenos museus de história/cultura local, existentes em pequenas cidades. Estes museus são o objeto deste trabalho, tendo como estudo de caso o museu interiorano Carlota Pereira da Silva, que além de possuir acervo multifacetado, tem como seu discurso principal a história e cultura de Carmo do Rio Claro, em Minas Gerais. Este trabalho se divide em 04 partes: 1. Introdução breve sobre museus, educação e museus interioranos em geral; 2. Discussão teórica sobre museus interioranos e educação; 3. apresentação do museu Carlota Pereira da Silva; 4. Considerações finais que caminham em direção à defesa de que estes museus, de uma forma geral, possuem geralmente um acervo local rico, com grande potencial para desenvolver atividades educacionais, contribuindo não somente para a exposição da cultura material local, como também para a (re) elaboração de identidade individual e comunitária.

Palavras chave: Museus interioranos, identidades locais, abordagens educacionais. Abstract: The following work is to demonstrate how the collections of provincials museums can contribute to the development of local socio-cultural connections, such as the (re) formulation of individual identities and collective. The provincials museums are mostly small museums, local history/culture, existing in small towns. These museums are the object of this work, in particular the small-town museum Carlota Pereira da Silva, which has beyond the multifaceted acquis, has as its main discourse the history and culture local of Carmo do Rio Claro, Minas Gerais. This work is divided into 4 sections : 1. Brief Introduction of museums , education Inner and museums in general; . 2 Theoretical discussion about education provincials and museums ; 3. presentation of the museum Carlota Pereira da Silva ; 4. Concluding remarks. We believe that these museums, in general, usually have a rich local collection, vast, with great potential to develop educational activities and to contribute not only to the exposure of local material culture, but also to the (re) elaboration of individual identity and community.

Keywords: provincials museums, local identity, educational approaches.

1

Graduada em História – UNIFAL-MG. Museóloga (Unirio), Mestre e Doutoranda em Museologia e Patrimônio (Unirio/Mast); Diretora do Museu da Memória e Patrimônio da Universidade Federal de Alfenas. 2

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1.

Introdução Os museus, de forma geral, possuem as funções sociais de conservar, preservar e

expor os patrimônios (históricos/culturais/naturais) materiais e imateriais da humanidade, porém nem todos conseguem exercê-las em sua plenitude. Alguns museus, especialmente os interioranos, pequenos museus de história local existentes em pequenas cidades, compartilham dificuldades ao exercerem as funções e obrigações amplamente difundidas para os museus pelos órgãos internacionais e nacionais da área, por motivos variados, dentre estes: falta de investimento, estrutura ou ausência de profissionais trabalhando nesses museus. Por estas razões este trabalho é direcionado a tais museus, em especial ao Museu Carlota Pereira da Silva, localizado na cidade de Carmo do Rio Claro, em Minas Gerais, visando não só para colaborar para que estes consigam atingir seus objetivos sócioculturais, mas também para democratizar esses espaços (por serem em sua maioria elitistas), bem como utilizá-los como complemento à educação, pois acreditamos em suas potencialidades educacionais. Nosso objetivo principal é delinear sobre o papel desses museus que, aliados às práticas do campo da Educação, podem contribuir para se estabelecer conexões entre indivíduos e acervo. Essa conexão possibilitará aos indivíduos do local se perceberem no contexto do museu, seja pelo compartilhamento de elementos comuns, seja pelo confronto com elementos não familiares, existentes na exposição. Assim, essas conexões estabelecerão transformações e (re) formulações identitárias. Assim, este trabalho possui a seguinte trajetória: Na parte 2 faremos uma discussão teórica a respeito dos museus interioranos e das abordagens educacionais como fator dinamizador da educação e do espaço museal, bem como sua importância para se estabelecer conexões entre indivíduos e sociedade, por meio das coleções. Na parte 3 apresentaremos brevemente o museu Carlota Pereira da Silva e, por último, na parte 4 apontaremos as considerações finais deste trabalho.

2.

Museus interioranos e abordagens educacionais: das coleções de museus às

conexões sociais. Museus, de forma geral, se constituem como espaços em potencial para a difusão, reflexões e estudos, além de promover à humanidade a conservação, preservação e exposição de seus patrimônios. Porém levando em conta suas fragilidades, tais como ser 107

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considerado um espaço elitista, para uma efetiva conexão entre patrimônio e/ou indivíduo faz-se necessário diferentes abordagens (principalmente de cunho educacional). E os museus interioranos, em especial, possuem um grande potencial para estabelecer conexões entre as pessoas, contribuir para as formulações e reformulações identitárias individuais e coletivas, através da exposição do patrimônio cultural e histórico local. Quando falamos de museus interioranos, nos referimos àqueles museus de cidades com menos de 100 mil habitantes, com pouca dinamização, onde há escassez de espaços culturais mas, quando há esses espaços, poucos são aproveitados pela comunidade. Cidades com mais 100 mil habitantes já possuem uma dinamização cultural maior, dando em geral outras possibilidades culturais à população. Em sua maioria, um museu interiorano é um pequeno museu, mas nem todo pequeno museu é interiorano, visto que podem existir pequenos museus em cidades metropolitanas. Os museus interioranos são pequenos museus, de história local, em pequenas cidades. Por serem raros e às vezes o único espaço cultural da cidade, merece atenção não somente como complemento à educação, mas também como reconhecimento, coesão social e (re) formulação de identidade, possível de se chegar através do confronto de ideias diversas. Na atualidade já se tem percebido que apenas as funções de preservar e conservar não são suficientes: o papel do museu junto à comunidade, bem como uma preocupação por atividades educativas, são questões já amplamente discutidas ao longo do século XX pelos profissionais de museus. Aqueles que possuem boas estruturas físicas, financeiras e profissionais, em sua maioria, conseguem atingir de certa forma as diretrizes propostas pelo ICOM, mas os pequenos museus, que são inúmeros, e que não dispõem geralmente de amplos recursos, continuam perpetuando a ideia de “museu onde se guarda coisas velhas”. Adequam-se a essa concepção defasada do significado de museu, realizando apenas um papel “expositivo” do acervo. A nível nacional, com o decreto presidencial, Lei nº 11.904, de 14 de janeiro de 2009, sancionado pela presidenta Dilma Rousseff, este também regulamenta a função dos museus. O estatuto dos museus no Brasil possui as mesmas premissas já contidas no estatuto do ICOM, responsabilidades tanto com as questões fundamentais como a conservação, preservação e exposição do patrimônio material e imaterial quanto com os pressupostos desenvolvidos com as declarações do ICOM, como acessibilidade ao museu, desenvolvimentos educacionais, fomento de conhecimentos, integração com a comunidade e preocupação social. 108

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Colocar todas essas questões em prática tem sido um desafio devido a motivos variados, como o descompromisso de alguns museus com tais questões, falta de estrutura profissional e orçamentária. Os grandes museus já possuem algumas dessas dificuldades, os pequenos sofrem ainda mais, suas potencialidades são pouco exploradas e pouco comprometimento para com sua função social (BRANDÃO, 2013, p. 6). Ainda segundo Inês Fialho Brandão, esses problemas fazem com que os pequenos museus prejudiquem até mesmo sua função social: Normalmente, tutelas e financiadores resolvem os dilemas acima enunciados com uma palavra: “polivalência‟. No entanto, aquilo que entendem por “polivalência‟ – pessoal não qualificado para as funções que desempenha, mal remunerado, que acumula funções, sem ter as aptidões necessárias, para além da boa vontade, para desempenhar cada uma delas de modo profissional e com resultados – não só desprestigia o conceito, como limita seriamente a capacidade de o museu realizar a sua razão de existir (BRANDÃO, 2013, p. 6).

Ademais a maioria desses pequenos museus retrata a história e cultura local, essencial para a (re) formulação de identidades, através da memória e da história explicitada por meio do acervo. O indivíduo, ao entrar em contato com o acervo, de inúmeras formas, reflete e se questiona sobre os objetos, se reconhece ou não neles, contribuindo para a sua construção identitária. Enquanto os pequenos museus forem tratados apenas como mera instituição informativa, suas potencialidades sociais, educacionais e culturais não serão devidamente aproveitadas, podendo deixar de efetuar um trabalho transformador de desenvolvimento social, de integração da sociedade, deixando de prestar um serviço importante à cidadania. É necessário ressaltar que a identidade é formulada não somente com o confronto com a cultura do outro, mas também da relação que o individuo estabelece ao enxergar alguns aspectos culturais comuns, como diria Maurice Halbwachs, aguçando sua afetividade com a memória histórica loca. Um museu local que traga a cultura local e também vestígios de outros lugares, fator comum nos museus interioranos, além de reforçar identidades, pode trazer ao público conhecimentos de outras culturas, permitir uma reflexão sobre o outro, material interessante a ser a trabalhado em abordagens educativas. Os pequenos museus são ferramentas importantes da sociedade para manter a identidade sociocultural de um grupo, e por isso a existência e o apreço destas ferramentas são fundamentais para manter vivas as características culturais de um grupo. Brulon entende como esses museus locais são imprescindíveis no que diz a respeito à identidade do indivíduo e coletiva ao dizer que [...] o museu produz, então, um olhar sobre as coisas, antes mesmo de produzir um saber sobre aquilo que se vê. Em museus de pequeno porte, que desenvolvem uma ação mais local, é, com efeito, mais fácil normatizar 109

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os olhares e as experiências variadas e singulares sobre o patrimônio. A ação desses museus, nos quais o olhar coletivo é mais facilmente construído, é, assim, percebida como mais efetiva, e a mudança social pode ser alcançada mais rapidamente (BRULON, 2013, p. 20).

Museus interioranos geralmente são constituídos por uma exposição de longa duração e estática, espaços onde o público apenas tem o contato com os objetos e nada mais. Já foram enfatizadas as potencialidades dos museus interioranos e, dentre eles, os museus de história tendem a se destacar ainda mais. Ademais, os museus históricos instigam o senso crítico do individuo pois, por meio da narrativa histórica do acervo do museu, traz ao indivíduo informações que podem ser percebidas e relacionadas com seu cotidiano. Museus históricos podem fomentar a reflexão crítica desde que deixe claro que trata-se de uma interpretação sobre os fatos e possibilite ao indivíduo questionar sobre a validade ou não daqueles acontecimentos, transpondo-os na atualidade, colaborando para o desenvolvimento de conexões entre coleções e indivíduos para a construção das identidades individuais e coletivas. Ademais, a exposição dos museus de história tende a relativiza tais acontecimentos, enaltecendo-os e/ou negligenciando-os em seu discurso, às vezes por intencionalidade ou até mesmo pelo espaço físico e do acervo não permitirem uma abrangência histórica maior. Morais nos diz que A elaboração de um texto para uma exposição de caráter histórico pode pretender transparecer uma imagem democrática e isenta, mas quando seleciona uma vertente, um viés específico em sua abordagem, pode direcionar o entendimento do aluno, limitando a sua compreensão de que o fato histórico não é um acontecimento isolado, mas consequências de diversos fatores sejam econômicos, políticos ou sociais, que se interrelacionam permitindo diversas análises. É através da orientação dada à pesquisa, da seleção de informações e de objetos que disponibilizará ao público e da elaboração de seus textos que o Museu mostra o seu caráter democrático ou autoritário, educativo ou apenas informativo (MORAIS, 2008, p. 34).

Neste caso, é essencial que haja um engajamento entre escolas e museus, entre professores e os responsáveis pelas abordagens educativas, para que não hajam interpretações históricas equivocadas. Ainda, espera-se que a ação educativa seja não somente informativa, mas que estabeleça uma relação do acervo com o conhecimento histórico, de forma crítica. Existe uma grande riqueza educacional nos museus interioranos e que vale uma investigação que coloque essas questões em pauta. Um olhar mais apurado para esses pequenos museus traria um reconhecimento de sua importância pois, além de sua função social, seria um complemento interessante à educação, e a coesão comunitária através da percepção do patrimônio local exposto e (re)formulação de identidades. A junção

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desses fatores só tem a acrescentar na constituição do indivíduo, da sociedade e na dinamização do ensino. Sobre as abordagens educacionais - uma educação acrítica, que tem respaldo em um currículo escolar acrítico e de aulas apenas informativas, dificulta o desenvolvimento pessoal do indivíduo, e consequentemente o seu desenvolvimento social (FREIRE, 1970). Por isso pensamos em uma abordagem metodológica que fuja da educação tradicional ou informativa/acrítica, especialmente no campo de ensino da disciplina de História. A preocupação desta proposta visa dar oportunidades educacionais que privilegiem o senso crítico, a reflexão, e não a mera reprodução e informação, presente tanto nas aulas de História do ensino básico como presente nas instituições museais, principalmente nas interioranas. Para isso recorremos à relação dialógica de Paulo Freire, pois acreditamos na colaboração entre os conhecimentos dos alunos junto ao professor, contribuindo com a difusão de ideias, dinamização da reflexão e desenvolvimento cognitivo. Neste caso, abordagens educacionais críticas estimulariam os indivíduos a pensarem nos personagens e culturas ali silenciadas, o porquê do discurso tendencioso do museu. As abordagens educacionais deste gênero ajudariam os visitantes a perceberem os personagens ali pouco evidenciados, estimulando-os a entender a história a contrapelo, como diria Walter Benjamim, que dizia também que o dever da história é proporcionar a redenção do passado, como uma espécie de “vingança” da história do oprimido (BENJAMIN,1994). Na abordagem educacional, os visitantes seriam estimulados a pensar quem são os personagens ali não evidenciados? O por que eles não se encontram presentes nitidamente no discurso do museu? Qual importância teriam essas para a formação da cidade? Cabe aos historiadores e/ou professores ler, estudar e ensinar a contrapelo os conteúdos históricos, ensinar não somente a história evidenciada, mas principalmente aquela silenciada. A perpetuação da história e memória dos vencedores, apontada por Benjamin, por ser parte de uma fração mínima de um grupo maior, faz com que esse outro grupo que não tenha suas histórias e memórias evidenciadas, tendo dificuldades de se reconhecer na história local, no discurso do culto à memória coletiva da cidade, logo a sua relação de pertencimento daquela sociedade pode não ser efetiva. História e memória coletiva não estão desassociadas da identidade do indivíduo; sua identidade é formulada de suas particularidades, frutos de experiências e lembranças próprias, em confronto com as experiências e lembranças coletivas. É necessário ter um laço afetivo entre memória individual e coletiva, através do compartilhamento de noções comuns (HALBWACHS, 1990, p. 34). 111

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Entendemos as dificuldades em desenvolver atividades educacionais nestes museus, pois, para tal, é necessário estabelecer um vínculo entre as duas instituições que por sua vez possuem problemas particulares: no caso do museu interiorano, em geral, falta de apoio orçamentário e mão de obra especializada; e no caso das escolas, enrijecimento das metodologias didáticas e do currículo escolar, transformando as aulas, especialmente as de história, em meramente descritivas e sem despertar o senso crítico nos alunos. Contudo, acreditamos que qualquer tentativa que visa o bem comum, o desenvolvimento do outro, da sociedade, é válida como esforço, levando em conta tanto concepções éticas de diferentes ofícios - educador, historiador, museólogo - tanto como um exercício de cidadania. Independente da tipologia do museu, se tradicional ou não, pequeno ou grande, de exposições de longa ou curta duração, ele sempre desencadeará ao visitante um mundo de possibilidades antes ignorado pelo próprio indivíduo, sendo desta forma inegável a dimensão do desenvolvimento cognitivo que um museu é capaz de proporcionar. Mas acreditamos que os museus, especialmente interioranos, podem ser considerados como complementares aos espaços formais de educação; as coleções desses museus são meios importantes para se estabelecer conexões entre indivíduos e sociedade.

3. Museu Carlota Pereira da Silva. Essas ideias sobre o que seriam os museus interioranos e suas potencialidades sociais foram pensadas a partir do momento em que realizei um estágio voluntário no museu Carlota Pereira da Silva, em Carmo do Rio Claro, Minas Gerais, e, como graduanda em História (Licenciatura), me indaguei a respeito das visitas promovidas pelas escolas ao museu, e se havia certa efetividade educacional e social nessas ações. Observando as visitas compreendi que elas tinha um caráter meramente informativo, me instigando a pensar no porquê disto e se haveria alguma alternativa que transformasse essas visitas em um aprendizado mais efetivo e profundo, tanto pensando no campo educacional/social quanto museal. O museu Carlota Pereira da Silva é um museu de história local e regional de uma minoria da população e, além de outras peculiaridades do acervo de outras culturas e períodos históricos, pouco evidencia a maior parte da origem da população histórica de Carmo do Rio Claro: os brancos pobres ou de uma classe social intermediária, negros e índios (PREFEITURA MUNICIPAL DE CARMO DO RIO CLARO). O discurso do museu é, de maneira geral, expor aspectos culturais das famílias abastadas Carmelitana e sul mineira 112

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de outrora. Tem por finalidade preservar a história local e um culto à memória dos cidadãos carmelitanos, apresentando-se assim aos demais visitantes parte da história/cultura local e não restringindo somente ao enfoque de colecionismo ou à concepção sobre museus ainda muito difundida pelo senso comum: “local de guardar coisas velhas”. O museu desempenha o seu papel informativo sobre parte da população e suas raízes culturais e identitárias, além da exposição de outros objetos de nacionalidades diferentes. O museu foi elaborado por Edgard Pereira da Silva, filho de Jayme Silva e Carlota Pereira da Silva. Carlota, que nasceu em 1908, foi uma personagem carmelitana famosa por sua produção de doces artísticos3, deixando assim seguidores. Carlota faleceu em oito de dezembro de 1993, sendo lembrada e homenageada pelo seu filho e idealizador do museu, nomeando o Museu de Carlota Pereira da Silva. A família Carlos Pereira da Silva era uma das mais abastadas da cidade e o museu foi constituído por doações de familiares e integrantes de outras famílias ricas da cidade, possuindo uma influencia bem elitista na sua concepção. Ainda há peças adquiridas durante viagens de Edgar Pereira da Silva, peças estas de várias nacionalidades e culturas, dando um caráter multifacetado ao museu. O acervo do museu é dividido em 07 (sete) espaços, sendo que 06 (seis) recebem nomes de familiares do idealizador Edgar Pereira da Silva; e o último espaço é uma réplica em miniatura da Antiga Igreja Matriz da cidade, que foi demolida e reconstruída outra no local.

Sala Prudenciana Maria da Conceição (Guia informativo do Museu Carlota Pereira da Silva, 2012).

3

Atividade que movimenta as feiras artesanais e econômicas da cidade (recorrente até os dias atuais). 113

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Mesa de embuia do século XIX com cadeiras autênticas, maciças, que pertenceu a uma fazenda do sul de Minas Gerais (Guia informativo do Museu Carlota Pereira da Silva, 2012).

Aparador de madeira contemporâneo com sopeira Francesa e vasos do início do século XX (Guia informativo do Museu Carlota Pereira da Silva, 2012).

Ou seja, um museu interiorano, de história local, com um discurso elitista tende a dificultar conexões sociais por parte das demais parcelas da população, caso os visitantes não reflitam criticamente a exposição. Haverá apenas um estranhamento dos elementos culturais/históricos não comuns compartilhados, ou seja, um estranhamento da maior parte da população para com a história/cultura de uma minoria objetivamente demonstrada. Porém os elementos históricos/culturais comuns compartilhados da maioria da população não evidenciados claramente no discurso do museu, que são tão importantes quanto elementos não comuns para a formulação da identidade do indivíduo, estariam perceptíveis nas coleções principalmente quando esta for questionada. A maioria da população se reconheceria nos personagens, na história e cultura ali pouco evidenciada, se questionando o por quê o museu possui esse discurso, quais eram as demais culturas locais, quem eram essas pessoas, qual importância elas tiveram para o 114

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desenvolvimento da cidade. Caso esta reflexão esteja ausente ou mal elaborada pode fragilizar um pouco suas construções identitárias locais. Por isso defendemos que, com abordagens educacionais, estimulando a criticidade dos estudantes acerca da exposição, é possível colaborar para a constituição da própria identidade do indivíduo e de sua identidade no social. Nossa preocupação especificamente com esses museus se deve também por serem espaços únicos de valorização de culturas e patrimônios nessas pequenas cidades. Assim como os grandes museus, os pequenos possuem as mesmas responsabilidades, mas há carências profissionais e estruturais mais delicadas, que dificultam muito a execução da função social do museu, como foi dito anteriormente por Brandão (2013), que dirá do desenvolvimento de ações educativas que colabore para as reflexões a respeito do patrimônio histórico cultural local. Embora no guia informativo do museu Carlota Pereira da Silva se afirme que o museu é “direcionado para um objetivo restrito do cotidiano da vida dos cidadãos do sul de Minas Gerais, em época antiga” e que o mesmo pretende “desempenhar um papel educativo e de conscientização popular para o aprimoramento da identidade carmelitana” é visível a tendência do acervo à elite local, dificultando uma efetiva relação com as identidades locais, visto que a maioria da população não é abastada e não se identificará de imediato com a exposição do museu.

4.

Considerações Finais Entendemos que a nocividade não está nesse discurso do museu que tende ao

elitismo, visto que há de resguardar a liberdade do indivíduo de “criar”, de se expressar, além disso, os museus interioranos são geralmente pequenos museus, o que dificulta estabelecer exposições que abranjam a história local/cultural como um todo, ou seja, fugir dessa imparcialidade no discurso do museu não é tarefa fácil. Tentar expor toda a cultura local poderá desencadear uma superficialidade histórica, visto que há pouco espaço físico para um acervo que deveria ser vasto, isto é, a tentativa de condensar a história/cultural de um povo, homogeneizando o discurso, possibilita que alguns fatores possam ser ignorados, podendo ser tão excludente quando um discurso unilateral. A nocividade está no caráter apenas “informativo” do museu, não no seu discurso elitista em si, principalmente quando há visitas escolares; o perigo está em não propor uma reflexão adequada sobre o acervo, possuindo apenas uma preocupação informativa, reprodutiva e acrítica a respeito do acervo e do discurso proveniente dele. Assim, no caso 115

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do Museu Carlota Pereira da Silva, a intencionalidade inconsciente do idealizador do museu é em expor a cultura da minoria rica da população local, sendo ele integrante de uma dessas famílias. A evidência do elitismo está no acervo em si, influenciada pela tendência sociocultural vinda de seu idealizador, como por exemplo, as homenagens concedidas por ele a personagens carmelitanos ricos e integrantes de sua família, bem como a evidência existente no discurso do acervo do museu que, em sua grande maioria, expõe objetos que remetem à cultura e história dessa elite local. Entretanto, através de abordagens educacionais

voltadas

à

criticidade

da

coleção

considerando

as

histórias/culturas/personagens ali silenciadas, podem colaborar para que os indivíduos percebam essa fração não evidenciada no museu, e quem sabe se identificar como parte da “descoberta”’. No museu Carlota Pereira da Silva a história pouco evidenciada é a da maioria da população, mas há de se entender também que, a respeito do idealizador, ele faz parte da minoria dominante, ou seja, a idealização do museu foi uma projeção da empatia do responsável pela classe do qual faz parte. Trata-se, portanto, de uma evidência da nãodemocratização do espaço museal e do discurso da história/cultura local, mas o ponto principal não é o caráter tendencioso do discurso do museu, mas sim a ausência de uma problematização por meio dos professores de história a respeito desse discurso, conforme dissemos anteriormente. Em nosso país, devido a motivos variados, como corrupção, descaso político e educacional, falta de apoio das autoridades competentes, ou seja, qualquer esforço, por mínimo que seja, que venha a amenizar tais defasagens e a somar para o desenvolvimento da sociedade, ajudando na difusão cultural e exercício da cidadania, é válido e digno de reconhecimento. Por isso entendemos que proporcionar ao público local um museu que se preocupe com o desenvolvimento de cada um como indivíduo, como cidadão, e com a percepção de cada individuo perante o mundo, perante sua comunidade, reforçará laços, através da memória dos objetos musealizados. Estas questões são fundamentais para manter a integração de um povo e de conscientização comunitária, questões fundamentais

para exercício da cidadania.

Reafirmamos que ser uma instancia educacional não é responsabilidade dos museus, mas é uma parte importante de suas funções/ações, que pode ser melhor trabalhada como complemento à educação e uma contribuição significativa à cidadania. Por isso entendemos que estes museus, os interioranos, de uma forma geral, possuem um grande potencial em seu acervo para o desenvolvimento de atividades educacionais, que podem contribuir não 116

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

somente com a exposição do material cultural local, como colaborar também para a coesão social através da (re) elaboração das identidades individuais e comunitárias.

Referências: BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas, Magia e Técnica, Arte e Política. v.I. São Paulo: Brasiliense, 2008. BRANDÃO, Inês Fialho. Pequenos museus, grandes ambições. Informação ICOM.PT. Portugal, série II/ nº 19, p. 6-7, 2013. Disponível em: < http://www.icomportugal.org/boletim_icom,156,355,detalhe.aspx >. Acesso em: 12 nov. 2013. BRULON SOARES, Bruno César. Máscaras guardadas: musealização e descolonização. Tese (Doutorado em Antropologia) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Departamento de Antropologia, Universidade Federal Fluminense, 2012. 448f. _________. O ecomuseu e seu público: a experiência do visitante, entre objetividade e subjetividade. In: Anais da V semana Nacional dos Museus na Unifal-MG. Alfenas, p. 1528, 2013. CD-ROM. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 47ª Ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008. GUIA INFORMATIVO DO MUSEU, Carmo do Rio Claro-MG, 2012. Folheto. HALBAWACHS, Maurice. A memória coletiva. Revista dos tribunais. São Paulo: Vértice, 1990. ICOM. Código de Deontología del ICOM para Museos. Paris: ICOM, 2013. 16 p. MARQUES, Joana Ganilho. Museus locais: conservação e produção da memória coletiva. VOX MUSEI - Congresso Internacional da Arte, Património e Museus. Faculdade de Belas-Artes. Lisboa, p. 1-14, 2013. MORAIS, Silvilene de Barro Ribeiro. Museus de História, memória e cidadania. In: Anais da III Semana Nacional de Museus na Unifal-MG. Alfenas, p. 99-111, 2011. CD-ROM. MORAIS, Silvilene de Barro Ribeiro. Museus e a alfabetização de adultos: reflexões sobre ações educativas nos museus. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Museologia) - Escola de Museologia, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. PREFEITURA MUNICIPAL DE CARMO DO RIO CLARO, 2014. Disponível em: < http://www.carmodorioclaro.mg.gov.br/>. Acesso em: abril. 2014.

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COLEÇÕES NUMISMÁTICAS: PRESERVAÇÃO DA HISTÓRIA POR MEIO DAS CÉDULAS, MOEDAS E MEDALHAS Luciano Alves Teixeira1

Resumo: A Numismática não pode ser vista como simples passatempo ou investimento, mas, sim, como ciência que é, constituindo um dos ramos da História. É por meio do estudo das cédulas, moedas e medalhas que se preserva a memória dos povos, pois elas registram épocas, personalidades, bem como usos e costumes de uma sociedade, com o propósito de resguardar seus aspectos históricos, culturais, religiosos, comerciais, artísticos, ambientais e geográficos. Esses ramos do colecionismo apresentam uma diversidade fascinante de peças, que vai desde o papel-moeda, passando pela moeda metálica e culminando com a medalhística. Cabe, portanto, ao colecionador decidir a qual destas subdivisões irá se dedicar. Ademais, o colecionador é um dos mais importantes entes nesta relação, uma vez que é ele quem resgata a História — ou parte dela — preservando-a por meio de sua coleção. Portanto, as coleções particulares e públicas são uma fonte inesgotável de pesquisa, e contribuem para a manutenção e preservação da História.

Palavras-chave: Numismática. Cédulas. Moedas. Medalhas. Coleção. Abstract: The Numismatics cannot be seen as a simple hobby or investment, but as a science that is, constituting a branch of History. It is through the study of banknotes, coins and medals that preserves the memory of the people, because they record times, personalities and habits and customs of a society for the purpose of protecting its historical, cultural, religious, commercial, artistic aspects, environmental and geographical. These branches of collecting presents a fascinating variety of pieces, ranging from paper money, through coins and culminating with the medals. It is therefore up to the collector to decide which of these subdivisions will devote. Furthermore, the collector is one of the most important ones in this respect, since it is he who rescues the History — or part of it — preserving it through your collection. Therefore, private and public collections are an inexhaustible source of research, and contribute to the maintenance and preservation of History.

Keywords: Numismatics. Banknotes. Coins. Medals. Collection.

1

Advogado e Numismata. Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Alfenas, Universidade José do Rosário Vellano — UNIFENAS. Ex-conciliador-orientador e ex-conciliador do Juizado de Conciliação do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais — TJMG, na Comarca de Alfenas. Membro da Associação Virtual Brasileira de Numismática — AVBN. 118

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“[...] de certa forma, cada colecionador é um guardião, um depositário de pequenos pedaços da história.”2 (Benedito Camargo Madeira, 1993).

1. Introdução As coleções atravessam os tempos e são passadas de geração em geração, tanto por meio de acervos públicos, quanto por intermédio de particulares. Impende consignar que os acervos, os quais compõem as coleções, são os mais variados. Tem-se, desde utensílios domésticos, passando por vestuário, autógrafos, cerâmicas, tampinhas de garrafa, figurinhas, pedras e gemas minerais, fósseis, bilhetes de loteria, caixas de fósforos, selos, até peças ligadas à Numismática. O colecionismo é um meio, um ato humano, que promove a preservação da História da Humanidade, por intermédio da aquisição de peças — de forma onerosa ou não — e de seu respectivo armazenamento, com o intuito de se formar um acervo, o qual irá integrar uma coleção. As coleções numismáticas são formadas pela reunião organizada de cédulas, ou moedas e, também, ou medalhas, tendo em vista que a Numismática é a ciência que estuda, cataloga e classifica tais peças. Sendo isto, com o escopo de determinar, cronologicamente, as atividades humanas inerentes a determinados períodos históricos, bem como os usos e costumes dos povos, cujo material, em comento, pertenceu ou pertence. Podem — as coleções numismáticas — ser divididas em profissionais, onde se mantêm um registro criterioso e minucioso das peças do acervo, mediante catalogação e classificação e não profissionais, categoria esta, na qual o seu possuidor apenas reúne peças, sem qualquer método científico e apenas como distração, visando momentos de relaxamento, ao apreciar o acervo amealhado. No presente estudo, abordar-se-á a importância da manutenção e preservação das coleções numismáticas, como instrumento de pesquisa histórica e de integração entre as pessoas; sejam na qualidade de colecionadores, pesquisadores ou, apenas, indivíduos fascinados por esses objetos, que se fizeram e se fazem presentes no cotidiano de todos. Demonstrando, assim, que as coleções numismáticas formam e criam conexões, mormente 2

MADEIRA, Benedito Camargo. A moeda através dos tempos. 2. ed. Pouso Alegre: Irmão Gino, 1993. p. 70. 119

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difundindo o conhecimento por intermédio de laços de amizade, gerados por um interesse comum: a paixão pela Numismática.

2. Numismática: ciência, hobby e investimento Sendo, a Numismática, uma ciência, posto que é um dos ramos da História, é natural que os critérios técnicos sejam observados para que uma coleção seja formada e composta, de forma criteriosa e de maneira a retratar um determinado período histórico e os comportamentos dos povos. Nesta esteira, é assim conceituada — a Numismática — pelo saudoso e eminente numismata Álvaro da Veiga Coimbra, ex-presidente da Sociedade Numismática Brasileira (SNB) e ex-chefe da Seção Técnico-Científica de Numismática do Museu Paulista da Universidade de São Paulo (USP): NUMISMÁTICA é a ciência que estuda a moeda de todos os povos e de todos os tempos, classificando-a, interpretando-a e descrevendo-a sôbre vários aspectos. Sua denominação provém de numus ou numisma, que significa em latim — moeda. (sic)3

Não é outro o entendimento esposado pelo numismata Kurt Proeber, in verbis: NUMISMÁTICA; s.f. — Ciência que trata do estudo das moedas e medalhas através dos séculos. Em muitos países esta matéria tem cadeira nas Universidades. 4

O estudo numismático é capaz de trazer à lume os usos e costumes dos povos, demonstrando os vários aspectos de determinada civilização, como o florescer e o ocaso de uma época, os aspectos culturais-científicos, representados por elementos mitológicos, religiosos, artísticos, bem como ambientais, com alusão à fauna e flora e, ainda, por meio da representação de personagens históricos que se destacaram por seu heroísmo ou por sua atuação política. Corroborando com a presente afirmação, tem-se: A numismática nos ajuda a compreender o mundo em que vivemos, relatando com o auxílio da geografia, mitologia, arqueologia, paleontologia e heráldica, a história de uma civilização, de uma nação ou de uma era.

3

COIMBRA, Álvaro da Veiga. Noções sôbre Numismática. Revista de História, [S.l.], v. 12, n. 25, p. 241, Mar. 1956. 4 PROEBER, Kurt. Catálogo das moedas brasileiras. 3. ed. Rio de Janeiro: Livraria Kosmos Editora, 1981. p. 207. 120

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São documentos históricos, e/ou artísticos, as variações das ligas metálicas, a difusão territorial, a introdução de novos valores monetários e as inscrições gravadas por soberanos. Todos estes elementos reunidos nos 5 possibilitam compreender melhor a história de uma época.

No mesmo sentido, à colação o escólio do numismata pouso-alegrense Benedito Camargo Madeira, in verbis: A numismática foi o maior meio de comunicação da Antigüidade como veículo de divulgação da cultura, das artes e dos costumes dos povos. As imagens, os sinais e as inscrições gravadas nas peças monetárias permitem à numismática, com precisão científica, reconstruir os acontecimentos da época, resguardando, desse modo — para à posteridade —, a “memória” da civilização antiga. (sic). 6

Impende consignar que a Numismática surgiu como ciência nas primeiras luzes do período Renascentista, ocasião onde se deu as primeiras publicações sobre o tema. Sendo que, “a preocupação moderna começou com o estudo dos sistemas monetários antigos, publicado em 1514 pelo humanista francês, Guillaume Budé e consolidou-se apenas no final do século XVIII e no início do século XIX.” (CARLAN E FUNARI: 2012, 17). Desta feita, conclui-se que, como ciência, a Numismática tem por escopo estudar, catalogando, classificando e registrando, por meio das cédulas, moedas e medalhas, os aspectos cotidianos das civilizações e dos povos, por meio da análise de fatores ambientais, culturais, financeiro-econômico, religioso, político e social, inerentes as mesmas e representativas de determinada época. Como hobby, a Numismática se insere em um universo muito particular, restrito aos particulares que procuram uma distração mental, mediante o colecionismo. Oportuno registar que o humanista e poeta italiano Francesco Petrarca (1304-1374) é reconhecido, oficialmente, como o primeiro colecionador de moedas da História, tendo arrecadado vários espécimes de origem grega e romana (COIMBRA: 1956, 242). Sendo que, assim se posicionava acerca do colecionismo numismático, a saber: [...] Petrarca defendia a tese de que todo colecionador / numismata, deveria ter um objetivo traçada, antes de começar a agrupar seu acervo. Seu objetivo era conhecer a História de cada povo através das moedas. (sic).7

5

MALDONADO, Rodrigo. Moedas brasileiras: catálogo oficial. 2. ed. Turim: MBA Editores, 2014. p. 17. 6 Op. Cit., p. 15. 7 CARLAN, Cláudio Umpierre. Moeda e poder em Roma: um mundo em transformação. São Paulo: Annablume, 2013. p. 43-44. 121

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O colecionador, seja de cédulas, moedas ou medalhas, é um importante instrumento de preservação da História da Humanidade, pois seus acervos garantem a perpetuação do conhecimento, o qual é passado de geração em geração. Sobre o colecionismo, visto como hobby e mais difundido, pode-se delimitar sua origem na Renascença, juntamente com o início do estudo da Numismática e sua aceitação como ciência, integrante de um dos ramos da História. Para ilustrar a afirmação, tem-se o ensinamento do Professor Doutor Cláudio Umpierre Carlan, in verbis: Em sua origem, o colecionismo desenvolvido durante a renascença, esteva retido as casas dinásticas e a nobreza, únicas com condições financeiras e bagagem cultural, para iniciar e manter uma coleção. Séculos depois, industriais ricos e sedentos de cultura, adotaram esse costume. Era um meio de mostrar para a sociedade seu poder, financeiro e cultural, sobre os demais. Assumindo dessa forma a herança nobiliárquica. Na Inglaterra, por exemplo, era comum o matrimônio entre membros da nobreza decadente com os “novos ricos”, comerciantes e industriais. Com a formação dessas coleções particulares no século XVIII, elas vão sendo ampliadas durante boa parte do século XIX. Muitos desses colecionadores, ou seus familiares, doaram partes dos acervos para museus estatais.8

Assim sendo, vista como hobby, pode-se dizer que a Numismática é um meio de promoção da saúde mental, bem como de uma fonte de aquisição de cultura, diante da vasta gama de informações, que as peças numismáticas trazem. Informações estas de ordem histórica, econômica, social, artística e religiosa, com reflexos nas artes plásticas, na geografia, nos idiomas, os quais incrementam a bagagem intelecto-cultural dos colecionadores. Não se pode perder de vista que a Numismática, também, é um investimento. E isto, tendo em vista que toda peça, agregada ao acervo do colecionador, carrega um valor econômico-financeiro. Este valor é auferido pelo grau de raridade das peças, pelo estado de conservação, pelos materiais utilizados em sua confecção (destacando-se os metais nobres, no caso de moedas e medalhas), pela tiragem, pelos métodos de produção empregados na produção, dentre outros fatores mercadológicos. O mercado numismático vem, ao longo dos tempos, tendo um significativo incremento, no que tange a oferta de peças. Oportuno dizer que a procura — por cédulas, moedas e medalhas — vem aumentando e isto, talvez seja, devido a proliferação das novas tecnologias da informação, mormente pela popularização Internet. 8

Op. Cit., p. 44. 122

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Exemplo disto, foi o leilão realizado em Nova Iorque, no dia 05 de janeiro deste ano de 2014, pela empresa Heritage Auctions, sediada em Dallas, Texas, Estados Unidos da América, onde a denominada “Peça da Coroação”, moeda de ouro, classificada como “R.4” (na nomenclatura numismática, uma peça raríssima) e com de valor nominal de Rs.6$400 (seis mil e quatrocentos réis), cunhada em 1822, com tiragem de 64 (sessenta e quatro) exemplares — sendo conhecidos, apenas, 16 (dezesseis) — e com o propósito de comemorar a ascensão de D. Pedro I, ao Trono Imperial do Brasil, foi arrematada por US$ US$ 499.375,00 (quatrocentos e noventa e nove mil trezentos e setenta e cinco dólares americanos), conforme informa o numismata Cristiano Paes9. Ainda, como investimento, pode-se dizer que as coleções numismáticas “são facilmente transportáveis e não se deterioram. Podem agregar muito valor em um pequeno volume e tem cotação internacional” (MALDONADO: 2014, 41). Desta feita, a Numismática sob o prisma de investimento deve ser levada em consideração e há de ser considerada uma commodity, diante de haver um valor econômico-financeiro próprio das peças; ainda que, os numismatas valorizem, em primeiro lugar, muito mais a paixão pela manutenção de suas coleções, do que pelo quantum, em dinheiro, que representam.

3. Coleções numismáticas e suas conexões: preservação da História Tecidas algumas considerações iniciais e necessárias sobre a Numismática, passase a abordagem do tema proposto, com vistas a demonstrar que a manutenção de uma coleção, além de ser uma ciência, um hobby e um investimento, também é uma forma de interação e integração social. O colecionador é, por excelência, um indivíduo dotado de sensibilidade, posto que queda-se inebriado diante das formas, dos materiais, dos tamanhos, das diversas iconografias estampadas e demais elementos plásticos, todos representados e contidos nas cédulas, moedas e medalhas. As peças numismáticas apresentam-se em uma vasta gama de tipos, a serem escolhidas e delimitadas pelo indivíduo que se arvora a colecioná-las. No que diz respeito às cédulas, pode-se formar uma coleção levando-se em consideração o estado de 9

PAES, Cristiano. Peça da Coroação leiloada em Nova York por mais de 1 milhão de Reais. O NVMISMATA, [S.l.], n. 4, a. II, Jan./Fev./Mar. 2014, p. 21. 123

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conservação (apenas novas ou apenas usadas); por países ou continentes; período de inflação; por material (papel-moeda, representado por celulose e seus derivados ou polímero plástico) ou por padrão monetário. Quanto às moedas, uma coleção pode ser formada com peças de ouro, prata, cobre e outros metais; pode-se formar uma coleção optando por moedas da Antiguidade Clássica (gregas ou romanas); outra linha temática são as moedas cunhadas durante a Idade Média ou durante o Renascimento; sem falar das moedas obsidionais e de necessidade ou, ainda, as denominadas falsas de época. Uma coleção de moedas, também, pode ser formada levando-se em conta um determinado período, pelo qual um monarca tenha reinado soberano, sobre um país, sobre um império colonial. Existe, também, a possibilidade de se eleger um tipo, um padrão, monetário, para que seja formada uma coleção. No que diz respeito às medalhas, além de algumas semelhanças quanto a período, metais e emitentes, estas, também podem ser colecionadas levando-se em consideração o seu caráter comemorativo; militar ou civil, no caso de condecorações que dignificam aqueles as quais lhes são outorgadas ou, ainda, aquelas afetas ao sagrado, nas quais o caráter religioso se faz presente. É, portanto, diante da profusão de peças numismáticas é que o colecionador (nem sempre numismata) haverá de estabelecer as bases para formar sua coleção ou coleções; pois, poderá decidir por manter e organizar uma ou mais coleções, filiando-se a uma, duas ou a todas as vertentes numismáticas. O ato de colecionar é uma atividade humana eminentemente social, visto que faz com que haja uma interação

inter personæ (entre indivíduos). Esta interação,

invariavelmente, cria laços de amizade, os quais são oriundos de relações comerciais ou de relações de afinidade, diante de um propósito, de um anseio, comum, materializado e proporcionado pelas coleções numismáticas. É muito comum que numismatas (colecionadores e comerciantes) se reúnam, seja nas sedes sociais das entidades que os congregam e difundem a Numismática; seja em encontros ou congressos, bem como nas feiras promovidas e realizadas em vários países, com periodicidade e continuidade. A troca de experiências e informações, advindas das coleções numismáticas, é uma constante e ocorre, com mais frequência, entre os colecionadores particulares. Entre os 124

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particulares, tais conexões foram alargadas com a maior acessibilidade da Internet e os grupos de colecionismo proliferam-se, nas redes sociais, de maneira vertiginosa. Infelizmente, o mesmo não ocorre entre as instituições públicas, posto que dependem de dotação orçamentária governamental, a qual nem sempre é suficiente para promoção de conexões entre seus acervos e o público em geral. Conclui-se que não é, portanto, errôneo dizer que as coleções numismáticas promovem laços de amizade que, além de servirem como salutar meio de interação e integração social — por meio das conexões, delas oriundas — servem de instrumento de divulgação de conhecimento técnico-científico-cultural, além de preservar o Patrimônio Histórico da Humanidade.

Referências CARLAN, Cláudio Umpierre. Moeda e poder em Roma: um mundo em transformação. São Paulo: Annablume, 2013. 258 p. ISBN 978-85-391-0558-8. CARLAN, Cláudio Umpierre & FUNARI, Pedro Paulo. Moedas: a Numismática e o estudo da História. São Paulo: Annablume, 2012. 100 p. ISBN 978-85-391-0415-4. COIMBRA, Álvaro da Veiga. Noções sôbre Numismática. Revista de História, [S.l.], v. 12, n. 25, p. 241-275, mar. 1956. ISSN 2316-9141. MADEIRA, Benedito Camargo. A moeda através dos tempos. 2. ed. Pouso Alegre: Irmão Gino, 1993. 192 p. MALDONADO, Rodrigo. Moedas brasileiras: catálogo oficial. 2. ed. Turim: MBA Editores, 2014. 1088 p. ISBN 978-88-906933-2-8. PAES, Cristiano. Peça da Coroação leiloada em Nova York por mais de 1 milhão de Reais. O NVMISMATA, [S.l.], n. 4, a. II, Jan./Fev./Mar. 2014, p. 21-22. PROEBER, Kurt. Catálogo das moedas brasileiras. 3. ed. Rio de Janeiro: Livraria Kosmos Editora, 1981. 233 p.

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VI Semana Nacional de Museus na UNIFALMG / XII Semana Nacional de Museus

Museus e Patrimônios: As Coleções criam Conexões Logomarca do ICOM para o Dia Internacional dos Museus 2014.

Universidade Federal de Alfenas, de 12 a 16 de maio de 2014.

VOLUME COMPLEMENTAR – MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL DA UNIFAL-MG P. Maria de Fátima Rodrigues Sarkis e Vitor Xavier Monteiro de Castro – Acervo de Minerais e Rochas do Museu de

História Natural / UNIFAL-MG

Maria de Fátima Rodrigues Sarkis e Jeâni Kelle Landre Rosa – Acervo de Fósseis do Museu de História Natural /

UNIFAL-MG

Maria de Fátima Rodrigues Sarkis e Jeâni Kelle Landre Rosa – Coleção de Fósseis do Museu de História Natural /

UNIFAL-MG

Maria de Fátima Rodrigues Sarkis Vinícius Xavier Silva e Luciana Menezes de Carvalho – Museu de História Natural /

UNIFAL-MG: Espaço Ciência

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ACERVO DE MINERAIS E ROCHAS DO MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL/UNIFAL-MG1 Dra. Maria de Fátima Rodrigues Sarkis2 Vitor Xavier Monteiro de Castro3

Resumo As coleções de mineralogia e petrologia destacam-se desde meados do século XVIII como patrimônio geológico e uma ferramenta para as atividades de pesquisa, ensino e extensão. A constituição de acervos, bem como a identificação e organização em museus, é de fundamental importância para produção de conhecimento cientifico e tecnológico. O trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, objetivou estudar e organizar os acervos de minerais e rochas do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas. A metodologia utilizada foi baseada em técnicas de curadoria, bibliografia especializada e ensaios químicos e físicos. A coleção de minerais está constituída por 285 amostras e a coleção de rochas por 260 amostras. Estas foram devidamente identificadas, rotuladas, registradas em livro tombo, incluindo a confecção das fichas catalográfica e técnica, além de cadastradas em um banco de dados. A coleção é pequena, porém muito representativa e valiosa nas ações educativas desenvolvidas pelo Museu.

Palavras-chave: Museu de História Natural. Coleções de Minerais e Rochas. Educação Patrimonial.

Abstract The collections of mineralogy and petrology stand out from the eighteen century as geological heritage and a tool for research, teaching and extension activities. The constitution of collections, as well as the identification and organization in museums, is of fundamental importance for the production of scientific and technological knowledge. The work which culminated in this paper aimed to study and organize collections of minerals and rocks of the Museum of Natural History University of Alfenas. The methodology was based on techniques of curatorship, bibliography specialized and chemical and physical tests. The collection of minerals is constituted by 285 samples and the collection of rocks is constituted by 260 rock samples. These were identified, labeled, recorded in the book fall, and made technical catalog cards, and registered in a database. The collection is small but very representative and valuable in the educational actions developed by the Museum.

Keywords: Museum of Natural History. Mineral and Rock collections. Heritage Education.

1

Projeto financiado pela Fapemig EDITAL Nº 10/07 - Apoio à Difusão e Popularização de Ciência e Tecnologia - Processo: APQ-6522-5.02/07. 2 Docente - Instituto de Ciência e Tecnologia, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Poços de Caldas. 3 Bolsista de iniciação cientifica Fapemig - Curso de Química, Universidade Federal de Alfenas-MG. 126

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I. Introdução A importância de colecionar minerais e rochas vêm desde meados do século XVIII, com o movimento de valorização dos objetos de estudo de História Natural (Lopes, 1997), a partir deste momento formaram-se grandes coleções de mineralogia e petrologia. O Brasil, como outros países, dispõe de importantes coleções desta área que são consideradas coleções de referencia para todo o mundo como exemplo as coleções do Museu Nacional do Rio de Janeiro, do DNPM e da Escola de Minas. Atualmente as Coleções de minerais e rochas são de grande importância para a preservação do patrimônio geológico e uma importante ferramenta para as atividades de pesquisa, ensino e extensão. Portanto, a constituição de coleções de minerais e rochas, mesmo que pequenas, são de grande valia para as instituições museológicas e de ensino. Neste contexto a identificação e organização dos acervos de minerais e rochas são de grande importância para difusão do conhecimento cientifico e tecnológico. O trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, teve como objetivo estudar e organização as coleções de minerais e rochas do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas.

II. Material e Métodos Neste trabalho utilizaram-se técnicas usuais de curadoria de minerais e rochas, ensaios químicos e testes pirognósticos. O estudo de identificação dos minerais e rochas foram baseados nos seguintes autores: RAMPONE (1993); LEINZ & CAMPO (1986); BANCO

DE

DADOS,

Museu

Heinz

Ebert.

[online]

Disponível

na

Internet

via

http://www.rc.unesp.br/museudpm/banco/index.html.10/2008; DANA (1986); DEER (1981); SUGUIO (1980); ABREU (1978); BEST (1982). Depois de identificado o acervo foi rotulado, com tinta látex branca, tinta nanquim e verniz para a fixação do código. A codificação recebida é composta pelos seguintes códigos: MNH/UNIFAL-MG acrescidos de R para rocha, além da letra inicial do grupo e uma seqüência numeral e M para minerais acrescidos da letra inicial da classe mais a seqüência numeral (ex. rocha: MHN/UNIFAL-MG-RM-0001; minerais: MHN/UNIFAL-MG-MC-0001). Em seguida o acervo foi registrado em livro tombo e confeccionadas as fichas catalográficas e técnicas. Estas foram utilizadas para alimentar um banco de dados dos acervos, desenvolvido pelo Núcleo de Tecnologia de Informação da Unifal-MG.

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Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

A ficha catalográfica contém as seguintes informações: código, descrição, classificação, unidade estratigráfica, idade, coletor/doador, local da coleta e data da coleta. A ficha técnica dos minerais contém: classe; composição, brilho, cor, traço, dureza, sistema cristalino, propriedades magnéticas, elétricas e fluorescentes e as aplicações. Já a ficha técnica das rochas apresenta: grupo, classificação, estrutura, textura, cor e suas aplicações. Após esse processo todo o acervo foi fotografado, com a câmera Sony Mavica, pertencente à Instituição. Essas fotos futuramente serão disponibilizadas na futura página virtual do Museu de História Natural, na WEB.

III. Resultados e discussão A coleção de minerais e rochas do Museu de Historia Natural /Unifal-MG está registrada é compreende um acervo pequeno, mas significativo. Atualmente está composta por 545 peças, sendo 260 de espécies mineralógicas distintas e 285 amostras de rochas. Os minerais estão expostos por classes, sendo que 7,4% das amostras pertencentes ao Museu são da classe dos carbonatos (ex.Malaquita e a Dolomita); 4,4% são fosfatos (ex. Apatita e Vanadinita); 2,9% são haletos (ex. Fluorita); 11,8% são óxidos (ex. hematita, Limonita); já os silicatos correspondem a 54,4% (ex. quartzo, feldspato, berilo); 5,8% correspondem aos sulfatos (ex. Barita e Gipsita); 8,8% são os sulfetos (ex. Pirita) e 4,5% de elementos nativos (ex. Mercúrio e Niobio) (Figura 1). As rochas estão expostas em três grupos: metamórficas, sedimentares, ígneas, sendo que 35,3% do acervo de rochas é constituído por rochas metamórficas (Ex. mármore, gnaisse), 57,6% ígneas (ex. granito, basalto) e 7,15% sedimentares (ex. arenito, argilito) (Figura 2). O Museu também apresenta um setor com minerais e rochas ornamentais e suas aplicações.

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C oleç ão de Minerais do MHN/UNIF A L -MG 5% 1%

8%

7%

4%

3% C arbonatos

6% 12%

F os fatos Haletos Ó x idos S ilic atos S ulfatos S ulfetos E lementos nativos O utros

54%

Figura 1. Acervo de minerais do MHN/Unifal-MG.

C oleç ão de R oc has do MHN/UNIF A L -MG 7% 35% Metamórfic as Ígneas S edimentares

58%

Figura 2. Acervo de rochas do MHN/Unifal-MG.

O acervo compõe a exposição do salão MHN/Unifal-MG denominado de Terra: os minerais e o ciclo das rochas. Estes são fontes de interesse de pesquisas acadêmicas e da comunidade em geral, contribuindo com o conhecimento cientifico e tecnológico. Além disso, representa um importante patrimônio geológico.

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IV. Conclusões As coleções de minerais e rochas do Museu de Historia Natural da Universidade Federal de Alfenas é pequena, porém muito representativa. A identificação e organização do acervo foram de grande importância para as ações extensionistas e de pesquisa do museu, representado importante patrimônio geológico, além de importante ferramenta no processo de ensino-aprendizagem, formal e informal, da comunidade em geral.

Agradecimentos Os agradecimentos dos autores à Fapemig pelo apoio financeiro; à museóloga Luciana Menezes de Carvalho e todos aqueles que colaboraram direta e indiretamente para a execução deste trabalho.

Referências ABREU, S.M. Recursos Minerais do Brasil, Vols. I e II. 2 ed., São Paulo: Editora Edgar. Blücher Ltda, 754 p. 1978. BANCO DE DADOS, Museu Heinz Ebert. [online] Disponível . Acesso em: Outubro de 2008.

em:

BEST, M. Igneous and Metamorphic Petrology. Freemann and Company. London. 630p. 1982. DANA, J. D. Manual de Mineralogia. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, Editora S.A. 642 p. 1986. DEER, WA; HOWIE, RA. and ZUSMANN, J. Minerais Constituintes de Rochas: Uma Introduçäo. Fund. Calouste Gulbekian. Lisboa. 584p. 1981. LEINZ, V. & CAMPOS, J.E.S. Guia para determinação de minerais. 10 ed. São Paulo: Editora Nacional. 149 p. 1986. LOPES, M. M. O Brasil descobre a pesquisa científica: os museus e as ciências naturais no século XIX. São Paulo: Ucitec, 1997. RAMPONE, G. Manuales de Indentificación Rocas y Minerales. Barcelona: Ediciones Omega. 256 p. 1993. SUGUIO, K. Rochas sedimentares. São Paulo: Ed. Edgard Blücher Ltda, 500 p. 1980.

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ACERVO DE FÓSSEIS DO MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL/UNIFALMG1

Dra. Maria de Fátima Rodrigues Sarkis2 Jeâni Kelle Landre Rosa3

Resumo As coleções de fósseis são muito importantes por representar a paleodiversidade e a evolução da vida na Terra, além de patrimônio geológico. A constituição de acervos paleontológicos bem como a identificação e organização em museus é de fundamental importância para produção de conhecimento cientifico. O trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, objetivou estudar e organizar a coleção de fósseis do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas. A metodologia utilizada foi baseada em técnicas de curadoria e em bibliografia especializada. A coleção de fósseis esta constituída por 188 amostras. Estas foram devidamente identificadas, rotuladas, registradas no livro tombo, confeccionadas fichas técnicas e informatizadas. A coleção é de pequeno porte, porém muito representativa da fauna e flora pretérita e valiosa nas ações educativas desenvolvidas pelo Museu de História Natural/UNIFAL-MG.

Palavras-chave: Museu de História Natural. Coleções Paleontológicas. Educação Patrimonial.

Abstract The fossil collections are very important because they represents the paleodiversidade and evolution of life on earth, and geological heritage. The constitution of paleontological collections and the identification and organization in museums is fundamental importance for the production of scientific knowledge. The work which culminated in this paper aimed to study and organize the collection of fossils from the Museum of Natural History of Federal University of Alfenas. The methodology was based on techniques of curation and in the specific literature. The fossil collection is constituted by 188 samples. These were identified, labeled, recorded in the book fall, made sheets and computerized. The collection is small, but representative of the fauna and flora in the past and valuable educational activities developed by the Museum of Natural History / UNIFAL-MG.

Keywords: Museum of Natural History. Paleontological collections. Heritage Education.

1

Projeto financiado pela Fapemig EDITAL Nº 10/07 - Apoio à Difusão e Popularização de Ciência e Tecnologia - Processo: APQ-6522-5.02/07. 2 Docente - Instituto de Ciências e Tecnologia, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Poços de Caldas. 3 Bolsista de iniciação cientifica Fapemig - Curso de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Alfenas-MG. 131

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

I. INTRODUÇÃO Os fósseis são importantes por representar a paleodiversidade e a evolução da vida na Terra, além de patrimônio geológico. As coleções de fósseis são valiosas, pois incorporam amostras científicas que documentam diversos eventos que ocorreram no nosso planeta. Este tipo de acervo representa um recurso finito e muito valioso, especialmente devido à enorme importância da informação holística a ele associada. Esta informação é continuamente ampliada e atualizada à medida que os exemplares são estudados por sucessivas gerações de investigadores. Neste contexto, os acervos de fósseis constituem uma importante ferramenta no processo de ensino-aprendizagem, formal e informal, das ciências geológicas e biológicas. A constituição de coleções paleontológicas bem como a identificação e organização em museus é de fundamental importância para difusão do conhecimento cientifico. Portanto o trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, objetivou o estudo e organização da coleção de fósseis do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas, para o desenvolvimento de ações extensionistas e de pesquisa.

II. MATERIAL E MÉTODO Este trabalho utilizou técnicas usuais de curadoria de fósseis, além da bibliografia especializada para a identificação do acervo (e.g. CLARKSON, 1993; FREY,1975; TAYLOR & TAYLOR, 1975; HILDEBRAND,1995; ROMER & PARSONS, 1985; COLBERT et.al,2001). Depois de identificados os exemplares foram rotulados com tinta látex branca. Foi utilizada caneta nanquim para a codificação e verniz para a fixação. O código recebido é composto pelo nome MNH/UNIFAL-MG acrescidos de F e da inicial do grupo taxonômico (pplanta, i – invertebrados; v- vertebrados; ic- icnofósseis) e uma seqüência numeral, (ex. fóssil: MHN/UNIFAL-MG-Fp-0001). Depois o acervo foi registrado em livro tombo e confeccionado as fichas catalográficas e técnicas. Estas foram utilizadas para alimentar um banco de dados, desenvolvido pelo Núcleo de Tecnologia de Informação da Unifal-MG.

A ficha catalográfica contém as seguintes informações: código, descrição, classificação, unidade estratigráfica, idade, coletor/doador, local da coleta e data da coleta. A ficha técnica contém informações referentes à Sistemática, Distribuição Estratigráfica, Processo de fossilização e Aplicações.

Todas as peças do acervo foram

registradas em Livro Tomo. 132

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Após a identificação e catalogação o acervo foi fotografado, com a câmera Sony Mavica. Essas fotos futuramente serão disponibilizadas na futura página virtual do Museu de História Natural, na WEB.

III. RESULTADO E DISCUSSÃO O acervo total de fósseis do Museu de Historia Natural da Universidade Federal de Alfenas é composto por 188 fósseis representados por diversas classes. A coleção de fósseis esta composta pelos seguintes grupos: 91,00%, Invertebrados, 4,00% de Vertebrados, 1,60% de Plantas, 1,60% de Icnofósseis e Outros (1,80%) (Figura 3).

C oleç ão de F ós s eis do MHN/UNIF A L -MG 2% 4% 2% 2%

Invertebrados V ertebrados P lantas Ic nofós s eis O utros

90%

Figura 1. Acervo de fósseis do MHN/Unifal-MG.

O acervo de fósseis compõe a expografia do Museu de História Natural da UnifalMG e estão distribuídos em salões temáticos, organizados por eras geológicas. O salão do Pré-Cambriano retrata a origem da vida com surgimento dos procariontes (bactérias e cianobactérias), dos eucariontes unicelulares e dos primeiros metazoários, representados pela fauna de Ediacara. O salão do Paleozóico apresenta a história dos invertebrados, o surgimento das plantas, dos vertebrados e a colonização do continente.

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Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

O salão do Mesozóico representa a diversidade de répteis – como, por exemplo, dinossauros - e surgimento das angiospermas, aves e mamíferos. E, finalmente, o salão do Cenozóico apresenta a megafauna do Quartenário e a biodiversidade atual.

IV.CONCLUSÃO O trabalho permitiu a organização de um acervo didático-científico para o Museu de Historia Natural da Universidade Federal de Alfenas. O acervo foi identificado com base na bibliografia especializada e organizado por classes. A coleção tem por objetivo contribuir para um processo de ensino-aprendizagem mais eficiente nos cursos de graduação, alunos e professores do Município de Alfenas e da região, além de propiciar ao visitante conhecimento dos principais eventos biológicos que ocorreram no nosso planeta.

AGRADECIMENTOS Os agradecimentos dos autores à Fapemig pelo apoio financeiro; a museóloga Luciana Menezes de Carvalho e todos aqueles que colaboraram direta e indiretamente para a execução deste trabalho.

REFERÊNCIAS CLARKSON, E.N.K. Invertebrate paleontology and evolution. 3ed. Cambridge: Chapman & Hall. 434 p. 1993. COLBERT, E.H.; MORALES, M.; MINKOFF, E.C. Colbert´s evolution of the vertebrates: a history of the backboned animals through time. 5 ed. USA: John Wiley & Sons, 576p. 2001. FREY, R.W. The study of trace fossils. Spring-Verlag, 562 p. 1975. HILDEBRAND, M. Análise da estrutura dos vertebrados. 1 ed. São Paulo: Atheneu, 700p. 1995. ROMER, A.S.; PARSONS, T.S. Anatomia comparada dos vertebrados. São Paulo: Atheneu, 559p. 1985. TAYLOR, T.N. & TAYLOR, E.L. The biology and evolution of fossil plants. Englewood Cliffs: Prentice-Hall, Inc, 982 p. 1993.

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COLEÇÃO DE FÓSSEIS DO MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL/UNIFAL-MG1 Dra. Maria de Fátima Rodrigues Sarkis2 Jeâni Kelle Landre Rosa3 Resumo As coleções de fósseis são muito importantes por representar a paleodiversidade e a evolução da vida na Terra, além de patrimônio geológico. A constituição de acervos paleontológicos bem como a identificação e organização em museus é de fundamental importância para produção de conhecimento cientifico. O trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, objetivou estudar e organizar a coleção de fósseis do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas. A metodologia utilizada foi baseada em técnicas de curadoria e em bibliografia especializada. A coleção de fósseis esta constituída por 188 amostras. Estas foram devidamente identificadas, rotuladas, registradas no livro tombo, confeccionadas fichas técnicas e informatizadas. A coleção é de pequeno porte, porém muito representativa da fauna e flora pretérita e valiosa nas ações educativas desenvolvidas pelo Museu de História Natural/UNIFAL-MG.

Palavras-chave: Museu de História Natural. Coleções Paleontológicas. Educação Patrimonial.

Abstract The fossil collections are very important because they represents the paleodiversidade and evolution of life on earth, and geological heritage. The constitution of paleontological collections and the identification and organization in museums is fundamental importance for the production of scientific knowledge. The work which culminated in this paper aimed to study and organize the collection of fossils from the Museum of Natural History of Federal University of Alfenas. The methodology was based on techniques of curation and in the specific literature. The fossil collection is constituted by 188 samples. These were identified, labeled, recorded in the book fall, made sheets and computerized. The collection is small, but representative of the fauna and flora in the past and valuable educational activities developed by the Museum of Natural History / UNIFAL-MG.

Keywords: Museum of Natural History. Paleontological collections. Heritage Education.

1

Projeto financiado pela Fapemig EDITAL Nº 10/07 - Apoio à Difusão e Popularização de Ciência e Tecnologia - Processo: APQ-6522-5.02/07. 2 Docente - Instituto de Ciência e Tecnologia, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Poços de Caldas. 3 Bolsista de iniciação cientifica Fapemig - Curso de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Alfenas. 135

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

I. Introdução Os fósseis são importantes por representar a paleodiversidade e a evolução da vida na Terra, além de patrimônio geológico. As coleções de fósseis são valiosas, pois incorporam amostras científicas que documentam diversos eventos que ocorreram no nosso planeta. Este tipo de acervo representa um recurso finito e muito valioso, especialmente devido à enorme importância da informação holística a ele associada. Esta informação é continuamente ampliada e atualizada à medida que os exemplares são estudados por sucessivas gerações de investigadores. Neste contexto, os acervos de fósseis constituem uma importante ferramenta no processo de ensino-aprendizagem, formal e informal, das ciências geológicas e biológicas. A constituição de coleções paleontológicas bem como a identificação e organização em museus é de fundamental importância para difusão do conhecimento cientifico. Portanto o trabalho desenvolvido, que culminou neste artigo, objetivou o estudo e organização da coleção de fósseis do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas, para o desenvolvimento de ações extensionistas e de pesquisa.

II. Material e Métodos Este trabalho utilizou técnicas usuais de curadoria de fósseis, além da bibliografia especializada para a identificação do acervo (e.g. CLARKSON, 1993; FREY,1975; TAYLOR & TAYLOR, 1975; HILDEBRAND,1995; ROMER & PARSONS, 1985; COLBERT et.al,2001). Depois de identificados os exemplares foram rotulados com tinta látex branca. Foi utilizada caneta nanquim para a codificação e verniz para a fixação. O código recebido é composto pelo nome MNH/UNIFAL-MG acrescidos de F e da inicial do grupo taxonômico (pplanta, i – invertebrados; v- vertebrados; ic- icnofósseis) e uma seqüência numeral, (ex. fóssil: MHN/UNIFAL-MG-Fp-0001). Depois o acervo foi registrado em livro tombo e confeccionado as fichas catalográficas e técnicas. Estas foram utilizadas para alimentar um banco de dados, desenvolvido pelo Núcleo de Tecnologia de Informação da Unifal-MG. A ficha catalográfica contém as seguintes informações: código, descrição, classificação, unidade estratigráfica, idade, coletor/doador, local da coleta e data da coleta. A ficha técnica contém informações referentes à Sistemática, Distribuição Estratigráfica, Processo de fossilização e Aplicações.

Todas as peças do acervo foram

registradas em Livro Tomo.

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Após a identificação e catalogação o acervo foi fotografado, com a câmera Sony Mavica. Essas fotos futuramente serão disponibilizadas na futura página virtual do Museu de História Natural, na WEB.

III. Resultados e Discussão O acervo total de fósseis do Museu de Historia Natural da Universidade Federal de Alfenas é composto por 188 fósseis representados por diversas classes. A coleção de fósseis esta composta pelos seguintes grupos: 91,00% de Invertebrados (e.g. Lingula; trilobitamorfa; brachiopodas), 4,00% de Vertebrados (e.g. Mesosaurus; mastodonte), 1,60% de Plantas (e.g. Typha, Coniferas, 1,60% de Icnofósseis (e.g. pistas, tubos, coprólitos )e Outros (1,80%) (Figura 1).

C oleç ão de F ós s eis do MHN/UNIF A L -MG 2% 4% 2% 2%

Invertebrados V ertebrados P lantas Ic nofós s eis O utros

90%

Figura 1. Acervo de fósseis do MHN/Unifal-MG.

O acervo de fósseis compõe a expografia do Museu de História Natural da UnifalMG e estão distribuídos em salões temáticos, organizados por eras geológicas. O salão do Pré-Cambriano retrata a origem da vida com surgimento dos procariontes (bactérias e cianobactérias), dos eucariontes unicelulares e dos primeiros metazoários, 137

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

representados pela fauna de Ediacara. O salão do Paleozóico apresenta a história dos invertebrados, o surgimento das plantas, dos vertebrados e a colonização do continente. O salão do Mesozóico representa a diversidade de répteis – como, por exemplo, dinossauros - e surgimento das angiospermas, aves e mamíferos. E, finalmente, o salão do Cenozóico apresenta a megafauna do Quartenário e a biodiversidade atual.

IV. Conclusões O trabalho permitiu a organização de um acervo didático-científico para o Museu de Historia Natural da Universidade Federal de Alfenas. O acervo foi identificado com base na bibliografia especializada e organizado por classes. A coleção tem por objetivo contribuir para um processo de ensino-aprendizagem mais eficiente nos cursos de graduação, alunos e professores do Município de Alfenas e da região, além de propiciar ao visitante conhecimento dos principais eventos biológicos que ocorreram no nosso planeta.

Agradecimentos Os agradecimentos dos autores à Fapemig pelo apoio financeiro; a museóloga Luciana Menezes de Carvalho e todos aqueles que colaboraram direta e indiretamente para a execução deste trabalho.

Referências CLARKSON, E.N.K. Invertebrate paleontology and evolution. 3ed. Cambridge: Chapman & Hall. 434 p. 1993. COLBERT, E.H.; MORALES, M.; MINKOFF, E.C. Colbert´s evolution of the vertebrates: a history of the backboned animals through time. 5 ed. USA: John Wiley & Sons, 576p. 2001. FREY, R.W. The study of trace fossils. Spring-Verlag, 562 p. 1975. HILDEBRAND, M. Análise da estrutura dos vertebrados. 1 ed. São Paulo: Atheneu, 700p. 1995. ROMER, A.S.; PARSONS, T.S. Anatomia comparada dos vertebrados. São Paulo: Atheneu, 559p. 1985. TAYLOR, T.N. & TAYLOR, E.L. The biology and evolution of fossil plants. Englewood Cliffs: PrenticeHall, Inc, 982 p. 1993.

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MUSEU DE HISTÓRIA NATURAL/UNIFAL-MG: ESPAÇO CIÊNCIA1

Dra. Maria de Fátima Rodrigues Sarkis2 Dr. Vinicius Xavier da Silva3 Luciana Menezes de Carvalho4 Resumo Com a finalidade de difundir a ciência da Terra e promover ações educativas e de capacitação, foi criado em 2003 o Museu de Ciências da Terra, hoje Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas (MHN/UNIFAL-MG). O MHN/UNIFAL-MG é órgão suplementar da Reitoria, na forma do disposto na Resolução nº. 035/2009. Assim, desde 2003, este museu vem atendendo à comunidade universitária e sociedade apresentando, em seus espaços, diversas exposições: O Universo, Sistema Solar e a Terra; Aplicações dos Minerais e Rochas; Origem da Vida, além de cursos de capacitação para professores: Atualização em temas de Geociências e Evolução. O MHNUnifal-MG é um espaço de produção e divulgação científica, promovendo conhecimento para a comunidade, além de um instrumento para o desenvolvimento de políticas de conservação e preservação do patrimônio biológico, geológico e arqueológico regional. O MHN/Unifal-MG está estruturado de forma temática - os salões foram organizados de acordo com o tempo geológico, seguindo uma seqüência lógica na sucessão dos eventos geológicos e biológicos que ocorreram no nosso planeta. Assim, o presente artigo visa mostrar o desenvolvimento do trabalho que culminou na primeira exposição de longa duração do Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas.

Palavras-chave: Museu. Formação continuada. Educação.

Abstract In order to spread the earth science and promoting educational and training, it was created in 2003 the Museum of Earth Sciences, actually Museum of Natural History University of Alfenas (MHN / UNIFALMG). MHN / UNIFAL-MG is a supplementary service of the Rectory, as set forth in Resolution No. 035/2009. Thus, since 2003, this museum has been serving the university community and society by presenting, in its space, several exhibits: The Universe, Solar System and Earth; Applications of Minerals and Rocks, Origin of Life. In addition to training courses for teachers: Update on topics of Geosciences and Evolution. The MHN-Unifal-MG is a space for producing and disseminating scientific knowledge to promote the community as well as a tool for policy development, conservation and preservation of biological, geological and archaeological region. The MHN / Unifal-MG is structured thematically - the spaces were arranged according to geological time obeying a logical sequence in the succession of geological and biological events that occurred on our planet. Thus, this paper aims

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Projeto financiado pela Fapemig EDITAL Nº 10/07 - Apoio à Difusão e Popularização de Ciência e Tecnologia - Processo: APQ-6522-5.02/07. 2 Docente - Instituto de Ciência e Tecnologia, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Poços de Caldas. 3 Docente – Instituto de Ciências da Natureza, Universidade Federal de Alfenas-MG, Campus Alfenas. 4 Museóloga – Universidade Federal de Alfenas. 139

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

to show the development of work that culminated in the first long-term exposure of the Museum of Natural History University of Alfenas.

Keywords: Museum. Continuing Formation. Education.

I. Considerações Iniciais O Museu de Ciências da Terra/Unifal-MG foi criado em 2003 e instalado provisoriamente em uma sala de 36 m2 no prédio das Análises clinicas Campus I da Universidade Federal de Alfenas - MG, tendo por finalidade difundir os conhecimentos sobre as Ciências Geológicas e Paleontológicas e a pesquisa desenvolvida pela equipe do Laboratório de Geociências e Laboratório de Palinologia e Paleoecologia. Este pequeno museu, ao longo de seus três anos de atividade, tornou-se um instrumento de difusão de conhecimento científico e tecnológico, desenvolvendo ações de extensão voltadas para a melhoria do ensino-aprendizagem dos alunos da Unifal-MG e alunos do ensino fundamental e médio de Alfenas e região, oferecendo atividades de palestras, visitas monitoradas e projeção de filmes na área de Geociências. Na busca de novos paradigmas educativos o Museu enquanto fenômeno apresenta um importante papel no desenvolvimento do homem. O Homem é um ser social, e seu desenvolvimento depende das interações que ele faz com seu meio. Neste contexto o museu tradicional ortodoxo não desempenha, de forma integrada, este papel devido suas exposições estruturadas apenas para observação, gerando desta forma visitas passivas e como resultados indivíduos com informação concisa e impessoal. No entanto, o próprio conceito de museu tradicional exploratório visa apresentar um cenário prazeroso, estimulante e atraente, onde o publico visitante tem atitude participativa e ativa. Grande parte de suas ações educativas adotam metodologias educativas próprias com riqueza de linguagem visual, porém com possibilidades de interação e dialogo lúdico. Desta maneira promoverá, de forma mais efetiva, uma aproximação do publico com a mensagem

museológica,

explorando

as

potencialidades educativas

em

ambiente

pedagogicamente estruturado. Algumas experiências didáticas bem sucedidas nesta área já foram publicadas por Silva et al., 2001; Rösler, 2001 e Schwanke, 2001. Portanto, a proposta de reestruturação do Museu de História Natural visava desenvolver um ambiente a contribuir com o processo de educação informal, fornecendo ao individuo uma formação integral cientifica, cultural e social. 140

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

Atualmente, através de ações educativas que são implantadas, o referido museu atua na difusão do conhecimento cientifico e tecnológico em visitas monitoradas, cursos de formação continuada para os professores da rede estadual e municipal de Alfenas e região, além de oficinas para estudantes e comunidade.

II. Desenvolvimento 1. Reestruturação e criação do MHN/Unifal-MG Com o objetivo de criar um instrumento de difusão do conhecimento científico e tecnológico na cidade de Alfenas e no Circuito Turístico Lago de Furnas, em 2007, se submeteu à agência de fomento FAPEMIG o projeto intitulado “Reestruturação do Museu de Ciências da Terra da Unifal-MG” e, partir desta proposta, a criação do Museu de História Natural/Unifal-MG. O referido projeto, aprovado pela FAPEMIG, visou promover um espaço de discussão das ciências e o desenvolvimento de ações de extensão voltadas para a melhoria do ensino-aprendizagem dos acadêmicos da instituição e de alunos do ensino fundamental e médio da região, além da formação continuada de professores e o oferecimento de palestras, visitas monitoradas e projeção de filmes, dentre outras atividades. A Universidade Federal de Alfenas-MG, localizada no Sul de Minas Gerais, é uma instituição do ensino superior que, na interface entre pesquisa e extensão, tem como finalidade principal a formação do individuo. Portanto o projeto apresentado teve sua origem na necessidade de modernização do Museu de Ciências Naturais/Unifal-MG a fim de atender às necessidades institucionais e regionais. Neste sentido Alfenas é referência no ensino mas carece, como toda a região, de um espaço que promova conhecimento cientifico e tecnológico. Nesse contexto, este projeto é uma iniciativa educacional inovadora e estratégica para o desenvolvimento do município e região. No âmbito nacional, esta proposta vai de encontro às diretrizes, no âmbito dos museus, que contemplam a inter e multidisciplinaridade do conhecimento no século XXI. A Universidade Federal de Alfenas contava com pessoal qualificado, acervos significativos de minerais, rochas, fósseis, material zoológico, botânico, peças anatômicas dentre outras, justificando a criação de um Museu de História Natural. A criação do Museu de História Natural da UNIFAL/MG vem atender a instituição na necessidade de um fiel depositário para a guarda das suas coleções cientificas. É importante ressaltar que museus desse porte colocam a Universidades em local de destaque na área de ensino, pesquisa e cultura. 141

Anais – VI Semana Nacional de Museus na UNIFAL-MG ISSN 2236-2088

O MHN-Unifal-MG, no Sul de Minas Gerais, visa atender à demanda institucional, regional e turística, tendo como objetivo principal orientar o desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa e extensão no âmbito da sociedade local, atendendo principalmente professores, alunos da rede estadual e municipal de Alfenas e região. O referido museu foi criado oficialmente na Universidade Federal de Alfenas como órgão suplementar da Reitoria, na forma do disposto na Resolução nº. 035/2009. Neste processo foi elaborado e aprovado pelo CONSUNI, órgão deliberativo da universidade, o regimento interno do museu e posteriormente foi realizado seu cadastrado no IBRAM. O MHN-Unifal-MG é um espaço de produção e divulgação científica, promovendo conhecimento para a comunidade, além de um instrumento para o desenvolvimento de políticas de conservação e preservação do patrimônio biológico, geológico e arqueológico regional. Possui as seguintes finalidades: I - Tornar-se um espaço de divulgação do conhecimento científico e cultural, promovendo educação, cultura e lazer; II - Promover e apoiar atividades educacionais e culturais, através de exposições interativas, permanentes, temporárias e itinerantes, capacitação profissional, cursos, palestras, debates e atividades similares; III - Tornar-se um agente de inclusão social, promovendo ações efetivas para atender às necessidades da sociedade; IV - Desenvolver a pesquisa básica e aplicada dentro de sua área de atuação; V - Promover a formação e especialização de recursos humanos em suas áreas de atuação; VI- Preservar o material científico de pesquisa da instituição sob sua guarda; VII - Promover e apoiar o intercâmbio com instituições de pesquisa, ensino e cultura, nacionais e estrangeiras; e VIII - Tornar-se um centro de excelência e referência em todos os aspectos de suas atividades. O acervo do Museu de Historia Natural é formado por várias coleções de minerais, rochas e fósseis, que constituem uma importante ferramenta no processo de ensinoaprendizagem, formal e informal, das ciências geológicas e biológicas, difundindo o conhecimento científico destas áreas. O acervo é valioso, pois incorporam amostras científicas que documentam diversos eventos que ocorreram no nosso planeta: os fósseis 142

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são importantes principalmente por representar a paleodiversidade e a evolução da vida na Terra; o acervo biológico e arqueológico é composto, principalmente, por peças osteológica de vertebrados, de peles taxidermizadas, invertebrados terrestres, marinhos, plantas e material lítico. Assim, o MHN/Unifal-MG tornou-se o espaço de divulgação e proteção destas coleções cientificas da universidade. Tais coleções são preparadas e constituídas através do Projeto Biota Minas- Fapemig. A exposição do MHN/Unifal-MG encontra-se estruturada em módulos temáticos. Os salões foram organizados de acordo com o tempo geológico, seguindo uma seqüência cronológica dos eventos geológicos e biológicos que ocorreram no nosso planeta. O primeiro espaço apresenta a origem do Universo, o Sistema Solar e a Terra; o segundo contempla a temática Terra: os minerais e o ciclo das rochas; o terceiro trata do Pré-Cambriano, retratando a origem da vida com surgimento dos procariontes (bactérias e cianobactérias), dos eucariontes unicelulares e dos primeiros metazoários, representados pela fauna de Ediacara; o quarto espaço apresenta o Paleozóico, descrevendo a história dos invertebrados, o surgimento das plantas, dos vertebrados e a colonização do continente; o quinto espaço está destinado ao Mesozóico, representando a diversidade de répteis – como, por exemplo, dinossauros - e surgimento das angiospermas, aves e mamíferos. E finalmente o sexto espaço, que trata do Cenozóico, apresenta a megafauna do Quartenário e a biodiversidade atual, além de dois dioramas, Cerrado e Mata Atlântica, representando as paisagens da região.

2. Ações Cientificas e Educativas O MHN/Unifal-MG também tem como proposta o desenvolvimento de atividades cientificas e educativas em parceria com o ensino de pós-graduação. A contribuição com a ciência e tecnologia será alcançado por meio de estudos e pesquisas realizados por pesquisadores vinculados ao museu, proporcionando e/ou auxiliando o desenvolvimento científico-tecnológico. A parceria também se estende à extensão: as ações correlacionadas a esta vertente visam à formação continuada, através de cursos de capacitação, palestras, oficinas, visitas monitoradas, sessões cinematográficas, eventos educativos, artísticos e culturais e desenvolvimento científico-tecnológico para professores, estudantes e para a qualificação profissional.

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As atividades educativas e culturais têm como objetivo fornecer aos professores e alunos do ensino fundamental e médio conhecimento científico e tecnológico, através de atividades lúdicas e práticas. As visitas monitoradas têm objetivo garantir um melhor entendimento e absorção da informação exposta, seguindo um roteiro pré-determinado de acordo com a temática abordada; as sessões cinematográficas geram aprimoramento do conhecimento e a

interdisciplinaridade. A apresentação de filmes de temáticas

diversificadas, abordando o ambiente natural e social, o sistema político, a tecnologia, as artes e os valores em que se fundamenta a sociedade são fundamentais no desenvolvimento humano. Eventos educativos, artísticos e culturais, o conhecimento adquirido através destas ações é fundamental para a formação e inclusão do cidadão.

III. Considerações Finais O Museu de História Natural é um órgão suplementar da Universidade Federal de Alfenas (Unifal-MG), conforme disposto na Resolução nº. 035/2009. Atua como apoio à pesquisa, ao ensino e à extensão na área de História Natural. Este foi criado em 2003, como Museu de Ciências da Terra, mas somente no ano de 2009 foi institucionalizado. Desde esta data, o Museu de História Natural da Universidade Federal de Alfenas se encontra em implementação e atualmente esta sediado no Prédio histórico da Universidade, no centro da cidade de Alfenas, Minas Gerais. Atualmente o museu abriga pequenas coleções de minerais, rochas e fósseis documentadas, além de materiais biológicos (animais taxidermizados e esqueletos de animais) ainda em estudo. Estes acervos são fontes de interesse de pesquisas acadêmicas e da comunidade em geral. Este vem promovendo conhecimento cientifico e tecnológico, propiciando uma integração teórico-prática dos conteúdos de ciências e dessa forma tem auxiliado no processo de ensino-aprendizagem dos alunos das escolas da rede municipal e estadual do município de Alfenas e região, além de contribuir para a melhoria do ensino básico local e culturalmente para a comunidade. O museu de História Natural dará continuidade ao processo de organização e promoção de exposições de curta e longa duração, com vistas à divulgação do próprio acervo e da ciência. Além de cursos de formação continuada para professores do ensino fundamental e médio da região. Estima-se uma freqüência de três mil visitantes anuais aos espaços de exposição do museu, entre estudantes de nível fundamental e médio, universitários, turistas e a comunidade em geral.

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Agradecimentos Os agradecimentos dos autores à Fapemig pelo apoio financeiro; e todos aqueles que colaboraram direta e indiretamente para a execução deste trabalho.

Referências RÖSLER, O. CENPÁLO e o Turismo Científico, Cultural e Sócio-Econômico Regional Integrado, com base na Paleontotogia. Revista Brasileira de Paleontologia, 2:142-143. 2001. SCHWANKE, C. Proposta de Divulgação da Paleontologia no Ensino Médio e Fundamental. Revista Brasileira de Paleontologia, 2:111-112. 2001. SILVA, R.M., ZAMPIROLLI, A. P.,OLIVEIRA, J.B. A. Paleontologia e a Educação Ambiental na Sala das Ciências da Terra – Prof. Dr. Setembrino Petri – Escola de Ecologia, São Caetano do Sul – SP. Revista Brasileira. 2001.

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