As Divisas Simbólicas e Emblemáticas de António Augusto Carvalho Monteiro

July 14, 2017 | Autor: Manuel J. Gandra | Categoria: Emblemata, Divisas, António Augusto Carvalho Monteiro
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Manuel J. Gandra

AS DIVISAS SIMBÓLICAS E EMBLEMÁTICAS DE ANTÓNIO AUGUSTO CARVALHO MONTEIRO

Mafra, 2015

Manuel J. Gandra © Mafra, Fevereiro de 2015 Versão simplificada do capítulo homónimo do livro A.A. Carvalho Monteiro, imaginário e legado (Mafra – Rio de Janeiro, 2014) O conteúdo deste folheto não pode ser reproduzido, sem a prévia autorização por escrito do autor.

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AACM era um homem de princípios que vivia em consonância estricta com eles. A sua índole, educação, formação e ideais todos confluíram no sentido de o tornar um cidadão atento aos sinais dos Tempos e empenhado no aprimoramento anímico e moral da humanidade e, particularmente, no dos Portugueses, dando, sem embargo, prioridade ao seu próprio aprimoramento e dos seus mais próximos. Patenteia-se isso em várias dimensões da sua vida, a saber: A adesão a agremiações e instituições, filantrópicas, cívicas, culturais e científicas 1;

assistenciais,

O coleccionismo no que concerne, designadamente, aos lepidópteros (borboletas), os quais, como se infere do seu jazigo, entendia enquanto alegoria, ou Imagem da Vida Humana e da respectiva teleologia; A sua biblioteca com especial enfâse para a Camoniana, cujo acervo foi o mais vasto alguma vez reunido, e para o Templarismo e, notadamente, para a matéria Sebástica, certamente, uma das mais representativas colectâneas de fontes, seja históricas, seja proféticas, organizada durante o século XX; Sem prejuízo de outras: Sociedade Protectora das Cozinhas Económicas de Lisboa; Albergues Nocturnos de Lisboa; Assistência Nacional aos Tuberculosos; Cruz Vermelha Portuguesa (sócio 775 e seu Presidente Honorário); Santa Casa da Misericórdia de Sintra; Sociedade de Protecção ao Operariado; Real Associação dos Arquitectos Civis e Arqueólogos Portugueses; Sociedade Promotora das Raças Cavalares e Turf Club; Sociedade de Geografia de Lisboa; Sociedade Broteriana de Coimbra; Sociedade de Instrução do Porto; Academia Real das Ciências de Lisboa; Associação dos Advogados de Lisboa; Jardim Zoológico e de Aclimatação em Portugal (vogal da 1ª Direcção, 18831884); Société Portugaise des Sciences Naturelles. No estrangeiro afiliou-se nas principais sociedades entomológicas da Europa e da América, nomeadamente de Espanha, França, Bélgica, Inglaterra, Alemanha, Rússia e Estados Unidos. 1

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Catavento com Cruz de Cristo (Ordem Templária de Portugal), na Torrinha e efígies de Camões, cavaleiro templário e dama Beatriz, “nortes” de AACM, no pináculo Norte do mirante da Sala Octogonal.

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Regrar a sua vida por máximas morais e divisas emblemáticas estrategicamente posicionadas no piso térreo (público) da Regaleira 2, ou transportadas consigo, sob a forma de medalhas, ou do Leroy 01, o “relógio mais complicado do mundo”;

A saudação latina SALVE e o pelicano debicando o seu próprio corpo para alimentar os filhotes. A saudação repete-se no mosaico do pavimento do vestíbulo.

Sondar o mais profundo da sua Alma, mediante a atenção que dedicava aos sonhos. A familiaridade com a tradição clássica que o curso de Direito, a ópera e, mais determinantemente, a intimidade com Camões e a Uma das netas de AACM, D. Nazaré Pombal, recordava-se delas como se fossem parte integrante do espírito do lugar”. 2

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cosmovisão templária e sebástica deste, de resto partilhada pelos editores e comentadores quinhentistas e seiscentistas da obra do vate, que AACM tão bem conhecia, facultou-lhe os motes fundadores da sua própria mundividência, susceptíveis de integrar harmoniosamente a poética do mistério e o correlato imaginário. Revelam-se tais motes nos frontispícios de algumas edições de Luís de Camões constantes da biblioteca Monteiriana (cf. Camoniana – lista dactilografada na posse de um descendente de AACM). A título de exemplo, recordo apenas os quatro casos seguintes, todos eles reportando à tradição emblemática inaugurada por André Alciato:

Os Lusiadas de Luis de Camões, Manuel de Lira, 1584 Orfeu, aquele que visitou o Hades (Mundo subterrâneo) para resgatar Eurídice, a sua Dama, tocando uma viola antiga, cuja música amansa animais (veado e leão), com o mote NON VI, SED INGENIO ET ARTE (Não a Força, mas o Engenho e a Arte). 6

Os Lusiadas de Luis de Camões, Manuel de Lira, 1591 Variante da empresa, ou divisa anterior: Orfeu tocando uma lira (viola antiga), com o mote NON VI (no manto) SED INGENIO ET ART[E] (Não a Força, mas o Engenho e a Arte).

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Rimas de Luís de Camões, Lisboa, Pedro Craesbeeck, 1598 (2ª ed.) Genios alados com archote / ramo de oliveira e espelho / folha de palma, alegorias da Paz e da Verdade, em torno de uma arcada no interior da qual se acha a empresa ou divisa de D. Gonçalo Coutinho, uma oliveira e o mote MIHI TAXUS (Para mim teixo = oliveira), árvore de Palas que “mistura com as armas todas as boas ciências e disciplinas, com tal concerto que reciprocamente se comunicam admirável lustre”. O conjunto expressa a ideia de “paz e brandura cortesã” (Fernão Rodrigues Lobo Soropita). 8

Lusíadas de Luís de Camões, Lisboa, Pedro Craesbeeck, 1635 Uma pena e uma espada postas em aspa e reunidas por coroa de louro, com o mote SIMUL IN UNUM (O mesmo num), inspirado no Salmo XLVIII, 3 (Vulgata)

*** O Emblematum Liber (Augsburgo, 1531), o livro de André Alciato (1492-1550) que inaugurou o género emblemático, Alciato teve a Ilíada e a Odisseia, os fabulários latinos (de Fedro e Esopo), a cerâmica e numismáticas clássicas, os epigramas gregos

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(nomeadamente os da Antologia Planudea 3, do período alexandrino), as obras de Ovídio, Aulo Gélio, Plínio, Ateneu, Eliano, Pausanias, etc., as colecções de provérbios e máximas que sistematizavam a ética greco-latina (Dísticos Morais de Catão e a Antologia de Estobeu), a Bíblia, os bestiários, a heráldica, a literatura alegórica medievais, etc., e, designadamente, as invenções hieroglíficas de Horapollo e Colonna, bem assim como os elencos de apólogos e provérbios em circulação nos meios humanistas, compendiados em diversas obras, com destaque para os Adagia 4 do mestre de Roterdão, Erasmo (1466-1536). Foi amplíssima em Portugal a aceitação da obra deste jurisconsulto milanês e muito popular até aos finais da centúria de setecentos. Leite de Vasconcelos referenciou, em 1917, para cima de cinco dezenas de exemplares em bibliotecas públicas e privadas nacionais 5. É conhecido o quanto D. João de Meneses Sotomaior, encarecia os Emblemata 6, a ponto de, correspondendo a uma sua solicitação, Sebastião Stockhamer ter composto, em 1552, os sucintos comentários, posteriormente impressos em Lião (1556), Antuérpia (1565, 1566 e 1567) e Genebra (1614). O entusiasmo do 7º Senhor de Também denominada Antologia Grega. Trata-se de uma colectânea de epigramas gregos de várias épocas, recolhidos pelo erudito grego Máximo Planudes (1255-1305), cuja edição princeps data de 1494 (Florença), sob a direcção de outro erudito grego, Janus Lascaris. Outras edições quinhentistas: Veneza, Aldo Manucio, 1503, 1521 e 1551; Florença, Giuntina, 1519; Paris, Badius Ascensius, 1531; Basileia, 1549; Veneza, P. e J. Nicolini, 1550; Paris, Estienne, 1566; Francoforte, Herdeiros de Wechel, 1600. Existe reedição contemporânea: Anthologie Grecque, deuxième partie, Anthologie de Planude, Paris, Les Belles Lettres, 1980. O médico Brás Luís de Abreu, reproduz uns versos latinos de Alciati, vertidos do grego, in Portugal Médico, Lisboa, 1726, p. 732, §§ 70 e 71, alusivos à barba, acrescentando que esta “devia ser o ornamento mais precioso de um varão sábio, visto que é judicioso emblema de um homem douto”. 4 Edição princeps: Paris, 1500. Reeditados em 1508 (Veneza) e 1515 (Basileia), consideravelmente ampliados. Ver também Primera parte de las Sentencias que hasta nuestros tiempos, para edificacion de Buenos costumbres, estan por diversos Autores escriptas […], Lisboa, Germão Galhardo, 1554, fl. 102v-106 [BN: Res 2613 V] e Coimbra, João Álvares, 1555, p. 212s. [BPÉ: Res 760]. Cf. Artur Moreira de Sá, De Re Erasmiana, Lisboa, 1977, p. 282-289. 5 Joaquim Leite de Vasconcelos, Emblemas de Alciati explicados em Português: manuscrito do séc. XVI-XVII ora trazido a lume, Porto, 1917. Cf. Manuel J. Gandra, Os Emblemas de Alciato (ed. Christian Wechel, Paris, 1540), comentados em Português, Mafra, 2012. 6 Cf. Maria Helena de Teves Costa, A Emblemática de Alciato em Portugal no século XVI, in O Humanismo Português (1500-1600) Primeiro Simpósio Nacional, Lisboa, 1988, p. 435-461. 3

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Cantanhede pelo livro seria de tal ordem “que não só o tinha à mão em casa, como até em viagem o levava consigo”. Eventualmente, aquele aristocrata terá levado os Emblemata consigo para a Índia, em 1605, onde, de resto, terão circulado outros livros congéneres, chegados na bagagem de fidalgos empenhados em alguma campanha militar ou comercial, e de missionários, maioritariamente jesuítas, decerto. Com efeito, em 1602, contava o inquisidor António de Barros que no cárcere do Santo Ofício de Goa aparecera “a ocultas um exemplar do Livro dos Emblemas de Alciato” que para lá fora enviado pela mãe do judeu João Nunes, para este se desenfadar, livro “assaz prejudicial”, no entender do referido inquisidor 7. Convém, ainda, registar a ocorrência de motivos inspirados (Fortuna foi um dos favoritos) em Alciato (e em Achile Bocchi) em colchas bordadas indo-portuguesas e sino-portuguesas 8. Nas letras profanas os Emblemata inspiraram notoriamente Luís de Camões. Em abono da verdade, a influência exercida pela literatura emblemática (Alciato, Camerarius, Bartolomeus Anulus, Joannes Sambucus, etc.) em Camões foi imediatamente constatada por alguns dos seus editores seiscentistas 9.

Cf. António Baião, A Inquisição de Goa – Correspondência dos Inquisidores da Índia (1569-1630), v. 1, Lisboa. 1930, p. 343. 8 Cf. Maria João Ferreira, Ganimedes e a Fortuna. Exemplos de temáticas mitológicas clássicas em peças têxteis bordadas sinoportuguesas, in Oriente, n. 12 (Ago. 2005), p. 90-114. Ver também João Nuno Alçada, A Tempestade do Triunfo de Inverno como “topos” da “Fortuna” Marítima na Corte de D. João III, in Arquivos do Centro Cultural Calouste Gulbenkian, v. 37 (1998), p. 53-66. 9 Cf. Manuel Correia, Os Lusíadas do grande Luís de Camoens […] comentados pelo licenciado […], Lisboa, 1613, fl. 251r; Bartolomeu Pachão, Fábula dos planetas moralizada […], Lisboa, 1633, fl. 88v; Faria e Sousa, Rimas Várias de Luís de Camoens, Lisboa, 1689, 2ª parte, p. 166; etc. Ver Marion Ehrardt, Repercussões Emblemáticas na obra de Camões, in Arquivos do Centro Cultural Português, v. 8 (1974), p. 553-566; Yara Frateschi Vieira, A Tradição emblemática em Camões: presença e função discursiva, in Estudos Portugueses e Africanos, n. 5 (1985), p. 123-135 e Emblema, alegoria e história no episódio da Ilha dos Amores, in Revista Camoniana, s. 2, v. 4 (1981), p. 93-109; Maria Helena de Teves C. Ureña Prieto, Tópicos da iconologia Renascentista na Poesia Camoniana, in Actas da I Reunião Internacional de Camonistas, S. Paulo, 1987, p. 669702; Martim de Albuquerque, Emblematismo e Camões, in A Expressão do poder em Luís de Camões, Lisboa, 1988, p. 265-290. 7

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Diversos apontaram a origem emblemática de uma série de versos que descrevem a Ilha dos Amores, designamente aqueles que se reportam à cidreira 10, ao pêssego 11, ou ao olmeiro 12. Por seu turno, os versos 43-39 da Ode VII do vate parecem concitar a convicção da generalidade dos exegetas, desde Faria e Sousa 13, quanto a traduzirem o sentido do emblema 120 de Alciato (Paupertatem summis ingeniis obesse ne provehantur), por sua vez inspirado num hieróglifo da Hipnerotomachia Poliphili de Colonna 14:

“Sempre foram engenhos peregrinos Da Fortuna envejados; Que, quando levantados Por um braço nas asa são da Fama, Tanto por outro a sorte, que os desama, E o peso da gravidade Os oprime da vil necessidade”. Essa constatação, pode conduzir a considerar francamente consistente a probabilidade da origem emblemática de outras imagens Cf. Os Lusíadas, IX, 56. Idem, IX, 58. 12 Ibidem, IX, 59. 13 Ver Vida del Poeta, VI, col. 22. 14 Cf. Ludwig Volkmann, Bilderschriften der Renaissance, Hieroglyphic und Emblematik in ihren Beziehungen und Fortwirkungen, Nieuwkoop, 1969, p. 43. 10 11

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constantes da mesma Ode, caso dos versos 4-6, similares no sentido aos do epigrama do emblema 36 de Alciato (Obdurandum adversus urgentia):

“da gloriosa palma, que não perde A presunção sublime Nem por força do peso algum se oprime” 15. Convém, não obstante, adoptar redobradas cautelas no que concerne às atribuições genéticas no emblematismo literário e não confundir estruturas ou funções emblemáticas com meros motivos emblemáticos, i. e., distinguir, tanto quanto possível, as influências directas das indirectas. No caso em apreço, por exemplo, a imagem poética da palmeira, como emblema da constância, pode ter sido inspirada a Camões por Gélio, Plutarco, Aristóteles, Xenofonte, Teofrasto, Estrabão, Plínio ou Erasmo. Tal cautela deve subjazer à exegese de inúmeros outros textos literários, pese embora a influência maior ou menor creditável a Alciato, sofrida por André Rodrigues Eborense 16, António Ferreira 17, Glosa o tema na Ode Querendo escrever, um dia […], v. 111 e em Os Lusíadas, VIII, 76. Cf. Sententiae, Lisboa, 1554; Lião, 1557; Coimbra, 1569; Paris, 1569; Veneza, 1572; Colónia, 1593. 15

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Francisco Leitão Ferreira 18, António Delicado 19, António de Sousa de Macedo 20, bem como inúmeros outros de entre os quais se destacam Manuel Faria e Sousa, Manuel Severim de Faria e Bocage.

O interior da cúpula do zimbório da igreja de São Pedro de Elvas, reproduz oito emblemas de Alciato

Carta para António de Castilho (Coimbra, 30 de Junho de 1557): “os alciatos em que me V. m. falou, se todavia os escusa me fará mercê mui grande mandarmos”. Ver Poemas Lusitanos, v. 2, Lisboa, Clássicos Sá da Costa, p. 154-155. Cf. Brito Rebelo, Cartas de António Ferreira e Diogo Bernardes a António de Castilho, in Archivo Histórico Português, v. 1 (1903), p. 138, 148, 185 e 187. 18 Nova Arte de Conceitos, Lisboa, 1718-1721. 19 Adágios Portugueses reduzidos a lugares comuns, Lisboa, 1651. 20 Eva e Ave, ou Maria Triunfante, Lisboa, 1716 [BPNM: 2-13-18-8]. 17

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Nas artes são tributários de Alciato: João de Ruão 21, Francisco de Holanda, bem assim como os autores de muitos dos programas iconográficos dos espaços emblemáticos, destinados às entradas régias e aos jardins de muitas quintas de recreio e palácios, desse modo transformados em autênticas Moradas Filosofais, de que são paradigmáticas a Quinta da Bacalhoa (Azeitão) e o Palácio Fronteira (Lisboa).

Mas até as Apólices do Real Erário, instituídas por Alvará de 1797, testemunham a glosa dos repertórios emblemáticos de Alciato, mediante a transposição de algumas das suas alegorias, como, meramente a título de exemplo: o leão acossado por uma matilha de cães (figurando a Ira e a Cólera dos seres em estado selvagem, que o homem avisado deve evitar) e a vanidade dos maldizentes ou ímpetos vãos, exposta no emblema 164 (o cão julga ver na Lua a imagem de um outro da sua espécie, ladrando-lhe incessantemente e exaurindo, desse modo vão, todas as suas energias) 22.

Alegado autor de um medalhão com a figura da Ocasião, datável de ca. 1540, destinado a uma casa do Largo da Sé Velha de Coimbra, actualmente no Museu Nacional Machado de Castro. Erroneamente descrita como Fortuna por Pedro Dias e, antes dele, por Guido Battelli, Um Medalhão da Renascença Italiana no Museu Machado de Castro, in Ilustração Moderna, a. 6, n. 52 (Jul.-Ago. 1931), p. 326. 22 Cf. Arte e Imagem nas notas do Banco de Lisboa (1846-1996), Lisboa, 196, p. 112-114. 21

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Já no século XIX, também o pintor António Manuel da Fonseca utilizaria os Emblemata para compôr diversas das suas obras, designadamente um painel transparente de pintura expressamente encomendado pelo barão de Quintela para a iluminação do seu Palácio das Laranjeiras, na noite do dia 22 de Outubro de 1820 23: “[…] o objecto principal é o Retrato do nosso Amável Soberano, e da Sua Augusta Esposa, levantados em baixo relevo em uma medalha de ouro, a qual vão colocar sobre um Pedestal de uma Coluna Egípcia duas Figuras, uma o Amor da Pátria, que é caracterizado em um Mancebo guerreiro, que tem ao peito uma das Quinas Portuguesas; o mesmo pega com a mão direita nos Retratos, e com a esquerda mostra quanto avalia, e estima a Justiça, que se vê à esquerda do Quadro, pegando com a direita na dita medalha, e com a esquerda impunha as varas Consulares. Junto ao Amor da Pátria se vê a Fidelidade figurada em um Menino, e um Cão, tendo na direita duas chaves; e em o meio das duas figuras ditas a Felicidade Pública coroada de flores, entornando a Cornucópia da abundância. Na parte superior do Quadro, junto à mesma Medalha, se vê o Amor da Virtude, que com a mão direita ampara os ditos Retratos, e com a esquerda segura o símbolo da Memória perdurável, figurada em uma Cobra, que morde a cauda. a qual é sustida tambem pela Gratidão simbolizada por um Menino que abraça uma Cegonha. À esquerda do dito Quadro se vê o Tempo curvado, sustendo sobre as asas um Livro, em que se lê a História ditada pela Verdade, que está à sua direita, caracterizada com hum Sol, que lhe alumia o peito, e na mão esquerda tem uma Palma. Finalmente ao lado direito do dito Quadro se vê a Generosidade, junto a ela um Leão, e com mãos liberais distribui ricas medalhas, e preciosas jóias, mostrando o quanto estima as Artes, e olhando benigna para o Génio da Pintura, caracterizada por um Menino, que tem na mão esquerda umas asas, e na direita lhe pesa uma grande pedra. Este Emblema é de Alciato” 24. Cf. Henrique de Campos Ferreira de Lima, António Manuel da Fonseca, Litógrafo, in Museu, v. 3, n. 6 (Jun. 1944), p. 25-26. 24 A Analise do Painel transparente que mandou fazer o Barão de Quintella, pelo pintor António Manoel da Fonseca, Filho, para a illuminação do seu Palácio das Larangeiras, para a noute do dia 22 de Outubro de 1820, circulou impressa numa folha volante, 23

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A influência de Alciato e de seus mais notórios discípulos não foi menor entre teólogos e moralistas, que empregaram emblemas e empresa, ou divisas, para interpretações ao divino, como sucedeu com Frei Heitor Pinto 25 e Manuel Bernardes, em particular, e com os jesuítas, em geral, seus mais estrénuos adeptos e divulgadores, bem como com os respectivos discípulos 26. Outro exemplo é o oratório da duquesa de Bragança D. Catarina (Paço de Vila Viçosa), concebido pelo pintor Tomás Luís 27. O êxito retumbante e a popularidade alcançados pela obra de Alciato 28, autêntica vulgarização da doutrina antes apenas acessível nos Espelhos e Regimentos de Príncipes (os denominados livros ad usum delphini), testemunham o interesse generalizado que suscitou não só no velho Continente como também nas colónias (nomeadamente as americanas), o qual se havia de consubstanciar na adesão ao género de um número crescente de autores. Paradoxalmente, o alinhamento de muitos deles, por campos ideológica e idiossincraticamente distintos, como eram o dos reformados e o dos contra-reformistas, não os impediria de, reiteradamente, partilharem as mesmas fontes. Num ápice, o emblematismo havia de transformar-se numa espécie de linguagem universal e influenciar outros géneros e disciplinas, tornando-se a literatura (Camões), o teatro (Shakespeare e impressa de um só lado, profusamente distribuída (Lisboa, Na Impressão Régia. Com Licença da Comissão da Censura). A Mnemosine Constitucional transcreve quase na íntegra, o mesmo texto. 25 Imagem da Vida Christam, Lisboa, 1681 [BPNM: 2-13-8-12] e Segunda Parte dos Diálogos da Vida Christam, Lisboa, 1593 [BPNM: 2-13-3-16]. 26 A título meramente exemplificativo, anoto de Pedro José Supico de Morais, Collecção Moral de Apothegmas, ou ditos agudos, e sentenciosos, Parte I, Lisboa Oriental, Oficina Augustiniana, 1732 e Parte II, Coimbra, Francisco de Oliveira, 1761, obra na qual se acham inúmeras remissões para os Emblemata de Alciato. Apenas na Parte II, registo, sem pretender ser exaustivo: p. 75, 76, 117, 125, 145, 149, 308, 354, 365, 373, 383, 401, 406. 27 Cf. Vítor Serrão, O pintor maneirista Tomás Luís e o antigo retábulo da igreja da Misericórdia de Aldeia Galega do Ribatejo (1591-1597), in Artis, n. 1 (2002), p. 211-235, especialmente, p. 229-231. 28 A única tradução portuguesa conhecida (Declaração Magistral sobre os Emblemas de Alciato com todas as Historias, Antiguidades, Moralidades, e Doctrina tocante aos bons costumes [BN: cod. 9221 = F 268 e F 1476]) foi realizada, em 1695, por Teotónio Cerqueira de Barros, cavaleiro da Ordem de Cristo, familiar do Santo Ofício natural da Vila de Barca Província do Minho, a partir da edição de Diego Lopez (1615) Rubem Amaral Júnior, promoveu a edição do códice em apreço, antepondo uma “breve apresentação” à respectiva transcrição diplomática, s. l., s. d. [2006] [BN: L 94402 V].

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Cervantes) e as artes plásticas campos preferenciais para a sua expressão. Não obstante, convém distinguir a empresa 29 do emblema, género afim deste (patente em registos heráldicos, vinhetas, marcas de impressores, ex-libris, nas medalhas de AACM, etc.), com o qual, de resto, foi, frequentemente, confundido aquém-Pirinéus. Com efeito, a empresa é uma figura ou composição engenhosa de uso estritamente pessoal, invariavelmente, enigmática e indissociável de mote curto (redigido em latim, grego ou francês) que expõe veladamente uma intenção, aspiração, desejo ou conduta particular, ao invés do emblema que expressa uma intenção geral. Rafael Bluteau esclarece na perfeição as acepções adequadas a cada um dos conceitos: “Entre Humanistas, Emblema é termo metafórico, porque da significação de ornamentos materiais, passou a significar algum documento moral, que aberto em estampas, ou pintado em quadros, se põe para ornamento das salas, galerias, academias, arcos triunfais, etc. O Emblema tem, como a Divisa, ou Empresa, corpo e alma, a saber figura visível e letra inteligível, porém em muitas coisas difere Emblema de Empresa. 1. Tanto mais perfeita é a Empresa ou Divisa quanto mais simples e composta de menos figuras. Mas o Emblema admite várias figuras históricas ou fabulosas, materiais ou artificiosas, verdadeiras ou quiméricas; nem exclui, como a Empresa, corpos humanos; mas antes com erudita moralidade às vezes representa um Ganimedes, que sobe, um Dédalo que voa, um Faetonte que cai, etc. 2. O objecto da Empresa (segundo o seu uso primitivo) é Heróico e Particular. O objectivo do Emblema é um documento geral, concernente ao instituto da vida humana. 3. A Empresa como subtil, engenhosa e rebuçada, usa de letra ambígua e lacónica, que declarando encubra, e encobrindo declare, o que significa. Pelo contrário, o Emblema, como familiar, popular, liso e sincero, clara e difusamente expõe o que ensina. Finalmente, podem a Empresa e o Emblema ter o mesmo corpo ou figura, mas não a mesma alma ou letra, porque a letra da Empresa 29

Do latim imprendere, empreender. Sinónimo de divisa, na língua portuguesa.

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há-de ser própria e particular, e a letra do Emblema há-de ser geral e dogmática; e com esta advertência, arrolando a alma, e não o corpo, quero dizer mudando a letra sem mudar a figura poderás fazer da Empresa Emblema e do Emblema Empresa” 30. Os livros de empresas são, em regra, e à semelhança dos bestiários e lapidários medievais, autênticos repositórios de portentos e curiosidades pitorescas, bebidas tanto nos clássicos, quanto em eventos coetâneos dos respectivos autores. A vasta literatura sobre empresas, difundida pelas cortes dos monarcas franceses Carlos VIII e Luís XII, designadamente a partir da invasão francesa da Itália, tornando-a uma verdadeira filosofia do cortesão, testemunha o triunfo do conceito e do engenho na escrita. Diversas foram as explicações avançadas quanto à origem da empresa: Menestrier considerou-a italiana, Juan de Horozco (1589) dila originada nos signa dos estandartes romanos, distinguindo-a da divisa e alegando que esta foi originalmente distintivo pessoal, posteriormente convertido nos brasões hereditários, enquanto a empresa, sendo igualmente pessoal, manifesta algum propósito que, por constituir o objecto de um empreendimento, adquiriu a designação que usa. Paolo Giovio (1483-1552) e Pierre Le Moyne são apontados como os responsáveis pela definição e consagração das regras compositivas da empresa. O referido mestre italiano expôs, no Dialogo delle Impresi Militari et Amorose (1551), os cinco critérios indispensáveis à divisa bem sucedida 31, a saber: 1. correspondência exacta entre corpo e alma (figura e motto); 2. nem obscura, nem demasiado óbvia; 3. de aparência agradável; 4. não antropomórfica;

Cf. Vocabulário Portuguez Latino, v. 3, Lisboa, 1713, p. 43-44. Nunca houve unanimidade quanto a estes critérios. Cerca de um século volvido, Emanuel Tesauro havia de apontar os 32 elementos essenciais à empresa, no Il Cannochiale Aristotelico (1672). O gosto renascentista pela elaboração de empresas, como exercício de agudeza, seria reiteradamente preconizado pela teoria barroca da metáfora, tornando-se parte indissociável das opções estéticas do conceptismo. 30 31

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5. o motto escolhido não podendo adoptar a língua do destinatário da empresa, convém que seja breve e isento de ambiguidades.

A Empresa, ou Divisa, de Camões (um dragão saindo das entranhas da terra), segundo Manuel Faria e Sousa (1639) e a edição de Os Lusíadas, patrocinada pelo Morgado de Mateus (Paris, 1817)

Em Portugal as empresas começaram a ser difundidas a partir do século quatorze, coincidindo com o advento da dinastia de Avis. A esse propósito, evoco uma muito esclarecedora passagem de Rodrigues Lobo: “- As armas (respondeu ele) é a insígnia que cada um tem de sua nobreza, conforme ao apelido com que se nomeia, e com o sinete delas sela as cartas de importância, ou com elmo, e folhagens sobre o paquife do escudo, ou com ele em tarja, como tenção; que estas como são pensamento, e desenho particular, se abrem às vezes em redondo, ovado, ou quadrângulo, e outras figuras, sem respeitar a do escudo. Em Portugal é coisa muito antiga aos príncipes trazem tenções, e empresas com letras, e ainda as usavam misturadas nas Armas Reais, 20

que posto que naquele tempo não estavam tão apuradas como agora, nem eram sujeitas à arte, que delas e para elas fizeram os modernos, não lhes faltava entendimento, e galanteria. El-rei D. João o I trazia na orla das Armas uma letra, que dizia: Por bem. E a rainha D. Filipa de Alancastre sua mulher, outra que respondia a esta em Inglês que dizia: Me contenta. O infante D. Fernando seu filho, o Santo, trazia uma capela de hera com seus cachinhos, e no meio dela a Cruz de Avis, de cuja cavalaria era Mestre. O infante D. Pedro uma capela de carvalho com suas bolotas, e no meio umas balanças, e nas armas Reais, no banco de pinchar, em cada pé de alto a baixo mãos, e por cima umas letras escritas muitas vezes, que diziam: Dizer, e entre cada palavra destas um ramo de carvalho com bolotas. O infante D. João, que foi mestre de S. Tiago, casado com a neta do condestável D. Nuno Alvares Pereira, trazia uma capela de ramos de silva com cachos de amoras, com as bolsas de S. Tiago no meio, e três conchelas em cada uma com uma letra em Inglês, que dizia: Com muita razão. O infante D. Henrique, Mestre na Ordem de Cristo, trazia as armas do Mestrado, e de antigas de Portugal, e ao redor um cinto largo de correia, que abroxava no cabo de baixo, e uma fivela que fazia volta com ao correia, e em Inglês a letra dos cavaleiros de Garrotea, que ele também era, e dizia: Contra si faz quem mal cuida. E uma capela de carrasco, e no banco de pinchar três flores de lírio em cada pé. El-rei D. Afonso o V trazia pintado um mundo com esta letra: Conheço que não te conheci. El-rei D. João II seu filho, trazia um rodízio, com esta letra: Setere: e na outra trazia um Pelicano ferindo o peito, e dizia a letra: Pela lei e pela grei. A rainha D. Leonor sua mulher, trazia uma rede de pescar, a que chamam rastro. El-rei D. Manuel, uma esfera com uma Cruz. A excelente senhora, uns alforges, e nas cevadeiras pintadas as Armas de Castela com esta letra: Memória de mi derecho. O marquês de Valença, neto do conde D. Nuno Álvares, trazia dois guindastes, que levantavam um título de pedra, com quatro letras, cada uma por parte. E além destas há memória de outras muitas, que dão testemunho do uso que delas havia neste reino. - Por certo, disse D. Júlio, que estou assaz contente do fruto que colhi da minha pergunta, por saber curiosidade tão notável dos nossos príncipes antigos, que para a minha natural inclinação é a coisa de maior gosto, e interesse: e não fora menor; pois falamos de Armas, e Tenções, e vós sois visto nela fazer que saibamos mais alguma coisa

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traz desta matéria, principalmente donde nasceu, e teve principio o uso dos Escudos de Armas, e das Tenções. - Quanto à minha opinião (respondeu Leonardo é que armas, e empresas, ou tenções não tiveram no seu princípio a diferença, que agora lhes assignam os que delas escrevem de letras, e corpos sem letras, com limitações, e regras mui apertadas. Antes me parece, que as armas eram as insígnias que os reis, e imperadores davam aos seus para ser conhecida sua nobreza, conformando-se na figura delas com a qualidade dos sucessos por onde as mereceram, ou com a antiguidade do sangue de onde descendiam a quem as davam, e as que os mesmos reis tomavam para si em memoria de semelhantes feitos, ou derivadas por seus antecessores. Empresas, ou tenções são as que os mesmos reis, príncipes, ou particulares tomam, conformando as figuras, e letras com o desenho, e pensamento que cada um tem, para empreender coisas altas, E daqui adiante entram as regras, que depois lhe aconteceram; que, por ser um discurso mui comprido, não tem lugar em noite tão breve” 32. Dom Francisco Manuel de Melo testemunha o declínio a que haviam chegado no século XVII, no seguinte trecho da sua Carta de Guia de Casados: “Pedia uma dama a um seu irmão, discreto, que lhe desse uma letra para certa empresa sua, que queria mandar abrir em um sinete; respondeu-lhe: Minha irmã, deixai as empresas para as adargas dos cavaleiros andantes, as empresas que haveis de mandar abrir, sejam chavões para fazerdes bolos a vosso marido quando o tiverdes” 33. *** O escrutínio do acervo bibliográfico disponível na biblioteca de AACM, mediante a consulta sistemática dos catálogos da DCL e das listas na posse de descendentes, apenas permitiu assinalar duas obras integráveis na tradição emblemática a que tenho vindo a reportar-me, (uma de Boccacio, outra de Jacob Cats), porém, nenhuma delas deu entrada na Biblioteca do Congresso. 32 33

Cf. A Corte da Aldeia, diálogo II. Cf. cap. XII.

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Seja como for, AACM teve, decerto, oportunidade de compulsar tratados emblemáticos que não chegou a adquirir, eventualmente na posse de Luigi Manini, ou de outros bibliófilos e bibliotecas. Justamente, porque todas as sete medalhas de AACM foram decalcadas de um mesmo livro, uma colectânea de Empresas, ou Divisas, organizada por Nicolas Verrien (Recueil d’Emblemes, Paris, 1696), ausente quer da DCL, quer das listas familiares... 34

Jacob Cats (1577-1660), Silenus Alcibiadis, sive Proteus, Vitae humanae ideam Trifariam Varietate Oculi [...], Amesterdão, Villem Blaeu, s. d. AACM contava com um exemplar desta edição na sua biblioteca, achando-se encadernada no mesmo volume, com frontispício especial, a obra Manita Amoris Virginei sive Officium Puellarum […]. O autor foi adepto da "agudeza recondita", buscando inspiração nos provérbios do quotidiano holandês, como antes fizera Pieter Brueghel num óleo de 1559, actualmente no Museu de Berlim. As 7 medalhas em ouro que AACM usava ao pescoço foram presentes ao público, pela primeira vez (mediante projecção), no decurso da derradeira comunicação, a cargo do Arq. João Cruz Alves (31 de Outubro de 2011), no Colóquio Carvalho Monteiro – Vida, Imaginário e Legado. Por carta (21.5.2012), o detentor delas, trineto do evocado, proibiu-me, não só de publicá-las, como também, pasme-se, de abordar o tema! 34

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A mitologia clássica não esteve completamente ausente da cultura medieval, tendo, no entanto, sido relegada para o plano da fábula. Ficaria a dever-se a Boccacio a sistematização, na sua Genealogiae deorum, da maior parte da informação até então dispersa acerca dos deuses pagãos da antiguidade. O seu livro, a par das Metamorfoses de Ovídio, constituiu, até à publicação das Imagini de i Dei (1566) de Vincenzo Cartari, a fonte primacial, não só para explicar em termos simbólicos as acções dos deuses, mas também a respectiva aparência e atributos, de molde a esclarecer a metáfora hagiográfica que haviam passado a personificar. António Augusto Carvalho Monteiro possuia a edição incunábula, de 1481, da Genealogiae deorum.

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Festina lente Oxímoro latino atribuído ao Imperador Octávio (27 a. C. – 14 d. C.), com o sentido: Apressa-te devagar; Devagar se vai ao longe; Faz lentamente o urgente; Devagar que tenho pressa. Condenação da pressa excessiva. Fazer as coisas sem tardança, mas não sem ponderação e cautela. Ocorre num trecho da Vida de Augusto de Suetónio (12 Césares, 25, 4), o qual advertia os comandantes impetuosos com uma expressão grega com o exacto sentido desta. Depois em Polieno (Strategemata, 8, 24) e Aulo Gélio (Noites Áticas, 12, 5), em Esopo (Fábulas A Tartaruga e a Lebre e O Caranguejo e a Borboleta).

Tartaruga com vela aplicada à carapaça e delfim (aliás, rémora) entrelaçado numa âncora.

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Alciato, Elias Ashmole e Cardeal D. Henrique

Variantes: tartaruga com vela aplicada à carapaça (Cosimo I de Medici; impressores florentinos Bartolomeo e Michelangelo Sermartelli); delfim (ou rémora) entrelaçado numa seta (Melchior de Neuss de Colónia, c. 1529; Alciato, sv maturandum, in Comentário por Claude Mignault; Elias Ashmole, Theatrum Chemicum); delfim

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(aliás, rémora) entrelaçado numa âncora (Aldus Manucio; Cardeal D. Henrique; etc.); etc. 35

Sala do Bilhar, ou dos Reis, na Regaleira

Foi divisa, ou mote, de Augusto, Tito, Vespasiano (medalha), Domiciano (medalha), Medici, Aldo Manúcio (1494-1515), Paulo Manúcio (1533-1573), Aldo Jovem (1574-1598), Cardeal-rei D. Cf. Edgar Wind, Los Misterios del Renascimiento, Barcelona, 1971, p. 104. Ver também: José V. de Pina Martins, Descobertas Filológicas e Descobrimentos Portugueses numa carta de Aldo Manuzio a Leão X (1513), in Humanismo Português na época dos Descobrimentos (Coimbra, 1991), Coimbra, 1993, p. p. 425-437; G. ZAPELLA, Le marche dei tipografi e degli editori Italiani del cinquecento, Milão, 1986, s. v. Tartaruga, parte 1, p. 368-369 e parte 2, fig. 1151-1155. 35

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Henrique, família Onslows (on slow), etc., tendo sido interpretada por Erasmo (Adagia, Cumprimentos ao editor) e por Gabrieli Simeoni (Le Empresi Heroiche et Morali). Na Regaleira, via-se pintada nas paredes da Sala do Bilhar, ou dos Reis, alternada com o mote Macte Animo, no enxaquetado vegetalista em forma de losango que cobria as paredes. Desapareceu por iniciativa da família d’Orey.

Macte animo Jovem, ânimo! (Estácio, Silvae, 5.97); Ânimo! Coragem! Ocorre em Virgílio (Eneida, 9, 641): “Macte nova virtute, puer; sic itur ad Astra” (Bravo rapaz, pela tua coragem, assim se chega às Estrelas). Lema do 2º Esquadrão de Carros de Combate da Brigada Mecanizada (Portugal). Provérbio latino, vocativo do adjectivo mactus, macta, mactum, sinónimo de honrado (Macte animi = honrado pela tua alma). Cf. Sílio Itálico (17, 275), Estácio (Tebaida, 2, 495), etc. Na Regaleira, via-se pintada na Sala dos Reis, alternada com o mote Festina Lente, no enxaquetado vegetalista, em forma de losango que cobria as paredes. Desapareceu por iniciativa da família d’Orey.

De coloribus et gustibus non est disputandum De cores e gostos não se discute; Sobre os gostos e as cores não vale a pena discutir; Gostos não se discutem. Na Regaleira, via-se pintado na Sala de Caça, na parede sobre a passagem para a copa.

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Materiam superabat opus O Engenho supera a Matéria. Ocorre em Ovídio (Metamorfoses, 2, 5) Na Regaleira, via-se no átrio de entrada, sobre o pórtico de transição para a escadaria nobre, a qual os d’Orey suprimiram quando adquiriram a mansão.

Parcialmente encoberta pelo candeeiro, a máxima Materiam superabat opus vislumbra-se sobre o pórtico de entrada na mansão.

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Tarde venientibus ossa […] nulla Para os retardatários apenas os ossos; Quem vem tarde come os ossos e quem mais tarde vier nada come. Provérbio dos mercadores romanos. Na Regaleira, via-se em duas paredes da Sala de Caça, sobre a porta de entrada e sobre a janela dupla 36.

Sobre a janela dupla, lê-se a derradeira palavra do provérbio.

Cf. N. COLARES, Palácio do Ex.mo Senhor Dr. António Augusto de Carvalho Monteiro, in A Architectura Portuguesa, a. 10, n. 8 (Ago. 1917), p. 30. 36

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A máxima vislumbra-se na parede ao fundo, ladeando a porta de acesso a esta dependência da casa.

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Deorsum nunquam Corpo da divisa: Chama flutuando no espaço Alma da divisa: Deorsum nunquam = Não desço nunca. “Tal como a chama se eleva e não pode jazer, nem inclinar-se para baixo, nem descansar, assim o nosso ânimo ergue-se e fica mais activo, quanto mais veemente é” (Séneca, Os quatro Elementos, liv. 2, Ep. 39). Ocorre em: Lactâncio (De Divinis Instututionibus, liv. 7); Girolamo Ruscelli (Impresi Illustri, Veneza, 1584, p. 121) 37; Caspar Augustin (Der newen Cornet und Fahnen, Augsburgo, 1633, p. 42); Dominique Bouhours (Les Entretiens d’Ariste [...], entretien VI, Paris, 1671, p. 298 e 304 e Paris, 1741, p. 381); Picinelli (Il Mondo Simbolico [os 4 elementos: o fogo = O ânimo nobre], Milão, 1680, 2, 48 e 1687, II, 2, 56); Daniel la Feuille (Devises et Emblemes), Amesterdão, 1693, prancha LXI, n. 4 e 1712; Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha LXI, n. 4); François Noel (Opuscula Poetica in quatuor partes distributa, Francoforte, 1717, parte 3, cap. 4, p. 196 [Vita S. Ignatii Virtutes]); Gabriel François Le Jay (Bibliotheca Rhetorum, v. 4, Paris, 1725, p. 419); Graham (The British Herald or cabinet of armorial banings of the nobility and gentry of Great Britain and Ireland, v. 3, Sunderland, 1830). Empresa adoptada pelas famílias Orsini, Olympia e TargioniTozzetti (Livorno), por Claudia Rangona (filha de Claudio Rangoni e Lucrezia Pico della Mirandola) e também por Richard Goodsicke of Ribaton Yorkshire (1560-1601) e por Cornelis Ketel (1548-1616) que se fez retratar acompanhado por esta empresa (Art Gallery of South Australia, Adelaide), 156º Regimento (21-23 Out. 1915), numa medalha em ouro de AACM, etc.

Cf. Monica Calabritto, Women’s Impresa in Girolamo Ruscelli’s Le Imprese Illustri (1566), in Donato Mansuelo, The Italian Emblem: a collection of Essays, Glasgow Emblem Studies, v. 12, p. 75-76. 37

32

Frontispício da obra de Nicolas Verrien (Recueil d’Emblemes […], Paris, 1696) da qual AACM decalcou as suas sete medalhas.

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A divisa em Caspar Augustin e Girolamo Ruscelli

A medalha de AACM é decalcada da empresa publicada por Nicolas Verrien (prancha LXI, n. 4). No verso a tradução: Não desço nunca

34

Dum placeam peream Corpo da divisa: Queimador de incenso Alma da divisa: Dum placeam peream = Que todo eu me consuma contanto que agrade; Que seja a meu favor, enquanto viva (Pierre Le Moyne) Ocorre em: Pierre Le Moyne (Devises Heroiques et Morales, 1649); Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha IV, n. 3); Daniel La Feuille (Devises et Emblemes, Amesterdão, 1691; Symbola et Emblemata, Amesterdão, 1705, p. 10, n. 30); Dominique Bouhours (Entretiens d’Ariste [...], entretien VI, Paris, 1671, p. 363); Louis Claude Menestrier (Devises des Princes, Cavaliers, Dames, Scavans et autres personnages illustres de l’Europe - La Philosophie des Images, v. 2, Amesterdão, 1683, p. 212); Verrien (Recueil d’Emblemes); Meling van Zinspreuken (Verzameling [...], Amesterdão, 1741, p. 10-11, n. 30); Jacob Bosch (Symbolographia, Augsburgo, 1701, e 1702, n. DCLXX, p. 231 e 233), numa medalha em ouro de AACM, etc.

A divisa em Daniel La Feuille (1691) e Pierre Le Moyne

35

Empresa iconografada na igreja de S. Miguel de Bamberg (cf. Anja Hofmann, Sakrale Emblematik in St. Michael zu Bamberg, Bamberg, 1997/2001, p. 68)

A divisa em Meling van Zinspreuken e Jacob Bosch

Medalha de ouro de AACM, decalcada de Nicolas Verrien (prancha IV, n. 3). No verso ostenta a tradução: Que todo eu me consuma contanto que agrade.

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Mitte non promitte Corpo da divisa: Uma figueira carregada de figos Alma da divisa: Mitte non promitte = Dá o teu fruto sem o prometer; Dá frutos sem os prometer A figueira produz frutos sem antes se apresentar florida (cf. Deuteronómio), caso singular no mundo vegetal. Ocorre em: Joachim Camerarius (Symbolorum et emblematum, ex re herbaria [...], Mogúncia, 1677, centuria I, colecta IX, p. 18-19: “Gratior est fructu ficus quem flore salicta missa ego promissis ante ferenda reor”; Nuremberga, 1590, p. 10v-11r; Francoforte, 1654, p. 10v-11r); Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha II, n. 8); Heinrich Offelen (Symbola et emblemata, n. 391, p. 132); Daniel la Feuille (Divises et Emblemes, Amesterdão, 1691, X, 399, p. 29, n. 8 e prancha 2, n. 8); Heinrich Kitoch (Symbologia heroica hexaglottos, 1608, p. 105); Johann Heinrich Ursinus (Arboretum Biblicum, 1663, p. cap. 21, p. 303), numa medalha em ouro de AACM, etc.

A divisa em Camerarius e Daniel La Feuille

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Divisa do conde de Monsanto (9.12.1864).

A medalha em ouro de AACM é decalcada de Nicolas Verrien (prancha II, n. 8). No verso a tradução: Dá o teu fruto sem o prometer.

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Obliquus, non devius Corpo da divisa: Rio serpenteante Alma da divisa: Serpenteio mas não me desvio Ocorre em: Dominique Bohours (Entretiens d’Ariste [...], entretien VI, Paris, 1671, p. 374); Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha XXXIII, n. 7); Jacob Bosch (Symbolographia sive de arte symbolica, Augsburgo, 1701 e 1702, n. CMLIII, p. 634 e 637, respectivamente); Picinelli (Mundus Symbolicus, 1715, Flumen, 2, 435); Gabriel François Le Jay (Bibliotheca Rhetorum, Veneza, 1747, p. 725; Daniel la Feuille (Emblemes et Devises, prancha XXXIII, n. 7), numa medalha em ouro de AACM, etc.

Divisa em Jacob Bosch e Medalha em ouro de AACM, decalcada de Niolas Verrien (no verso ostenta a tradução: Serpenteio mas não me desvio).

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Privo di te moriro Corpo da divisa: Caixa ou vaso com planta (laranjeira), iluminada pelo sol resplandescente Alma da divisa: Privo di te moriro = Sem ti perecerei Ocorre em: Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha IV, n. 14); Von den Ketten (Apelles Symbolicum, Amesterdão, 1699, CLIII, p. 834); Daniel la Feuille (Devises et Emblemes, Amesterdão, 1691, prancha IV, n. 4, n. 14; tb, ed. 1705), numa medalha em ouro de AACM, etc. Mote de Luís XIV (cf, moedas de ouro e cobre, Ø 28 mm) Medalha de Maria de Rubentel (1555-1612), cobre, 1570

Moeda de ouro de Luís XIV

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A divisa em Nicolas Verrien (prancha IV, n. 14) e Daniel la Feuille (1705)

Medalha em ouro de AACM, decalcada de Nicolas Verrien, sem tradução no verso

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In me mea spes omnis Corpo da divisa: Elefante Alma da divisa: In me mea spes omnis = Nada espero senão de mim mesmo; A minha esperança reside em mim Ocorre em: Daniel la Feuille (Devises et Emblemes, Amesterdão, 1685, n. 5); Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha I, n. 3); Meling van Zinspreuken (Verzameling [...], Amesterdão, 1741, p. 2-3, n. 1), numa medalha em ouro de AACM, etc. Brasão de armas da família Post (jazigo de família no Hillwood State Museum, Washington, DC) e também de Virginia e Richard Poultney (1730) (cf. Charles Knowles Bolton, Bolton’s American Armory, 1927 e 1989, p. 133)

A divisa em Meling van Zinspreuken e Medalha em ouro de AACM, decalcada de Nicolas Verrien. No verso ostenta a tradução: Nada espero senão de mim mesmo.

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Quis audet? Corpo da divisa: Leão num circo Alma da divisa: Quis audet? = Quem ousará? Aquele que não ousa não vencerá (quis audet vincit = provérbio latino, correspondente a outro: vincit quis audet = o vencedor é aquele que ousa). Juvenal (Sátiras, XII, 48-49): “Mas onde encontrar ainda um mortal que deseje comprar a sua salvação em troca de todos os seus bens?” Divisa inspirada em 2 Corintios XI, 21 (Vulgata) e Genesis XLIX, 9 (todo o versículo se reporta ao Messias = Judá é como um leão ainda novo. Tu te levantaste meu filho, para roubares a presa. E quando descansavas, estiveste deitado como um leão em sua casa. Quem se atreverá a despertá-lo?) Leitura de Domingo de Sexagésima (Domingo Magro, 8º domingo, ou 56º dia antes da Páscoa) Ocorre em: Nicolas Verrien (Recueil d’Emblémes, devises, medailles et figures Hieroglyphiques, Paris, 1696, prancha L, n. 8), numa medalha em ouro de AACM, etc.

Vinheta alusiva a Genesis XLIX, do frontispício do tomo I da Bibliotheque des Philosophes Chymiques (Paris, 1672) [BPNM]

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Medalha em ouro de AACM. A única das 7 medalhas cuja divisa se reporta a alguém distinto do seu proprietário (3ª pessoa do singular). No verso ostenta a tradução: Quem ousará atacá-lo?

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