AS FALÁCIAS DO MODELO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL E COMERCIAL NA AMÉRICA LATINA: DESNUDANDO OS INTERESSES DA IIRSA NA FRONTEIRA

May 26, 2017 | Autor: Davilson Cunha | Categoria: Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente, Integração econômica
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AS FALÁCIAS DO MODELO DE INTEGRAÇÃO REGIONAL E COMERCIAL NA AMÉRICA LATINA: DESNUDANDO OS INTERESSES DA IIRSA NA FRONTEIRA Davilson Marques Cunha1 Renísea Figueiredo da Silva2 Pablo Marques Silve3

Resumo Dados do IPEA/Brasil - Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas apontam que em 2006 a Amazônia brasileira possuí 62.20% de sua população pobre e indigente e 20,4% analfabeta, indicadores que determinam um cenário de grandes desigualdades sociais. Como receita para solucionar estes e outros problemas, muitos organismos internacionais apostam na adoção de uma agenda político-econômica centrada na integração comercial, como a saída para o desenvolvimento de algumas regiões pobres da América Latina inclusive da Amazônia. Desta forma, as dificuldades de transportes e infra-estrutura têm sido apontada como uma das principais barreiras para promoção do desenvolvimento na fronteira amazônica, o que tem levado os países latino-americanos à implementar programas econômicos de integração comercial visando alavancar um desenvolvimento mais eqüitativo e duradouro. A IIRSA– Iniciativa de Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana, busca desenvolver e integrar as áreas de transporte, energia e telecomunicações da América do Sul, estimulando a organização do espaço Sul-americano a partir da contigüidade geográfica, da identidade cultural, e dos valores compartidos dos países vizinhos sul-americanos”. (Fonte: www.iirsa.org). Entre as centenas de grandes projetos que formam o pacote da IIRSA, alguns se voltam para fronteira amazônica visando integrá-la ao Pacífico Sul-americano. Até que os modelos de integração econômica e comerciais podem ser considerados alternativas viáveis para o desenvolvimento das capacidades humanas das populações amazônicas? Em que medica a agenda econômica e comercial interferem positivamente na redução dos níveis de pobreza das comunidades tradicionais e do povo amazônida em geral?. Estas e outras perguntas encontram-se sem respostas e objetivamos neste estudo, debater todos estes processos estrutarantes que orbitam em torno das questões relacionadas à pobreza, integração econômica e comércio internacional.

Palavras Chave: Amazônia, IIRSA, Comercio Internacional, Interesses mercadológicos. 1.0 – A AMAZÔNIA E OS DILEMAS DO DESENVOLVIMENTO: UMA INTRODUÇÃO AO DEBATE. A Amazônia sul-americana possui aproximadamente 7,01 milhões de km2, distribuídos em nove países: Brasil, Guiana Francesa, Suriname, Guiana, Venezuela, 1

Sociólogo, Especialista em Filosofia Política e Mestre em Desenvolvimento Regional. Graduada em Serviço Social. 3 Economista e Mestre em Desenvolvimento Regional. 2

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Colômbia, Equador, Peru e Bolívia, sendo que aproximadamente 4,5 milhões de km2 em território brasileiro. Ao longo das ultimas décadas a Amazônia brasileira tem sofrido uma intensa e devastadora investida de grandes empresas e grupos multinacionais interessados em sua inestimável riqueza e biodiversidade. Este interesse tem materializado uma forma de cooperação internacional para o desenvolvimento da Amazônia criando uma importante base para reflexão acerca das políticas de integração da infra-estrutura com fins mercadológicos, e como estas estabelecem uma sintonia com a melhoria da qualidade de vida e das capacidades humanas das populações amazônicas. Dados do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – IPEA/Brasil, revelam que em 2006 a Amazônia brasileira possuía 62.20% de sua população situada nas zonas de pobreza e indigência, que somado à um índice de 20,4% de analfabetismo determinam um cenário de grandes desigualdades sociais. Esta realidade não é diferente em outros países que em decorrência de sua pouca ou nenhuma governabilidade ambiental, tem um grande desafio na construção de uma agenda que possibilite o desenvolvimento regional sustentável respeitando a dinâmica social, aspectos identitários e populações tradicionais amazônicas. No caso brasileiro, durante o regime militar (1964-1985), a Amazônia brasileira foi alvo de vários planos estratégicos de desenvolvimento e integração regional que vislumbravam sua ocupação com o lema “Integrar para não entregar”. Foi durante este período que se notou a implantação de grandes projetos estrutarantes com forte orientação desenvolvimentista na região. A partir da década de 1960, os governos brasileiros instituíram uma política de interiorização e abertura de fronteira que promoveu a ocupação e transformação econômica e territorial da Amazônia. A política adotava uma estratégia econômica e geopolítica que visava à integração econômica, política e ideológica da Amazônia, orientados por dois objetivos básicos, representados pelo binômio segurança nacional e desenvolvimento (Becker, 1990). Esta estratégia desenvolvimentista estava direcionada a interconexão física do território amazônico, por meio de uma política de transporte de produtos e arrecadação de comodites. Todavia as atividades econômicas resultantes da integração viária revelaram-se de caráter eminentemente devastadoras, como por exemplo, a exploração de madeira, minério e demais riquezas naturais. Estabelecer uma relação harmônica entre desenvolvimento e conservação dos recursos naturais na Amazônia tem-se se revelado um paradigma que o Estado brasileiro

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escorrega à várias décadas e cada vez mais sofre com a interferência do mercado. Acredita-se que a Amazônia só terá futuro com um desenvolvimento moderno. Para Castro, (2007:94), “o aproveitamento racional da região por meio de explorações econômica e ambientalmente sustentáveis depende de estratégias que combinem alta produtividade da terra e uso intensivo de mão-de-obra qualificada, pois essa forma de ocupação permite um adensamento populacional que minimize os aspectos ambientais negativos, abrindo espaço para a realização de grandes projetos que são imprescindíveis para o país”. Ainda segundo Castro (2007:95) “este processo de modernização e inserção no comercio global, tem conseqüências adversas ao interesse de governabilidade ambiental. Primeiramente pela erosão da soberania em um mundo onde a tendência geopolítica é encolher e flexibilizar as fronteiras. Outro aspecto devastador é reconhecimento de direitos especiais, associados a territórios, que pode evoluir muito rapidamente para enfraquecer ou relativizar o poder do Estado. Isso pode ocorrer em relação a terras indígenas e também por meio de uma possível legislação que pretenda reconhecer direitos de propriedade sobre a biodiversidade. A transformação da gestão política tradicional tem implicações em outros aspectos de importante dimensão interna”. Nota-se que o debate sobre desenvolvimento na região amazônica exige especial atenção, no que concerne a sua viabilidade socioambiental, especialmente quando se trata de planos integracionistas de infra-estrutura preocupados essencialmente com os resultados máximos do livre mercado como é a agenda da IIRSA, cujos interesses a cada dia mostram-se cada vez mais antagônicos ao bem estar da população da região. 2.0 A INICIATIVA DE INTEGRAÇÃO DA INFRA-ESTRUTURA REGIONAL SULAMERICANA E OS PROJETOS NA AMAZÔNIA, A IDÉIA DE INTEGRAR OU ENTREGAR?. Antes de debater o foco dos projetos da IIRSA em direção à Amazônia e como estes trazem consigo uma estratégia integracionista essencialmente mercadológica julgamos pertinente realizar - ainda que breve- uma breve reflexão sobre a perspectiva integracionista no continente sul-americano. Por sua vez, este perspectiva remonta à época pós-colonial, quando surgiram as primeiras manifestações visando a construção a unidade entre as nações recém-independentes.

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A integração defendida nesse período foi notadamente político-militar, que ocorreram vários processos independentistas no continente, estão entre os maiores defensores da integração latino-americana. Entre estas se destacou a doutrina hispanoamericanista 4 de Simon Bolívar, que buscava a formação de uma nação única, soberana e livre, como alternativa ao projeto panamericanista dos Estados Unidos. Outro movimento integracionista importante no continente foi liderado por de Artigas (Séc. XIX), cuja perspectiva da integração sul-americana, naquele momento, também mostrava-se com uma conotação de caráter político-militar. Exceto o Brasil, todos os demais países do continente sofreram colonização espanhola, que historicamente mostrou-se extremamente violenta e devastadora. É sobre este sentimento de liberdade que cimentou-se um sentimento de unidade entre as nações necessário para a conquista de sua independência. Logo a perspectiva integracionista está no DNA do continente. Entretanto, diferentemente do que ocorreu em séculos passados onde a idéia integracionista estava vinculada ao sonho de liberdade, hoje esta idéia mostrasse perigosa aos interesses nacionalistas. Atualmente o continente busca avançar no processo como alternativa para o desenvolvimento. Considerando a realidade brasileira, especialmente da integração física do território amazônico, temos a seguinte contribuição. A Amazônia foi definitivamente integrada ao restante do território brasileiro por de uma rede de estradas de rodagem. Mas, como no passado, os frutos desse desenvolvimento passaram ao largo das populações amazônidas. E os efeitos deletérios do modelo, que perdura até os dias atuais, não ficaram restritos apenas aos aspectos sociais. A desestruturação das comunidades tradicionais tapuias, quilombolas, indígenas e extrativistas ocorreu em simbiose com concentração fundiária, desmatamento, poluição industrial e urbanização desorganizada. (CASTRO, 2007, 49.).

No âmbito da IIRSA, os governos têm formado uma carteira consensual de 506 projetos de infra-estrutura de transportes, energia e comunicações, que são agrupados em 47 grupos de projetos. Além disso, os governos selecionaram um conjunto limitado de projetos de elevado impacto que estão recebendo especial atenção ao seu financiamento e execução a curto prazo (Implementação da Agenda consenso 2005 -2010). Esta “Agenda” é composta de 31 grandes projetos com investimento médio de 15 Bilhões de dólares.

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Estes projetos foram agrupados em dez “Eixos de Integração e Desenvolvimento”5, dos quais quatro estão direcionadas à Amazônia sul-americana, numa clara estratégia de integrar fisicamente o território e “entregar” ao mercado às riquezas amazônicas. Esta análise ideológica dos planos “entregacionistas6” da IIRSA buscaremos fazê-la a seguir.

3.0



A

AMAZONIA

E

A

NOVA

GEOPOLITICA

DOS

MERCADOS:

DESVENDANDO OS INTERESSES DA IIRSA.

Nos meses de agosto e setembro de 2000, a Cúpula dos Chefes de Estado da América do Sul, reuniu-se em Brasília para formação de um grande projeto visando a integração física do continente. Trata-se da IIRSA – Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana, que busca articular um amplo processo multisetorial envolvendo os setores de transporte, energia e telecomunicações da América do Sul7. O objetivo central do encontro seria “estimular a organização do espaço sul-americano a partir da contigüidade geográfica, da identidade cultural, e dos valores compartidos dos países vizinhos. Ver (www.iirsa.com). Para Senhoras e Guzzi, as iniciativas de integração da Infra-estrutura da América do Sul (IIRSA) de desenvolvimento nacional e regional teriam como objetivo basilar, segundo o discurso oficial, o aumento das capilaridades8 materiais para a chamada inserção competitiva das empresas e países na economia global, através de corredores de integração física. Para ter uma idéia da forma como se tem costurado esta agenda, julgamos oportuna a firmação de Espinosa, (2006:23) onde:

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Referencia ao termo muito utilizado nos textos oficias da IIRSA. Parafraseando a idéia de entregar e não de integrar. 7 Entre os encaminhamentos desse encontro definiu-se que o banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) elaboraria um plano estratégico para consolidação das principais metas e desafios. Desta forma, foi apresentado um estudo intitulado “Um Nuevo Ilpulso a La Integración de La Infraestrictura em America del Sur” foi apresentado pelo BID, em dezembro de 2000, este estudo “revelou” “problemas” que inibem o comércio intraregional e as alternativas para melhorar o fluxo de mercadorias. 8 Reforçada pela “necessidade” de criação de uma estrutura física geradora de benefícios “mútuos” e de solução de problemas logísticos que segundo alguns organismos internacionais, constituem-se em entraves que retardam o espaço em desenvolvimento. Na região da Amazônia e do pacifico os eixos da IIRSA teriam por objetivo melhorar a interdependência entre os países amazônico-andinos com o Brasil. 6

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“A integração da América do Sul passou a ser analisada em uma instancia de dialogo técnico e de intercambio de informação, a ser considerada como um dos objetivos essenciais da região para seu desenvolvimento sustentável. [...] Este principio básico imediatamente posicionou estrategicamente a integração física, posto que, não existe ampliação da integração econômica sem que se obtenha o fortalecimento das prestações dos serviços de transportes, comunicações e energia”

Para Senhora e Guzzi é “a partir desse referencial analítico, o discurso oficial dos eixos que recortam e integram os territórios entre a Amazônia e o Pacífico destaca a IIRSA como um formato estratégico para repensar as bases cooperativas de sustentação dos interesses nacionais da América do Sul, a partir de interconexão física de zonas interiores que reforçam as estratégias de desenvolvimento conjugadas em iniciativas multilaterais de comercio que tem base no regionalismo aberto”. Estes assinalam que:

Neste contexto de integração física, o Estado integral cede lugar a um Estado catalítico, que está constantemente compartilhando arranjos espaciais de poder, conformando uma nova dinâmica de governança nacional e internacional através das agendas do multilateralismo e do regionalismo. Portanto o desenvolvimento da IIRSA na região Amazônia e do Pacifico atenderia a uma lógica de modernização do território necessária à ampliação da circulação, etapa chave para o atual estágio do capitalismo[...] (Senhoras e Guzzi), grifo nosso.

Por isso, a Iniciativa para a Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA) ganha maior relevância para a Amazônia no desenvolvimento dos processos de integração física, das comunicações e da energia que possibilitarão aproximar os mercados amazônicos com os mercados internacionais. A articulação das ações da IIRSA verifica-se inclusive no Plano Estratégico da OTCA – Organização do Tratado de Cooperação Amazônica para 2004/2012, que ao corrobora com a visão estratégica da integração física regional”, que assinala: “..um dos desafios mais complexos para a América do Sul de 2020 é construir um novo paradigma do desenvolvimento amazônico, que na sua essência, consiste em garantir a qualidade de vida das populações amazônicas ao mesmo tempo em que conserva o patrimônio natural, a diversidade biológica e as culturas ancestrais. Assim o desenvolvimento da Infra-estrutura de integração assume um caráter mais amplo e estratégico. Demanda, em conseqüência, ações integradas e simultâneas de infra-estrutura, gestão ambiental e desenvolvimento social, apoiadas em processos de avaliação de alcance estratégicos.”

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Dos quatro eixos da IIRSA que abrangem a Amazônia, três tem sua expansão rumo ao Pacífico o que evidencia que a integração continental da América do Sul tem objetivos estratégicos de uma geopolítica, construída visando a inserção economia internacional. Segundo Senhoras e Vitte (s,d/11) os eixos Peru-Brasil-Bolívia, Amazônico e Andino buscam dois objetivos geoeconômicos sul-americanos muito claros: a expansão do continente rumo ao Pacífico e por fim mercado asiático afim de escoamento de commodities agrícolas e minerais, visando atender ao dinamismo capitalista promissor daquela região: não menos importante, destacamos o objetivo econômico de construir uma rede de infra-estrutura entre a Amazônia e o Pacífico Sul-americano visando garantir as condições de abastecimentos dos centros industriais. Mas, quais interesses de fato são objetivados com a implementação da Agenda da IIRSA?. No documento “IIRSA Integración em Riesgo” (2005), destaca-se a importância dos Estados Nacionais delegarem a sua soberania no momento de tomada de decisão sobre quais as obras publicas a serem executadas. O significado disto é que o Estado ao perder o seu poder de decisão, perde também o parlamento, as instituições, enfim a sociedade civil – no seu conjunto – o controle sobre tais projetos. É importante destacar que durante o ano de 2005, foram realizadas oficinas sobre a Visão Estratégica Sul-Americana (VESA) nos doze países sul-americanos. Devido insistentes pressões por parte a sociedade civil organizada – tendo como interlocutora a Rede Brasil sobre instituições Financeiras Multilaterais – o Brasil foi o único pais onde foi permitida a participação de ong‟s e movimentos sociais neste processo de consulta” Após cinco anos de lançamento da IIRSA comprova-se cada vez com maior segurança que a lógica da iniciativa é meramente baseada na integração física e comercial visando a exploração do patrimônio natural do continente sul-americano. Segundo Carrion e Paim, (2006:11) “as criticas que vêm sendo feitas pelos estudiosos do assunto, mantêm-se na ordem do dia; falta de transparência na condução do plano; dificuldade na obtenção de informações, ausência de participação da sociedade civil, sendo que as deliberações são restritas aos governos dos países da região, maioria das obras previstas cortam áreas ricas em sociodiversidade, entre tantos outros aspectos”. Ainda Segundo Carrion e Paim, “diferentemente do que é apresentado nos documentos oficiais, tanto das Instituições Financeiras Multilaterais, quanto dos governos a

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“estabilidade

com

crescimento

econômico,

social

e

ambientalmente

sustentável,

comprometida com a luta para a redução da pobreza e para aumentar o acesso à educação e ao emprego” (BID), não tem se efetivado conforme o recorte sintético da realidade vigente”. Da forma que vem sendo implementada, a consolidação da agenda da IIRSA constitui-se numa perigosa estratégia contra a governabilidade política e socioeconômica dos países sul-americanos. Segundo Diniz (2000:28) o conceito de governabilidade encerra três aspectos estreitamente inter-relacionados. O primeiro refere-se a capacidade do governo de identificar problemas críticos e formular políticas apropriadas para seu enfrentamento. O segundo diz respeito à capacidade governamental de mobilizar meios e recursos necessários à implementação destas políticas, enfatizando, além da tomada de decisões, problemas cruciais ligados ao processo de implementação. Em estreita conexão com este ultimo aspecto situa-se a capacidade de comando do Estado, isto é, de fazer valer suas políticas, sem a qual suas decisões tornam-se inócuas. Finalmente, dada a interdependência que caracteriza a ordem internacional na atual etapa do capitalismo, a eficácia na condução dos problemas internos não pode ser dissociada da capacidade de cada país de administrar o processo de inserção no sistema internacional. Portanto, os riscos de governabilidade devem ser avaliados não apena em seus aspetos internos, relacionados à capacidade do governo de administrar seus problemas de ordem doméstica, mas, também, em seus aspectos externos, ligados à capacidade de alcançar o equilíbrio entre ajustes interno e inserção internacional. Diniz (2000:31) Muito mais que um perigo iminente a governabilidade dos países latinoamericanos e de seus dos territórios, a IIRSA e outras iniciativas dos governos da região não contribuem para aproximar os povos da América do Sul. Ao contrário, ratifica a lógica histórica de utilizar a Amazônia como plataforma de exportação de produtos agrícolas e extrativistas criando as condições para que ocorra a devastação ambiental, desrespeitos contra povos tradicionais, principalmente indígenas, aumento da concentração da renda e queda de todos os níveis de vida para a maior parte de sua população. Percebe-se que IIRSA está voltada até a medula ao fortalecimento de instituições e dos mecanismos de mercado, estando, desta forma, em perfeita sintonia com as principais diretrizes dos organismos internacionais, confrontando-se, assim, com toda e qualquer política pública voltada ao desenvolvimento socialmente justo.

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Um aspecto merecedor de destaque, repousa sob a estratégia de desenvolvimento baseada na implementação de "cinturões de desenvolvimento" a partir dos "eixos de integração9" tende a perpetuar a fragmentação espacial do desenvolvimento, através da concentração dos investimentos públicos e privados naquelas partes dos territórios nacionais que efetivamente interessam ao grande capital por disporem de melhores condições para conectar-se ao fluxo internacional de mercadorias. Em conseqüência disso, a IIRSA tende a agravar as disparidades no interior de cada região e entre as diferentes regiões de cada país. Considerando especificamente os grandes projetos voltados para a integração física da Amazônia com outros centros, percebe-se que o foco orientador da IIRSA é o mercado internacional. Ou seja, facilitar a exploração da imensa riqueza natural da região por grandes conglomerados econômicos nacionais e internacionais com forte atuação no exterior, relegando a um plano secundário a implementação de políticas públicas para o fortalecimento do mercado interno dos nossos países e à valorização de produtos voltados ao atendimento das demandas das populações de baixa renda. Diferentemente do que apregoam os defensores da IIRSA esta não possui uma visão integral do desenvolvimento da região, muito menos do continente, posto que tal estratégia relega a um plano secundário as dimensões importantes da vida social, como os direitos humanos, o fortalecimento das instituições democráticas e o respeito à diversidade cultural, entre outras questões. Definitivamente, a IIRSA não é eco-sustentável10. Pelo contrário, o que presenciamos na Amazônia é o avanço da devastação ambiental resultante da homogeneização de atividades produtivas para atender o mercado externo. A monocultura se expande com rapidez na América do Sul, tornando mais poderosas grandes empresas de produtos químicos, por exemplo. Logo, a IIRSA não fortalece a democracia na América do Sul por não prever a adoção de qualquer mecanismo para combater as disparidades existentes entre os diferentes países. A integração econômica que se está realizando é uma integração

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Os termos “cinturões de desenvolvimento” e “eixos de integração” foram extraídos do site oficial da IIRSA http://www.iirsa.org. Todavia, estes termos já são usados em literaturas científicas há muito tempo. Por isso, há de se destacar o geógrafo Cláudio A. G. Egler como um destes autores pioneiros na utilização de tais termos. 10 A sustentabilidade do ponto de vista social, afirmada nos documentos oficiais sobre a IIRSA, é uma peça de ficção dado o aumento exponencial de excluídos (as) em nossos países, comprometendo diretamente a consolidação democrática em nosso continente.

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entre desiguais, reproduzindo em larga medida as relações assimétricas existentes entre os países capitalistas centrais e os nossos. Considerando que a formação da IIRSA é relativamente recente, que as estratégias visando a integração dos mercados internacionais remontam há mais tempo, e que os países latinoamericanos tem seu processo de inserção comercial internacional, lenta ou tardiamente, a criação da IIRSA, nada mais é que uma nova remodelagem do velho modelo da globalização. Nova remodelagem no sentido de fazer dos países latinoamericanos acreditarem que de fato são protagonistas no processo de desenvolvimento no continente a partir da integração de infra-estrutura interna no continente, e velho no sentido de trazer insistentemente em seu bojo antigas e já superadas expectativas de crescimento econômico com o livre mercado. Logo a IIRSA nada mais é do que um novo modelo de geopolítica de mercado, cujo eixos de integração direcionados à Amazônia, não passam de mega projetos voltados os interesses mercadológicos de tornar a ultima fronteira e maior reserva de recursos naturais do planeta mais acessível ao capital. Cujos impactos ambientais decorrentes de sua construção são minimizados por discursos políticos que exageram na suas potencialidades e buscam propagar a máxima da estrada como vital para o desenvolvimento da região. 4.0 - CONSIDERAÇÕES FINAIS Os verdadeiros donos da Amazônia são os indígenas, os seringueiros e as comunidades tradicionais: são eles que caçam, que pescam e que há vários séculos moram, cuidam e retiram dela seu sustento. Toda e qualquer ação realizada no sentido promover o crescimento econômico e o desenvolvimento de qualquer espécie e conseqüentemente de alterar esta harmonia, ainda que atendam a interesses estratégicos do Estado constitui-se numa violência à vida e dignidade humana do povo amazônico. (Cunha 2007).

A partir de algumas argumentações resultantes de pesquisas sobre o tema, especialmente sobre as estratégias integracionistas da IIRSA em território amazônico, podemos concluir que a agenda da IIRSA e as outras iniciativas dos governos da região não contribuem para aproximar os povos da América do Sul. Ao contrário, ratificam a lógica histórica de utilizar a América do Sul como plataforma de exportação de produtos agrícolas e extrativistas e com eles criam as condições para que se dê – vem acontecendo desde que os europeus aqui chegaram – devastação ambiental, desrespeitos contra povos tradicionais,

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principalmente indígenas, aumento da concentração da renda e queda de todos os níveis de vida para a maior parte das sociedades de nossos 12 países. É correto afirmar que o sentido da IIRSA é o mercado internacional. Ou seja, a exploração da imensa riqueza natural da Amazônia Sul-americana por grandes conglomerados econômicos nacionais e internacionais com forte atuação no exterior - como o agronegócio – deixando em segundo plano a implementação de políticas públicas para o fortalecimento do mercado interno dos nossos países e à valorização de produtos voltados ao atendimento das demandas das populações de baixa renda. Percebe-se que existe uma relação cada vez mais antagônica entre as estratégias de desenvolvimento no continente notadamente na Amazônia Sul-americana e a melhoria das condições socioeconômicas das populações da região e diferentemente do que apregoam os defensores da IIRSA esta não possui uma visão integral do desenvolvimento, posto que tal estratégia relega dimensões importantes da vida social, como os direitos humanos, o fortalecimento das instituições democráticas e o respeito à diversidade cultural, entre outras questões. BIBLIOGRAFIA AMARAL, Carlos Eduardo Pacheco 1998. “Do Estado soberano ao Estado das autonomias: regionalismo, subsidiariedade e autonomia para uma nova idéia de Estado”. Porto: Ed. Afrontamento. ARIMA, Eugenio e VERISSIMO, Alberto. 2002. “Brasil em Ação: Ameaças e Oportunidades Econômicas na Fronteira Amazônica”. Série Amazônia N° 19 - Belém: Imazon, 2002. ARRIGUI, Giovani 1994, “O longo Século XX” Tradução The Long Twentieth Century, Contraponto e Unesp, São Paulo. BECKER, Bertha. K “Significado geopolítico da Amazônia. Elementos para uma estratégia”, Em Pavan, Crodowaldo (Coord.). Uma Estratégia Latino-Americana Para A Amazônia. São Paulo, Memorial Da América Latina/Editora Da Unesp. CASTRO Edna, M. Ramos “Transformações ambientais na Amazônia: Problemas locais e desafios globais. Terra e Civilização organizador Armando Mendes, 2004. CASTRO, Márcio Henrique Monteiro de. “Amazônia - soberania e desenvolvimento sustentável”. – Brasília: Confea, 2007. 120p. – (Pensar Brasil) CUNHA, Davilson M 2007. “Estratégia para integrar ou entregar? desafios e perspectivas da Interoceânica no contexto da pobreza, integração econômica e comércio internacional. Artigo

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