Aspectos éticos e estéticos da pesquisa acadêmica em Direito

May 29, 2017 | Autor: H. de Oliveira Sa... | Categoria: Ética Aplicada, Metodologia da Pesquisa em Direito
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa Programa de Pós-Graduação em Direito Mestrado em Constitucionalização do Direito “Metodologia da Pesquisa e do Ensino” Profa. Dra. Flávia Pessoa

ASPECTOS ÉTICOS E ESTÉTICOS DA PESQUISA ACADÊMICA EM DIREITO¹ Hermano de Oliveira Santos²

1 Exposição verbal realizada em 10/10/2016 para a turma do período letivo 2016.2. 2 Currículo: lattes.cnpq.br/8900052310138642. E-mail: [email protected].

INDAGAÇÕES ONTOLÓGICAS Pesquisa acadêmica é arte (art) ou ofício (craft)? É teoria (epistemologia) ou prática (teleologia)?

É metodologia (com técnica) ou tecnologia (com método)? É atividade criadora (busca por originalidade) ou recriadora (risco de plágio)? É científica (especulativa) ou política (propositiva/interventiva)?

Que é pesquisa acadêmica em Direito?

DA ÉTICA... (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Ofício - atividade social / união com “aqueles cuja pesquisa usamos” e aqueles “que usarão a nossa” / não limitado ao meio acadêmico / “Era da Informação” / necessidade de pessoas e profissionais com espírito crítico

Princípios - de proibição (não plagiar, adulterar, ocultar, destruir, negligenciar, encobrir, ridicularizar, dificultar ou simplificar) e de colaboração (desenvolvimento comunitário de um ethos, caráter, para evitar desconfiança e cinismo) Plágio - evidente ou oculto / o “caso” da professora de RR na UnB / uso de “farejador”

DA ÉTICA... (GADAMER/DWORKIN/POPPER) “Elogio da teoria” - “poder da razão” / tolerância (GADAMER)

“Elogio à teoria” - importância da teoria (integral) para a argumentação (prática) jurídica / resposta à visão anti-teórica de POSNER/SUSTEIN (DWORKIN) “Tolerância e responsabilidade intelectual” direito/responsabilidade de participar do diálogo acadêmico / respeito mútuo / doze princípios para uma “nova ética profissional” da pesquisa acadêmica (POPPER)

DA ÉTICA... (BORGES) Informação/Conhecimento pensamento (memorização) ≠ “calculante” (criatividade)

cumulativo

“Apologia do erro” - “a hipótese teórica apenas pode ser corroborada provisoriamente, isto é, se e enquanto algum teste crucial de refutação não a infirmar” / falibilismo do conhecimento humano de POPPER: o erro não é a melhor forma de aprender; o erro é inevitável / o ideal de erradicar erros é vão / o pesquisador deve procurar identificar erros o mais rapidamente possível, mas não a qualquer custo

DA ÉTICA... (BORGES) Ciência e poder - dominação / poder para saber, saber para poder / “O saber nos converte em senhores da natureza”

“Ciência feliz” - opção pelo que se gosta de fazer / a satisfação está no caminho e no caminhar (GANDHI) / ver sobre os ombros de gigantes (CHARTRES/NEWTON)

DA ÉTICA... (BORGES) “Satelitização da inteligência” - riscos de orbitar um autor/astro-rei

“Corporação de elogios mútuos” - preocupação excessiva com os efeitos “sociais” da pesquisa e dos títulos acadêmicos

DA ÉTICA... (FERRAZ JR./BOURDIEU/MIAILLE) Direito como tecnologia - zetética e dogmática / as três dogmáticas (analítica, hermenêutica, da decisão) / “técnica, decisão, dominação” (FERRAZ JR.)

Direito como “poder simbólico” - “no texto jurídico estão em jogo lutas, pois a leitura é uma maneira de apropriação da força simbólica que nele se encontra em estado potencial” (BOURDIEU) Direito como práxis - atitude crítica para superar tanto o idealismo, quanto o empirismo como o positivismo / “prática revolucionária” / “subversão do status quo” (MARX apud MIAILLE)

DA ÉTICA... (GUSTIN; DIAS) “Pesquisas” em Direito - pesquisa “profissional” / pesquisa “científica” / Direito é uma ciência social aplicada

Necessidade de repensar a pesquisa jurídica - “a ciência, dentre todas as demais formas de conhecer a realidade, parece ser a que ainda pode contribuir para a emancipação dos sujeitos e para a alteração do status quo vigente” / “à ciência resta proporcionar a democratização do conhecimento produzido e a melhoria das condições sociais da humanidade” / aluno como sujeito do processo de aprendizagem e indivíduo crítico em relação ao que é ensinado / transformar e redefinir o papel do Direito na sociedade / “pesquisa como função acadêmica de grande relevo para a produção do conhecimento científico”

ENTRE A ÉTICA E A ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Ética (comunidade) Estética (familiaridade) - modos de pensar e se expressar próprios / paralelo como o “universo” da moda

(Pré-)Julgamentos - “pensar no diálogo” Relação autor-aluno/leitor-professor - representar/imaginar papeis sociais / compartilhar interesses comuns

Aprendizagem de técnicas de pesquisa - ler/ouvir, observar, praticar

ENTRE A ÉTICA E A ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Autor - imaginar que possui uma informação importante / identificar o “palco” / representar o “papel” de pesquisador / intuir a forma final do trabalho e o que o leitor espera / “pensar e escrever como um leitor” Leitor - imaginar “quem” analisará a informação e “como” pretende utilizá-la (fins lúdicos, práticos ou intelectuais?) / indagar-se sobre a compreensão do problema/questão e a reação à solução/resposta

ENTRE A ÉTICA E A ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Habilidade/Ansiedade - experiência -> maior controle das técnicas repetitivas e previsão de incertezas

Lição - “pesquisa não é o tipo de coisa que se aprende de uma vez por todas” Proposições - o autor-aluno aprende a pesquisar quando tem uma visão do leitor e da comunidade, “cujos valores e práticas definem a pesquisa competente e sua divulgação” (ética) e quando compreende “como algumas características formais básicas de seus textos influenciam o modo como os leitores os lerão” (estética)

ENTRE A ÉTICA E A ESTÉTICA (ECO) Humildade - “Todos podem ensinar-nos alguma coisa. Ou talvez sejamos nós os esforçados quando aprendemos algo de alguém não tão esforçado como nós. Ou então, quem parece não valer grande coisa tem qualidades ocultas”

Orgulho - “papel de funcionário da humanidade”, que fala “em nome da coletividade” sobre seu tema de pesquisa, “uma autoridade sobre o que foi dito por outras autoridades” Relação autor/leitor - um “encontro marcado” / “ideia de interpretação textual como a estratégia de produzir um leitormodelo, concebido como a contrapartida ideal de um autormodelo”, tornando desnecessárias as figuras do autor e do leitor empíricos e superando as ideias de voluntas/intentio

ENTRE A ÉTICA E MACHADO)

A ESTÉTICA (PINHEIRO-

Vaidade - performance dos “fodas” e depressão dos “fracos” / “Gênios são raros. Enroladores se multiplicam. Soar inteligente é fácil (é apenas uma técnica e não uma capacidade inata), difícil é ter algo objetivo e relevante socialmente a dizer” / “A função da universidade não é anular egos, mas construí-los” / “a vida acadêmica é composta por trabalho duro e não genialidade” / “Nós mesmos criamos a nossa trajetória. Em um mundo em que invejas andam às soltas em um sistema de aparências, é preciso acreditar na honestidade e na seriedade que reside em nossas pesquisas”

ENTRE A ÉTICA E REPOLÊS; PRATES)

A ESTÉTICA (OLIVEIRA;

Liberdade - o que e como pesquisar / “papel crítico e investigativo esperado das Universidades” no Estado Democrático de Direito / estudo de caso do movimento “Escola sem Partido” / comparativo entre a situação no Brasil e nos Estados Unidos

... À ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Tecnologia/Metodologia - aprendizagem/ensino Níveis de linguagem - relevância desse ou daquele dado

Finalidades - compreender um assunto / delimitar um tema / solucionar um problema

... À ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Etapas - avanços e retrocessos / influências recíprocas (introdução-desenvolvimento-conclusão)

Levantamento bibliográfico Leitura - sumário, referências bibliográficas, resenhas etc. / fontes e níveis de utilidade / volume e rapidez (GUSTIN; DIAS) Tópicos do projeto assunto/tema/problema/hipótese/objetivos/justificativa

Tópicos do relatório - sumário/partes/capítulos/itens/subitens ou referencial teórico/análise de resultados Título: subtítulo - assunto(s): tema

... À ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Relatório - “produto” da pesquisa / meio de demonstrar a coleta, organização, análise e apresentação de informações de modo confiável e convincente / rascunho e polimento / que escrever primeiro? / introdução como guia de escrita / introdução: contexto, problema, resposta / apresentação visual e sedução do leitor / retórica, argumentação, persuasão / o risco do panfleto / estilo e autenticidade / clareza e concisão / coesão e coerência / vozes e ordem / temporalidade: antigo antes do novo / espaço: mapa de leitura / do simples ao complexo

... À ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Padrão - formato específico / formas pré-determinadas (ex. normas da ABNT) / “não são formas vazias arbitrárias a serem preenchidas com negligência, mas antes elementos geradores”, que tanto influenciam a leitura como estimulam a reflexão / o padrão não deve ser repressor e coercitivo, mas criativo e construtivo

... À ESTÉTICA (BOOTH; COLOMB; WILLIAMS) Formalismo - riscos e limitações (confundir forma e conteúdo -> “trivializar os padrões formais” / descontextualização retórica -> “imitação vazia”) / desafios (estimular a criatividade para entender todo o processo do trabalho de pesquisa / reconhecer e tolerar o inevitável para evitar uma aplicação mecânica das técnicas de pesquisa)

... À ESTÉTICA (GUSTIN; DIAS) Necessidade de repensar a pesquisa jurídica - / nova concepção de pesquisa, de viés problematizador / busca de integração de ensino, pesquisa e extensão (“pesquisa-ação”) -> reflexos na escolha de temas e abordagens / dar “valor ao papel da metodologia e às formas de raciocínio e de argumentação na investigação do fenômeno jurídico” / considerar as vertentes metodológicas da pesquisa nas Ciências Sociais Aplicadas e condições e possibilidade de utilização no Direito / conhecer os elementos essenciais do desenvolvimento de pesquisas jurídicas

... À ESTÉTICA OLIVEIRA)

(OLIVEIRA;

ADEODATO

apud

“Manualismo” - “uso abusivo de manuais e de livros de doutrina” / “tendência a escrever (...) capítulos de manual, explicando redundantemente (...) o significado de princípios e conceitos que são como o bê-a-bá da disciplina” “Reverencialismo” - “argumento de autoridade” / “fórmulas do tipo ‘como preleciona fulano de tal’, ‘segundo o magistério de sicrano’ etc.” / “é preciso que os juristas se convençam de que, ao escreverem um trabalho, não podem tratar suas hipóteses de trabalho como se estivessem defendendo causas”

... À ESTÉTICA OLIVEIRA)

(OLIVEIRA;

ADEODATO

apud

“Falta de tempo” - no Direito, é comum “dividir” o tempo entre a pesquisa acadêmica e outra(s) atividade(s) profissional(is) (“atividade docente”, “burocracia judiciária” etc.) “Ampliação exagerada de temas” - para outras áreas do saber, como Sociologia (no mais das vezes, “crítica social” sob o título de “visão sociológica”), História, Filosofia etc.

... À ESTÉTICA (OLIVEIRA; ADEODATO apud OLIVEIRA)

“Impureza” - “confusão epistemológica”, assim entendida a utilização de “um arsenal de métodos e técnicas de pesquisa que o jurista, que não foi preparado para isso, normalmente não possui” / “sincretismo metodológico” (como denuncia KELSEN apud OLIVEIRA) Habilidade para o Direito, inabilidade para outras áreas - “por razões imperiosamente práticas, a primeira tarefa do estudante de direito é conhecer o ordenamento dentro do qual vai trabalhar” / “o jurista (...), por mais que esteja imbuído de boas intenções, não pode pretender, de uma hora para outra, escrever capítulos de história ou sociologia que mereçam o reconhecimento de sociólogos e historiadores. Falta-lhes (...) traquejo para tanto”

... À ESTÉTICA OLIVEIRA)

(OLIVEIRA;

ADEODATO

apud

“Europeocentrismo” - “visão retrospectiva segundo a qual é ‘a partir do direito moderno e ocidental que são apreciadas as instituições jurídicas de outros sistemas (...) instituições muito afastadas no tempo como sendo antepassados de instituições actuais’” (MIAILLE apud OLIVEIRA) “Evolucionismo” - “linha (...) onde as normas e valores do presente já existem em embrião no passado mais longínquo”, a exemplo do “retorno” ao Código de Hamurábi / o jurista “adota um viés evolucionista sem consciência do está fazendo” / “cumprimento de um simples ritual” (MIAILLE apud OLIVEIRA)

... À ESTÉTICA OLIVEIRA)

(OLIVEIRA;

ADEODATO

apud

“Universalimo a-histórico” - “visão da história segundo a qual as ideias ‘se destacam pouco a pouco do contexto geográfico e histórico no qual foram efetivamente produzidas e constituem um conjunto de noções universalmente válidas (universalismo) sem intervenção de uma história verdadeira’” (MIAILLE apud OLIVEIRA)

REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, Manoela. “UnB cassa diploma de doutora por plágio”. Metrópoles, Educação, 8 set. 2015. Disponível em: < http://www.metropoles.com/distrito-federal/educacao-df/unbcassa-diploma-de-doutora-por-plagio>. Acesso em: 10 out. 2016. BOOTH, Wayne C.; COLOMB, Gregory G.; WILLIAMS, Joseph M. (2000). A Arte da Pesquisa. Trad. Henrique A. Rego Monteiro. São Paulo: Martins Fontes.

BORGES, José Souto Maior (2000). Ciência Feliz. 2. ed. São Paulo: Max Limonad.

REFERÊNCIAS BOURDIEU, Pierre (2012). O Poder Simbólico. 16. ed. Trad. Fernando Tomaz. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.

DWORKIN, Ronald (2006). “Elogio à Teoria”. Revista Brasileira de Estudos Jurídicos - Faculdades Santo Agostinho, vol. 1, n. 1, jul./dez. 2006. Montes Claros: Editora da Fundação Santo Agostinho. Mimeo. In: DWORKIN, Ronald (2010). A Justiça de Toga. São Paulo: Martins Fontes, p. 71 e ss. ECO, Umberto. Como se Faz uma Tese (2008). Trad. Gilson Cesar Cardoso de Souza. 21. ed. São Paulo: Perspectiva.

REFERÊNCIAS ECO, Umberto (2005). Interpretação e Superinterpretação. 2. ed. Rev. Monica Stahel. São Paulo: Martins Fontes.

FERRAZ JR., Tercio Sampaio (2003). Introdução ao Estudo do Direito: técnica, decisão, dominação. 4. ed. São Paulo: Atlas. GADAMER, Hans-Georg (2001). Elogio da Teoria. Trad. João Tiago Proença. Lisboa: Edições 70.

GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; DIAS, Maria Tereza Fonseca (2006). (Re)Pensando a Pesquisa Jurídica: teoria e prática. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey.

REFERÊNCIAS MIAILLE, Michel (2005). Introdução Crítica ao Direito. Trad. Ana Prata. 3. ed. Lisboa: Editorial Estampa.

OLIVEIRA, Luciano (2004). “Não fale do Código de Hamurábi! A pesquisa sociojurídica na pós-graduação em Direito”. In: IDEM. Sua Excelência o Comissário e Outros Ensaios de Sociologia Jurídica. Rio de Janeiro: Letra Legal.

REFERÊNCIAS OLIVEIRA, Marcelo Cattoni de; REPOLÊS, Maria Fernanda Salcedo; PRATES, Francisco de Castilho (2016). “Liberdade acadêmica em tempos difíceis: diálogos Brasil e Estados Unidos”. Revista Eletrônica do Curso de Direito Universidade Federal de Santa Maria, v. 11, n. 2. Disponível em: . Acesso em: 10 out. 2016.

REFERÊNCIAS PINHEIRO-MACHADO, Rosana (2016). “Precisamos falar sobre a vaidade acadêmica”. Carta Capital, Sociedade, 24 fev. 2016. Disponível em: < http://www.cartacapital.com.br/sociedade/precisamos-falarsobre-a-vaidade-na-vida-academica >. Acesso em: 10 out. 2016. POPPER, Karl (s/d). “Tolerancia y responsabilidad intelectual”. Conferência. Tünbingen, 26 maio 1981; Viena, 16 mar. 1982. Disponível em: . Acesso em: 10 out. 2016.

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