AS COMPETÊNCIAS NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL BRASILEIRA

Share Embed


Descrição do Produto

Educação Profissional: Ciência e Tecnologia Jan-Jun 2007, volume 1, número 2, p. 199-207

As competências na educação profissional brasileira

Artigo

Antonio Sebastião Galdeano, UNIRADIAL

Resumo - Este trabalho é resultado de uma pesquisa que verificou a importância da delimitação de um conceito de competências para a formulação de políticas públicas, no intuito de subsidiar a discussão sobre a formação e a certificação profissional no Brasil. Apresenta-se um breve histórico do surgimento e dos desdobramentos do emprego do termo “competências” no Brasil e no mundo, desde seu surgimento, no período da Guerra Fria, até o presente momento. Especial ênfase é dada à caracterização das três vertentes (produção, educação e mercado de trabalho) que centralizam estas formulações e às concepções de competências defendidas por cada uma dessas vertentes. Pretende-se contribuir para a reflexão e ação de agentes integrados à discussão da educação profissional brasileira.

Palavras-chave: competências, mundo do trabalho, educação profissional, formação e certificação profissional.

Os conceitos de competência, discu-

A pesquisa baseou-se na coleta e aná-

tidos nos diversos segmentos nos quais o

lise de dados bibliográficos. A coleta de

termo é empregado, divergem estrutural-

dados, em grande parte, foi centrada em

mente entre si. Cada ator social empre-

artigos de periódicos, em websites, na le-

ga o conceito na perspectiva que melhor

gislação oficial e em documentos de entida-

se adaptar às suas necessidades, sendo

des nacionais e internacionais, privadas e

extremamente complexo encontrar um

públicas, que, de alguma forma, interferem

conceito comum que permita a utilização

na discussão do conceito de competências e

intersubjetiva do termo pelas diversas

na implantação deste na formação e certifi-

áreas que o empregam. Tentaremos aqui

cação profissional.

demonstrar essa diversidade, apresen-

Dos organismos internacionais, bus-

tando alguns conceitos de competências

cou-se pontos de referência discutidos

utilizados nos meios produtivos, sociais e

no âmbito do Mercosul, por meio das pu-

educacionais.

blicações do Centro Interamericano de

Nosso principal objetivo é demonstrar a

Investigação

e

Documentação

Formação

diversos segmentos em que o tema é dis-

da Organização Internacional do Trabalho

cutido e quais as dificuldades enfrentadas

(OIT). Esses são fóruns em que a discus-

para se chegar a uma concepção comum a

são do tema da formação e certificação pro-

todos esses atores.

fissional se encontra em estágio bastante

Este artigo é fruto da pesquisa re-

Profissional

sobre

extensa gama de definições existentes nos

(CINTERFOR),

e

avançado.

alizada para a confecção da dissertação

Esse quadro teórico nos auxiliou a cons-

de mestrado intitulada Políticas Públicas

truir uma análise do contexto que envolve

de Formação e Certificação Profissional

a discussão, implantação e manutenção de

no Brasil, defendida em agosto de 2005

um sistema de formação e certificação pro-

na UNICID – Universidade Cidade de São

fissional no Brasil.

Paulo, sob orientação da Profa. Dra. Helena Gemignani Peterossi.

Começaremos a discussão pela análise pelo termo competência. Competência

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

199

Artigo

é uma palavra do senso comum, utilizada

3. O processo de aprendizagem é mais fácil

para designar pessoa qualificada para rea-

quando o aluno sabe precisamente o que

lizar algo. Seu antônimo não apenas impli-

se espera dele.

ca a negação dessa capacidade, mas também guarda um sentimento depreciativo,

4. O conhecimento preciso dos resultados também favorece a aprendizagem.

pejorativo, de culpa. Sinaliza mesmo que

5. É mais provável que o aluno faça o que se

a pessoa incompetente estaria fadada ao

espera dele e o que deseja de si próprio,

insucesso e à marginalização nos círculos

se ele tem a responsabilidade das tarefas

produtivos e sociais.

de aprendizagem.

No dicionário Webster da língua ingle-

Notadamente esta proposta de ensino

sa (WEBSTER, 1981, p.63), a definição de

baseado em competências, de 1971, desti-

competência aparece como “qualidade ou

nava-se a reiterar a crença em uma educa-

estado de ser funcionalmente adequado

ção por tarefas, por metas a serem atingidas.

ou ter suficiente conhecimento, julgamen-

Pouco propunha para a formação empírica do

to, habilidades ou força para determinada

aluno, que se dá pela vivência e experimenta-

atividade”. Pode-se dizer que essa definição

ção. Aparentemente, o erro não era facilmen-

aproxima muito o conceito de competência

te tolerado e a disciplina era algo desejável.

de uma abordagem existencialista, em que o

A partir dos anos 80 do século XX, os

sujeito é o portador da qualidade ou estado

serviços de recursos humanos voltaram-se

de ser. O “ser” prevalece sobre o “fazer”.

aos princípios traçados pela metodologia do

Já no dicionário Aurélio (FERREIRA,

Ensino para Competência (NAGEL; RICHMAN,

1975, p. 353), competência aparece como

1976). Na década de 1990, o discurso sobre

“qualidade de quem é capaz de apreciar e

as competências estava disseminado interna-

resolver certo assunto, fazer determina-

cionalmente, conforme aponta Brígido:

da coisa; capacidade, habilidade, aptidão, idoneidade”. Nota-se que essa definição di-

Em

ferencia-se da anteriormente apresentada,

Profissional (CEDEFOP) organizou uma série de

pois ela está muito mais próxima do “saber

seminários para discutir o conceito de compe-

fazer”. É uma definição pragmática.

tência, o que resultou em mais confusão, ainda,

Competências e Educação Profissional

Para aproximar nossa reflexão da dis-

200

1992, o

Centro

Europeu

de

Formação

a respeito do que se concordava em relação ao

cussão educacional, os estudos de Brígido

conceito de competência.

(2001) se mostram oportunos. O autor faz

Um dos poucos pontos de consenso era que exis-

um retrospecto histórico do surgimento do

tia a necessidade urgente de estabelecer medidas

conceito de competências, dizendo que “no

que facilitassem a mobilidade européia, seja em

ano de 1968, B. S. Bloom publicou o artigo

termos de educação ou de emprego.

‘Aprendizagem para o Domínio’, no qual de-

No ano seguinte, tentou esclarecer por que mo-

clarava que 90 a 95% dos alunos têm pos-

tivo, de que modo, e a partir de que situações,

sibilidades de aprender tudo o que lhes for

cada país introduziu o conceito de competência

ensinado, desde que lhes ofereçam condi-

nos debates sobre formação e ensino profissional

ções para isso” (BRÍGIDO, 2001, p.4).

(BRÍGIDO, 2001, p. 12).

Em decorrência dos trabalhos de Bloom, surgiu, na década de 1960, um movimento

Desde então, vários estudiosos passaram

chamado “Ensino baseado em competên-

a discutir o assunto aqui e no exterior. Segundo

cias” (HOWSAN, 1971), que se fundamen-

Afonso Fleury (FLEURY; FLEURY, 2001), as com-

tava em cinco princípios:

petências, no mundo do trabalho, podem ser

1. Toda aprendizagem é individual.

analisadas sob o aspecto de variáveis de input

2. O indivíduo, assim como qualquer sistema,

e variáveis de output. As variáveis de input

é orientado por metas a serem atingidas.

dizem respeito às competências inerentes às

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

pessoas, como as características relativas aos

gestão de pessoas no estilo da administração

seus conhecimentos, habilidades e atitudes.

científica e seriada. Outro viés a ser considerado, é a vertente

cias caracterizadas pela realização de tarefas,

dos representantes do mercado de trabalho.

por resultados mensuráveis. Citando a re-

Se nos aproximarmos da reflexão dos traba-

vista Personnel Management (WOODRUFFE,

lhadores, através da análise do documento

1991), Fleury destaca as nuances que alguns

Certificação de Competências Profissionais

autores encontram, na língua inglesa, entre

– Relatos de Algumas Experiências Brasileiras

os termos competency e competence.

(OIT, 2002a), perceberemos uma série de in-

Competency, de acordo com esses auto-

formações que contradizem as expectativas

res, diz respeito a dimensões do comporta-

geradas no âmbito dos escritórios administra-

mento que estão por trás de um desempenho

tivos das empresas que discutem os conceitos

competente. Já competence designa áreas

de gestão por competências. Além do treina-

de trabalho em que a pessoa é competente.

mento e adequação aos postos de trabalho e

Construímos o quadro abaixo, a fim de com-

o acesso aos mesmos, discutem-se as formas

parar essas duas concepções.

de desenvolver competências por meio de um

Ainda no âmbito do mundo do trabalho, é comum entre os profissionais de Recursos

Artigo

Já as variáveis de output seriam competên-

processo calcado na vivência e na formação profissional e educacional do trabalhador:

Humanos a definição de competências proposta por Parry: “Competência é o conjunto

Os saberes necessários ao desempenho profis-

de conhecimentos, habilidades, atitudes que

sional, portanto, são passíveis de se modificarem

afetam a maior parte do trabalho de uma

com o tempo, mas as competências construídas

pessoa, e que se relacionam com o desem-

devem capacitar os trabalhadores para a busca

penho no trabalho; a competência pode ser

de novos conhecimentos, processo pelo qual

mensurada, quando comparada com padrões

novas competências requeridas são desenvolvi-

estabelecidos e desenvolvida por meio de

das. É o princípio básico do aprender a aprender,

treinamento” (PARRY, 1996, p. 50).

que deve permear todo o processo educacional

Esta definição pode ser considerada re-

(OIT, 2002a, p. 21).

ducionista, pois tem como referência, implicitamente, a tarefa e o conjunto de tarefas

Podemos então afirmar que, segundo a

prescritas a um cargo. Neste sentido, a ges-

OIT, as competências decorrem da utilização

tão por competências pode ser considerada

dos saberes desenvolvidos pelo homem para

apenas como a revitalização de uma forma de

o desempenho profissional. Em conseqüência

COMPETENCY

COMPETENCE

Características do indivíduo

Desempenho no cargo/função

Conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes

Resultados, produtos

Input (entradas)

Output (saídas)

Soft (não concreto, não palpável)

Hard (concreto, palpável)

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

A. S. GALDEANO

Quadro 1. Comparativo de Termos

201

Artigo

desta prática cotidiana, o trabalhador com-

da navegação diária de um professor, de

petente, por si só, perceberá a necessidade

uma situação de trabalho à outra.

de expandir suas potencialidades e buscará

Conforme Perrenoud (1993), construir

novos conhecimentos que aumentem suas

uma competência significa aprender a iden-

competências em um processo de retroa-

tificar e a encontrar os conhecimentos per-

limentação permanente. Esse processo foi

tinentes de interferência na prática. Nessa

denominado pelo documento da OIT como

perspectiva, os elementos de que necessitam

aprender a aprender.

os professores para atingir a competência

Mundo afora, vários são os atores e as

pedagógica são encontrados, em parte, em

instituições envolvidas no processo que pro-

um processo de formação contínua, que seja

põe a adoção do conceito de educação ba-

caracterizado por uma atitude reflexiva sobre

seada em competências. No caso brasileiro,

a prática e por uma atitude crítica sobre os

algumas

erros e acertos cometidos.

organizações

protagonizam

esta

Competências e Educação Profissional

discussão.

do

apresentado

nessa

síntese

Uma influência significativa, exercida no

das teorias de Perrenoud poderá ser obser-

momento que precedeu a promulgação da Lei

vado nas políticas públicas do Ministério da

de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) – lei

Educação (MEC). Mas como afirmamos an-

9.394/96, foram as expressivas contribuições

teriormente, nosso trabalho extrapola o âm-

de Perrenoud. Contudo, não aprofundamos

bito exclusivamente educacional. A fim de

nossa análise sobre este autor, pois a maior

compreendermos a evolução e os desdobra-

parte de suas pesquisas refere-se exclusiva-

mentos do conceito de competências para as

mente ao campo educacional, com ênfase no

políticas públicas de formação e certificação

“fazer docente”. Desse modo, distancia-se

profissional brasileiras, é imprescindível es-

dos objetivos de nosso trabalho, que trata,

tudarmos as três vertentes (ALEXIM; LOPES,

especificamente, da implicação do conceito

2003) que compõem o centro das discussões

de competências nas políticas públicas de for-

sobre o tema:educação, produção e mercado

mação e certificação profissional brasileiras.

de trabalho.

Para Perrenoud (1999), a noção de com-

Discutiremos o papel delas, bem como

petência designa a capacidade de mobilizar

das instituições que as representam, na po-

diversos recursos cognitivos para enfrentar

larização dos rumos desta discussão. A se-

um tipo de situação. Essa definição insiste em

guir, temos as vertentes e suas instituições

quatro aspectos:

representativas:

1. As competências não são saberes, savoir-

1. educação: a Organização das Nações

faire ou atitudes, mas mobilizam, inte-

Unidas para a Educação, a Ciência e a

gram e orquestram tais recursos;

Cultura (UNESCO), em conjunto com o

2. Essa mobilização só é pertinente em situação singular, mesmo que se possa tratá-

Ministério da Educação (MEC); 2. produção:

a International

Organization

la em analogias com outras situações já

for Standardization (ISO), em parceria

encontradas;

com o Instituto Nacional de Metrologia,

3. O exercício da competência passa por op-

Normalização

e

Qualidade

Industrial

erações mentais complexas, subentendi-

(INMETRO), e a Associação Brasileira

das por esquemas de pensamento que

de Normas Técnicas (ABNT), em con-

permitem determinar (mais ou menos

junto com as associações e sindicatos

consciente e rapidamente) e realizar, de modo mais ou menos eficaz, uma ação relativamente adaptada à situação; 4. As competências profissionais constroemse em formação, mas, também, ao sabor

202

Muito

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

patronais; 3. mercado de trabalho: a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em parceria com Ministério do Trabalho e

cias já existentes, elaborando os principais crité-

classe e sindicatos de trabalhadores.

rios para a elaboração de normas de certificação

Para se entender a dificuldade em de-

de pessoal (ALEXIM; LOPES, 2003, p. 6).

Artigo

Emprego (MTE) e as associações de

limitar um conceito comum para o termo competências, basta elencar algumas das

De posse destas referências, começamos

instituições nacionais e internacionais que,

a compreender a intrincada rede de relacio-

de alguma forma, mantêm uma interface

namentos e interesses políticos e econômicos

com esta discussão. Como referências para

que compõem a discussão acerca das compe-

a elaboração deste estudo, foram consulta-

tências. Na descrição de competências feita

dos: o modelo inglês de gestão e certifica-

pelo Inmetro, ficam patentes a necessidade

ção de competências, o National Vocation

e o interesse da empresa brasileira em parti-

Qualifications (NVQ); o mexicano, Consejo de

cipar do comércio mundial. Para tanto, assi-

Normalización y Certificación de Competência

milar os padrões globalizados de qualidade é

Laboral (CONOCER); além das orientações

imprescindível. Daí a necessidade de se esta-

do Centro Interamericano de Investigação e

belecerem normas em âmbito nacional, em

Documentação sobre Formação Profissional

conformidade com as já existentes no mer-

para a América Latina e Caribe (CINTERFOR)

cado externo, que assegurem a padronização

e da OIT. Destacam-se ainda as normas da

e a competitividade do produto nacional no

ISO, que tem empreendido esforços para nor-

mercado global.

malizar a certificação de pessoas. O Ministério

Para o MEC, no que concerne à legislação

do Trabalho e Emprego também participa ati-

específica da Educação Profissional, regula-

vamente deste fórum de discussão, no âm-

mentada a partir de 1997 pelo Decreto 2.208

bito da Classificação Brasileira de Ocupações

(revogado pelo Decreto 5.154/04), o conceito

(CBO), que, reformulada e publicada a partir

de competências adotado é igual àquele apre-

de 2002, oferece um bom quadro referencial

sentado no Parecer CNE/CEB 16/99, no qual

à discussão. Também o Conselho Nacional de

“entende-se por competência profissional a

Metrologia, Normalização e Certificação da

capacidade de articular, mobilizar e colocar

Qualidade (CONMETRO) e, mais recentemen-

em ação valores, conhecimentos e habilida-

te, o INMETRO integram-se na construção

des necessários para o desempenho eficiente

deste sistema, como órgãos credenciadores

e eficaz de atividades requeridas pela nature-

dos Organismos de Certificação de Pessoal

za do trabalho” (BRASIL, 1999).

(OPCs)1 e das Organizações Certificadoras Credenciadas (OCCs) : 2

O mesmo documento, no intuito de elucidar o uso da terminologia adotada, complementa:

terreno da certificação profissional foi a sua in-

O conhecimento é entendido como o que muitos

corporação pelo Instituto Nacional de Metrologia,

denominam simplesmente saber. A habilidade re-

Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO).

fere-se ao saber fazer relacionado com a prática

De fato, tendo-se encerrado o projeto OIT-MTE,

do trabalho, transcendendo a mera ação moto-

esse órgão público tem atuado como catalisador

ra. O valor se expressa no saber ser, na atitu-

dos interesses e energias dirigidos à certifica-

de relacionada com o julgamento da pertinência

ção de pessoas. O Inmetro criou uma Comissão

da ação, com a qualidade do trabalho, a ética do

Técnica com funções de consulta e assessora-

comportamento, a convivência participativa e so-

mento, reunindo as principais representações

lidária e outros atributos humanos, tais como a

pertinentes, que tem funcionado como suporte

iniciativa e a criatividade (BRASIL, 1999).

A. S. GALDEANO

Recentemente, o fato de maior expressão no

para novas iniciativas e reforço para as experiên-

O conceito de competências profissionais 1 Norma Inmetro nº NIT-Dicro – 004. 2 Norma ISO/IEC nº 17024/02.

da OIT refere-se àquelas adquiridas no exercí-

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

203

Artigo

cio da experiência profissional: “Um profissio-

certificação de terceira parte. O documento

nal é competente quando é reconhecidamen-

ainda traz toda a nomenclatura adotada pela

te bom em sua prática profissional. Implica a

OIT sobre o tema certificação e avaliação de

aceitação de uma avaliação positiva por parte

competências, incluindo itens referentes à ava-

de seu entorno social” (OIT, 2002b).

liação, constituição de conselhos certificadores,

Este conceito é encontrado no material

credenciamento de instituições, entre outros.

denominado Certificação de Competências Profissionais – Glossário de Termos Técnicos

ConClusões

(OIT, 2002b), que contribui para a reflexão

Podemos aqui estruturar uma compara-

sobre a certificação, propriamente dita, mas

ção preliminar entre os conceitos de compe-

que também delimita uma série bastante

tências propostos pelas vertentes produção,

grande de termos sobre a discussão: com-

educação e mercado de trabalho. É perceptí-

petência, competências básicas, competên-

vel o sutil viés ideológico que permeia o dis-

cias específicas, competências essenciais,

curso de cada um dos atores citados no qua-

competências gerais, competências profis-

dro a seguir. O Inmetro destaca e valoriza as

sionais, competências tácitas, competências

qualificações; o MEC ressalta valores, conhe-

transversais. De modo semelhante, delimita

cimentos e habilidades inerentes aos sujeitos

uma série de outras propostas interligadas ao

alvos da ação formativa; e a OIT, represen-

tema. Aborda mais especificamente a certi-

tante do mundo do trabalho, busca promover

ficação, como certificação de competências,

a fusão entre as tendências educacionais e a

certificação de competências profissionais,

produção.

certificação ocupacional, certificação de pes-

O quadro 2 apresenta uma comparação

soas, certificação profissional, certificação de

entre as definições de competências para as

primeira parte, certificação de segunda parte,

três vertentes citadas anteriormente:

Quadro 2. Definição de competências

“É a aptidão de uma empresa ou de um colaborador para atender a um determinado INMETRO

requisito, aplicando de maneira efetiva o seu respectivo acervo de qualificações“ (CARVALHO, 2004, p.1).

Competências e Educação Profissional

“...entende-se por competência profissional a capacidade de articular, mobilizar MEC

e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho” (BRASIL, 1999). “Capacidade de articular e mobilizar condições intelectuais e emocionais em termos de conhecimentos, habilidades, atitudes e práticas, necessários para o desempenho de uma determinada função ou atividade, de maneira eficiente,

OIT

eficaz e criativa, conforme a natureza do trabalho. Capacidade produtiva de um indivíduo que se define e mede-se em termos de desempenho real e demonstrado em determinado contexto de trabalho, e que resulta não apenas da instrução, mas em grande medida, da experiência em situações concretas de exercício ocupacional” (OIT, 2002b).

204

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

idade a ingressarem no mercado de trabalho

diversidade conceitual que permeia esta dis-

ainda na idade escolar. Boa parte deles acaba

cussão sobre as competências. As definições

abandonando os estudos e dedicando-se ao

apresentadas nos fazem refletir criticamente

subemprego ou à mendicância. Isso resul-

sobre as concretas possibilidades do sistema

ta em uma enorme massa de trabalhadores

educacional em atender a tão diversa gama

analfabetos ou semi-alfabetizados:

Artigo

Esse quadro comparativo demonstra a

de reflexões que, por sua vez, exigem providências pontuais para a questão da formação

Estão

e certificação profissional baseada em com-

org os resultados do 3º Indicador Nacional de

petências no cenário educacional vigente.

Analfabetismo Funcional – Um diagnóstico para

disponíveis

em

www.acaoeducativa.

A discussão sobre as competências é

a inclusão social pela educação, iniciativa de

multifacetada. Não há formas concretas, dis-

Ação Educativa e do Instituto Paulo Montenegro.

cutidas até o presente momento, que per-

O levantamento de 2003 avaliou habilidades e

mitam ao Brasil organizar um sistema único

práticas de leitura de jovens e adultos na vida

de certificação, conforme vem tentando o

cotidiana. Comparados aos percentuais de anal-

MEC, o Inmetro e o Ministério do Trabalho e

fabetismo funcional de 2001, não houve mudan-

Emprego (MTE).

ça significativa: o analfabetismo absoluto caiu de

Cada vertente desenvolve ações isola-

9% para 8%. O teste identificou 30% da popu-

das, o que torna cada vez mais difícil conci-

lação com reduzidas habilidades de leitura: são

liar estes esforços em uma única direção. Em

capazes apenas de localizar informações simples

2005, discutiu-se a construção de um modelo

em enunciados com uma só frase. Outros 37%

de certificação para o setor metal-mecânico

conseguem localizar uma informação em textos

e da construção civil – esses modelos de cer-

curtos, o que poderia ser considerado um nível

tificação encontram-se em estágio de expe-

básico de alfabetização. Em 2001, esses índices

rimentação, sem dados concretos sobre sua

eram de 31% e 34%, respectivamente. Em 2003,

viabilidade e efetividade para o mercado e

25% dos brasileiros de 15 a 64 anos demons-

para o trabalhador.

tram habilidades plenas de leitura e escrita. O

Por outro lado, chama a atenção de estu-

diferencial no desempenho se ampliou de 4 para

diosos do tema o desaparecimento do termo

8 pontos em favor das mulheres, que têm mais

competências das publicações e documentos

interesse que os homens pela leitura, ainda que

governamentais publicados a partir de 2004.

41% da população nunca tenha freqüentado bi-

Será este um sinal do esgotamento desta pro-

bliotecas (AÇÃO EDUCATIVA, 2003, p. 2).

posta e do surgimento de um novo paradigma Exemplos e modelos de formação e cer-

No Brasil, a educação fundamental, por

tificação, que pretendem minimizar as defici-

si só, já se coloca como um problema mal re-

ências deste cenário, são trazidos da Europa

solvido. Dados apontam que a população bra-

e da América do Norte, de países que já

sileira economicamente ativa tem, em média,

possuem seus sistemas de formação e cer-

cinco anos e meio de escolaridade – esse fato

tificação regulamentados desde a década de

caracteriza o contingente e a qualificação

1990. Não há dúvidas sobre a qualidade des-

básica de nossa força de trabalho. Nos EUA,

sas contribuições, contudo temos de conside-

a média é 14 anos; no Japão, 17 anos; na

rar a enorme diferença entre a cultura desses

Europa, em torno de 12 anos. Não estamos

povos, dimensões geográficas e nível de de-

considerando aqui a qualidade do ensino.

senvolvimento socioeconômico dessas regi-

Existe uma correlação direta entre esco-

A. S. GALDEANO

para a Educação Profissional?

ões e o caso brasileiro.

laridade e renda. As famílias que constituem

Adaptar e aproveitar os referenciais des-

os 50% mais pobres da população brasileira,

ses modelos são os grandes desafios impos-

em geral, incentivam seus filhos menores de

tos às instituições de nosso país. A adaptação

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

205

e o aproveitamento dos referenciais desses

Artigo

modelos a nossa realidade é o grande desafio para as instituições de nosso país. Guy Le Boterf (2003) tem defendido a teoria da “profissionalização”, em substituição ao uso do termo “competências”. Segundo o referido autor, a partir da mobilização de três níveis diferentes da realidade (os recursos, as competências e o profissionalismo) expressase a “profissionalização” do trabalhador. São muitas perguntas, muitas dúvidas, mas certo é que ainda há um extenso caminho a trilhar para que consigamos estabelecer um parâmetro comum para esta discussão.

referênCiAs BiBliográfiCAs

AÇÃO EDUCATIVA. Analfabetismo funcional mantém-se no nível de 2001. Boletim mensal Informação em Rede, São Paulo, ano VII, n. 59, p. 2, out. 2003. ALEXIM, J. C.; LOPES, C. L. E. A certificação profissional revisitada. Boletim Técnico do SENAC, Rio de Janeiro, v. 29, n. 03, set.-dez. 2003. Disponível em: Acesso em: 22 fev. 2004. BRASIL. Decreto 2208/97. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 42 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília: Diário Oficial da União, 18 abr. 1997.

Competências e Educação Profissional

______. Decreto 5154/04. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, e dá outras providências. Brasília: DOU, 26 jul. 2004. ______. Lei Federal 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: DOU, 23 dez. 1996. ______. Lei n. 9933/99. Dispõe sobre as competências do CONMETRO e do Inmetro – Institui a Taxa de Serviços Metrológicos, e dá outras providências. Brasília, DOU, 21 dez. 1999.

______. MEC/CNE/CEB. Parecer CNE/CEB 16/99. Institui as Diretrizes Curriculares da Educação Profissional de Nível Técnico, de 05/10/1999. Disponível em:. Acesso em: 21/04/2005. Brasília, 1999. BRÍGIDO, R. V. Certificação e normalização de competências: origens, conceitos e práticas. Boletim Técnico do SENAC, Rio de Janeiro, v. 27, n. 01, jan./abr. 2001. Disponível em: . Acesso em: 14 mar. 2004. CARVALHO, J. E. O que é produtividade. Lisboa: Quimera, 2004. 168 p. FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. São Paulo: Nova Fronteira, 1975. 2120 p. FLEURY, A.; FLEURY, M. T. L. Estratégias empresariais e formação de competências: um quebra-cabeça caleidoscópio da indústria brasileira. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2001. HOWSAN, R. B. Competency Based Instruction. In: WASHINGTON CONFERENCE, November, 1971, Washington DC. LE BOTERF, G. Desenvolvendo as competências dos profissionais. Porto Alegre: Artmed, 2003. 278 p. NAGEL, T. S.; RICHMAN, P. T. Ensino para competência: uma estratégia para eliminar o fracasso. Rio de Janeiro: Editora Globo, 1976. OIT. Certificação de competências profissionais: relatos de algumas experiências brasileiras. 1. ed. Brasília: OIT, 2002a. ______. Certificação de competências profissionais: glossário de termos técnicos. 1. ed. Brasília: OIT, 2002b. PARRY, S. B. The quest for competencies. Training Magazine, Minneapolis, v.33, n.7, p. 48-54, jul. 1996. PERRENOUD, P. Práticas pedagógicas, profissão docente e formação. Lisboa: Publicações Dom Quixote/IIE, 1993. ______. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. WEBSTER. Webster´s third new internacional dictionary of the English language, unabridged. Massachussets: G & C Merriam Co., 1981. WOODRUFFE. Competent by any other name. Personnel Management. p. 30-33, Sept. 1991.

aNToNIo seBasTIÃo GalDeaNo é mestre em educação, professor universitário e gestor do campus Moóca da UniRadial. Participou da construção do programa Aprender a Aprender da SERT – São Paulo, em companhia do professor Francisco Aparecido Cordão e da professora Sílvia Manfredi no ano de 1996, gestão do Secretário de Estado Walter Barelli. E-mail: [email protected]

206

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

The competences in the brazilian professional education

Artigo

aBsTRacT - This article is the result of a research that verified the importance of the delimitation of a concept of competences for the development of public policies, with the intention of basing the quarrel about the formation and professional certification in Brazil. A historical briefing of the sprouting and unfolding of the term “competences” in Brazil and the world is presented, since its sprouting, in the cold war period, until the present moment. Special emphasis is given to the characterization of the three slopes (production, educational and of the market of work) which centralize these formulations and the conceptions of competence defended by each of these slopes. This work intends to contribute to the reflection and action of agents integrated in the quarrel of the Brazilian Professional Education.

KeY WoRDs: competences, world of the work, professional education, formation and professional certification.

Las competencias en la educación profesional brasileña ResumeN - Este trabajo es resultado de una pesquisa que averiguó la importancia de la delimitación de un concepto de competencias para la formulación de políticas públicas, en la intención de subsidiar a la discusión sobre la formación y certificación profesional en Brasil. Se presenta un breve histórico del surgimiento y de los desdoblamientos al empleo del termo “competencias” en Brasil y en el mundo, desde su surgimiento, en el período de Guerra Fría, hasta el presente momento. Especial importancia es dada a la caracterización de las tres vertientes (producción, educación y mercado de trabajo) que centralizan estas formulaciones y a las concepciones de competencias defendidas por cada una de esas vertientes. Se pretende contribuir para la reflexión y acción de agentes integrados a la discusión de Educación Profesional brasileña.

PalaBRas clave: competencias, mundo de trabajo, educación profesional, formación y certificación profesional.

Recebido: 22.09.2006 | Primeira decisão editorial: 22.02.2007 | Aceito: 28.05.2007

CoMo

fAzer referênCiA A este Artigo

(PAdrão ABnt)

A. S. GALDEANO

GALDEANO, Antonio Sebastião. As competências na educação profissional brasileira. Educação Profissional: Ciência e Tecnologia, Brasília, v. 1, n. 2, p. 199-207, jan./jun. 2007.

Edu Pro: C e T, Brasília, 1(2): p. 199-207, Jan-Jun, 2007

207

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.