As Parceiras - Resumo

July 21, 2017 | Autor: Jennyfer Siqueira | Categoria: Literatura
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Anelise: Casada com Tiago, vai para o Chalé resolver sua vida.
Catarina: Tinha 14 anos quando se casou. Era triste, sozinha e esquisita. Cheirava a alfazema. Teve três filhas em meio a abortos: Beatriz, tia Beata, Dora, a pintora, e Norma, mãe de Anelise. Vinte anos depois teve a anã Sibila.
Tia Dora: Se afastou da família e levava a vida como bem entendia, não dava satisfação para ninguém, não ligava para a desaprovação de Beatriz pelo seu estilo de vida "escandaloso". Tinha vitalidade, era interessada, viva, falastrona.
Tia Beata: Estava seguidamente na igreja, fazendo novenas, promessas. Vivia para Bila e o casarão. Era interessada, mas fria, sem carinho.
Norma: Era etérea, desligada, infantil, inocente e esquecida. Uma menina crescida que ainda queria brincar de bonecas.
Sibila: Concebida e parida no sótão. Anã e retardada.
Adélia: Melhor amiga de Anelise. Era extrovertida, divertida.
Fräulen – governanta do casarão.
Nazaré – caseira do chalé. Zico era seu filho, que gostava de brincar com bernardo.

Domingo
Uma mulher fica parada no morro.
Catarina
Anelise teve um único encontro com sua vó, que a marcou. Tudo no sótão era branco, das paredes às vestes da moradora. Um quarto de menina: limpo, inocente e infantil.
"Catarina mal tinha começado a menstruar quando se casou [...] não tinha certeza de como os bebês entravam e saiam da barriga das mães. Casamento era para ela a noção difusa de abraços e beijos demorados, e alguma coisa mais, assustadora. Algo que nunca falavam direito."
Catarina era filha de uma alemã que veio para o Brasil visitar parentes e acabou casando, enviuvando e criando sozinha a única filha. Achou um genro, um trintão experiente que disse que na hora certa lhe ensinaria o que fosse preciso.
"O destino foi zeloso: caçou-a pelos quartos do casarão, seguiu-a pelos corredores, ameaçou arrombar os banheiros chaveados como arrombava dia e noite o corpo imaturo. Mais tarde entenderam que os arroubos do meu avô eram doentios: nada aplacava suas virilhas em fogo."
"E Catarina sucumbiu a um fundo terror do sexo e da vida. Não os medrosos pruridos de muitas novinhas de seu tempo, mas uma agoniada compulsão de fugir [...] ela se refugiou onde pode: um mundo branco e limpo que inventava e onde se perdia cada vem mais. Assumiu o ar distraído de todas outras mulheres da família."
Catarina cada vez mais se perde na loucura. Mobília o sótão como quarto de menina, todo branco, só que sem bonecas, só faltava às bonecas para que a inocência fosse recomposta. Impregna na casa sua ladainha, de adulta precoce, uma criança que teve sua infância e inocência roubada. Com a adolescência o marido deixa-a esquecida e se muda para uma de suas fazendas. E quando ia ao chalé, invadia o sótão e em meio a gritos engravidava Catarina.
Sucumbiu à loucura, e se tranca no sótão. As meninas são criadas pela governanta rígida, a Fräulein (sobrenome).
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O Chalé era a lembrança de que apesar de antigo, a história iria se perdurar.
"É como se a vida fosse um jogo em que as peças mudam, mas as jogadas são as mesmas. Incógnitas."
Adélia e Anelise adotam um antigo cemitério no morro, com inscrições em alemão e português.
"Há os mortos do morro e há os mortos do meu cemitério da memória: como num sótão, me fazem companhia sem serem vistos [...] Cada vez mais me atemorizam menos: já sou quase um deles."
Motivo de Anelise ir pro Chalé: descobrir como tudo começou como acabou. Por que acabou. Se dou com a ponta errada do fio, se descubro o lance perverso da jogada, a peça de azar, quem sabe consigo sobreviver.
Era uma família de mulheres doidas, segundo tia Dora.
"As três filhas de Catarina casariam cedo. Beatriz, por três semanas apenas. Tia Dora, mais de uma vez. Minha mãe, com um homem que a protegeria da fragilidade numa existência quase tão irreal quanto a do sótão.
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Adélia
No Chalé, quando crianças, Adélia e Anelise dormiam no mesmo quarto. Elas estudaram juntas, tinham a mesma idade, e seus pais a deixavam ir para praia com Anelise, porque sabiam que ela era muito sozinha. Adélia era mais irmã que Vânia, que não ligava para Anelise. Adélia dava a ternura que Anelise necessitava.
Menina rechonchuda, de riso fácil e alegria de viver. Para ela fantasmas eram coisa natural, seus pais eram espíritas. Adélia era o brilho na vida de Anelise por oferecer o amor que ninguém dava para ela.
Quando Anelise tinha 12 anos e estavam no Chalé, em uma tarde em que ela estava doente, tinha acordado tarde, já era escuro e viu a movimentação. Ela perguntou por Adélia e o pai disse que ela estava em outro quarto dormindo, para não pegar dor de garganta. No outro dia ele contou que Adélia tinha se jogado do penhasco. Ele disse que ela tinha se machucado muito, sido levada para casa para os pais cuidarem dela no hospital. Mas depois Anelise soube que ela despencara do penhasco.
"Nunca tive outra amiga como Adélia. Sua morte entrou em mim num ferimento que jamais sarava, pois logo outra pessoa morria e eu a enterrava naquele mesmo lugar. Onde se encontrava tanto Catarina murmurando quanto Bila, num canto fazendo caretas."
Adélia não tinha medo: era só alegria, desejo de viver, de amar.
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Norma
"Quando ela casou todos acharam que lhe convinha muito aquele homem já maduro, bondoso. Ainda por cima ainda um médico [...] para atender as singularidades de Norma. Pois ela era um pouco infantil, desinteressada pelas coisas práticas, aparentemente incapaz de assumir uma família sua."
Norma tocava piano para seu marido na sala: era para ele que tocava, cantava, vivia. Ela só sossegava quando ele chegava do consultório.
Para Anelise seus pais eram bondosos e tranquilos, mas distraídos.
"A felicidade precária precisava ser tão protegida quanto minha mãe, quase ausente, acompanhando um pouco à distancia a vida das filhas e os acontecimentos domésticos. Nunca podíamos correr, gritar, discutir na frente dela. Tudo a perturba, começava a chorar, recolhia-se no quarto."
Anelise então se acostuma a reprimir suas vontades. Inventou uma mentira para seus pais verem. Criou um universo de fantasia, com personagens, companhias onde podia ser criança.
Vânia era bem mais velha, e achava Anelise boba. Eram distantes, não dormiam no mesmo quarto. Anelise ficava sozinha com seus duendes e medos.
Anelise e Vânia foram criadas por empregadas. O pai perguntava sobre a escola, mas a verdadeira preocupação era a mãe.
"Pensei que se amavam demais, o resto do mundo não interessava: eu me sentia mais só ainda."
Anelise tinha 14 anos quando seus pais morreram em um acidente de avião. Duas pessoas que não podiam viver uma sem a outra.
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Os medos de Anelise quando criança era o de enlouquecer, já conhecendo a história de Catarina. Ela se perguntava se loucura podia ser herdada. E tinha medo de não crescer, vendo Bila, a anã. Dos dois medos o de enlouquecer é o que ainda a assombra.
Adélia era a única que dava amparo, quando ela morreu Anelise ficou sozinha.
"Desconfiei sempre que tia Beata nunca se importou em não ser amada pelas pessoas: o contato físico, mesmo conosco, a repugnava. Ou Assustava?" Ela era rígida, fria, encolhida e hostil.
Depois da morte dos pais foram morar com tia Beata. Vânia e Beatriz já não se davam bem morando separadas, agora juntas ninguém podia, discutiam sempre. Vânia já estava noiva. E Anelise se sentia sem amigos e sem afeto.
Anelise foi morar com Beatriz no casarão, com os fantasmas. Tornou-se rebelde, não queria adotar a religião, nem valores impostos pela tia. E se sentia ainda mais sozinha quando Vânia se casou e saiu de casa.
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Tia Beata, Beatriz
"mundo triste o de tia Beata, que crescera sob o império de Fräulein, a mãe louca no sótão da casa enorme, duas irmãs mais novas tendo que ser protegidas, o pai raro e grosseiro. Magra, taciturna [...] Casara e enviuvara em pouco tempo, voltara ao casarão, a mãe enfurnada lá em cima. Começou a cuidar dela, depois de Bila."
"Beatriz cuidava de seu triste ofício: uma louca, uma anã. Era religiosa, ia à igreja mesmo em dia de semana, não perdia a novena."
Quando Anelise soube da verdade sentiu mais pena que afeto. Apenas solidariedade familiar: eram um bando de mulheres malsinada.
Ela não queria ser amada para não sofrer de novo, até seus abraços eram pontudos.
Morreu virgem.
"Foi casada três semanas. Logo o marido se suicidara, diziam que fora por não poder cumprir seus deveres conjugais. Não saciara os magros ardores de tia Beata. Faltava ao marido o que sobrava ao avô. [...] Fora um tiro na boca, a tampa da cabeça saltara como tampinha de laranja quando se corta. Sangue e miolos."
Anelise não aguentou viver sob a vida, religião e ideias de Beatriz, se rebelou. Anos depois foi mandada para Dora e Beatriz se mudou para o quarto de um convento até o final da vida. Uma freira sem votos. Como se ter ficado virgem era um aviso de Deus.

Segunda-feira
- Anelise vai visitar o cemitério, mas não o encontra. Adélia havia morrido há mais de 20 anos.
"Vontade de sumir, de inventar meu sótão, ali em cima seria um bom lugar: um cemitério por refúgio, um mundo como o de Catarina, ordenado e branco [...] O pensamento calado. Sem podridão. Nem vermes. Mas no meu cemitério tudo seria limpo e estático: sem perigos. Sem dor. Fantasmas comportados cheirando a alfazema."

Vânia
Depois da morte de Adélia, Anelise queria que Vania a substituísse.
Tinham a diferença de idade e a atmosfera distante em casa contribuiu para o afastamento entre as duas.
Anelise admirava Vania pela sua força, independência e arrogância, orgulhosa. Parecida com tia Dora. Não se impressionava com a história da avó doida e da tia anã. As amigas perguntavam sobre Bila.
Anos mais tarde, quando já estão casadas, é que se tornam amigas.
"Demorei a perceber que aquele casamento também era uma farsa, que por trás do rosto bonito e do penteado impecável minha irmã escondia muita solidão. O marido a traía com meio mundo, nem as amigas escapavam, o caso era comentado, todos tinham pena da mulher tão moça, tão fina, tão solitária."
Vivia um casamento de aparências. Na véspera do casamento fez um acordo com o marido de não terem filhos, ele não queria arriscar que seu filho tivesse o mesmo destino de Catarina ou Bila. Quando jovem aceitou sem hesitar, mas anos mais tarde sofria por não poder ter filhos. Conforme ia descobrindo as traições do marido, mais solitária ficava. Vânia ainda amava o marido. Estava traída, desarmada e condenada ao casamento. Nem amante resolveria. Ela estava em um beco sem saída onde todas outras estavam.

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"Quando menos se espera, as parceiras escamoteiam uma peça"
Escamoteiam= encobrem, somem com sutileza.
Para Anelise avó Catarina era a peça principal. Quando ainda ela e Vania moravam no Chalé elas entraram no sótão, Anelise queria entender o que tinha levado a avó à loucura, por que tinha se escondido. Ela comparou-a com Virginia woolf, por ter manias, por ter medo de tudo, de homem, de ter o jeito assustado.
"Ela era uma viada" – Vânia sobre virginia woolf. Anelise (no presente) se lembra de que soube que no fim da vida Catarina teve mania de escrever, cartas endereçadas a um homem e a uma mulher, e que aos 46 anos foi pega em atitudes suspeitas com uma enfermeira. A enfermeira foi demitida. Tia Dora que a contou do fato. Catarina além de ter a intimidade violada, não teve a chance de ser feliz, de se salvar, de se sentir amada.
Anelise conta que a solidão reinava ali no Chalé, e que ela e Tiago estavam se separando, e que estavam tristes.

Terça-feira
Bila
Nasceu quando Catarina tinha 14 anos e estava já no sótão. Não via há anos o marido, e um dia ele veio, bêbado, invadiu o sótão e engravidou-a. Sibila, nome escolhido por Beatriz. Assim que nasceu, Catarina não quis ver a filha. Parecia que tinha esquecido da filha. Quando Bila tinha três anos Catarina pediu para vê-la e os poucos minutos que a pegou bastou para nunca mais querer vê-la. Em sua imaginação criou a imagem de uma filha loura e perfeita, como Anelise, quando visitou-a. Nunca lhe cresceu os dentes, era feia, cabeça pequena, olhos miúdos. Bila cuspia, beliscava, judiava dos bichos, e pegar insetos.
Bila era o medo de Anelise. E anos mais tarde Anelise pensa que poderia ter dado mais compaixão a Bila, que poderia ter sido sua amiga, e ter tido menos repugnância e terror.
Anelise lembra-se que quando morava com tia Beata, a desafiava para ver que não seguiria suas regras, e que assim a mandasse para viver com tia Dora. E que ela e tia Beatas eram solitárias, mas que a presença de Otávio a quebrou durante três meses.
Bila morreu de uma pneumonia fulminante, nem chegou a ir para o hospital. Todo o carinho que restava em Beatriz, foi dedicado a Bila.

Otávio
Fora adotado por Dora ainda bebê. Como Dora viajava muito ficava em internato, se arranjava, era independente. Otávio tocava piano, coisa que tia Beata desaprovava, não era coisa de homem. O achava mimado.
A fuga de Otávio era o piano. Anelise gostava das improvisações que ele fazia quando ninguém mais estava vendo. A música submarina. Ele se transformava em um rapaz sedutor e tímido, e quando parava, percebia que ela estava ali e sorria com cumplicidade.
Anelise se apaixonou por ele.
Otávio trouxe com ele, umas caixas de sapatos cheios de bicho da seda, na qual Bila se apaixonou.
"Foi Otávio quem me deu o primeiro beijo na boca, me fez viver uma primeira, incompleta e assustadora experiência de sexo, me ajudou a enxergar a vida além dos paredões sombrios daquela casa."
Otávio também a ajudou quando o casamento desmoronou, e quando tudo acabasse ele seria seu amigo, um velho amor, todo desarrumado e fiel.
Anelise queria descobrir qual era fenda que Otávio tinha quando tocava. Mas era tão vaga que logo se perdia.
Otávio tinha o mesmo sorriso de Adélia = vivo e inocente.
Otávio trouxe vida para vida de Anelise, era brincalhão, tocava piano. E assim como ela, era fascinado pela história do sótão e de Catarina.
Quando adolescentes ele foi seu primeiro amor. Era excitante, tudo tinha que ser rápido, escondido, não tinha tempo. Ele mudou-a. Anelise se tornou mais solta, rindo sem motivo, desabrochava na presença dele. Ele foi o seu primeiro, e por um momento ela queria morrer de amor.
Quando voltou para casa, tia Dora o mandou para o exterior para se aperfeiçoar no piano. As visitas ficaram mais espaçadas, menos intensas sem o proibido do casarão.
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Aos 18, Anelise e tia Beata se separaram. Ela fora morar com tia Dora e tia Beata se refugiou num convento. O casarão foi derrubado e virou um edifício.
Anelise se sente cansada, sem forças, deprimida. Por um momento ela se sente numa sobre vida, e ao dormir vai lá falar com seus duendes e mortos, seus anjos. Os mortos roubados do cemitério, tudo estaria perfeito se não fosse à dor.
Otávio deu esperança para Anelise. Deixou de pensar tanto no legado da família, e quis viver.
Anelise, solta, viva, desafiava os padrões de tia Beata. E com a morte de Bila tudo ficou pior. Assim, interveio Dora, que se sentia muito sozinha, com Otávio no exterior. A faculdade impunha novos horários a Anelise, e ela poderia ser livre.

Dora
O apartamento de Dora era quase um enorme ateliê, era claro, ao contrário do casarão. Viver se tornou algo saudável, ela tinha liberdade, era feliz. A amizade de Adélia e o romance com Otávio a fez desabrochar.
Anelise sabia que por trás daquele esplendor todo, das bebidas e reuniões de artistas, todos ali traziam uma solidão, um medo. Dora se refugiava em seus quadros, pintava seus medos. Dora cuidava de Anelise sem a aprisionar, sem a fragilidade de Nora ou a secura de Beatriz.
Ali não havia sótão, era vivo, e apesar de às vezes sofrerem havia muitas coisas boas. Que os fantasmas ficassem em seu canto, entre caixas de sapatos e alfazema.
Dora não gostava de ninguém por perto quanto pintava, mas deixava que Anelise ficasse por perto desde que ficasse quieta. Ela se sentia participante. Vendo Dora pintar seus demônios. Anelise dizia que Dora desenhava anjos e pintava monstros. Os anjos vinham dos esboços que fazia, tão belos.
Mas nesse meio tempo Anelise se apaixona por Tiago, uma paixão avassaladora, madura, tudo se resumia a ele. Saudável, seguro, ordenado, com a vitalidade de tia Dora e com a coragem que ela um dia teve.
Seus fantasmas: a mão branca de uma solitária moradora do sótão, a figura de uma anã rasgando minhocas, um casal virando poeira sobre o mar, uma menina de cabelos preto e liso despencando na rocha.
E Tiago aceitava, aceitava Anelise com seus fantasmas, com seu passado. A vida continuava.

Quarta-feira
Anelise acordou com a movimentação causada por Nazaré e Zico. Ela queria saber quem era a mulher do morro e Nazaré disse que Zico descobriria.
Anelise também pintava, mas ao invés de anjos, ela pintava paisagens. O mar, dunas e um chalé antigo.
Anelise queria ser amiga da mulher do morro, conhecida pelo menos. Afeto não era mais para ela, só afagos distraídos em Zico ou no lombo de Bernardo.

Otávio e seu Casamento
Otávio pouco escrevia, só os cartões que não substituíam sua presença antiga. Ele se tornou um homem triste. Tocava num conjunto de jazz. E não sabia se ele ainda tocava a musica submarina, de olhos fechados. Um dia escreveu que se casou e que iria visitar ela e Dora. Foi repentino, não tinha comentado nada antes.
"Foi assim que vi pela primeira vez um casamento se destruindo como um canibal que devora partes do próprio corpo. Não disfarçado desencanto de tia Dora, que tentara uma porção de vezes, não o súbito apagamento de meus pais, não o teatro patético de Vânia, nem o absurdo de tia Beata, ou o esfacelamento vagaroso que seria o meu um dia: apenas um ato desencontrado e ridículo, que nos deixaria mais unidos do que nunca: tia Dora, Otávio e eu."
Ao se reencontrarem Anelise ficou comovida, não se esqueceu do amor adolescente, apesar de estar apaixonada por Tiago. A esposa, Mariana, uma ruiva fascinante, autêntica e nem muito jovem nem muito velha. Magra, inquieta, soberana. Mas Dora não gostou dela e Otávio estava apaixonado, mas não se sentia a vontade com ela, como se fosse sua primeira namorada, depois Anelise percebeu que Mariana não ligava para o marido.
Os dois, Anelise e Otávio, eram agora adultos comprometidos, amigos, que relembravam com humor os velhos tempos sob os cuidados de tia Beata. E tinha Mariana, meio estranha, que passava o tempo todo no quarto e reclamava de tudo. Mas à noite, quando vinham os amigos, ela se transformava se tornava provocante, flertava com todo mundo, até com Tiago.
No decorrer do tempo, Mariana se mostrava cada vez mais vulgar, queria voltar para a Europa e Otávio queria ficar, dar um tempo. Ela era vulgar, histérica, eles brigavam com frequência. Um dia Anelise a pegou traindo Otávio, mas não falara nada. Como ele podia ficar com alguém vulgar, que o traía, desprezava e brincava com ele? Um dia o caos foi tanto que Mariana se mudou, e voltou para a Europa, dias seguintes Otávio partiu deixando um bilhete dizendo que ia atrás dela.
Anelise disse que um dia ele voltava a morar no Brasil, que a deixava, mas elas sabiam que era mais complicado que isso. Afinal, era uma família de perdedoras.
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Anelise via em Zico seu filho e Otávio, mas sem a inocência de Otávio quando foi em busca de Mariana.
Nazaré tem um mundo tão rico, real, de bom senso, pretensões humildes, fácil de satisfazer, família grande e uma mãe. Ela era feliz, ela e o marido tinham empregos, filhos com saúde. Diz que sente falta do marido quando ela está no Chalé, Anelise diz que ela pode ir para casa mas ela nunca deixaria Anelise sozinha, era fiel.
Ela diz que é feliz porque não pensa tanto, é mais simples, pq não tem estudo, quem pensa demais acaba endoidando.
Anelise sente falta de Tiago, tem esperança de retomar o casamento. Mas apesar do pedido de divórcio, eles já estavam separados, há anos.
Que casamentos os nossos: o de Catarina inaugurava a cadeia nada secreta que nos ligava intimamente.
Vânia foi à única aparentemente predestinada a ter uma vida normal. Corajosa, independente, merecia escapar.
Quando o casamento já estava marcado Vânia e Anelise se reaproximaram. As duas falavam futilidades, da vida alheia, tudo menos da crise no casamento da irmã, onde o marido pegava meninas de quinze anos. Ela vivia de aparências, rondava o assunto, consumida pelo fado da família.
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Anelise sobe o morro e vê a mulher do morro, toda de branco, com os cabelos esvoaçando, antiquada. Anelise se perguntava se a mulher estava em retiro, como ela no chalé ou como Vânia em sua cama sem amantes.
Ela pensa nela, em Tiago, Vânia e Otávio. Acuados com o passado, de ter que enfrentar de frente, que não dá para voltar a inocência, apenas tem que aguentar tudo
Quando ela e Tiago estavam na lua de mel no Chalé estavam muito apaixonados, se queriam a todo instante. Não podia ter sido mais feliz.
Ela se pergunta porque a gente não morre quando está tudo bem, perfeito e feliz. Antes que tudo desmorone. Ela não sabe se é no fundo ou na superfície que começa a erosão. Se nos primeiras desilusões ou talvez no momento em que não há forças pra continuar.
Ela não entende como o casal feliz que eles eram podiam acabar. Que eles se amavam com defeitos e tudo. Mas ela sentia, anos antes, algo desmoronar, tia dora dizia que casamento não era só felicidade e sexo. E ela queria ter um filho.
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Lalo, seria o nome do filho de Anelise. Tiago queria muitos filhos, uma casa cheia, com gritos e bagunça. Vânia trouxe Bernardo da Suiça, como companheiro para o filho de Anelise.
Todos queria ter um filho, mas nela o sentimento era mais forte, ela precisava ter esse laço entre ela e Tiago. Mas ao ver o histórico de sua família começou a mexer em seus medos, que estava quietos. A avó louca, a tia anã, os abortos de Catarina, a mãe esquiva, a tia beata, ressecada por dentro. E tia Dora, que adotara, talvez não quisesse passar os genes.
Ela e Vânia, normais, inteiras, sadias, e sem filhos. Vânia pela promessa que fizera ao marido e Anelise pelos abortos.
A parte mais negra de sua história se aproxima. Quarenta anos e tantos fios brancos.
Porque ela cita tanto a canção alemã cantada por sua mãe? Adélia, morta com lábios brancos, em Otávio, e sua música submarina,

Quinta-feira
"Acho que agora sou um corpo com memória, feito sótão cheio de moradores esquisitos. Ossadas, flores, cartas, horas de amor, delírio e morte. E a esperança."
Ela queria filhos. Tentou três vezes e todas foram abortos. Vânia e Dora disseram para ela desistir e adotar, mas para ela isso seria confirmar sua incapacidade. Ela e Tiago eram mais amigos que amantes, talvez ele tivesse pensado em parar de tentar, mas ele não falava. Talvez tivesse salvado o casamento deles.
A cada tentativa ela ficava mais focada em ter um filho. O quarto aborto foi de sétimo mês. Ela vivia para ter o filho, seus anos se resumiram em gravidez, aborto, repouso, gravidez, aborto, repouso, medo de engravidar e assim por diante. O casamento foi esfriando, o sexo não era mais o mesmo. Tiago se mudou para o outro quarto e eles nem sentiram. Toda a exuberância que ele tinha, foi substituída pelo ar distraído, calado.
Abortos aconteciam e foi o causador do distanciamento entre eles. Desistiram de ter filhos. Quem queria ficar com alguém desanimada e insatisfeita? Eles cada vez mais se afastavam. Vânia vinha lhe fazer companhia, a dor as aproximara, ela contava seus problemas para distrair Anelise. Contou de seu marido, de seu sofrimento.
Dora disse que Otávio estava voltando, desistiu da ruiva.
Ela e Tiago se deram uma chance, viajaram, às vezes dormiam juntos, mas o sexo era sem graça, sem o ardor de antes. Ela mudou de setor e mudou por fora, mas por dentro ainda tinha a mesma dor.
Foi ai que ela engravidou pela quinta vez.
Todos a tratavam como se fosse a primeira vez, a olhavam com solidariedade e ela ali, tensa, solitária e miserável. Fingiam alegria da gravidez. Mas ela queria tanto um filho. Quando ele se mexia ela rezava para ele aguentar.
"Meu corpo estava tão bem quanto minha alma estava encolhida e apavorada. Fizera um sótão para mim mesma, com traves, madeira, tijolos tirados da solidão da minha infância. Ali moravam as mulheres da minha família, meus mortos: um adolescente que criava bichos da seda, suspeito de não ser muito viril, mas que me ensinara a beijar e a vibrar no corredor sombrio, pedaços de gente perdidas no mar, nas pedras, fragmentos alusões, esboços de anjos ou de monstros. Bila. Vozes na sombra"
Nascera o filho, Lauro, parto difícil e perfeito. Conseguiu quebrar a maldição. MAS nasceu com lesão cerebral, um vegetal, iria precisar sempre de auxilio de aparelhos. Sobreviveu dois anos. Loiro, olhos azuis, bonito e bonzinho. Todos fingiam. Ele era seu centro. Tiago fingia que Lalo era saudável. Com a chegada de Lalo se afastaram mais ainda. Ela não queria outro filho, já tinham o seu, não tinha porque fazerem sexo.
Para Anelise, seu quarto com o filho era seu sótão. Ela se refugiava em si mesma.
E Anelise se perguntou se a veranista estava ali, talvez no rochedo, que soubesse que ela estava acordada fazendo companhia para a solidão dela.

Sexta-feira
Anelise acorda com a agitação na casa. Lembra-se de quando Adélia morreu e desce as escadas para ver o que acontece. Nazaré e um bando de mulheres a consolando. Zico havia sido violentado por um bando de veranistas que fugiram de carro e o deixaram largado nas dunas. Estava judiado, rasgado, tiveram que costura-lo no hospital. Anelise passa mal, e Zico também. Ela é como um mau agouro.
Lalo se torna a razão de viver de Anelise.
Quando Otávio volta, ambos fazem mútua companhia. Os dois estavam magros e tristes. Otávio com seu drama com Mariana, na qual todos apontava para ele como quem tocava bem demais para ser homem, mal sabiam eles. Otávio serviu de apoio para Anelise, acompanhou fiel seu drama, percebeu que ela precisava continuar vivendo mesmo quando Lalo se fosse. Mas Anelise já estava desacreditada, e o casamento arruinado, dois conhecidos sob o mesmo teto.
Anelise teve o filho que tanto queria, mas um filho com lesão cerebral, que vivia em outra dimensão, assim como todos da família.
Anelise diz que não há espaço para mais afeto em sua vida, que entendia porque Beatriz depois que o marido morreu não se envolveu com ninguém mais além de Bila, era mais seguro e Bila não iria corresponder seu afeto.
Seu último renascimento foi com Otávio. Ele voltou e com ele veio aquela fagulha de outros tempos. Quando tudo desmoronara ele voltara quieto, desesperado e só. Segurava minha mão, escutava meu desabafo, passava o braço pelo meu ombro. Acho que até começamos a nos amar de novo, ou nem foi amor, foi compaixão, reunião de tristezas. Amor sem sexo. Otávio com seu destino confuso e difícil e eu com o meu corpo encolhido como o da viúva virgem. Um amor-amigo.
Eles se beijaram, um beijo demorado, como se fossem de novo adolescentes. Ele se levantou, saiu, e voltou dois dias depois. Ele era fiel, e estava ali por ela, para ajuda-la, sem interesse. Eles eram fieis, e formara uma aliança, mais forte de que se fosse para a cama. Um companheirismo.
Lalo morreu no hospital. Todos iam a ver mas ela não precisava de nada. Ela e tia Dora conversam sobre as pessoas da família.
Sobre Otávio, que mesmo não sendo seu filho biológico era uma peça de azar, como qualquer outro da família. Sobre Vânia, que mesmo sem filhos era feliz. Sobre seus pais, Norma aérea e o pai que se dedicava 100% a esposa. Sobre tia Beata, na qual não conseguiram amar, que mesmo quando menina não foi alegre. O sótão.
Falaram sobre a morte de Catarina. Que depois da demissão da enfermeira se distanciara mais ainda, não falava, não escrevia. O sótão do sótão. Um dia sem aviso, abriu a porta da sacada, o que nunca fazia, e se atirou da balaústra para o jardim, três andares abaixo.
No enterro de Lalo, apesar de Tiago estar ali, segurando sua mão, ela sabia que era Otávio que estava com ela, que sempre esteve com ela, desde a adolescência, tirando-a da escuridão.
Ela então escreveu uma carta e se mandou para o chalé semanas depois e que ao voltar para a cidade pediria o divórcio. Ela iria reavaliar sua vida, ver se eram as raízes de Catarina ou acaso da vida que acabou com o casamento dela. Ela queria que Tiago telefonasse, mas sabia que ele não iria. O amor já havia morrido, o coração encolhido, o sexo melancólico. Tudo ressecado. Acabou.
Ela olha para o morro e vê um vulto. A mulher do morro descendo correndo, fugindo dos raios e da chuva. E ela, tentava inutilmente não ligar para as vozes do sótão.

Sábado
"Ninguém a vista. Mas, se olhar por cima do ombro, sei que verei o meu cortejo fiel: os mortos, os loucos, os suicidas, os dúbios e desamparados, os culpados, os solitários. E, no final da fila, uma anã carregando uma caixa de sapato."
"Sei que Otávio está pensando em mim agora mesmo: os pensamentos se encontram, se tocam, se beijam. Uma paixão sem sexo, sem sentido. Sem vida."
Ela pensa em transformar o chalé em sótão. Ficar morando ali com Bernardo. Pendurar os esboços de tia Dora, ela pinta monstros depois de desenhar anjos.
Ela encontra a veranista, a mulher do morro e percebe que a mulher era Catarina, e era por ela que tinha esperado tanto tempo. Ela dá as mãos a Catarina e juntas descem.



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