As emoções e o Existencialismo em \'\'Amores Perros\'\' de Alejandro González Iñarritu

May 22, 2017 | Autor: Gonçalo Gomes | Categoria: Film Studies, Emotions, Alejandro González Iñárritu
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FACULDADE DE LETRAS UNIVERSIDADE DE LISBOA

As emoções e o Existencialismo em ‘’Amores Perros’’ de Alejandro González Iñarritu Gonçalo Gomes, #47955

Docente: Professor Doutor Carlos João Correia





Da mesma maneira que Collingwood consideraria as obras de Alfred Hitchcock como algo de pura ‘’Arte de diversão’’ e não verdadeira Arte, muito provavelmente a sua opinião, no que toca ao filme que me focarei neste ensaio, seria a mesma. No entanto, tal como Hitchcock, Alejandro González Iñarritu apresenta como objetivo o despertar de determinadas emoções na plateia, soldando a metáfora e o problema do Existencialismo Humano. Amores Perros (em português poderia traduzir-se como ‘‘Amor Cão’’) é um filme de violência extrema, tanto entre pessoas como entre cães. A obra divide-se em três histórias que se encontram e misturam entre si. O cão forma um paralelo entre a vida Humana nas ruas da cidade do México, onde as pessoas são facilmente agressivas e impetuosas. A análise da obra remontou-me para a questão que já foi colocada e analisada em aula e se enquadra na disciplina de Estética e Filosofia da Arte: Não poderão o horror e a violência ser considerados como uma forma de Arte? Este ensaio pretende focar-se nas emoções e na questão existencial que Iñarritu transpôs ao público, para tal, apoiar-me-ei na obra de Nigel Warburton ‘’O Que É a Arte?’’, estudada nas aulas ao longo do semestre, usando como suporte o exemplo acerca de Alfred Hitchcock e a sua forma de Arte, tal como a análise de cenas e símbolos expostos no filme ‘’Amores Perros’’ (2000) de Alejandro González Iñarritu. Irei começar por descrever um pouco do Universo da obra, permitindo assim o melhor entendimento da mesma e a forma como esta se encaixa no tema. Algures na cidade do México, Octavio (interpretado por Gael García Bernal) é um jovem que vive com o seu irmão Ramiro (Marco Pérez), a mulher do seu irmão, Susana (Vanessa Bauche) e o seu cão Cofi. Susana é tratada de forma horrível por Ramiro, algo que não escapa à atenção de Octavio, que se encontra apaixonado pela sua cunhada. À medida que se desenrola um caso entre Octavio e Susana, o jovem cria o plano de fugir com a sua cunhada, esta hesita devido à sua falta de dinheiro. De forma a conseguir dinheiro, Octavio decide envolver-se no negócio das lutas de cães, conseguindo rapidamente muito mais do que alguma vez imaginou. No desenrolar de diversos acontecimentos, tudo resulta num terrível acidente de carro que nos remonta para a segunda história presente no filme. Na mesma, Valeria (Goya Toledo) é uma modelo de grande sucesso, cartazes enormes com fotografias suas enchem as paredes da cidade do México. Esta tem um caso com Daniel (Álvaro Guerrero), um homem com um cargo importante que deixou a sua mulher e filhos para ficar com a modelo. Após as graves lesões sofridas no acidente rodoviário, a vida de Valeria e de Daniel sofre um enorme abalo emocional, piorando quando o seu precioso e amado cão salta para um buraco no chão do seu novo apartamento, ficando preso. À medida que o



casal vai tentando salvar o cão, vão também percebendo que a carreira de Valeria, como modelo, acabou. A terceira história envolve um sem-abrigo Ex-anarquista que vive a sua vida como assassino contratado. O seu último ‘’trabalho’’, a pedido de um polícia corrupto- Leonardo (José Sefami) - consiste no assassínio do sócio e meio-irmão de Gustavo (Rodrigo Murray). El Chivo, o Ex-anarquista (Emilio Echevarría), persegue a filha Maru (Lourdes Echevarria) que abandonou durante a sua infância após ser preso devido a um golpe de Estado e sua consequente prisão. A falta de relações e afetos humanos faz com que Octavio e El Chivo se envolvam em atividades/trabalhos ilegais. Apesar das grandes quantidades de dinheiro conseguidas resultantes dessas mesmas atividades, nunca conseguem preencher o vazio emocional existente, nem a relação pretendida para as suas vidas. Medidas como estas demonstram o quão desesperado o ser Humano pode ficar para conseguir lidar com os seus problemas. Estes dois indivíduos deveriam ser encarados como vilões, sendo consequentemente moral e socialmente condenados, mas tal não acontece, nem é despertado esse sentimento no espectador. Octavio e El Chivo são na verdade pessoas com um bom coração que agem de forma errada de forma a conseguirem preencher o vazio dos relacionamentos familiares. Esta é uma das formas que Iñarritu utiliza para manipular as emoções e sentimentos da plateia. O horror (lutas de cães; assassinatos), ações que deveriam despertar ódio, causam no entanto empatia pelos personagens, fazendo mesmo a plateia ‘’torcer’’ pelos mesmos. Já aqueles que se envolvem com Octavio, os donos dos cães que lutam com Cofi, invocam o sentimento contrário, que praticando as mesmas ações que ele, esses sim, são vistos como vilões. Os criadores do filme afirmam que nenhum cão foi magoado durante a realização de Amores Perros, algo difícil de imaginar. O filme inclui cães de luta reais, e aparentemente donos reais também. Estes cenários contribuem mais uma vez para a manipulação dos sentimentos e das sensações. Nas cenas de luta entre estes animais, os planos são esquematizados de maneira a que o espectador acredite no confronto e no horror que são as lutas de cães e os maus tratos animais (ver imagem 1). Apesar de todo o sensacionalismo, o filme possui toda uma dimensão moral e existencial, com todos os personagens a dirigir-se para o seu inevitável destino, questionando-se ao longo da obra o seu lugar no Mundo. Os símbolos familiares e afetivos apresentam-se de maneira diferente para estes dois personagens. Enquanto que Octavio utiliza a mulher do irmão como seu símbolo familiar, El Chivo utiliza uma matilha de cães com a qual vive. Estes símbolos funcionam de maneira perfeita, uma vez que Susana é mal tratada pelo marido e o relacionamento com Octavio permite-lhe seguir em frente com a sua vida. El Chivo trata de cães abandonados que mais ninguém se importa nem expressa o mínimo de importância em relação aos mesmos. Apesar da estranha escolha de família, esta é feita de forma a



manter a sanidade mental dos personagens. O cão e a simbologia que o mesmo carrega representa um papel chave tanto na vida de Octavio como na de El Chivo. Por um lado, este é usado para lutas, por outro é usado para manter o contacto com o Mundo exterior. A história de Valeria carrega uma enorme simbologia ‘’canina’’. O seu cão é aquele que se encontra aprisionado por baixo do soalho do novo apartamento deste casal que começou uma nova vida. Após uma brincadeira em que Valeria arremessava uma bola, este caiu para um buraco que se encontrava no chão, ficando preso. Valeria encontrava-se ‘’aprisionada’’ numa cadeira de rodas, após um brutal acidente de carro. Toda a história gira em torno do cão que não se consegue libertar e do desespero que essa mesma prisão causa no espectador. É na verdade, um paralelismo feito à vida, ao estado e à condição a que a vida de Valeria se encontra, uma modelo que, sentada numa cadeira de rodas, vê a sua vida desmoronar-se, confrontada com um cartaz enorme, afixado em frente a sua casa, com a sua fotografia enquanto modelo de sucesso. O cão torna-se num símbolo daqueles que não olham além, neste caso, da beleza superficial (ver imagem 3). Conclui-se então que a utilização da violência e do horror são utilizados em Amores Perros como forma de manipulação dos sentimentos do espectador, despertando então sentimentos contrários. À semelhança de Hitchcock, a esquematização dos planos e a maneira como estes são filmados transmitem a ideia de violência e horror, é um brilhante retrato do cão por debaixo da pele Humana. É um jogo emocional paradoxal que nos faz questionar os nossos sentimentos e emoções, algo que Alejandro González Iñarritu pretende demonstrar, explicitando isso mesmo no próprio nome que atribuiu à obra.





Imagem 1

Imagem 2



Imagem 3

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