AS PESSOAS NÃO EXISTEM

June 5, 2017 | Autor: M. Hernández | Categoria: Dramaturgy, Theatre
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AS PESSOAS NÃO EXISTEM

ABERTURA Música: Gavilan (Interpol)

15 segundos: as cortinas abrem-se, O telão desce, logo o vídeo é projetado. Todos os sete personagens se encontram sentados à mesa. Fernando está no centro. Na ala direita estão Jorge Leopoldo, Crispin e Teófilo. Na ala esquerda estão Narcisa, Francisquinho e Gastão. Todos com suas respetivas xícaras de café e com seus próprios bules. 44 segundos: cabisbaixos, os sete levantam as cabeças lentamente. 50 segundos: todos fazem uma longa rotação de ombros. 58 segundos: as cabeças se posicionam para cima 1 minuto: para baixo 1'02”: para direita. 1'04”: para esquerda. 1'06”: centro. Em seguida todos baixam as cabeças. 1'13”: todos levantam as cabeças lentamente. 1'19”: fazem uma longa rotação de ombros. 1'26”: posicionam as cabeças para cima. 1'28”: para baixo. 1'30”: para direita. 1'32”: para esquerda. 1'34”: centro. 1'40”: todos baixam as cabeças. 2'09”: todos levantam as cabeças lentamente. 2'16”: fazem uma lenta rotação de ombros. 2'23”: posicionam as cabeças para cima. 2'25”: para baixo.

2'27”: para direita. 2'29”: para esquerda. 2'31”: centralizam as cabeças. Logo baixam as cabeças. 2'38”: todos levantam as cabeças. 2'40”: tombam os troncos para o lado esquerdo. 2'45”: centralizam os troncos. 2'52”: posicionam as cabeças para cima. 2'54”: para baixo. 2'56”: para direita. 2'58”: para esquerda. 3 minutos: centralizam as cabeças. 3'06”: Fernando derrama o café da xícara. 3'10”: Jorge Leopoldo faz o mesmo. 3'13”: a vez de Crispin. 3'17”: a vez de Teófilo. 3'20”: a vez de Gastão. 3'24”: a vez Francisquinho. 3'28”: por último, Narcisa. 3'32”: todos colocam as xícaras na mesa. 3'35”: cada um pega o seu bule e derrama o café em sua xícara até transbordar. 4'02”: Fernando joga o café da xícara sobre a mesa, seguido pelos outros que derramam o café das xícaras em direções diversas. Em seguida, todos pegam seus bules e jogam o café um no outro. 4'35”: as luzes se apagam. 5'02”: o ambiente volta a ser iluminado. Todos, limpos e cabisbaixos, em suas respetivas posições. 5'09”: todos levantam as cabeças lentamente. 5'16”: posicionam as cabeças para cima. 5'18”: para baixo. 5'20”: para direita. 5'22”: para esquerda. 5'24”: centralizam, e rapidamente baixam as cabeças. 5'31”: todos levantam as cabeças lentamente. 5'33”: tombam os troncos para direita. 5'38”: centralizam os troncos. 5'44”: todos posicionam as cabeças para cima. 5'46”: para baixo.

5'48”: para direita. 5'50”: para esquerda. 5'52”: centralizam as cabeças. 5'59”: Fernando joga sua xícara no chão. 6'06”: Jorge Leopoldo faz o mesmo. 6'08”: Crispin joga sua xícara. 6'10”: a vez de Teófilo. 6'20”: Gastão joga sua xícara no chão. 6'22”: a vez de Francisquinho. 6'24”: por último, Narcisa. 6'26”: todos suspiram. 6'28”: uma luz vindo do canto esquerdo ilumina, por cima, todos os personagens. 6'30”: todos olham em direção a esta luz. 6'38”: o ambiente se escurece. 6'41”: as cortinas se fecham. 6'49”: encerra a música.

PRIMEIRO ATO

CENA I As cortinas se abrem. Gastão, o advogado, lentamente caminha pelo palco. A luz o acompanha até o centro do palco, onde o homem para. O advogado ouve os sinos da igreja soando, e um forte cheiro de café torrado invade o ambiente. Gastão sente uma sensação de repulsa e, ao mesmo tempo, de admiração pelo lugar. Lugar este, onde o advogado foi contratado para auxiliar no inventário de uma família produtora de café, sendo esta família, quem mais lucra com a cafeicultura na atualidade. O canto direito do palco é iluminado e quatro personagens estão presentes. Gastão os observa, porém todos estão concentrados em seus afazeres. Após ao término da missa de sétimo dia do falecido marido, Narcisa acende uma vela e em seguida reza. Jorge Leopoldo varre o alta da capela e Francisquinho limpa os cálices, enquanto Crispin, sentado, conversa ao celular. Mas o homem sente a presença do advogado e logo olha para trás. Todos, neste momento, veem Gastão os observando. Crispin desliga o celular e levanta-se, em seguida caminha em direção ao advogado. CRISPIN: _ Seja bem-vindo, meu caro advogado. O meu nome é Crispin, irmão do falecido Fernando, o proprietário da fazenda. Ou melhor, o antigo proprietário. GASTÃO: (estende a mão, enquanto é observado pelo primogénito Jorge Leopoldo) _ É um grande prazer estar aqui, meu senhor. Eu farei o melhor serviço possível para auxiliar no inventário de sua família. CRISPIN: (cumprimenta) _ Muito serviço pela frente, meu caro advogado. (sorri ligeiramente) _ Fernando era conhecido como o rei do café, e agora, não mais... (Jorge Leopoldo e Francisquinho se entreolham). GASTÃO: (curioso) _ Desculpe-me minha intromissão... (pega o homem pelo braço e sussurra) _

Qual foi a causa da morte de Fernando? (Narcisa levanta a cabeça e olha fixamente para o advogado). CRISPIN: (sorri por alguns segundos) _ Ele decidiu dar um fim em sua própria vida. Triste, meu caro advogado, mas foi a decisão dele. E nós, da família, temos que aceitar esta realidade. GASTÃO: (observa a viúva contorcer o pescoço, porém esta lança um olhar de reprovação para cima do advogado) _ Eu nunca entendi uma pessoa que faz algo assim... (Jorge Leopoldo baixa cabeça e sorri) _ Mas o que o levou a decidir por isso? (observa a viúva). CRISPIN: (observa o advogado por alguns segundos) _ Nunca saberemos. O motivo foi sepultado junto com ele. E por que saber? (a viúva olha para o irmão do falecido, enquanto é observada por Jorge Leopoldo). GASTÃO: _ Imagino eu que aquela distinta dama deva ser a viúva de Fernando? (aponta para Narcisa). CRISPIN: _ Sim, meu caro advogado. GASTÃO: (caminha em direção à mulher e estende a mão) _ Meus pêsames, minha senhora... (a viúva o observa de cima para baixo calada, mas logo vira o rosto em direção ao altar da capela, onde estão os filhos a observando atentamente). JORGE: (seco) _ Nós sentimos muito falta do nosso falecido pai. Mas a morte faz parte da vida. Todos um dia morrerão. E esta foi a hora de nosso estimado papai. Não é verdade, Tio Crispin? (sorri, e o homem responde também com um sorriso). GASTÃO: (observa o menino com uma certa repulsa) _ É evidente, meu jovem! (vira-se para viúva) _ E senhora, como se sente? (caminha em direção à mulher e tenta tocá-la, porém a viúva, ágil, se afasta do advogado) _ Eu sinto muito, minha senhora... (com olhar de compaixão) _ Eu sinto muito... (os dois meninos se aproximam e Crispin, parado, observa os quatro). NARCISA: (caminha pelo palco e logo para diante de Crispin) _ Fernando era uma pessoa especial. Digamos assim, um ser exclusivo sobre a face da Terra... (vira-se para o advogado) _ Quase perfeito... (sussurra) _ Quase... (olha para os filhos, e estes a observam calados) _ Fernando,

Fernando... (para no meio do palco e põe as mãos na cabeça) _ Mas ele... (os homens e os meninos acompanham com o olhar os movimentos da viúva) _ Mas Fernando... (Jorge Leopoldo observa a mulher com ar de desprezo, porém Gastão com piedade, enquanto Francisquinho e Crispin tentam entender as palavras de Narcisa) _ Ele tinha uma paixão forte, muito forte por cavalos! (arregala os olhos) _ Paixão esta, (sussurra) quase doentia... (caminha pelo palco, e os outros a acompanham atrás) _ Fernando! (para de caminhar e aponta para o canto direito do palco). O canto direito do palco é iluminado, onde está Fernando deitado sobre um cavalo morto. Narcisa caminha em direção ao falecido, e os outros permanecem parados com as testas franzidas. Os personagens observam a viúva estender a mão com o intuito de tocar o falecido marido. Um sentimento de culpa arrebata o coração da pobre mulher. Um som de tiro invade o palco, logo Narcisa esconde os rosto com as duas mãos. Lentamente, a mulher baixa as mãos e vira-se em direção aos quatros. O canto direito do palco se escurece, e em seguida, Narcisa corre para o centro do palco e sorri. NARCISA: (sussurra) _ Quem matou o pobre coitado do cavalo? (sorri cinicamente). Os quatro se posicionam por trás da viúva. Todos observam a plateia, porém neste momento Teófilo entra em cena. Segurando uma bandeja, o empregado oferece café aos cinco. O fundo do palco é iluminado e cada um pega sua xícara, logo, todos sentam-se nas cadeiras localizadas no fundo. As luzes são apagadas.

CENA II O canto esquerdo do palco é iluminado. A passos lentos, Jorge Leopoldo caminha pelo palco. Porém o menino para no centro e sorri ligeiramente com olhar fixo em algo. A luz do canto esquerdo é apagada, em seguida, o canto direito é iluminado. O garoto caminha em direção à escrivaninha. Seus olhos brilham de curiosidade. Lentamente, o menino verifica uma gaveta por vez. Ao abrir a gaveta maior, Jorge Leopoldo encontra uns papéis e documentos. Aguçado por um instinto estranho, o menino pega os papéis e tenta guardá-los em baixo de suas roupas. Neste ínterim o centro do palco é iluminado, onde está Crispin observando os movimentos do sobrinho. CRISPIN: _ O que você está fazendo aqui no quarto de Gastão, Jorge Leopoldo?

JORGE: (assustado, pula e os papéis caem no chão) _ O senhor quer me matar de susto, Tio Crispin? CRISPIN: _ Você não me respondeu, Jorge Leopoldo. O que o mocinho está fazendo aqui? (caminha até o sobrinho e o menino torna-se tenso) _ Por que estes papéis estão no chão? Você pode me explicar, Jorge Leopoldo? (recolhe os papéis) JORGE: (nervoso) _ Estes documentos são do meu interesse. (espreme os lábios) _ Eles dizem ao meu respeito, ao meu futuro... (arregala os olhos) CRISPIN: (irónico) _ Mas o seu futuro não é ir ao mosteiro, Jorge Leopoldo? Segundo a vontade da Senhora Narcisa... JORGE: (grita) _ Calado, estúpido! (o homem se assusta com a audácia do menino) _ Quem traçará meu futuro, será eu mesmo. Por isso, eu necessito saber tudo que ocorre dentro desta fazenda! CRISPIN: (tenso) _ Isto não é assunto para um menino de onze anos. O advogado fará tudo perfeitamente, conforme as leis estabelecidas. Coloque estes papéis de volta de onde o mocinho os pegou. (estende a mão, segurando os documentos) JORGE: (grita) _ Eu não sou seu escravo, idiota! Eu não vou colocá-los de volta, pois eles são meus! Meus! (cruza os braços) CRISPIN: (nervoso) _ Garoto dos infernos... (pega o menino pelo braço, mas este tenta se livrar do tio) _ Você merece um castigo! (agarra novamente o sobrinho e coloca os papéis sobre a escrivaninha) O canto esquerdo é iluminado. Bufando, Crispin arrasta o sobrinho pelo braço até a parte esquerda do palco. CRISPIN: (nervoso) _Você ficará trancado em seu quarto até a hora da janta. Você precisa respeitar os mais velhos! Está me compreendendo, Jorge Leopoldo? Sem dizer uma palavra, o menino lança um olhar de ódio sobre o tio. Porém, Crispin não se intimida e sorri ironicamente para o sobrinho. Após respirar fundo, o homem se retira pelo canto

direito do palco e a luz o acompanha. O canto esquerdo é novamente iluminado. Lá está Jorge Leopoldo segurando um pequeno palhaço de louça. O menino tira a cabeça do boneco e pega uma chave que está dentro do mesmo. Lentamente, Jorge Leopoldo sorri com o olhar direcionado ao canto direito do palco. A luz se apaga. Segundos depois, o canto direito é iluminado. Narcisa se encontra no jardim, cuidando de suas adoráveis rosas. Neste momento, Gastão entra em cena pelo canto esquerdo do palco e a luz o acompanha. O homem se posiciona atrás da mulher, porém esta, concentrada em seus afazeres, não percebe a presença do advogado. GASTÃO: (oferece uma garrafa) _ Gostaria de uma bebida, Senhora Narcisa? Isto fará muito bem a você. NARCISA: (seca) _ Saia do meu jardim, pois você está causando mal estar a minhas rosas! GASTÃO: (insistente) _ Minha senhora, beba isto. (oferece a garrafa novamente) _ Você precisa relaxar por algumas horas. Eu não lhe culpo, pois eu posso lhe compreender muito bem... (sorri) NARCISA: (vira-se para trás e observa o advogado por alguns segundos) _ O que é isto? (arranca a garrafa das mãos do homem) _ Que tipo de bebida é esta? (levanta-se) GASTÃO: (sorri cinicamente) _ Absinto, minha senhora. NARCISA: (franze a testa) _ Absinto?! (observa a garrafa) GASTÃO: (toca nas mãos da viúva) _ Beba, Senhora Narcisa, beba... (abre a garrafa e a leva até os lábios da mulher) _ Beba, minha senhora... você se sentirá bem após um gole desta doce bebida... Narcisa agarra a garrafa e se afasta um pouco. O advogado a observa atentamente. Num gole só, a viúva bebe quase a metade da garrafa. Em seguida, Narcisa joga a garrafa no chão e cambaleando, a mulher olha para suas mãos, logo as vê tremendo. Neste instante, Gastão se aproxima. Com um olhar felino, o advogado sente um desejo incontrolável de possuir a vulnerável viúva. Narcisa caminha em direção ao centro do palco. A viúva para e ri descontroladamente. Sem controle de seus impulsos, o advogado abraça Narcisa por trás. Os dois riem sem parar. Gastão agarra o rosto da viúva e tenta beijá-la. Porém neste momento, o canto esquerdo é iluminado. Lá

está Jorge Leopoldo observando os dois. JORGE: (seco) _ O que está acontecendo aqui? A senhora pode me dizer, mamãe? (grita) _ O que a senhora está fazendo? (os dois se assustam com a presença do menino) NARCISA: (envergonhada, empurra o advogado) _ Nada... (gagueja) _ Na... Nada... Nada grave, Jorge Leopoldo. Está tudo em ordem, meu filho! JORGE: (desconfiado) _ A senhora aparenta estar um pouco bêbada... (aproxima-se) NARCISA: (disfarça) _ Não, eu não estou bêbada. Eu nunca ousaria beber álcool em minha vida. Jamais faria isto, pois eu não sou uma mulher perdida! JORGE: (irónico) _ Sei, mamãe... Eu acredito na senhora... (sorri) GASTÃO: (seco) _ O que o menino faz aqui? Você não é para estar em seu quarto? Todos sabem que você está sob castigo. JORGE: (fuzila o advogado com o olhar) _ Por que você está se intrometendo em assuntos meus? O castigo é meu e não seu! GASTÃO: (responde com um olhar ameaçador) _ Francamente, garoto... você não tem noção nenhuma de respeito aos outros. (sorri artificialmente) Neste momento, Teófilo entra em cena pelo canto esquerdo do palco. A luz acompanha o empregado que está segurando uma bandeja, na qual há três xícaras de café. Teófilo caminha até o centro do palco, logo para e oferece café aos três. TEÓFILO: _ Pelo que eu vejo, vocês precisam de um cafezito para distrair. Gostariam de um? (inclina o corpo e estende a bandeja) Cada um pega uma xícara de café. Com as xícaras em mãos, os três olham para plateia e sincronizadamente bebem o café, enquanto Teófilo, com o corpo voltado para eles, sorri discretamente. As luzes se apagam.

CENA III O centro do palco é iluminado e os seis personagens estão presentes. Todos sentados em suas respetivas cadeiras. Fatigado, Gastão observa os outros, um por vez: Crispin se distrai com o seu celular, lendo e enviando mensagens; Teófilo, bêbado, dormita; Francisquinho se esforça para resolver palavras-cruzadas; Jorge Leopoldo lê um jornal económico e Narcisa, sem nada a fazer, se espreguiça. O olhar do advogado para sobre a viúva. Esta não percebe que está sendo observada. Minuciosamente, Gastão pousa os olhos sobre o corpo da viúva. Sentindo o corpo enfebrecer, o advogado observa as pernas de Narcisa. Neste momento, a viúva reclama do calor e em seguida, se abana com um leque. Delicadamente, Narcisa seca com a mão o suor sobre seu colo. Gastão se arrepia ao olhar para os seios da viúva. Logo o advogado cruza as pernas, com o intuito de ocultar os seus desejos. Porém seus olhos não conseguem se desviar de Narcisa. A mente do advogado cria asas. GASTÃO: (pensa) “Viúva apetitosa! Além de deliciar seu corpo, será muito mais inebriante deliciar sua fortuna. Gastão, o novo rei do café...” NARCISA: (fecha o leque) _ Bem, já são quase nove da noite. Eu tenho que me retirar, pois está na hora da reza do terço. (olha para os familiares, mas ninguém responde) _ Bom, (levanta-se) tenho que ir-me, boa noite... (sob o silêncio dos demais, a viúva se retira pelo canto direito do palco). Sem perceber a ausência de Narcisa, todos continuam com seus afazeres. Menos Gastão, que se sente deslocado por estar no meio da indiferença dos demais. O advogado cruza os braços e fixa o olhar para baixo. Após alguns segundos, no ímpeto, Gastão se levanta. GASTÃO: (finge uma sonolência) _ Bem, eu estou muito cansado. Preciso dormir, pois amanhã eu tenho muito a fazer. (ninguém responde) _ Boa noite a todos... O advogado caminha em direção ao canto direito do palco. Neste instante, os outros interrompem suas atividades e acompanham Gastão com os olhares até o mesmo sair de cena. Em seguida, todos se espreguiçam e pegam as xícaras de café que estão localizadas ao lado de cada cadeira. Logo os quatro bebem o café e as luzes do palco se apagam. O centro do palco volta a ser iluminado. Ao som de “Isis” da banda Yeah Yeah Yeahs, a luz

paira sobre Narcisa, que está ajoelhada rezando o terço. Aos 26 segundos da música, a mulher se benze e senta-se no banco. Durante alguns segundos, Narcisa olha para a plateia. Nos 42 segundos, outra luz paira sobre Fernando, que está sentado no banco e observando a mulher. Durante segundos, Narcisa se sente observada pelo homem, porém esta se recusa a olhar para ele. No 1'02” da música, a mulher contrai os ombros e em seguida, alonga o pescoço por se sentir incomodada. Neste momento, Fernando direciona o olhar para a plateia. No 1'15” da música, o homem retorna a observa Narcisa. Incomodada por estar sendo observada pelo homem durante segundos, no 1'35” da música, Narcisa olha para Fernando, reprovando sua atitude. Rapidamente, o homem direciona a cabeça para a plateia. Narcisa respira fundo e volta a olhar para o público. No 1'48” da música, os dois direcionam as cabeças para o canto esquerdo do palco. No 1'52”, direcionam as cabeças para o canto direito do palco, e 1'56”, os dois direcionam novamente para o canto esquerdo do palco. Nos 2 minutos da música, os dois olham para a plateia. Nos 2'08”, tombam ligeiramente as cabeças para direita e nos 2'12”, tombam as cabeças para esquerda. E por fim, os dois centralizam as cabeças e observam a plateia. Nos 2'21” da música, Fernando volta a observa Narcisa. Esta se incomoda com os olhares do homem, pois nos 2'41” da música, a mulher lança um olhar de reprovação sobre Fernando. Rapidamente, o homem direciona a cabeça para o público, porém nos 2'45” da música, Fernando a responde com um olhar sereno. 2'54” da música, o homem tomba o tronco em direção a Narcisa. 2'58”, a mulher responde também tombando o tronco em direção ao homem, porém com um olhar felino. Nos 3'02”, Fernando não se intimida, e volta a tombar o tronco em direção à mulher. Nos 3' 06” da música, o homem se aproxima de Narcisa. Audacioso, nos 3'10”, Fernando pousa a mão esquerda sobre a coxa da mulher. Esta tira a mão do homem sobre sua coxa. O homem volta colocar sua mão sobre a coxa da mulher. Narcisa tira a mão do homem sobre sua coxa. Insistente, Fernando coloca novamente a mão sobre a coxa da mulher, e esta a empurra. O homem insiste colocar a mão sobre a coxa de Narcisa. Tensa, a mulher empurra novamente a mão de Fernando. Porém o homem agarra a mão de Narcisa. De mãos dadas, os dois olham para lados opostos. Nos 3'35” da música, Fernando põe a delicada mão de Narcisa em seu órgão genital. Estupefacta, a mulher arregala os olhos. Nove segundos depois, Narcisa retira sua pequenina mão sobre o órgão genital do homem. Os dois se entreolham. Nos 3'56”, Narcisa sorri para Fernando. As luzes do palco se apagam.

CENA IV O canto esquerdo do palco é iluminado. Narcisa se encontra sentada numa cadeira. Com os

olhos fechados, a mulher segura o rosário. Porém por detrás da cadeira, Gastão se aproxima e agarra a mulher pelos seios. Assustada, Narcisa abre os olhos. GASTÃO: (sussurra) _ Narcisa das rosas... minha Narcisa... (esfrega o rosto na face da mulher) _ Minha doce rosa, você precisa de alguém que lhe possa proporcionar muitas felicidades. Momentos inesquecíveis... (beija a orelha da mulher). NARCISA: (estupefacta com a ousadia do advogado) _ Respeite-me, cafajeste! (segura as mãos do homem em seus seios) _ O senhor perdeu toda a noção de um bom cavalheiro, o senhor enlouqueceu? Comporte-se, homem! (segura com intensidade as mãos do advogado). GASTÃO: (beija a face da mulher) _ Sim, eu enlouqueci! Você é causa de minha loucura. Eu estou enlouquecido de paixão por você, minha doce Narcisa... (enfia a mão por baixo da roupa da mulher, com o intuito de tocar direto no mamilo) _ Porém, eu não posso e não quero ser curado desta loucura. Eu estou disposto a perder todo o juízo por você! (beija a orelha da mulher). NARCISA: (sorri) _ Cafajeste! O senhor é o ser mais abissal deste mundo! (segura o rosto do advogado) _ Criatura, eu estava a rezar... (mostra o rosário) _ O senhor não respeita mais o sagrado? (deixa o rosário cair no chão). GASTÃO: _ Beije-me, eu estou lhe ordenando! (volta a esfregar o rosto na face da mulher) _ Respeitar o quê?! Pois eu nunca fui adepto destes delírios... eu estou perdido... o que eu perdi, foi a cabeça! Eu estou perdendo a cabeça, o bom senso por você... (sorri) _ Você causa danos em minha mente! (beija o pescoço da mulher). NARCISA: _ O senhor não respeita nada! Nada, cafajeste! (grita, e ao mesmo tempo beija o rosto do homem) _ Maldito, você está condenado a arder no fogo do inferno por sua incredulidade! (beija o queixo do advogado). GASTÃO: (sorri) _ Não me importo... (beija e toca no colo da mulher) _ Eu desejo arder em seu corpo. Seu corpo é mais quente, escaldante como o inferno! Eu estou condenado a arder em seu corpo, minha doce Narcisa... (toca nos seios da mulher) _ Beije-me! NARCISA: (sorri e meneia a cabeça) _ Não! Eu não vou lhe beijar. Eu nunca lhe beijarei!

GASTÃO: (segura a mulher pelos ombros) _ Beije-me agora! Eu estou lhe ordenando! NARCISA: (toca suavemente no peito do advogado) _ Não! Eu não sou sua escrava... eu não sou sua serva... (sorri). GASTÃO: _ Sim, minha doce Narcisa... você é minha serva! Eu sou o seu único senhor. Eu sou o seu Deus! Portanto, obedeça-me e faça que lhe ordenei. Beije-me, agora! NARCISA: (rindo) _ Não delire, homem! Eu jamais lhe beijarei... (beija o advogado). GASTÃO: (segura o rosto da mulher) _ Você é minha! Você me pertence. Eu sou o seu único senhor! NARCISA: (sorri) _ Nunca, eu jamais serei sua! (beija o advogado novamente). GASTÃO: _ Não seja rebelde, minha doce Narcisa... (toca entre as pernas da mulher) _ Uma boa serva nunca se rebela contra o seu senhor! Seja fiel a mim, minha doce rosa! (segura intensamente a coxa da mulher). NARCISA: (segura a mão do advogado sobre a coxa) _ Suas blasfémias soam quase cómico! _ Cafajeste, eu nunca serei sua! (beija o homem) _ Você jamais será o meu senhor... (toca no pescoço do advogado) _ Pecador, afaste-se de mim! (beija o pescoço do advogado). GASTÃO: (toca na parte íntima da mulher) _ Eu não sou pecador! Pois o maior pecado é não poder desfrutar de seus lábios, seu corpo, ou seja, desperdiçar a mais perfeita criatura! Amo-te, Narcisa... Narcisa silenciosamente se levanta. Neste momento, o canto direito do palco é iluminado. A mulher pega a mão do advogado e em seguida aponta para o canto direito do palco. Gastão olha para trás, e vê sobre o ombro Fernando. Este observa o casal serenamente. Ao som de “Lights” da banda Interpol, Narcisa ajoelha-se diante do advogado. Logo, a mulher abraça os joelhos do homem e escorrega até os seus pés. Gastão se ajoelha e levanta delicadamente a cabeça da mulher. Narcisa beija o órgão íntimo do advogado, e este sorri. Sorrindo, os dois se observam por alguns segundos. O advogado pega a mulher pelos braços e a levanta. Neste momento, Fernando caminha aos passos lentos em direção aos dois. Gastão abraça intensamente Narcisa. E esta agarra o advogado pelo pescoço e entrelaça as pernas em sua cintura. Eufóricos, os dois sorriem. Logo Narcisa estende a

mão em direção a Fernando. O falecido se aproxima e pega na mão de sua fiel esposa. Até o fim da música, segurando a mão de Narcisa, Fernando dança todo sorridente, enquanto a viúva e o advogado se beijam. As luzes do palco se apagam.

CENA V O centro do palco é iluminado. Na manhã seguinte, Crispin e seus sobrinhos estão à mesa para o dejejum. Teófilo, o empregado, serve o café para os três. Neste instante, Gastão entra em cena todo sorridente. GASTÃO: (senta-se na cadeira) _ Bom dia a todos. Eu espero que todos vocês tiveram uma excelente noite de sono... (Teófilo serve café ao advogado e este sorri, enquanto é observado por Jorge Leopoldo e Francisquinho). CRISPIN: (admirado) _ Pelo que eu percebo, o senhor advogado teve uma excelente noite, ou não? (Francisquinho e Jorge Leopoldo se entreolham). GASTÃO: (sorri com canto direito dos lábios) _ Sim, meu caro Crispin. Eu tive uma serena noite de sono. Muito serena e ardente noite... (Crispin franze a testa) _ Pois... (disfarça) nós estamos em pleno verão. Noites quentes são comum nesta estação... CRISPIN: (meneia a cabeça) _ Claro, meu caro advogado... (Jorge Leopoldo lança um olhar ameaçador para cima de Gastão, porém este tampouco percebe). Neste momento, Narcisa entra em cena. NARCISA: _ Bom dia, meus amados... (senta-se à mesa e Teófilo serve café a viúva, enquanto Jorge Leopoldo se espanta com o sereno semblante da mãe). CRISPIN: (admirado) _ Outra?! Ao meu ver, Senhora Narcisa, a senhora teve uma excelente noite de sono, imagino eu? NARCISA: (olha para o advogado) _ Sim, Crispin. Eu tive uma tranquila e inesquecível noite! (bebe o café) _ Há meses que eu não tenho uma formidável noite... (sorridente, olha para o

advogado, e este a responde com um largo sorriso). CRISPIN: _ Perfeito, parece-me que a última noite foi ótima para todos! (bebe o café, enquanto Jorge Leopoldo reprova com o olhar as palavras da mãe e do tio). JORGE: (olha para Francisquinho, logo este baixa os olhos em direção à mesa) _ Bom... (respira) _ Eu estou muito contente em ver que os senhores estejam bem após uma excelente noite, (seco) uma excelentíssima noite... (lança um olhar ameaçador para cima de Gastão. Porém o advogado pouco se importa com o menino). CRISPIN: (surpreso) _ Jorge Leopoldo, nunca imaginei lhe ver dizer algo assim! (sorri discretamente). JORGE: (olha para Teófilo, e este aponta com olhos para a viúva e o advogado, que estão trocando olhares picantes entre si) _ Bom... (bufa e vira-se para o tio) _ Eu sempre desejei o bem de todos. (irónico) _ Nós todos somos uma família, ou não, meu caro tio Crispin? CRISPIN: (desconfiado) _ Claro, Jorge Leopoldo, claro... (observa a viúva e o advogado, logo sorri cabisbaixo). Crispin pega sua xícara de café, seguido por todos, incluindo Teófilo. Sincronizados, cada um com sua xícara em mãos, bebe o café. A luz do centro do palco é apagada. Após 30 segundos, o canto esquerdo do palco é iluminado. Lá está Jorge Leopoldo observando algo com os olhos repletos de malícia. Após 30 segundos, a luz do canto esquerdo é apagada, porém o centro do palco é iluminado. Lá está Narcisa se espreguiçando na cadeira. Segurando o rosário, a viúva se benze. Após 30 segundos, a luz do centro do palco é apagada. Quinze segundos depois, o centro do palco é novamente iluminado. Com o rosário em volta do pescoço, Narcisa falece. Jorge Leopoldo pousa a cabeça sobre os joelhos da falecida mãe. Lágrimas escorrem pelo pequenino rosto do garoto. Entretanto, Jorge Leopoldo se levanta e caminha em direção à plateia. Com o olhar fixo no horizonte, o garoto seca as lágrimas e em seguida, sorri cinicamente. Jorge Leopoldo ajeita o seu pequeno paletó e caminha em direção ao canto direito do palco. A luz acompanha o menino até a sua saída de cena, deixando para trás Narcisa, com um semblante sereno, morta na cadeira. As luzes do palco se apagam.

SEGUNDO ATO

CENA I O centro do palco é iluminado. Crispin e seus sobrinhos se benzem e logo fecham o caixão, no qual descansa Narcisa eternamente. Neste momento, o canto esquerdo do palco é iluminado. Lá está Gastão, embriagado, com o braço direito estendido em direção ao centro do palco. CRISPIN: (aproxima-se do advogado) _ É uma lástima, meu caro advogado, pois o velório chegou ao fim e temos que sepultá-la imediatamente. (Jorge Leopoldo e Francisquinho se entreolham sorridentes). GASTÃO: (meneia a cabeça e lança um olhar furioso sobre Jorge Leopoldo) _ Não me importo... Não me interessa ver Narcisa como uma defunta. Eu prefiro guarda sua imagem enquanto estava viva. CRISPIN: (observa o advogado com compaixão) _ Eu lhe entendo, estimado advogado... (Jorge Leopoldo sorri cabisbaixo) _ Ela agora está em paz... (abraça o advogado, e este observa o primogénito com fúria) _ Narcisa descansará ao lado de Fernando. Ambos interromperam suas próprias vidas... (abraça com intensidade o advogado, e este ameaça Jorge Leopoldo com o olhar, porém o garoto o responde com um sorriso cínico). GASTÃO: (cabisbaixo) _ É triste saber que jamais verei Narcisa... Crispin levanta a cabeça do advogado lentamente e aponta para o canto esquerdo do palco. Imediatamente este canto do palco é iluminado. Todos veem Narcisa com uma xícara de café em mãos. Estupefacto, Gastão caminha em direção à viúva, e esta sorri para o advogado. Os meninos caminham em pequenos passos até Crispin. Logo eles se posicionam por trás do tio, e os três observam atentamente o advogado e a viúva. Com os olhos lacrimosos, Gastão observa Narcisa por inteiro. Seus olhos pousam nos seios da viúva. Narcisa sorri e estende os braços, oferecendo a xícara ao advogado. Gastão estende o

braço em direção à xícara, com o intuito de pegá-la e tocar nas mãos da viúva. Entretanto, o advogado baixa o braço e caminha um passo para trás. Por alguns segundos, Gastão observa o chão do palco, enquanto os quatros tombam a cabeças para direita, tentando entender o que passa na mente do pobre advogado. Gastão levanta a cabeça e sorri. Em seguida, o advogado se retira pelo canto esquerdo do palco sob os olhares dos quatros personagens. As luzes se apagam.

CENA II O canto esquerdo do palco iluminado. Jorge Leopoldo estica o pescoço para observar melhor algo. Neste momento o centro do palco é iluminado. Lá está Francisquinho dormindo serenamente na cadeira. O primogénito caminha às pressas em direção ao pequeno irmão. JORGE: (sacode o irmão) _ Acorda, Francisquinho, acorda por favor... (o benjamim abre os olhos e esfrega-os com intensidade) _ Precisamos sair agora, venha! (Francisquinho olha para Jorge Leopoldo, querendo saber o porquê) _ Venha logo! Temos que ir agora... Jorge Leopoldo pega o irmão pelo braço e os dois caminham em direção ao canto direito do palco. A luz os acompanha. Os dois irmãos param e viram-se para o lado oposto. Durante alguns segundos, em silêncio, os meninos observam a parte escura do palco. A luz se apaga, porém segundos depois, todo o palco é iluminado. À procura de Crispin, os dois irmãos deparam com uma pequena festa em um lugar, que aparenta ser um refúgio de pessoas excluídas por motivos diversos. Uma bandeira negra rasgada decora o ambiente, e ao lado, um retrato de Che Guevara quase desprendendo. Os dois meninos caminham entre os homens, que conversam e bebem sem perceber a presença dos pequenos irmãos. Os dois observam a única jovem da festa, que traje um vestido curto e amarelo, descansando na poltrona. Próximo à poltrona, está Teófilo, bêbado, caído sobre uma cadeira. Do outro lado está Gastão, discursando para um grupo de jovens. Sobre os ombros, o advogado vê os dois irmãos. Gastão os observa por alguns segundos, mas logo volta a discursar. No fundo do palco, encontra-se Crispin, jogando cartas com alguns homens mais velhos. Os dois irmãos caminham em direção ao tio, e este logo interrompe o jogo e observa os sobrinhos durante alguns segundos. Crispin pega o seu celular no bolso e mostra a hora na tela do telefone para os irmãos. Os sobrinhos se mantêm calados. O homem guarda o celular no bolso e se espreguiça. Neste momento, Teófilo se levanta e liga um rádio que estava debaixo da poltrona.

Ao som de “Rich” da banda Yeah Yeah Yeahs, Jorge Leopoldo sobe em cima da mesa, a qual jogavam Crispin e seus companheiros cartas. Com um sorriso malicioso, o garoto ajeita o seu elegante paletó. Nos 22 segundos da música, Jorge Leopoldo balança a cabeça e dubla canção que rola por todo ambiente. Neste instante, todos param e observam o garoto. Nos

59

segundos

da

música, Jorge Leopoldo dança freneticamente. Logo a jovem se levanta, e em pé sobre a poltrona, dança sensualmente. Neste momento, Francisquinho se aproxima dela e a observa boquiaberto. O pequenino se delicia ao ver a jovem dançando. Bêbado, Teófilo tenta acompanhar a música. O empregado se extravasa ao dançar, sem se importar com as pessoas presentes na monótona festa. No 1'26” da música, Jorge Leopoldo aponta o braço em direção a Gastão. Sorrindo com os olhos, o garoto observa o advogado enquanto dubla a canção. Gastão, por sua vez, observa calado o menino. Neste momento, o advogado se sente atraído pelo garoto. Sem como explicar, Gastão se hipnotiza por Jorge Leopoldo. Porém Crispin, enciumado, ameaça a se levantar. Mas logo o homem se recua e lança um olhar de reprovação para cima do advogado. Nos 2'10”, Jorge Leopoldo se balança freneticamente, enquanto Teófilo berra e dança como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. Empolgada, a jovem permite que Francisquinho se aproxime. Balançando as cadeiras, a jovem seduz o pobre pequenino, e este tenta beijar as pernas de sua primeira amada. Nos 2'53” da música, Jorge Leopoldo segura em sua gravata borboleta e fixa o olhar sobre Gastão. E este responde ao garoto com um sorriso. Sorrindo, os dois trocam olhares. E Crispin, ao ver os dois, se irrita. Contudo, o homem só os observa todo embirrado. Nos 3'20” da música, Jorge Leopoldo senta-se na mesa, sem desviar o olhar sobre o advogado. Neste momento, todos se aproximam lentamente do garoto. Jorge Leopoldo cruza as pernas sobre a mesa, e em seguida, pega uma xícara de café das mãos de um homem velho e a leva até os lábios. As luzes do palco se apagam.

CENA III O canto do palco esquerdo é iluminado. Deitado sobre a cama, Jorge Leopoldo se desperta de repente. Logo o garoto se levanta às pressas. Desconfiado de algo, Jorge Leopoldo ajeita o paletó e observa a plateia por alguns segundos. Em seguida, o garoto caminha em direção ao centro do palco, e a luz o acompanha. Neste momento a luz do canto esquerdo é apagada e o canto direito é iluminado. Lá está Francisquinho, estendido no chão. O irmão mais velho corre para saber o que

ocorreu com o mais novo. Neste instante, a luz do centro do palco é apagada. Jorge Leopoldo ajoelha-se e observa, atónito, o corpo do falecido irmão. O garoto toca suavemente na face do pequenino irmão. Sem derrama uma lágrima, Jorge Leopoldo se entristece e retorna a observar, todo frustrado, o corpo de Francisquinho. Neste ínterim, o centro do palco é novamente iluminado. Jorge Leopoldo olha para trás e vê Gastão, imóvel, o observando. Os dois se entreolham por alguns segundos. Porém o advogado se aproxima de Jorge Leopoldo, e este se levanta lentamente. Os dois novamente se entreolham por alguns segundos. Suavemente, Gastão pega o revólver do bolso de seu paletó, e em seguida, encosta a arma na testa de Jorge Leopoldo. Sem expressar medo, o garoto fecha os olhos e sorri. Imediatamente as luzes se apagam e um som de disparo invade o palco. Segundos depois, o centro do palco é iluminado. Crispin se encontra, dormindo, numa cadeira. Uma jovem se aproxima por trás e toca no braço do homem. Logo este se desperta. Neste instante, o canto esquerdo do palco é iluminado. A jovem aponta para cama, na qual estão Jorge Leopoldo e Francisquinho repousando. Por alguns segundos, ao dois observam os corpos dos meninos. Lentamente, Crispin se levanta e confirma com a cabeça para a jovem o reconhecimento dos sobrinhos. Neste momento, soa a canção “All the rage back home” da banda Interpol por todo o palco. Aos passos lentos, a jovem se afasta pelo fundo do palco até sumir entre as sombras. A luz do canto esquerdo se apaga. Crispin, direcionado para plateia, sorri com o olhar fixo no horizonte. Em seguida, o homem coloca as mãos nos bolsos das calças e se retira serenamente pelo canto direito do palco. A luz o acompanha até a sua saída de cena. Fecham-se as cortinas.

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