AS TRANSFORMAÇÕES NA COMUNICAÇÃO E AS DISPUTAS POR HEGEMONIA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO (2003 – 2014)

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Sobre as concepções de esquerda e direita no jogo político, ver: BOBBIO, Norberto. Direita e esquerda: Razões e significados de uma distinção política. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1995.
KECK, Margaret E. PT: A lógica da diferença. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2010.
Em 1989, Collor foi eleito com 53% dos votos no segundo turno, contra 47% de Lula. Ver: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/09/especial-25-anos-das-eleicoes-de-1989.html (Acesso em 15/07/2015 às 01:08)
Em 2014, Dilma Rousseff foi eleita com 51,65% dos votos, enquanto Aécio Neves obteve 48,35%. Ver: http://www.eleicoes2014.com.br/ (Acesso em 15/07/2015 às 01:09)
PAULINO, Robério. Socialismo no século XX: O que deu errado? 2. ed. São Paulo: Letras do Brasil, 2010. p. 350.
A "Carta ao povo brasileiro", considerada por muitos uma carta ao mercado financeiro, pode ser acessada em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u33908.shtml (acesso em 15/07/2015 às 01:10)
In: DEMIER, Felipe: As transformações do PT e os rumos da esquerda no Brasil: entrevistas com Babá; César Benjamin; Luciana Genro; Marcelo Badaró Mattos; Valério Arcary; Virgínia Fontes; Zé Maria. Rio de Janeiro, Bom Texto, 2003.
Idem, p. 17
A empresa canadense do ramo farmacêutico Apotex, por exemplo, estampava em seu anúncio na página 15 do dia 2 de janeiro de 2003 os seguintes dizeres: "Senhor presidente: que o seu governo faça tão bem para a população como os nossos medicamentos genéricos. ". Uma outra empresa, Colonial Lustres, estampava um anúncio menor na página 9 cujo título era "Bem-vindo Lula presidente. ". As edições de janeiro de 2003 de O Globo podem ser acessadas em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=2000200301 (Acesso em 15/07/2015 às 01:11)
Em sua coluna na página 4, Márcio Moreira Alves, por exemplo, destacava que a maior alegria cívica para 53 milhões de brasileiros naquela virada de ano era a posse de Lula e José Alencar.
LIMA, Venício. Regulação das comunicações: História, poder e direitos. São Paulo: Paulus, 2011.
A constituição federal brasileira pode ser acessada em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:14)
LIMA, Venício. Política de Comunicações: Um balanço dos governos Lula [2003 - 2010]. São Paulo: Publisher Brasil, 2012, pp 25-26.
MATOS, Carolina. Mídia e política na América Latina: Globalização, democracia e identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2013.
Idem, p.150
MORAES, Dênis de. Vozes abertas da América Latina: Estado, políticas públicas e democratização da comunicação. Rio de Janeiro, Mauad X/FAPERJ, 2011.
Idem, p. 40.
PIERANTI, Octavio Penna. Políticas públicas para radiodifusão e imprensa: Ação e omissão do Estado no Brasil pós-1964. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.
Considerado um dos principais pensadores marxistas da primeira metade do século XX, Gramsci é uma referência fundamental no que diz respeito à concepções sobre o Estado e política. Ver: HOBSBAWM, Eric. Como mudar o mundo: Marx e o Marxismo, 1840-2011. 2. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 285-301.
FONTES, Virgínia. Intelectuais e mídia: Quem dita a pauta? In: COUTINHO, Eduardo Granja et al. Comunicação e contra-hegemonia: Processos culturais e comunicacionais de contestação, pressão e resistência. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2008. p. 145.
O Globo, fundado em 1925 pelo jornalista Irineu Marinho, tornou-se um dos mais conhecidos jornais do Brasil. No momento em que escrevo este trabalho, é o quarto maior jornal em circulação do país. Ver: TRISTÃO, Marisa Baesso; MUSSE, Christina Ferraz. O direito à informação e o (ainda restrito) espaço cidadão no Jornalismo Popular impresso. Revista Brasileira de Ciências da Comunicação: Intercom. São Paulo, v. 36, n. 1, p. 39-59. 01/2013. p. 48
Brasil de Fato foi fundado em 2003, como fruto das discussões do Fórum social mundial, realizado em Porto Alegre. Trata-se de um jornal de circulação semanal a nível nacional oriundo do trabalho de movimentos sociais como o MST e a Via Campesina.
MORAES, op. cit. 2011.
LIMA, op. cit. 2011.
O conceito "coronelismo eletrônico" utilizado por Lima advém da obra de Victor Nunes Leal, "Coronelismo, enxada e voto", referência para a historiografia brasileira sobre a 1° república (1889-1930). Por esse termo, podemos entender que se trata de um fenômeno ocorrido na sociedade brasileira a partir da segunda metade do século XX no qual oligarquias regionais lançam mão do Estado para adquirir concessões de radiodifusão com o intuito de utilizarem tais concessões na tentativa de garantir eleições e reeleições, isto é, a sua perpetuação dentro do aparelho de Estado. Ver: LIMA, op. cit. 2011, pp. 103-148.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere: Volume 3. Maquiavel. Notas sobre o Estado e a política. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
Vale lembrar que a maioria da classe trabalhadora brasileira é negra, então, nem sempre ambas as categorias estão separadas.
MELO, Carlos Ranulfo; ANASTASIA, Fátima. A reforma da previdência em dois tempos. DADOS: Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, v. 48, n. 2, p. 301-332. 2005
Idem, p. 309.
João Batista Oliveira de Araújo, o Babá, é engenheiro mecânico e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No momento em que este trabalho é escrito, exerce mandato de vereador na capital fluminense pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), do qual ele é um dos fundadores.
Luciana Krebs Genro é filha do ex-governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro. Exerceu mandatos na Assembleia Legislativa de seu Estado e foi deputada federal de 2003 a 2010. Em 2014, foi candidata à presidência da República pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), obtendo pouco mais de 1 milhão e 600 mil votos.
Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho é profissional da área de enfermagem. Assim como Babá e Genro, ajudou a fundar o Partido Socialismo e Liberdade, pelo qual foi candidata à presidência da república no pleito de 2006, no qual obteve cerca de 6 milhões e 500 mil votos. No momento em que este trabalho é escrito, exerce mandato de vereadora na cidade de Maceió. Há indícios, por parte da própria, que ela deve deixar o PSOL e colaborar com a formação de uma nova legenda, a Rede Sustentabilidade.
MELO & ANASTASIA, op. cit. 2005, p. 308
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020030103 (Acesso em 15/07/2015 às 01:20)
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020030105 (Acesso em 15/07/2015 às 01:20)
O nome do(a) autor(a) do texto não foi divulgado.
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020030108 (Acesso em 15/07/2015 às 01:22)
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020030109 (Acesso em 15/07/2015 às 01:22)
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020030110 (Acesso em 15/07/2015 às 01:23)
MELO & ANASTASIA, op. cit. 2005.
Idem. p.302
É necessário ressaltar que uma parcela dos servidores se viam representados por estes parlamentares. A intenção não é apontar uma contradição entre os parlamentares da esquerda do PT e a luta dos servidores, mas sim destacar a quem O Globo deu mais visibilidade.
MIOLA, Edna. Representações do jornalismo sobre a radiodifusão pública: o debate em torno da criação da Empresa Brasil de Comunicação na imprensa. Revista Compolítica, n. 2, vol. 1, ed. set-out, ano 2011, pp. 41-42
GRAMSCI, op. cit. 2000.
O Estado é responsável, entre outras coisas, pela manutenção da propriedade cruzada dos meios de comunicação e por garantir grande parte de verbas publicitárias para estes meios.
GRAMSCI, op. cit. 2000, p. 21
Idem.
MIANI, Rozinaldo Antonio. Imprensa das classes subalternas: atualização e atualidade de um conceito. Em Questão, Porto Alegre, v. 16, n. 1, p. 193-208, jan. /jun. 2010. p. 202
Os exemplos de A lanterna, durante a primeira república e Opinião, durante a ditadura empresarial-militar são apenas alguns de variados exemplos que podem ser pesquisados. Ver: FERREIRA, Maria Nazareth. A imprensa operária no Brasil (1880 – 1920). Petrópolis, Vozes, 1978, e MACHADO, J. A. Pinheiro. Opinião x Censura: momentos de luta de um jornal pela liberdade. São Paulo, L&PM, 1978.
http://issuu.com/brasildefato
A reportagem pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_025 (Acesso em 15/07/2015 às 01:24)
A reportagem pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_002 (Acesso em 15/07/2015 às 01:24)
BOSCHETTI, Ivanete. Implicações da reforma da previdência na securidade social brasileira. Psicologia & Sociedade; 15 (1): 57-96; jan. /jun.2003
Outros países fora do continente americano aboliram a escravidão oficialmente depois do Brasil. Os casos mais recentes são o do Paquistão, que aboliu a escravidão por dívidas no ano de 1992, e o da Mauritânia, onde esse tipo de regime de trabalho foi abolido em 1985. Ver: PÉTRÉ-GRENOUILLEAU, Olivier. A história da escravidão. São Paulo, Boitempo, 2009.
Sobre as condições de vida e a atuação dos libertos no pós-abolição, ver: RIOS, Ana Maria; MATTOS, Hebe Maria. O pós-abolição como problema histórico: Balanços e perspectivas. Topoi, v. 5, n. 5, p. 170-198. 01/2004. Disponível em: http://www.revistatopoi.org/numeros_anteriores/Topoi08/topoi8a5.pdf. Acesso em: 27/07/2015
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020090202 (Acesso em 15/07/2015 às 01:26)
Não há identificação de quem escreveu tal texto.
Professor de História e então vice-líder do governo no congresso nacional.
Na página onde constam os textos, acima do primeiro é possível verificar que há os dizeres "Nossa opinião", e acima do texto de Gilmar Machado está escrito "Outra opinião".
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020090205 (Acesso em 15/07/2015 às 01:26)
Sociólogo e doutor em geografia humana pela Universidade de São Paulo (USP).
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020090209 (Acesso em 15/07/2015 às 01:27)
KAMEL, Ali. Não somos racistas: uma reação aos que querem nos transformar numa nação bicolor. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2006.
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020090317 (Acesso em 15/07/2015 às 01:28)
O(a) autor(a) do texto não foi identificado
Então ministro da igualdade racial.
Ex-editor de opinião de O Globo.
Colunista de O Globo.
Administrador de empresas.
Então deputado federal pelo PMDB do estado de Pernambuco
Economista ligado ao Instituto Millenium. No momento em que tal trabalho é escrito, trabalha como colunista da Revista Veja.
Revista anexa ao jornal.
Então presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), militante do Partido Comunista do Brasil (PC do B).
Repórter de O Globo.
Mestre em direito, ligada ao instituto Millenium.
DOMINGUES, Petrônio. Ações afirmativas no Brasil: O início de uma reparação histórica. Revista brasileira de educação, n. 29, p. 164-177. 05/2005.
Idem, p. 165
Ibidem.
A edição do jornal pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_343
Então diretor de graduação da faculdade de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do Movimento Negro do Rio.
Membro do conselho geral da União de Núcleos de Negros e Classe Trabalhadora (Uneafro).
DOMINGUES, op. cit. 2005, p. 168.
MIOLA, op. cit. 2011, p. 36
Idem.
A Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto foi a organização social responsável pela criação da TVE do Rio de Janeiro em 1969. Em sua produção, historicamente, prezou pela difusão de conteúdo audiovisual de cunho educativo.
Empresa pública, fundada em 1975, que tinha como objetivo gerir as emissoras de radiodifusão pertencentes ao governo federal.
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020071026 (Acesso em 15/07/2015 às 01:29)
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020071031 (Acesso em 15/07/2015 às 01:29)
MIOLA, op. cit. 2011, pp. 42-43.
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=200020081030 (Acesso em 15/07/2015 às 01:29)
LIMA, op. cit. 2011.
MIOLA, op. cit. 2011.
MORAES, op. cit. 2011.
LIMA, op. cit. 2011.
MIOLA, op. cit. 2011.
A reportagem pode ser encontrada em: issuu.com/brasildefato/docs/bdf_221 (Acesso em 15/07/2015 às 01:30)
A edição do jornal pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_229 (Acesso em 15/07/2015 às 01:30)
Esta edição do jornal pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_246 (Acesso em 15/07/2015 às 01:31)9
Professor da pós-graduação em comunicação da Universidade do Vale do Rio Sinos (Unisinos/RS)
Professor do laboratório de políticas de comunicação da Universidade de Brasília (UNB)
A jornalista responsável por ela é Mayrá Lima, do Distrito Federal.
A edição 248 de Brasil de Fato pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_248 (Acesso em 15/07/2015 às 01:31)
Ex-governador de São Paulo, membro do DEM, advogado e professor de direito da Universidade de São Paulo
Ex-ministro da fazenda, foi um dos principais formuladores da política econômica da ditadura empresarial-militar brasileira, responsável, entre outras coisas, por um aumento na concentração de renda no país.
Empresária, então integrante do conselho consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico Nacional.
Mais conhecido como Boni, empresário e consultor da Rede Globo de comunicações.
Biofarmacêutica, famosa por dar nome a uma lei que leva seu nome, que visa proteger as mulheres que sofrem violência doméstica.
Carnavalesca ligada ao G.R.E.S. Imperatriz Leopoldinense, localizada no bairro de Ramos, zona norte do Rio de Janeiro.
Economista e professor da Unicamp, viria posteriormente a se tornar presidente da Sociedade Esportiva Palmeiras, um dos clubes mais populares do estado de São Paulo.
Então presidente da Organização dos professores indígenas do Acre, membro da tribo Ashaninka.
Engenheira agrônoma e doutora em ecologia. Pesquisadora da biodiversidade na Amazônia.
Professor de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Então diretora da Rede Sarah de hospitais.
Rapper, membro da Central Única das Favelas (CUFA). Ficou famoso por dirigir o documentário "Falcão: meninos do tráfico", que fala sobre a vida de jovens favelados que entram para o mundo do crime.
Advogado e Jornalista, dirigia a Empresa Brasileira de Notícias na época do governo Sarney.
Professor aposentado do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Engenheiro mecânico que esteve historicamente ligado a empresas de fabricação de ônibus e carrocerias.
A reportagem pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/busca/?tipoConteudo=pagina&ordenacaoData=relevancia&allwords=Cria%C3%A7%C3%A3o+da+EBC&anyword=&noword=&exactword=&decadaSelecionada=2000 (Acesso em 15/07/2015 às 01:32)
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_249 (Acesso em 15/07/2015 às 01:32)
Dentro da perspectiva teórica aqui adotada, acredita-se que é impossível que qualquer veículo de comunicação seja completamente imparcial. Ver: FONTES, op. cit. 2008.
As informações são do site da BBC e podem ser encontradas em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2015/04/150429_divulgacao_pnad_ibge_lgb (Acesso em 15/07/2015 às 01:33)
SAMPAIO, Rafael Cardoso; BRAGATTO, Rachel Callai; NICOLÁS, Maria Alejandra. Inovadora e democrática. Mas e ai?: Uma análise da primeira fase da consulta online sobre o Marco Civil da Internet. Curitiba: V Congresso da Compolitica, 2013.
Tal apelido fazia menção ao Ato Institucional n° 5 da ditadura civil-militar brasileira, responsável pela cassação de diversos direitos civis dos brasileiros. O PL 84/99 previa, entre outras medidas, a criminalização de uma série de ações corriqueiras feitas pelos internautas brasileiros, como fazer download de álbuns sem o pagamento de direitos autorais.
O texto do Marco Civil da Internet pode ser acessado em: http://www.camara.gov.br/sileg/integras/912989.pdf
A matéria pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/busca/?tipoConteudo=pagina&ordenacaoData=relevancia&allwords=Marco+Civil+da+Internet&anyword=&noword=&exactword=&decadaSelecionada=2010&anoSelecionado=2013&mesSelecionado=6 (Acesso em 15/07/2015 às 01:34)
A edição pode ser encontrada em: http://acervo.oglobo.globo.com/consulta-ao-acervo/?navegacaoPorData=201020130624 (Acesso em 15/07/2015 às 01:34)
A Associação Internacional de Radiodifusão reúne representantes de empresas de rádio e televisão das Américas, da Ásia e da Europa.
A Associação Brasileira de Internet é uma entidade responsável por reunir as empresas provedoras de serviços de internet no país.
A Agência Nacional de Telecomunicações é a agência reguladora dos serviços de telefonia e internet no Brasil.
A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão foi fundada à época da formulação do Código Brasileiro de Telecomunicações na década de 60. Segundo Lima, a associação transformou-se em uma das principais representantes dos interesses da Rede Globo no país.
No momento em que este trabalho é escrito, Eduardo Cunha é presidente da Câmara dos deputados.
Organização que possui como pauta principal a democratização do sistema de mídia no Brasil. Reúne ativistas e profissionais envolvidos nesta causa.
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação reúne diferentes organizações e movimentos sociais que lutam pela causa desde a década de 1990.
GRAMSCI, op. cit. 2000, p. 21.
http://www.brasildefato.com.br
Sobre as "jornadas de junho", ver: GOHN, Maria da Glória. Manifestações de junho de 2013 no Brasil e praças dos indignados no mundo. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2014.
Tal menção é feita em reportagem do dia 27 de julho de 2013. Pode ser encontrada em: http://www.brasildefato.com.br/node/14423 (Acesso em 15/07/2015 às 01:35)
GRAMSCI, op. cit. 2000, p. 21
Em São Paulo, aula pública debate Projeto de Lei por uma internet livre.2013. Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/14423. (Acesso em: 21/06/2015 às 01:35)
FERREIRA, Leonardo. Com impasse sobre neutralidade da rede, marco civil da internet pode ser votado. 2013. Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/26622. (Acesso em: 21/06/2015 às 01:36)
Algo que não ocorreu em razão de pressões de parlamentares conservadores.
MIELI, Silvio. Marco histórico. 2014. Disponível em: http://www.brasildefato.com.br/node/28004. (Acesso em: 21/06/2015 às 12:34)
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere: Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo. 7. ed. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2014. 2 v. p. 20
Idem.
GOMES, Raimunda Aline Lucena. A comunicação como direito humano: Um Conceito em Construção. Recife: EdUFPE, 2007.
MOREIRA, Gislene. É legal? A regulação da comunicação comunitária na América Latina. Intercom: Revista Brasileira de Ciências da Comunicação. São Paulo, v. 36, n. 1, p. 209-227. 01/2013.
Idem, p. 210
LIMA, op. cit. 2011. pp 28-34
Idem, p. 28
Ibidem, p. 30
MATOS, op. cit. 2013, p. 83
Neste caso, a autora faz menção à legislatura que esteve em vigor entre os anos de 2011 e 2014.
LIMA, op. cit. 2011, p.30.
A Associação Brasileira de Radiodifusores é uma entidade formada no ano de 2005, composta pelas redes "Bandeirantes" e "Rede TV! ".
A Associação Brasileira de Rádio e Televisão é uma entidade que reúne emissoras de radiodifusão, liderada pela Rede Record – que por sua vez, está ligada à Igreja Universal do Reino de Deus
A Associação Nacional de Jornais é uma entidade que agrega diferentes jornais de todos os estados da federação, entre eles, O Globo, analisado no primeiro capítulo.
A Associação Nacional de Editores e Revistas representa as editoras de revistas periódicas de consumo, liderada pela editora Globo e pela editora Abril, que publica a revista semanal Veja.
A ABRAÇO foi fundada em 1996 em busca de unificar a luta das rádios comunitárias pela regulamentação do serviço através da pressão ao Congresso Nacional.
A FENAJ foi fundada em 1946 a fim de representar os interesses da categoria. Nos últimos anos, esta federação tem se destacado pela defesa da democratização da comunicação e dos direitos humanos.
MOREIRA, op. cit. 2013, p. 215
Idem.
Criada em 2001 pela Medida Provisória 2228-1, a ANCINE – Agência Nacional do Cinema é uma agência reguladora que tem como atribuições o fomento, a regulação e a fiscalização do mercado do cinema e no Brasil.
O texto do substitutivo pode ser encontrado em: http://www.fenaj.org.br/cfj/projeto_cfj.htm
FORNAZARI, Fabio Kobol. Instituições do Estado e políticas de regulação e incentivo ao cinema no Brasil: O caso Ancine e Ancinav. RAP, Rio de Janeiro, v. 40, n. 4, p. 644-677. 05/2006. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rap/v40n4/31600.pdf. (Acesso em: 05/06/2015 às 13:29)
LIMA, op. cit. 2011, p. 35
Esta lei pode ser encontrada em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11437.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:42)
O decreto pode ser encontrado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Decreto/D6299.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:42)
MOREIRA, op. cit. 2013, p. 217
A lei pode ser acessada em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.871.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:43)
A lei pode ser acessada em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9612.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:44)
LIMA, op. cit. 2011, pp. 104-148.
Idem, p. 37
Ibidem.
O texto do decreto pode ser acessado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/D5371.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:44)
MORAES, op. cit. 2011, pp. 46-53.
O decreto pode ser verificado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/D5413.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:45)
BOLAÑO, César Ricardo Siqueira. Qual a lógica das políticas de comunicação no Brasil? São Paulo: Paulus, 2007.
O texto do decreto pode ser encontrado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2003/d4901.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:46)
Em 2005, o esquema de compra de votos de parlamentares conhecido como "Mensalão" chegou a conhecimento público e tomou grande parte do noticiário político nacional.
LIMA, op. cit. 2011, p.38.
As entidades presentes nessa comissão eram: a Casa Civil, o Ministério das Comunicações, o Ministério da Fazenda, a Secretaria de Comunicação Social (SECOM), a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, além da Advocacia Geral da União
LIMA, op. cit. 2011, p. 40.
O texto do decreto pode ser acessado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Decreto/D7037.htm (Acesso em 15/07/2015 às 01:46)
Tal comparação é, no mínimo, muito improvável de se encontrar em qualquer obra historiográfica sobre o período stalinista na URSS e a declaração universal dos direitos do homem e do cidadão.
Assim como a comparação entre o stalinismo e o PNDH 3, a tese de que os membros do governo petista fossem comunistas, apesar de ser razoavelmente difundida na sociedade brasileira, carece de qualquer obra que a sustente teórica ou metodologicamente.
O vídeo com o comentário de Jabor pode ser encontrado em: https://www.youtube.com/watch?v=Vb2yIxVhsG8 (Acesso em 08/06/2015 às 22:19)
O vídeo com o comentário de Garcia pode ser encontrado em: https://www.youtube.com/watch?v=wBNcmKScggw (Acesso em 08/06/2015 às 22:20)
LIMA, op. cit. 2011, p. 42.
SINDICATO DOS METALÚRGICOS DO ABC. Lula democratiza verba de propaganda. 2009. Disponível em: http://www.smabc.org.br/smabc/materia.asp?id_CON=14365&id_SUB=79. (Acesso em: 09/06/2015 às 13:40)
LIMA, op. cit. 2011, p. 45.
O texto do decreto pode ser encontrado em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7175.htm (Acesso em: 09/06/2015 às 14:35)
CARDOSO, Marina. O fracasso do Programa Nacional de Banda Larga. 2015. Disponível em: http://www.cartacapital.com.br/blogs/intervozes/o-fracasso-do-plano-nacional-de-banda-larga-3770.html. (Acesso em: 09/06/2015 às 14:23)
MOREIRA, op. cit.2013, p. 216.
CASTELLS, Manuel. Redes de Indignação e esperança: Movimentos sociais na era da internet. 1. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
MORAES, Dênis de. Comunicação alternativa em rede e difusão contra-hegemônica. In: COUTINHO, Eduardo Granja et al. Comunicação e contra-hegemonia: Processos culturais e comunicacionais de contestação, pressão e resistência. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2008.
CASTELLS, op. cit. 2013, p. 157.
Idem.
Ibidem, p. 159
GIANNOTTI, Vito. História das lutas dos trabalhadores no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.
CASTELLS, op. cit. 2013, pp. 159-160.
Em uma perspectiva que privilegia movimentos da periferia europeia e o oriente médio, Castells não faz menção aos espaços rurais. No entanto, a presença de movimentos sociais ligados ao campo é muito marcante na América Latina. Por isso, fiz questão de acrescentar que as ações dos movimentos sociais não ocorrem somente no meio urbano, mas também no espaço rural.
CASTELLS, op. cit. 2013, p. 161.
Ver: MOREIRA, op. cit. 2013.
Aqui, faz-se referência ao fato de que a internet não chegou, até o ano de 2014, a metade dos domicílios brasileiros. Além disso, cabe lembrar que os portais de jornalismo na internet mais acessados pertencem às grandes empresas de radiodifusão e da imprensa escrita, o que de certa forma, auxilia a manter uma hegemonia dos grupos que já eram dominantes antes do advento da internet, ainda que não da mesma maneira.
Veja é a revista de circulação semanal de maior popularidade no Brasil. Foi criada em 1968 por Roberto Civita e Mino Carta. Pertence à editora Abril, uma das maiores do mercado brasileiro.
No que diz respeito ao 3° PNDH, por exemplo, o colunista Rodrigo Constantino afirmou que a proposta se tratava de um atentado petista à democracia. Ver: http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/tags/pndh-3/ (Acesso em 15/07/2015 às 01:54)
MORAES, op. cit. 2008, p. 40.
CASTELLS, op. cit. 2013, pp 166-170.
Idem, p. 167.
Ibidem.
Ibidem.
Ibidem, p. 168.
MORAES, op. cit. 2008.
Idem.
É importante ressaltar que os meios tradicionais também se colocam favoráveis à liberdade de expressão, ainda que de maneira diferente dos veículos contra hegemônicos.
MORAES, op. cit. 2008, p.39.
Idem.
http://www.aporrea.org/
O link disposto no texto de Moraes para acesso ao site de tal coletivo não estava mais disponível quando da realização desta pesquisa.
http://www.cartamaior.com.br/
MORAES, op. cit. 2008.
http://www.virusplanetario.net/
http://www.pragmatismopolitico.com.br/
http://www.anovademocracia.com.br/
Conforme visto no capítulo 1, Brasil de Fato não se configura apenas como um jornal impresso de circulação material, mas também publica seu conteúdo em seu site.
Ceará, Piauí, Paraíba, Bahia, São Paulo, Distrito Federal, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, além do Rio de Janeiro, cidade de onde surgiu a revista.
O advento de uma "onda conservadora" se refletiu nos resultados das eleições para o Congresso Nacional. Ver: http://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,congresso-eleito-e-o-mais-conservador-desde-1964-afirma-diap,1572528 (Acesso em 15/07/2015 às 01:55)
Pode ser acessada em: http://www.anovademocracia.com.br/linhaeditorial (Acesso em 19/06/2015 às 21:51)
MORAES, op. cit. 2008.
Quando uma página possui "curtidas", isto significa que usuários escolheram seguir as publicações de tal página em suas páginas pessoais.
Ver: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/10/pragmatismo-politico-bate-um-novo-recorde.html (Acesso em 15/07/2015 às 01:56)
MIANI, op. cit. 2010, p. 202
A página de Veja no Facebook pode ser acessada em: https://www.facebook.com/Veja?fref=ts (Acesso em 20/06/2015 às 15:39)
A página de Época no Facebook pode ser acessada em: https://www.facebook.com/epoca?fref=ts (Acesso em 20/06/2015 às 15:37)
GRAMSCI, op. cit. 2014.
GRAMSCI, op. cit. 2014 p. 21.
Idem.
Ibidem, p. 78
Algo bastante significativo para um veículo de comunicação oriundo de movimentos populares.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere: Introdução do estudo da filosofia. A filosofia de Benedetto Croce. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, p. 314.
SOSA, Derocina Alves Campos. Imprensa e história. Biblios, Rio Grande, v. 1, n. 19, 2006, p. 109-125.
LE GOFF, Jacques. A Política: será ainda a ossatura da História? In: O maravilhoso e o cotidiano no Ocidente Medieval. Lisboa: Edições 70, 1975. pp. 221-242.
GRAMSCI, op. cit. 2014, p. 20
Dentro da concepção de Gramsci, é perfeitamente possível que o jornalista exerça a função de intelectual na sociedade, uma vez que ele é capaz de influenciar a formação da opinião pública, fundamental para as disputas por hegemonia.
SOSA, op. cit. 2006, p. 110.
FONTES, op. cit. 2008, p. 150.
Idem, p. 151
Isso não significa dizer que os ofícios de historiadores e de jornalistas sejam exatamente iguais. Apenas afirmo que eles possuem esta característica em comum que não pode ser ignorada.
FILHO, Eduardo Meinberg de Albuquerque Maranhão. Para uma história do tempo presente: O ensaio de nós mesmos. Fronteiras: Revista Catarinense de História. Florianópolis, n. 17, p. 137-151. 2009.
Idem, p.149.
Ibidem, p. 151
DOSSE, François. História do tempo presente e historiografia. Tempo e argumento: Revista do programa de pós-graduação em história. Florianópolis, v. 4, n. 1, p. 5-22. 01/2012.
Idem, p. 6.
Ibidem, p. 8.
Ibidem.
A partir de 2013, Brasil de Fato passou a circular com dois tipos de versões impressas: sua versão tradicional, em circulação desde março de 2003, e suas circulações regionais, nos estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.
http://bdtd.ibict.br/
STRAUBE, Ana Maria. Brasil de Fato: Trajetória, contradições e perspectivas de um jornal popular alternativo. 2009. 185 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Comunicação Social, Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2009.
CASSOL, Daniel Barbosa. Brasil de Fato: A imprensa popular alternativa em tempos de crise. 2010. 159 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Ciências da Comunicação, Universidade do Vale do Rio Sinos, São Leopoldo, 2010.
STRAUBE, op. cit. 2009, pp. 86-95
Ver: BARREIRA, César. Crônica de um massacre anunciado: Eldorado dos Carajás. 1999. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/spp/v13n4/v13n4a14.pdf. (Acesso em: 10/07/2015 às 10:55)
A saber: Nilton Vianna, José Arbéx Jr. e Miguel Stédile.
Ver: FERREIRA, op. cit. 1978.
STRAUBE, op. cit. 2009, p. 91.
Retirado de entrevista concedida à Ana Maria Straube. Ver: STRAUBE, op. cit. 2009, p. 90
Informação retirada de entrevista concedida à Ana Maria Straube. Ver: STRAUBE, op. cit. 2009, p. 89.
STRAUBE op. cit. 2009, p.91.
Idem, p. 94
O Censo de 2000 estimava que a população brasileira na época era de 169.799.170 pessoas. Ver: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2000/tabelagrandes_regioes211.shtm (Acesso em 15/07/2015 às 01:58)
MORAES, Dênis de. Comunicação, hegemonia e contra-hegemonia: A contribuição teórica de Gramsci. Revista Debates, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 54-77. 01/2010, p.54. Disponível em: http://www.seer.ufrgs.br/debates/article/viewFile/12420/8298. (Acesso em: 13/10/2014 às 12:35)
STRAUBE apud "Projeto editorial do jornal de esquerda", 2009, p. 96.
Declaração de Nilton Viana em entrevista à Ana Maria Straube. Ver: STRAUBE, op. cit. 2009, p. 97.
STRAUBE, op. cit. 2009, p. 100.
Idem, pp. 119-153.
Algo que nunca ocorreu na história do jornal até o momento em que escrevo este trabalho.
No momento em que este trabalho é escrito, Dilma Rousseff exerce seu segundo mandato como presidenta do Brasil. Tal mandato, até então tem se mostrado o mais conservador de todos aqueles exercidos ao partido dos trabalhadores, não só pelo contexto de crise econômica, mas também pelo legislativo conservador que foi eleito em proporção maior do que nas eleições anteriores.
CASTELO, Rodrigo. O Social-Liberalismo: uma ideologia neoliberal para a "questão social" no século XXI. Programa de pós-graduação em Serviço Social (UFRJ), Rio de Janeiro, 2011.
CASSOL, op. cit. 2010, pp. 65-86.
STRAUBE, op. cit. p. 110.
Idem.
Ibidem, p. 115
Ibidem, pp. 119-120
Ibidem, p. 122.
Ibidem, p. 127.
Ibidem, p. 128
O levantamento de Cassol não contemplou todas as assinaturas de Brasil de Fato, destacando apenas aquelas ocupações que tinham um número considerável dentro de seus parâmetros de pesquisa.
CASSOL, op. cit. 2010, p. 137
Como entidades, entende-se ONGs, Partidos Políticos e movimentos sociais, por exemplo.
CASSOL, op..cit. 2010, p. 139.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/nas_bancas (consulta em 06/07/2015 às 01:35)
CASSOL, op. cit. 2010, p. 138.
STRAUBE op. cit. 2009, p. 148
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_383 (Acesso em 05/07/2015 às 11:34)
Antes de se lançar à corrida presidencial de 2010, José Serra era governador do Estado de São Paulo
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_387 (Acesso em 05/07/2015 às 12:20)
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_390 (Acesso em 05/07/2015 às 13:04)
GRAMSCI, op. cit. 2000, p. 21.
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_391 (Acesso em 05/07/2015 às 21:26)
A edição pode ser encontrada em: http://issuu.com/brasildefato/docs/bdf_400 (Acesso em 05/07/2015 às 22:17)
A carta pode ser acessada em: http://www.pstu.org.br/node/15815 (Acesso em 05/07/2015 às 22:50)
Cabe dizer que a questão dos investimentos em educação por parte dos governos petistas não é consenso na esquerda brasileira. Parte dela celebra a entrada de novos atores no ensino superior, por exemplo, enquanto outras, mesmo não se opondo à expansão do acesso, problematizam a forma como ele vem sendo feito. Ver: LÉDA, Denise Bessa; MANCEBO, Deise. REUNI: Heteronomia e precarização da universidade e do trabalho docente. Educação & Realidade, v. 34, n. 1, p. 49-64. 01/2009. Disponível em: http://www.seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/viewFile/8457/4922. (Acesso em: 06/07/2015 às 21:03)
STRAUBE, op. cit. 2009.
CASSOL, op. cit. 2010, p. 125
Idem, pp. 125-130
Ver: CHOMSKY, Noam. Midia: Propaganda política e manipulação. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
GRAMSCI, op. cit. 2000, p. 17
LIMA, op. cit. 2011, pp. 103-148
MORAES, op. cit. 2011, p. 40
MATOS, op. cit. 2013, pp 73-92.
MOREIRA, op. cit. 2013.
GRAMSCI, op. cit. 2014, p. 78.
MORAES, apud GRAMSCI, 2010, p. 73
Ver: SINGER, André. Os sentidos do Lulismo: Reforma gradual e pacto conservador. 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA
BACHARELADO EM HISTÓRIA






MATHEUS DE CARVALHO LEIBÃO







AS TRANSFORMAÇÕES NA COMUNICAÇÃO E AS DISPUTAS POR HEGEMONIA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO (2003 – 2014)























Niterói
2015

MATHEUS DE CARVALHO LEIBÃO






AS TRANSFORMAÇÕES NA COMUNICAÇÃO E AS DISPUTAS POR HEGEMONIA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO (2003 – 2014)











Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em História












Orientador: Professor Dr. Marcelo Badaró Mattos






Niterói
2015









Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá
L525 Leibão, Matheus de Carvalho. As transformações na comunicação e as disputas por hegemonia no Brasil contemporâneo (2003-2014) / Matheus de Carvalho Leibão. – 2015. 111 f. Orientador: Marcelo Badaró Mattos. Leitora crítica: Juniele Rabelo de Almeida. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia, Departamento de História, 2015. Bibliografia: f. 107-110. 1. Imprensa. 2. Hegemonia. 3. Brasil de Fato (Jornal). 4. O Globo (Jornal). I. Mattos, Marcelo Badaró. II. Almeida, Juniele Rabelo de.
III. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia. IV. Título.

L525 Leibão, Matheus de Carvalho. As transformações na comunicação e as disputas por hegemonia no Brasil contemporâneo (2003-2014) / Matheus de Carvalho Leibão. – 2015. 111 f. Orientador: Marcelo Badaró Mattos. Leitora crítica: Juniele Rabelo de Almeida. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia, Departamento de História, 2015. Bibliografia: f. 107-110. 1. Imprensa. 2. Hegemonia. 3. Brasil de Fato (Jornal). 4. O Globo (Jornal). I. Mattos, Marcelo Badaró. II. Almeida, Juniele Rabelo de.
III. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia. IV. Título.



L525 Leibão, Matheus de Carvalho.
As transformações na comunicação e as disputas por hegemonia no Brasil contemporâneo (2003-2014) / Matheus de Carvalho Leibão. – 2015.
111 f.
Orientador: Marcelo Badaró Mattos.
Leitora crítica: Juniele Rabelo de Almeida.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia, Departamento de História, 2015.
Bibliografia: f. 107-110.
1. Imprensa. 2. Hegemonia. 3. Brasil de Fato (Jornal). 4. O Globo (Jornal). I. Mattos, Marcelo Badaró. II. Almeida, Juniele Rabelo de.
III. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia. IV. Título.










L525 Leibão, Matheus de Carvalho.
As transformações na comunicação e as disputas por hegemonia no Brasil contemporâneo (2003-2014) / Matheus de Carvalho Leibão. – 2015.
111 f.
Orientador: Marcelo Badaró Mattos.
Leitora crítica: Juniele Rabelo de Almeida.
Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em História) –
Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia, Departamento de História, 2015.
Bibliografia: f. 107-110.
1. Imprensa. 2. Hegemonia. 3. Brasil de Fato (Jornal). 4. O Globo (Jornal). I. Mattos, Marcelo Badaró. II. Almeida, Juniele Rabelo de.
III. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Ciências Humanas e
Filosofia. IV. Título.





























MATHEUS DE CARVALHO LEIBÃO


AS TRANSFORMAÇÕES NA COMUNICAÇÃO E AS DISPUTAS POR HEGEMONIA NO BRASIL CONTEMPORÂNEO (2003 – 2014)



Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para a obtenção do grau de Bacharel em História.



Aprovada em 25 de Outubro de 2015


BANCA EXAMINADORA


_______________________________________
Prof. Dr. Marcelo Badaró Mattos (Orientador) - UFF

_______________________________________
Profª. Drª. Juniele Rabelo de Almeida - UFF

Niterói
2015

AGRADECIMENTOS
Este trabalho é fruto de um acúmulo de discussões e reflexões que se desenvolveram ao longo de 11 semestres, período no qual fui estudante de graduação no curso de História da Universidade Federal Fluminense. Durante esses 5 anos e meio de intenso aprendizado, muitas pessoas puderam contribuir para a concretização deste trabalho. Talvez eu cometa a injustiça de não lembrar de todos e todas que me motivaram a me formar como historiador e professor de história. A elas, peço minhas mais sinceras desculpas. Às demais, aqui vão os meus registros de gratidão pela importância que têm, tiveram e certamente continuarão a ter.
Primeiramente gostaria de agradecer a meus pais, Carlos e Cecília por sempre terem me incentivado a estudar e terem feito o máximo que puderam para que eu tivesse acesso a uma educação e uma formação intelectual de qualidade. Sem vocês eu não teria chegado absolutamente a lugar nenhum. Gostaria de agradecer também a minha irmã mais velha, Priscila, por ser e ter sido uma grande referência para mim no que diz respeito aos estudos. Sem ela, os obstáculos que se apresentaram ao longo de minha trajetória seriam certamente mais difíceis.
Um agradecimento mais do que especial vai para os meus tios Ana e Sued, que sempre me acolheram com muito amor e solidariedade em sua casa e cuidaram de mim como se fosse filho deles. A presença e a generosidade de ambos certamente tornaram a tarefa de estudar e trabalhar ao mesmo tempo bem menos difícil.
Aos meus amigos, fica um agradecimento especial a Kaio Assis, Daniel Tota, Rodrigo Cravo, Victor Machado, André Brito e Catarina Farias pela série de conversas e trocas de ideias que certamente me influenciaram a escrever este trabalho. Credito os méritos e virtudes dele a tudo que pude aprender e ensinar na companhia de vocês. A Beatriz Paz e Roberta Almeida, agradeço por sempre me fazerem ver beleza e graça em coisas simples da vida, inclusive nos momentos mais difíceis. Também cabe agradecer ao Rodrigo Monteiro por ter me ajudado a montar o computador com o qual escrevi este trabalho e pelas demais ajudas relacionadas à área de informática. Ao Júlio César, pelas companhias, risadas, histórias engraçadas e por partilhar grandes vitórias do Flamengo comigo, muito obrigado.
Não poderia em hipótese alguma deixar de agradecer à minha namorada, Ana Carolina por absolutamente tudo ela fez por mim ao longo desses 5 anos e meio. Certamente conhecer você, Carol, foi o melhor presente que UFF poderia me dar. Seria necessário o tamanho de páginas de uma pesquisa de doutorado para mencionar tudo que você significou para mim ao longo desses 11 períodos de graduação. Você é a minha maior inspiração, minha maior fonte de felicidade e eu agradeço a toda atenção que você dispendeu a mim e saiba que quero fazer o mesmo por ti. Eu posso não mostrar isso com frequência, mas não há ninguém como você. Peço desculpas por todos meus erros e defeitos, e saiba que se não fosse por você, eu dificilmente teria encontrado forças para aguentar 11 períodos de deslocamento de Brás de Pina a Niterói. Obrigado por me fazer sentir vivo e motivado, por me dar dicas para este trabalho, por implicar com a minha resistência em usar as notas de rodapé, por me ensinar tanto de história e pesquisa em história, por me ajudar a rever alguns de meus conceitos e erros, enfim, por me ajudar a viver.
Gostaria de agradecer também ao Henrique Sobral, por ter me dado inúmeras dicas ao longo da produção desse trabalho, me passando textos e contribuindo com ideias fundamentais que certamente qualificaram esta monografia. A você, muito obrigado.
Seria impossível negligenciar a participação fundamental da professora Nívea Andrade, certamente a pessoa que mais me influenciou na decisão de cursar a graduação em história, da qual não me arrependo nem um pouco. Muito obrigado pelos 3 anos nos quais você foi minha professora no ensino fundamental, e posteriormente, pelos 2 semestres de aulas de Pesquisa e Prática de Ensino na UFF. Minha gratidão e admiração por esta professora serão eternas.
Ao professor Marcelo Badaró, gostaria de agradecer pela orientação deste trabalho e do projeto que o originou e também pelas aulas de História do Brasil III, que foram fundamentais para a escolha do tema de minha pesquisa. Também possuem contribuição fundamental na escolha desse tema e desenvolvimento do trabalho os professores Rodrigo Teixeira, Hugo Bellucco, Norberto Ferreras, Martha Abreu, Carlos Addor e Juniele Rabelo, esta última, que se prontificou a fazer a leitura crítica deste trabalho. Por fim, gostaria de agradecer a todos trabalhadores e trabalhadoras da Universidade Federal Fluminense que possibilitam o funcionamento das atividades, apesar de todos os empecilhos impostos pela reitoria e pelo governo federal. Desses, destaco Juceli Silva, muito querida por todos os estudantes de História da UFF, provavelmente a única unanimidade de todo o curso. A todos eles, muito obrigado.



EPÍGRAFE
























A vida é preciosa. O mundo é grande. Tem muitas pessoas. Pessoas com todas as religiões, idiomas, dialetos, culturas, preferências sexuais, muitas diferentes cores, pessoas de todos os tamanhos. E cada uma com sua própria personalidade. O coração socialista tem espaço para todas.

Bilbo Göransson
RESUMO
O trabalho pretende discutir aspectos ligados à liberdade (e pluralidade) de imprensa no Brasil a partir do 1° governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003), quando há o fim de um período de governos do PSDB, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, que contribuiu para a consolidação de um projeto neoliberal para o Brasil. Minha preocupação principal é com a atuação de veículos de caráter contra hegemônico, isto é, como a atuação destes é influenciada pelas condições historicamente construídas dentro do período trabalhado. Sendo assim, pretendo analisar como a legislação, a concentração dos meios de comunicação e outros fatores foram capazes de limitar ou possibilitar a construção de uma comunicação contra hegemônica na sociedade brasileira, que pudesse alcançar diversos setores da população, a partir da chegada do Partido dos Trabalhadores ao governo federal. Em um estudo de caso, pretendo analisar o jornal Brasil de Fato e verificar se este se trata de um veículo de comunicação contra hegemônico ou não, a partir das discussões do quadro teórico sobre os conceitos de hegemonia e contra hegemonia propostos pelo filósofo italiano Antonio Gramsci e por outros autores que seguiram a linha adotada por ele. Para tal, tentarei comparar o jornal em questão com o jornal O Globo, além de realizar uma análise de suas formas de financiamento, público e relação com o governo, a fim de confirmar (ou não) as hipóteses que terei para minha problematização.

Palavras-chave: Imprensa – Contra hegemonia – Brasil de Fato – O Globo – Mídia – Tempo Presente









ABSTRACT
This work aims to discuss some aspects related to the freedom (and plurality) of press (and other media) in Brazil after the first election of Luiz Inácio Lula da Silva, when there is the end of an era of PSDB governments, with the leadership of Fernando Henrique Cardoso, which has contributed to consolidate a neoliberal project for this country. The main preoccupation here is with the action of counter-hegemonic means of communication, that is, to analyze how their agency is influenced by the historical conditions during this time. Thus, I intend to analyze how the laws, the concentration of the means of communication and other elements could limit or enable the construction of a counter-hegemonic communication in the Brazilian society, which would be able to reach different parts of Brazil's population after the raise of PT to the federal government. In a specific study, I intend to analyze the newspaper Brasil de Fato and check if that can actually be called counter-hegemonic. For that, the theoretical reference are the conceptions of hegemony and counter-hegemony, formulated by the Italian philosopher Antonio Gramsci and other authors who have followed his example. I will try to make a comparison this newspaper with another one, O Globo, and also make an analysis of its financing, its public and its relationship with the government, with the intention to confirm (or not) the assumptions I will have on my questioning.
Key Words: Press – Counter hegemony – Brasil de Fato – O Globo – Media – Present time.










LISTA DE TABELAS


Número
Título
Página
Tabela 1
Posicionamentos em relação às ações afirmativas em O Globo
33
Tabela 2
Estações de Rádio e TV controladas por políticos no Brasil
55
Tabela 3
Perfil dos assinantes do Brasil de Fato
87
Tabela 4
O jornal Brasil de Fato nas bancas em diferentes estados brasileiros
89
Tabela 5
Distribuição de assinantes de Brasil de Fato por estado
90
Tabela 6
Manchetes que citam o governo Lula dividida por anos
93












LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS


ABC
Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul
Abert
Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão
Abra
Associação Brasileira de Radiodifusores
ABRAÇO
Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária

Abranet
Associação Brasileira de Internet

Abratel
Associação Brasileira de Rádio e Televisão
ABTA
Associação Brasileira de TV por Assinatura
ACERP
Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto
AI-5
Ato Institucional n° 5
AIR
Associação Internacional de Radiodifusão

Anatel
Agência Nacional de Telecomunicações
Ancinav
Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual
Ancine
Agência Nacional do Cinema
ANER
Associação Nacional de Editores e Revistas
ANJ
Associação Nacional dos Jornais

BBC
British Broadcasting Corporation
CBT
Código Brasileiro de Telecomunicações
CCS
Conselho de Comunicação Social
CFJ
Conselho Federal de Jornalismo
CoNoSur
Coletivo de Noticias del Sur
CUFA
Central Única das Favelas
CUT
Central Única dos Trabalhadores
DEM
Democratas
EBC
Empresa Brasil de Comunicação
EUA
Estados Unidos da América
FENAJ
Federação Nacional do Jornalistas
FHC
Fernando Henrique Cardoso
FNDC
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
GTI
Grupo de Trabalho Interministerial
INSS
Instituto Nacional do Seguro Social

MASP
Museu de Arte de São Paulo
MP
Medida Provisória

MST
Movimento dos trabalhadores rurais sem-terra

ONG
Organização Não Governamental

PCB
Partido Comunista Brasileiro
PC do B
Partido Comunista do Brasil
PIB
Produto Interno Bruto
PL
Partido Liberal
PL
Projeto de Lei
PMDB
Partido da Mobilização Democrática Brasileira
PNBL
Plano Nacional de Banda Larga
PNDH 3
3° Plano Nacional de direitos humanos
PSB
Partido Socialista Brasileiro
PSC
Partido Social Cristão
PSDB
Partido da Social Democracia Brasileira
PSOL
Partido Socialismo e Liberdade
PSTU
Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
PT
Partido dos Trabalhadores
RCTV
Radio Caracas Televisión
RTVIs
Retransmissoras de TV institucionais

SBTVD
Sistema Brasileiro de Televisão Digital
SECOM
Secretaria de Comunicação Social

UERJ
Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFPR
Universidade Federal do Paraná
UNE
União Nacional dos Estudantes
Uneafro
União de Núcleos de Negros e Classe Trabalhadora
URSS
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas









SUMÁRIO


Introdução................................................................................................................................. 13
Capítulo 1 – Comparações entre os jornais O Globo e Brasil de Fato: os veículos de comunicação como potenciais geradores de consenso 22
Capítulo 2 – As organizações da sociedade civil e a luta pela democratização da comunicação no Brasil contemporâneo 54
Capítulo 3 – Jornal Brasil de Fato: contra hegemônico? 75
Conclusão 102
Referências Bibliográficas 107
















Introdução
O período de transição democrática no Brasil, iniciado na década de 1980 após 21 anos de ditadura empresarial-militar foi marcado por diversas disputas políticas e ideológicas. Tais disputas se fizeram presente, sobretudo, na formulação da nova constituição, promulgada em 1988. Diversos setores da sociedade brasileira participaram e disputaram o sentido político do novo conjunto de leis pelas quais se constituiria a nova república. Trabalhadores, sindicatos, movimentos sociais, empresários, partidos políticos, igrejas, entre outros segmentos da sociedade estiveram presentes nesta conjuntura de redemocratização.
Uma força política que obteve muito destaque neste processo histórico foi formada nesta mesma década: trata-se do Partido dos Trabalhadores. O PT destacou-se, ao longo da década de 1980 pela defesa se um programa nacional que aglutinasse diferentes ideias de esquerda em torno de um projeto que ficou conhecido como "democrático popular". O auge de tal destaque pode ser identificado na disputa eleitoral pela presidência da república de 1989, a primeira após o fim da ditadura (1964 – 1985). Neste processo eleitoral, o candidato deste partido, Luiz Inácio da Silva, o Lula, ganhou destaque pela defesa de um programa de esquerda, que contava com o apoio de diversas organizações da sociedade civil, em oposição àquele que viria a ser retratado pela historiografia como o representante do neoliberalismo, Fernando Collor de Mello. Esta eleição era a que havia registrado a disputa mais acirrada pela presidência do Brasil durante a nova república, sendo superada somente pela disputa entre Aécio Neves, do PSDB e Dilma Rousseff, do próprio PT no pleito realizado no ano de 2014.
O objetivo principal dessa pesquisa é analisar as políticas de comunicação e as disputas políticas em torno da área da comunicação social no Brasil entre os anos de 2003 e 2014. Tal recorte cronológico corresponde a um período no qual este país esteve sob governos do Partido dos Trabalhadores, somando um total de 3 mandatos executivos, e 3 legislaturas diferentes. Como o PT, ao longo do processo de redemocratização brasileira, se constituiu como a principal força política de esquerda do país (ainda que com diversas divergências internas), a sua chegada ao poder em 2003, após a vitória eleitoral de Lula contra o candidato do PSDB, José Serra, em 2002, foi marcada de expectativas por parte daqueles que desejavam construir um país e/ou uma sociedade na qual os abismos sociais entre ricos e pobres não existissem. No entanto, a composição de forças que levou o candidato do Partido dos Trabalhadores à vitória eleitoral em 2002 não foi a mesma que compôs a candidatura derrotada por Collor 13 anos antes, ainda que o candidato à presidente permanecesse o mesmo. O avanço do pensamento neoliberal no Brasil e em outras partes do mundo, associado ao colapso do sistema socialista soviético abalou as estruturas dos pensamentos de esquerda tanto no Brasil quanto em outras partes do planeta na passagem da década de 1980 à década de 1990. O Partido dos Trabalhadores não ficou imune a isso. Ao longo dos anos 90, em meio a consecutivas derrotas nas corridas presidenciais para o candidato do PSDB, Fernando Henrique Cardoso, - responsável por dar continuidade ao programa de reformas neoliberais iniciadas no governo Collor - o partido encontrou poucas brechas para combater politicamente e contestar o pensamento neoliberal. Tal processo fez com que o partido modificasse seu arco de alianças para a disputa eleitoral de 2002, dando um tom mais moderado às suas propostas políticas, o que ficou simbolizado na "Carta ao povo brasileiro", de junho de 2002.
Outro aspecto que pode ser ressaltado em relação a essa mudança política e estratégica do Partido dos Trabalhadores está na composição da chapa que veio a vencer as eleições de outubro de 2002, encabeçada por Lula, o quadro político de maior destaque do partido, cujo vice foi José Alencar, filiado ao Partido Liberal (PL). Vale lembrar que na disputa de 1989, o arco de alianças do PT se restringiu ao Partido Socialista Brasileiro (PSB) e ao Partido Comunista do Brasil (PC do B), partidos que, assim como o PT, sofreram profundas mudanças de cunho ideológico semelhantes àquelas pelas quais o quadro majoritário petista passou.
Sendo assim, a chegada do PT ao poder no Brasil, como aponta a historiadora Virginia Fontes, estava carregada de uma série de fatores, dentre os quais ela destaca: 1) a crise na base de apoio ao candidato tucano (José Serra), resultante de um certo esgotamento do modelo colocado em prática na década anterior; 2) a opção de parte do empresariado pelo apoio à Lula, que estabeleceu diretrizes ao comportamento do futuro governo através dos meios de comunicação; 3) uma guinada da corrente majoritária do Partido dos Trabalhadores em direção a uma política menos radical, mais focada em um papel institucional e, nas palavras da própria historiadora, "menos organizativo no que diz respeito aos movimentos sociais"; e 4) o acúmulo de forças políticas, que ao longo da história recente do Brasil, através de movimentos sociais e sindicais, possibilitou que um candidato oriundo da classe trabalhadora chegasse ao posto de presidente da república.
A guinada à direita que marcou a vitória de Lula pode ser identificada também nas páginas do jornal O Globo. Nos dois primeiros dias do ano de 2003, houve uma intensa cobertura em relação à posse do novo presidente. Em vários anúncios publicitários, pode-se verificar diferentes empresas saudando e felicitando a posse de Luiz Inácio, relacionando o sucesso do novo presidente ao sucesso da empresa em questão. O próprio jornal também saudou a posse do novo presidente com muitas menções positivas à Lula, algo que seria inimaginável caso o Partido dos Trabalhadores tivesse vencido as eleições de 1989.
Um governo que chegou ao poder através de tal correlação de forças fazia com que parte da esquerda brasileira ficasse, ao mesmo tempo, temerosa e esperançosa em relação ao futuro do país no que diz respeito à distribuição de renda, política externa, aplicação de recursos públicos nas áreas de saúde e educação e também no que diz respeito às políticas de comunicação. Esta última área está no centro desta pesquisa.
A área da comunicação no Brasil, de maneira geral, possui, até o momento em que este trabalho é escrito, uma parca regulamentação. Um dos problemas que Venício Lima – cuja obra adquire fundamental importância por ser uma referência no que diz respeito à (não) regulação dos meios de comunicação no Brasil – aponta é a ausência de qualquer marco regulatório que impeça a existência da propriedade cruzada dos meios de comunicação. Na prática, isso implica que uma mesma empresa possa ter concessões públicas de canais de televisão e rádio, além de jornais impressos, editoras, entre outros.
Um caso emblemático de propriedade cruzada no Brasil, sem dúvidas, é o das Organizações Globo, chefiadas pela família Marinho, que possuem canais na televisão (aberta, a cabo e via satélite), no rádio (AM e FM), jornais, revistas, uma editora e o principal portal de notícias na internet do país (além de inúmeras emissoras filiadas em todos os estados da federação). Este autor explica que os cinco artigos da constituição federal que compreendem os números 220 e 224 não possuem uma regulamentação suficientemente clara para definir a estruturação da comunicação social no Brasil, ainda que, no artigo 220, afirme-se que os meios de comunicação não podem ser monopolizados ou oligopolizados. No entanto, os termos "oligopólio" e "monopólio" carecem de qualquer definição constitucional. Sendo assim, Lima identifica que estas brechas constitucionais permitiram a poucas famílias ter o controle da maior parte da mídia e da imprensa brasileiras. Ele também ressalta que grande parte da legislação sobre a comunicação no Brasil está baseada no Código Brasileiro de Telecomunicações (CBT), datado de 1962, atualmente defasado e obsoleto. Tal código é responsável, segundo ele, por permitir a existência da propriedade cruzada dos meios de comunicação no país.
Carolina Matos também analisa a maneira como foi formulado o sistema de comunicação social no Brasil. Ela afirma que o modelo de radiodifusão dos países latino-americanos foi bastante influenciado pelo modelo de radiodifusão dos Estados Unidos, sobretudo a partir de fins da década de 1980, época de avanço do pensamento neoliberal. O Brasil não fugiu à regra, ainda que, segundo a autora, haja também neste país uma certa influência de um modelo de imprensa partidária típico da Europa. Segundo esta jornalista e professora universitária, o sistema de mídias construído na sociedade norte-americana possui um caráter majoritariamente privado, com pouco espaço para a comunicação pública (diferentemente da Inglaterra, por exemplo, que possui uma empresa pública de comunicação forte, a BBC). Mesmo que tais modelos sejam majoritariamente privados, as empresas concessionárias dos serviços de radiodifusão são dependentes, em certa medida, do poder público, uma vez que grande parte de suas receitas é advinda da publicidade estatal. Matos também aponta, que tanto nos EUA quanto na América Latina, a maior fatia do mercado está concentrada nas mãos de poucos grupos empresariais, o que, por sua vez, dificulta a garantia da pluralidade cultural e de opiniões dentro do espaço de radiodifusão destes países. A consequência de tal estruturação é que grandes parcelas da população, sobretudo as "minorias" (negros, indígenas, homossexuais, etc.) não se vejam representadas nos principais espaços de circulação da produção audiovisual. Ou então, quando incluídos, sejam majoritariamente estigmatizados de alguma forma que mantenha as relações de poder tradicionais. Tal realidade, é importante dizer, não exclui as possibilidades de se encontrar brechas nos meios de comunicação dominantes que possam tentar subverter as relações de poder estabelecidas. É importante ter tal ressalva em mente para que não se crie uma falsa ideia de homogeneidade dentro dos principais veículos da grande mídia.
Ainda sobre a concentração da comunicação nas mãos de poucos grupos empresariais brasileiros, Dênis de Moraes identifica quais são as famílias responsáveis pelo controle do maior fluxo de informações na radiodifusão brasileira. As famílias Marinho, Civita, Mesquita, Abravanel, Saad, Sirotsky, Sarney, Magalhães e Collor (esta última representada pelo ex-presidente da república, Fernando Collor de Mello), articularam, nas últimas décadas, uma série de acordos com empresas estrangeiras, o que culminou, na década de 90, em uma abertura para o investimento do capital externo na área de comunicação social. Tal medida possibilitou tais grupos a se manterem como os principais meios de comunicação do Brasil, ainda que os tenha deixado, de certa forma, dependentes dos investidores estrangeiros. Vale lembrar que o domínio de tais famílias não se forma a partir da década de 90, mas tem suas origens no antigo regime empresarial-militar.
O interesse na área da comunicação advém da função que atualmente ela possui na sociedade. Com a massificação de meios como a imprensa, o rádio e a televisão, e mais recentemente a internet, os meios de comunicação se tornaram ferramentas importantíssimas no que diz respeito à construção da hegemonia. Falar em hegemonia, a partir dos pressupostos teóricos de Antonio Gramsci, significa "analisar as formas de convencimento, de formação e de pedagogia, de comunicação e de difusão de visões de mundo, as diferentes modalidades de adestramento para o trabalho", de acordo com a historiadora e professora Virgínia Fontes. Ainda que a hegemonia possa também ser exercida através de meios coercitivos, como por exemplo, a violência policial, o papel do convencimento e do poder simbólico são essenciais para que uma classe ou fração de classe detenha a hegemonia dentro de determinada sociedade. É importante ter em mente que coerção e consenso não são duas categorias que caminham separadamente. É possível que ações coercitivas tenham legitimidade por parte da maioria da sociedade, como por exemplo, quando uma ação policial resulta em mortes e ferimentos de dezenas de pessoas nas favelas e bairros pobres das grandes cidades brasileiras e, ainda assim parcelas significativas da população acreditam que o crime esteja sendo devidamente combatido pelo Estado.
Dentro da perspectiva teórica que será adota neste trabalho, entende-se que a hegemonia não é algo que representa uma forma totalmente consolidada de dominação. Ela precisa se reinventar constantemente, encontrar novas formas de guiar a ação da maioria dos indivíduos em sociedade. Isso ocorre porque ela é quase sempre desafiada por aqueles que não concordam com ela, ou seja, pressupõe a existência de uma contra hegemonia, que contesta os valores e as práticas do sistema vigente.
Sendo assim, este trabalho busca analisar as disputas por hegemonia no Brasil a partir do ano de 2003 e atentar para os diversos fatores que condicionaram tais disputas. Para a realização destas discussões, foi feita a opção pela a análise de duas fontes primárias distintas: os jornais O Globo e Brasil de Fato. A escolha pelos dois partiu de uma notável diferença entre ambos no que diz respeito às condições materiais sob as quais eles são produzidos e publicados e dos diferentes posicionamentos políticos que podem ser verificados quando fazemos as comparações entre os jornais, muito mais explícitos e claros no segundo que no primeiro. O objetivo do trabalho consiste em verificar semelhanças ou diferenças entre as coberturas dos jornais no que diz respeito aos seguintes temas: a criação da Empresa Brasil de Comunicação, aprovação do Marco Civil da Internet, a aprovação da reforma da previdência e o debate em torno das cotas raciais nos processos seletivos das universidades brasileiras. Tal processo consistirá na primeira parte desta monografia.
Posteriormente, na segunda parte deste trabalho, será dado destaque às organizações da sociedade civil que tem como bandeira principal a luta pela democratização da comunicação, com a construção de um sistema que permita a diferentes atores sociais se fazerem vistos pela sociedade. Além disso, pretende-se verificar se alguma demanda destes grupos foi atendida pelo Estado brasileiro no período que compreende a pesquisa. As obras de Dênis de Moraes e Venício Lima apontam para direções que nos permitem identificar as ações e demandas destes grupos. A hipótese é de que poucas reivindicações dos movimentos sociais, meios de comunicação contra hegemônicos e coletivos pró-regulamentação da comunicação foram atendidas tanto pelo governo federal, quanto pelo poder legislativo brasileiro, uma vez que tais setores da sociedade sempre demandaram políticas públicas que visassem à democratização dos meios de comunicação no Brasil, com o fim de monopólios, oligopólios e da propriedade cruzada, algo que, até o momento em que este trabalho é escrito, não aconteceu.
Nesta mesma parte do trabalho, pretendo fazer a discussão acerca de como as políticas públicas de comunicação condicionaram a atuação dos veículos contra hegemônicos. Serão discutidos temas como iniciativas legislativas e também ações do poder executivo. A hipótese em relação a essa questão é de que as políticas de comunicação do período que contemplam os anos de 2003 a 2014 pouco contribuíram para a solidificação e massificação de meios de comunicação contra hegemônicos no Brasil. A maior parte dos projetos de regulamentação do sistema de radiodifusão permaneceu emperrada em tramitações pelo Congresso Nacional, ou foram barradas pelo mesmo, através de uma prática que Venício Lima chama de "coronelismo eletrônico". Tal processo pode se dar pela própria composição das bancadas legislativas, uma vez que boa parte dos deputados e senadores são/foram concessionários dos serviços de radiodifusão brasileiros.
Ao final desta parte, há o objetivo de problematizar o papel da internet e das novas tecnologias da informação e da comunicação em relação à propagação de ideias e de ações dos setores contra hegemônicos. A ideia inicial é que o advento das novas tecnologias de informação e da comunicação ampliou consideravelmente as possibilidades de diálogo dos meios de comunicação contra hegemônicos com a população brasileira em termos absolutos. No entanto, em termos relativos, penso que tal ampliação não se verifica, ou se verifica em proporções tímidas, fazendo com que tais meios ainda sejam bastante limitados em relação ao seu alcance.
O terceiro capítulo desta obra se pauta na seguinte questão: o jornal Brasil de Fato pode ser considerado um veículo de comunicação contra hegemônico? Nesta parte, a análise da leitura dos escritos do pensador italiano Antonio Gramsci se faz fundamental, assim como a reflexão em relação ao material do jornal, que será comparado a um jornal da mídia hegemônica, no caso, o jornal O Globo, no capítulo 1. Para responder a tal questão, serão analisados o editorial do jornal, formas de financiamento do mesmo, o público leitor e as relações que o veículo estabeleceu com o governo. Além disso, as comparações com o jornal O Globo do capítulo 1 devem ser retomadas para contribuir com as respostas que podem ser dadas ao questionamento que guiará a produção deste capítulo.
Para concluir, buscarei responder ao seguinte questionamento: durante o período no qual a pesquisa se insere, houve algum tipo de contribuição do governo federal brasileiro em busca de fortalecer a comunicação contra hegemônica? Os resultados obtidos nessa pesquisa guiarão as reflexões que tentarão responder a essa pergunta.
A escolha por trabalhar com a análise de veículos de comunicação advém da potencialidade que eles oferecem ao pesquisador interessado nas disputas políticas em torna da formação de consenso e na difusão de valores que guiam as ações do ser humano no convívio coletivo. No entanto, é necessário ter em mente que nem todas as pautas que serão analisadas a partir dos periódicos obtiveram grande repercussão pública, logo, influenciaram pouco as disputas em torno da formação de uma hegemonia. No entanto, há de se discutir as razões para tal e este também é um dos objetivos deste trabalho.
























Capítulo 1
Este capítulo tem como foco destacar algumas propostas de políticas públicas que foram colocadas em discussão na sociedade brasileira durante os governos de Lula e o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Dentre vários temas que foram debatidos por brasileiros e brasileiras (seja nas escolas, sindicatos, igrejas, associações de moradores, nas universidades, ou nos meios de comunicação), foram escolhidas quatro pautas: a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), aprovação do Marco Civil da Internet, a aprovação da reforma da previdência e o debate em torno das cotas raciais nos processos seletivos nas universidades brasileiras. Dois destes temas são específicos sobre a área da comunicação social, e outros dois são considerados de extrema importância para a vida daqueles grupos sociais que fazem partes dos mais marginalizados no Brasil, os(as) trabalhadores e os(as) negros(as) .
A proposta é verificar como os jornais O Globo e Brasil de Fato trataram dessas temáticas, a fim de compará-los. Durante a verificação, serão discutidos os padrões de abordagem de ambos os veículos de comunicação. Antes de aprofundar a análise das fontes históricas, no entanto, é necessário fazer uma breve apresentação de cada um dos temas.
Primeiramente, cabe tratar da reforma da previdência. Uma das primeiras medidas aprovadas pelo governo e pela legislatura que exerceram mandatos de 2003 a 2006 foi esta. A aprovação da reforma teve apoio dos quadros majoritários do Partido dos Trabalhadores, mas foi rejeitada pela ala mais radical do partido, que votou contra ou se absteve da votação.
Segundo Carlos Ranulfo Melo e Fátima Anastasia, a aprovação da reforma da previdência resultou em uma derrota para a classe trabalhadora brasileira, em especial aos funcionários públicos, aposentados e pensionistas. Eles lembram que as propostas em torno da reforma começaram em 1995, ainda no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, do PSDB, através da Proposta de Emeda Constitucional n
úmero 33. No entanto, afirmam que foi durante o governo de Lula que a proposta pode ser finalmente positivada. Dentre as perdas, destacam-se :1) a instituição de um valor máximo (2400 reais à época) a ser pago, que igualava as categorias do funcionalismo público aos trabalhadores da iniciativa privada, uma espécie de "nivelamento por baixo". 2) a taxação dos servidores inativos em 11% do valor dos salários dos servidores federais que ganhavam mais de 1440 reais e dos servidores estaduais e municipais que ganhavam mais de 1200; 3) a redução de 5% (a partir do ano de 2006) para aqueles que se aposentassem antes da idade mínima; 4) o desconto de 30% nas pensões que fossem concedidas após a aprovação da reforma, entre outras. O governo argumentava que tais "ajustes" eram necessários para que a economia do país pudesse crescer. Mas dentro do próprio partido, havia quem discordasse. Diversos parlamentares do Partido dos Trabalhadores se opuseram às pautas da reforma. Dentre eles, destacaram-se João Batista, o "Babá", Luciana Genro e Heloísa Helena. Tal processo acabaria fazendo com que eles fossem desligados do Partido.
Segundo Melo e Anastasia, o governo Lula, em comparação ao governo anterior, obteve muito mais êxito em aprovar a reforma, uma vez que ela acontecera ainda no primeiro ano de governo. Dentre as razões que eles apontam para justificar tal fato estão o fato de Lula ter enfrentado menos resistência por parte do poder legislativo e também a alteração do comportamento político de atores ligados aos movimentos sociais, o que influenciou no resultado das tramitações.
Analisar o processo histórico utilizando como fonte primária um jornal permite a(o) historiador(a) analisar dois aspectos relevantes através deste método. O primeiro, sem sobra de dúvidas é identificar a forma de apresentação dos acontecimentos por parte do meio de comunicação em questão, o que nos permite refletir sobre o(s) posicionamento(s) político(s) do veículo. Atentar para este aspecto é fundamental nesta obra, uma vez que se entende aqui que uma empresa de comunicação pode ser considerada um aparelho privado de hegemonia, dentro dos postulados teóricos de Antonio Gramsci. Isto quer dizer que ela (assim como igrejas, partidos políticos, sindicatos, associações empresariais, entre outros) tem a capacidade de orientar/convencer os cidadãos em torno de um projeto de sociedade, garantindo o consenso necessário para que uma estrutura política, econômica e social se estabeleça. O segundo está em identificar que o processo histórico é formado por diversas possibilidades de ação por parte dos seres humanos. Isso implica em desnaturalizar os acontecimentos do passado, ou seja, em negar que "as coisas aconteceram porque haviam de acontecer".
A cobertura da reforma da previdência pelo jornal O Globo permite ao pesquisador atentar para estas duas facetas do fazer historiográfico através da análise de jornais como fontes. Durante o ano de 2003, o veículo publicou praticamente todos os dias alguma notícia em relação à esta medida. Como se trata de um periódico que está entre aqueles de maior circulação nacional e é pertencente ao maior conglomerado de comunicação do país, foi feita a opção por analisá-lo, inclusive porque todo o acervo do jornal no ano de 2003 (exceto os classificados) poderia ser encontrado on-line.
Já no dia 3 de janeiro, após dois dias dedicando dezenas de páginas cobrindo a posse do novo presidente empossado, a página 12 de O Globo deu destaque para o pronunciamento do então ministro da previdência, Ricardo Berzoini. A manchete (principal, diga-se de passagem) da página afirmava: "Berzoini quer fim de privilégios na previdência", o que já anunciava a postura e determinação do novo governo em aprovar a reforma. O que chama a atenção nesta reportagem do dia 3 de janeiro é que somente o ministro da previdência foi ouvido na matéria, sem que qualquer voz dissonante ou complementar fosse apresentada.
Dois dias depois, na sessão "Opinião" do jornal (página 6), foi publicado um texto intitulado "Sonho e Realidade". Nele, o(a) autor(a) afirmava que a carga tributária imposta ao povo brasileiro (cerca de 36% do PIB, segundo o próprio texto) não era capaz de suprir as despesas públicas. Afirmava ainda que estas não paravam de crescer graças aos enormes gastos com a previdência. Ficava subentendida, então uma defesa de que os cortes na área previdenciária eram necessários para que houvesse responsabilidade fiscal por parte do governo. Além disso, passava a ideia de que não haveria outra opção senão a adotada pelo novo governo.
Nos dias 8 (página 3) e 9 (página 5) de janeiro o jornal já destacava o déficit que os gastos da previdência geravam para o poder público, que era de 68 bilhões de reais. Ainda que na mesma página 5 do dia 9 de janeiro se atentasse para o fato de que uma parcela dos trabalhadores ficaria prejudicada caso a reforma fosse aprovada, na reportagem sobre o tema, somente o ministro Ricardo Berzoini teve espaço para pronunciamento.
No dia 10 de janeiro foi possível verificar que aqueles que seriam afetados pela reforma foram ouvidos por O Globo. No entanto, a reportagem da página 5 do veículo deu espaço a 6 pronunciamentos do ministro Berzoini, enquanto apenas um trabalhador foi ouvido pelo jornal, o então Secretário de Organização da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Securidade social, Vladimir Nepomuceno.
Durante todo o ano de 2003, foi possível verificar uma tendência por parte de O Globo no que diz respeito ao debate público acerca da reforma da previdência. Antes de dar prosseguimento, é importante ressaltar um aspecto desta reforma, que foi analisada por Melo e Anastasia. Para estes autores (visão que é reiterada nesta pesquisa), tal temática (assim como várias outras pautas políticas que passam pelo parlamento) esteve condicionada por 5 "arenas" do jogo político. A primeira delas, sem dúvida é a "arena" parlamentar, isto é, os debates e negociações dentro do congresso nacional que levaram a aprovação da reforma. A segunda seria a do Poder Executivo, uma vez que o assunto envolvia os ajustes nas contas públicas e isso fazia com que o presidente precisasse se mobilizar com seus ministros para influenciar o comportamento político da maioria dos parlamentares, em especial no próprio PT, que não foi unânime em relação à reforma. O terceiro seria o do Poder Judiciário, que poderia "ser acionado como ator com poder de veto, dado o grau de desconstitucionalização exigido para a aprovação da proposta". O quarto seria o que os autores chamaram de "arena societal", ou seja, a parcela da população que se envolveu direta ou indiretamente com as discussões em torno da reforma e que buscava pressionar os poderes legais em busca de seus interesses. Por último, viria a "arena eleitoral", especialmente importante porque a votação do projeto poderia ter implicações no que diz respeito à reeleição (ou não) dos membros das casas legislativas, uma vez que os debates e posicionamentos se tornariam públicos.
Sendo assim, diante desta multiplicidade de "arenas" que os meios de comunicação poderiam dar atenção, foi possível verificar que as esferas parlamentar e do poder executivo foram privilegiadas pela cobertura do jornal em relação às demais. Como foi afirmado anteriormente, durante o ano de 2003, em praticamente todas as edições do jornal O Globo, que é de circulação diária, houve alguma menção à reforma da previdência, sendo que na maioria dos casos, o veículo optou pela ênfase nos trâmites institucionais que conduziram a reforma em detrimento das ações conduzidas por aqueles que seriam afetadas por ela, os(as) trabalhadores(as), sobretudo os servidores públicos. Quando houve alguma notícia em relação àqueles que batalharam politicamente contra a reforma, ela foi noticiada como aspecto secundário. Além disso, dentro da pouca visibilidade dada aos contrários à reforma, houve uma tendência a destacar mais a resistência de alguns parlamentares petistas do que a mobilização social dos servidores. Tal tendência, segundo Edna Miola, é comprovada empiricamente pela maioria das coberturas jornalísticas. A visibilidade dada aos atores históricos varia de acordo com a posição hierárquica que eles ocupam dentro de uma estrutura institucional. Isto quer dizer que há muito mais espaço para aqueles que ocupam cargos de ministros, deputados, senadores, entre outros do que para os movimentos sociais e sindicatos organizados na base da sociedade.
No entanto, tal diferença de visibilidade oferecida pela maioria dos meios de comunicação não pode, de forma alguma, ser encarada como natural. Há de se pensar as razões pelas quais O Globo adotou essa postura. Primeiramente, é necessário ter em mente que quando o termo "tendência" é usado, é justamente com o objetivo de não ignorar ocasionais posicionamentos divergentes dentro do próprio jornal, em especial porque elas eventualmente ocorrem dentro da grande imprensa. Isso não implica em dizer que se trata de um jornal que lida de maneira equitativa com diversos pontos de vista. Definitivamente não é o caso. Mas também não se pode incorrer na ingenuidade de acreditar que não existam vozes dissonantes dentro do veículo. Não há a pretensão de dar uma resposta definitiva e fechada para o porquê de o jornal adotar essa ou aquela postura, mas é possível apontar alguns caminhos.
Primeiramente, é preciso relembrar que dentro do quadro teórico aqui proposto, ganha destaque o pensamento de Antonio Gramsci, filósofo socialista da Itália, nascido no final do século XIX e morto na década de 30 do século XX. Para este pensador, pensar no Estado não significa apenas considerar as suas instâncias formais. Para ele, o Estado é a junção da sociedade civil, a partir de seus aparelhos privados de hegemonia (escolas, igrejas, sindicatos, associações empresariais, meios de comunicação, entre outros) com a sociedade política, isto é, as forças armadas, a polícia, os poderes legislativos, executivo e judiciário. A união entre parte da sociedade civil e os aparelhos coercitivos do Estado formam o que Gramsci chama de Estado Ampliado, que é capaz de garantir a dominação de uma classe ou fração de classe sobre outras classes e/ou frações de classes, através de um misto entre coerção e consenso, que estabeleceria então a hegemonia de determinados grupos em relação a outros.
Então, como O Globo, assim como vários outros veículos de comunicação da mídia oligopólica brasileira, depende do Estado para se manter como um dos principais formadores de opinião (ou de consenso, para usar os termos gramscinianos) do país, e o Estado, por sua vez, depende das Organizações Globo (proprietária do jornal), uma vez que o que é retratado nos meios de comunicação de massa influi diretamente na opinião pública, muito dificilmente os assuntos da "grande política" seriam retratados em O Globo. Por "Grande Política", refiro-me a uma definição do próprio Gramsci, ao diferenciá-la da "pequena política". Segundo o filósofo, "A grande política compreende as questões ligadas à fundação de novos Estados, a luta pela destruição, pela defesa, pela conservação de determinadas estruturas orgânicas econômico-sociais". Por outro lado, a "pequena política" compreenderia "... as questões parciais e cotidianas que se apresentam no interior de uma estrutura já estabelecida em decorrência de lutas pela predominância entre as diversas frações de uma mesma classe política".
O que se pretende afirmar aqui, então é que, durante a cobertura dos trâmites da reforma da previdência, O Globo priorizou o debate pela "pequena política" ao optar por dar pouco destaque à resistência dos trabalhadores do setor público e aos questionamentos sobre os benefícios que o Estado estava concedendo aos bancos. Pode-se dizer que tal prática ocorreu uma vez que ela correspondia não só aos interesses de seus proprietários, mas também aos de seus anunciantes, em sua maioria, empresas privadas e o próprio Estado brasileiro. Ao fazer isso, torna-se possível afirmar que o veículo contribuía para a estruturação da hegemonia da fração de classe dominante, a burguesia financeira.
Antes de entrar na discussão sobre a forma na qual Brasil de Fato cobriu a reforma da previdência, é necessário discutir um pouco de sua história – que será aprofundada no capítulo 3. Ele foi lançado oficialmente no dia 25 de janeiro de 2003, a partir das discussões do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, e teve seu primeiro exemplar publicado no dia 8 de março do mesmo ano, vendido pelo preço de 2 reais. Segundo Rozinaldo Antônio Miani, este jornal foi formado a partir da vontade de diferentes setores da esquerda brasileira de disputar a hegemonia na sociedade, em diálogo não só a nível nacional, mas também com outros setores da esquerda latino-americana. Ou seja, desde a sua fundação, Brasil de Fato se propunha a ser um veículo contra hegemônico. Ainda segundo Miani, tal tentativa não era inédita na sociedade brasileira, mas outras que atuaram no sentido de emplacar um veículo de comunicação não foram bem-sucedidas e/ou duradouras para as lutas sociais no Brasil.
Vale lembrar que o autor também ressalta que não se disputa a hegemonia com um único veículo de comunicação, mas a partir de uma série de frentes que podem gerar um determinado consenso por parte da maioria dos indivíduos da sociedade. Este trabalho não tem alcance para destrinchar todos os aspectos da disputa pela hegemonia na sociedade brasileira no período 2003-2014, mas a comparação entre Brasil de Fato e O Globo pode ajudar a verificar quais são as estratégias adotas por cada veículo para gerar um convencimento por parte de seus públicos.
As consultas ao jornal Brasil de Fato foram realizadas on-line a partir do portal Issuu. Nele, encontram-se diversas edições inteiras do jornal, que permitem ao pesquisador ter acesso gratuito às suas edições.
No que diz respeito à reforma da previdência, em sua edição de 21 a 27 de agosto (apenas a vigésima quinta do jornal), verificou-se algo que foi difícil de encontrar nas páginas de O Globo: o destaque para a luta dos trabalhadores. A manchete de capa do jornal dizia: "Servidores da educação repudiam reforma". Havia uma foto de uma manifestação contra a reforma na qual 20 mil pessoas estiveram presentes em Brasília, segundo o próprio jornal. A página 4 dizia em sua manchete: "Um sonoro 'não' à reforma da previdência". Abaixo, era possível verificar uma foto na qual profissionais sindicalizados ligados à área da educação pública mostravam sua insatisfação com tal proposta, uma das primeiras a ser discutida pelo novo governo.
Um pouco antes, na segunda tiragem do jornal, foi possível verificar um viés classista na cobertura sobre as questões da previdência. Uma das manchetes que estampava a primeira página do jornal (que esteve em divulgação entre os dias 16 e 22 de março) dizia: "Fundos do INSS vão para banqueiros". Na página 4 desta mesma edição, a matéria referente ao assunto estampava a manchete: "INSS tem dinheiro. Pergunte aos banqueiros". O jornal denunciava que havia uma série de intentos, por parte do governo da época, assim como dos anteriores em difundir a ideia de que se a previdência continuasse com os seus "altos gastos", o Brasil quebraria economicamente. O ponto de vista - mais que explícito, diga-se de passagem - do jornal foi expressado a partir de um claro descontentamento com a política previdenciária, uma vez que, os motivos pelos quais se intentava diminuir os custos do governo com a previdência, de acordo com o pensamento expressado pelo veículo, atendiam mais aos interesses da burguesia financeira e especulativa do que os interesses das contas públicas do Estado brasileiro, e claramente, dos trabalhadores. Diferentemente de O Globo, Brasil de Fato ofereceu a seus leitores a ideia de que a política previdenciária poderia ser guiada por outro viés, tocando em uma questão classista. Sendo assim, o jornal se aproximou de um tipo de discussão que Gramsci provavelmente chamaria de "Grande Política".
A visão do jornal é reiterada por Ivonete Boschetti. Ao analisar como as reformas da previdência, desde a década de 1990, condicionaram a seguridade social brasileira, a autora coloca em xeque os argumentos governamentais que tentavam justificar o corte de custos nessa área. Ainda segundo ela, o déficit entre a receita e a despesa não era um argumento que se justificava na prática, mas sim que era utilizado para legitimar um processo de descaracterização da previdência enquanto um sistema de proteção social.
Sendo assim, foi possível verificar, durante o processo de disputas que levou à aprovação e positivação da reforma da previdência, que os jornais colocaram em prática dois tipos de cobertura que eram pautadas por diferentes interesses de classe, e consequente, produziram jornalismos diferenciados um do outro. Nessas disputas, os jornais mostraram pontos de vistas divergentes, sendo que em Brasil de Fato, o posicionamento político é muito mais claro do que em O Globo. Tal constatação permite ao leitor verificar que a cobertura jornalística, independentemente do veículo, não é neutra e objetiva, como alguns veículos e jornalistas insistem em afirmar. Além disso, permitem ao leitor fazer uma análise sobre as disputas pela hegemonia e as diferentes estratégias adotadas pelos meios de comunicação para alcança-la.
Finalizada a exposição em torno da reforma da previdência, será feita agora uma discussão sobre como ambos os jornais trataram da positivação de ações afirmativas para negros, pardos e índios nas universidades brasileiras. É necessário frisar que a discussão em torno das "cotas" ganhou muita visibilidade a partir de 2003, quando a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) se tornou a primeira a reservar uma parcela de suas vagas para estudantes afrodescendentes e indígenas. Apesar da primeira experiência ter se dado em 2003, a maioria das universidades federais brasileiras só foi adotar tal política a partir de 2009. Trata-se de uma questão que divide opiniões até o momento em que este trabalho é escrito. Desta forma, o que é divulgado pelos meios de comunicação e os debates em torno de tal proposta servem – e muito – para a formação da opinião pública, fundamental para a geração de consenso. Sendo assim, buscarei analisar a cobertura dos jornais durante o ano de 2009, a fim de comparar o posicionamento político de ambos em relação às ações afirmativas para negros, pardos e índios nas universidades brasileiras. Os resultados que podem ser observados com a análise permitem ao pesquisador identificar, parcialmente, qual modelo de sociedade é defendido por cada veículo.
Antes de entrar na análise específica sobre a cobertura dos meios de comunicação, é preciso explicar de onde vem tal proposta de se reservar vagas a partir de critérios raciais nas universidades federais brasileiras. É necessário ter em mente que um dos traços culturais da sociedade brasileira é o racismo. O Brasil é um país que conviveu com a escravidão durante séculos, sendo o último a aboli-la oficialmente no continente americano, no ano de 1888. Mesmo no pós-abolição, os antigos escravizados se mantiveram, majoritariamente marginalizados, sem acesso à terra, moradia e os direitos mais básicos do ser humano. No entanto, é extremamente problemático afirmar que os(as) negros(as) e os descendentes das populações nativas da América são apenas vítimas de sua própria história, e não agentes. Historicamente, as populações marginalizadas devido aos seus traços físicos se mobilizaram em torno de ideias que combatiam – e que ainda combatem – esse tipo de opressão. O resultado da positivação das ações afirmativas para os grupos sociais oprimidos advém da luta por melhores condições de vida por parte deles próprios. Seria uma ingenuidade acreditar que o Estado brasileiro, historicamente composto, em sua maioria, por homens brancos de origem afortunada, formulasse voluntariamente qualquer tipo de política pública que favorecesse os setores mais marginalizados da sociedade. Partindo deste princípio, é possível, então, iniciar as discussões sobre a cobertura dos jornais.
Como grande parte dos debates em relação à reserva de vagas para negros pardos e índios ocorreu no ano de 2009, quando houve uma reformulação na forma de acesso às universidades federais brasileiras, escolhi delimitar o recorte temporal da análise dos jornais a este ano. Através do acervo on-line de O Globo, que permite a realização de pesquisas a partir de buscas por palavras-chaves, foi possível encontrar cerca de 32 páginas que versavam sobre o tema. É impossível, devido às limitações deste trabalho, analisar minunciosamente todas elas. Sendo assim, foi feita a escolha por dissertar sobre as páginas onde o conteúdo publicado visava, explicitamente, apresentar o ponto de vista dos autores sobre o tema. Tal seleção não é aleatória. A escolha por artigos contendo a opinião dos(as) autores(as) é especialmente importante porque são nessas partes onde podemos verificar com mais clareza o posicionamento político de um veículo de comunicação e identificar eventuais dissensos que podem ocorrer dentro do mesmo. As exposições de opiniões, em um jornal de grande tiragem e um dos maiores em circulação no país tem fundamental importância no que diz respeito à formação da opinião pública e na geração de consenso em torno de valores morais, ações, visões de mundo e projetos de poder.
No dia 2 de fevereiro de 2009, O Globo publicou um artigo, em sua sexta página, criticando o projeto de lei que criava a reserva de vagas baseadas em critérios raciais. Nele, o(a) autor(a) afirmava que a aprovação da lei 73/99 reduziria a importância do mérito acadêmico e privilegiaria a cor da pele nos processos seletivos. Além disso, argumentava dizendo que, caso tal projeto fosse colocado em prática, uma série de estudantes despreparados assumiria cadeiras nas universidades, e que consequentemente, formaríamos profissionais menos qualificados. Para este(a) autor(a), a solução passava por melhorias no ensino básico, e que a aprovação da lei de cotas seria uma vitória para políticos populistas que não visavam a real solução do problema na educação pública brasileira. O artigo não fazia menção a qualquer dado ou fonte que embasasse seu posicionamento político, claramente contrário às cotas.
Na mesma página, um artigo que se encontrava abaixo deste que acaba de ser mencionado, assinado por Gilmar Machado, argumentava a favor da aprovação da lei 73/99, justificando seu ponto de vista a partir de dados – nos quais as fontes não foram mencionadas – que explicitavam que em pleno século XXI, havia uma série de diferenças entre brancos e negros no Brasil no que diz respeito à grau de escolarização, renda, emprego, entre outros fatores. Sendo assim, verificou-se que o jornal abriu espaço a opiniões divergentes em sua edição, deixando claro qual era a opinião de O Globo e que havia uma outra forma de se interpretar o projeto de lei.
Poucos dias depois, na edição de 5 de fevereiro de 2009, Demétrio Magnoli publicou um artigo que, em muitos pontos, corrobora com a opinião publicada pelo jornal O Globo dias antes. Para este autor, a lei 73/99, caso fosse aprovada, seria a primeira lei racial da história brasileira. Além disso, Magnoli afirmou não existir um movimento negro organizado no Brasil, – como ocorrera em países como os EUA e a África do Sul – prevalecendo, no caso, a pressão de algumas ONGs racialistas que não possuíam legitimidade para pressionar o congresso em prol da aprovação da lei, uma vez que a maioria dos brasileiros não concordava com a separação de vagas de acordo com critérios raciais. Assim como o primeiro texto que foi discutido, Magnoli enfatizava a necessidade de se investir em educação pública, para que as cotas não se fizessem necessárias. Inclusive, lembrou de um projeto de lei de autoria do então senador Demóstenes Torres (DEM – GO) que visava garantir o ensino integral nas escolas públicas, que segundo ele, seria economicamente viável.
Curiosamente (ou não), no dia 9 de fevereiro de 2009, Demóstenes Torres viria a ser mencionado novamente em um artigo em O Globo. Dessa vez, o autor era o jornalista Carlos Alberto di Franco. Ao abrir espaço para o então senador do Democratas, este afirmou que o PL 73/99 faria com que a sociedade brasileira se visse dividida, porque tal proposta estimularia o ódio entre raças. Posteriormente, o autor fez menção à obra de Ali Kamel, diretor de jornalismo das organizações Globo, para afirmar que o Brasil nunca foi um país racista, no qual havia algumas pessoas racistas. Assim como os demais textos – à exceção do de Gilmar Machado – di Franco afirmou que a solução para tal problema se encontrava na melhoria da educação pública. Além disso, afirmou que "os negros brasileiros não precisam de favor".
Na edição de 17 de março de 2009, em outra coluna de opinião, O Globo apresentou, mais uma vez, uma série de argumentos posicionando-se contrário às cotas raciais e ao Estatuto da Igualdade Racial, que previa não só a reserva de vagas para minorias étnicas nas universidades, mas também no mercado de trabalho. O texto afirmava, além de alguns pontos já vistos anteriormente, que a medida que previa tal tipo de distribuição de vagas nas universidades era uma armadilha perigosa para o país. Apesar de reconhecer a necessidade de políticas públicas que visassem combater a desigualdade social, o jornal foi enfático ao afirmar que tal medida tinha cunho discriminatório e racista.
Além destes cinco textos de cunho opinativo, foi possível encontrar mais 14 que versavam sobre a reserva de vagas para negros índios e pardos nas universidades brasileiras. Como, muitas vezes, os argumentos tendem a tornar-se repetitivos para ambos os lados, optou-se aqui pela construção de uma tabela na qual é possível verificar a diferença quantitativa de posicionamentos pró-cotas contrários a elas.
Tabela 1 – Posicionamentos em relação às ações afirmativas em O Globo
Data e Página
Autor(a)
Posicionamento
2 de fevereiro de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
2 de fevereiro de 2009 – 6
Gilmar Machado.
A favor das cotas.
5 de fevereiro de 2009 – 7
Demétrio Magnoli.
Contrário às cotas.
9 de fevereiro de 2009 – 7
Carlos Alberto di Franco.
Contrário às cotas.
17 de março de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
13 de abril de 2009 – 7
Edson Santos.
A favor das cotas.
14 de maio de 2009 – 7
Demétrio Magnoli.
Contrário às cotas.
16 de maio de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
28 de maio de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
2 de junho de 2009 – 7
Luiz Garcia.
Contrário às cotas.
3 de junho de 2009 – 7
Elio Gaspari.
A favor das cotas.
4 de junho de 2009 – 7
João Luiz Mauad.
Contrário às cotas.
22 de junho de 2009 – 7
Raul Henry.
Contrário às cotas.
26 de junho de 2009 – 7
Rodrigo Constantino.
Contrário às cotas.
28 de julho de 2009 – Revista Magazine, Página 3
Augusto Chagas, em entrevista a Lauro Neto.
A favor das cotas.
3 de agosto de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
22 de setembro de 2009 - 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
6 de outubro de 2009 – 6
Não identificado(a).
Contrário às cotas.
25 de outubro de 2009 – 7
Roberta Fragoso M. Kaufmann
Contrário às cotas.

Pelo que se pode verificar a partir da análise da Tabela 1, nas páginas dedicadas a exposição de opiniões, O Globo apresentou 19 textos que argumentavam acerca da reserva de vagas nas universidades federais brasileiras para estudantes negros, pardos e indígenas. Destes, 15 – ou aproximadamente 79% - se posicionaram contrários à aprovação do PL 73/99, nos quais, grosso modo, os argumentos tenderam a defender a "não racialização" do país e que o problema de desigualdade no que diz respeito ao acesso ao ensino superior no Brasil não estava ligado a problemas relacionados ao racismo, mas sim à pobreza. Por outro lado, 4 textos – ou aproximadamente 21% - se mostraram favoráveis à aprovação da lei. Todos eles tocavam em questões relacionadas a necessidade de se haver uma medida de ação afirmativas para diminuir as diferenças sociais, que no Brasil, se confundem com desigualdades raciais. Nenhuma das que defendiam o PL, no entanto, enfatizava que a tramitação projeto de lei advinha de pressões dos movimentos sociais, de setores organizados da sociedade civil. Apenas aquelas que se posicionavam contrárias às cotas lembraram de tal fato, ainda que fosse para desmoralizá-los, afirmando que ONGs e movimentos sociais não poderiam se afirmar como representantes da sociedade e que os parlamentares deveriam pensar mais nos cidadãos "desorganizados".
Segundo Petrônio Domingues, o Brasil é um país no qual os indicadores sociais andam ao lado dos indicadores raciais. A segregação social leva a marca do racismo. Em seu texto, o autor defende a ideia de que os aspectos que fazem da sociedade brasileira uma sociedade racista variam desde a porcentagem de negros desempregados, até a expectativa de vida dos mesmos, passando, obviamente, pela entrada nos cursos de ensino superior. À época da publicação de seu artigo (2005), 97% dos universitários eram brancos, 2% eram negros e 1% eram descendentes de orientais. É importante frisar que tal recorte nada tem a ver com aspectos genéticos. Sendo assim, uma pessoa que tem 80% de sua herança genética de descendentes europeus, mas que por ventura, tenha a pele negra e/ou qualquer outro traço físico que remeta à negritude, é considerada negra. O que entra em questão então, é a discriminação do ser humano a partir de suas características físicas, como a cor da pele, cabelos e traços estéticos-corporais. Nenhum dos colunistas de O Globo tocou no assunto de que, antes de algumas universidades adotarem sistemas de cotas, o que havia, na prática, era uma reserva de vagas – não explícita – para estudantes brancos, a maioria advinda das camadas médias ou das famílias burguesas. Sendo assim, ao se posicionarem contrariamente ao PL 73/99, o que se defendia, na verdade, era que uma geração de milhares de estudantes negros, pardos e indígenas ficassem de fora do ensino superior público brasileiro. Como "solução", defendiam uma proposta genérica – investimentos no ensino básico – que levaria, no mínimo, uma década e meia para ter resultados práticos, haja vista que os investimentos em educação básica possuem retornos de médio e longo prazo. Logo, podemos identificar em O Globo uma postura conservadora, ainda que eventualmente houvesse espaço para vozes divergentes que se alinhavam a um discurso mais progressista dentro do jornal.
O jornal Brasil de Fato, por sua vez, não dedicou intensa cobertura à aprovação do PL 73/99. Durante todo o ano de 2009, foi possível verificar apenas uma reportagem que fazia referência à reserva de vagas para estudantes negros, pardos ou indígenas nas universidades federais do Brasil. Tratava-se de uma reportagem divulgada na edição 343, em circulação na semana de 24 a 30 de setembro de 2009.
Nesta reportagem, Brasil de Fato seguiu sua tendência de ouvir militantes de movimentos sociais e ativistas envolvidos com determinada pauta. Ao comentar a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, o jornal problematizou o fato de alguns pontos considerados fundamentais para a promoção de uma redução nas desigualdades raciais terem sido retirados do texto final do Estatuto. Entre elas, estava a retirada da obrigatoriedade de se aprovar as cotas, contestadas judicialmente por parlamentares do Democratas (DEM), além da demarcação de territórios quilombolas. A retirada de tais propostas do Estatuto foi criticada pelo jornal e pelos entrevistados pelo mesmo. Os agentes históricos ouvidos na reportagem foram Marcelo Paixão e Douglas Belchior, duas pessoas envolvidas na luta antirracista. Ambos comemoraram a aprovação do instituto, que para eles foi uma demonstração de reconhecimento da necessidade de políticas públicas focadas na superação das desigualdades raciais por parte do Estado brasileiro. Porém, não deixaram de ressaltar a necessidade de se continuar avançando na conquista de mais direitos para os grupos oprimidos.
No entanto, chama a atenção o fato de apenas uma reportagem ter contemplado o tema das ações afirmativas em prol de etnias historicamente segregadas na sociedade brasileira. Apesar de o jornal adotar uma postura claramente favorável à aprovação das reservas de vagas e ao Estatuto da Igualdade Racial, o jornal não fez uma cobertura extensa e não promoveu debates intensos em relação à temática. Há de se perguntar o porquê de tal constatação. Ao analisar a cobertura das edições de Brasil de Fato no ano de 2009, foi possível verificar que a maioria das manchetes e notícias em destaque no jornal faziam referência ao quadro político latino-americano, sobretudo de Venezuela, Bolívia, Equador, Nicarágua e Honduras – onde, no ano de 2009, o então presidente Manuel Zelaya foi vítima de um golpe militar. Então, talvez a resposta possa passar por uma proposta do jornal de dar foco a questões internacionais, uma vez que boa parte da mídia hegemônica tendeu a criminalizar os governos desses países por terem uma tendência de menor subordinação aos interesses do imperialismo, principalmente o norte-americano.
Outro ponto que pode guiar tal resposta é apontado por Petrônio Domingues. Segundo o autor, uma parcela da esquerda marxista relutou em apoiar a aprovação das ações afirmativas nas universidades por se tratarem de uma política pública reformista, e não revolucionária, isto é, que não atingia as raízes do problema da desigualdade social e racial. Como Brasil de Fato se caracterizou por aglutinar diferentes pensamentos de esquerda em sua produção, torna-se razoável supor que não havia um consenso dentro de seu editorial capaz de fazer com que o jornal se empenhasse na causa de rebater os argumentos vindos dos meios de comunicação hegemônicos, notavelmente, contrários às ações afirmativas – ainda que, como se viu em O Globo, houve espaço, mesmo que pequeno, para quem as defendessem.
De qualquer forma, dadas as limitações desta pesquisa, não é possível formular uma resposta consistente que explique o porquê de Brasil de Fato ter dado tão pouca visibilidade a uma proposta que foi capaz de oferecer maiores oportunidades de acesso à educação de jovens pobres e etnicamente marginalizados. Talvez uma futura pesquisa possa fornecer melhores elementos que respondam a tal questionamento.
Cabe agora analisar a cobertura dos jornais no que diz respeito à criação da Empresa Brasil de Comunicação. Segundo Edna Miola, as políticas públicas de comunicação que visavam fomentar uma regulamentação desta área no Brasil sempre foram poucas e, quando existiram, tenderam a privilegiar os setores dominantes do mercado. Ainda segundo a autora, a criação da EBC foi um marco importante para a história da comunicação brasileira pois, neste caso, ela surgiu de uma mobilização dos movimentos sociais em articulação com o governo federal, em detrimento dos interesses dos empresários do setor e de grande parte dos parlamentares do Congresso Nacional.
Miola também reforça a ideia de que o Estado brasileiro primou, a partir do processo de redemocratização, por um modelo essencialmente privado de comunicação social em detrimento de um modelo que pudesse responder às demandas dos demais setores da sociedade, como as dos movimentos sociais. Tal prática fez com que os meios de comunicação tradicionais se transformassem em verdadeiros conglomerados, que se apoiaram, sobretudo, em uma estrutura que permitisse a existência da propriedade cruzada.
A criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) fez com que vários setores da sociedade civil organizada que se viram, ao mesmo tempo, esperançosos e temerosos em relação ao governo Lula, considerassem a criação da TV pública um passo à frente em relação a mudanças mais democráticas na comunicação brasileira. A medida provisória responsável pela criação desta empresa, que se formaria através da fusão da ACERP com a Radiobrás previa não só este ponto específico, mas também dissertava sobre o modelo de gestão a ser aplicado à empresa (Diretoria executiva, Conselho de Administração e um Conselho Curador, composto por membros do governo e da sociedade civil), além das formas de financiamento que teria a nova emissora (publicidade institucional, patrocínios, dotação orçamentária e prestação de serviços). Sendo assim, havia sido colocada na prática a ideia de uma televisão pública independente dos interesses editoriais dos grandes grupos de comunicação do país.
Desta forma, cabe agora analisar como tal processo foi noticiado pelo maior jornal da maior empresa de comunicação do Brasil. Primeiramente, chama a atenção a pouca visibilidade dada à questão por parte de O Globo. Na pesquisa realizada através de seu acervo on-line, foi possível encontrar poucas páginas nas quais havia algum tipo de menção à criação de uma rede de televisão pública. No total, foram encontradas apenas 7 páginas no período que compreende outubro de 2007 e outubro de 2008, ou seja, 1 ano. Vale lembrar que O Globo é um jornal de circulação diária e um dos maiores do país no que diz respeito ao número de páginas por edição.
A primeira das páginas encontradas, datada de 26 de outubro de 2007 (página 10) fazia uma breve menção à criação da empresa responsável por gerir a televisão pública. A notícia explicava resumidamente como havia sido criada a empresa, segundo as palavras do jornal, por um "decreto" – o termo jurídico mais adequado seria Medida Provisória, ou MP – do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além de explanar, também de forma sucinta, a receita financeira da empresa e sua forma de estruturação. Neste caso, nenhum ator político foi ouvido pelo jornal.
No entanto, 5 dias depois – 31 de outubro de 2007 – na sua décima primeira página, O Globo dedicou uma reportagem cujo tamanho fora parecido com a explanada anteriormente na qual era possível destacar um posicionamento político por parte de algum agente histórico. Desta vez, fora ouvido um parlamentar da oposição. Neste caso, tratava-se de Paulo Bornhaussen representante do Democratas (DEM) do estado de Santa Catarina. Na reportagem, era possível identificar as críticas que a oposição conservadora ao governo petista fazia à criação da EBC. Segundo este grupo, a criação de uma rede de televisão pública era um risco à democracia pois havia a possibildade de ocorrer a "montagem de uma grande máquina de propaganda partidária" caso a EBC fosse criada. Além do pronunciamento de um parlamentar da oposição, o jornal também ouviu Tereza Cruvinel, que viria a ser presidente da nova rede pública. Segundo ela, havia a garantia de que o novo canal de comunicação não faria qualquer tipo de jornalismo "chapa-branca", isto é, que se furtaria de fazer críticas ao governo e que serviria simplesmente como máquina de propaganda petista.
Assim como na cobertura em relação à reforma da previdência, a partir da análise das páginas de O Globo, foi possível verificar a tendência que Edna Miola apontou. Mais uma vez, houve um destaque muito maior aos atores institucionais, como parlamentares da oposição (de direita, é importante frisar) e membros do governo e pouco destaque a quem está fora da institucionalidade, como os trabalhadores e os movimentos sociais. A exceção (se é que pode se chamar dessa forma) à esta tendência, que pode ser verificada em O Globo, ocorreu na edição de 30 de outubro de 2008 (página 15), na qual uma greve de jornalistas e radialistas obteve destaque em uma reportagem. Nela, no entanto, apesar de haver um destaque das ações dos trabalhadores e de suas versões em relação às negociações das pautas, foi possível verificar também que a voz da direção da empresa obteve mais destaque do que a dos trabalhadores. Além disso, os "prejuízos" decorrentes da paralisação dos trabalhadores também foram destacados.
Para além do que foi noticiado pelo jornal, é necessário também refletir sobre o porquê de tal pauta ter tido pouca visibilidade em O Globo. Primeiramente, acadêmicos ligados à pesquisa na área da comunicação social, dentre eles Venício Lima e Edna Miola, atentam para o fato de que a discussão sobre a regulamentação dos meios de comunicação no Brasil foi historicamente afastada da agenda pública de debates. Isto porque tal agenda é ditada justamente pelos meios de comunicação dominantes e/ou pelo Estado. Uma vez que, como Dênis de Moraes e Venício Lima expuseram, existe uma estrutura de comunicação que permite a propriedade cruzada e a prática do Coronelismo Eletrônico, não foi interessante para o Estado brasileiro e para os empresários da comunicação, nas últimas décadas, investir em canais públicos de radiodifusão. Sendo assim, qualquer proposta em torno da regulação da comunicação social ou em torno do fortalecimento de meios públicos independentes dos canais privados seria ignorada e/ou atacada pelos meios dominantes e por parte daqueles membros do Estado que tivessem qualquer relação ou compromisso político com a comunicação privada. Sendo assim, a escassez de matérias de O Globo sobre a criação da Empresa Brasil de Comunicação diz muito mais sobre o seu posicionamento político nesta questão do que o que foi de fato noticiado, ainda que se possa tirar algumas conclusões a partir das poucas notícias veiculadas pelo jornal. É importante ter em mente, mais uma vez que o caso aqui explicitado é apenas um dentre tantos outros. Miola, por exemplo, verificou a mesma tendência em A Folha de São Paulo, um dos principais jornais impressos do país, ainda que na pesquisa feita por ela, tenha sido possível encontrar uma coluna de opinião que defendesse a criação da EBC, algo que não foi possível verificar em O Globo nesta pesquisa.
O jornal Brasil de Fato, no que diz respeito à criação da EBC, adotou, como na reforma da previdência, uma postura diferente daquela adotada por O Globo. Foi possível verificar que o tema da regulamentação dos meios de comunicação, em especial do espaço da radiodifusão, teve um destaque maior que em O Globo. Inclusive, na sua edição número 221, o jornal estampou em sua página 9 a opção do então presidente venezuelano Hugo Chávez de não renovar a concessão do canal RCTV, uma das maiores concessionárias daquele país. Para o jornal, tal medida foi importante pois fez levantar um debate crucial em relação ao papel do empresariado na comunicação social de um país.
Em relação à questão da criação da Empresa Brasil de Comunicação especificamente, foi possível em Brasil de Fato, um jornal de circulação semanal, verificar que a temática em torno da criação da TV pública teve um número de reportagens parecido com o de O Globo, que é diário. Apesar de não encontrar tantas matérias específicas entre os anos de 2007 e 2008, aquelas que tratavam do tema o abordaram de maneira distinta de O Globo.
Primeiramente, na edição número 229, correspondente à semana de 19 a 25 de julho de 2007, o jornal chamava atenção, em sua página 8, para as definições políticas que estavam sendo formuladas pelo governo em relação à EBC. Algo que não foi possível verificar em O Globo presente na cobertura desta matéria de Brasil de Fato diz respeito à preocupação de ativistas da área de comunicação sobre a possibilidade da gestão da empresa que estava sendo criada ser, efetivamente, pública. O jornal, neste caso, seguiu a sua tendência de dialogar com as demandas dos movimentos sociais, quebrando a tendência jornalística de dar mais visibilidade aos atores políticos estabelecidos nas esferas institucionais.
A edição 246 do jornal, que esteve em circulação na semana de 15 a 21 de novembro de 2007, por sua vez, trouxe críticas à forma como estava sendo criada a EBC. Ao ouvir especialistas no assunto – a saber: Valério Brito, e Murilo Ramos - o jornal fazia uma crítica que já ficava visível na própria manchete da notícia, que dizia: "TV pública cada vez mais estatal". Nela, os acadêmicos supracitados criticaram, respectivamente, 1) o modelo de organização da empresa que estava a ser implementado, no qual, segundo Brito, o poder executivo poderia fazer diretamente a indicação dos conselhos de gestão da EBC e 2) O fato da empresa ser criada por uma Medida Provisória (MP) e não por um Projeto de Lei (PL), que segundo Ramos, poderia fazer com que houvesse mais discussões parlamentares sobre a forma de funcionamento da Empresa Brasil de Comunicação. Sendo assim, o processo se tornaria antidemocrático. Brasil de Fato também denunciou, nesta mesma reportagem, que a EBC, de acordo com a proposta em jogo, ficaria praticamente sob responsabilidade exclusiva da presidência da república. De acordo com a matéria, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria o poder de indicar 80% do conselho administrativo da empresa e 95% do conselho curador, que seria responsável pelas diretrizes da televisão pública. O jornal, além de corroborar com as críticas ao governo, também refutou os posicionamentos dos parlamentares da oposição pertencentes ao DEM e ao PSDB, que segundo eles, eram ligados à grande mídia corporativa e não teriam qualquer interesse em positivar a criação de uma rede de televisão pública. Verifica-se então, que neste ponto, o jornal adotou um posicionamento independente do governo e de sua oposição de direita.
No entanto, na semana de 29 de novembro de 2007 a 5 de dezembro de 2007, o jornal publicou em sua quarta página uma entrevista com Tereza Cruvinel, aquela que viria a ser a presidente da EBC. O jornal ressaltou a história profissional de Cruvinel, que trabalhara por 10 anos como colunista de O Globo, o que fazia com que a indicação do nome dela à presidência da empresa causasse uma certa apreensão por parte do próprio jornal e dos movimentos comprometidos com o fortalecimento da comunicação pública. Na entrevista, foram abordados temas como o pensamento teórico em comunicação de Cruvinel, a criminalização dos movimentos sociais por parte da mídia hegemônica, e os princípios jornalísticos editoriais da TV pública. Em linhas gerais, a presidente afirmou-se intelectualmente eclética, variando suas preferências por Gramsci, Bobbio e Chomsky, negou a existência de criminalização dos movimentos sociais pela mídia hegemônica, naturalizando o fato da mídia comercial refletir os interesses das classes dominantes, além de afirmar que a TV Brasil se basearia no princípio jornalístico da isenção.
Por fim, foi possível encontrar, tanto em O Globo, quanto em Brasil de Fato, uma matéria que versava sobre o mesmo tema: a criação do conselho curador da EBC, que seria formado por um grupo de quinze pessoas, a saber: Cláudio Lembo, Delfim Netto, Ângela Gutierrez, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, Maria da Penha Maia, Rosa Magalhães, Luiz Gonzaga Belluzzo, Isaac Pinhanta, Ima Vieira, Luiz Edson Fachin, Lúcia Willadino Braga, MV Bill, José Paulo Cavalcanti Filho, Wanderley Guilherme dos Santos e José Martins. Além desses, os ministérios da Comunicação, Educação, Cultura e Ciência e tecnologia estariam envolvidos com a curadoria.
No que diz respeito à nomeação dos curadores pela presidência da república, as coberturas de ambos os jornais foram completamente distintas. O Globo, no dia 27 de novembro de 2007, caracterizou a formação do conselho como eclética. A própria manchete da notícia já anunciava tal interpretação. Além disso, O Globo destacou o fato de que Boni era o único pertencente ao meio televisivo e o único jornalista era José Paulo Cavalcanti Filho. Na discussão que guiou a construção desta reportagem, foram ouvidos o então ministro das comunicações, Franklin Martins e Tereza Cruvinel, que viria a presidir a empresa. Ambos endossavam o posicionamento de que as escolhas por aqueles nomes seriam acertadas porque o grupo de 15 curadores englobava pessoas de diferentes profissões, regiões do Brasil e pontos de vista diversos.
Brasil de Fato, em sua edição n° 249, em circulação na semana de 6 a 12 de dezembro de 2007, por sua vez, enfatizou que dentre os 15 membros escolhidos para a formação do conselho pela presidência da república não havia qualquer representante de organizações sociais ou movimentos ligados às lutas dos trabalhadores. Para embasar sua crítica, o jornal concedeu espaço à João Felício, membro da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e João Brant, membro do coletivo Intervozes – que tem como pauta principal a democratização dos meios de comunicação no Brasil. Para o primeiro, a composição do conselho deveria ser mais eclética e chamar membros de setores organizados da classe trabalhadora, como a própria CUT ou o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Já o segundo afirmou não se sentir representado por nenhum dos 15 membros, por se tratarem de escolhas conservadoras e elitistas. Para Brant, a sociedade civil deveria escolher os conselheiros, e não a presidência da república.
Sendo assim, a cobertura de ambos os jornais em relação à criação da EBC permite ao pesquisador constatar algumas conclusões. A primeira delas é que tal assunto apareceu como secundário na construção das pautas de ambos os jornais. Em nenhum deles, a proposta de criação da EBC foi destaque em suas capas, – ao contrário da reforma da previdência, por exemplo – e na maioria dos casos, as notícias que apareceram nos jornais tiveram tamanho modesto, com exceção da entrevista feita com Tereza Cruvinel pelo jornal Brasil de Fato, que ganhou uma página inteira.
A segunda delas é que os jornais mantiveram as tendências que lhes são características no que diz respeito à visibilidade dos agentes sociais. Enquanto em O Globo foi possível verificar que os agentes ligados à esfera institucional tiveram maior destaque, sendo que neste caso, em especial, não foi possível verificar nenhuma reportagem na qual o veículo tenha concedido espaço aos movimentos sociais, em Brasil de Fato percebe-se uma preocupação em estabelecer diálogos com ativistas sociais. No entanto, a maior reportagem do jornal em relação à criação da EBC foi a entrevista com Tereza Cruvinel, presidente da empresa, e obviamente ligada ao aparato estatal.
A terceira é que se verifica que meios de comunicação distintos possuem estratégias distintas para tentar convencer o(a) leitor(a) a se aproximar de sua linha editorial. Enquanto Brasil de Fato adotou um posicionamento político mais claramente assumido, O Globo optou por mantê-lo mais implícito, o que não significa, de forma alguma, que o jornal tenha assumido uma postura imparcial. Tais estratégias giram em torno da produção de consenso em relação a um determinado projeto de sociedade, uma vez que o que estava em jogo, era a formação de um veículo de comunicação pública a nível nacional. Os grandes empresários que controlam a comunicação no Brasil, tinham, então, interesses para: 1) negligenciar o tema e não colocá-lo na agenda pública de discussão; 2) nas raras vezes em que o tema fosse tratado, conceder espaço àqueles contrários à proposta; 3) uma vez que a criação se tornasse inevitável, se articulassem para que seus interesses não fossem colocados em xeque pela TV pública – daí o interesse de Boni em participar do conselho curador da empresa e 4) excluir os ativistas ligados à movimentos sociais pró-democratização da comunicação de suas edições, para que estes fossem conhecidos o menos possível por grande parte da população.
Aqueles que não fazem parte do grande empresariado que comanda a maior parte dos veículos de comunicação, por sua vez, também tentam se contrapor ao discurso hegemônico e questionar as ações e estratégias daqueles que detêm a hegemonia. Daí a busca por quebrar tendências estéticas e jornalísticas que vigoram em grande parte da imprensa comercial.
A última das medidas a ser analisada é o Marco Civil da Internet. A escolha por tal tema advém da importância adquirida pela internet a partir do final do século XX, no qual o número de pessoas com acesso a ela aumentou significativamente. Este processo fez com que tal meio se tornasse extremamente relevante no que diz respeito ao acesso à informação, participação de debates que pautavam a agenda pública de discussões, entretenimento, articulação política, divulgação de eventos, entre outros fatores. Inclusive, as fontes utilizadas para a realização desta pesquisa foram encontradas através da internet, o que, de certa forma, demonstra um aumento da participação de tal ferramenta em diferentes níveis da vida em sociedade. Sua importância tem adquirido cada vez mais força na vida social, política, econômica e cultural, ainda que, no momento em que escrevo esta pesquisa, estima-se que metade dos brasileiros não disponha de acesso à internet.
No entanto, até meados de 2014, o Brasil não possuía uma regulamentação precisa para a exploração e utilização deste meio. Segundo os autores Rafael Cardoso Sampaio, Rachel Callai Bragatto e Maria Alejandra Nicolás, até o ano de 2009, tramitavam no congresso nacional 26 propostas legislativas que buscavam regulamentar a internet no Brasil, sendo que destas, ganhava destaque o PL 84/99, do então senador do PSDB de Minas Gerais Eduardo Azeredo, que fora apelidado por alguns meios de comunicação de "AI-5 digital".
Com a possibilidade de aprovação das medidas previstas no projeto de lei supracitado, o Ministério da Justiça resolveu lançar uma consulta pública para aprovar uma lei que seria uma espécie de "constituição da internet", que viria a ser conhecida como o Marco Civil da Internet. A intenção era que o novo projeto fosse amplamente debatido pela sociedade civil afim de garantir direitos de liberdade e privacidade dos usuários e a neutralidade da rede, entre outras questões. O texto final da lei aprovada em 2014 pelo congresso nacional deu força legal à garantia de privacidade dos usuários, isto é, que eles não pudessem, legalmente, ter seus arquivos, trocas de mensagens, entre outras coisas acessadas sem a existência de mandado judicial. Além disso, aprovou que as provedoras de rede sejam proibidas de cortar a conexão de seus clientes, a não ser que haja descontos na conta a ser paga pelo serviço em decorrência da interrupção, e previa também, que o direito de acesso à internet estaria atrelado ao exercício da cidadania.
Sendo assim, como nos outros três casos analisados anteriormente, os jornais O Globo e Brasil de Fato serão analisados a fim de verificar quais são as diferenças ou semelhanças entre ambos e identificar como estes buscam se enquadrar dentro das disputas por hegemonia exercidas na sociedade, das quais, certamente os jornais participam e – ainda no século XXI – têm bastante importância.
A pesquisa em relação ao jornal O Globo pode ser realizada a partir de buscas por palavras-chaves em seu acervo on-line. Como se trata de uma lei aprovada em meados de 2014, foi feita a opção de analisar a cobertura do jornal a partir de 2013 porque, ainda que o projeto de lei tivesse sido apresentado em 2011, a maioria das referências à lei só ocorreram a partir daquele ano. Além disso, uma análise a partir de 2011 demandaria um esforço que iria além das possibilidades desta pesquisa.
Em junho de 2013, foi possível encontrar 2 páginas com conteúdo relacionado ao Marco Civil da Internet. A primeira, datada do dia 16, consta na vigésima nona página do jornal. Nela, a jornalista Mônica Tavares afirmava que escândalos de invasão de privacidade ocorridos nos Estados Unidos naquela época haviam reacendido a discussão sobre a necessidade de se proteger os internautas deste tipo de violação. A autora da matéria ouviu o deputado federal do Partido dos Trabalhadores do Rio de Janeiro, Alessandro Molon, que fora o relator do projeto de lei. Ele afirmou que o texto se encontrava pronto e corroborou com a interpretação de Tavares no que diz respeito aos ocorridos nos EUA e as discussões parlamentares brasileiras.
Pouco mais de uma semana após a publicação da matéria de Mônica Tavares, no dia 24 o próprio Molon teve um artigo seu publicado em O Globo. Nele, o deputado ressaltava que o projeto havia sido considerado uma referência de legislação sobre a internet em diversos países do planeta e destacou três virtudes do mesmo: o impedimento à limitação das escolhas de navegação e download dos internautas, – também conhecida como neutralidade da rede – a garantia da liberdade de expressão on-line e a proteção da privacidade dos usuários. No entanto, o autor ressaltou a resistência por parte das empresas fornecedoras de conexão da internet no Brasil. Ao chamar atenção para este fato, o deputado do Partido dos Trabalhadores indicava que existiam interesses de empresas de capital privado que estavam em jogo, uma vez que boa parte delas não estavam dispostas a se comprometer com o que estava previsto na lei. Sendo assim, era de se esperar que não seria fácil a aprovação do Marco Civil da Internet, uma vez que grande parte dos parlamentares brasileiros – que tendem a defender no congresso, majoritariamente, os interesses da burguesia – não veria tal aprovação com bons olhos. Por outro lado, movimentos sociais engajados na temática buscariam pressionar o Congresso Nacional para que o Marco fosse positivado.
De junho de 2013 até junho de 2014, foi possível encontrar 23 páginas de O Globo que tratavam do tema, dentre noticiários e colunas opinativas. No que diz respeito aos noticiários, foi possível identificar que o jornal, ao tratar de uma proposta de política pública de comunicação, tendeu a procurar entidades e personalidades públicas envolvidas na área de comunicação, além daqueles que se encontravam dentro da institucionalidade política. Dentre estes, destacou-se, claramente, o deputado Alessandro Molon, relator do projeto e a ministra de Relações Institucionais, Idelí Salvatti. Dentre as instituições, o jornal deu destaque para representantes da AIR, Abranet, Anatel e Abert. Além disso, em algumas matérias, os jornais convidaram especialistas no que diz respeito a legislações no campo da comunicação para que eles comentassem pontos do projeto de lei.
Dentre as reportagens mais factuais sobre o assunto, verificou-se que o jornal deu bastante ênfase nas disputas interpartidárias envolvendo parlamentares do Partido dos Trabalhadores e o governo federal, sob o comando do mesmo partido, além de deputados e senadores de orientação política mais conservadora. Destes, a maioria se encontrava no PMDB, no PSDB e no PSC, com destaque para o deputado federal carioca Eduardo Cunha, então líder peemedebista na câmara.
Nos textos de opinião sobre o Marco Civil da Internet, verificou-se que aqueles que tiveram espaço no jornal tenderam a apoiar a aprovação do Projeto de Lei, construindo argumentos a partir da defesa da liberdade de expressão, da privacidade dos usuários e, em alguns casos, na defesa da neutralidade da rede. Por este termo, entende-se que as fornecedoras de conexão de Internet não poderiam fazer pacotes específicos para o uso de determinados serviços. Ou seja, uma provedora não poderia fazer um pacote específico para os usuários acessarem somente e-mails ou redes sociais em detrimento de sites jornalísticos, por exemplo. Ainda que o jornal tenha feito, parcialmente a defesa deste ponto, abriu-se espaço para que as reclamações das empresas de telecomunicação se fizessem presentes.
De certa forma, pode ser considerado surpreendente o fato de que O Globo, um jornal pertencente a um grande conglomerado de comunicação, tenha se posicionado a favor de uma política pública que colocava, parcialmente, em xeque os interesses de uma parcela importante da burguesia. Não cabe aqui discutir as razões pelas quais o jornal optou por aderir à proposta do governo, uma vez que isso demandaria uma pesquisa de maior alcance. Atentemos então para a forma como O Globo fez tal defesa. Destaca-se na cobertura sobre o Marco Civil da Internet o fato de que, nas reportagens encontradas, não houve qualquer tipo de diálogo com movimentos sociais ligados à área da comunicação, como o Coletivo Intervozes e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Como visto nas coberturas de O Globo, o jornal seguiu, mais uma vez, uma tendência a fazer poucas referências às atuações dos movimentos sociais organizados, e quando o fez, como no caso das cotas, os tratou como não representativos da sociedade civil. No entanto, instituições como a Abert, a AIR e a Abranet, que dentro do pensamento de Gramsci podem ser consideradas aparelhos privados de hegemonia – em torno dos interesses da burguesia, obviamente – tiveram voz no jornal. Neste caso, a forma do jornalismo praticado por O Globo diz mais do que o posicionamento político em si em relação ao Marco Civil da Internet. Ao não falar dos movimentos sociais e focar as coberturas em torno das discussões parlamentares, dos interesses da espionagem dos EUA, e das críticas de associações empresariais, uma parcela importante da sociedade ficou – deliberadamente ou não – excluída: aqueles que se organizam politicamente em prol de um modelo de comunicação social mais plural, democrático e inclusivo.
No caso do jornal Brasil de Fato, como nas outras ocasiões analisadas, pode-se verificar um modelo jornalístico diferente daquele exercido por O Globo. No caso da cobertura do Marco Civil da Internet, não foi possível acessar as versões digitalizadas do jornal através do portal Issuu, No entanto, as análises não ficaram inviabilizadas, uma vez que grande parte daquilo que é veiculado na versão impressa do jornal, também é divulgado no site oficial do mesmo. Logo, foi possível, a partir de buscas por palavras-chaves no próprio site, encontrar dezoito reportagens que faziam menção direta ao projeto de lei entre meados de 2013 e meados de 2014.
Primeiramente, chama a atenção o fato de que o jornal aponta dois fatores fundamentais para que o PL 2126/11 voltasse à discussão no Congresso Nacional: o primeiro, o escândalo relacionado a denúncias de espionagem por parte do governo dos Estados Unidos da América. O segundo, a pressão advinda das "jornadas de junho", uma série de manifestações públicas ocorridas no Brasil em 2013, que começaram como uma reação ao aumento das tarifas de transporte público em várias cidades brasileiras e que acabaram por levar outras pautas – das mais diversas tanto do ponto de vista estratégico, quanto do ponto de vista ideológico – para as ruas e para a agenda pública de debates. Já neste quesito, percebe-se que o veículo faz uma interpretação que acredita que as pressões populares nas ruas podem fazer com que isso se reverta na transformação da realidade e na garantia de direitos. Nesse sentido, o jornal aproximou-se de uma discussão em torno da "grande política", categoria trabalhada pelo filósofo Antonio Gramsci.
Dentre as 18 reportagens de Brasil de Fato encontradas, metade delas fazia menção às demandas e lutas da sociedade civil, sobretudo dos movimentos sociais, com destaque para o Coletivo Intervozes. O jornal fez questão de destacar que as pressões exercidas pela sociedade ao Congresso Nacional tiveram relevância no desenrolar da aprovação do Marco Civil da Internet.
Aquelas reportagens que não trataram diretamente das ações dos movimentos sociais eram textos opinativos – todos eles a favor do projeto – e detalhes da tramitação política no congresso nacional. Em alguns deles, é possível verificar também que o jornal não ignorou as pressões por parte do empresariado. No entanto, a atuação política desta classe foi mais esmiuçada por O Globo do que por Brasil de Fato.
Constatadas essas características gerais apresentadas por Brasil de Fato, serão agora destacadas 3 reportagens onde elas se fazem presentes. A escolha pela análise específica de 3 reportagens se faz necessária uma vez que este trabalho não possui um alcance que o permita atingir um nível tão aprofundado de discussão, que demandaria a análise de todas de maneira detalhada. No entanto, elas se fazem necessárias para que fiquem claras as semelhanças e diferenças da cobertura dos dois jornais analisados neste capítulo.
No dia 22 de julho de 2013, o jornal fez a divulgação de uma aula pública voltada para o debate do que se chamou de "projeto de lei por uma internet livre". Este ato aconteceria no vão livre do Museu de Arte de São Paulo (MASP), localizado no centro da capital paulista, um local que pode ser facilmente acessado por quem parte de diversos pontos da cidade. Na condução do debate, estariam dois membros do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, um deles ligado ao Coletivo Intervozes – João Brant – e outra participante ligada ao Centro de Estudos Barão de Itararé – Renata Mielli. Ao divulgar tal ato político e, de certa forma, convocar seus leitores para o debate, o jornal Brasil de Fato demonstrou que a prática jornalística pode estar relacionada ao incentivo ao exercício da cidadania. E ao destacar o trabalho de movimentos sociais, é possível constatar algo neste jornal que é mais difícil de se encontrar em O Globo: a difusão da ideia de que o povo na rua também faz política.
No dia 18 de novembro de 2013, o jornal dedicou uma reportagem que indicava que o projeto poderia ser votado naquela mesma semana. O jornal destacou que a demora na votação do projeto ocorrera porque havia um forte lobby das empresas de telecomunicação que não estavam satisfeitas com o princípio de neutralidade das redes, que caso não fosse aprovado, permitiria aos provedores criar planos que limitassem as experiências de navegação dos internautas. Nesta mesma reportagem, o jornal ouviu o professor e sociólogo Sérgio Amadeu, que defendia a aprovação do projeto. Para Amadeu, três grupos corporativos tinham interesses em jogo: as operadoras de telecomunicações, as operadoras de telefonia e as indústrias ligadas a direitos autorais de músicas e filmes, sobretudo Hollywood, e a Rede Globo. No entanto, não consta uma explicação mais aprofundada de Amadeu sobre os interesses das Organizações Globo neste processo, o que causa, de certa maneira, uma estranheza, haja vista que o seu principal jornal impresso não operou uma oposição sistemática ao marco.
Já no dia 2 de abril de 2014, o jornal publicou um texto assinado por Silvio Mieli. A esta altura, o projeto já havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e seguia para tramitação no Senado Federal. Para Mieli, a aprovação do Marco Civil da Internet foi um "Marco Histórico". O autor lembra que os demais meios de comunicação que a sociedade brasileira dispõe, sobretudo o rádio e a televisão são historicamente concentrados nas mãos de pequenos grupos empresariais, e que caso o Projeto de Lei não fosse aprovado, a sociedade correria o risco de assistir a um processo de concentração semelhante ao da radiodifusão na intenet.
No geral, foi possível verificar que a cobertura de ambos os jornais tocou em dois pontos principais que norteavam o texto do PL 2126/11: a defesa da liberdade de expressão e da privacidade dos usuários. No que diz respeito à neutralidade das redes, não foi possível detectar um posicionamento muito claro por parte de O Globo, enquanto Brasil de Fato fez uma defesa aberta de tal princípio. O que diferenciou claramente ambos os jornais, mais uma vez, foi a visibilidade dos agentes históricos em cada um dos dois. Enquanto no primeiro nota-se a preferência pela arena política institucional, com destaques para as disputas interpartidárias no parlamento, destacando também os posicionamentos de setores empresariais, o segundo optou por uma linha diferente: a ênfase nas ações da sociedade civil organizada.
Este capítulo teve como objetivo analisar as disputas por hegemonia nestes dois veículos de comunicação. Lembrando que, quando se fala em hegemonia, é com o objetivo de explicar como determinadas classes ou frações de classe buscam estabelecer consensos coletivos em torno de seus projetos políticos e ideológicos, que visam estabelecer ou reforçar o poder de uma classe dominante ou de uma fração de classe dominante, para além das ações coercitivas. Para que tal consenso seja estabelecido, Gramsci destaca a função que os intelectuais exercem na sociedade contemporânea. Ele defende a ideia que todo homem é um intelectual, embora nem todos exerçam tal função. A condição para o exercício, segundo ele, se dá devido a processos históricos concretos, que permitiram determinadas classes ou camadas da sociedade produzir intelectuais, e não acontecem "num terreno democrático abstrato". Sendo assim, a função que lhes caberia teria um cunho organizativo, isto é, de buscar a adesão da maioria dos indivíduos para legitimar um sistema. Daí a importância de analisar os veículos de comunicação, uma vez que eles são algumas das várias ferramentas utilizadas para legitimar um poder estabelecido, ou para contestá-lo. E são neles, onde, invariavelmente, os intelectuais conseguem com mais eficácia exercer suas funções conectivas e organizativas.





Capítulo 2
Este capítulo visa fazer uma discussão sobre movimentos sociais ligados à sociedade civil que tem como pauta principal a formação de um sistema de comunicação mais aberto, democrático e participativo no Brasil. A existência de tais movimentos, como quaisquer movimentos organizados, advém das características que fazem parte do contexto histórico contemporâneo. No período compreendido entre a segunda metade do século XX e no início do século XXI, há uma difusão de veículos de mídia massiva que ganharam importância na vida social, uma vez que através destes, passaram a circular informações, mensagens pessoais, produções culturais, trocas comerciais, entre outras coisas. Tal processo atinge tamanha dimensão, a partir da década de 1990, com o advento da internet e a difusão de serviços de televisão à cabo e via satélite.
Sendo assim, ao adquirir importância fundamental na vida em sociedade, começa a se desenvolver uma ideia que defendia a comunicação como um direito humano, tão essencial à vida dos homens quanto a saúde, alimentação, educação, transporte, trabalho entre outros. Logo, todos os seres humanos, de acordo com essas ideias, deveriam ter o direito de acessar os meios de comunicação, se comunicar através deles e ser informado por eles sem que houvesse qualquer tipo de restrição, seja por parte do Estado, ou por parte de empresas privadas. Além de fazer a discussão sobre tais movimentos que questionam a ordem estabelecida, pretende-se também discutir como as políticas públicas interferiram na atuação dos veículos de comunicação contra hegemônicos, e como as novas tecnologias interferem no diálogo entre veículos contra hegemônicos e a sociedade.
O modelo de comunicação social estabelecido no Brasil na virada do século não permitia que a grande maioria dos brasileiros pudessem fazer com que suas múltiplas vozes ecoassem – ou pudessem fazer isto de maneira limitada – nos meios de comunicação, sobretudo no rádio e na televisão. Segundo Gislene Moreira, na maioria dos países latino-americanos – incluindo o Brasil – a radiodifusão se estabeleceu a partir de "perigosas relações de poder entre elites políticas e empresários midiáticos". Ela adjetiva tal relação como "perigosa" pois, a partir dela, a exploração não comercial destes meios de comunicação foi ignorada e, no caso das rádios comunitárias, houve, inclusive, perseguições políticas por parte do Estado, que coibiu o funcionamento de grande parte delas.
Venício Lima faz uma análise do sistema de radiodifusão brasileiro na qual ele aponta suas características. A primeira delas é o que o autor chama de "Trusteeship Model". Tal definição diz respeito ao modelo essencialmente privado de radiodifusão escolhido pelo Estado brasileiro, ainda na década de 1930. Os espaços são explorados por empresas privadas, ainda que sejam de propriedade pública concedida. Tal escolha, segundo Lima, não contou com a participação popular.
A segunda característica apontada por Lima é a ausência de regulação específica para a radiodifusão. A principal referência legal para esta área é o CBT – Código Brasileiro de telecomunicações, formulado em 1962. Segundo o autor, tal código se encontra, na segunda década do século XXI, bastante obsoleto e defasado. Além disso, não consta na legislação brasileira a proibição da propriedade cruzada, o que permitiu, historicamente, ao grupo dos Diários Associados terem se estabelecido, por bastante tempo como principal grupo de comunicações do país, sendo superado somente pelas Organizações Globo nas últimas décadas do século XX.
Como consequência da ausência de qualquer tipo de restrição ao número de concessões que uma mesma pessoa ou grupo empresarial pode ter, o sistema de radiodifusão brasileiro tornou-se oligopolizado. Tal situação é agravada pelo fato de que muitos concessionários do rádio e da televisão são pertencentes a famílias tradicionais que costumam hegemonizar a política local, como a família Sarney, por exemplo. Lima afirma que um tipo de prática nas concessões de radiodifusão se tornou comum: o fato de concessor e concessionário de radiodifusão se confundirem, o que de certa forma, reforça o domínio de antigos grupos empresariais e familiares. A esse processo, Lima chamou de Coronelismo Eletrônico, fazendo alusão às práticas políticas da República Velha que reforçavam o poder dos grandes latifundiários nos níveis local e nacional e que mantinham as parcelas mais pobres da população afastadas do exercício da cidadania. A obra de Carolina Matos exibe dados de políticos que detiveram concessões de rádio e TV no ano de 1994, que podem ser vistos na Tabela 2. É importante ter em mente que a maioria daqueles que eram concessionários de rádio e televisão naquele ano continuaram sendo até o período que se insere no recorte temporal deste trabalho.
Tabela 2 - Estações de Rádio e TV controladas por políticos no Brasil.
Canais
Total
Políticos atuais e do passado
Porcentagem
TV
302
94
31,12%
Rádio
2908
1169
40,19%

Além das famílias ligadas à políticos no Brasil, um setor importante da sociedade que possui uma quantidade considerável de concessões de radiodifusão são as Igrejas. Embora tenha ocorrido um crescimento das igrejas neopentecostais, a Igreja Católica ainda se mantém como a maior concessionária entre as instituições religiosas. Não é algo incomum, para o povo brasileiro, ligar a televisão em um canal de televisão aberto e se deparar com a transmissão de uma missa ou culto evangélico, sobretudo nos finais de semana. Ou seja, além de serem concessionárias de serviços públicos de radiodifusão, as empresas também gozam de espaço dentro de outras concessões privadas, teoricamente laicas.
Além das oligarquias familiares e das Igrejas, Lima também destaca o papel do Estado, uma vez que este é responsável, através do Congresso Nacional e do poder executivo, por conceder a possibilidade de uma empresa explorar os espaços de radiodifusão. Além dele, o autor também ressalta o poder das empresas privadas nas políticas públicas de radiodifusão. No entanto, há de se atentar que existem diferentes tipos de empresas privadas atuando em torno da garantia de seus interesses. Dentre elas, Lima destaca a Rede Globo, – principal conglomerado de comunicação do país – as entidades empresariais ligadas a grupos de radiodifusão e da mídia impressa, como a Abert, a Abra, a Abratel, a ANJ, a ANER entre outras. Por fim, destacam-se as empresas de telecomunicação, que entraram em ação nesta área a partir do processo de privatização do setor, sendo a maioria delas, ligadas ao capital internacional.
Como foi visto acima, uma série de instituições detém interesses específicos para querer explorar o espaço de radiodifusão. No entanto, só foram ressaltados até então os grupos que, em maior ou menor grau, controlam a maior parte da radiodifusão e da imprensa brasileira. Existem grupos que reivindicam participação de demais setores da sociedade nestes espaços. Desta forma, uma série de organizações da sociedade civil que não se via representada nos meios de comunicação dominantes resolveu agir politicamente a fim de lutar pela construção de um novo modelo de comunicação do país. Entre os movimentos que travam esta batalha estão a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (ABRAÇO), A Federação Nacional do Jornalistas (FENAJ), o Coletivo Intervozes e o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). Ao longo dos governos petistas, estas entidades lançariam mão de estratégias e articulações políticas – por vezes, convergentes, por outras vezes, divergentes – na luta pela garantia de seus interesses.
É importante salientar que tais movimentos que reivindicam um processo de democratização da mídia no país não são, de forma alguma, homogêneos. No entanto, a força de suas ações – conjuntas ou não – resultou na criação de algumas propostas de políticas públicas para o setor. Algumas delas avançaram, outras não chegaram a ser colocadas em prática.
Segundo Moreira, ao longo das lutas promovidas por estes grupos, desde a década de 90, houve poucas conquistas por parte deles. Isso se deveu, em grande parte aos seguintes fatores, segundo a autora: fragmentação ideológica por parte dos movimentos sociais, a ineficiência em relação às pressões sobre o Congresso Nacional e o aumento da repressão por parte do Estado às rádios comunitárias.
Algumas pautas que foram levadas a frente pelos movimentos em questão foram: A criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ); a transformação da Ancine em Ancinav; o fim da criminalização às rádios comunitárias; a criação de retransmissoras de televisão institucionais; a criação de um comitê consultivo – plural – que discutiria as alternativas para a implantação da TV digital no país; a criação de uma Lei geral de comunicação eletrônica de massa; a criação do Conselho de Comunicação Social (CCS), o 3° Plano Nacional de direitos humanos (PNDH 3), a regionalização das verbas de publicidade oficial por parte do Estado; a regulamentação da TV paga, o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), a criação da EBC e a criação do Marco Civil da Internet – estas duas últimas, analisadas no capítulo anterior. Cada uma delas será exposta brevemente a fim de se fazer um balanço daquilo que foi conquistado
A criação do Conselho Federal de Jornalismo partiu de uma demanda da FENAJ, que buscava a partir deste, fortalecer os valores contidos no código de ética dos jornalistas. Sendo assim, o governo encaminhou ao Congresso Nacional, em 2004, um projeto de lei que previa a criação do CFJ. No entanto, houve muitas críticas à proposta por parte dos grandes veículos de comunicação, que impossibilitaram a aprovação da proposta. Sendo assim, a FENAJ resolveu criar um outro texto, que previa a Criação do Conselho Federal dos Jornalistas e também de conselhos regionais atrelados a ele. No entanto, a câmara dos deputados, no final do ano, rejeitou a proposta.
Em um contexto no qual as produções audiovisuais ganharam dimensões importantes no que diz respeito a formação de identidades, produção de poder simbólico e difusão de valores e crenças, a produção cinematográfica adquire um valor estratégico. Sendo assim, houve a tentativa por parte dos movimentos sociais de transformar a agência reguladora do cinema brasileiro (Ancine) em uma Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav), que, segundo Lima, seria responsável por regular e fiscalizar a produção e a distribuição dos conteúdos audiovisuais no país. No entanto, segundo o autor, a reação dos setores hegemônicos foi tamanha – sobretudo da Rede Globo, detentora da maior parte da produção audiovisual do país – que o projeto sequer chegou a ter uma versão final. O governo recuou afirmando que não seria possível criar uma agência reguladora do audiovisual sem antes existir uma lei geral de comunicação de massa. Sendo assim, o mais próximo que se conseguiu chegar a isso foi a formulação do Fundo Setorial do Audiovisual, que reúne recursos destinados ao desenvolvimento da cadeia produtiva audiovisual no país. Tal fundo foi criado a partir da lei n° 11.437 de 28 de setembro de 2006 e regulamentado pelo Decreto n° 6.299, de 12 de dezembro do ano seguinte.
No que diz respeito à criminalização das rádios comunitárias, Moreira afirma que houve um retrocesso a partir do governo Lula, uma vez que a obra da autora aponta para um aumento nas prisões de concessionários e de fechamento de estações em comparação com o governo de Fernando Henrique Cardoso. Além disso, houve a aprovação de uma lei (10.871/04), que conferiu poder de polícia aos agentes da Anatel. Venício Lima lembra que a legislação que faz com que o sistema de radiodifusão comunitária seja excludente fora aprovada durante o período FHC, com a lei 9.612, de 1998. A repressão às rádios comunitárias, que atuam na esfera local, reforça a prática do Coronelismo Eletrônico, explicado por Lima. Tal repressão inviabiliza o exercício da cidadania por parte de grandes parcelas da população brasileira.
Em relação às retransmissoras de TV institucionais (RTVIs), Lima considera que fora uma grande oportunidade "para o poder municipal se tornar retransmissor de emissoras de TV do campo público e, também, produtor de conteúdo" [Grifos do autor]. Essa oportunidade citada por lima advinha do fato de que poderia ser possível para as prefeituras lançarem mão de 15% das retransmissões da TV à cabo. Sendo assim, através do decreto n° 5.371, datado de 21 de fevereiro de 2005, haveria a possibilidade de um incentivo maior à produção audiovisual local e regional, não necessariamente vinculada aos grandes conglomerados que hegemonizam a produção no país. Para se entender a importância de tal medida, é fundamental recorrer à Dênis de Moraes. O autor identifica que em toda a América Latina, 85,5% deste tipo de produção cultural é proveniente dos Estados Unidos da América. Sendo assim, verifica-se que a partir da leitura das obras de ambos estes autores, o Brasil optou, a partir do processo de redemocratização do país, ampliar a abertura econômica brasileira e aprovar um programa extenso de desestatização e de mercantilização das atividades humanas que causou profundas transformações na sociedade. E isso, sem sombra de dúvidas, não poderia deixar de incluir os meios de comunicação e o sistema de mídia aqui existentes, que possibilitaram ao capital estrangeiro e aos demais atores que comandam o sistema de mídia vigente obter ganhos materiais com a sua participação no mercado brasileiro. O decreto então, seria uma chance de se romper – limitada e parcialmente – com esta hegemonia. No entanto, o governo recuou diante das pressões dos grandes conglomerados, com o Decreto 5.413 de 6 de abril de 2005, extinguindo assim, as RTVIs.
Bolaño lembra que o Sistema Brasileiro de TV digital (SBTVD) foi instituído a partir do decreto número 4.901, cuja data é 26 de novembro de 2003, isto é, ao longo do primeiro ano de governo do ex-presidente Lula. O SBTVD foi responsável por suscitar importantes debates sobre os rumos que teriam a implantação da televisão digital. No entanto, é necessário ressaltar que os debates em torno da TV digital no Brasil foram concebidos durante o governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso. Segundo este autor, os interesses dos grupos de mídia brasileiros tradicionais foram os de fazer com que o modelo de televisão digital adotado no país fosse semelhante àquele dos EUA e do Japão e desconsiderar o debate em torno de possíveis alternativas, que inclusive foram apresentadas pela Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ). Ele afirma que a intenção inicial do governo fora de fomentar os debates e este não se mostrou tão inclinado aceitar as propostas dos setores concessionários de radiodifusão, sendo mais favorável a alternativas que pudessem ampliar o número de canais de televisão a partir da criação de novas concessões. No entanto, como a pressão dos radiodifusores foi enorme, e como houve um forte desgaste do governo devido a escândalos de corrupção, a adoção do modelo japonês foi feita sem gerar os debates que parcelas significativas da sociedade civil esperavam.
Uma das propostas mais ousadas, no que diz respeito a buscar um modelo democrático de regulação das comunicações no Brasil era a formulação da Lei Geral de Comunicação Eletrônica de Massa, que seria responsável por regulamentar o funcionamento do sistema de mídia do país. Porém, a forma como os governos petistas lidaram com a proposta foi um tanto confusa. Primeiramente, a ideia era criar um GTI (Grupo de Trabalho Interministerial) para tratar do tema. Segundo Lima, levou cerca de nove meses para que os nomes que fariam parte de tal grupo fossem indicados pelo governo federal. Posteriormente, o governo optou por abrir mão da GTI em favor de uma Comissão Interministerial, que abarcaria também a Procuradoria Geral da República. Até o final do governo Lula, em 2010, tal comissão ainda não havia se reunido. No entanto, em julho de 2010, foi criada outra Comissão Interministerial que ficara encarregada de realizar estudos e encaminhar ao governo uma série de relatórios com recomendações que revissem a organização da radiodifusão brasileira. No entanto, o máximo que se conseguiu realizar foi a criação do "Seminário Internacional Comunicações Eletrônicas e Convergências de Mídias", no qual diversos setores da sociedade puderam debater diferentes formas de se criar uma regulamentação democrática dos meios de comunicação. No entanto, pouco se avançou nesse sentido, tanto nos dois governos de Luiz Inácio, quanto no 1° mandato de Dilma Rousseff.
Outra proposta reivindicada pelos movimentos pró-democratização da comunicação foi a positivação do Conselho de Comunicação Social (CCS). Este conselho já tinha sua existência prevista a partir da aprovação da constituição de 1988, que funcionaria como um órgão regulador autônomo, nos moldes da Anatel. No entanto, no final do governo de Fernando Henrique Cardoso, houve a aprovação de uma Emenda Constitucional ao artigo 222 da constituição federal que fez com que o CCS fosse concebido apenas enquanto um órgão consultor, ligado ao poder legislativo. Esta mesma emenda foi responsável por permitir entrada de 30% de capital estrangeiro nas empresas jornalísticas e de radiodifusão. A partir de então, inclusive nos governos petistas, o Conselho de Comunicação Social foi esvaziado e, na prática, tornou-se um órgão inócuo.
O terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) insere-se no contexto de desenvolvimento e fortalecimento da ideia da comunicação como um direito humano inalienável. O decreto 7.037 de 21 de dezembro de 2009 tinha entre seus princípios a defesa da difusão de novas tecnologias da comunicação e da informação, "o direito à comunicação democrática e ao acesso à informação para consolidação de uma cultura em Direitos Humanos", a realização de campanhas de combate a tortura através dos meios de comunicação, o desenvolvimento de programas de formação em direitos humanos para comunicadores de redes comunitárias, além de prever a criação de um ranking que classificaria as instituições que mais tivessem reforçado os valores dos Direitos Humanos e a criação de um marco regulatório para a radiodifusão. Certamente, a proposta enfrentou uma resistência incansável por parte da grande mídia, sobretudo da TV Globo. Em vídeos encontrados a partir de buscas por palavras-chaves no site "Youtube", foi possível encontrar dois posicionamentos veementemente contrários à proposta, por parte dos jornalistas Alexandre Garcia e Arnaldo Jabor. Entre outras declarações, Jabor relacionou o conteúdo do PNDH 3 ao stalinismo, afirmando que este era "bonito por fora, mas soviético por dentro". Além disso, afirmou que a vontade de controlar a imprensa era uma ideia que não saía da cabeça dos "comunas" do executivo. Já Garcia, por sua vez, afirmou que o programa interferia na liberdade de imprensa e que o mesmo continha características totalitárias.
Sendo assim, diante da ofensiva dos grandes conglomerados empresariais de mídia, sob a liderança da Globo, em maio de 2010 o projeto foi modificado pelo decreto 7177, do dia 12 de tal mês. Os trechos referentes a punições a veículos que desrespeitarem os princípios fundamentais dos direitos humanos, o ranking previsto na versão original e, o principal, a previsão de criação de um marco regulatório para o sistema de comunicação midiática brasileiro foram abortadas.
Quanto à regionalização das verbas publicitárias oficiais, houve uma considerável dispersão no que diz respeito à quantidade de veículos que recebiam publicidade do governo a partir da chegada do PT ao poder. Segundo o sindicato dos metalúrgicos do ABC paulista, com o mesmo dinheiro utilizado por FHC para a publicidade oficial, o governo Lula lançou mão de mais de 5.000 veículos, enquanto o ex-presidente do PSDB havia utilizado apenas 500. Tal medida, segundo Lima, atende ao princípio da máxima dispersão da propriedade, fundamental para a formulação de um sistema de mídia que se pretende democrático.
O Programa Nacional de Banda Larga (PNBL) teve seu texto apresentado na primeira metade do ano de 2010, a partir do decreto n° 7.175/2010. O projeto previa a massificação do acesso à serviços de internet banda larga, a aceleração do desenvolvimento econômico-social, a redução da desigualdade entre regiões no Brasil, geração de emprego e renda, entre outros objetivos. Instituído no último ano de governo de Lula, a expectativa era de que tais metas fossem atingidas, ao menos parcialmente, no governo de sua sucessora, Dilma Rousseff. No entanto, as medidas previstas não lograram êxito ao fim do primeiro mandato de Rousseff. A meta de domicílios com acesso à internet Banda Larga era superior a 30 milhões, sendo que o máximo alcançado ao fim de 2014 girou em torno de 23 milhões. Ainda que tenham sido criados pacotes de banda larga popular, suas assinaturas não chegaram a 1% do total das assinaturas de programas de banda larga. Além disso, as disparidades socioeconômicas entre as regiões brasileiras não obtiveram quaisquer mudanças significativas ao fim do 1° mandato de Dilma Rousseff.
Dentro da gestão do governo Lula, Moreira afirma que houve uma fragmentação da organização das políticas públicas para a comunicação brasileira. Durante o governo do então presidente da república, estiveram envolvidos nas políticas públicas de comunicação o Ministério das Comunicações, o Ministério da Cultura, o Ministério da Ciência e Tecnologia, a Secretaria de Direitos Humanos e a Secretaria de Comunicação da presidência. Muitas vezes, inclusive, estas partes agiram sem articulações entre si, ou seja, isoladamente. Desta maneira, ficava difícil pensar na criação de um marco regulatório que fosse o "pontapé inicial" para mudanças significativas no sistema de comunicação brasileiro. Já no governo de Dilma Rousseff, diante ofensivas ainda mais ousadas de setores conservadores da sociedade, tal proposta se mostrou gradativamente mais distante.
Apesar de acumular uma série de frustrações, advindas do não cumprimento de algumas propostas, ou pelo cumprimento parcial de outras, a luta pela democratização das comunicações no Brasil não acabou. Os movimentos, que reivindicaram e disputaram as propostas colocadas em pauta pelo governo brasileiro, não só atuaram na arena institucional, como também tentaram fazer públicas as suas demandas. Dessa forma, torna-se fundamental analisar quais são os meios pelos quais, Intervozes, ABRAÇO, FNDC, entre outros, travam seus diálogos com a sociedade.
Um veículo bastante utilizado por estes grupos, assim como pelos demais movimentos sociais, são os veículos de informação que fogem da esfera dos grandes conglomerados empresariais de comunicação. O caso de Brasil de Fato, analisado no capítulo 1, mostra bem tal estratégia. Dentre todos os casos analisados, foi possível identificar membros de movimentos sociais e/ou de sindicatos buscando tornar públicas suas propostas, questionamentos e articulações políticas. No entanto, é possível afirmar que estes jornais impressos possuem alcance limitado, fazendo com que parcelas restritas da população tenham acesso a eles. Sendo assim, a partir da difusão de novas tecnologias da informação e da comunicação, a internet tornou-se um espaço privilegiado para a difusão das ideias e ações de grupos e veículos de cunho contra hegemônicos.
Logo, pretende-se aqui fazer uma discussão sobre as buscas por uma comunicação alternativa através da internet. Além disso, busca-se fazer uma problematização da internet enquanto meio capaz de disputar a hegemonia e formar novos consensos na sociedade. Para tal, serão utilizados os textos de Manuel Castells e Dênis de Moraes.
Ao referir-se aos movimentos sociais, Castells afirma que estes foram, historicamente "e continuam a ser as alavancas da mudança social". Ele atenta também para o fato de que eles geralmente surgem de uma piora das condições de vida de parcelas da população, a ponto de fazer com que a vivência cotidiana de tais grupos se tornasse insustentável. Vale lembrar que, em sua obra, o autor estuda especificamente movimentos que surgem na Europa e no Oriente Médio. No entanto, suas análises teóricas em relação aos movimentos sociais, ainda que estejam melhores aplicadas às realidades por ele estudadas, podem servir de base para este trabalho, desde que algumas ressalvas sejam feitas.
Castells defende que a ação coletiva dos movimentos sociais que emergem no final do século XX e no início do século XXI teve origem a partir de uma crise estrutural na economia, o que levou uma crise de legitimidade cada vez mais profunda do sistema capitalista. No Brasil, especificamente, o modelo neoliberal, em princípios do século XXI, começa a receber uma série de críticas que ecoam pela sociedade, não só por parte da classe trabalhadora organizada, mas por parte dos movimentos sociais. Tal modelo fora defendido não só pelo Estado brasileiro, mas também pelos meios de comunicação hegemônicos, que, neste país, são historicamente oligopolizados. Sendo assim, a grande mídia comercial, no Brasil, tornou-se um dos símbolos da hegemonia neoliberal, uma vez que ela fora responsável por legitimar o projeto levado a cabo pelos governos Collor, FHC e, com ressalvas, Lula e Dilma. Portanto, uma série de organizações da sociedade civil se engajaria em torno da formação de um novo modelo de mídia, que contribuiria para a disputa da hegemonia na sociedade.
Uma característica fundamental dos movimentos que emergem neste período histórico é o fato destes se organizarem através de redes. Castells destaca que as conexões em rede são feitas de múltiplas formas. Elas agregam formas de organização preexistentes às realidades das plataformas on-line, que lhes permite entrar em contato com outros movimentos, por vezes, de outras partes do mundo. Desta forma, segundo o autor, os movimentos tendem a tornar-se, ao mesmo tempo, locais e globais. Locais porque lançam mão da ocupação de espaços urbanos e rurais nas regiões ou cidades nas quais eles vivem. Globais "pois estão conectados com o mundo inteiro, aprendem com outras experiências e, de fato, muitas vezes são estimulados por essas experiências a se envolver em sua própria mobilização. ".
De fato, por parte de movimentos como o Intervozes e o FNDC, há a utilização de redes sociais on-line para a divulgação de suas ideias, atos e críticas, que grande parte das vezes são direcionadas aos veículos de comunicação da mídia hegemônica. Além disso, as experiências de políticas públicas inclusivas de comunicação social em países latino-americanos, sobretudo Venezuela e Argentina influenciaram os movimentos ligados ao setor no Brasil a pressionar os governos petistas a aprovar medidas no sentido de democratizar o sistema de comunicação brasileiro, tanto na radiodifusão, quanto na imprensa escrita e na internet – que, apesar de ser mais descentralizada e plural do que a radiodifusão e a imprensa escrita, não é um meio totalmente democrático.
Entretanto, é necessário ter em mente que, apesar de possibilitar um acesso gratuito às suas páginas na rede, o alcance de tais movimentos é limitado. Isso ocorre porque os setores que exercem a hegemonia na sociedade também ocupam as redes e disputam a hegemonia dentro dela. Além disso, por serem pouco visíveis em jornais impressos e televisivos, a procura por movimentos e meios de comunicação contra hegemônicos torna-se reduzida em comparação às páginas de revistas como Veja, por exemplo, que se destaca por suas posturas políticas conservadoras, inclusive no que diz respeito às pautas que visam criar um sistema de comunicações mais plural e democrático.
De qualquer forma, a despeito da presença dos setores hegemônicos nas redes virtuais, estas não são, para os setores contra hegemônicos, um espaço qualquer. Para Moraes a internet configura-se como mais um espaço onde se travam as lutas e conflitos em busca da hegemonia dentro da sociedade civil. Sendo assim, ela ganharia destaque privilegiado na medida em que ganhasse mais adeptos.
Já para Castells, a contribuição que a internet ofereceu para os movimentos sociais se deu no que diz respeito à formação de uma "cultura da autonomia". Para o professor da Universidade do Sul da Califórnia, vivências "com a comunicação face a face e com a ocupação do espaço urbano" são fundamentais para promover relações mais horizontais, isto é, menos pautadas na hierarquização e na burocratização. É necessário ressaltar, no entanto, que no caso não só brasileiro, mas de grande parte da América Latina, a atuação dos movimentos no espaço rural também é bastante recorrente. Não por acaso, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) é a principal referência brasileira quando se pensa em movimentos sociais. Feita essa ressalva, cabe entender melhor a explicação do autor em relação à formação de tal "cultura de autonomia".
De acordo com o pensamento de Castells, os meios digitais são de fundamental importância para a mobilização, organização, deliberação, coordenação e decisão dos movimentos sociais. Mas não somente nesse sentido. O autor destaca também que a internet cria condições "para uma forma de prática comum que permite a um movimento sem liderança sobreviver, deliberar, coordenar a expandir-se". Sendo assim, os movimentos sociais contemporâneos e a internet teriam em comum o que o autor afirma ser a "matriz cultural básica das sociedades contemporâneas": a cultura da autonomia. Ao desenvolver tal cultura, segundo o autor, o ator social poderia converter-se em sujeito, uma vez que se tornaria capaz de guiar as suas ações em torno de projetos elaborados coletivamente, independentemente das instituições da sociedade, como o Estado. Tal processo se desenvolveria a partir da criação de redes "que permitem aos atores individuais construírem sua autonomia com pessoas de posição semelhante nas redes de sua escolha". Desta forma, a internet deixa de ser encarada apenas como um instrumento da luta por mudanças, mas também como um espaço em construção, no qual a estrutura social que se quer criar é forjada nos meios virtuais.
Essa formação de espaços virtuais – como comunidades, grupos, espaços de discussão, etc. – que questionam a ordem estabelecida na sociedade e buscam romper, ainda que com muitas dificuldades, com as relações de poder pré-estabelecidas encontra seus reflexos na produção jornalística contra hegemônica na internet. Para entender melhor como os meios de comunicação contra hegemônicos lançaram mão desse espaço, torna-se fundamental acompanhar a leitura de Dênis de Moraes.
O jornalismo alternativo em rede analisado por Moraes possui uma série de características que o próprio autor destaca. Entre os princípios de tais veículos, ele cita: 1) o rompimento com as limitações e controles da mídia tradicional; 2) a defesa da cidadania e da democratização da vida coletiva, assim como da liberdade de expressão e 3) a oposição ao pensamento neoliberal, que segundo ele, "subordina os direitos sociais à razão competitiva do mercado". Sendo assim, estas seriam as principais balizas do que se caracterizou, a partir do advento e da difusão da internet na América Latina a partir da virada do século XX para o século XXI, como comunicação alternativa em rede. De uma maneira resumida, tal comunicação alternativa se apresentaria enquanto contra hegemônica uma vez que se colocava contra a ordem neoliberal e "à ideologia mercantilista da globalização".
O autor aponta certos veículos on-line que se destacaram como contra hegemônicos por conterem tais características. São eles os portais Aporrea, da Venezuela, o Coletivo de Noticias del Sur (CoNoSur), da Argentina e Carta Maior, do Brasil. Como este trabalho confere um foco privilegiado à sociedade brasileira, pretende-se então, fazer uma breve discussão sobre alguns portais brasileiros on-line que se destacaram pelas características apontadas por Dênis de Moraes, e a partir de então, discutir as potencialidades e limitações que tais meios de comunicação oferecem na disputa por hegemonia. No entanto, apesar do trabalho ter esse recorte de cunho nacional, não é possível ignorar que, por estarem conectados em redes nas quais as fronteiras nacionais não se fazem tão presentes, tais meios dialogam e são influenciados por portais e movimentos que se desenvolvem e acontecem fora do Brasil.
Uma ressalva importante a ser feita sobre o texto de Moraes é que ele foi publicado em 2008. Sendo assim, após a publicação dele, outros veículos surgiram e ganharam dimensão considerável na sociedade brasileira. A intenção, então, é buscar fazer uma breve análise sobre os veículos Vírus Planetário, Pragmatismo Político e A Nova Democracia. Sem sombra de dúvidas, destaca-se também o jornal Brasil de Fato, que será analisado exclusivamente no terceiro capítulo e que, em alguns assuntos foi verificado comparativamente com o jornal O Globo no primeiro capítulo.
Vírus Planetário foi criada em 2008, por um grupo de universitários do Rio de Janeiro cuja orientação política se aproxima da esquerda marxista. Seu slogan, "Porque neutro, nem sabonete, nem a Suíça", revela uma concepção de produção jornalística pautada no engajamento político. Dentro de tal concepção, os produtores da informação não se colocam como neutros, crentes em uma suposta verdade objetiva, isto é, eles não acreditam na imparcialidade da produção do jornalismo. Sendo assim, o jornalista não deveria se colocar como um informante "isento", mas sim deixar claro quais são as pautas que defendem e não maquiar o seu posicionamento político.
Vírus Planetário não é apenas um portal on-line, mas também uma revista impressa de publicação mensal. O veículo conta com representantes em onze estados do país, englobando quatro regiões brasileiras, com exceção da região norte. Dentre os temas sobre os quais a revista versa, destacam-se: 1) a homofobia; 2) o machismo; 3) o racismo; 4) as produções culturais de artistas e intelectuais independentes que se engajam nas lutas sociais, entre outros.
Pragmatismo Político é um portal de notícias independente que se destacou pela defesa dos direitos humanos e a crítica ao crescente conservadorismo que se verificou na sociedade brasileira a partir da segunda metade de 2014. O veículo iniciou seus trabalhos no ano de 2009 e suas atividades se restringiram ao meio virtual, em seu site e em suas páginas nas redes sociais, como o Facebook e o Twitter. Segundo o próprio veículo, sua função é fortalecer o exercício da cidadania para que se garanta "plena democracia". Suas matérias, assim como as de Vírus Planetário, buscam combater o machismo, o racismo, a homofobia e também tecem várias críticas às publicações da mídia burguesa tradicional, principalmente da Rede Globo.
A Nova Democracia tem se destacado por uma crítica radical ao imperialismo norte-americano e por se colocar ao lado dos trabalhadores em luta e dos movimentos sociais. Sua linha editorial critica as implicações que a geopolítica – que segundo eles, é a política do imperialismo – gerou na produção jornalística no início do século XXI, responsável, entre outras coisas pela geração de "fatalismos" de cunhos geográfico, político, social, entre outros. Tal consequência fez com que se criasse uma tendência no jornalismo hegemônico de não questionamento da realidade. Sendo assim, A Nova Democracia demonstra empenho em questionar os pilares do mundo capitalista – como o Estado e o sistema financeiro – e mostrar que outro mundo é possível de ser construído, sobretudo através das lutas sociais.
Chamam atenção algumas características de tais veículos. Primeiramente, o fato de todos eles lançarem mão da internet como instrumento de divulgação de seus ideais e de atos políticos que os defendam. Além disso, pode-se citar que eles tendem a tecer críticas buscando problematizar o comportamento da mídia tradicional, sobretudo da Rede Globo de Televisão. Outras, são a crítica ao sistema econômico vigente – com diferentes níveis de radicalidade, é importante citar, e a explicitação do pensamento político dos veículos. Sendo assim, tais veículos se encaixam dentro das características apontadas por Dênis de Moraes quando o autor faz a discussão sobre veículos alternativos em rede.
A partir da formação de tais veículos que se organizaram a partir de redes a fim de questionar diversas características da sociedade burguesa nas primeiras décadas do século XXI, cabe a seguinte pergunta: seria a internet apenas mais uma ferramenta a serviço das lutas políticas no mundo contempor neo, ou teria ela um lugar privilegiado e inédito nas lutas sociais em uma sociedade na qual as tecnologias da comunicação e informação tendem a se expandir e se tornar cada vez mais presentes na vida das pessoas? Não há aqui a intenção de fornecer uma resposta definitiva para tal questionamento, porém acredito que este trabalho pode fornecer algumas ideias que contribuam para tal discussão.
No caso dos três veículos brevemente analisados nesta parte do trabalho, verifica-se que todos lançam mão do uso de redes sociais na internet para a divulgação de suas produções jornalísticas. No momento em que este trabalho é escrito, Vírus Planetário conta com o número de 87.841 "curtidas" em sua página no Facebook, enquanto a Nova Democracia possui 191.250. Pragmatismo Político, por sua vez, conseguiu alcançar o surpreendente número de 719. 469 e, segundo informações do próprio portal, sua página oficial havia obtido, no ano de 2014, cerca de 13 milhões de acessos. Com exceção de Pragmatismo Político, os demais veículos também possuem suas versões impressas. Fundado em 2002, A Nova Democracia fechou o mês de junho de 2015 com 152 edições, o que confere uma média de quase 12 edições anuais. Vírus Planetário é uma revista de circulação mensal, e que não está presente em sua versão impressa na maior parte dos estados brasileiros. Sendo assim, diante das dificuldades de se massificar em uma sociedade cujo mercado editorial é bastante restrito, a internet aparece como uma alternativa importante para que estes veículos sobrevivam e consigam dialogar com partes da sociedade que certamente encontrariam vários entraves para entrarem em contato com suas publicações impressas.
No entanto, como Rozinaldo Antônio Miani ressaltou, não se disputa a hegemonia na sociedade apenas através de um veículo. Tampouco se disputa a hegemonia apenas através de uma ferramenta, como a internet. Se tal realidade fosse possível, os setores dominantes da comunicação no Brasil não se importariam caso a propriedade cruzada fosse proibida, o que certamente não é o caso. Além disso, como foi visto anteriormente neste mesmo capítulo, estima-se que cerca de metade da população brasileira não tenha acesso à internet. Ou seja, por mais que em termos absolutos, veículos de cunho alternativo ganhem um certo destaque, ele deve ser relativizado para que prognósticos equivocados não sejam feitos.
Outra questão importante a ser levantada sobre os usos políticos da internet, sobretudo nas redes sociais, é que ela não é utilizada apenas pelos grupos contra hegemônicos. A mídia comercial tradicional também lança mão das redes sociais para divulgação de sua produção jornalística, inclusive, obtendo mais visibilidade dos que os meios alternativos. No momento em que este trabalho é escrito, a página no Facebook da revista Veja, por exemplo, conta com 5.938.638 "curtidas". Época, revista ligada à Rede Globo, por sua vez, possui 1.551.398. Ou seja, tratam-se de números bastante superiores aos daqueles que os criticam e se colocam enquanto alternativa comunicacional. Isso significa dizer que, ainda que possua sua estrutura descentralizada, a internet reproduz parcialmente as desigualdades entre veículos de comunicação que advêm de outros meios – como o rádio, a televisão e as revistas e jornais impressos que circulam no mercado – uma vez que a produção do "espaço virtual" ocorre a partir das condições estabelecidas no plano "real".
Foi visto nesse capítulo que as disputas políticas em torno da comunicação no Brasil nos primeiros anos do século XXI envolveram diversas arenas e setores da sociedade civil. Por um lado, foi possível verificar entidades como a ANJ, a ABERT, a Abra, ABTA, a ANER, a Abratel e a Rede Globo se articulando politicamente em torno da manutenção da propriedade cruzada, do modelo essencialmente comercial de radiodifusão e contrariamente à aprovação de qualquer marco regulatório para a comunicação social no país.
Por outro lado, organizações como a FENAJ, ABRAÇO, Intervozes e FNDC se organizaram coletivamente em busca de mudanças como a criação da TV pública, a aprovação do Marco Civil da Internet, o fim da propriedade cruzada, entre outras pautas analisadas brevemente neste capítulo. Algumas delas foram vitoriosas, outras foram parcialmente colocadas em prática, ou foram deixadas de lado por parte dos governos petistas e do Congresso Nacional nos mandatos que compreendem os anos de 2003 e 2014.
Além disso, foi possível verificar que além das entidades organizadas pleiteando políticas públicas (ou não) em torno do Estado, as disputas simbólicas em torno da geração de consensos dentro da sociedade civil adquiriram novas dimensões com o advento da internet e a crescente difusão de tecnologias da comunicação e da informação. Nesse sentido, o uso de tal ferramenta adquire importância estratégica tanto para os meios de comunicação alternativos, quanto para aqueles já previamente estabelecidos enquanto hegemônicos em outros espaços.
Tais disputas podem ser explicadas a partir da interpretação de Gramsci sobre os aparelhos privados de hegemonia. No segundo volume dos "Cadernos do Cárcere", escrito durante a prisão do pensador no período do fascismo italiano, o autor discorreu sobre a função daquilo que chamou de "aparelhos privados de hegemonia". Sendo assim, cabe entender porque tais instituições e meios de comunicação se fazem tão importantes nas disputas políticas que ocorrem na sociedade brasileira contemporânea.
Gramsci defende a ideia de que a hegemonia se estabelece a partir de uma combinação entre coerção e consenso, que garante assim, a manutenção do poder por parte de uma classe ou fração de classe. Para que o consenso seja gerado, os intelectuais assumem a responsabilidade pela geração dele, de forma "espontânea", fazendo com que grandes massas da população confiem em determinado tipo de sociedade defendido pelos intelectuais e faça com que estes mesmos intelectuais ganhem a confiança da sociedade. Sendo assim, os intelectuais teriam uma função organizativa e conectiva. Já a coerção seria efetuada pelos mecanismos de poder direto, a maioria deles controlada pelo Estado, como a polícia ou o exército. Sendo assim, Gramsci faz a separação daquilo que ele chamou de "planos" da superestrutura: a "sociedade civil" e a "sociedade política, ou Estado".
É majoritariamente dentro da sociedade civil onde se desenvolvem os aparelhos privados de hegemonia, nos quais os intelectuais são capazes de realizar as suas funções conectivas e organizativas em relação às massas. Para Gramsci, que escreveu na Itália da década de 1930, a imprensa era "a parte mais dinâmica desta estrutura ideológica, mas não a única". Além da imprensa, Gramsci também destacou as igrejas, as escolas, as bibliotecas e até os nomes de ruas. Todos esses espaços, ou aparelhos privados de hegemonia teriam a capacidade de condicionar a formação da opinião pública. A imprensa escrita, na época de Gramsci, certamente tinha um peso maior na formação do consenso do que hoje. Com a difusão do rádio, da televisão e, mais recentemente da internet, os meios de comunicação, apesar de diversificados, se mantiveram fundamentais no que diz respeito à consolidação de projetos de sociedade.
Dessa forma, quando se verifica que associações empresariais como a ABTA, a ANJ, a Abert, entre outras, assim como a maior rede de comunicação do país, de posse da família Marinho fazem uso de diferentes meios e estratégias para difundir seus princípios editoriais, estes grupos estão visando a manutenção de um poder de classe. Por outro lado, quando ABRAÇO, FENAJ, Intervozes, Pragmatismo Político, Vírus Planetário e A Nova Democracia questionam o mundo apresentado pelos meios tradicionais, criticam as posturas políticas dos empresários do ramo da comunicação e buscam convencer a população de que um modelo de comunicação e uma sociedade mais igualitários são possíveis, eles atuam na contramão dos setores hegemônicos da sociedade brasileira nos princípios do século XXI. Desta forma, pode-se entender melhor o dinamismo das disputas por hegemonia, uma vez que elas estão presentes em diversos espaços da vida social e se transformam rotineiramente em busca da ruptura com um modelo de sociedade, por um lado, e a manutenção, por outro. E os meios de comunicação – todos eles – possuem importância estratégica para que a hegemonia não seja apenas disputada, mas sim conquistada, num processo que é tudo, menos monolítico.
















Capítulo 3
A terceira parte deste trabalho busca realizar uma discussão específica sobre o jornal Brasil de Fato. As questões que serão levantadas visam responder ao seguinte questionamento: seria este jornal um veículo de comunicação contra hegemônico? Para realizar tal problematização, serão feitas análises do editorial do jornal, das formas de financiamento que fizeram com que o jornal se mantivesse vivo ao longo de 11 anos, comparações com a mídia comercial tradicional, e discussões acerca da postura do jornal em relação ao governo. Para tal, uma discussão bibliográfica em relação à história do veículo se faz necessária para melhor compreender os fatores que condicionaram a produção jornalística de Brasil de Fato. Assim como nos capítulos anteriores, os pressupostos teóricos de Antonio Gramsci são fundamentais para procurar responder à questão que guia a produção desta parte do trabalho. O parâmetro de contra hegemonia que será utilizado aqui pauta-se nos escritos do próprio Gramsci, que afirma que a construção de uma nova hegemonia se daria num momento de assimilação de uma nova forma ético-política, distinta dos padrões dominantes. Incrementando a parte teórica, torna-se imprescindível discorrer sobre as relações entre imprensa e história e, dado o recorte temporal escolhido e o período no qual o trabalho é escrito, uma discussão sobre a história do tempo presente também é primordial.
Como a principal fonte primária desta pesquisa é um jornal, acredito que se torna necessário tratar das relações entre imprensa e História. Segundo Derocina Sosa, estudar tais relações permite ao historiador perceber "situações concretas que remetem às especificidades reveladoras de sua ideologia e de seus contatos com o poder". Além disso, uma análise crítica que leve em conta os interesses políticos e econômicos que guiam a produção jornalística de um meio de comunicação pode permitir a construção de uma história política diferente daquela tradicional, focada nas grandes figuras e personalidades, de caráter mais factual e com uma noção de tempo pautada na linearidade.
Para Sosa, os jornais encontram-se entre três elementos: o Estado, a política e o poder. Dependendo do tipo de veículo, ele pode endossar ou contestar o discurso oficial – por diferentes pontos de vista, é importante frisar. Assim como o trabalho dos intelectuais dentro da perspectiva de Gramsci, a produção jornalística não ocorre em um terreno abstrato. Ela é fruto das relações históricas que as condiciona. Nas palavras da própria autora, o discurso jornalístico "obedece às regras históricas e é o resultado de uma posição sócio-histórica, na qual os enunciadores se revelam substituíveis e o conteúdo apresentado está visceralmente ligado a seu tempo". Isso significa dizer que o contexto histórico da produção do jornalismo é protagonista no que diz respeito aos fatores que condicionam a formação de seus discursos e apresentação dos fatos.
Quando, como no caso deste trabalho, se pretende fazer um trabalho que se insere no campo da história política, uma questão fundamental a ser encarada é que, por estarem condicionados pelos contextos históricos nos quais são produzidos e por estarem localizados nas fronteiras entre Estado, poder e política, o discurso e a produção jornalística não podem ser encarados como "neutros". O pressuposto de que a imprensa e os demais meios de comunicação devem se colocar de maneira imparcial é limitado, de acordo com a historiadora Virgínia Fontes, uma vez que segundo ela, em uma sociedade dívida por classes não pode haver neutralidade nas explicações sobre os fenômenos sociais. Fontes ainda explica que, para além da forma que os jornais escolhem – não aleatoriamente – expor algum tipo de acontecimento, processo ou disputa, praticamente tudo que envolve a produção das pautas de jornais envolve escolhas, que poderíamos chamar de escolhas políticas. De acordo com as palavras da própria autora,

O Veículo não é neutro – e isso é explícito: o veículo X está voltado para o público C, com número máximo de y linhas, é especializado em determinado tipo de informação – cultura, moda, lazer, ciência, turismo, economia etc. – e está direcionado para determinado tipo de público específico; já o veículo W destina-se ao público A, e dirige-se unicamente à cobertura de temas específicos, fragmentados.

Desta forma, ao examinar o jornal Brasil de Fato, é necessário ter em mente todos estes fatores que influem na produção jornalística. Tal análise se faz de extrema importância, pois, ainda que muitos editoriais se pretendam neutros (ou, ao menos, se mostrar desta forma), o fator subjetivo está sempre presente neste tipo de produção. A presença de tal subjetividade se dá principalmente pelo fato da produção jornalística estar a serviço dos interesses daqueles que a escrevem e daqueles que a financiam. Sendo assim, a seleção dos assuntos que entram em determinada edição (em detrimento de outros que ficam de fora), o destaque que cada notícia possui dentro de cada edição, o tipo de linguagem utilizado pelo veículo, as imagens que são exibidas em cada reportagem e o público-alvo são, sobretudo escolhas políticas, que visam a formação de um consenso e a legitimação (ou contestação) de uma determinada estrutura ou conjuntura que ajuda a consolidar e manter ou contestar o poder de uma classe, ou de fração de classe.
Feita esta breve consideração acerca das relações entre história e imprensa, é necessário realizar uma discussão sobre a história do tempo presente, já que se trata de uma pesquisa realizada em 2015 sobre um período histórico cujo recorte se fecha um ano antes do início dela. Assim como a produção da imprensa, o fazer historiográfico também é condicionado pelas relações sócio históricas que os cerca e não pode ser considerado, de forma alguma, neutro diante das explicações dos fenômenos sociais que ocorrem dentro de uma sociedade marcada por, entre outras características, uma grande desigualdade social. Sendo assim, as escolhas feitas pelo historiador, nesse caso – e em vários outros também – se tornam essencialmente políticas, não apenas por conta das escolhas que guiaram a formação deste trabalho (recorte cronológico, recorte espacial, tipo de metodologia, embasamento teórico), mas também porque pesquisador e objeto de pesquisa coexistem no espaço-tempo.
Uma das potencialidades que o estudo da história do tempo presente pode oferecer é o estabelecimento de explicações "micro" e "macro". Por "micro", entende-se aquelas relações sociais ligadas ao cotidiano das pessoas e a vida privada. Por "macro" entende-se questões ligadas ao entendimento de políticas públicas, estruturas sociais, projetos de poder, entre outros fatores. Tal relação é facilitada na história do tempo presente justamente porque o(a) pesquisador(a) é agente histórico do período e/ou do processo que ele(a) estuda.
No entanto, tal potencialidade não torna o trabalho do(a) historiador(a) mais fácil. Principalmente quando ele(a) está inserido(a) em um contexto histórico marcado pelo dinamismo das relações sociais, pelo processo de produção de informação – que se multiplica de uma maneira jamais vista anteriormente – e pelos fluxos intensos de circulação de pessoas, bens, capitais, serviços, entre outras coisas. A dinâmica que passa pela coexistência com os seus objetos de estudo, para o(a) historiador(a), pode fazer com que ele(a) se perca na hora de escolher suas abordagens, haja vista a multiplicidade de possibilidades que surgem. Além disso, dependendo da temática e de quem realiza a pesquisa em história, o envolvimento do(a) pesquisador(a) do tempo presente com seu tema pode envolver questões que despertam paixões e outros tipos de sentimentos que podem comprometer a produção e o caráter crítico fundamental a qualquer estudo na área de História. Como solução para tal questão, Filho afirma que "a experimentação das hipóteses de trabalho pelo historiador, a ambição científica responsável pela construção do objeto de estudo, o rigor de seus questionamentos e a correta metodologia investigativa o protegeriam desta proximidade interferente." [Grifos do autor]. Ainda sobre as necessidades de se tomar uma série de cuidados com o trabalho da história do tempo presente, Filho alerta:

Parece-me claro que este pesquisador deve estar bem atento à grande massa de documentos disponíveis, e que esta profusão de fontes exige do historiador uma seleção acurada, com repúdio e hierarquização contundentes, se fazendo mister esse ofício rigoroso. Como também comentam Serge Berstein e Pierre Milza, o historiador do presente deve se "cercar de uma multiplicidade de fontes para aí encontrar o necessário confronto entre múltiplas abordagens que, sozinhas, legitimam a veracidade do fato, tecido inexcedível de toda reflexão histórica. " [Grifos do autor]

Apesar de ter ganho destaque progressivo nas últimas décadas, o estudo da história do tempo presente ainda possui uma certa restrição entre os historiadores, uma vez que, dada a proximidade do historiador com o período histórico, criou-se uma certa confusão – proposital ou não – do ofício dos historiadores do tempo presente com o ofício dos jornalistas. Sendo assim, houve uma dificuldade no que diz respeito a conceituar o que seria a história do tempo presente. François Dosse afirma que diferentes explicações para o conceito de história do tempo presente foram formuladas. Algumas delas se referiam à temporalidade estudada como "História Imediata", ou história do "muito contemporâneo", e havia também aqueles que defendessem que não havia qualquer separação ou diferença teórico-conceitual entre a história do tempo presente e as demais temporalidades históricas, permanecendo assim como um pseudoconceito.
Dosse também ressalta que as fontes históricas que foram consideradas mais importantes pelos historiadores na época da profissionalização da História (no século XIX) foram as fontes escritas ligadas à institucionalidade. Tal preferência fez com que a prática do exercício historiográfico se fizesse muito mais restrita ao passado e, parcialmente, alheia às questões do presente. Essa perspectiva começou a mudar com o advento da escola dos annales, a partir dos anos de 1930, na qual se destacaram os historiadores Marc Bloch e Lucien Febvre. Os acontecimentos históricos ocorridos em meados do século XX, como a crise de 1929, a ascensão de regimes e ideias fascistas, a consolidação da URSS enquanto sociedade não capitalista e a segunda guerra mundial fizeram com que os historiadores passassem a ver a relação de seus estudos com o tempo presente de outra maneira. Tal mudança fez com que se entendesse que a história e seus questionamentos possuem intrínseca relação com o presente.
No entanto, não é apenas essa relação com o presente que delimita a história do tempo presente. Uma característica que ela possui é a relação da produção historiográfica com a subjetividade do(a) historiador(a). É fato que isso ocorre com qualquer tipo de produção de pesquisa em história, mas no caso da história do tempo presente, se torna fundamental que tal subjetividade fique explícita, como forma do(a) pesquisador(a) enunciar seu lugar de discurso, porque a sua própria história possui correlação direta com a história daquilo que ele(a) pretende examinar.
Sendo assim, se faz necessário, antes de entrar na discussão bibliográfica sobre o jornal Brasil de Fato, explicar de onde vem o interesse pelo estudo de tal veículo. Durante minha formação intelectual – que está longe de ter seu processo finalizado – pude tornar-me um crítico dos veículos de comunicação tradicionais, a partir de uma formação político-intelectual inspirada a partir das leituras de autores como Paulo Freire, Gramsci, Thompson, entre outros, que tive a oportunidade de ter acesso e debate-las em curso de graduação na Universidade Federal Fluminense. Além disso, como morador da periferia da cidade do Rio de Janeiro, mais especificamente do bairro de Brás de Pina, pude verificar várias contradições no espaço urbano de minha cidade que me fizeram, até o presente momento, acreditar e me engajar na formação de uma sociedade mais democrática, plural e igualitária – crença esta que não identificava nos meios de comunicação tradicionais, fossem eles televisivos, impressos ou no rádio. Daí advém o interesse pelos meios de comunicação que fujam dos modelos centrados (quase) exclusivamente nos padrões mercadológicos e que não contestem ou pouco contestem as relações sociais que são responsáveis pelo estabelecimento da exploração do ser humano pelos seus semelhantes – algo que reverbera na produção do espaço. A partir do contato com o jornal, primeiramente a partir da internet, e posteriormente com as versões impressas de edições de Brasil de Fato, as impressões que tive ao ler diversas páginas do veículo eram de que se tratava de um meio que buscava fortalecer o ideário da esquerda brasileira e de outros países do mundo, mas que, por vezes, esbarrava em determinados "desvios" no que diz respeito aos posicionamentos em relação a alguns assuntos, sobretudo em períodos eleitorais, nos quais pude notar, ainda que me colocando apenas como leitor e não pesquisador, uma certa reticência por parte do jornal em criticar o governo federal e candidatos petistas, alinhados com o governo. Por causa dessa percepção, formulei o questionamento que guiará o restante da discussão deste capítulo: pode o jornal Brasil de Fato ser considerado um veículo contra hegemônico? Para isso, será feita uma discussão bibliográfica sobre o jornal, a fim de analisar o editorial, verificar as formas de financiamento do veículo, o seu público leitor e a sua relação com o governo.
Ao realizar uma pesquisa no portal IBICT, foi possível encontrar duas dissertações de mestrado que tinham como objeto de estudo principal o jornal Brasil de Fato. No entanto, nenhum dos dois estudos pertence a programas de pós-graduação em História, assim como a maioria dos textos utilizados na bibliografia desta pesquisa sobre as políticas públicas de comunicação, que estão ligados à área de ciência da comunicação. Tal dificuldade de encontrar obras que tratem de políticas públicas de comunicação no tempo presente reflete certas reticências que os historiadores possuem em se debruçar sobre o tema, o que revela que, para muitos, por mais que se tenha como consenso que as relações sociais ocorridas no passado que são estudadas pelos historiadores possuem intrínseca relação com o presente, ainda é preferível se dedicar ao estudo de um espaço-tempo do qual o(a) historiador(a) não foi agente histórico.
A primeira das obras encontradas foi a de Ana Maria Straube, finalizada no ano de 2009. Sua dissertação trata das origens do jornal e dos primeiros anos de funcionamento e circulação do mesmo. A segunda obra foi de Daniel Cassol, finalizada no ano seguinte. Nela, o autor enfatiza a atuação do jornal em uma conjuntura, que de acordo com sua interpretação, é de crise das esquerdas brasileiras. Sendo assim, será feita uma síntese sobre o que os autores destacaram da história do jornal que podem auxiliar nas discussões das problematizações. É necessário ter em mente que o período que compreende o recorte cronológico desta pesquisa vai além dos limites temporais de ambas as pesquisas supracitadas. Desta forma, a partir das discussões propostas pelos dois autores, procurarei verificar se há mudanças ou continuidades nos padrões e tendências que o jornal adotou no período entre 2010 e 2014.
Straube disserta sobre os antecedentes históricos que levaram a formação do jornal. A autora explica a conjuntura da relação entre Estado e movimentos sociais no período do governo de Fernando Henrique Cardoso, que ficou marcado pela truculência do governo brasileiro ao lidar com os movimentos organizados, sobretudo o MST. Um acontecimento histórico que simboliza tal relação foi o massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido no sudoeste do estado do Pará no ano de 1996, resultando na morte de 19 pessoas. As coberturas midiáticas de alcance nacional sobre a atuação política dos movimentos sociais na década de 90 ficaram marcadas pela tendência em passar imagens negativas dos mesmos. A partir de então, militantes e ativistas, sobretudo os do campo, começaram a se articular em torno da ideia de criação de um jornal que não passasse pelos crivos de Globo, Abril, entre outros grupos empresariais que oligopolizam os meios de comunicação impressos – e audiovisuais – na sociedade brasileira.
No entanto, lançar um jornal, que se pretendia nacional em um país de proporções continentais, era uma tarefa árdua, ainda mais se tratando de movimentos sociais de esquerda que não contariam com apoio de grandes patrocinadores ligados ao empresariado. Se tornava necessário, então, planejar como manter um veículo de considerável alcance e angariar recursos para que tal ideia saísse do papel. Sendo assim, seus principais organizadores se encarregaram de buscar a formação de uma lista de sócios e garantir doações permanentes para que o jornal não enfrentasse os mesmos problemas que os jornais contra hegemônicos costumeiramente enfrentaram na sociedade brasileira: a falta de regularidade nas suas publicações. Logo, calculou-se que seriam necessários cerca de 900.000,00 R$ para que Brasil de Fato conseguisse circular durante 6 meses ininterruptos. Os recursos, então, viriam de colaborações de militantes, de sindicatos, de quotas de contribuições individuais, e posteriormente, o jornal se sustentaria a partir da assinatura dos leitores, de vendas nas bancas e de anúncios publicitários.
Além da questão de financiamento do jornal, era necessário também que fossem discutidos os princípios editoriais que guiariam a produção jornalística de Brasil de Fato. A ideia principal era fazer do jornal um aglutinador das vozes de esquerda, que abrisse espaço não só para discussões a nível nacional, mas também internacional. Além disso, a intenção era fazer do veículo o mais plural possível, desde que se comprometesse com um projeto político popular e anti-imperialista. A tentativa de formar uma espécie de meio de comunicação não sectário foi articulada a partir de consultas populares feitas pelo MST através de uma de suas lideranças, João Pedro Stédile. Segundo José Arbéx Júnior, tais consultas eram bastante amplas e nelas, cabiam "todo mundo que se considerasse anti-imperialista" Ficava claro, então, que o que se pretendia fazer não era criar o jornal de uma determinada corrente interna das esquerdas, mas sim fazer com que várias delas tivessem espaços para divulgar a sua visão de mundo dentro do jornal.
Tais consultas fizeram com que as reuniões responsáveis pela elaboração do jornal contassem com um número considerável de interessados, chegando a ter até 300 pessoas, de acordo com Nilton Viana. Então, foi a partir de um amplo debate que, em maio de 2002 foi lançado um documento intitulado "Um jornal político nacional", no qual foram definidos uma série de pressupostos que guiariam a produção do jornalismo do novo veículo. Logo, ficavam preestabelecidos os parâmetros para o que jornal 1) expressasse a visão da esquerda e promovesse o debate político sobre os fatos e a realidade brasileira; 2) tivesse uma visão de solidariedade internacionalista; 3) fosse plural nas ideias, mas comprometido com o povo, com as ideias de transformação social e ruptura com a dependência externa; 4) fosse independente de disputas de correntes partidárias; 5) servisse como subsídio para a informação e estudo para toda a militância social; 6) fosse um estimulador da luta social e de massa; 7) fosse um estimulador da militância social e do engajamento político dos leitores e 8) defendesse sempre os valores socialistas e humanistas.
O público alvo do jornal inicialmente fora pensado como "a esquerda do Brasil", que na época, segundo estimativas dos próprios organizadores do jornal, girava em torno de 25 milhões de pessoas, algo próximo a 15% da população brasileira na época. Aqui já se encontrava uma certa "falha" programática de um veículo que se pretende contra hegemônico. Como disputar a hegemonia na sociedade de classes produzindo um jornal cujo público alvo é previamente simpático às ideias do meio de comunicação? Como explicou Dênis de Moraes,
... a hegemonia pressupõe a conquista do consenso e da liderança cultural e político-ideológica de uma classe ou bloco de classes sobre as outras. Além de congregar as bases econômicas, a hegemonia tem a ver com entrechoques de percepções, juízos de valor e princípios entre sujeitos da ação política.

Sendo assim, para que uma classe ou bloco de classes se sobreponha sobre outra(s) classe(s) ou bloco(s) de classe(s), é de fundamental importância que haja um esforço para conseguir a maior quantidade possível de adesões em torno de um projeto de sociedade. É óbvio que Brasil de Fato jamais conquistaria, sozinho, a hegemonia na sociedade brasileira, mas se havia a necessidade do fortalecimento da comunicação alternativa, os veículos que assim se pretendessem teriam como função primordial disputar a opinião pública dentro de diferentes setores da classe trabalhadora – rural e urbana – e não se voltar para um público relativamente restrito e previamente simpatizante das ideias que seriam difundidas.
Tal questionamento foi feito por uma parcela das pessoas que contribuíram para a formação do jornal. O jornalista José Arbéx Júnior chamava a atenção para o cuidado que deveria ser tomado para que o jornal não se restringisse à círculos totalmente fechados. Ele ficou encarregado da formulação de um esboço sobre o "Projeto editorial do jornal de esquerda" e afirmou neste mesmo esboço que o jornal não deveria "carregar uma linguagem cifrada, falada apenas por determinados guetos culturais e ideológicos. Sua linguagem deve ser, ao contrário, de fácil entendimento para qualquer leitor médio, de qualquer região do Brasil". Ou seja, apesar de estar voltado para um público notoriamente mais progressista, verifica-se, a partir da obra de Straube, que havia uma preocupação no que diz respeito ao diálogo com amplos setores da sociedade, inclusive porque havia também preocupações estéticas em relação ao veículo. Nilton Viana também se posicionou em relação a tal questão:
Nós intensificamos muito o debate em torno de como e qual deveria ser esse instrumento, ou seja, esse veículo de comunicação, inclusive debatendo as experiências da esquerda, já que na verdade nós não estávamos inventando a roda [...] A esquerda brasileira sempre procurou criar seus próprios meios, então nós debatemos muito os erros e acertos desses meios específicos que a esquerda sempre procurou criar. Um deles é que nós não faríamos um jornal de nenhum partido político ou de uma tendência política específica, ao mesmo tempo em que não seríamos uma república de tendências. Não seria um jornal doutrinário, dogmático, massudo, seria um jornal com reportagens, que fizéssemos mesclado com profissionalismo e militância. E mais, não faríamos um jornal para nós mesmos, ou seja, para militância. O jornal nasceu especificamente para dialogar com outro público da sociedade brasileira, não com a militância, embora seja um instrumento que sirva de subsídio para a militância, para fazer o debate político-ideológico [...] Alguns queriam que fosse um jornal voltado para a militância, um pouco dentro da linha doutrinária-dogmática, de se algo que fosse um instrumento para a vanguarda [...] Então nós mesclamos todos esses debates e chegamos a um meio -termo. Ou seja, vamos fazer um jornal bonito, que vá para as bancas, que seja atrativo, com linguagem profissional, jornalística - com reportagem - mas que ao mesmo tempo seja um jornal que se posicione politicamente frente aos grandes desafios da conjuntura.

A partir dos depoimentos Arbéx Júnior e Viana, verifica-se que, por ter uma composição inicial essencialmente plural, os rumos da produção jornalística de Brasil de Fato encontravam-se, inicialmente, em disputa. No entanto, as diferenças objetivas em relação à função e ao público alvo do jornal, de acordo com a fala de Nilton Viana, puderam ser superadas através da formação de um jornalismo que mistura engajamento, formação política, informação e opinião. Tal afirmação pode ser constatada tanto a partir da fala de Viana, mas também quando se analisa determinadas coberturas do jornal, como foi visto no capítulo 1. Ao final dos debates em torno do programa editorial do jornal, os princípios permaneceram praticamente iguais àqueles esboçados previamente por Arbéx Júnior:
a) expressar a visão da esquerda sobre os fatos e a realidade nacional e internacional e promover o seu debate;
b) expressar a postura da solidariedade internacional entre os povos;
c) ser plural nas idéias, sem vinculação a correntes partidárias, e profundamente comprometido com os interesses do povo brasileiro nas transformações sociais necessárias ao país;
d) subsidiar, com informação e reflexão, a militância social e as pessoas que querem mudanças;
e) estimular as lutas sociais e os movimentos de massa;
f) promover incansável e incessantemente os valores humanistas e socialistas;
g) ter como referencial político a necessidade de um Projeto Popular para o Brasil.
(Projeto editorial do jornal Brasil de Fato, 2002)
Dessa forma, ao se pretender um instrumento que visava a formação de um projeto popular para o país, articulado com os movimentos sociais e abertamente socialista, o jornal se aproximava, ao menos editorialmente, de um veículo contra hegemônico. No entanto, como nem sempre as relações entre teoria e prática são perfeitamente harmoniosas, não se pode levar em consideração que apenas o editorial do jornal seja suficiente para chegar a tal constatação. É necessário que os pressupostos sejam problematizados a partir da análise do próprio jornal. Para isso, a análise bibliográfica de trabalhos anteriores a esse também é de fundamental importância.
Ana Maria Straube analisou os seis primeiros anos de vida do jornal, de 2003 a 2008, tendo identificado, neste período, 3 fases. A primeira, que concerne ao ano de 2003, segundo a autora, foi um período de criação e de projeções que estavam sendo feitas por aqueles que se empenharam na formulação de um veículo de esquerda no Brasil. À época de lançamento do jornal, no 3° Fórum Social Mundial, ocorrido em janeiro de 2003, na capital gaúcha, havia a esperança por parte de seus formuladores de que Brasil de Fato se tornaria um jornal lido pelas massas. Como foi afirmado na introdução deste trabalho, diversos militantes de esquerda, sindicalistas e indivíduos progressistas que não necessariamente estavam completamente engajados na luta política esperavam que a vitória eleitoral do Partido dos Trabalhadores após quase uma década de neoliberalismo tucano significasse um recrudescimento dos movimentos de massa no Brasil, o que alimentou, de certa forma, as expectativas daqueles que se envolveram na criação do jornal.
Com essa esperança, a ideia de alguns dos organizadores de Brasil de Fato era de que, a médio e longo prazo, o jornal tomasse uma abrangência que fosse capaz de torna-lo um veículo que teria condições de disputar a hegemonia com os meios da grande imprensa, como O Globo, a Folha de São Paulo e o Estado de São Paulo, inclusive fazendo com que o jornal deixasse de ser semanal para tornar-se, futuramente, diário. No entanto, as expectativas dos movimentos sociais em relação aos governos do Partido dos Trabalhadores e do fortalecimento da esquerda no Brasil não se concretizaram. Os governos de Luiz Inácio Lula da Silva, assim como o primeiro mandato de Dilma Rousseff foram marcados por algumas políticas sociais que aumentaram o poder de compra da população brasileira, mas não se pode dizer que houve um avanço nas principais pautas políticas defendidas historicamente pelos setores de esquerda, como a reforma agrária, a tributação de grandes fortunas, o enfrentamento aos interesses do capital financeiro, entre outras bandeiras. No entanto, os governos dos partidos dos trabalhadores durante a maior parte do tempo sofreram uma série de críticas conservadoras por parte da grande imprensa comercial, fazendo com que, mesmo sem atender as reivindicações da esquerda, fosse defendido, muitas vezes, por parte dela.
Tal conjuntura fez com que não se criasse um consenso dentro do campo político da esquerda em relação ao governo. Uma parcela acreditava que o governo estava em disputa, ou seja, tinha a crença de que através da pressão política poderia fazer com que o governo se comprometesse a realizar políticas públicas mais ou menos radicais com o objetivo de reduzir a desigualdade social no país e elevar a consciência de classe dos(as) trabalhadores(as) brasileiros(as). Outra parte acreditava que o governo petista era claramente de direita e não estava em disputa, uma vez que havia aprovado a reforma da previdência – que, como visto no primeiro capítulo, prejudicou muitos trabalhadores, sobretudo do serviço público – e não dava sinais de que aceleraria o processo de reforma agrária, além de não ter apresentado uma ruptura com o modelo econômico dos governos anteriores.
Esta divergência se refletiu, de certa forma, nas páginas e no posicionamento político de Brasil de Fato. Ao longo de sua história o jornal não se furtou de fazer críticas a Lula e Dilma quando achou necessário, mas também não chegou a romper politicamente com o governo, o que levou José Arbéx Júnior a sair provisoriamente do editorial do jornal em 2006, e romper completamente com o mesmo em 2010. Para o jornalista, o apoio à candidata do PT no segundo turno das eleições exercido pelo jornal foi o estopim para que a situação tornasse insustentável sua participação na produção do jornal.
Além das questões ideológicas que levaram a um contexto de crise nas esquerdas identificada por Daniel Cassol, houve também uma série de problemas financeiros que quase levaram o jornal a sair de circulação no ano de 2006. Straube identificou que o veículo estipulou como metas, no ano de 2003, uma série de objetivos que não puderam ser alcançados, fazendo com que ele não fosse capaz de se massificar. Entre elas, estava a criação de comitês de apoio ao jornal. Segundo a autora, a ideia da criação de tais comitês havia sido uma das mais originais contidas no projeto editorial de Brasil de Fato. Ela afirma que "eles foram pensados para tentar solucionar questões complicadas para a viabilização dos objetivos do jornal". Dentre tais metas, ficava claro que seus organizadores não queriam que Brasil de Fato ficasse restrito ao eixo Rio de Janeiro-São Paulo-Brasília. Seria necessário que os comitês se espalhassem por todo país para que o veículo se popularizasse e se capilarizasse. Além disso, os comitês seriam responsáveis pela sugestão de pautas e envio de textos para as edições do veículo, o que evitaria que as manchetes e notícias se centrassem em regiões específicas do país e negligenciassem outras. Outra responsabilidade dos comitês seria a fomentação de debates a nível local, afim de incentivar a participação política da população em diferentes cantos do país. No entanto, apesar de tais pretensões, o jornal não conseguiu arrecadar o montante necessário, apenas cerca de 40% do que seria preciso para lançar os primeiros 6 meses de jornal.
Além de não conseguir reunir o montante de dinheiro que esperava, um outro problema ocorreu durante as publicações das oito primeiras edições do jornal. A empresa distribuidora do veículo, a Transfolha, reteve um grande número de exemplares de Brasil de Fato, fazendo com que ele não chegasse às bancas, o que foi considerado pelos editores do novo periódico semanal um verdadeiro boicote. Posteriormente, o jornal assinou contrato com outra empresa de distribuição, a Chinaglia, que após uma série de acordos fez com que o veículo se mantivesse circulando semanalmente, ainda que muitos assinantes recebessem os exemplares com atraso, o que, na interpretação de Straube, freou o aumento no número de assinaturas, que por sua vez, freariam um processo que se intencionava de massificação do jornal. Sendo assim, já no ano de 2003, as ambições de tornar Brasil de Fato um jornal diário, com ampla tiragem e que fizesse um contraponto aos jornais tradicionais foram ficando cada vez mais distantes. A publicidade oficial, nos primeiros anos de vida do veículo, também "boicotou" o jornal devido a sua linha política independente.
A situação se agravaria nos anos seguintes. De 2004 até 2006, houve uma queda de faturamento por parte do jornal, o que acarretou em prejuízos financeiros e quase levou o jornal à extinção. Assim, os organizadores de Brasil de Fato foram obrigados a cortar custos de produção, diminuir o número de páginas do veículo de 16 para 8, demitir parte do corpo de funcionários, o que fez com que o número de assinaturas ficasse muito abaixo do esperado, fazendo com que se chegasse a cogitar a transformação do jornal em um veículo mensal.
No entanto, apesar das dificuldades financeiras e da redução do tamanho do jornal, ele continuou indo regularmente às bancas todas as semanas, e aperfeiçoou sua agência de notícias na internet, a Agência Brasil de Fato. Com todas estas limitações, o público do veículo também se tornou limitado, uma vez que não havia nem pessoal, tampouco recursos financeiros para que o jornal pudesse ganhar uma popularidade massiva. Sendo assim, os textos e reportagens, como verificou Straube, voltaram-se mais para o público da militância de esquerda do que para a sociedade em geral, que é guiada por valores, práticas cotidianas e códigos distintos daquela parcela da sociedade. Daniel Cassol, em pesquisa finalizada em 2010, traçou em seu trabalho um perfil dos assinantes do jornal, correlacionando suas profissões ou funções sociais e a quantidade de assinaturas por grupo, que pode ser verificado na tabela a seguir:
Tabela 3 – Perfil dos assinantes do Brasil de Fato
Profissão/Organização
Quantidade de assinaturas
Entidades
687
Professor(a)
621
Estudante
464
Jornalista
210
Sindicatos
122
Militante
77
Religioso
74
Funcionário(a) público(a)
74
Advogado(a)
66
Aposentado(a)
50
Assistente Social
41
Engenheiro(a)
39
Médico(a)
33
Bancário(a)
32
Tecnólogo(a)
30
Administrador(a)
29
Sociólogo(a)
26
Economista
22
Petroleiro(a)
20
Arquiteto(a)
16
Analista
15
Operador(a)
11
Agricultor(a)
10
Assessor(a)
10
Enfermeiro(a)
10
Sindicalista
10

Verifica-se a partir da análise da tabela acima quais foram os perfis de assinantes de Brasil de Fato. No entanto, acredito que a análise dos dados coletados por Cassol deva ser feita levando em conta outros dados que serão explicados e debatidos em seguida, fazendo as devidas contextualizações, uma vez que a formação de tal público diz respeito especificamente às condições de produção do jornal.
A situação econômica do jornal melhoraria a partir do ano de 2007, quando foi possível sanar as dividas adquiridas nos primeiros anos de jornal, fazendo com que ele pudesse se sustentar a partir da doação de militantes de movimentos sociais, sobretudo o MST, vendas nas bancas, assinaturas permanentes e também graças à publicidade oficial, que passou a se fazer mais presente a partir deste ano. Como visto no capítulo dois, a descentralização da verba publicitária do governo federal foi responsável por fazer com que mais veículos recebessem um certo aumento em sua receita, e Brasil de Fato foi um dos veículos contemplados. A partir de então, o veículo ganharia gradual espaço concatenando a sua produção impressa e sua produção on-line.
Um período importante para a história do jornal começou a partir de 2013. Neste ano o jornal iniciou a produção de exemplares que são distribuídos gratuitamente às quintas feiras nos estados de Minas Gerais, São Paulo, e Rio de Janeiro. Desta forma, verifica-se a intenção do periódico em comunicar-se com uma parcela da população que não se restringe ao militante de esquerda ou um mero simpatizante de ideais progressistas. Em outros estados da federação, o jornal pode ser encontrado em algumas bancas de jornais, como se dispõe na tabela a seguir:
Tabela 4 – O jornal Brasil de Fato nas bancas em diferentes estados brasileiros
Estado
Quantidade de bancas
Espírito Santo
4
Minas Gerais
6
Rio de Janeiro
48
São Paulo
20
Paraná
5
Santa Catarina
4
Distrito Federal
6
Goiás
11
Alagoas
3
Bahia
8
Ceará
1
Paraíba
3
Pernambuco
2
Rio Grande do Norte
3
Sergipe
5
Tocantins
4

A partir da análise do gráfico, verifica-se que Brasil de Fato circula em 16 dos 27 estados do Brasil, estando presente em todos da região sudeste, a única região do país na qual todos os estados recebem o veículo em suas bancas. O Rio de Janeiro concentra a maior parte desses postos, seguido do estado de São Paulo. A discrepância entre o Rio de Janeiro e os demais estados faz crer que a capilarização do jornal neste estado é consideravelmente maior do que em qualquer outro. Outro dado que deve ser levado em consideração é que na região norte, apenas o estado do Tocantins recebe exemplares de Brasil de Fato nas bancas. No entanto, apesar de o veículo praticamente não contemplar a região norte nas bancas, diversas reportagens se destinaram às questões da Amazônia. De qualquer forma, nota-se que o objetivo de fazer deste um veículo que chegasse às massas em diferentes partes do país se mostrou muito mais complicado na prática do que fora idealizado na época de fundação do jornal.
No entanto, apesar de não estar presente nas bancas de todos os estados da federação, e em alguns deles, contar com poucos pontos nos quais leitores comuns possam ter acesso ao jornal, foi possível verificar que o jornal teve assinantes de regiões e estados nos quais não era possível encontrar exemplares do veículo nas bancas regulares. Cassol disponibilizou uma tabela, que será reproduzida a seguir, na qual pode ser verificada a distribuição de assinaturas do jornal entre estados e regiões do Brasil:
Tabela 5 – Distribuição de assinantes de Brasil de Fato por estado
SUL

Rio Grande do Sul
279
Santa Catarina
124
Paraná
160
TOTAL DA REGIÃO SUL
563
SUDESTE

São Paulo
1182
Minas Gerais
243
Rio de Janeiro
312
Espírito Santo
53
TOTAL DA REGIÃO SUDESTE
1790
CENTRO-OESTE

Mato Grosso do Sul
17
Mato Grosso
23
Goiás
39
Distrito Federal
62
TOTAL DA REGIÃO CENTRO-OESTE
141
NORDESTE

Bahia
98
Sergipe
37
Alagoas
65
Pernambuco
43
Paraíba
32
Rio Grande do Norte
28
Ceará
138
Piauí
10
Maranhão
34
TOTAL DA REGIÃO NORDESTE
485
NORTE

Tocantins
5
Amazonas
14
Pará
51
Amapá
1
Roraima
1
Rondônia
41
Acre
3
TOTAL DA REGIÃO NORTE
116
Internacional
6

Analisando os dados coletados por Cassol em pesquisa finalizada em 2010, fica evidente que grande parte das assinaturas de Brasil de Fato se concentrou na região sudeste do Brasil, aquela que concentra os maiores centros urbanos do país, São Paulo e Rio de Janeiro, que coincidentemente ou não, são os estados que possuem o maior número de assinantes do periódico, além do maior número de bancas que vendem o veículo. Logo verifica-se que o esforço em fazer com que o jornal não ficasse circunscrito aos principais eixos econômicos do país foi apenas parcialmente atingido. De fato, todos os estados brasileiros possuem assinaturas de Brasil de Fato – ainda que alguns estados do norte e do nordeste não tenham passado de dez assinaturas. No entanto, se analisarmos as duas tabelas anteriores, verificamos que o público de Brasil de Fato se concentra majoritariamente no eixo Rio-São Paulo e faz parte de uma parcela da população que está engajada politicamente e/ou possui grau de escolarização de ensino superior ou médio. Trata-se de um público consideravelmente diferente da maioria da população brasileira. No entanto, não se pode considerar que o jornal abriu mão por completo da disputa de setores mais amplos da sociedade. O fato do veículo contar com distribuição edições regionais gratuitas em diversos pontos dos estados mais populosos do Brasil pode não ser algo grande quando comparado com os jornais da burguesia, mas é uma grande conquista para os veículos oriundos dos movimentos sociais, uma vez que ele é capaz de chegar a uma parcela significativa de trabalhadores sem custeá-los.
A medida dos mandatos petistas que foi responsável por uma descentralização dos recursos de verbas publicitárias, assim como várias outras estudadas nos capítulos anteriores fizeram com que a postura de Brasil de Fato em relação ao governo fosse bastante ambígua. Em diversos momentos, o jornal criticou medidas adotadas pelo governo, como a reforma da previdência e a transposição do rio São Francisco. No entanto, quando jornais da grande imprensa criticavam o governo, por um viés conservador e elitista, o jornal saiu em defesa do governo – ainda que ele, majoritariamente, tenha se comportado de maneira conservadora e elitista.
No que diz respeito às manchetes que o jornal dedicou ao governo Lula, Straube identificou 4 tipos diferentes de enunciados em direção ao governo federal no período que vai do ano de 2003 até 2008. Havia as manchetes propositivas, ou seja, que davam sugestões de caminhos a seguir pelo governo, as que continham elogios a determinadas medidas do governo, as que continham reivindicações e aquelas que eram críticas abertas a Lula e seu governo. A distribuição da quantidade de matérias sobre o governo entre os 4 diferentes tipos pode ser identificada na tabela a seguir:
Tabela 6 – Manchetes que citam o governo Lula dividida por anos
Ano
Críticas ao governo
Reivindicações ao governo
Propositivas
Elogiosas/Apoiadoras
Total de manchetes
2003
3
2
2
7
14
2004
1
1
-
-
2
2005
7
1
-
3
11
2006
3
1
2
2
8
2007
9
-
-
-
9
2008
4
-
-
-
4
Total
27
5
4
12
48

Verifica-se a partir da análise da tabela 6 que de 48 manchetes que chamaram atenção para a atuação do governo petista, 27, ou seja, mais de 50% delas foram críticas ao governo vigente. Ou seja, mesmo escolhendo não fazer uma oposição completamente aberta à Lula, o jornal não se furtou das críticas, ainda que as 12 manchetes elogiosas não possam ser ignoradas. Porém, apesar das críticas, uma contradição que pode ser verificada no jornal ao longo de sua história é como o jornal se comportou politicamente em tempos eleitorais. Tanto na eleição de 2010, quanto em 2014, Brasil de Fato optou por defender as candidaturas do PT, ainda que houvesse outros nomes à esquerda, que mesmo nos segundos turnos das eleições defenderam o voto nulo por não verem diferenças significativas entre Dilma Rousseff e os candidatos do PSDB – José Serra em 2010 e Aécio Neves em 2014.
No período de julho a outubro de 2010, meses nos quais se deram as campanhas eleitorais para a presidência do Brasil, o jornal dedicou uma série de reportagens em relação às eleições e seus candidatos. Verificou-se que Brasil de Fato centrou a maior parte de sua atenção a críticas ao candidato tucano, na tentativa de enfraquecer e desnudar contradições de sua campanha e seus colaboradores.
A edição de número 383 estampou em sua página 6 uma reportagem cuja manchete era "Alagados, abandonados e removidos" na qual se destacava a imagem de José Serra para ilustrar o descaso do poder público paulista diante da precariedade urbana de bairros da zona leste paulistana, que havia sofrido com graves enchentes. Segundo a reportagem, a intenção do governo paulista era forçar que os moradores de áreas carentes saíssem da região, com o intuito de reforçar a especulação imobiliária naquela parte da cidade.
Já na edição 387, o jornal estampou como manchete principal os seguintes dizeres: "Sem rumo, Serra apela para discurso ainda mais reacionário". A capa ainda destacava que diante do crescimento de Dilma Rousseff nas pesquisas eleitorais, o candidato do PSDB se viu forçado a mudar de estratégia. Antes, tentava conectar sua candidatura à sua imagem de líder estudantil opositor do regime empresarial-militar, e depois apelava para um discurso calcado no anticomunismo. Na página 3 da mesma edição, o jornal denunciava que os interesses do PSDB e do DEM – partido do candidato à vice-presidência da chapa de José Serra, Índio da Costa – eram fortalecer as práticas do imperialismo dos países centrais.
Além dessas duas matérias, o jornal lançou mão de mais oito matérias com o intuito de enfraquecer a candidatura do PSDB, considerada aquela que melhor representava os interesses dos setores dominantes. No período eleitoral de 2010, o jornal abriu pouco espaço para as candidaturas de partidos da esquerda socialista. Na edição 390, o jornal concedeu uma entrevista de página inteira com Ivan Pinheiro, candidato à presidência pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB). Nela, o presidenciável comunista destacou que a disputa entre Rousseff e Serra não contemplava debates essenciais para o Brasil pois nenhuma das candidaturas, segundo ele, visava enfrentar os interesses do grande capital. Além disso, Pinheiro também citou na entrevista que os bancos haviam batido recordes de lucros durante o governo Lula.
Já na edição 394, o jornal abriu espaço para o candidato do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Plínio de Arruda Sampaio, também em uma entrevista de página inteira. Para o então candidato psolista, o período das eleições seria um momento de pedagogia política, no qual o dever dos socialistas seria explicitar seu repúdio às restrições que a burguesia, através dos meios de comunicação, infere sobre os candidatos que não são aqueles "da ordem", isto é, aqueles que pautam o debate político em torno de quem seria o melhor gestor, aproximando-se assim do conceito de "pequena política" formulado por Gramsci e debatido no capítulo 1.
O jornal publicou também duas matérias expondo um apoio, ainda que discreto à candidatura de Dilma Rousseff. A primeira, presente na edição 391, destacava o apoio que amplos setores do sindicalismo brasileiro dedicaram à eleição daquela que viria a ser a primeira mulher na presidência do país. No entanto, o jornal também fez questão de pontuar que o apoio a Rousseff não era consensual, uma vez que algumas centrais optaram pelo apoio à Plinio de Arruda Sampaio (PSOL), Ivan Pinheiro (PCB) ou Zé Maria (PSTU). A edição 400, lançada às vésperas da votação do segundo turno destacava que a maioria da esquerda brasileira apoiava a candidatura da presidenciável do PT. Sendo assim, o jornal refletiu majoritariamente a visão desta parcela da esquerda que optou por apoiar Dilma. Tal apoio, no entanto, resultou na saída de José Arbéx Júnior do conselho editorial de Brasil de Fato. O site do PSTU divulgou, no dia 21 de outubro de 2010, uma carta assinada pelo próprio Arbéx, que reproduzo aqui sem quaisquer cortes:
Carta ao Conselho Editorial do Brasil de Fato

Acabo de ler a versão virtual da tiragem especial sobre eleições.
Tenho dois comentários e algumas considerações:
1. Tecnicamente, o jornal atingiu o auge. A apresentação está tecnicamente perfeita, bonita, agradável, acessível.
2. Politicamente, o jornal também atingiu o auge, no sentido de ter chegado a um limite: não se trata mais de um jornal, mas sim de um panfleto especial sobre as eleições. Para mim, isso significa a morte do jornal Brasil de Fato e o nascimento oficial de mais um órgão chapa branca. Um órgão tecnicamente perfeito, mas politicamente subordinado ao lulismo.
Sem entrar no mérito das posições, é conhecido o fato de que vários setores da esquerda não apoiam a candidatura Dilma, embora sejam contrários à candidatura Serra. Plínio de Arruda Sampaio, por exemplo, acaba de lançar um manifesto propondo o voto nulo. Eu mesmo me manifestei contrário ao apoio a Dilma, embora não tenha defendido o voto nulo. E a posição dos companheiros da Refundação Comunista é favorável ao voto em Dilma, mas com todos os "mas", "senões" e "talvez" que desaparecem da edição especial: o lema da Refundação, se não estou enganado, é: "derrotar Serra nas urnas e a Dilma nas ruas", o que está longe de transformar Dilma em ícone da redenção nacional (coisa que a edição especial faz, na pratica, sem o menor pudor).
O jornal Brasil de Fato, obviamente, só considera digno de publicação no especial sobre as eleições a posição que apóia explicitamente a candidatura Dilma. O jornal Brasil de Fato, ao fazê-lo, pratica a mesma operação que Altamiro Borges corretamente critica na própria edição especial, só que inverte o sinal: o Brasil de Fato se torna um palanque para a Dilma, precisamente como a "grande mídia" é um palanque de Serra. Pior ainda: ao considerar legítima e merecedora de publicação apenas uma determinada posição, descartando liminarmente todas as outras que existem no interior do Conselho Editorial, o jornal passa a impressão pública (exposta em 2 milhões de exemplares) de que há uma unanimidade no interior do conselho: trata-se de uma prática sórdida e bem conhecida, consagrada na época que um certo Josef comandava o regime de terror na URSS.
Diante disso, minha posição no Conselho Editorial se torna insustentável. Sei que ocorreu algo semelhante em 2006, mas voltei a integrar o jornal, na época, por considerar que o MST era muito maior, muito mais importante, muito mais vital do que eventuais divergências. Só que a situação agora é qualitativamente nova. O jornal Brasil de Fato transformou-se num planfletão lulista, e isso marca - na minha opinião, obviamente - reflexo de um processo de desmantelamento histórico do MST e de ruptura de uma boa parte da esquerda com sua própria história e princípios éticos. Trata-se de uma debandada tão grande e imunda que permite, entre outras coisas, que lideranças da "esquerda" declarem sem ruborizar o seu apoio ao agronegócio, à aliança com os neocompanheiros José Sarney e Michel Temer e o acobertamento cúmplice e conivente de manobras sórdidas nos corredores palacianos.
Já abordei várias vezes esse tema em reunião do Conselho Editorial e nunca fui levado suficientemente a sério. O MST, que era - sempre na minha opinião - o último grande bastião de resistência à cooptação oficial, está claramente sendo triturado pela máquina do Estado terrorista brasileiro, agora operada pelo lulismo. E tudo em nome do... "combate à direita"! A frase "Dilma não é o governo dos nossos sonhos, mas Serra é o governo de nossos pesadelos", que consagra a posição editorial assumida pelo jornal, pode ser um bom achado de marketing, um ótimo recurso de oratória, uma bela saída para escapar de um dilema político. Mas se o critério for a boa oratória, que se convoque então Carlos Lacerda. Ele tem ótimas lições a dar nesse campo.
Não vou ser cúmplice disso. Nesse mesmo sentido - e embora não seja essa lista o palco para esse debate - coloco em questão a legitimidade de minha permanência à frente da Associação dos Amigos da Escola Nacional Florestan Fernandes (e por isso envio esta carta com cópia à diretoria da AAENFF, a quem peço que remete ao conjunto de seus associados). Encaminho também a algumas outras listas, para que se marque publicamente a minha ruptura com esse trágico desfecho.

Aos vencedores, as batatas.

Abraços

Jose Arbex Jr.

Na opinião de um dos jornalistas que ajudou na criação de Brasil de Fato, o periódico havia se tornado um veículo subordinado politicamente ao lulismo. A carta de Arbéx Júnior revela muito de sua insatisfação em relação aos rumos que o jornal tomara. Ele, assim como outros militantes de esquerda, era a favor de um rompimento político com o Partido dos Trabalhadores e a adoção de uma linha política que não tivesse qualquer tipo de comprometimento com o governo federal. Por mais que se leve em consideração que a sua carta contenha em grande medida uma dose de desabafo emocional, as críticas do jornalista são pertinentes. Isso se verifica a partir das escolhas políticas feitas pelo veículo nas eleições presidenciais seguintes.
Em 2014, mesmo tendo criticado o governo Dilma ao longo de seu primeiro mandato, o jornal produziu edições especiais que foram distribuídas gratuitamente nas ruas de algumas cidades brasileiras, inclusive no Rio de Janeiro, cidade na qual habito e pude ter acesso à versão material de duas delas. Uma delas, destacava os avanços em alguns índices sociais que o Brasil obteve ao longo de 12 anos de governos petistas, como o "desaparecimento" do país do mapa da fome e o aumento nos investimentos em educação, com a criação de novas universidades, cursos técnicos e programas de bolsas e financiamentos para facilitar a entrada de estudantes no ensino superior privado. A outra se tratava de um verdadeiro panfleto político-eleitoral em forma de um tabloide, cuja capa estampava metade dos rostos de Dilma Rousseff e Aécio Neves e os dizeres: "Dilma X Aécio: quem está do nosso lado? ". A página 5 desta mesma edição estampou a manchete: "Lula e Dilma mudaram para melhor a vida dos brasileiros". A edição ainda versou sobre o aumento do salário mínimo promovido pelos governos do PT, além de afirmar que a composição da bancada do congresso nacional havia sido prejudicial para os trabalhadores. Sendo assim, verificou-se que aquilo que foi criticado por Arbéx Júnior em 2010 voltou a se repetir na eleição seguinte.
Foram discutidos até aqui diferentes questões acerca do jornal Brasil de Fato, como seu editorial, a forma de financiamento do jornal, seu público e a relação que este estabeleceu com os governos do Partido dos Trabalhadores no período que compreende os dois mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro mandato de Dilma Rousseff. Estes foram os elementos selecionados para responder à pergunta que motivou a produção deste capítulo: seria o jornal Brasil de Fato um veículo de comunicação contra hegemônico? O desenrolar da pesquisa faz crer que é impossível chegar a uma conclusão simples e dicotômica, que responderia um "sim" ou um "não" contundente.
A partir da análise da obra de Straube, verificou-se que o jornal, na época de seu lançamento tinha pretensões ambiciosas de disputar a hegemonia com os jornais de grande circulação da imprensa burguesa e dialogar com um grande público da população brasileira. Contudo, as condições objetivas referentes à produção de um jornal de circulação nacional em um país de dimensões continentais como o Brasil freou boa parte das ambições de seus idealizadores. No entanto, apesar das dificuldades, dívidas adquiridas e boicotes por parte do governo – no início – e do empresariado, o jornal conseguiu manter sua regularidade – algo extremamente difícil dadas as condições financeiras que a imprensa não comercial sempre teve na história do brasil – e, a partir de 2013, passou a contar com edições de distribuição gratuita nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, com edições regionais, mais voltadas para a vida e os problemas cotidianos enfrentados pelas populações desses lugares – sobretudo as das periferias e favelas. Logo, se em um determinado período de sua história, Brasil de Fato dedicou-se mais a atrair o público militante do que o público em geral, em outros, percebe-se uma preocupação em ampliar as bases de diálogo do jornal.
Em relação ao financiamento do veículo, verificou-se que ele acontecia a partir de diferentes meios: publicidade oficial governamental, vendas nas bancas, assinaturas e doações por parte de militantes e organizações como movimentos sociais e sindicatos. Logo, ao que tudo indica, não se tratou de um veículo movido a partir do dinheiro da burguesia, algo essencial para que um veículo possa ser considerado contra hegemônico neste contexto histórico. De todos os quesitos analisados, talvez seja nesse onde Brasil de Fato se aproxime mais de uma característica contra hegemônica: o fato de ter sua produção pautada sem passar pelos crivos e lobbys do grande empresariado.
No que diz respeito à relação que o veículo estabeleceu com o governo, encontra-se o ponto mais complicado para a análise do jornal. É certo que, como um veículo que angariou diferentes vozes da esquerda nacional, ele publicou diferentes pontos de vista acerca dos governos do PT. Algo perfeitamente compreensível, haja vista que até o momento em que escrevo este trabalho, parte da esquerda brasileira se mantém fiel ao governo Dilma Rousseff, mesmo com todas as ressalvas que possam vir a ser feitas. No entanto, nos períodos eleitorais de 2010 e 2014, o jornal poderia ter optado por diferentes linhas políticas para se pautar, e fez a opção pelo que fora considerado um "mal menor" para a sociedade brasileira, uma vez que o retorno do PSDB ao governo seria considerado um desastroso retrocesso para os movimentos sociais. Porém, ao centrar, desde o primeiro turno, os debates políticos em torno das candidaturas que já eram colocadas pelos meios de comunicação comerciais como as principais, o jornal se aproximou de uma discussão política não em torno qual seria a melhor opção política para os(as) brasileiros(as), mas sim de qual gestão seria a "menos pior". Tal opção não é característica de um veículo que pretenda promover uma oposição consistente ao sistema capitalista e a criação de uma nova forma ético-política.
No entanto, levar em consideração apenas como o jornal Brasil de Fato se relacionou com os governos de Lula e Dilma Rousseff seria insuficiente para dizer que este não é um veículo contra hegemônico. Inclusive, porque, como assinalou Daniel Cassol, o veículo "possui latente um desejo de expansão hegemônica". Além disso, boa parte das matérias que são divulgadas pelo mesmo tendem a tocar em assuntos como a luta de classes, a mobilização de movimentos sociais, críticas ao sistema financeiro e ao agronegócio, entre outras temáticas que raramente são vistas nos jornais ligados aos grandes conglomerados empresariais.
Diante da análise feita neste capítulo, como afirmado anteriormente, não é possível afirmar categoricamente que Brasil de Fato se trata de um periódico contra hegemônico, mas tampouco faz qualquer sentido dizer que este é um jornal como qualquer outro da imprensa burguesa, haja vista a notável diferença que pode ser verificada entre este e O Globo, comparados no capítulo 1. Fato é que muitas vozes anticapitalistas ecoam e ecoaram neste semanário, mas em períodos importantes para se debater o futuro da nação, notou-se um recuo político-programático por parte do jornal. Logo, pode-se dizer, a partir da análise aqui realizada, que o jornal difundiu algum tipo de pensamento contra hegemônico, mas, em outras ocasiões, se afastou deste próprio pensamento, algo que não é específico de tal veículo em questão, mas que perpassou boa parte da mentalidade da esquerda brasileira após a chegada do PT ao poder, é importante frisar. Sendo este um trabalho de história do tempo presente, aqui encontra-se uma grande dificuldade que se impõe a todos aqueles que pretendem estuda-la. Trata-se de um processo histórico ainda não finalizado e qualquer tentativa de se fazer um prognóstico sobre os próximos anos de Brasil de Fato teria grandes chances de ser completamente equivocada. Logo, a história que está para se desenvolver poderá dizer se as reflexões aqui feitas poderão servir como base para um melhor entendimento do jornal e das lutas sociais no Brasil, ou poderá refutar estas próprias reflexões e lançar novos olhares elucidativos.























Conclusão
Este trabalho buscou analisar as disputas por hegemonia na sociedade brasileira a partir dos meios de comunicação no período que compreende os anos de 2003 e 2014, anos nos quais o governo federal teve a liderança do Partido dos Trabalhadores, primeiramente com Lula, que teve dois mandatos seguidos, e posteriormente com Dilma Rousseff.
A chegada de um partido cujas bases se estabeleceram na classe trabalhadora sindicalizada ao poder fez com que muitos brasileiros acreditassem que o novo governo poderia ser capaz de realizar profundas reformas que mudariam drasticamente – para melhor – a realidade dos milhões de habitantes deste país.
A sociedade brasileira nos primeiros anos do século XXI continha várias características estruturais advindas de períodos anteriores de sua história: uma extensa concentração fundiária, concentração de renda, fome, milhões de pessoas abaixo da linha de pobreza, violência urbana, déficit imobiliário, violência contra camponeses no campo, precariedade dos serviços públicos de saúde, educação e transporte e uma outra característica que recebeu atenção especial neste trabalho. A concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucos grupos empresariais.
A distribuição dos veículos impressos, de radiodifusão e de conexão com a internet, apesar de não estar diretamente ligada à satisfação das necessidades mais básicas e urgentes da produção da vida material humana – aquilo que os marxistas costumaram chamar de base – possui estreita relação com ela e é capaz de influenciar a mesma. Em outras palavras, a transmissão de opiniões, notícias, valores, entre outros elementos, através dos meios de comunicação, apesar de não estarem presentes na organização da economia e na distribuição de riquezas, são capazes de influenciar a política econômica de um governo, a forma como se dão as relações de trabalho, a distribuição do trabalho doméstico e as relações de poder entre diferentes segmentos da sociedade. É por isso que os meios de comunicação, com o advento de novas tecnologias que foram responsáveis pela sua massificação, adquiriram, a partir do final do século XX uma importância fundamental para a vida em sociedade, ainda que as disparidades socioeconômicas mantenham uma série de pessoas afastadas de várias dessas novas tecnologias.
Os meios de comunicação possuem uma importância estratégica no que diz respeito ao jogo político. Como visto, uma classe ou fração de classe detém a hegemonia dentro de uma sociedade quando ela é capaz de convencer a maioria dos indivíduos da mesma de que o seu projeto de sociedade representa alguma espécie de vontade coletiva. Para que isso se concretize, o controle da maioria dos veículos impressos, de rádio, televisão e de provedores de internet é imprescindível, uma vez que eles permitem que uma série de valores sejam transmitidos para milhões de pessoas. Sendo assim, a mídia se constitui como uma ferramenta fundamental para que as pessoas criem a sua percepção daquilo que é justo ou injusto, pautem as suas ações, suas formas de expressão e de auto representação.
No caso dos veículos de radiodifusão, tratam-se de espaços limitados que não podem ser explorados por todos os cidadãos. Desta forma, é necessário que o estado controle a distribuição destas concessões de forma a garantir o direito da liberdade de expressão e de informação. Entretanto, a partir de uma prática que Venício Lima denominou "coronelismo eletrônico", o Estado brasileiro historicamente evitou que se estabelecessem regras que impedissem, na prática, a formação de monopólios ou oligopólios de comunicação no país. A partir da análise das obras de Dênis de Moraes, Carolina Matos e do próprio Lima, verificou-se que um grupo seleto de famílias controlou a maior parte das concessões de radiodifusão no país, tendo elas, mais recentemente estabelecido uma série de acordos com empresas estrangeiras do setor.
Com base no texto de Gislene Moreira, viu-se que a repressão às rádios comunitárias foi uma constante dos governos petistas, estabelecendo uma série de regras e concedendo poder de polícia aos agentes da Anatel para fecharem os estabelecimentos que se encontravam na ilegalidade. Tal prática fez com que inúmeras parcelas da população brasileira não fossem capazes de se expressar através da radiodifusão comunitária, o que fortaleceu um modelo quase exclusivamente privado de comunicação social no qual se confundem – de forma proposital ou não – liberdade de imprensa com liberdade de empresa e concessor com concessionário dos serviços públicos de radiodifusão.
A partir dos esforços que entidades empresariais, Estado e concessões públicas fazem para manter o sistema de radiodifusão de tal maneira que atenda aos interesses desses três elementos, verifica-se a importância dos sistemas de comunicação para a manutenção ou contestação dos pilares que baseiam a vida em sociedade. Os meios de comunicação, assim como as entidades empresariais, igrejas, sindicatos, partidos políticos, escolas, universidades, entre outros tipos de organizações que condicionam a formação da visão de mundo de um determinado ser humano formam o que Gramsci chamou de aparelhos privados de hegemonia, logo, são determinantes para a manutenção ou contestação de um poder de classe ou de fração de classe.
Dentro do quadro teórico escolhido para a produção deste trabalho, no qual os escritos deste filósofo italiano ganham relevância fundamental, a existência de uma hegemonia por parte de uma classe ou fração de classe pressupõe a existência da contestação, uma vez não se pode esquecer que consenso não é a mesma coisa que adesão unânime. Logo, a existência de um pensamento hegemônico faz com que se desenvolva uma ou mais formas de pensamento contra hegemônicas, que são responsáveis por questionar os valores, as interpretações e as ações dos setores dominantes, o que confere às disputas por hegemonia na sociedade contemporânea um caráter essencialmente dinâmico.
Logo, mesmo com os meios de comunicação de massa estando em sua maior parte no controle de poucos grupos que pertencem a uma elite político-econômica do Brasil, foi possível verificar o surgimento de meios alternativos aos dominantes, que são guiados por outros valores, princípios e ideologias, que nos casos analisados nesta pesquisa, se pautaram pela defesa da democratização da vida coletiva, contrários às desigualdades sociais, opressões de gênero, raça e sexualidade e à mercantilização da vida. Estes veículos lançaram mão sobretudo da internet, estabeleceram estreitas relações com as lutas de movimentos sociais em rede, e sempre que possível, criticavam as produções da mídia comercial tradicional.
Dentre estes veículos, destacou-se o jornal Brasil de Fato, o qual pude analisar nos capítulos 1 e 3 deste trabalho. Advindo de grandes movimentos sociais da sociedade brasileira, como MST e a Via Campesina, ele se tornou um jornal que se destacou historicamente pela difusão de diversos pensamentos da esquerda nacional. Primeiramente, foram escolhidos temas que suscitaram debates na sociedade brasileira e/ou tinham alguma relação com as políticas públicas de comunicação: a reforma da previdência; a adoção de reservas de vagas para negros, pardos e índios nas universidades brasileiras; a criação da EBC e a aprovação do Marco Civil da internet. As coberturas de Brasil de Fato foram comparadas com as coberturas de um dos maiores jornais impressos do país, O Globo. A partir das comparações, foi possível identificar que se tratavam de veículos de naturezas distintas, com objetivos e ideais de sociedade divergentes. As reflexões sobre ambos permitiram ratificar o pressuposto de que a produção jornalística não pode ser considerada neutra sob hipótese alguma.
Mesmo com as diferenças notáveis entre os dois jornais, escolheu-se aprofundar as discussões acerca da contra hegemonia (ou não) de Brasil de Fato. Para a realização desta discussão, foram analisados o editorial do jornal, sua disposição nas bancas, seu público leitor, suas formas de financiamento e a sua relação com o governo federal, além das discussões de conteúdo e das comparações feitas no capítulo 1. As análises mostraram que, em relação ao editorial e as formas de financiamento do veículo, o jornal apresentou-se de maneira completamente alternativa aos veículos tradicionais, uma vez que não recebia financiamento a partir de empresas privadas, tendo sua manutenção bancada a partir de publicidade oficial estatal, doações, vendas nas bancas e assinaturas, além de se afirmar abertamente como um meio de comunicação anti-imperialista e socialista. No entanto, a capacidade de gerar disputas de hegemonia por parte dele se veria prejudicada devido a questões políticas e financeiras que impediram que Brasil de Fato se tornasse um jornal lido pelas massas. De qualquer forma, o jornal não abandonou por completo os objetivos de se tornar conhecido por um público amplo, haja vista as produções gratuitas que começaram a circular semanalmente nos três estados mais populosos da nação a partir de 2013.
O fator no qual foi possível encontrar uma maior controvérsia foi o da relação do jornal com o governo federal ao longo de sua história. Brasil de Fato estabeleceu uma relação de ambiguidade com os mandatos petistas, por ora criticando-os com firmeza, e por outros momentos se aliando a eles, como nos períodos eleitorais. Essa postura flutuante certamente traz muitas dificuldades para o(a) pesquisador(a) quando ele(a) tem a intenção de estudar o posicionamento político de um veículo frente a um governo. Tais dificuldades encontradas no estudo sobre Brasil de Fato remetem a possibilidade que todo movimento social e político tem de sofrer um processo de burocratização. Seria prematuro dizer, que no momento em que esta pesquisa é escrita, tal processo teria sido concretizado, mas é minimamente razoável problematizar que existe essa possibilidade, haja vista a proximidade que o veículo estabeleceu com um governo que resistiu em abraçar causas e pautas políticas defendidas historicamente pelos setores de esquerda, da qual fazem parte aqueles que contribuíram para a fundação e manutenção do veículo ao longo de mais de uma década.
Diante do que foi estudado nesse trabalho, seria possível afirmar que os governos do Partido dos Trabalhadores contribuíram para o fortalecimento da comunicação contra hegemônica brasileira? Certamente, algumas medidas de políticas públicas na área de comunicação foram favoráveis aos veículos alternativos, como o Marco Civil da Internet – cujo relator pertence ao PT do Rio de Janeiro – e a descentralização da publicidade oficial. Mas seria impossível afirmar que tais medidas foram a tônica das políticas de comunicação no período estudado. Propostas presentes no PNDH 3 (estudado no capítulo 2) foram deixadas de lado e o governo relutou em buscar a formulação de uma lei geral de comunicação eletrônica de massa, mantendo basicamente o modelo de radiodifusão do país – aquele que atinge a maior parcela da população brasileira – sem uma regulamentação precisa, o que, obviamente, favorece os setores dominantes, a quem não interessa que múltiplas vozes ecoem no sistema de comunicação nacional. Vale lembrar que tal postura em relação a comunicação não está em desacordo com o restante da política governamental brasileira no período 2003-2014, haja vista que o governo implementou medidas que beneficiaram parcelas mais pobres da população, sem, no entanto, ameaçar o poder das oligarquias e do capital financeiro. Não obstante, é fundamental lembrar que as políticas de comunicação no Brasil pós-1988 não passam apenas pelo crivo do governo federal, mas também pelo poder legislativo, que assim como o palácio do planalto, resistiu a maioria das propostas de democratização da comunicação.
No entanto, como a construção da hegemonia é um processo dinâmico e este trabalho destinou-se à análise de um processo histórico ainda não concluído, é possível que o quadro analisado se modifique, já que as lutas sociais, de maneira alguma, chegaram ao fim. De qualquer forma, acredito que as reflexões, analises e dados aqui apresentados tenham sido de alguma valia para aqueles que se interessam tanto pela história política, quanto pelo estudo de sistemas de comunicação e as disputas em torno da consolidação de poder por parte de uma classe ou fração de classe.
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