AS RELAÇÕES DE TRABALHO DOMÉSTICO E O ESTADO BRASILEIRO: QUANDO UM ‘E-SOCIAL’ ESTRAGA TUDO!

June 15, 2017 | Autor: Tercio Souza | Categoria: Direito do Trabalho, Trabajo doméstico
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AS RELAÇÕES DE TRABALHO DOMÉSTICO E O ESTADO BRASILEIRO: QUANDO UM 'E-SOCIAL' ESTRAGA TUDO!

Tercio Souza. Advogado. Membro do Instituto dos Advogados da Bahia. Associado da ABAT – Associação Baiana dos Advogados Trabalhistas.

Há tempos a sociedade brasileira reclama um tratamento adequado das relações de trabalho doméstico. Mesmo a democrática Constituição de 1988, em sua redação original, ainda trouxe consigo algumas restrições aos milhares de trabalhadores do lar, distinguindo-os dos demais trabalhadores brasileiros, já que não conferiu àqueles que trabalham no ambiente doméstico os mesmos direitos daqueles que executam as suas atividades em outros locais, embora todos os trabalhadores, em essência, estejam sujeitos às mesmas condições.
Apenas em 2013, ou seja, mais de 20 (vinte) anos depois da Carta Magna, com o advento da Emenda Constitucional nº 73, passamos por alguns ajustes de rota, visando justamente uma equivalência dos trabalhadores domésticos aos demais trabalhadores brasileiros. A partir daquele instante foram previstos diversos direitos em favor dos trabalhadores do lar, equiparando aqueles, no tocante a várias parcelas, aos demais empregados. Depois da aludida Emenda, passamos por todo um processo legislativo para, em Junho de 2015, termos editada a Lei Complementar nº 150, que dispõe justamente sobre o contrato de trabalho doméstico, em que, mais uma vez, se buscou a aludida equivalência. Seria, enfim, a equivalência dos direitos dos trabalhadores domésticos.
De antemão, podemos dizer que as mudanças ocorridas diretamente nos contratos de trabalho mantidas entre empregadores e empregados domésticos impõe alterações no comportamento das partes, mas o incremento daqueles tão esperados direitos, em regra, necessariamente não demandam a adoção de maiores formalidades por parte do empregador, mesmo porque, contratualmente as relações do trabalho estão assentadas sob a lógica daquilo o que se denomina do 'contrato realidade', ou seja, vale aquilo o que é efetivamente praticado pelas partes.
Todavia, parafraseando Willian Shakespeare, somos obrigados a mencionar que entre a teoria e a prática há mais coisas do que supõe a nossa vã filosofia. E entre a definição de direitos e a implementação desses mesmos direitos, vão surgindo uma série de questões, que jamais seriam imagináveis, à nossa vã filosofia.
O incremento de direitos, que seria motivo de comemoração para todos, passou a ser uma imensa dor de cabeça para empregadores, em todo o país, o que se agudizará no próximo dia 30 de novembro. Isso porque, o Governo Federal, no afã de permitir o recolhimento do FGTS e das contribuições previdenciárias, obrigações a serem satisfeitas pelos empregadores, mas através do Estado brasileiro, embora inerentes a qualquer contrato de trabalho, acabou por impor a todos os empregadores obrigações até então inexistentes: exigiu-se o registro dos empregadores e dos trabalhadores, no sistema governamental denominado "e-social", através do qual se impôs a prestação de uma série de declarações e informações, sob pena das mais variadas cominações, e cujo prazo se encerrará no mesmo dia 30 de novembro.
Além de ruim, o sistema retrata qual é o grande rival das relações de trabalho: o Estado brasileiro. Por exemplo, além das dificuldades 'normais', algum burocrata fez com que no aludido sistema fossem os empregadores obrigados a prestar diversas informações, muitas das quais de posse da própria administração pública, como alguns dados disponibilizados pelo próprio INSS, ou pior, o empregador é obrigado a preencher informações sem qualquer serventia para os empregados e empregadores, como por exemplo, a cor do empregado, ou a sua escolaridade, ou mesmo o seu e-mail, no aludido sistema. Afinal, qual a importância daqueles dados para as partes contratante e contratada? Certamente, nenhuma.

O Estado brasileiro, ao tornar complexo o que é simples, e ao obrigar a todos a prestarem informações inúteis aos verdadeiros interessados, mostra quem está a serviço de quem: o Estado não está disposto a facilitar a vida de quem quer que seja, muito menos permitir a exoneração de responsabilidades ou o cumprimento de obrigações por parte de quem as deve. Prefere caminhar no sentido inverso, o de que caberá também aos empregadores domésticos, pessoas físicas, as mesmas dificuldades enfrentadas pelos demais empregadores deste país, imersos em um imenso cipoal de sistemas, siglas, obrigações acessórias e recolhimentos, tudo para alimentar uma máquina burocrática ineficiente e redundante, que insiste na colheita de informações que não usa e por certo jamais usará. Enquanto isto, os reais interessados na aludida relação contratual, sejam os empregados ou os empregadores, que viam nos avanços legislativos uma perspectiva de avanço social, verão, mais uma vez, apenas um incremento burocrático, sem sentido. Enfim, parece que erramos mais uma vez!

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