As falácias da ideia de progresso segundo Nietzsche

July 8, 2017 | Autor: Adilson Gomes | Categoria: Modernity, Nietzsche, Teleology, Moral, Progress
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DOI: 10.4025/actascihumansoc.v33i1.9139

As falácias da ideia de progresso segundo Nietzsche Renato Nunes Bittencourt Programa de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Largo de São Francisco de Paula, 1, 20051-070, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: [email protected]

RESUMO. Apresentamos as críticas de Nietzsche ao ideário moderno de “progresso”, entendido como aprimoramento da condição humana em sua perspectiva material e moral, e de que modo tal conceito se manifestou na interpretação filosófica da história e no desenvolvimento das tecnologias modernas como uma extensão da moralidade cristã. Para Nietzsche, a ideia de progresso é uma fabulação decorrente de uma má interpretação existencial da vida, pois tal conceito não representa necessariamente desenvolvimento vital e aprimoramento das forças criativas do ser humano, significando talvez o seu declínio orgânico e um distanciamento valorativo da experiência imanente da existência. Palavras-chave: Nietzsche, progresso, teleologia, modernidade, moral.

ABSTRACT. The fallacies of the idea of progress according to Nietzsche. We present the criticisms by Nietzsche of the modern concept of “progress”, understood as an improvement in the human condition in its material and moral perspective, and of the way such concept was revealed in the philosophical interpretation of history and in the development of modern technologies as an extension of Christian morality. To Nietzsche, the idea of progress is a fable resulting from a poor existential interpretation of life, as such a concept does not necessarily represent a vital development and improvement of the creative forces of human beings, meaning perhaps their organic decline and a valuative distancing from the immanent experience of existence. Keywords: Nietzsche, progress, teleology, modernity, moral.

Introdução Nietzsche é um grande crítico da perspectiva filosófica do “progresso”, noção que acompanha o desenvolvimento histórico e ideológico da civilização judaico-cristã desde os seus primórdios, ainda que em configurações axiológicas e revestimentos argumentativos e retóricos distintos. De um modo geral, pode-se compreender a noção de “progresso” como o processo de desenvolvimento constante de uma forma de vida ou de uma determinada estrutura social em suas acepções materiais, intelectuais e, acima de tudo, morais. Conforme será visto ao longo deste texto, em diversos momentos da trajetória intelectual de Nietzsche encontram-se indicativos precisos das suas objeções ao conceito de “progresso” tal como compreendido pela vertente idealista da filosofia moderna, tanto na sua configuração kantiana como na perspectiva hegeliana. A associação entre os conceitos de “progresso” e “teleologia” (compreensão racional da finalidade ulterior de uma dada experiência ou acontecimento tendo-se por meta alcançar um objetivo transcendente) se manifesta como uma visão de mundo regida por uma orientação moral que aspira Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

ao aprimoramento da condição humana em sua trajetória ao estado de perfeição espiritual. Dessa maneira, se justifica por qual motivo a acepção moderna de “progresso” expressa grande proximidade axiológica com os princípios da moralidade cristã. Nessas condições, as críticas nietzschianas ao ideário moderno do progresso se aterão em especial aos sistemas filosóficos de Kant e de Hegel, pois Nietzsche considera haver nas obras dos citados pensadores indícios de uma submissão intelectual aos parâmetros morais cristãos. Dessa maneira, para que se compreenda o cerne dessa polêmica estabelecida por Nietzsche é conveniente que se faça, em linhas gerais, uma genealogia da consciência teleológica do pensamento ocidental pelas obras de autores que se caracterizam, no decorrer da história da filosofia, por tal direcionamento axiológico. Portanto, cabe ressaltar que será feito uso de uma metodologia investigativa que associa uma interpretação capaz de conciliar alguns aspectos da interpretação histórico-filosófica do problema do “progresso” na tradição intelectual ocidental, seja na acepção cristã de Santo Agostinho, seja nas filosofias de Kant e de Hegel, analisando assim enxertos Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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específicos das obras desses autores que porventura tratem de tal temática nos seus respectivos sistemas de pensamento. A justificativa para tal perspectiva se dá pela importância de tal problematização para o estudo rigoroso sobre o uso ideológico do conceito de “progresso” em nosso sistema de valores, e de que modo a civilização ocidental moderna não realizou de forma plena a proposta transformadora embutida nesse ideário. Teleologia da história

Uma incipiente formulação de uma compreensão filosófica da história da humanidade se encontra em “Cidade de Deus” de Santo Agostinho. Nesta obra se apresenta o antagonismo entre a “Cidade dos Homens”, marcada pela soberba, pelos vícios e pela corrupção moral, e a “Cidade de Deus”, nascida mediante a participação imediata do ser humano na glória divina, submetendo a condição humana aos desígnios superiores da Providência Divina. Conforme Santo Agostinho expressa em “A Cidade de Deus”, Livro XIV, capítulo 28: Dois amores fundaram pois, duas cidades, a saber: o amor próprio, levado ao desprezo a Deus, a terrena; o amor a Deus, levado ao desprezo de si próprio, a celestial. Gloria-se a primeira em si mesma e a Segunda em Deus, porque aquela busca a glória dos homens e tem esta por máxima glória a Deus, testemunha de sua consciência. Aquela ensoberbecese em sua glória e esta diz a seu Deus: “Sois minha glória e quem me exalta a cabeça”. Naquela, seus príncipes e as nações avassaladas vêem-se sob o jugo da concupiscência de domínio; nesta, servem em mútua caridade, os governantes, aconselhando, e os súditos, obedecendo. Aquela ama sua própria força em seus potentados; esta diz a seu Deus: “A ti hei de amar-te, Senhor, que és minha fortaleza”. Por isso, naquela, seus sábios, que vivem segundo o homem, não buscaram senão os bens do corpo, os da alma ou os de ambos e os que chegaram a conhecer Deus não o honraram nem lhe deram graças como a Deus, mas desvaneceram-se em seus pensamentos e obscureceu-se-lhes o néscio coração (AGOSTINHO, 1991, Parte II, p. 169). (Grifo do autor).

A intervenção contínua do Plano Divino mediante a ação concreta dos homens justos garantiria, no fim dos tempos, a instauração de uma era de plenitude fundamentada no altruísmo, no amor e na verdade; em suma, o “Reino de Deus” manifestado na Terra. A partir do advento do Cristianismo, o tempo se articula em passado, presente e futuro. O presente vincula-se ao passado Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

pela Paixão e Ressurreição de Cristo e também ao futuro pela Salvação e consumação do mundo no dia do Juízo Final. Pode-se considerar que é justamente a existência de uma postulada crença que se encontra latente na tese agostiniana acerca do estabelecimento da ordem divina na Terra que permite a associação desta perspectiva soteriológica com a noção de progresso como um processo de aprimoramento moral e teleológico da condição humana, pois a submissão do fiel cristão ao mandamento divino representa o itinerário da alma humana rumo à sua salvação espiritual e subseqüente possibilidade de fruir no Além-mundo a beatitude destinada àqueles que se adequaram rigorosamente aos parâmetros morais cristãos. Conforme salienta Karl Löwith sobre a questão do finalismo histórico na filosofia de Santo Agostinho, Para um homem como Santo Agostinho, todas nossas elucubrações acerca do progresso, das crises e da ordem mundial pareceriam pueris, porque, de um ponto de vista cristão, só existe um progresso: aquele dirigido a uma distinção mais marcada entre a fé e a sua ausência, entre Cristo e o Anticristo (LÖWITH, 1958, p. 243).

Há que se destacar que o ideário do “progresso” alcançou grande repercussão intelectual a partir do “Século das Luzes” e da grande efervescência cultural que acompanhou esse período de contestação do dogmatismo teológico e da arbitrariedade do poder absolutista. O projeto iluminista de supressão das superstições e da moral da ignorância se caracteriza assim como uma tentativa de se estabelecer uma nova era da humanidade, livre do obscurantismo imposto por uma autoridade teológico-política associada ao poder temporal e ao poder eclesiástico (em especial a Igreja Católica e suas práticas intolerantes contra o desenvolvimento das ciências e ao exercício dos credos religiosos distintos); essa estrutura era sustentada pela intolerância religiosa em relação aos demais credos, pela perseguição ao desenvolvimento das ciências, das artes e das atividades literárias, assim como pela inoculação do medo sobre as massas incultas que, desprovidas de acesso aos bens culturais, se encontravam imediatamente submetidas ao ideário opressor do poder. A construção da filosofia kantiana recebe influência dos debates intelectuais estabelecidos pelos principais expoentes do Iluminismo setecentista, que encontra uma das suas maiores realizações na redação da “Enciclopédia”, editada por D’Alembert e Diderot, obra coletiva que recebeu Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

As críticas de Nietzsche ao conceito de progresso

contribuições de grandes nomes filosóficos como Voltaire, Rousseau e Montesquieu. Os pensadores iluministas propunham como ideal a extensão dos princípios do conhecimento crítico aos mais importantes campos do mundo humano e de seus problemas cruciais. Cabe ressaltar que o uso do conceito de “Iluminismo” na sua forma singular justifica-se em decorrência de determinadas tendências gerais comuns a diversas vertentes denominadas como “iluministas”, em especial a ênfase na ideia de progresso e a postulação da perfectibilidade humana, assim como a defesa do conhecimento racional como meio para a superação de preconceitos morais e ideologias tradicionais; trata-se de um conceito que sintetiza diversas tradições filosóficas, sociais, políticas, correntes intelectuais e mesmo atitudes religiosas1. No espaço cultural alemão, um dos traços distintivos do Iluminismo (Aufklärung) é a atenuação do sentimento anticlerical que, por exemplo, deu a tônica ao Iluminismo francês (a título de exemplo, cabe lembrar a renomada expressão voltaireana Écrassez l’ infâme contra a instituição clerical da Igreja Católica). Kant, por conseguinte, também pode ser enquadrado entre os filósofos iluministas; inclusive, em sua obra encontramos constantes debates intelectuais com expoentes iluministas alemães como Moses Mendelssohn e Herder, circunstância que evidencia a intensidade na qual o seu sistema de pensamento partilha desse projeto cultural. Para Kant, Esclarecimento [Aufklärung] é a saída do homem de sua menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a direção de outro indivíduo. O homem é o próprio culpado dessa menoridade se a causa dele não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de decisão e coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de outrem. Sapere Aude! Tem coragem de fazer uso de teu próprio entendimento, tal é o lema do esclarecimento [Aufklärung]. A preguiça e a covardia são as causas pelas quais tão grande parte dos homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha,

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Constata-se que, na configuração da vida prática postulada por Kant, a “razão” seria a grande condutora da condição humana, favorecendo a passagem do estado de “menoridade” intelectual e existencial para o estado de “maioridade”, na qual o indivíduo desenvolveria a capacidade de pensar de forma autônoma, sem depender de influências externas das autoridades estabelecidas (a polícia, a Igreja) nas suas decisões. Em “Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita” (Segunda Proposição), Kant argumenta que, “numa criatura, a razão é a faculdade de ampliar as regras e os propósitos do uso de todas as suas forças muito além do instinto natural, e não conhece nenhum limite para seus projetos” (KANT, 2003, p. 5)2. O progresso da humanidade cuja história da espécie, por meio da cultivação, civilização e moralização pode, por um lado, se dar só por meio do uso da razão, pois apenas pelo uso dela é que o homem age segundo fins, os quais ele mesmo se coloca e dele mesmo faz um ser racionalreal; todavia, tal aperfeiçoamento supõe, por outro lado, uma tendência natural do ser humano a tornarse sempre melhor. Conforme destaca Kant em seu texto “Começo conjectural da história humana” acerca da influência exercida pela natureza no ser humano para que este aja teleologicamente: “Para esse progresso cada um é chamado pela natureza a contribuir com a parte que lhe corresponde e segundo medida de suas forças” (KANT, 2010, p. 39). No âmbito da consciência histórica, caberia ao próprio ser humano empreender o esforço para desvelar o plano secreto da natureza que conduz a sociedade paulatinamente ao estado de aperfeiçoamento contínuo das suas disposições morais; a decifração desse processo teleológico da natureza tornaria a mente ilustrada capaz de explicar o sentido, aparentemente desencontrado, das contraditórias ações humanas manifestadas no mundo ao longo do decorrer do tempo histórico. Por conseguinte, na “Ideia de uma história universal de um ponto de vista cosmopolita” Kant afirma que De um ponto de vista metafísico, qualquer que seja o conceito que se faça da liberdade da vontade, as suas manifestações – as ações humanas -, como todo outro acontecimento natural, são determinadas por leis naturais universais. A História, que se ocupa da

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Cabe destacar neste momento o fato de que um grande expoente do “Iluminismo francês”, Rousseau, manifestava reservas acerca do progresso contínuo da condição humana e da técnica como instância promotora do autêntico bem-estar humano; mais ainda, o filósofo genebrino desconfiava do pretenso poder superior da razão em relação ao âmbito da sensibilidade, considerada por ele muito mais próxima daquele que seria o estado autêntico da natureza humana, livre das convenções sociais artificiais. Todavia, Rousseau é um filósofo “iluminista” por defender a liberdade e a igualdade do homem como uma condição inata, sendo o arbítrio tirânico que suprime tais propriedades; além disso, Rousseau, no seu “Emílio” (ROUSSEAU, 2004), propõe uma reforma do sistema educacional em vigor, ao centrar as suas perspectivas pedagógicas na afirmação da individualidade do educando, mediante a assimilação de um tipo de aprendizado capaz de realçar a sua bondade natural diante da corrupção latente na vida em sociedade.

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Ao se tratar a da questão da razão enquanto instância condutora da vida em constante progresso para o aprimoramento moral em Kant torna-se imprescindível que se comente brevemente a sua compreensão sobre a razão em sua obra capital, “Crítica da Razão Pura”, B 355: “Todo o nosso conhecimento começa pelos sentidos, daí passa ao entendimento e termina na razão, acima da qual nada se encontra em nós mais elevado que elabora a matéria da intuição e a traga à mais alta unidade do pensamento” (KANT, 1989, p. 298).

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Bittencourt narrativa dessas manifestações, por mais profundamente ocultas que possam estar as suas causas, permite, todavia esperar que, com a observação, em suas linhas gerais, do jogo da liberdade da vontade humana, ela possa descobrir aí um curso regular – dessa forma, o que se mostra confuso e irregular nos sujeitos individuais poderá ser reconhecido, no conjunto da espécie, como um desenvolvimento continuamente progressivo, embora lento, das suas disposições originais (...). Os homens, enquanto indivíduos, e mesmo povos inteiros mal se dão conta de que, enquanto perseguem propósitos particulares, cada qual buscando seu próprio proveito e freqüentemente uns contra os outros, seguem inadvertidamente, como a um fio condutor, o propósito da natureza, que lhes é desconhecido, e trabalham para a sua realização, e, mesmo que conhecessem tal propósito, pouco lhes importaria (KANT, 2003, p. 4).

Pode-se perceber que, por meio dessas considerações, Kant pretendia evidenciar a existência de uma espécie de poder superior existente na natureza em relação às determinações individuais dos seres humanos, que proporcionaria empiricamente o desenvolvimento dos objetivos teleológicos da natureza, essencialmente racionais e condizentes aos planos providenciais. De acordo com Kant: “A história da natureza começa, por conseguinte, pelo bem, pois ela é obra de Deus. A história da liberdade começa pelo mal, pois ela é obra do homem” (KANT, 2010, p. 25). O homem considerado enquanto indivíduo histórico é elemento imprescindível desse empreendimento que se mobiliza em prol do desenvolvimento do progresso da racionalidade nas estruturas sociais e políticas. Conforme destaca Francisco Javier Herrero, Aos olhos de Kant, a história real da humanidade é, antes de mais nada, uma história política, porque a política é a obra das liberdades humanas unificadas pelo Direito (...) A liberdade deve realizar-se na história, isto é, deve reproduzir no mundo sensível a forma do mundo inteligível submetido à lei moral, sem prejudicar as leis próprias do mundo sensível (HERRERO, 1991, p. 146; 150).

O processo da história universal testemunharia assim o somatório de ações da humanidade na sua trajetória rumo ao estado de bem maior. Para Kant, cabe ao filósofo se tornar o intérprete mais apurado desse processo natural que conduz o gênero humano ao seu desenvolvimento progressivo: Como o filósofo não pode pressupor nos homens e seus jogos, tomados em seu conjunto, nenhum propósito racional próprio, ele não tem outra saída senão tentar descobrir, neste curso absurdo das coisas humanas, um propósito da natureza que Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

possibilite todavia uma História segundo um determinado plano da natureza para criaturas que procedem sem um plano próprio. Queremos ver se conseguimos encontrar um fio condutor para tal história e deixar ao encargo da natureza gerar o homem que esteja em condição de escrevê-la segundo este fio condutor (KANT, 2003, p. 4).

Na segunda parte de “O Conflito das Faculdades”, Kant enuncia a questão célebre: “Estará o gênero humano em constante progresso para o melhor?” (KANT, 1993, p. 95). A resposta é positiva, e Kant utiliza como justificativa a ocorrência “de um acontecimento do nosso tempo que prova esta tendência moral do gênero humano” (KANT, 1993, p. 101). Mais especificamente, o filósofo está se referindo à Revolução Francesa e sua supressão da antiga ordem política do mundo, na transição do regime monárquico para o republicano. De acordo com a perspectiva kantiana, Pode-se considerar a história da espécie humana, em seu conjunto, como a realização de um plano oculto da natureza para estabelecer uma constituição política perfeita interiormente e, quanto a este fim, também exteriormente perfeita, como o único estado no qual a natureza pode desenvolver plenamente, na humanidade, todas as suas disposições (KANT, 2003, p. 17).

Kant defende a tese de que a racionalidade que se exibe na estrutura da natureza não se encontra de forma alguma divorciada da trajetória humana na civilização, de maneira que seria do âmbito da própria razão que a humanidade progrida em direção ao seu aprimoramento no que concerne à finalidade moral da sua própria existência: “o primeiro fim da natureza seria a felicidade e o segundo a cultura do homem” (KANT, 2002a, p. 270). Isso se dá em decorrência do fato de que, segundo Kant: “Todas as disposições naturais de uma criatura estão destinadas a um dia se desenvolverem completamente conforme um fim” (KANT, 2003, p. 5). Já no âmbito da realidade sócio-política, Kant, ao postular o estabelecimento futuro de uma era de justiça, acredita que Pouco a pouco diminuirá a violência por parte dos poderosos e aumentará a docilidade quanto às leis. Haverá, porventura, na sociedade mais beneficência e menos rixas nos processos, maior confiança na palavra dada etc., quer por amor da honra, quer por interesse pessoal bem entendido; e tal estender-se-á, por fim, aos povos na sua relação externa recíproca até à sociedade cosmopolita, sem que se possa minimamente ampliar o fundamento moral no gênero humano; para isso exigir-se-ia também uma espécie de nova criação (influxo sobrenatural). (KANT, 1993, p. 109). Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

As críticas de Nietzsche ao conceito de progresso

No Prefácio de “Antropologia de um ponto de vista pragmático”, Kant apresenta ainda detalhadamente a sua compreensão sobre o processo teleológico da humanidade, salientando que Todos os progressos das civilizações, pelos quais os homens se educam, têm como fim que os conhecimentos e habilidades adquiridos sirvam para o uso do mundo, mas no mundo o objeto mais importante do qual o homem pode aplicá-los é o ser humano, porque ele é seu próprio fim último (KANT, 2006, p. 21).

Mesmo na formulação da razão prática kantiana encontramos uma evidente disposição teleológica atrelada ao projeto do ser humano realizar a ação virtuosa e postular como suporte para tal objetivo ulterior a imortalidade da alma e a existência de Deus. Por uma necessidade da própria razão prática pura, a existência do eu, ainda que apenas em sua acepção imaterial, deveria se prolongar numa realidade suprassensível, intrinsecamente livre das inclinações inferiores, a fim de que ela obtivesse o pleno aperfeiçoamento nessa dimensão inteligível. Como a santidade absoluta inexiste no mundo sensorial, e visto que ainda assim ela é necessariamente requerida como prática, ela somente pode ser encontrada, segundo Kant argumenta na “Crítica da Razão Prática” (A 220) em um progresso que avança ao infinito em direção àquela conformidade plena, se torna necessário, segundo os princípios da razão prática pura, assumir tal prosseguimento como o objeto real de nossa vontade. Entretanto, esse progresso infinito somente é possível sob a pressuposição de uma existência e personalidade do mesmo ente racional perdurável ao infinito, ou seja, a imortalidade da alma. Logo, o pretenso “sumo bem é praticamente possível somente sob a pressuposição da imortalidade da alma” (KANT, 2002b, p. 198); mais ainda, Kant argumenta que A lei moral ordena-me fazer do sumo bem possível no mundo o objeto último de toda conduta. Mas eu não posso esperar efetuar isso senão pela concordância de minha vontade com a de um santo e benévolo Autor do mundo; e conquanto no conceito de sumo bem como um todo, no qual a máxima felicidade é representada como vinculada na mais exata proporção com a máxima medida perfeição moral (possível em criaturas), a minha felicidade própria esteja também incluída, não é, contudo, ela mas a lei moral (a qual, muito antes, limita rigorosamente sob condições a minha ilimitada aspiração por ela) o fundamento determinante da vontade que é dirigida à promoção do sumo bem (KANT, 2002b, p. 209). Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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Mediante as questões presentemente expostas, pode-se dizer que no advento da modernidade as diversas elaborações de filosofias da história, ainda que tenham se emancipado relativamente do tom eclesiástico característico da concepção agostiniana, permaneceram, todavia, atreladas a uma visão moral de mundo, seja pela crença no aperfeiçoamento contínuo da humanidade rumo ao melhor mediante à postulação da existência de um mecanismo “natural” que proporcionaria a efetivação de tal resultado, seja mesmo pela permanência da tese da inteligente ação providencial no mundo humano, como Kant argumenta: “Uma tal justificação da natureza - ou melhor, da Providência – não é um motivo de pouca importância para escolher um ponto de vista particular para a consideração do mundo” (KANT, 2003, p. 21). Prosseguindo a reflexão sobre a destinação teleológica da condição humana, Kant afirma que A ideia de um fim de todas as coisas não tem origem no raciocínio sobre o curso físico das coisas no universo, porém sobre o curso moral das coisas no mundo, unicamente sendo causada por ele, este último curso só pode ser relacionado com o suprasensível (compreensível apenas na esfera da moralidade), de que é parte a ideia de eternidade (KANT, 2005a, p. 94).

Encontra-se outra importante interpretação metafísica da filosofia da história no sistema hegeliano, que considera o processo histórico como a própria ação divina no âmbito terreno: A História Universal é o processo desse desenvolvimento e do devir real do espírito no palco mutável de seus acontecimentos – eis aí a verdadeira teodicéia, a justificação de Deus na História. Só a percepção disso pode reconciliar a História Universal com a realidade: a certeza de que aquilo que aconteceu, e que acontece todos os dias, não apenas não se faz sem Deus, mas é necessariamente a Sua obra (HEGEL, 1999b, p. 373).

A história da Humanidade é a trajetória das determinações do “Absoluto”, na forma de “Espírito do Mundo”, manifestado no mundo pelas artes, da religião revelada e pela Filosofia. Em grandes linhas, o Deus hegeliano é, ao mesmo tempo, a condição de sua existência e a expressão do que ele é; o conhecimento filosófico representa a possibilidade de se compreendê-lo. Aliás, Hegel considera que o conteúdo da Filosofia e da religião [cristã] são os mesmos, a revelação da verdade, e que ambas são, cada qual a sua maneira, igualmente culto divino. No § 1 da Introdução do Vol. I da “Enciclopédia das Ciências Filosóficas em compêndio” (“A Ciência da Lógica”), Hegel afirma que Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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Bittencourt Em primeiro lugar, a filosofia tem, de fato, seus objetos em comum com a religião. As duas têm a verdade por seu objeto, decerto no sentido mais alto: no sentido de que Deus é a verdade, e só ele é a verdade. Além disso, ambas tratam do âmbito do finito, da natureza e do espírito humano; de sua relação recíproca e de sua relação com Deus, enquanto sua verdade (HEGEL, 1995, p. 39)

Nesses termos, constata-se que a Filosofia da História de matiz kantiana-hegeliana se fundamenta em dispositivos abstratos, cujas bases valorativas não são dadas em caracteres imanentes, mas em uma compreensão existencial abstrata, seja “Natureza” (na acepção kantiana) ou “Deus” – o “Absoluto” – em Hegel. Nietzsche e a negação da ideologia do progresso

Em contraponto ao ideário moderno de progresso se encontra o projeto intelectual de Nietzsche de desmistificar as valorações metafísicas subjacentes aos preceitos teleológicos da filosofia pós-iluminista. A sentença de Nietzsche enunciada no § 4 d’O Anticristo representa de forma sintética as suas objeções ao ideal moderno que postula a existência de um aprimoramento contínuo da humanidade a partir do espírito do progresso: Ao contrário do que hoje se crê, a humanidade não representa uma evolução para algo de melhor, de mais forte ou de mais elevado. O “progresso” é simplesmente uma ideia moderna, ou seja, uma ideia falsa. O europeu de hoje vale bem menos do que o europeu do Renascimento; desenvolvimento contínuo não é forçosamente elevar-se, aperfeiçoarse, fortalecer-se (NIETZSCHE, 1997, p. 17).

Pode-se indagar a quem Nietzsche pretende atingir por meio dessa crítica? De imediato, é possível elencar Kant, Hegel e a filosofia positivista. Se, porventura, o enfoque hermenêutico dessa questão for direcionado para o contexto de sua “Segunda Consideração Intempestiva”, pode-se obter um esclarecimento mais preciso acerca dessa questão. Neste ensaio, o problema do desenvolvimento da perspectiva historicista na cultura europeia do Oitocentismo se encontra intimamente associado ao credo de que a humanidade de então representava a manifestação plena do espírito de progresso. Essa ideologia apregoava tal visão de mundo em decorrência dos inúmeros avanços técnicos advindos da Revolução Industrial, que promoveu uma série de mudanças radicais na vida cotidiana da humanidade moderna. O enaltecimento do espírito do progresso proclamava a ideia de que a sociedade oitocentista se encontrava no estado máximo de plenitude, de modo que as culturas precedentes seriam inferiores Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

ao seu patamar existencial. Hegel, por exemplo, considera o mundo alemão como a realização maior da consciência humana: O espírito germânico é o espírito do mundo moderno, cujo fim é a realização da verdade absoluta como a infinita autodeterminação da liberdade, que tem por conteúdo a sua própria forma absoluta. A determinação dos povos germânicos é tornar-se sustentáculo do principio cristão (HEGEL, 1999a, p. 291).

Todavia, Nietzsche considera que essa perspectiva representa uma interpretação axiologicamente equivocada dos acontecimentos que marcavam a civilização europeia, pois esse conjunto de inovações técnicas trouxe consigo uma série de problemas para a vida do indivíduo imerso no cenário da efervescência de progresso material. Um dos principais sintomas desse conjunto de problemas que surgiram a partir de então, segundo Nietzsche, foi uma espécie de adoecimento existencial do homem moderno, o qual, obrigado a se adaptar a um novo modelo de relação de trabalho, se encontrava na necessidade de se submeter uma mudança radical no seu modo de viver, circunstância essa que se manifestava na sua degenerescência vital, no declínio das suas forças criativas. Nietzsche identifica a fonte da exaltação da ideia de “progresso” nas filosofias de Kant e de Hegel que, apesar das diferenças estilísticas e dos seus respectivos projetos intelectuais, apresentam convergências axiológicas na crença de uma ação providencial ulterior ao homem na consecução de um projeto de aprimoramento, moral e material, da condição humana; mais ainda, o positivismo, conforme a acepção de Auguste Comte, que vislumbra a instauração de um estado epistemológico destituído de valorações metafísicas, estabelece como projeto intelectual a regeneração da condição humana mediante o desenvolvimento das ciências, circunstância que influenciaria o aprimoramento técnico da realidade material da sociedade e, por conseguinte, exerceria um efeito positivo sobre a vida moral da humanidade, tornando-a “melhor” em sua acepção existencial, isto é, adequando-a intrinsecamente aos propósitos teleológicos de uma racionalidade providencial que coordena os rumos do mundo. O progresso da técnica, nessas condições, favorece o desenvolvimento das capacidades humanas de estabelecer em sua vida concreta um sistema social regido pela organização racional da sua própria infraestrutura econômica e política. Qual seria um dos grandes problemas culturais decorrentes da legitimação dessa ideologia Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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teleológica do progresso, seja na acepção kantiana, hegeliana ou positivista? A humanidade do presente seria considerada apenas um meio para a instauração de um estado melhor que surgiria na posteridade. Analisando a história das civilizações egrégias, Hegel, em sua “Filosofia da História”, identificara o contínuo aprimoramento da ideia de liberdade na consciência humana: De modo geral, há muito que as mudanças que ocorrem na História são caracterizadas igualmente como um progresso para o melhor, o mais perfeito (...). A História Universal representa, pois, a marcha gradual do princípio cujo conteúdo é a ideia de liberdade. (...) A História Universal representa a evolução da consciência do espírito no tocante à sua liberdade e à realização efetiva de tal consciência (HEGEL, 1999b, p. 53; 60)

A saga da humanidade representa o progressivo desvelamento da consciência de liberdade; tal circunstância significa que homem da Antiguidade pré-cristã seria “menor” em relação ao homem moderno, pois que este viveria no estado de liberdade plena da sua individualidade, decorrente do aprimoramento da estrutura do Estado, que encarna na Terra o ideal divino de liberdade. De acordo com a argumentação de Bernard Bourgeois, Hegel, mais do que qualquer outro, buscou entender o poder da razão, fazendo-a dominar de maneira determinada, isto é, real, o próprio campo onde parecia reinar, mais do que em qualquer outra parte, o irracional, sob a dupla forma do acaso objetivo e da arbitrariedade subjetiva, ou seja, o campo da contingência histórica (BOURGEOIS, 2004, p. 287)

Para Hegel, “a história é, de acordo com o conceito da sua liberdade, o desenvolvimento necessário dos momentos da razão, da consciência de si e da liberdade do espírito, a introdução e a realização do espírito universal” (HEGEL, 2003, p. 307). Conforme argumenta Jean Hypollite, compreender o espírito de um povo, o seu destino, não consiste em justapor singularidades históricas, mas em penetrar o seu sentido; o destino não é uma força brutal, é interioridade que se manifesta na exterioridade, revelação da vocação do indivíduo (HYPOLLITE, 1995, p. 48). Porém, de acordo com a perspectiva nietzschiana, o problema contido nessa assertiva consistia no desarraigamento do homem do presente diante do porvir, pois que a potência da sua ação seria considerada apenas um mecanismo para a realização da civilização ulterior, de maneira que ela perderia a legitimação simbólica e valorativa do presente. Como a cultura social se encontra no processo de transformação Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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contínua do devir, os seus elementos constituintes seriam continuamente aprimorados. O fator de complexidade desse problema ocorreria na tentativa de se colocar esses nomes dignos de recordação apenas como o suporte valorativo para o futuro, o que geraria então a citada perda da identidade do “homem do presente” diante do seu próprio momento histórico. Tanto pior, um dos motores desse processo de contínuo aprimoramento da civilização humana se encontraria numa esfera metafísica, na própria manifestação da Providência Divina na Terra ou ainda na crença de uma ordem natural que promove o beneplácito do ser humano, ainda que este seja incapaz de compreendê-lo em suas limitações cognitivas. Nietzsche, coerentemente com a sua proposta de desenvolvimento de uma filosofia comprometida com o processo de expansão da vida, refuta a ideia de uma “História Universal”, considerada como o resultado por excelência da ação de uma ordem providencial no âmbito do mundo concreto. Essa perspectiva vislumbra a presença, no conjunto e somatório das ações humanas desenvolvidas ao longo das civilizações, da ideia do desenvolvimento de uma racionalidade perfeita, que justificaria inclusive os momentos caóticos vividos de tempos em tempos pela humanidade, posto que tudo aquilo que acontece conduz a um estado melhor, garantido por uma inteligência universal. Nessas circunstâncias, seria a consciência limitada dos homens que impediria a compreensão da totalidade do mundo. A História Universal dedica seus esforços à crença e ao anseio pela instauração de um extraordinário estado de perfeição absoluta, capitaneada pelo espírito do progresso, que aprimoraria, no constante decorrer das eras, as sucessivas civilizações da humanidade, em nome de um estatuto divino de perfeição: “Deus governa o mundo, e o conteúdo do seu governo, a realização do seu plano, é a história universal” (HEGEL, 1999b, p. 37-38). As críticas de Nietzsche a tal ideário são uma constante em suas obras, como se pode constatar no § 357 de “A Gaia Ciência” (NIETZSCHE, 2001b, p. 256), como no § 27 da 3ª dissertação da sua “Genealogia da Moral”, em que realiza uma grande objeção à interpretação teleológica da “História para a glória de uma razão divina, como permanente testemunho de uma conduta moral de mundo e de intenções morais últimas” (NIETZSCHE, 1999b, p. 147). O motivo de tal crítica se dá pelo fato de que tal concepção reflete fortemente uma conotação moral, pois o aprimoramento do homem e da sociedade decorreria de um projeto divino a ser efetivado Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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lentamente no plano humano. De acordo com a perspectiva de Nietzsche, pode-se considerar que a consolidação dessa visão de mundo transformaria a História na causa eficiente de um processo insondável que motivaria grande estagnação das forças criadoras da sociedade, pois impediria construir e transformar o porvir, em prol da fixação e legitimação de um falso momento atual, o qual, em verdade, decorreria imediatamente de uma incontestável herança do passado. Desse modo, a noção de progresso poderia colocar em grande risco a estabilidade e o desenvolvimento das forças criadoras da cultura, por desvalorizar justamente a vida presente em prol de um futuro idealizado. Pensando em conformidade com a axiologia nietzschiana, pode-se dizer que o problema principal da perspectiva progressista consistia no fato de que ela estimulava o homem a desenvolver uma compreensão da vida no momento presente como um meio para a concretização altruísta de uma finalidade ulterior, de modo que a sociedade do presente deveria agir irrestritamente de acordo com o projeto de realização de tal objetivo, circunstância que pode ser considerada como extremamente prejudicial para a situação das forças produtivas e criativas do presente. Afinal, em nome da afirmação da ideia de um futuro – ideia essa que, devemos ressaltar, é nitidamente abstrata – a ser alcançado pela linha contínua do progresso, esse projeto acabaria por fazer com que os elementos ativos e engendradores do presente (que deveriam, nessas condições, agir incondicionalmente em prol da realização do porvir), se destituíssem de sua própria vitalidade intrínseca. Uma vez que a “cultura do presente” serviria como etapa de transição para a “cultura do futuro”, ela deixaria de consolidar o seu nome e a sua criatividade no próprio mundo, pois, de forma altruísta, todas as suas forças criativas seriam direcionadas para o aproveitamento adequado da sociedade vindoura. Conforme diz Kant na Segunda Proposição da “Idéia de uma História Universal de um ponto de vista Cosmopolita”: “No homem (única criatura racional sobre a Terra), aquelas disposições naturais que estão voltadas para o uso de sua razão devem desenvolver-se completamente apenas na espécie e não no indivíduo” (KANT, 2003, p. 5). Contudo, uma vez que a fabulosa ideia de progresso – considerado tanto no âmbito científico, como no social ou mesmo no moral – preconiza o constante aperfeiçoamento da sociedade humana rumo ao melhoramento infinito, quando essa Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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referida sociedade vindoura finalmente viesse a se tornar efetivamente presente, ela mesma também deveria, após cumprir um determinado período de tempo, fazer parte desse processo de contínua transição e transformação das suas forças intrínsecas, pois estaria inapelavelmente inserida em uma rotatividade contínua. Tal como Nietzsche destaca, “é precipitado e quase absurdo acreditar que o progresso deva necessariamente ocorrer” (NIETZSCHE, 2000, p. 33). Esse problema ocasionaria, portanto, não a concretização do ansiado estado de progresso, mas sim a anarquia e a derrocada das forças plásticas de criação, as quais, ao invés de serem utilizadas em nome da afirmação imediata dos elementos criadores constituintes do presente, seriam destinadas exclusivamente para a legitimação de uma ilusão metafísica depositada no ideal do futuro. Esse processo de contínua transformação da civilização humana decorreria, nessa perspectiva metafísica, da intervenção do plano transcendente sobre a esfera concreta, de tal modo que exclui do mundo humano uma valoração imanente, fundamentado na sua própria realidade. Nesses termos, há uma recusa nietzschiana ao postulado da ordem moral de mundo, mesmo que tal postulado se encontre, na modernidade, secularizado pela teoria do Estado como organismo ético que garante aos indivíduos a realização do bem público. Conforme pondera Nietzsche, Que significa a “ordem moral do mundo”? Que existe, de uma vez por todas, uma vontade de Deus, acerca do que o homem deve ou não fazer; que o valor de um povo, de um indivíduo, se avalia em conformidade com a sua maior ou menor obediência à vontade de Deus; que nos destinos de um povo, de um indivíduo, se revela como “dominante” a vontade de Deus, isto é, como castigando e recompensando, segundo o grau de obediência (NIETZSCHE, 1997, p. 42). (Grifo do autor).

Há que se ressaltar que Schopenhauer já apontara a gravidade da negação da “ordem moral de mundo” e o que tal ausência representa para as valorações éticas: Que o mundo possui apenas uma significação física, e nenhuma moral, constitui o maior, o mais considerável e o mais fundamental erro, a própria perversidade da mentalidade, e provavelmente forma no fundo aquilo que a fé personificou como o Anticristo (SCHOPENHAUER, 1997, p. 243).

Aproveitando ironicamente a argumentação schopenhaueriana para as implicações das críticas nietzschianas ao ideário do “progresso” como expressão de uma necessidade metafísica de Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

As críticas de Nietzsche ao conceito de progresso

manutenção do estatuto moral da existência, é curioso ressaltar que o próprio Nietzsche encarnaria em sua obra precisamente tal disposição simbólica, pois quando o filósofo versa sobre a ousadia de se criar uma “Filosofia do Anticristo” (NIETZSCHE, 1999a, p. 167), isso significa o estabelecimento de uma valoração existencial para além de bem e de mal, para além da pretensa ordem moral de mundo. Tal colocação representa a etapa do processo da “transvaloração dos valores” em que a tradição metafísica que norteou a civilização ocidental é desmascarada nas suas pretensões modernas de se considerar emancipada da influência teológica, quando em verdade apenas ocorreu uma mudança de conceitos, mas não uma mudança radical de valorações. Portanto, Nietzsche considera que a noção de progresso desenvolvida pelo historicismo idealista é terrivelmente ilusória, por pretender afirmar na ação do homem inserido na sociedade e no Estado centralizador justamente a presença de uma teleologia transcendente, cujo desenvolvimento, no entanto, raramente pode ser compreendido pelo homem comum, de consciência irrefletida, mas somente pelo homem dotado de senso histórico, capaz de desvelar os enigmas do mundo. Desse modo, as determinações metafísicas do Plano Divino dirigidas para o âmbito concreto concederiam ao mundo real a efetiva racionalidade de sua estrutura natural: “A história universal é o progresso da consciência da liberdade – um progresso cuja necessidade temos de reconhecer” (HEGEL, 1999b, p. 25). Como elucidação dessa questão, cabe lembrar a hipótese acerca da relação lógico-ontológica de identidade que haveria, na concepção de Hegel, entre o espírito da razão e a dimensão da realidade, que pode ser expressa na célebre tese contida no Prefácio dos “Princípios da Filosofia do Direito”: “o que é racional é real e o que é real é racional” (HEGEL, 2003, p. XXXVI). A Providência Divina é a garantia para que haja equivalência entre as esferas da racionalidade e da realidade. Para Hegel, após o homem individualizado trilhar o caminho do conhecimento, partindo do nível concreto para o mais puro abstrato, ele tornarse-ia plenamente capaz de conhecer a potência divina de modo imediato, pois a sua consciência teria atingido, após um longo e contínuo processo de constantes superações, o estado absoluto, tornandose apta para intuir a expressão divina a partir de sua própria essência. No § 19 do Prefácio da “Fenomenologia do Espírito” Hegel afirma que “a vida de Deus e o conhecimento divino bem podem exprimir-se como um jogo de amor consigo Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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mesmo” (HEGEL, 1999a, p. 30). A Fenomenologia do Espírito é apresentada como uma sucessão de experiências da consciência, percurso no qual é a superada a rígida cisão entre o sujeito cognoscente, independente do objeto, e o objeto a ser conhecido, apartado do sujeito; retrata-se assim o caminho da consciência que nada mais é do que uma espécie de recapitulação, por parte do indivíduo, do percurso da História Mundial, percurso esse que é recapitulado por meio do pensamento. Tal como esclarece M. L. A. Borges essa questão hegeliana, A Fenomenologia é a abstração da História Mundial, no sentido de recolher nesta os momentos mais importantes, que poderia ser tomados como necessários para que a consciência vá da sua figuração mais primitiva até o saber absoluto. A obtenção do Absoluto, enquanto saber, é feito pelo intelecto finito, através de uma sucessão de experiências de consciência (BORGES, 1998, p. 125).

A tarefa do filósofo é a de conhecer a substancialidade divina do mundo, isto é, trata-se de um reconhecimento racional operado pelo filósofo acerca de sua própria racionalidade. Nessas condições, a razão enquanto mecanismo de abstração perpassa a coleção aparentemente caótica dos eventos históricos. O filósofo os contempla não como um cientista que pretende apenas relatar eventos, mas com os olhos conceituais, desvendando seu sentido divino. Essa perspectiva metafísica, de acordo com a crítica nietzschiana, demonstrava uma grave impertinência, uma vez que retirava justamente da ação efetivada do mundo concreto o seu significado autêntico, transferida para o mundo abstrato; por outras palavras, a existência do mundo concreto decorreria da existência necessária da dimensão abstrata da Ideia, verdadeiro núcleo engendrador da força criadora do mundo. A história humana, por conseguinte, decorreria da manifestação do espírito de progresso na Terra, mediante o desenvolvimento da consciência de liberdade. Na perspectiva de Nietzsche, essa fabulosa proposta hegeliana se manifestaria como um dos maiores absurdos elaborados pelo pensamento metafísico que se vincula intrinsecamente ao idealismo do historicismo alemão, pelo fato de submeter o contingente jogo de forças da história humana a uma autoridade superior que se encontra para além deste mundo, exercendo, no entanto, o seu poder absoluto sobre a esfera empírica: Acredito que não houve nenhuma oscilação perigosa ou mudança da cultura alemã neste século que, por meio da monstruosa, e até o presente instante ininterrupta, influência desta filosofia, a filosofia Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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Bittencourt hegeliana, não tenha se tornado bem mais perigosa. Na verdade, paralisante e desanimadora é a crença em ser um filho tardio de sua época. Uma tal crença, porém, parece aterradora e dizimadora, se um dia idolatra com uma franca exaltação este filho tardio como a meta e o sentido verdadeiro de todos os acontecimentos anteriores, quando a sua miséria sapiente é equiparada a um acabamento perfeito da história do mundo. Uma tal forma de consideração acostumou os alemães a falar em “processo do mundo” e a justificar a sua própria época como o resultado necessário deste processo; uma tal forma de consideração colocou a história – na medida em que ela é “o conceito que realiza a si mesmo”, “a dialética do espírito dos povos” e o “tribunal do mundo” – no lugar dos outros poderes espirituais, a arte e a religião, como a única força soberana. Chamou-se, com escárnio, esta história compreendida hegelianamente o caminhar de Deus sobre a terra; mas um Deus criado por sua vez através da história. Todavia este Deus se tornou transparente e compreensível para si mesmo no interior da caixa craniana de Hegel e galgou todos os degraus dialeticamente possíveis de seu vir a ser até a sua auto-revelação: de modo que, para Hegel, o ponto culminante e o ponto final do processo do mundo se confundiriam com a sua própria existência berlinense (NIETZSCHE, 2003, p. 72-73). (Grifo do autor).

Essa contraposição de Nietzsche se caracteriza, sobretudo, pela radical pretensão de demolir os alicerces da perspectiva metafísica acerca do progresso histórico que se consolida através da obra de Hegel, sobretudo pela crítica à crença hegeliana de que o conteúdo da História do mundo, ou seja, o processo da ação do homem concreto no próprio mundo seria provido de um caráter absolutamente racional. Contudo, essa pretensa racionalidade no movimento histórico seria garantida pela presença da vontade divina como suprema regente desse processo, manifestando, consequentemente, a ideia de que a própria Providência Divina seria, por detrás de todos os fenômenos aparentes, a grande governadora do mundo humano, garantindo assim a instituição da plena racionalidade da História e de seu vigoroso processo de constituição e desenvolvimento no plano concreto da vida humana. Nietzsche enfatiza com tanto afinco a sua crítica ao entrelaçamento entre História e transcendência elaborado por Hegel, certamente pelo fato deste eminente pensador ter proposto a associação entre um inextricável sistema filosófico de cunho metafísico e os caracteres teleológicos da compreensão racional da dimensão divina, como possibilidade de sustentação de sua teoria da ação das forças sociais no decorrer do tempo do mundo, onde Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

“a história não é senão uma teologia disfarçada” (NIETZSCHE, 2003, p. 69). Complementando essa ideia, Gérard Lebrun considera que “na cultura histórica, a voz cristã apenas mudou de registro” (LEBRUN, 1988, p. 45). Nessas circunstâncias, a finalidade da história humana no mundo consistiria no ato de desvelar a esfera da divindade no seu âmbito mais adequado possível, mediante a participação do ser do homem na ideia da liberdade. Em contraposição a essa perspectiva idealista, a filosofia nietzschiana faz valer a tese de que a compreensão histórica deve estar comprometida essencialmente com a vida e com a possibilidade de ampliação da mesma, de modo que uma concepção metafísica, sendo caracteristicamente dicotômica e atrelada a uma dimensão moralista de aprimoramento ontológico da condição humana, tende a excluir do plano concreto, da imanência, a sua significação e importância. Portanto, o historicismo hegeliano, conforme se pode perceber segundo a perspectiva crítica de Nietzsche, nada mais seria que uma justificativa de se levar a cabo a depreciação do mundo concreto, tal como a tradição filosófica em sua axiologia metafísica, moral e transcendente o fez. Na perspectiva de Nietzsche, portanto, não existiria a noção de necessidade vinculada ao constante processo de transformação da sociedade, mas apenas contingência, pois o mundo, sendo constituído por inúmeras forças contraditórias, não se dirige a um fim estranho ao seu próprio fluxo criador. A notória influência que Nietzsche recebe de Heráclito, “filósofo da era trágica”, lhe permite enveredar a sua compreensão do tempo e da dinâmica de transformação da vida e do mundo por uma perspectiva destituída de uma visão moral de mundo marcada por uma teleologia metafísica tal como exposta por Hegel nas suas obras, contrapondo-lhe assim uma disposição lúdica e extramoral na realidade: Neste mundo, só o jogo do artista e da criança tem um vir à existência e um perecer, um construir e um destruir sem qualquer imputação moral em inocência eternamente igual. E, assim como brincam o artista e a criança, assim brinca também o fogo eternamente ativo, constrói e destrói com inocência – e esse jogo joga-o o Aion consigo mesmo. Transformando-se em água e terra, junta, como uma criança, montinhos de areia à beira-mar, constrói e derruba: de vez em quando, recomeça o jogo. Um instante de saciedade: depois, a necessidade apoderase outra vez dele, tal como a necessidade força o artista a criar. Não é a perversidade, mas o impulso do jogo sempre despertando que chama outros mundos à vida. Às vezes, a criança lança fora o Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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brinquedo: mas depressa recomeça a brincar com uma disposição inocente. Mas, logo que constrói, liga e junta as formas segundo uma lei e em conformidade com uma ordem intrínseca. (NIETZSCHE, 2002, p. 49-50)3. A perspectiva existencial que estabelece uma valoração sobre a existência por critérios amorais de modo algum pode ser considerada um evento negativo ou uma espécie de desprestígio da atividade do homem no mundo cotidiano, visto que o seu campo de ações se situa efetivamente na diversidade de possibilidades de acontecimentos e projetos, e de modo algum numa dimensão predestinada, determinada por uma consciência superior, proposta que certamente seria defendida por uma vertente influenciada por uma compreensão metafísica na elaboração de sua visão de mundo. Conforme argumenta Olivier Reboul acerca da questão enunciada por Nietzsche, O jogo divino situa o mundo mais além de toda seriedade, de toda verdade imposta, de todo juízo, mais além de bem e de mal. No princípio mesmo das coisas há uma inocência criadora ante a qual o sério e até o trágico adquirem a forma do jogo (REBOUL, 1993, p. 105).

Pode-se considerar, de acordo com a perspectiva nietzschiana, que seria justamente o caráter contingente presente na ação do homem que garantiria a sua própria liberdade criativa e as constantes modificações práticas realizadas segundo as suas conveniências particulares nas suas interações com a realidade circundante. Cabe ainda ressaltar que as críticas de Nietzsche ao conceito de progresso, tal como pressuposto pelo ideário filosófico oitocentista em sua conjugação kantiana-hegeliana, se aplica também ao pensamento positivista apregoado por Comte. Segundo a sua teoria, a humanidade viveria uma contínua evolução histórica e cultural manifestada imediatamente na criação das suas instituições. Para representar essa perspectiva, Comte lança mão da ideia dos três estados nos quais a civilização humana teria passado ao longo de sua história até o momento em que alcançara a sua culminação, situada cronologicamente na era oitocentista. O estado teológico, considerado como o ponto de partida da humanidade, se encontra associado ao estágio da infância da mesma, pois que a sua concepção de mundo refletiria uma crença na força

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Cotejemos a citação de Nietzsche com o Fragmento 52 DK de Heráclito: “O Tempo é criança brincando, jogando; de criança o reinado” (HERÁCLITO, 1997). Há que se ressaltar que Nietzsche demonstraria ainda em diversos momentos das obras confessadas afinidades axiológicas com Heráclito, em especial no Crepúsculo dos Ídolos, “A Razão na Filosofia”, § 2 (NIETZSCHE, 2006, p. 26) e Ecce Homo, “O nascimento da Tragédia”, § 3 (NIETZSCHE, 2001a, p. 64).

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sobrenatural como causa eficiente dos processos de transformação da natureza e da vida como um todo. Incapaz de compreender o mecanismo físico existente nos eventos naturais, essa concepção primitiva postula a existência de entidades divinas, consideradas como as responsáveis pela efetivação dos ciclos naturais, identificando fenômenos ou acontecimentos com determinados seres, divinizados por essa mentalidade como forma de se obter conforto diante do mundo. No estado metafísico, por sua vez, a consciência humana refinaria o seu grau de interpretação da realidade, substituindo os agentes naturais por forças abstratas parcialmente capazes de serem compreendidas pela razão. Todavia, o postulado estágio superior da humanidade seria apenas alcançado no advento do estado positivo, que substituiria a compreensão metafísica e religiosa da realidade pela interpretação científica de tudo aquilo que ocorre. Todos os acontecimentos poderiam ser reduzidos a fenômenos físicos, e estes poderiam ser explicados pela investigação científica. Conforme enunciado, Comte identificava a manifestação desse estado na civilização da era moderna, pois que esta venceu o obscurantismo da religião dogmática e da arbitrariedade do poder político através da secularização social e da queda do absolutismo. Os avanços da tecnologia somente viriam a comprovar essa tese, de modo que a humanidade de então poderia viver adequadamente imersa no usufruto do progresso. Todavia, o processo capitaneado pelo espírito positivista não conseguiu se emancipar plenamente do peso da tradição do passado metafísico, pois que o positivismo preconizada a crença no “fato” como um fenômeno justificável por si mesmo: “A explicação dos fatos, reduzida então a seus termos reais, se resume agora em diante na ligação estabelecida entre os diversos fenômenos particulares e alguns fatos gerais, cujo número o progresso da ciência tende a diminuir” (COMTE, 1996b, p. 22-23). Demolindo tal tese, Nietzsche diz em um fragmento póstumo famoso (KSA XII, 7 [60]): “Contra o positivismo, que fica no fenômeno ‘só há fatos’, eu diria: não, justamente não há fatos, só interpretações. Não podemos verificar nenhum fato “em si”: talvez seja um absurdo querer uma tal coisa” (NIETZSCHE, 1980, p. 315). Nietzsche, inclusive, atenta para o grande perigo que poderia decorrer dos efeitos da possível legitimação da proposta positivista de tornar o campo epistêmico da História similar ao do utilizado por outras ciências específicas, como as empíricas, Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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que realizam por meio de reduções epistemológicas a análise “rigorosa” de objetos e fenômenos da natureza, ou ainda as “ciências puras”, que lidam com “abstrações”: Pensada como ciência pura e tornada soberana, a História seria uma espécie de conclusão da vida e balanço final para a humanidade. A cultura histórica só é efetivamente algo salutar e frutífero para o futuro em conseqüência de uma nova e poderosa salutar corrente de vida, do vir a ser de uma nova cultura, por exemplo; portanto, só se ela é dominada e conduzida por uma força mais elevada e não quando ela domina e conduz. A História, uma vez que se encontra a serviço da vida, se encontra a serviço de um poder a-histórico, e por isto jamais, nesta hierarquia, poderá e deverá se tornar uma ciência pura, mais ou menos como o é a Matemática (NIETZSCHE, 2003, p. 17).

Conforme a ideologia oitocentista da noção de progresso, a sociedade europeia de então alcançara o patamar da civilização, pois o desenvolvimento da indústria e da tecnologia tornaria melhor o modo de vida social. De fato, é inegável que o progresso material trouxe grandes benefícios para a sociedade ocidental, mas, por outro lado, malefícios também vieram em contrapeso: poluição, agitações nos grandes centros urbanos, alteração abrupta do ritmo da vida cotidiana etc. Poder-se-ia alegar que o progresso material não se instaura sem alguns transtornos concretos, é o preço por tal realização. Porém, o que motivará as críticas nietzschianas a essa axiologia moderna se encontra no vínculo que se fez entre progresso material e progresso existencial, nas suas múltiplas acepções: desenvolvimento efetivo da cultura, fortalecimento da vitalidade humana. Por isso se torna explícita na objeção nietzschiana a tese de que o progresso, tal como alardeado pela ideologia oitocentista, não tornou “melhor” o homem, seja do ponto de vista fisiológico, pois as condições de vida e culturais das sociedades do passado (em especial as do período greco-romano e as renascentistas) foram propícias para o cultivo de uma humanidade mais vigorosa e criativa, ainda que as condições materiais não se encontrassem em níveis avançados de desenvolvimento, conforme os padrões da era moderna. A axiologia moral do “progresso” é fruto da “moralidade de rebanho”, disposição reativa contra a imanência da vida e sua contínua necessidade de autossuperação das suas limitações existenciais. Segundo Nietzsche, Quem examinar a consciência do europeu de hoje haverá de extrair, de entre mil dobras e recessos morais, sempre o mesmo imperativo, o imperativo do temor do Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

rebanho: “queremos que algum dia não haja nada mais a temer!”. Algum dia – em toda a Europa, a via e a vontade que conduzem a ele se chamam agora “progresso” (NIETZSCHE, 1999a, p. 101).

É importante ainda salientar que mesmo do ponto de vista “moral” o avanço da técnica não favoreceu o desenvolvimento da consciência ética do homem; pelo contrário, conforme as circunstâncias históricas demonstram, o poder de destruição do ser humano se amplia na medida em que se conquistam avanços tecnológicos. Mais ainda, que pretensa superioridade moral seria a que a cultura moderna proclama possuir em relação às sociedades precedentes? Conforme sentencia Nietzsche: Europeu super-orgulhoso do século dezenove, tu estás fora de ti! O teu saber não aperfeiçoa a natureza, ele apenas mortifica a tua própria natureza. Compara, pelo menos uma vez, a tua altura, como homem de conhecimento, com a tua baixeza, como homem de ação. Tu escalas em direção ao céu pelos raios do sol do saber, mas também desces rumo ao caos (NIETZSCHE, 2003, p. 77).

O preço do progresso material, desvinculado da possibilidade de haver o tão propalado “progresso moral” da condição humana, assim como também o desenvolvimento contínuo das suas forças vitais e do cuidado adequado com a natureza, se caracteriza por estabelecer um divórcio simbólico do homem em relação ao mundo circundante, criando assim uma espécie de mecanização do homem, mera peça de um sistema social que se perpetua à custa da exaustão da sua própria vitalidade: “Hybris é hoje nossa atitude para com a natureza, nossa violentação da natureza com ajuda das máquinas e da tão irrefletida inventividade dos engenheiros e técnicos” (NIETZSCHE, 1999b, p. 102). Constata-se que Nietzsche já enuncia uma importante preocupação com os projetos de exploração da natureza realizados pela moderna cultura tecnicista que, no afã de obtenção de lucro imediato, motivou perdas irreparáveis na estrutura natural do planeta. Após a era do Iluminismo, a civilização ocidental alcançou um enorme nível de secularização das suas instituições, ao menos em um âmbito aparente, pois no fundo os velhos valores dogmáticos da religiosidade cristã continuaram se perpetuando na consciência social, ainda que travestidos por conceitos materialistas. O mundo ocidental moderno é herdeiro do dístico “IgualdadeLiberdade-Fraternidade” da Revolução Francesa, que subjugou o poder real pelo uso da guilhotina, rompendo violentamente o seu vínculo com as instituições elitistas do Antigo Regime, as Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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superstições teológicas e a tirania sócio-política legitimada pela Igreja Católica sobre as massas incultas. Nesse ponto, se torna pertinente à seguinte indagação: “o que é tal dístico senão uma ideia tipicamente cristã?” Tratar-se-ia talvez de um moral cristã laicizada. Mesmo o positivismo, que brota de um projeto anticlerical, também é imbuído de uma disposição cristã, transformada no culto do progresso histórico da humanidade, que substitui a figura patriarcal de Deus; ou seja, o positivismo se sustenta a partir de uma curiosa troca de sujeitos, sem que de fato estabeleça uma valoração radical em relação ao mundo dos dogmas e das antigas crenças supersticiosas. Conforme denuncia a crítica nietzschiana: “O que se entregava outrora para a Igreja concede-se agora, mesmo que parcimoniosamente, à ciência” (NIETZSCHE, 2003, p. 69). A doutrina positivista evidencia tal ideia na criação da religião da humanidade, em que esta se torna uma espécie de ídolo, merecendo então o estabelecimento de um culto de pompa e glória tal como o serviço católico. Mesmo a ideia de “Humanidade” adquire conotações metafísicas no credo positivista, quando é caracterizada como o “conjunto dos seres humanos, passados, futuros e presentes” (COMTE, 1996a, p. 135). Em contraposição a tal perspectiva pode-se aproveitar dos esclarecedores comentários de Sánchez Meca sobre Nietzsche e sua compreensão não-teleológica da vida humana: Não há humanidade como uma totalidade unitária, não há uma evolução da humanidade como um processo contínuo que progride unitariamente. Há evolução de cada cultura interrompida freqüentemente com rupturas, descontinuidades, retrocessos, em um devir que não persegue nenhum objeto predeterminado nem obedece a nenhuma finalidade de caráter metafísico (SÁNCHEZ MECA, 2006, p. 248).

A culminação por excelência da dependência positivista pela velha tradição clerical: a formulação da Igreja Positivista idealizada por Comte, apenas um teatral travestimento da antiga estrutura eclesiástica, e no lugar dos santos os grandes nomes da cultura humana; mais ainda, o estabelecimento do credo positivista faz da “Razão” o grande ser que não é adorado “como o antigo Deus, para fazer-lhe cumprimentos, mas a fim de servi-la melhor, aperfeiçoando-nos” (COMTE, 1996a, p. 143). A religião da Humanidade possui dogmas verdadeiramente universais, fundamentados na escala enciclopédica de sete graus composta pela Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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matemática, astronomia, física, química, biologia, sociologia e moral. A fórmula sagrada do positivismo expressa o ideário moral-teleológico da doutrina: “O amor por princípio e a ordem por base; o progresso por fim” (COMTE, 1996a, p. 127). Há que se ressaltar que algumas vertentes das escolas positivistas posteriores não aceitariam essa inclinação do fundador da doutrina pela necessidade de elaboração de um culto positivista, radicalizando consideravelmente o projeto epistemológico de Comte, surgindo daí doutrinas e tendências intelectuais que inegavelmente foram influenciadas pelo discurso positivo. Entretanto, o que é a busca objetiva pelos postulados “fatos puros” senão o anseio insano de se alcançar um nível de veracidade nega a vida e as particularidades da existência? O positivismo lógico acreditou enfim ter eliminado todo resquício da metafísica em sua configuração epistemológica e disposição axiológica, mas o vislumbre por um grau de cientificidade destituído de qualquer tipo de inserção humana na elaboração de enunciados filosóficos decorre na crença de que há uma verdade puramente objetiva, acima das particularidades subjetivas. Ora, percebese mais uma vez mesmo em suas perspectivas mais tecnicistas o positivismo continuou vinculado ao espírito metafísico, ainda que tenha manifestado ideologicamente contra ele sua mais nítida repulsa. Segundo a argumentação nietzschiana, pode-se considerar a ideologia moderna do progresso como uma valoração obtusa, pelo fato de se fundamentar apenas no aprimoramento das condições materiais da sociedade, ainda que para se alcançar tal estado de desenvolvimento técnico, gerações inteiras sejam anuladas tanto simbolicamente como concretamente, tudo em nome da consecução desse estágio civilizatório rumo ao “melhor”. Por conseguinte, no ideário progressista, a vida, sob uma perspectiva individual, somente adquire importância quando ela serve de sustentação para o porvir, mediante a negação “voluntária” do seu bem-estar particular em favor da instauração de um âmbito social mais amplo e potente, que se sustenta mediante a abnegação pessoal de cada um: esse é o valor transmitido pelo espírito de progresso vigente na sociedade europeia do Oitocentismo. Em decorrência desse mecanismo ideológico, o Estado moderno insufla nas massas a submissão a um plano de valores superiores aos da mera existência comum, pois é considerado como a pretensa garantia da manutenção da liberdade, bases teóricas que Hegel já havia enunciado, servindo de sustentação para a defesa do Estado centralizador, justamente pela crença metafísica na sua Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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“divindade”: “O Estado é a ideia moral exteriorizada na vontade humana e liberdade desta” (HEGEL, 1999b, p. 45). O grande problema desse processo, conforme a interpretação de Nietzsche, é que a sociedade como um todo é axiologicamente nivelada por baixo, de modo a se prejudicar o florescimento da genialidade dos grandes homens singulares em prol de um projeto materialista negador da cultura afirmativa da vida. Para Nietzsche, A cultura e o Estado – não haja engano a respeito disso – são antagonistas: ‘Estado cultural’ é apenas uma ideia moderna. Um vive do outro, um prospera à custa do outro. Todas as grandes épocas da cultura são tempos de declínio político: o que é grande no sentido cultural é apolítico, mesmo antipolítico (NIETZSCHE, 2006, p. 58).

O desenvolvimento militar do Estado não significa o aprimoramento da cultura e o estímulo para criação dos indivíduos; pelo contrário, pode muitas vezes servir de entrave para a expansão das forças criativas dos gênios e dos povos, em decorrência da interferência de fatores extrínsecos ao modus operandi das disposições culturais dos homens a partir da inserção de interesses alheios a essa dinâmica existencial que de modo algum se deixa fixar por fatores nacionalistas ou burocráticos. Considerações finais Após esse percurso argumentativo, pode-se constatar que as críticas de Nietzsche ao ideário moderno do progresso não representam o desencanto niilista de um filósofo em relação ao declínio existencial da humanidade oitocentista, cujo projeto civilizatório teria fracassado em decorrência de seu desprendimento em relação ao cuidado em relação âmbito da natureza e a desenfreada destruição dos seus recursos em prol do estabelecimento de uma sociedade tecnicista; pelo contrário, a perspectiva nietzschiana se estabelece como uma crítica salutar ao lado “obscuro” que perpassa a realização técnica subjacente ao estado de “progresso” moderno, pois este apenas se estabeleceu no seu âmbito material, mas não em sua acepção existencial, orgânica, de modo a proporcionar rigorosamente o desenvolvimento da saúde efetiva do ser humano e a compreensão de sua unicidade fundamental com a natureza. Desse modo, pode-se dizer que não se encontram quaisquer traços de pessimismo nas colocações críticas de Nietzsche ao projeto progressista das perspectivas teleológicas das concepções idealistas das filosofias da História apresentadas no decorrer deste texto, mas a denúncia Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

de que tais visões de mundo, desprivilegiando os elementos imanentes da existência humana e suas configurações criativas na sociedade, impossibilitam a compreensão da vida humana pelo viés efetivamente capaz de ser afirmado no âmbito de uma valoração “extra-moral”, destituída de traços metafísicos. Afinal, transferindo a força singular de transformação humana da vida em sociedade para instâncias ulteriores (“Deus”, “Natureza”, “Absoluto” e “Humanidade”), as perspectivas metafísicas latentes no pensamento cristão de Santo Agostinho, assim como nas teorias de Kant e de Hegel e do positivismo de Comte, que trataram filosoficamente do percurso histórico da humanidade rumo a um acreditado estado de aprimoramento moral, acabam por projetar para uma esfera transcendente ao mundo no qual vivemos centro de gravidade da existência. Mediante a argumentação apresentada ao longo do presente escrito, se porventura houvesse na consciência moderna o adequado entendimento de que o progresso técnico deve estar imediatamente associado ao desenvolvimento da qualidade de vida do indivíduo e da sociedade, assim como da manutenção plena dos potenciais naturais, a conotação de “progresso” tal como aplicada pela perspectiva teleológica da filosofia da história sofreria uma importante modificação em sua estrutura axiológica, eliminando-se assim os preconceitos metafísicos nela embutidos que impedem uma compreensão mais precisa e imanente dos problemas concretos da existência. As críticas de Nietzsche ao conceito de “progresso” como disposição motriz no desenvolvimento da história material e espiritual da humanidade se dá por uma necessidade filosófica de se denunciar de modo enfático a fragilidade axiológica de tal ideia, pois somente pode-se considerar que há um estado de progresso genuíno quando a questão das condições da saúde humana e da manutenção da natureza se torna o foco principal da avaliação científica sobre a realidade circundante. As valorações morais dotadas de suportes metafísicos e transcendentes, justamente pelo fato de não compreenderem adequadamente a dinâmica imanente das forças vitais do mundo, são a causa básica do afastamento do homem em relação ao seu imprescindível processo interativo com a natureza, motivando assim a crise das tecnologias e a degradação das condições de vida da sociedade em todas suas acepções. Os avanços técnicos promovidos pelo estado de progresso material, desvinculados de uma consciência ética que reflita Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

As críticas de Nietzsche ao conceito de progresso

sobre o valor intrínseco da vida, certamente se arriscam a tornar o ser humano um potencial destruidor dos recursos naturais existentes na natureza. As objeções nietzschianas ao uso ideológico na noção de “progresso” empregado pela sociedade moderna já enunciam os lampejos de uma nova maneira de se relacionar com a natureza circundante, e para tanto é necessário que o indivíduo se compreenda como alguém que faz parte de um grande todo orgânico que é o âmbito natural. Inclusive, pode-se dizer que a busca contemporânea pelo estabelecimento de uma vida sustentável nasce de uma tentativa de se conciliar os benefícios materiais proporcionados pelo progresso técnico com o uso consciente dos recursos naturais. Portanto, a grande questão que se apresenta na reflexão crítica do ideário do progresso não consiste em negar a existência da tecnologia, mas em se fazer uso dela em favor do aprimoramento autêntico da qualidade de vida humana, e para tanto, se torna necessário o estabelecimento de uma experiência ética na qual o projeto moderno do progresso se associe ao rigoroso cuidado com a preservação da natureza. Referências AGOSTINHO, S. A Cidade de Deus. Parte I e II. Tradução de Oscar Paes Leme. Petrópolis: Vozes, 1991. BORGES, M. L. A. História e metafísica em Hegel – sobre a noção de espírito do mundo. Porto Alegre: Edipucrs, 1998. BOURGEOIS, B. Hegel – os atos do espírito. Tradução de Paulo Neves. São Leopoldo: Unisinos, 2004. COMTE, A. Catecismo positivista. In: COMTE, A. (Ed.). Os pensadores. Tradução de Miguel Lemos. São Paulo: Nova Cultural, 1996a. COMTE, A. Curso de filosofia positiva. In: COMTE, A. (Ed.). Os pensadores. Tradução de José Arthur Giannotti. São Paulo: Nova Cultural, 1996b. HEGEL, G. W. F. Enciclopédia das ciências filosóficas em compêndio (Vol. I – A Ciência da Lógica). Tradução de Paulo Meneses. São Paulo: Loyola, 1995. HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do espírito. Tradução de Paulo Meneses. Petrópolis: Vozes, 1999a. HEGEL, G. W. F. Filosofia da história. Tradução de Maria Rodrigues e Hans Harden. Brasília: UNB, 1999b. HEGEL, G. W. F. Princípios da filosofia do direito. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 2003. HERÁCLITO. Fragmentos. In: Os Pensadores – Os Pré-socráticos. Tradução de José Cavalcante de Souza. São Paulo: Nova Cultural, 1997. HERRERO, F. J. Religião e história em Kant. Tradução de José A. Ceschin. São Paulo: Loyola, 1991. Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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Acta Scientiarum. Human and Social Sciences

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Received on December 30, 2009. Accepted on November 3, 2010.

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Maringá, v. 33, n. 1, p. 81-96, 2011

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