As indústrias criativas do Brasil e Reino Unido: um esforço exploratório a partir dos relatórios “Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil” e A Manifesto for the Creative Economy

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As indústrias criativas do Brasil e Reino Unido: um esforço exploratório a partir dos relatórios “Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil” e A Manifesto for the Creative Economy1 Giovana Franzolin LOPES2 Pedro Santoro ZAMBON3 Juliano Maurício de CARVALHO4 RESUMO Os estudos das indústrias criativas, dentro do macro-conceito da Economia Criativa, têm como um dos principais recursos de pesquisa bibliográfica os relatórios da UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento) de 2008 e 2010. Porém, em especial no contexto da realidade brasileira e do Reino Unido, dois estudos se destacam. O relatório “Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil”, desenvolvido pela Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) em 2012, e A Manifesto for the Creative Economy, uma obra da Nesta (National Endowment for Science, Technology and the Arts), do Reino Unido, de 2013. Este trabalho tem por objetivo levantar um estudo comparativo entre os dois relatórios, ressaltando seus pontos de convergência e divergência e buscando possíveis contribuições aos estudos de Economia Criativa no Brasil. PALAVRAS-CHAVE: economia criativa; indústrias criativas; UNCTAD; Firjan; Nesta. Introdução A temática das indústrias criativas tem surgido com maior evidência na última década, fruto de uma compreensão do papel da criatividade nas cadeias produtivas e da crescente mudança conceitual de abordagem, que se distancia do conceito clássico das indústrias culturais e se aproxima de uma consideração que valoriza as cadeias criativas e suas correlações. O pioneirismo desta relação se deu na Austrália em 1994, com o lançamento do relatório Creative Nation, mas sua popularização se deu na Inglaterra quando da criação do Department of Culture, Media and Sport (DCMS), em 1997, que culminou na mudança de enfoque das políticas culturais na busca por definir e reconhecer o setor (O’CONNOR, 2007). Como consequência, surge o relatório da DCMS de 1998, que delimita as indústrias criativas como: mercado de artes e antiguidades, artesanato, design, indústria editorial, música, artes cênicas, televisão, rádio, cinema e vídeo, softwares e sistemas de informática, softwares interativos de entretenimento, publicidade, arquitetura e moda (DCMS, 1998). E quase vinte anos depois do surgimento do termo, este artigo surge com o objetivo de evidenciar e analisar de maneira comparativa dois documentos muito 1

Artigo submetido na Semana da Comunicação 2013 da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC/Unesp), campus de Bauru (SP) 2 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital da FAAC-UNESP, email [email protected] 3 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Midiática da FAAC-UNESP, email [email protected] 4 Orientador dos discentes; docente dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação Midiática e em Televisão Digital da FAAC-UNESP; coordenador do Programa de Pós-Graduação em Televisão Digital, email [email protected]

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importantes para a consolidação desta abordagem - ressaltando seus pontos de convergência e divergência e, principalmente, clarificando quais são as soluções apresentadas por eles para o desenvolvimento do setor e consequente aferição de políticas públicas. Antes de partirmos para a análise comparativa destes documentos a que nos propomos, a saber, “Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil”, desenvolvido pela Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) em 2012, e A Manifesto for the Creative Economy, uma obra da Nesta (National Endowment for Science, Technology and the Arts), se faz importante que repassemos sobre a relevância de outros dois documentos internacionais, ambos desenvolvidos pela Conferência das Nações Unidas para Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) nos anos de 2008 e 2010. Isso se deve ao fato de tais relatórios serem considerados ponto de partida para quaisquer outros estudos no que concerne às indústrias criativas e à economia criativa. Para isso, também é preciso definir este objeto de estudo “indústrias criativas” e tomaremos por base algumas definições dos próprios documentos que serão analisados. As indústrias criativas têm como concepção central a configuração de indústrias cujo insumo criativo é intrínseco ao produto. O relatório Creative Economy Report 2010 é, desde sua divulgação, material relevante para qualquer estudo referente à economia criativa. Esse novo conceito de economia, surgido em meados da década de 1990, vem ganhando proporções e destaque mundial como uma alternativa de análise às tendências econômicas, em que os bens simbólicos e não-tangíveis se apresentam como o principal diferencial para os produtos e serviços presentes neste contexto. O estudo compreende um trabalho de aferição dos setores da economia criativa, considerando dados e estudos de caso mundiais, bem como identificando tendências, oportunidades, pontos fortes e fracos do setor. Tem a intenção de atrair a atenção de agentes sociopolíticos para o potencial comercial de bens e serviços criativos, produzidos por meio de conceitos-chave como conhecimento, criatividade, cultura e tecnologia. O relatório de 2010 (A feasible development – um desenvolvimento possível) é um desdobramento do relatório original de 2008, que tinha por subtítulo the challenge of assessing the creative economy - towards informed policy-making (o desafio da avaliação da economia criativa: em direção a uma formulação de políticas públicas) e traz uma investigação próxima à realizada pelo estudo original, porém com dados atualizados e análises aprofundadas, além da consolidação de conceitos. Dentre outras questões, os materiais concluem que as indústrias criativas estão entre os setores mais dinâmicos da

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economia mundial e oferecem novas oportunidades de crescimento em especial para países em desenvolvimento. O estudo desenvolvido pelo relatório inicia com a descrição da criatividade nos setores produtivos como fruto de três categorias: artística, científica e econômica – todas elas ligadas a criatividade tecnológica, que dá suporte à inovação. Enquanto a primeira envolve imaginação e capacidade de gerar ideias originais, a segunda envolve curiosidade e capacidade de resolver problemas, enquanto a terceira esta intimamente ligada à obtenção de vantagem competitiva na economia. Nesta definição, o relatório busca estabelecer a relação da criatividade com a criação de um denominado “capital criativo”, chegando ao conceito de que a criatividade “também pode ser definida como o processo pelo qual as ideias são geradas, conectadas e transformadas em coisas que são valorizadas5” (UNCTAD, 2010, p. 04). Aprofundando esse conceito sobre as diferentes definições de indústrias criativas, surge a caracterização de que “nas indústrias criativas, a criatividade é o elemento central, sendo percebida como necessária para a geração de propriedade intelectual. De fato, parece haver uma tendência a comoditizar a criatividade, na medida em que se enfatiza seu potencial de comercialização” (BENDASSOLLI et al., 2009, p. 12). O conceito de indústrias criativas inaugurou uma vertente de pensamento em que o capital simbólico e a criatividade passaram a ser encarados como essenciais e determinantes ao desenvolvimento econômico. A UNCTAD (2010) traz como definição oficial que “a ‘economia criativa’ é um conceito em evolução baseado em ativos criativos, potencialmente gerando crescimento e desenvolvimento econômico” (UNCTAD, 2010 p.09). Para a UNCTAD, ainda, estaria inserida no âmbito das indústrias criativas “qualquer atividade econômica que gera produtos simbólicos com forte embasamento em propriedade intelectual e voltada para um mercado o mais amplo possível” (UNCTAD, 2010, p. 07). Os relatórios trazem, também, importantes dados, conceitos e definições da economia criativa, partindo de termos-chave como criatividade, bens e serviços criativos, indústrias culturais, economia da cultura e indústrias criativas, finalmente, sendo que para este último traz sua própria classificação, compreendendo quatro grupos e nove subgrupos, quais sejam: Patrimônio: * Expressões culturais tradicionais: artes e artesanato, festas e celebrações; * Sítios culturais: sítios arqueológicos, museus, bibliotecas, exposições. Artes: * Artes visuais: pintura, escultura, fotografia e antiguidades; 5

Todas as traduções são nossas.

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* Artes cênicas: música ao vivo, teatro, dança, ópera, circo, fantoches. Mídia: * Editoração e mídia impressa: livros, imprensa e outras publicações; * Audiovisuais: cinema, televisão, rádio e outros derivados da radiodifusão. Criações funcionais: * Design: de interiores, gráfico, moda, joias, brinquedos; * Novas mídias: softwares, videogames, conteúdos criativos digitalizados; * Serviços Criativos: arquitetura, publicidade, P&D criativos, atividades culturais e recreativas.

Dentro das definições de indústrias criativas concluídas pela UNCTAD, estão que estas: * São os ciclos de criação, produção e distribuição de bens e serviços que usam criatividade e capital intelectual como dados primários; * Constituem um conjunto de atividades baseadas em conhecimento, focadas, mas não limitadas, na arte, potencialmente gerando receita da comercialização e direitos de propriedade intelectual; * Compreendem produtos tangíveis e serviços intelectuais ou artísticos intangíveis com conteúdo criativo, valor econômico e objetivos mercadológicos; * Localizam-se na intersecção dos setores industrial, de artesanato e de serviços; * Constituem um novo setor dinâmico no comércio mundial.

Dentro das definições de economia criativa concluídas pela UNCTAD, estão que esta: * Pode fomentar novas gerações, criação de empregos e exportar rendimentos, enquanto promove a inclusão social, a diversidade cultural e o desenvolvimento humano; * Envolve aspectos econômicos, culturais e sociais, interagindo com objetivos tecnológicos, turísticos e de propriedade intelectual; * É um conjunto de atividades econômicas embasadas em conhecimento com uma dimensão de desenvolvimento e conexões transversais em níveis macro e micro com a economia global. * É uma opção de desenvolvimento plausível que invoca respostas a políticas multidisciplinares inovadoras e ação interministerial;

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* Tem em seu núcleo as indústrias criativas.

Partindo destas definições, iniciamos a descrição dos relatórios da Firjan e Nesta, considerando a importância desses estudos e analisando a profundidade de suas abordagens. Considerações sobre “Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil” (Firjan, 2012) O trabalho desenvolvido pela Firjan em 2012, conforme elucidado na introdução do material, é baseado, dentre outros documentos, no mapeamento das indústrias criativas desenvolvido pelo Departamento de Cultura, Mídia e Esportes (DCMS) do Reino Unido, estudo este que é considerado o primeiro a reconhecer o potencial econômico de um setor pautado na criatividade, bem como cunhar o termo que o definiu. Deste, o estudo da Firjan utilizou, inclusive, a definição de indústrias criativas que rege o desenvolvimento do trabalho: “[atividades] que têm sua origem na criatividade, na perícia e no talento individual e que possuem um potencial para criação de riqueza e empregos através da geração e da exploração de propriedade intelectual” (DCMS, 1998, apud FIRJAN, 2012, p. 01). Com dados atualizados, o material da Firjan é um desdobramento do estudo original que data de 2008, quando foi lançado estudo pioneiro intitulado “A cadeia da indústria criativa no Brasil”. Segundo o material, a edição mais recente de 2012, além da atualização dos dados, [...] inova ao somar uma nova abordagem ao método das edições anteriores. Além da visão sobre cadeia produtiva, cujo foco são as empresas e o valor de produção gerado por elas, foi construída uma análise sobre os profissionais criativos. Isso é fundamental uma vez que estes não trabalham exclusivamente nas empresas que produzem bens e serviços criativos. (FIRJAN, 2012, P. 02)

Além disso, destaca-se a inclusão de dois novos setores criativos ao universo de análise, chamados de Pesquisa & Desenvolvimento e Biotecnologia. No total, são então 14 setores criativos mapeados, a saber, Arquitetura & Engenharia, Artes, Artes Cênicas, Design, Expressões Culturais, Filme & Vídeo, Mercado Editorial, Moda, Música, Publicidade, Software e Computação & Telecom. O cerne do estudo desenvolvido pela Firjan debruça-se sobre a chamada Cadeia da Indústria Criativa, cuja definição é retirada do relatório da UNCTAD: “a cadeia produtiva é composta pelos ciclos de criação, produção e distribuição de bens e serviços

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que usam criatividade e capital intelectual como insumos primários” (UNCTAD, 2008, apud FIRJAN, 2012, p. 03), cadeia esta que se estrutura em três grandes áreas:

* Núcleo Criativo: centro de toda a Cadeia Produtiva da Indústria Criativa, é formado por atividades econômicas que têm as ideias como insumo principal para geração de valor; * Atividades Relacionadas: provêm diretamente bens e serviços ao núcleo, são representadas em grande parte por indústrias e empresas de serviços fornecedoras de materiais e elementos fundamentais para o funcionamento do núcleo; * Apoio: ofertantes de bens e serviços de forma indireta ao núcleo. (FIRJAN, 2012, p. 03)

A figura abaixo nos auxilia na compreensão do desenho de tais áreas que compreendem a cadeia da indústria criativa analisa pela Firjan:

Figura 1 – Fluxograma da cadeia da indústria criativa no Brasil Fonte: Firjan, 2012, p. 02

O estudo da Firjan é estruturado em cinco macrotemas, e contempla um resumo dos resultados encontrados pelo mapeamento, a perspectiva das empresas criativas e do valor de produção gerado por elas, o mercado de trabalho criativo, o panorama das indústrias criativas nos estados brasileiros e uma análise de cada um dos 14 segmentos criativos considerados.

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Na seção “Resumo dos Resultados”, encontramos dez itens que sumarizam os dados encontrados, essencialmente apresentados em forma de números e porcentagens, como “o mercado formal de trabalho do núcleo criativo é composto por 810 mil profissionais, o que representa 1,7% do total de trabalhadores brasileiros”, “estima-se que o núcleo criativo gera um Produto Interno Bruto equivalente a R$ 110 bilhões, ou 2,7% de tudo o que é produzido no Brasil” e “no que se refere à remuneração, enquanto o rendimento mensal médio do trabalhador brasileiro era de R$ 1.733 em 2011, o dos profissionais criativos chegou a R$ 4.693, quase três vezes superior ao patamar nacional” (FIRJAN, 2012, p. 04). A segunda seção, “A Economia Criativa: Empresas e Produção”, apresenta, com base no PIB criativo e porcentagem em relação ao PIB tradicional, que o “Brasil está entre os maiores produtores de criatividade do mundo” (FIRJAN, 2012, p. 06). Reforça-se também tendência no mundo empresarial em reconhecer a importância da inovação e criatividade: “Além do capital, da matéria-prima e da mão de obra, as áreas estratégicas das empresas voltaram os olhos para o uso das ideias como recurso essencial para geração de valor” (FIRJAN, 2012, p. 06). Em “O Mercado de Trabalho Criativo: Empregos e Remuneração”, o destaque é para a descoberta de que “o núcleo criativo possui 810 mil profissionais, 1,7% do total de trabalhadores brasileiros” (FIRJAN, 2012, p. 08), bem como a conclusão de que a remuneração desses profissionais costuma ser superior do que a média da economia nacional. Vale chamarmos a atenção para a metodologia considerada nesta seção do documento, já que enquanto é comum se mapear os setores criativos e, por consequência, os profissionais embutidos no setor, aqui a preocupação foi contabilizar os profissionais cujo insumo principal são as ideias, mesmo que estes possam estar atuando em áreas não consideradas criativas. A seção “Indústrias Criativa nos Estados” nos mostra que os estados de São Paulo e Rio de Janeiro se sobressaem quanto ao número de profissionais criativos encontrados, com destaque para o núcleo criativo de Arquitetura & Engenharia, que abriga o maior contingente. Porém, Rio de Janeiro e Distrito Federal passam à frente quando se trata da média de remuneração desses profissionais. Por fim, a última seção, “Os Segmentos Criativos”, se propõe a caracterizar as atividades relacionadas (“as atividades de provisão direta de bens e serviços ao núcleo” (FIRJAN, 2012, p. 17) e as atividades de apoio (“os setores de provisão indireta” (FIRJAN,

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2012, p. 17) vinculadas a cada um dos 14 núcleos criativos avaliados, compondo assim, suas respectivas cadeias produtivas. A partir das informações supracitadas, entendemos, portanto, que o relatório da Firjan não se propõe a ingressar em nenhuma análise ou debate, tampouco apresenta uma relação das conclusões encontradas com o levantamento, assim como também não indica em sua introdução quais os objetivos esperados com tal estudo. Entendemos, assim, que, apesar de profícuo e válido para uma aferição quantitativa dos setores criativos brasileiros, o material pouco contribui com análises qualitativas a respeito da economia criativa brasileira.

Considerações sobre A Manifesto for the Creative Economy (Nesta, 2013) Em contraposição ao material da Firjan, nos propomos, então, a analisar o material A Manifesto for the Creative Economy, uma obra do Nesta (National Endowment for Science, Technology and the Arts), do Reino Unido, lançado em 2013. Em uma rápida primeira avaliação, percebemos logo que este estudo se propõe a ser algo aprofundado e, ao contrário do estudo da Firjan, mais reflexivo e qualitativo, em oposição a uma simples apresentação de dados. O Nesta se define, logo na introdução do documento, como uma fundação do Reino Unido para a inovação. Como uma instituição beneficente independente, ajudamos as pessoas e organizações a realizarem grandes ideias. Fazemos isso ao fornecermos investimentos e financiamento e mobilizarmos pesquisa, redes de contato e aptidões. (NESTA, 2013, p. 02)

Esclarece, também qual o objetivo do estudo: “Este manifesto mostra claramente tanto o que é possível e o que pode dar errado. Ele estabelece análises e prescrições, e nossa esperança é de que as pessoas possam se comprometer seriamente com ambas” (NESTA, 2013, p. 06). Acrescenta, também, que fazem parte dos objetivos esperados a identificação de ações necessárias para desenvolvimento de políticas públicas e a atuação de educadores, empresários e reguladores, já que a economia criativa representa uma considerável recorde de sucesso na história da Grã-Bretanha, com registros de liderança mundial. Com a preocupação da inserção da importância da revolução digital e as novas tecnologias, o estudo baseia-se na definição simplificada de indústrias criativas a partir do material do DCMS, resumindo-a como “aqueles setores especializados no uso do talento criativo com propósitos comerciais” (NESTA, 2013, p. 13).

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Dividido em 12 capítulos, o estudo se desdobra sobre um amplo histórico, que resgata as origens da economia criativa na Grã-Bretanha, no final da década de 90, e relata como tal setor se tornou referência mundial. Reconhece os esforços do governo para o setor criativo, mas reforça a importância das novas tecnologias, em especial da Internet, em ser considerada pelas políticas públicas, como insumo para os novos mercados digitais. O material também resgata definições de economia criativa, baseada no histórico da criação do termo pelo DCMS, sugere que a economia criativa não é bem definida (o que dificultaria a criação de políticas públicas), sugere metodologia própria para classificar e mensurar a economia criativa, baseando-se no local onde os profissionais criativos atuam e, de forma aprofundada, perpassa temáticas importantes para o entendimento do setor criativo, como a relevância das novas tecnologias e acesso a financiamentos, a questão da propriedade intelectual e a consideração do setor de artes e cultura. Todavia, o grande destaque do documento decai sobre as dez propostas que resumem os objetivos da instituição com esse documento e as ações que ela considera primordial para o desenvolvimento da economia criativa e das indústrias criativas na GrãBretanha, que, segundo o Nesta, “se aplicadas, irão melhorar de forma substancial a prospecção de inovação e crescimento da economia criativa da Grã-Bretanha” (NESTA, 2013, p. 16). Sendo assim, resumimos abaixo o conteúdo das dez propostas: Proposta um: o governo deveria adotar as novas definições de Economia Criativa e indústrias criativas propostas pelo Nesta, já que estas seriam mais simples e reconheceriam o papel central das tecnologias digitais. Proposta dois: uma nova estrutura deveria ser criada para o estabelecimento de políticas públicas para o sistema de inovação criativa, para que as prioridades estratégicas possam ser consideradas de forma mais coerente e efetiva. Proposta três: o governo deveria tornar os impostos sobre pesquisa & desenvolvimento mais acessíveis para os empreendimentos criativos, bem como o acesso a programas de estímulo à tecnologia e o estímulo a intercâmbio de colaboração com centros de pesquisa internacionais. Proposta quatro: os desenvolvedores de políticas públicas deveriam observar as sugestões criadas pelo Nesta para o desenvolvimento dos clusters criativos.

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Proposta cinco: o governo deveria garantir que seu financiamento a empresas não discrimine os empreendimentos criativos, e que seus regulamentos auxiliassem no desenvolvimento de plataformas de financiamento online (como sites de crowdfunding), Proposta seis: o Tesouro e o DCMS deveriam realizar uma aferição ampla sobre os gastos públicos com artes e cultura, e decisões futuras deveriam ser baseadas nas descobertas de tal estudo. Proposta sete: financiadores deveriam incentivar a experimentação com novas tecnologias digitais por meio de organizações de arte e cultura e alocar uma porcentagem de seus recursos para pesquisas digitais. Proposta oito: o Ofcom6 deveria ter a autonomia de reunir informações de todo o mercado online para maximizar as chances de identificar abusos de poder. Proposta nove: as regras de direito autoral da Grã-Bretanha deveriam ser revistas, tendo em mente um novo mecanismo que possibilite transações mais eficientes de licenciamento dos direitos. Proposta dez: os governos da Grã-Bretanha deveriam criar um sistema para garantir que os currículos escolares contemplassem artes, design, tecnologia e ciências da computação e que os jovens possam ter oportunidades de trabalhar com criatividade, dentro e fora das escolas. A partir do exposto, entendemos, então, que, ao contrário do material desenvolvido pela Firjan, o manifesto do Nesta se propõe a apresentar uma análise aprofundada do contexto da Economia Criativa britânica, levantando dados e históricos para, por fim, sugerir dez pontos-chave do que para a instituição representam ações concretas para que os setores criativos se desenvolvam com sucesso na Grã-Bretanha.

Considerações finais Os dois materiais analisados constituem importantes fontes de informação em se tratando de Economia Criativa. Conforme ressaltamos, as divergências entre eles são mais significativas do que as convergências, sendo a principal diferença a característica estritamente quantitativa do estudo realizado pela Firjan, enquanto que o manifesto do Nesta se apresenta de caráter amplamente qualitativo e analítico. A partir dos materiais avaliados, consideramos, então, que algumas reflexões possam ser levantadas. A primeira delas é que o Brasil necessita de iniciativas como a do manifesto do Nesta, que se preocupem com o cenário amplo da Economia Criativa e suas 6

Office of Communications, equivalente a Ministério das Comunicações.

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consequências urgentes e a curto, médio e longo prazo, e não apenas de mapeamentos e aferições. Reconhecemos que um dos avanços brasileiros para o destaque dos setores criativos foi em 2011 com a criação da Secretaria da Economia Criativa (SEC), vinculada ao Ministério da Cultura, que representou um importante avanço ao setor. Entendemos, porém, que também o envolvimento da sociedade civil se apresenta igualmente de suma importância para, principalmente, o desenvolvimento dos arranjos produtivos locais dos setores criativos. A elaboração de políticas concretas, como as dez propostas formuladas pelo Nesta, é uma primeira sugestão para que pensemos a realidade da Economia Criativa brasileira sob uma ótica de políticas públicas. A SEC, em seu “Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações”, apresenta seus cinco objetivos, que chama de desafios, que “foram eleitos como fundamentais para a elaboração e implementação de políticas públicas concretas e efetivas” (MINISTÉRIO DA CULTURA, 2011, p. 35), sobre os quais a atuação da Secretaria se dará tendo em mente o período de 2011 a 2014. São eles: 1) Levantamento de informações e dados da Economia Criativa 2) Articulação e estímulo ao fomento de empreendimentos criativos 3) Educação para competências criativas 4)

Infraestrutura

de

criação,

produção,

distribuição/circulação

e

consumo/fruição de bens e serviços criativos 5)

Criação/adequação

de

Marcos

Legais

para

os

setores

criativos

(MINISTÉRIO DA CULTURA, 2011, p. 35-36) Mais uma vez, reconhecemos a relevância e importância das ações propostas pela SEC, mas também acreditamos que outras propostas e iniciativas que não sejam fruto necessariamente de ações governamentais formais também devam ser consideradas, provenientes de organizações da sociedade civil, ONGs e demais instituições, bem como advindas das reflexões de pesquisadores acadêmicos e profissionais e especialistas do setor criativo brasileiro.

Referências bibliográficas BENDASSOLLI, P. F.; WOOD JR., T.; KIRSCHBAUM, C.; CUNHA, M. P. Indústrias criativas: definição, limites e possibilidades. RAE, v. 49, n. 1, p. 10+, 2009.

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FIRJAN. Indústria Criativa: Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil, Rio de Janeiro: Firjan, 2012. Disponível em: . Acesso em 12 mai. 2013.

MINISTÉRIO DA CULTURA. Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas, diretrizes e ações, 2011 –2014. Brasília: Ministério da Cultura, 2011.

NESTA. A Manifesto for the Creative Economy. Londres: Nesta, 2013. Disponível em: . Acesso em 12 mai. 2013. O’CONNOR, J. Cultural industries: political economy and cultural politics. The cultural and creative industries: a review of the literature: a report for Creative Partnerships. p.21-30, 2007. London: Creative Partnerships, Arts Council England, 2007.

UNCTAD. Creative economy report 2008: the challenge of assessing the creative economy - towards informed policy-making. Genebra: United Nations, 2008.

UNCTAD. Creative economy report 2010: a feasible development option. Genebra: United Nations, 2010.

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