As FA como Vector de Política Externa

July 27, 2017 | Autor: J. Prazeres | Categoria: Defesa Nacional
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JORGE PAULO PRAZERES

A FORÇAS ARMADAS COMO VECTOR DE POLÍTICA EXTERNA

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INTRODUÇÃO À medida que a sociedade ocidental actual se desenvolve, a sua dimensão económica tende a ser cada vez mais preponderante e a dimensão militar na Política Externa dos Estados tende a ser desvalorizada. Por seu lado, a actividade diplomática e as pressões políticas desenvolvidas pelos Estados, decorrentes de jogos estratégicos e económicos, parecem ter o efeito que antigamente era conseguido quase exclusivamente pelo uso da força coerciva das armas. A abordagem ao tema do vector militar na política externa reveste-se de particular interesse, pois o momento presente é dilemático. Se, por um lado a NATO abre novos espaços geográficos para o emprego militar, por outro lado, pedem-se novas visões conceptuais para o empenhamento militar e para o seu relacionamento e envolvimento com a sociedade civil. Hoje em dia, as lições aprendidas levam-nos a reinventar velhas técnicas que a doutrina da gestão de crises revisitou sob o nome de "comprehensive approach". A prudência e a experiência permite que esta gestão seja encarada de forma integrada, considerando todas as valência disponíveis, para além da militar, para controlar os conflitos e os seus efeitos. As dimensões políticas, diplomáticas, económicas, humanitárias e até políciais ganharam relevo, fruto da sua importância efectiva e fruto também de novas formas conceptuais de se abordar a conflitualidade e toda a envolvente de segurança humana. Restará aos governos encontrar plataformas de equilíbrio que possam conjugar a vontade de emprego das Forças Armadas com os objectivos políticos estabelecidos ao nível da política externa. É necessário demonstrar capacidade, intenção e vontade de sustentar tal política. Há que verificar a coerência do nível de ambição da política externa do Estado, aferindo a credibilidade dos actores e compreendendo o investimento realizado. A metodologia no desenvolvimento deste estudo assentou numa análise teórica acerca do emprego estratégico do vector militar, usando as Forças Armadas portuguesas para o estudo de caso. Concluiu-se que restará aos governos encontrar plataformas de equilíbrio que possam conjugar três vectores: a vontade de emprego das Forças Armadas, a sua estrutura e os objectivos políticos estabelecidos ao nível da política externa. O vector militar na acção de política externa necessita de demonstrar capacidade, intenção e vontade de sustentar tal política. Neste contexto, se o Vector Militar de um Estado não for tratado com cuidado, quer pela própria estrutura militar, quer pelo poder político que o controla, poderá ele próprio tender para a irrelevância (Fiott, 2010). O mesmo será dizer que se o vector militar não estiver devidamente estruturado e implantado para assumir um lugar de

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peso nos processos de negociação e decisão política internacional poderá vir a tornarse irrisório. Este artigo será articulado em três tópicos principais: Aspectos de Segurança em que assenta a Visão Estratégica Nacional. Principais objectivos da Política Externa portuguesa. Papel das Forças Armadas portuguesas como Vector de Política Externa. ASPECTOS DE SEGURANÇA E DEFESA NA VISÃO ESTRATÉGICA NACIONAL Portugal tem construído esta Visão Estratégica pautando-se pelas referências dos grandes espaços políticos onde se insere, a NATO e a União Europeia. Isso está patente nos textos dos últimos Conceitos Estratégicos de Defesa Nacional. Como se poderá constatar, quer pela consulta do Conceito Estratégico da NATO de 2010, quer pelas declarações da Alta Representante para a Política Externa da União Europeia, Catherine Ashton, quer ainda pelo texto que descreve o Conceito Estratégico de Defesa Nacional (Portugal, 2013), as principais ameaças identificadas no espaço transatlântico, que são passíveis de afectar significativamente o espaço nacional, são: O Terrorismo Transnacional A Pirataria apoiada em Estados com fraca capacidade de controlo sobre o seu território A Proliferação das Armas de Destruição Massiva. A Criminalidade Transnacional Organizada, incluindo o trágico de pessoas, de armas e de estupefacientes. A multiplicação de Estados Frágeis, a qual se afigura como um potenciador de instabilidade e de insegurança internacional que urge mitigar. O Ciber-Terrorismo e a Ciber-Criminalidade que se constituem como ameaças identificadas que ganharam foros de protagonismo, bem como Os eventos não antropológicos e as mudanças climáticas, também estes incluídos no elenco das ameaças identificadas pela sua alta possibilidade de afectar, sem distinção, os Estados, sociedades e populações. Não obstante a procura de uma posição estratégica regional e com alcance global, a União Europeia tem alguma dificuldade em construir uma estratégia que abarque os interesses de todos os seus Estados membros (Friedman, 2013). Portugal, apesar de elaborar um documento político tentando exteriorizar uma visão estratégica para o País, não identifica claramente quem é o "outro", ou "outros" com que compete. As ameaças enunciadas são decalcadas de visões globais e regionais, apresentando uma

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baixa incidência local. São identificadas algumas vulnerabilidades que podem adquirir contornos estratégicos, mas que ainda assim se situam no domínio político, pela falta de antagonista definido e por uma talvez excessiva abrangência do problema. Apesar da falta de um "outro" antagónico estratégico declarado, Portugal insere-se numa rede de relações internacionais onde se gerem compromissos, negociações, consultas e até competições. A Constituição da República Portuguesa diz que uma das funções das Forças Armadas é satisfazer os compromissos internacionais estabelecidos pelo Poder Político. O próprio Conceito Estratégico de Defesa Nacional considera funções para as Forças Armadas, como um vector de política externa. A Política Externa de um Estado é algo de real, que obriga a uma abordagem integrada, fazendo interagir diversas áreas da actividade política nacional, considerando um ambiente de competição internacional, bem como uma estreita ligação entre a política doméstica e a os resultados que se pretendem atingir com a internacionalização dos interesses nacionais. Porém, os domínios da política externa nem sempre assumem uma lógica de "win-win", pelo que há que escolher as parcerias e alianças, há que verificar a coerência do nível de ambição da política externa do Estado, há que aferir a credibilidade dos actores, assim como é necessário compreender o investimento realizado nesta área, em função de perspectivas de um benefício marginal. No que concerne à conflitualidade actual e ao empenhamento de forças militares, politicamente, a tendência é a para a rejeição do risco e para o envolvimento apenas em conflitos de "zero baixas". A alianças permanentes tendem a ser substituídas por coligações de oportunidade, em que os interesses são geridos caso a caso e com tempo determinado. Por outro lado, a quantidade de conhecimento e de informação envolvida é tão alta que o ambiente estratégico é extremamente complexo e admite pouco amadorismo. Será neste cenário de solidariedades voláteis e de interesses nacionais ainda não diluídos em espaços comunitários mais alargados que a política externa dos Estados é jogada. Porém, tal como tem existido sintonia na percepção e determinação de ameaças no espaço transatlântico, também tem havido alguma sintonia na percepção de que a crise económica vivida tem imposto restrições aos investimentos na defesa militar. O Presidente do Conselho da União Europeia, Herman Van Rompuy, afirmava que a preservação sustentada da capacidade de produção de segurança, através de ferramentas institucionais vocacionadas para as acções de defesa nacional, tais como umas forças credíveis, eficazes e dissuasoras, tem sido reconhecido como um desafio sério aos Estados, sobretudo em tempos de austeridade financeira. Neste cenário de contenção financeira e de crise económica em que vivemos, Herman Van Rompuy tem vindo a chamar a atenção para a necessidade de repensar as Forças Armadas e para o imperativo de racionalização dos gastos com a defesa na União

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Europeia. Citando-o, é dito que, de acordo com as tendências correntes será muito difícil manter os padrões quanto a meios militares chave. Diz ainda que os cortes na Defesa não são um fenómeno novo - certamente em parte relacionados com uma percepção Pós-Guerra Fria de diminuição das ameaças. Em Portugal, o Conceito Estratégico de Defesa Nacional de 2013 também aborda esta questão de constrangimento financeiro, alertando para a necessidade de racionalizar, frisando o peso da economia no desenvolvimento de umas Forças Armadas modernas e compatíveis com os interesses do Estado. Assim, é referido que (Portugal, 2013: pp.1981-1982): "Acresce que Portugal foi obrigado a recorrer à assistência financeira internacional e a sujeitar-se a severas limitações orçamentais para os próximos anos, com impacto, designadamente, na segurança e defesa nacional". "A estratégia nacional deve definir com clareza as missões prioritárias das Forças Armadas, a escala geopolítica das prioridades do seu emprego e as capacidades necessárias. Em simultâneo, deve definir, também, as medidas de racionalização que garantam maior eficiência na aplicação dos seus meios". A racionalização mencionada insere-se num conjunto de referências identificadas quer no seio da Aliança Atlântica, quer no domínio da Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia. Dada a dificuldade em conduzir de forma autónoma e isolada de um contexto internacional, o Conceito Estratégico de Defesa Nacional reconhece que «a estratégia de alianças tem como objetivos principais defender os interesses nacionais e garantir a segurança e a defesa de Portugal, reduzir as vulnerabilidades e exercer as responsabilidades internacionais do Estado e contribuir para a realização da visão portuguesa sobre os valores constitutivos da ordem internacional» (Portugal, 2013b: 1986). Descrevendo os Fundamentos da Estratégia de Defesa Nacional, o texto do Conceito de Estratégia de Defesa Nacional refere que as missões prioritárias das Forças Armadas se inserem num quadro de áreas estratégicas de primeira importância, sendo elas as seguintes: «afirmar a sua presença no mundo, consolidar a sua inserção numa sólida rede de alianças, defender a afirmação e a credibilidade externa do Estado, valorizar as comunidades portuguesas e contribuir para a promoção da paz e da segurança internacional». Neste sentido, Portugal reconhece que «os interesses nacionais exigem uma maior coesão e solidariedade no seio da UE e da OTAN» e que deverá ser apoiado «o

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reforço da parceria estratégica entre estas duas organizações, bem como entre a Europa e os EUA» (Portugal, 2013b: 1982).Na prossecução destes valores e interesses nacionais destacam-se, na estratégia nacional, como elementos essenciais (Portugal, 2013b: 1982) a diplomacia portuguesa, para a realização da estratégia na vertente internacional, bem como as Forças Armadas portuguesas, para consolidar Portugal no seu estatuto de co-produtor de segurança internacional. Para além do atrás expresso, «o interesse de Portugal é, ainda, inseparável do fortalecimento da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).» (Portugal, 2013b: 1982). Numa perspectiva de defesa da posição internacional de Portugal, o Conceito Estratégico de Defesa Nacional preconiza ainda o reforço das "parcerias estratégicas com os Estados de Expressão Portuguesa, desenvolvendo as dimensões políticas, económicas e de segurança e defesa nesse eixo estratégico" Portugal, 2013: 1988). Em termos concretos do papel das Forças Armadas, é expresso o interesse na defesa estratégica de um alargamento das relações bilaterais e multilaterais de Segurança e Defesa, quer com a NATO e a União Europeia, quer com os Estados membros da CPLP, nomeadamente nas áreas da Cooperação Técnico-Militar e na Reforma do Sector de Segurança (Portugal, 2013: 1989).

ASPECTOS DE SEGURANÇA E DEFESA NA POLÍTICA EXTERNA NACIONAL É competência do Ministério dos Negócios Estrangeiros executar a política externa, de cooperação para o desenvolvimento e de ligação às comunidades portuguesas no mundo, devendo também coordenar as ações externas dos outros ministérios54. No que concerne à Política Externa, o Programa do XIX Governo Constitucional considera que é necessário inovar, adoptando como prioridade uma estratégia nacional baseada numa forte política económica (Portugal, 2010a). Neste domínio, os objectivos parcelares enunciados pelo Governo prendem-se com: A garantia da credibilidade externa de Portugal, A criação de condições para atracção de investimento e A tomada de medidas para recuperação económica do País.

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Cf. Portal do Governo. Informação disponível em: http://www.portugal.gov.pt/pt/osministerios/ ministerio-dos-negocios-estrangeiros/sobre-o-ministerio-dos-negociosestrangeiros.aspx [2 de Julho de 2013]

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Em todo este processo, certamente que a Economia de Defesa não poderá ser considerada como uma ferramenta despicienda. Toda esta intenção de projecção da imagem de Portugal, no que concerne à Segurança e Defesa, é formulada através do seguinte tipo de medidas programáticas (Portugal, 2010a): O estabelecimento de uma posição nacional conducente a uma afirmação de lealdade para com a Aliança Atlântica. A manutenção de uma relação privilegiada com os Estados Unidos da América. Uma disponibilidade de intervenção externa sempre condicionada ao respeito pelo Mandato das Nações Unidas. Uma atitude inserida numa demonstração de vontade de participação de Portugal na linha da frente da construção europeia. A tomada de posições internacionais que conduzam à valorização das comunidades portuguesas no estrangeiro. Uma postura atenta e disponível para acompanhar os processos de paz no Médio Oriente e de diálogo no Mediterrâneo. É também objectivo estratégico do Governo para a Política Externa o redobrar da importância do relacionamento com os países de expressão portuguesa, é um deles, considerando a relevância estratégica e económica da CPLP (Portugal, 2010a: 105). Tal como percebida para a Defesa, também em termos de Política Externa será difícil cumprir objectivos sem uma forte gestão das relações bilaterais e multilaterais (Portugal, 2010a: 106-107). «A separação rígida entre cooperação bilateral e multilateral deixou de ser sustentável, porque as ideias e as metodologias que se desenvolvem no seio do sistema multilateral condicionam e influenciam sobremaneira a cooperação que se pratica no âmbito bilateral» (Portugal, 2005: 7189). MISSÕES DAS FORÇAS ARMADAS NO DOMÍNIO DA POLÍTICA EXTERNA Em acção coordenada e coerente com as medidas preconizadas para os desideratos apontados anteriormente, o Governo afirma a pretensão nacional de profundar a participação em missões internacionais. Como objectivos estratégicos de Defesa Nacional que relacionam a defesa militar com a Política Externa, conforme expresso no Programa do XIX Governo Constitucional (Portugal, 2010a: 110-111), para Portugal surge como importante o reconhecimento do carácter estratégico do Mar, em particular no que concerne à extensão da plataforma continental nacional. Em todo o processo de política de Defesa Nacional, o reforço do relacionamento com a NATO e com as estruturas europeias com responsabilidade de implementação da

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Política Europeia de Segurança e Defesa é considerado fulcral. Neste âmbito, a participação activa nacional em missões internacionais de carácter humanitário e de manutenção da paz, quer no quadro nacional, quer no contexto das organizações internacionais onde Portugal se insere, será sempre uma peça fundamental para a condução da política de defesa. Em todo o processo de cooperação multilateral e bilateral, mais uma vez a valorização dos projectos de cooperação técnico-militar com os PALOP surge como um desiderato relevante. O Conceito Estratégico de Defesa Nacional refere a determinação de objectivos permanentes e conjunturais para serem considerados. Directamente relacionado com o emprego das Forças Armadas, sublinham-se como objectivos permanentes a «manutenção ou o restabelecimento da paz em condições que correspondam aos interesses nacionais», bem como «o fortalecimento das capacidades de coesão da comunidade nacional, de modo a que possa prevenir ou reagir pelos meios adequados a qualquer agressão ou ameaça externas» (Portugal, 2013b: 1988). Os objectivos conjunturais visam "garantir" a «valorização da vocação atlântica de Portugal» (Portugal, 2013b: 1988), consolidando a «inserção de Portugal numa rede de alianças e de parcerias estratégicas estável e coerente», incluindo a CPLP, e contribuindo para o «fortalecimento da coesão da UE e da NATO». «O desenvolvimento da capacidade para enfrentar as ameaças e riscos mais prováveis e para cumprir os compromissos internacionais, incluindo a participação relevante das Forças Armadas em missões internacionais de paz» será, certamente o objectivo nacional conjuntural de aplicação mais directa à actividade militar. Em todo este sistema de intenções é colocado como corolário o objectivo de garantir a defesa do prestígio internacional de Portugal. Dadas as prioridades estabelecidas pelo Ministério da Defesa Nacional, e não obstante a informação que consta no Conceito Estratégico de Defesa Nacional, percebe- se que as Forças Armadas estão vocacionadas para responder a quesitos colocados pelo poder político, de acordo com os recursos disponíveis em cada momento. Para além disso, a qualidade da sua acção externa concorre para a afirmação nacional no seio das alianças a que pertence, não só numa perspectiva de segurança colectiva e cooperativa, mas também na generalidade das áreas de governança inseridas num processo sistémico internacional. Considerando os conjuntos de Objectivos de Política Externa e de Defesa Nacional mencionados anteriormente, constata-se um largo leque de compatibilidade entre uns e outros. Tais compatibilidades são substancialmente visíveis ao nível dos seguintes aspectos : Estabelecimento de uma Base Tecnológica e Industrial de Defesa, Desenvolvimento da Cooperação Técnico-Militar,

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Participação nacional na Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia, Relacionamento de Portugal na NATO e no apoio ao fortalecimento das relações transatlânticas. Conforme inscrito no texto da Estratégia de Desenvolvimento da Base Tecnológica e Industrial de Defesa, aprovada em conselho de Ministros em Maio de 2010, uma das áreas de interesse mútuo entre a Política de Defesa e a Política Externa será certamente a da Economia de Defesa, sendo a criação desta Base Tecnológica e Industrial de Defesa55 um dos aspectos fundamentais para a coerência das políticas a implementar (Portugal, 2010b). Entende-se assim por «Base Tecnológica e Industrial para a Defesa», no âmbito nacional, o conjunto das empresas e das entidades do sistema científico e tecnológico nacional, públicas (incluindo capacidades orgânicas das FA) e ou privadas, com capacidade para intervir numa ou mais das etapas do ciclo de vida logístico daquele material. (Portugal, 2010: 1600). Este conjunto empresarial ligado à defesa nacional integra-se numa lógica europeia mais vasta, com a aprovação pelos Estados membros da Agência Europeia de Defesa da Estratégia para a Base Tecnológica e Industrial de Defesa Europeia. Assim, foram colocados a Portugal desafios de posicionamento e afirmação, nos planos da competitividade, competência e inovação do seu sector tecnológico e industrial no contexto internacional (Portugal, 2010: 1599). Foi considerado importante que a oferta tecnológica e industrial nacional esteja capacitada e orientada para disputar o mercado internacional, no qual se situa a componente mais substantiva das oportunidades de negócio (Portugal, 2010: 1600). O objectivo desta estratégia para a Base Tecnológica e Industrial de defesa é «prevenir a ocorrência de duplicações, de carácter não competitivo, das capacidades industriais, em particular das associadas à disponibilidade operacional dos meios militares e direccionar as políticas e actividades de investigação e desenvolvimento de defesa para o desenvolvimento das tecnologias que respondam a requisitos operacionais de médio e longo prazo. Neste campo a EMPORDEF e as empresas a ela associadas têm um importante papel a desempenhar, mas também ainda terão um longo caminho a percorrer, quer na internacionalização dos seus projectos e produtos, quer na procura dos parceiros adequados para ganhar escala e peso económico. Porém, as Forças Armadas Portuguesas, não sendo um produtor industrial de defesa, não poderão deixar de se 55 Entende-se por «Base Tecnológica e Industrial para a Defesa», no âmbito nacional, como o conjunto das empresas e das entidades do sistema científico e tecnológico nacional, públicas (incluindo capacidades orgânicas das FA) e ou privadas, com capacidade para intervir numa ou mais das etapas do ciclo de vida logístico daquele material.

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constituir com um agente e vector de marketing comercial do que é produzido em Portugal, quer por empresas portuguesas, quer no âmbito da holding de defesa nacional. As Forças Armadas terão um papel a desempenhar também neste processo como uma montra comercial do que se poderá exportar em termos de equipamentos militares. Outro aspecto referido foi o da Cooperação Técnico-Militar. Na prática, a Cooperação Técnico-Militar portuguesa tem sido materializada essencialmente em assessoria técnica, no apoio a projectos de engenharia e de formação, bem como na elaboração de suporte legislativo para a actuação das Forças Armadas. Está expresso que Portugal se deve empenhar na valorização dos programas de cooperação militares e de segurança no quadro da CPLP e estabelecer parcerias estratégicas de segurança para criar quadros de cooperação relevantes para a defesa de interesses comuns, quer seja no domínio da segurança das linhas de comunicação marítimas, quer seja na gestão de crises (Portugal, 2013b: 1987). A relevância destas parcerias centra-se na consolidação da autonomia nacional e na defesa dos interesses e dos valores nacionais numa área geográfica de interesse estratégico para Portugal. As iniciativas tomadas neste domínio são uma forma de demonstrar o empenho de Portugal na defesa da unidade do Atlântico, contribuindo para a consolidação e reforço dos vínculos entre os membros da CPLP (Portugal, 2013b: 1987). Também aqui as Forças Armadas portuguesas têm capacidade para desenvolver um trabalho de enorme qualidade, quer de forma autónoma, quer num reflexo de correcta percepção do que é o conceito de "comprehensive approach" no esforço cooperativo entre valências nacionais militares e civis. A Cooperação Técnico-Militar é uma das áreas por excelência onde as Forças Armadas portuguesas podem contribuir de forma muito relevante para as relações multilaterais e, sobretudo, bilaterais, sendo este aspecto reconhecido no texto da Visão Nacional para a Cooperação. Aqui, sempre que solicitado, um dos objectivos tem sido garantir uma eficácia acrescida nos respectivos processos de estabilização interna e de construção e consolidação dos Estados apoiados (Portugal, 2005). Para tal efeito, espera-se uma participação das Forças Armadas em apoio da capacidade dos Estados alvo de acção de cooperação para poderem garantir níveis de segurança e defesa compatíveis com os princípios da democracia, da boa governação, da transparência e do Estado de direito. Estas acções envolvem aspectos relacionados com a estruturação, regulação, gestão, financiamento e controlo do sistema de defesa (Portugal, 2005). Nesta área também as Forças Armadas portuguesas, através de elementos e equipas designadas têm dado um contributo significativo. Há que considerar as parcerias que, gradualmente, vêm sendo estabelecidas entre a União Africana, como organização regional, e outras organizações sub-regionais, por um 112

lado, e a UE e a NATO, nas quais a experiência alargada e dicotómica das Forças Armadas portuguesas é uma mais valia. Esta vantagem consubstancia-se quer por via da actividade operacional na NATO e na União Europeia, quer por via da cooperação técnico-militar já efectuada, podendo ser extremamente relevante para as entidades apoiadas e para a afirmação e visibilidade externa de Portugal (Portugal, 2005: 7185). A cooperação portuguesa está atenta a duas dimensões fundamentais de apoio à segurança humana, quer seja no domínio da protecção, quer no da conferência de autonomização (Portugal, 2005: 7185). A protecção insere-se principalmente no apoio aos civis em áreas de conflito violento, integrando abordagens alargadas civis-militares num contexto político, militar, humanitário e de desenvolvimento. A autonomização inscreve-se num processo de estabilização e de emprego em situações de pós-conflito, incluindo o apoio à reforma do sector de segurança, e ainda o reforço dos mecanismos de criação de segurança humana em «Estados frágeis», incluindo cooperação apropriada nos âmbitos da polícia e das forças armadas. Esta será uma áreas em que as Forças Armadas portuguesas poderão dar um contributo valioso. No âmbito da segurança cooperativa, as missões de reforma do sector de segurança e as parcerias estratégicas de segurança com os países da CPLP, abertas a iniciativas conjuntas no domínio da segurança interna e da defesa militar, com especial incidência no combate à criminalidade organizada, à cibercriminalidade e à segurança das rotas navais, eram também consideradas atribuições das Forças Armadas. As estas actividades há que somar os programas bilaterais de cooperação técnico-militar conduzidas por Portugal. No âmbito do apoio os processos eleitorais» (Portugal, 2005: 7187), tal como preconizado na estratégia nacional para a cooperação as Forças Armadas poderão ter um papel de relevo, se forem consideras como um instrumento de segurança local para a realização em paz de eventos dessa natureza. A estratégia para a cooperação considera ainda que a aposta no desenvolvimento dos Estados mais frágeis, em prol da paz almejada, pode concorrer para a prevenção e a gestão de conflitos, bem como para medidas de apoio à estabilidade no pós-conflito. Nesta óptica, a cooperação técnico- militar poderá apoiar a reforma das estruturas de defesa dos países parceiros (Portugal, 2005: 7187), principalmente na definição da política de defesa dos países apoiados, bem como na reorganização das forças armadas e no desenvolvimento de projectos de cooperação técnico-militar. Na prática a cooperação técnico-militar tem sido materializada em assessoria técnica, no apoio a projectos de engenharia e de formação, bem como na elaboração de suporte legislativo para a actuação das Forças Armadas. Também a formação de pessoal e o fornecimento de material e serviços são outras áreas concretas no domínio da cooperação técnico-militar (Pires, 2010: 645-647).

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Apesar do interesse estratégico de Portugal na Comunidade lusófona, é na Europa, tal como foi expresso no Conceito Estratégico de Defesa Nacional, que se centra o interesse nacional. A Política Comum de Segurança e Defesa encerra em si uma forte vontade da União Europeia de se assumir como um actor estratégico internacional de alcance regional e global. A gestão de crises assumiu-se como o figurino de referência na Europa e o factor tem vindo a perder preponderância como elemento da afirmação externa dos Estados (Pires, 2010: 643). A natureza das ameaças identificadas para o ocidente após a queda do Muro de Berlim tem empurrado a actuação das suas Forças Armadas para missões de carácter humanitário, conferindo-lhes características padrão próximas das polícias. Janowitz (1960: 33) denominou as forças envolvidas nesta nova tendência como "constabulary forces". As missões de Petersberg definem a tipologia de intervenções militares que a Europa está disposta a conduzir. O Tratado de Lisboa actualizou o seu enunciado, passando a listar as missões de Petersberg da seguinte forma: Operações conjuntas de desarmamento, Tarefas humanitárias e de recolha de cidadãos, Tarefas de assistência e de aconselhamento militar, Tarefas de manutenção de paz e de prevenção de conflito Tarefas inerentes a forças de combate em gestão de crises, incluindo o restabelecimento da paz e estabilização de pós-conflito. Assim, a participação nacional em operações no âmbito das missões europeias, segundo a configuração de Petersberg, mais do que iniciativas do foro exclusivo da Defesa Nacional, serão certamente missões de afirmação internacional de Portugal na co-produção de segurança, num contexto eminentemente de política externa. Mas o Tratado de Lisboa introduziu também outros mecanismos para promover a capacidade de segurança cooperativa europeia. Um desses mecanismos foi a formulação das Cooperações Estruturadas Permanentes, bem como outros aspectos que se julgam importantes e que estruturam a PCSD terão sido todos os concorrentes para a definição de capacidades expressas ao longo de vários acordos, desde Helsínquia até ao acordado nos Headline Goal 2010, bem como a activação de uma estrutura de orientação dos esforços de desenvolvimento das capacidades militares dos Estados membros da União Europeia materializada na Agência Europeia de Defesa (AED). A participação nestas cooperações de carácter militar, para além de trazer Portugal para um processo de inclusão europeia, daria também uma nota de capacidade e de vontade de integrar o grupo de Estados mais activos na construção da Política Comum de Segurança e Defesa da Europa. Contudo, na União Europeia as Cooperações Estruturadas Permanentes são ainda algo em estudo, não concretizado e 114

que entra em competição no mérito com outras cooperações militares de carácter bilateral mais efectivas. Outro dos aspectos tidos como relevantes para a capacidade de Segurança e Defesa europeia foi a criação dos Battlegroups europeus. O Battlegroup é uma força baseada num sistema de armas combinadas, de escalão Batalhão reforçado, podendo dispor de elementos de apoio de combate e de apoio de serviços, considerando um efectivo aproximado de 1500 militares. Esta força pode ser formada por via de uma nação enquadrante ou por uma coligação de Estados membros da UE. Os Battlegroups são um produto da actual transformação militar europeia, com vista a tornarem-se um instrumento operacional para fazer face à crises em curso (Gnesotto, 2007: 5), sendo a sua criação vista como o elemento fundamental para a materialização de uma capacidade de prontidão e resposta rápida (Council of the European Union, 2004: 3). Também aqui, a eventual participação das Forças Armadas Portuguesas nos Battlegroups europeus, mais do que uma mera iniciativa de Defesa Nacional, será certamente uma iniciativa de Política Externa, dadas as relações internacionais de afirmação da política nacional e da procura de uma posição, tão inequívoca quanto politicamente possível, que demonstre a intenção de Portugal de integrar a linha da frente para a construção de uma política de defesa europeia. É repetidamente afirmado que as missões desempenhadas pelas Forças Armadas no âmbito dos compromissos internacionais firmados pelo Estado contribuem de forma expressiva para uma política externa nacional. A participação de Portugal na primeira linha da construção europeia têm sido usados como bandeira da política externa nacional. Porém, no que concerne à Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia a participação das Forças Armadas no terreno, agora conhecida sob a expressão de "boots on the ground", tem sido inserida numa lógica de Gestão de Crises, em que o emprego das forças militares terrestres é tendencialmente preterido, valorizando-se outras valências de carácter policial gendármico e civil (Hovens e Elk, 2011) Para além do mais, até agora não foi empregue nenhum Batllegroup em gestão de crises conduzida pela União Europeia, talvez por estas formações operacionais constituírem um encargo financeiro não comportável para os Estados participantes em tais projectos, ou porque o levantamento destas forças não representa qualquer vínculo político quanto à obrigatoriedade do seu empenhamento, ou talvez porque o conceito estrutural dos Battlegroups esteja ultrapassado em relação às ambições de Política Externa da União Europeia. O mesmo se poderá pensar em relação à NATO e à vontade portuguesa de apoiar a estabilidade das relações transatlânticas. Esta vontade deverá ser materializada em

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atitude, a qual passará pelo aprontamento de forças integradas no modelo de NATO Response Forces (NRF). Outra das áreas de Política Externa passível de intervenção das Forças Armadas é a da Cooperação para o Desenvolvimento e de Ligação às Comunidades Portuguesas no mundo, sendo também considerado um objectivo não menos importante. Neste campo, a solidariedade entre Estados aliados e parceiros, bem como o apoio militar mútuo, será um dos pontos chave, para que um País como Portugal, face à sua dimensão, possa operacionalizar esta capacidade. Com o objectivo de afirmar Portugal como co-produtor de segurança internacional (Portugal, 2013b: 1990) as Forças Armadas são instadas a participar na contribuição internacional no «reforço das políticas de controlo e não-proliferação dos armamentos, das tecnologias de destruição massiva, para a prevenção e combate ao terrorismo, ao narcotráfico e a outras formas de criminalidade organizada e para a proteção do meio ambiente, para a segurança marítima e aérea e para o auxílio humanitário». Assim, o Conceito Estratégico de Defesa Nacional determina para as Forças Armadas o seguinte nível de intervenção (Portugal, 2013b: 1991): Participar em missões militares internacionais na defesa da paz e da segurança, nomeadamente no quadro das Nações Unidas, da OTAN e da UE; Participar, sempre que possível e de acordo com as nossas capacidades, em missões de ajuda de emergência, solicitadas pelas Nações Unidas; Participar em missões de reforma do sector de segurança; Estabelecer parcerias estratégicas de segurança com os países da CPLP, abertas a iniciativas conjuntas no domínio da segurança e da defesa. Incrementar a área da cooperação técnico-militar. No esforço das Forças Armadas em prol do cumprimento dos objectivos políticos atrás enunciados, actualmente Portugal está presente em 3 missões da União Europeia, 4 da NATO e 2 das Nações Unidas, fazendo um esforço tido como significativo. No âmbito da ONU, as Forças Armadas Portuguesas estão a participar na UNMIK (United Nations Interim Administration Mission in Kosovo) e na UNAMA (United Nations Assistance Mission in Afghanistan)56. A UNMIK resulta de uma missão autorizada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, ao abrigo da Resolução 1244 de 10 de Junho de 1999. Esta missão das Nações Unidas destina-se a realizar funções administrativas essenciais, bem como serviços, nas áreas diversas abrangendo a saúde, a educação, as finanças, as comunicações, a lei e a ordem. Esta missão depende do Representante Especial do Secretário-Geral, gozando de poder executivo civil investido pelo Conselho de Segurança na Resolução 1244, que garante a coordenação das organizações civis internacionais presentes no Kosovo, incluindo a OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação da Europa). Este 56

Informação disponível no Portal Web do EMGFA no sítio: http://www.emgfa.pt.

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representante especial assegura ainda a coordenação com a Missão da União Europeia para o estabelecimento do Estado de Direito no Kosovo (EULEX). Portugal participou com com Oficiais de Ligação nos anos de 2005, 2007 e 2011. A UNAMA é uma Missão de Assistência das Nações Unidas no Afeganistão autorizada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas com formalização em 28 de Março de 2002 através pelo da Resolução 1401, a fim de apoiar o Acordo de Bonn. Tem como tarefas assegurar o governo afegão para o processo de paz, prestando assistência técnica, promovendo os Direitos Humanos e assessorando para a criação de políticas para o controlo de drogas. De uma forma geral, a missão propõe-se fazer a gestão e coordenação do processo de reconstrução do Estado e de desenvolvimento do Afeganistão liderado pelas Nações Unidas. Para esta missão Portugal enviou um Oficial. Em 4 de Julho de 2013 a Presidência da República dava nota de que o Conselho Superior de Defesa nacional deu parecer favorável à presença de militares portugueses no âmbito da Missão das Nações Unidas de Estabilização Multidimensional Integrada no Mali (MINUSMA), com três militares para prestarem serviço no Estado-Maior da Força Internacional e uma Aeronave de transporte, com a respetiva tripulação e pessoal de apoio, com mandato para actuação durante três meses57. No que concerne à participação nacional em missões NATO, o EMGFA reporta a participação portuguesa em quatro missões NATO, sendo elas a Standing NATO Group1 (SNMG 1), a Operation Active Endeavour (OAE), a International Security Assistance Force (ISAF) e a Kosovo Force (KFOR)58. A participação das Forças Armadas na missão NATO SNMG 1, consubstancia-se na integração de uma força naval da NATO que tem por objectivo a realização de treino operacional combinado, bem como vistas diplomáticas de rotina, operando essencialmente no Leste do Atlântico mas podendo operar também noutras áreas tais como o Mediterrâneo. A participação nacional resume-se a um Oficial embarcado num navio norueguês. A operação OAE insere-se na política operacional da NATO que conduz uma campanha marítima internacional contra o terrorismo no Mediterrâneo Oriental. NO segundo semestre de 2012 participou nesta operação o submarino NRP ARPÃO, tendo participado também na operação OAE/SNMG2 até ao mês de Novembro, bem como no exercício NOBLE MARINER. A ISAF insere-se num sistema de acordos de parceria tripartida incluindo a Autoridade Transitória Afegã (ATA), a UNAMA, sendo esta missão autorizada pela Resolução 1510 do Conselho de Segurança da ONU. A representação portuguesa divide-se pelos seguintes órgãos: 57 58

Informação disponível em: http://www.presidencia.pt/?idc=10&idi=75326 Informação disponível no Portal Web do EMGFA no sítio: http://www.emgfa.pt.

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Comandante do Contingente; Unidade de Apoio (UnAp) do Contingente Nacional AT (Advisor Team) de Divisão (AT Cap Div HQ) KAIA APOD Force Protection Equipas de Formadores/Instrutores PeH Staff Advisory Team KAIA National Police Training Centre (NPTC) KAIA Transition Plan Célula de Informações Militares (CIM) Quartéis-Generais; ISAF ISAF Joint Command (IJC) NATO Training Mission-Afganistan (NTM-A) ISAF SOF (ISAF Special Operations Forces) Na KFOR Portugal mantém uma participação desde 1999. Trata-se de uma missão decorrente da Resolução 1244 da ONU de 10 de Junho de 1999, considerando um acordo técnico entre NATO e a República Federal da Jugoslávia e da Sérvia. A KFOR é uma operação de imposição da paz, tendo sido concebida para deter as hostilidades e as acções agressiva contra Kosovo por forças por parte das forças sérvias. Pretendia-se estabelecer um ambiente seguro, a desmilitarização do Exército de Libertação do Kosovo e a gestão e coordenação da acção humanitária internacional. A presença actual portuguesa cinge-se ao KTM (Kosovo Tactical Maneuver) e ao Quartel-General da KFOR (Kosovo Forces), com um efectivo de 171 militares, sendo 2 da Armadas e 169 do Exército. No domínio das missões da União Europeia e a da sua PCSD, as Forças Armadas Portuguesas estão empenhado em 3 missões, sendo elas a European Union military mission to contribute to the training of Somali security forces (EUTM SOMALIA), a European Naval Force Somalia (EUNAVFOR ATALANTA) e a European Union Training Mission in Mali (EUTM MALI)59. A missão EUTM na Somália insere-se no contexto das missões de Petersberg, visando contribuir para o reforço do Governo de Transição da Somália e para o desenvolvimento de uma Reforma do Sector de Segurança na Somália, numa óptica abrangente e sustentável. Esta missão decorre no Uganda, onde funcionam os centros de treino das forças da Somália. A missão militar da UE funcionará em estreita colaboração com as organizações regionais e sub-regionais em presença, bem como com os EUA. Portugal está envolvido nesta missão com 5 militares do Exército. A missão EUNAVFOR ATALANTA visa combater os actos de pirataria e assaltos à mão armada ao largo da costa da Somália. No contexto das Resoluções do Conselho 59

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de Segurança das Nações Unidas 1814 (2008), 1816 (2008), 1838 (2008), 1846 (2008) e 1897 (2009) a União Europeia iniciou esta operação militar onde Portugal tem participado. Os dois objectivos principais da operação ATALANTA são efectuar a proteção dos navios do PAM (Programa Alimentar Mundial) que transportam ajuda alimentar, bem como a proteção de navios de carga civis que navegam ao largo da costa da Somália. Em Março de 2013 a Fragata Alvares Cabral iniciou a sua participação na operação ATALANTA, sendo substituída em Abril do mesmo ano pela Fragata Alvares Cabral comandando esta força, com um efectivo total de 198 militares da Armada. A missão EUTM Mali surgiu após uma solicitação das autoridades do Mali face à crise humanitária, política e securitária instalada na região, e de acordo com a Resolução do Conselho das Nações Unidas no 2071. A ameaça identificada aplicou-se aos interesses estratégicos da União Europeia, colocando em risco a segurança do abastecimento energético, a salvaguarda dos direitos humanos e o combate ao tráfico de droga. De acordo com a política de vizinhança estabelecida pela União Europeia para a região do Sahel, os objectivos da missão europeia centraram-se no restabelecimento da ordem constitucional e democrática no Mali, através da implementação de um programa conducente a eleições em 2013 e à recuperação da autoridade do Estado em todo o território, respeitando a regra do direto internacional e dos direitos humanos, passando pela neutralização das ameaças terroristas e do crime organizado. A activação da missão da Uni\ao Europeia no Mali insere-se num projecto de assistência, contribuindo para a melhoria da capacidade das Forças Armadas malianas. A missão portuguesa teve iniciou Fevereiro de 2013 com o envio de um Oficial da Força Aérea para o MHQ em Bamako, prevendo-se o envio de mais 6 militares para iniciar a formação de militares do Mali. A cooperação técnico-militar bilateral conduzida por Portugal é coordenada e desenvolvida ao nível da Direção de Serviços de Cooperação Técnico-Militar do Ministério da Defesa Nacional. A Cooperação Técnico-Militar é um instrumento de política externa nacional (Portugal, 1996: 4445) e tem sido utilizado como um importante factor de firmação no mundo. Em 2012 o Secretário de Estado Adjunto e da Defesa Nacional, Paulo Braga Lino anunciava um investimento nacional de cerca de 6,1 milhões de euros nos programas de Cooperação Técnico-Militar, apesar do reconhecimento da compressão dos recursos disponíveis, defendendo, no entanto, uma presença «minimalista», como no caso da Guiné-Bissau. O programa previsto para o período até 2014 previa a formação de 36 bolseiros e 28 assessores militares,

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entre outras iniciativas. Moçambique seria o programa com maior número de projetos, sendo eles 13 nas áreas da formação da Marinha e Força Aérea60. Não obstante, o volume de forças e de pessoal empenhado não deixa de ser diminuto. Se os números forem mínimos, pelo menos que seja máxima a qualidade das pessoas e das forças empenhadas de forma a tornar visível e credível a representatividade nacional nos fora de defesa internacionais segurança cooperativa onde temos assento. A participação das Forças Armadas em política externa dá-lhes prestígio, visibilidade e reconhecimento público, contudo, tais créditos só o serão efectivamente se a actividade militar portuguesa, como vector da política externa, se ajustar com muita qualidade quer à ambição política nacional, quer ao apoio solicitado pelos aliados e parceiros em termos de uma política de segurança cooperativa ajustada. CONCLUSÕES Como conclusão posso afirmar que em termos de empenhamento nacional das Forças Armadas nos compromissos internacionais do Estado, como vector de Política Externa, os reportes generalizados indiciam que a qualidade tem sido excelente e que o reconhecimento internacional tornado público em relação às missões cumpridas por militares portugueses tem sido muito significativo (Pinto, 2010, 2011; Ramalho, 2009; Teixeira, 2008; Vicente, 2007; Pinto, 2010; et al.). Isso é muito bom e é inegável. Porém, não obstante uma Visão Estratégica e uma Visão para a Cooperação, a actividade militar no âmbito dos compromissos internacionais assumidos pelo Estado Português parece estar refém da crise económica e financeira que grassa na Europa. Parece também estar refém da posição da NATO, cada vez mais um forum de consultas e cada vez menos uma aliança produtora de força operacional, constituindose como uma referência para a interoperabilidade entre as forças e para a integração doutrinária e não como uma estrutura interveniente em campanha militar. O papel coercivo da NATO, tal como foi usado os Balcãs, está a substituído por coligações militares, temporárias e desenhadas para a cada missão em particular, tal como aconteceu no Iraque, em 2003, ou ainda presentemente no Afeganistão. Assim, para que a Aliança Atlântica seja um forum onde a afirmação nacional pode ser visível através do Vector Militar, é necessário que as Forças Armadas portuguesas se ajustem de forma a encontrarem aí um espaço credível para intervenção e afirmação internacional. A União Europeia conduz a sua política Comum de Segurança e Defesa visando uma política tendente a uma autonomização dos Estados apoiados, gerindo civilmente as 60

Informação disponível no Portal do Web do Governo em: http://www.portugal.gov.pt/pt/os-ministerios/ ministerio-da-defesa-nacional/mantenha-seatualizado/20120509-seadn-ctm.aspx.

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crises e apostando em acções de reconstrução do Estado, quer como doador e como facilitador dos processos eleitorais, quer como apoiante das Reformas dos Sectores de Justiça e de Segurança. Neste aspecto e sob um perspectiva europeia, as Forças de Segurança de carácter policial e gendármico parecem levar vantagens na sua empregabilidade sobre as forças vocacionadas para a defesa militar. No que concerne à cooperação, constata-se que as Forças Armadas Portuguesas têm potencial para dinamizar a política externa no domínio da cooperação técnico-militar. Porém, seria interessante se a economia de defesa pudesse estar presente de forma mais efectiva, de modo a que essa cooperação de carácter bilateral não aparentasse ser uma parceria de sentido único, cabendo a Portugal apenas a despesa e o investimento, com um benefício marginal líquido muito pouco visível. Face ao figurino apresentado, concluo o meu raciocínio reforçando a ideia de que Forças Armadas Portuguesas têm sido um importante vector para a consecução da Política Externa Nacional, mas que terão, elas próprias, que estar atentas à forma como essa importância poderá ser ajustada às solicitações de produção de segurança internacional, sob pena de poderem tender para um contributo exíguo e para a irrelevância, face a outros vectores complementares de gestão de crises de ordem económica, política, e diplomática, ou até de ordem policial.

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