ASPECTOS JURÍDICOS DO CHAMADO \"BUG DO MILÊNIO\" - Desmistificando a catástrofe

August 31, 2017 | Autor: Frederico Favacho | Categoria: Direito Eletrônico, Direito Civil
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ASPECTOS JURÍDICOS DO CHAMADO "BUG DO MILÊNIO" - Desmistificando a
catástrofe

Por Frederico Favacho


O QUE É O CHAMADO "BUG DO MILÊNIO"?

Bug, ou inseto em inglês, é uma expressão adotada pelos profissionais de
processamento de dados para designar um erro de processamento que poderia
ter sido corrigido se o programador o tivesse notado. Trata-se, assim, de
um lapso na programação. A expressão foi adotada também para designar o
problema do ano 2000, ou seja, a incapacidade dos programas reconhecerem os
anos representados por dois dígitos, a partir do ano 2000, interpretando-os
como anos compreendidos entre 1900 e 1999 gerando inconsistências. Por
conta deste problema muitas previsões catastróficas já foram feitas e
suspeita-se que um grande número de ações de indenização por perdas e danos
serão propostas. Destarte, é preciso que se faça uma análise jurídica do
bug do milênio e suas conseqüências.


O problema do ano 2000

Quando apareceram os primeiros processadores aritméticos que permitiram a
criação das máquinas de calcular e dos computadores, um dos componentes
mais caros era a memória onde as informações ficavam armazenadas temporária
ou definitivamente. Para se avaliar a evolução dos custos, é bom lembrar
que, no início da década de 60, um megabyte de memória em disco custava
cerca de US$10 mil por ano, enquanto atualmente não passa de US$0,10. Isto
gerou, à época, a necessidade de representar as informações da forma mais
compacta possível, de moro a economizar espaço em memória e nos discos.

O exemplo de economia mais comum é o da representação de datas, cujos
campos relativos ao ano utilizavam apenas dois algarismos. Em outras
palavras, em vez de armazenar 01/01/1960, se armazenava 01/01/60,
economizando-se, assim, dois algarismos. Os cálculos envolvendo datas não
eram afetados, pois a diferença entre 1960 e 1955 é exatamente igual a 60-
55, ou seja, 5 anos.

Com o passar do tempo, contudo, alguns técnicos perceberam que, no ano de
2000, representado por 00, a conta 2000-1999 não daria 1, mas sim, -99,
gerando resultados errados. A despeito disso, os mesmos técnicos
acreditavam que até a virada do milênio os programas então utilizados já
estariam obsoletos e não estariam mais sendo utilizados. Contudo, contra
aquelas expectativas, as novas linguagens de programação continuaram
adotando aquele sistema de representação de datas e aquele erro de
programação que se imaginava impossível de ocorrer agora faz parte da
realidade de todos. É o que se convencionou chamar de "problema do ano
2000", em inglês Y2K problem, de Year 2 Thousand (k significando mil como
em kbytes) ou bug do milênio.


O problema do ano bissexto

Outra faceta do bug do milênio é o fato dos programas não reconhecerem o
ano 2000 como ano bissexto, ou seja, não reconhecerem o dia 29 de
fevereiro.

Isto se dá porque quando o Papa Gregório criou o calendário gregoriano
estabeleceu a regra que, a cada quatro anos o mês de fevereiro teria um dia
a mais. Para que esta regra não fosse esquecida, estabeleceu-se que todo
ano divisível por quatro seriam anos bissextos, exceto aqueles que
terminassem em 00. Contudo, a cada milênio os calendários deveriam ser
ajustados novamente com a inclusão de um dia a mais em fevereiro. Assim, o
ano 2000, apesar da regra anterior, é bissexto também.

Ocorre que a maioria dos programadores esqueceram-se desta regra (este sim
um verdadeiro bug).


QUAL AS CONSEQÜÊNCIAS POSSÍVEIS EM RAZÃO DO "BUG DO MILÊNIO"

Todos os programas time-sensitives, ou seja, que envolvam a questão das
datas diretamente para o processamento dos dados e conseqüente
operacionalização, poderão, se não forem compliant, vale dizer, adequado
com o ano 2000, entender, na virada, que o ano é o de 1990 ou a data mais
próxima desta que aquele programa localize.

Tal imprecisão poderá acarretar erros no processamento de dados com
resultados enganosos nas operações

Eventualmente, em casos em que a data seja de alguma forma vital para
aquele programa, poderá haver um erro de lógica tal que impeça o programa
de rodar, inutilizando-o.

Todos os problemas com programas time-sensitives são superáveis sem
necessidade de grandes pirotecnias. O que torna inexecutável a solução de
alguns casos é a relação custo-benefício para o reparo dos programas non-
compliant.

O problema do ano 2000 não está limitado apenas aos programas, ou software,
mas também afeta o hardware, ou seja, os equipamentos. Basta que o
equipamento tenha um relógio interno e este relógio seja necessário para
alguma função. Evidentemente o problema poderá ser maior ou menor de acordo
com a importância que o relógio interno tenha no funcionamento do
esquipamento.

Nos microcomputadores, por exemplo, existe um programa interno do Hardware,
o BIOS que inicia as funções básicas do equipamento, que usa as informações
de data e hora, alimentadas pelo relógio interno da placa matriz. Por conta
disso, as placas não adaptadas para o ano 2000 poderão afetar o BIOS do
equipamento com eventual perda de função ou mesmo impossibilidade de seu
uso.

Resumidamente, não há limites objetivos para os efeitos do "bug do milênio"
sobre equipamentos e programas, dependendo, cada caso, da importância
assumida pela informação "data".

Para nossa análise, abordaremos duas situações bem definidas:

contratos envolvendo equipamentos non compliant;

prestação de serviços prejudicadas em razão do evento do ano 2000


QUAL A NATUREZA DO "BUG DO MILÊNIO"?


Vício ou defeito?

Os romanos distinguiam o defeito (morbus) como uma falha temporária e o
vício (vitium) como falha perpétua.

O Código Italiano de 1865 fazia a mesma distinção e o Código Civil Francês
também diferencia vícios e defeitos (vices e défauts) enquanto o nosso
Código Civil equipara-os para todos os fins.

Já o código de defesa do consumidor (Lei. 8078/90) estabelece no parágrafo
primeiro do artigo 12 que:

O produto é defeituoso quando não oferece segurança que dele legitimamente
se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre
as quais:
I - sua apresentação;
II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III. a época em que foi colocado em circulação
O parágrafo segundo do mesmo artigo complementa:

O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor
qualidade ter sido colocado no mercado
Em contrapartida, no artigo 18, o mesmo diploma legal estabelece que vícios
de qualidade ou quantidade são aqueles que os tornem impróprios ou
inadequados ao consumo a que se destinam ou lhe diminuam o valor, assim
como aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do
recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas
as variações decorrentes de sua natureza.

Assim, de acordo com a lição de Ada Pelegrini Grinover[1], vícios seriam
aqueles desvios de qualidade e/ou de quantidade cujos efeitos estariam
conscritos ao âmbito interno da coisa (in re ipsa) enquanto defeitos seriam
aqueles desvios que extrapolassem este âmbito. Em outras palavras, vícios
estariam ligados à questão da inadequação do bem aos fins a que se
destinaria enquanto defeitos seriam relativos á segurança do consumidor.

Assim, parece-nos que o bug do milênio, afastadas as previsões mais
alarmistas teria, eventualmente, a natureza de vício e não de defeito. A
seguir veremos com mais cuidado, portanto, a questão da caracterização do
vício do produto ou serviço.


O Vício Redibitório no Código Civil brasileiro

O vício redibitório, previsto no Código Civil brasileiro, é um defeito do
objeto, da coisa objeto de contrato comutativo, por muitos nominado de
vício objetivo, capazes de produzir uma incapacidade ou redução da
capacidade, relativamente ao uso para o qual estão destinados, ou então,
serem tais vícios aptos a torná-los menos valiosos.

O Código Civil regrou-o através de seus artigos 1.101 a 1.106 no LIVRO III
- Do Direito das Obrigações, TÍTULO IV - Dos Contratos, CAPÍTULO V - Dos
Vícios Redibitórios:

ART.1101 - A coisa recebida em virtude de contrato comutativo pode ser
enjeitada por vícios ou defeitos ocultos, que a tornem imprópria ao uso a
que é destinada ou lhe diminuam o valor.
Parágrafo único. É aplicável a disposição deste artigo às doações gravadas
de encargo.
ART.1102 - Salvo cláusula expressa no contrato, a ignorância de tais vícios
pelo alienante não o exime da responsabilidade (art.1103).
ART.1103 - Se o alienante conhecia o vício, ou o defeito, restituirá o que
recebeu com perdas e danos; se o não conhecia, tão-somente restituirá o
valor recebido, mais as despesas do contrato.
ART.1104 - A responsabilidade do alienante subsiste ainda que a coisa
pereça em poder do alienatário, se perecer por vício oculto, já existente
ao tempo da tradição.
ART.1105 - Em vez de rejeitar a coisa, redibindo o contrato (art.1101),
pode o adquirente reclamar abatimento no preço (art.178, § 2º e § 5º, IV).
ART.1106 - Se a coisa foi vendida em hasta pública, não cabe a ação
redibitória, nem a de pedir abatimento no preço.
O art.178 dispondo sobre os prazos de prescrição assim dispõe sobre as
ações edilícias:

Prescreve:
§ 2º Em 15 (quinze) dias, contados da tradição da coisa, a ação para haver
abatimento do preço da coisa móvel, recebida com vício redibitório, ou para
rescindir o contrato e reaver o preço pago, mais perdas e danos.
§ 5º Em 6 (seis) meses:
IV - a ação para haver o abatimento do preço da coisa imóvel, recebida
com vício redibitório, ou para rescindir o contrato comutativo, e haver o
preço pago, mais perdas e danos; contado o prazo da tradição da coisa;
Segundo Maria Helena Diniz[2]: "Os vícios redibitórios, portanto, são
defeitos ocultos existentes na coisa alienada, objeto de contrato
comutativo, não comuns às congêneres, que a tornam imprópria ao uso a que
se destina ou lhe diminuem sensivelmente o valor, de tal modo que o ato
negocial não se realizaria se esses defeitos fossem conhecidos, dando ao
adquirente ação para redibir o contrato ou para obter abatimento do preço."

Para Caio Mario da Silva Pereira[3]: "O adquirente, sujeito a uma
contraprestação, tem direito à utilidade natural da coisa e, se ela lhe
falta, precisa de estar garantido contra o alienante para a hipótese de lhe
ser entregue coisa a que faltem qualidades essenciais de prestabilidade,
independentemente de uma pesquisa de motivação".

Entre as várias teorias que explicam a natureza jurídica da
responsabilidade pelo vício redibitório Wasihngton Monteiro de Barros
admite como a mais convincente a teoria do inadimplemento: "Temos para nós
que a responsabilidade do contratante se funda na teoria do inadimplemento.
Ao celebrar o contato, compromete-se o alienante a garantir o perfeito
estado da coisa, assegurando-lhe a incolumidade, as qualidades anunciadas,
e a adequação aos fins propostos. Não pode ele fugir, portanto, à
responsabilidade contratual, se a coisa se apresenta com defeitos ou
imperfeições, que a tornam inapta aos seus fins, ou lhe diminuam o
valor"[4].

Para Silvio Rodrigues[5], e Otto de Souza Lima[6], os vícios redibitórios
não se confundem com inexecução contratual embora também dêem azo à uma
espécie de resolução do contrato, no caso, a redibição, uma vez que a
legislação subordina a regras diversas e a tratamentos diferentes o
inadimplemento contratual e a responsabilidade por vícios redibitórios,
dando a estes últimos ações edilícias (a ação de redibição e a quanti
minoris) de índole absolutamente distintas e submetidas a outras regras e
conseqüências. Anote-se, ainda que, se a entrega duma coisa viciada
envolvesse inexecução contratual, não se compreenderiam nem os efeitos das
ações edilicianas nem o estabelecimento de curto prazo para a sua
propositura. Com efeito, aqueles efeitos não seriam nem a redibição nem a
redução do preço, mas a indenização de perdas e danos, além de que não
existiria um prazo especial para ser proposta a ação (decadencial para a
grande maioria da doutrina) e sim o prazo prescricional de vinte anos. Por
último deve-se acrescentar-se que, enquanto as ações edilicianas existem só
pela circunstância objetiva da existência de um vício, a inexecução
contratual só gera responsabilidade quando haja falta do devedor
remisso[7].

A segunda teoria mais importante sobre a natureza jurídica do vício
redibitório afirma que a responsabilidade do alienante pelos defeitos
ocultos da coisa não passa de mera conseqüência da teoria do erro (cf.
Washington de Barros Monteiro, op. cit. Pág. 57) e foi consagrada pelo
artigo 1.582 do Código Civil português que assim dispõe:

"O contrato de compra e venda não poderá ser rescindido com o pretexto de
lesão ou de vício da coisa, denominados redibitórios, salvo se essa lesão
ou esses vícios envolverem erro que anule o consentimento nos termos
declarados nos arts. 656 a 668 e 687 a 701, ou havendo estipulação expressa
em contrário".
Para maiores informações sobre as teorias da natureza do vício redibitório,
recomendamos a leitura do livro Da responsabilidade por vício do produto e
do serviço, Odete Novais Carneiro Queiroz, Ed. RT, São Paulo, 1998.


Concluindo temos que, sob as disposições do Código Civil, o vício
redibitório é:


1. um defeito oculto, anterior à tradição do bem, grave capaz de produzir a
redução da sua utilidade ou mesmo sua total inutilidade, considerado o
fim para o qual este bem se destina ou, ainda, a redução do seu valor;


2. independente do conhecimento pelo alienante de sua existência;


3. considerado apenas nos contratos comutativos;


4. causa de pedir das ações edilícias, a ação de redibição e a quanti
minoris;


5. Causa de pedir de indenização por perdas e danos somente no caso de má-
fé do alienante;


6. prazo de prescrição (ou decadência) para a propositura das ações
edilicianas são extremamente curtos: 15 (quinze) dias, contados da
tradição da coisa, para haver abatimento do preço da coisa móvel,
recebida com vício redibitório, ou para rescindir o contrato e reaver o
preço pago, mais perdas e danos e 6 (seis) meses para haver o abatimento
do preço da coisa imóvel, recebida com vício redibitório, ou para
rescindir o contrato comutativo, e haver o preço pago, mais perdas e
danos; contado o prazo da tradição da coisa;


O vício do produto ou do serviço na regulamentação da Lei. 8.078 de 1990

Dispõe o Código de Defesa do Consumidor (LEI 8.078 DE 11/09/1990,
regulamentada pelo Decreto nº 2.181, de 20/03/1997) no TÍTULO I - Dos
Direitos do Consumidor, CAPÍTULO IV - Da Qualidade de Produtos e Serviços,
da Prevenção e da Reparação dos Danos, SEÇÃO III - Da Responsabilidade Por
Vício do Produto e do Serviço

ART.18 - Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis
respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os
tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes
diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as
indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem
publicitária, respeitadas os variações decorrentes de sua natureza, podendo
o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 6º São impróprios ao uso e consumo:
I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;
II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados,
falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos
ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação,
distribuição ou apresentação;
III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim
a que se destinam.
ART.20 - O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os
tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por
aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta
ou mensagem publicitária,
§ 2º São impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que
razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas
regulamentares de prestabilidade.
ART.26 - O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil
constatação caduca em:
I - 30 (trinta) dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produto
não duráveis;
II - 90 (noventa) dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de
produto duráveis.
§ 1º Inicia-se a contagem do prazo decadencial a partir da entrega
efetiva do produto ou do término da execução dos serviços.
§ 2º Obstam a decadência:
I - a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o
fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente,
que deve ser transmitida de forma inequívoca;
II - (Vetado).
III - a instauração de inquérito civil, até seu encerramento.
§ 3º Tratando-se de vício oculto, o prazo decadencial inicia-se no
momento em que ficar evidenciado o defeito.
Assim, de acordo com as disposições do CDC o vício do produto ou serviço:

1. não depende da existência de contrato comutativo, mas de simples relação
de consumo, podendo o consumidor reclamar, inclusive, com quem não
contratou diretamente em razão da responsabilidade solidária entre o
fabricante e o distribuidor;

2. não precisam ser graves bastando, inclusive sua disparidade com as
indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem
publicitária, respeitadas os variações decorrentes de sua natureza

3. Pode haver vício por impropriedade ou inadequação, incluindo-se aí a sua
desconformidade com as informações recebidas pelo consumidor. Se houver
omissão ou parcialidade na informação sobre quantidade, características,
composição, qualidade e preço, além dos riscos que o produto possa
apresentar, evidentemente que o consumidor estará diante de um produto ou
serviço viciado, pois não haverá, por essa razão, correspondência à sua
expectativa, criada pelas informações que lhe foram passadas pelo
fornecedor;

4. incluem-se os vícios de quantidade (que no código civil limitava-se, nos
termos do artigo 1.136 do CC, aos contratos de compra e venda de imóvel
que apresentassem metragem inferior à equivalente ao preço contratado,
dando azo à actio empto;

5. também não mais se restringiu a tutela aos casos de vícios ocultos. Os
aparentes foram abrangidos pela proteção legal, como se observa do
disposto no art. 26 do CDC que, determinando um prazo para que seja
exercido o direito de reclamar, faz distinção, estabelecendo para os
vícios aparentes um termo a quo - a contar da entrega efetiva do produto
ou do término da execução do serviço e outro termo a quo para caso de
vício oculto, devendo ser contado a partir do momento em que se
evidenciar tal desconformidade.

6. Os prazos para reclamar pelos vícios ocultos são maiores que os prazos
previstos pelo CC e podem ser suspensos pela simples reclamação ou pela
instauração de inquérito pelo Ministério Público.

7. Sempre se poderá cumular com as ações redibitória e quanti minoris os
pedidos de indenização por danos morais e, inclusive cumulativamente,
danos patrimoniais, a teor do artigo 6º, VI do CDC, independentemente da
má-fé do alienante ou prestador do serviço.

8. Finalmente, de acordo com o disposto no art. 83, o consumidor poderá
lançar mão, para a defesa dos direitos e interesses protegidos por este
código, de todas as espécies de ações capazes para propiciar sua adequada
e efetiva tutela.


A natureza do "bug" do milênio

Dado que o chamado "Bug do milênio" como vimos, há muito tempo é do
conhecimento dos fabricantes de hardware e criadores de software,
inegavelmente estes não poderão negar o conhecimento prévio daquele
problema.

Da mesma forma, nos parece que, dada a atenção despertada pela mídia nos
últimos dois anos, pelo menos, dificilmente o consumidor mediano destes
insumos poderá alegar o desconhecimento do problema. Com isso concluímos
que dificilmente se configurará como vício redibitório do código civil o
evento dos efeitos do ano 2000 sobre os mesmos insumos.

Parece-nos que, coerentemente, a maneira mais acertada para afastar a
responsabilidade por vício redibitório, nestes casos, é a ampla informação
pelo alienante dos produtos, dos eventuais problemas que possa surgir se o
seu produto não esta devidamente adaptado ao evento do ano 2000.

Se a solução nos parece simples sob o manto das normas do Código Civil,
outra é a realidade para os contratos protegidos pelo Código de Defesa do
Consumidor.

Inevitavelmente, a única solução nestes casos, em que a responsabilidade do
fornecedor é objetiva e solidária, é a descaracterização do vício. Para
isso é necessário demonstrar-se que não há comprometimento da utilidade
normal e esperada do produto ou do serviço ou diminuição do seu valor.


RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO - Responsabilidade
Contratual


Sob a égide do Código Civil

Como vimos, pelo Código Civil a responsabilidade do alienante pelo vício
redibitório limitado ao vício oculto, de natureza grave, em contratos
comutativos, resolve-se na redibição do contrato ou ao abatimento do preço
contratado, salvo na hipótese de prévio conhecimento do vício pelo
alienante, o que configura, para os fins do CC, má-fé, hipótese em que o
alienante responde, também, por perdas e danos.


Sob a égide do Código de Defesa do Consumidor

Imediatamente, a questão que se nos coloca é a de definir a abrangência do
Código de Defesa do Consumidor. De fato é a definição de consumidor que
estabelecerá a dimensão da comunidade ou grupo a ser tutelado e, por esta
via, os limites da aplicabilidade do Direito especial. Conceituar
consumidor, em resumo, é analisar o sujeito da relação jurídica de consumo
tutelada pelo Direito do Consumidor[8]. Todavia não é fácil conceituar
precisamente o conceito de consumidor, mesmo partindo-se do artigo 2º do
CDC. A sua conceituação, certamente, constitui uma árdua tarefa, pois, ao
final 'consumidores somos todos nós'. Contudo, não podemos, para a ciência
jurídica pretender tão ampla generalização[9]. Afiliaremo-nos, destarte,
aqueles que entendem que consumidor é todo aquele que adquire, utiliza ou
frui produtos ou serviços para seu próprio uso, e que lhe são colocados à
disposição por pessoa que exerça uma atividade econômica, dando ao conceito
uma interpretação teleológica

Para que o adquirente de um produto ou utilizador de um serviço seja
considerado como consumidor há a necessidade de que dê uma destinação
privada a eles, sendo suas utilidades fruídas pelo consumidor. À evidência,
se o destino dado ao produto ou serviço for a sua integração à vida
profissional do suposto consumidor, sendo de relevância como verdadeiro
instrumento de trabalho seu, permitindo-lhe fruição de lucros com o seu
uso, já se apartaria dessa idéia, não ensejando a formação da relação de
consumo objeto da tutela deste Código[10]. Em outras palavras "se a
aquisição foi apenas meio para que o adquirente possa exercer outra
atividade, não terá adquirido como destinatário final e, conseqüentemente
não terá havido relação de consumo"[11].

Vale dizer, a relação contratual entre um fornecedor e um destinatário
final será regida pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor, a
relação entre um não-fornecedor e um destinatário final ou não, será regida
pelas regras do Código Civil e, finalmente, a relação entre um fornecedor e
um destinatário não final será regido pelas normas de direito comercial.

Vencida esta etapa de contextualização da abrangência da legislação
protetiva das relações de consumo, passemos a analisar a questão do vício
do produto ou serviço sob a sua égide.

O CDC assim dispõe sobre a matéria:
Art. 18...
§ 1º Não sendo o vício sanado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o
consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas
condições de uso;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem
prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 2º Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo
previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a 7 (sete) nem
superior a 180 (cento e oitenta) dias. Nos contratos de adesão, a cláusula
de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação
expressa do consumidor.
§ 3º O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1º deste
artigo, sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das
partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do
produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.
§ 4º Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1º deste
artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver
substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante
complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo
do disposto nos incisos II e III do § 1º deste artigo.
§ 5º No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável
perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado
claramente seu produtor.
ART.20 - O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os
tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por
aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta
ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à
sua escolha:
I - a reexecução dos serviços, sem custo adicional e quando cabível;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem
prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 1º A reexecução dos serviços poderá ser confiada a terceiros devidamente
capacitados, por conta e risco do fornecedor.
ART.21 - No fornecimento de serviços que tenham por objetivo a reparação de
qualquer produto considerar-se-á implícita a obrigação do fornecedor de
empregar componentes de reposição originais adequados e novos, ou que
mantenham as especificações técnicas do fabricante, salvo, quanto a estes
últimos, autorização em contrário do consumidor.
ART.24 - A garantia legal de adequação do produto ou serviço independe de
termo expresso, vedada a exoneração contratual do fornecedor.
ART.25 - É vedada a estipulação contratual de cláusula que impossibilite,
exonere ou atenue a obrigação de indenizar prevista nesta e nas Seções
anteriores.
§ 1º Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos
responderão solidariamente pela reparação prevista nesta e nas Seções
anteriores.
§ 2º Sendo o dano causado por componente ou peça incorporada ao produto
ou serviço, são responsáveis solidários seu fabricante, construtor ou
importador e o que realizou a incorporação.


Destaque-se, desde logo, as características da responsabilidade por vício
do produto ou serviço no CDC, a saber:

1. Solidariedade entre todos os participantes da cadeia econômica anterior
ao momento da relação de consumo;

2. Prescindibilidade do elemento culpa, o que faz supor que o legislador
estabeleceu nova hipótese de responsabilidade civil objetiva;

3. Possibilidade de o consumidor exigir que o vício seja sanado, no prazo
especificado pela lei ou estipulado pelas partes (dentro do limite
legal).

Portanto, é inegável que os limites da responsabilização do fornecedor de
produto ou serviço, sob o microssistema legal do Código de Defesa do
Consumidor são muito maiores e abrangentes do que aqueles que vigem no
Código Civil.

Aqui merece destaque a Portaria nº 212 do Ministério da Justiça, de 14/5/99
que determina ao DPDC - Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor da
Secretaria de Direito Econômico que promova todos os atos urgentes e
necessários à fiel observância das normas de proteção e defesa do
consumidor, inclusive solicitando o concurso dos órgãos e entidades da
União, dos Estados, do Distrito federal e dos Municípios, frente a
ocorrência de perda do parâmetro cronológico, denominado "efeito 2000",
induzindo defeitos e vícios em produtos e serviços.

A Portaria 212/99 também determina ao DPDC a adoção de medidas de
coordenação de ações do Sistema nacional de Defesa do Consumidor, de modo a
garantir os direito do consumidor previstos na legislação, especialmente
adotando as seguintes providências:

I - alertar a coletividade, com amparo na Lei de proteção e Defesa do
Consumidor, da situação que se vislumbra, para os produtos e serviços que
contenham "chips", sistemas informatizados e equipamentos, computadores,
equipamentos médicos, telefones, sistemas eletrônicos dos meios de
transportes, como veículos automotores, navios, aeronaves, sistemas de
telecomunicações, energia elétrica, segurança, produção e distribuição de
alimentos, controles de processos, dentre outros, capaz de apresentar
defeitos e de acarretar riscos à saúde ou á segurança dos consumidores;

II - identificar a responsabilidade do fabricante, do produtor, do
consultor, nacional ou estrangeiro, do importador, do comerciante e do
fornecedor de produtos e serviços, na forma da Lei, pela reparação de danos
causados ao consumidor por defeitos e por vícios, inclusive ocultos, a que
se refere o item I acima;

III - informar, à luz da Lei 8.078, aos fornecedores de produtos e
serviços, alcançados pelo item I acima, que a partir de 17 de maio de 1999
devem fazer constar do Termo de Garantia ou equivalente, nas embalagens ou
Manual de Instrução, de forma clara e precisa que os produtos e serviços
estão adequados para o uso no ano 2000 e subseqüentes, ou o prazo, a forma
e o lugar para adequá-los, desonerado de custos o consumidor.

A portaria 212/99 esclarece, ainda, que cabe ao fornecedor, às suas
expensas, comunicar aos consumidores dos riscos à saúde e segurança,
defeitos e restrições para o uso de produtos e serviços a partir do ano
2000.

Ao final, informando que suas disposições aplicam-se retroativamente a
contratos firmados após 1º de janeiro de 1995 parece estabelecer um prazo
prescricional de 5 anos para reclamações referentes ao "bug do milênio".

O Despacho do Diretor do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor,
de nº 21, datado de 21 de maio de 1999, em resposta à Portaria retro
mencionada, com o objetivo de alertar toda a coletividade, com base no CDC,
sobre o "bug do milênio" trás algumas notas interessantes à observação do
interessado na matéria, especialmente quanto aos critérios que deverão ser
levados em consideração para a caracterização da responsabilidade do
fornecedor do produto e serviços.

O despacho, convocando o concurso do ministério público, reforça a
orientação aos Órgão Públicos integrantes do Sistema Nacional de Defesa do
Consumidor, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, para que
promovam ações preventivas, urgentes, conscientizando toda a população, por
meio de divulgação ampla, com informações sobre os possíveis efeitos do
"Bug" e sobre a necessidade de medidas concretas para evitá-los. De igual
modo, lembra que ficam os órgão legitimados na defesa do consumidor
incumbidos de orientar a classe consumerista sobre os meios de proteção de
que dispõem, e o campo de ação em que devem atuar, principalmente sobre a
necessidade de que passem a exigir que se faça consignar no termo de
Garantia ou equivalente, nas embalagens ou Manual de Instrução, de forma
clara e precisa que estes estão adequados para uso no ano 2000 e
subseqüentes, ou o prazo, a forma e o lugar para adequá-los, desonerado de
custos o consumidor, garantindo a busca de direitos não desmerecendo as
formas de comercialização já havidas cuja proteção a norma agasalhe.

Finaliza dizendo que, assim, ciente e consientes do defeito ou vício oculto
no equipamento fornecido, os responsáveis poderão responder, na forma da
Lei, caso permaneçam inertes e em silêncio quanto à divulgação dos
problemas que venham a ser encontrados nos equipamentos.


Das garantias aos usuários de programa de computador

Aqui merece uma rápida menção o artigo 8º da Lei 9.609 de 19.02.98, a qual
dispõe sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de
computador, sua comercialização no País e dá outras providências.

O Artigo 8º tem a seguinte redação:

Aquele que comercializar programa de computador, quer seja titular dos
direitos do programa, quer seja titular dos direitos de comercialização,
fica obrigado, no território nacional, durante o prazo de validade técnica
da respectiva versão, a assegurar aos respectivos usuários a prestação de
serviços técnicos complementares relativos ao adequado funcionamento do
programa, consideradas as suas especificações.
Parágrafo único. A obrigação persistirá no caso de retirada de circulação
comercial do programa de computador durante o prazo de validade, salvo
justa indenização de eventuais prejuízos causados a terceiros.

DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL


Requisitos da responsabilidade civil aquiliana

Não há novidade nessa área.

A responsabilidade civil aquiliana forma-se a partir da existência
concomitante dos seguintes requisitos: comportamento ilícito do ofensor,
danos perpetrados ao ofendido e nexo de causalidade entre o primeiro e o
segundo. É a regra que extraímos do artigo 159 do Código Civil.

Desta forma, independentemente do fato do vício do produto ou do serviço,
abre-se a possibilidade de demanda por indenização de danos materiais e
morais, direta ou indiretamente em razão do evento do ano 2000,
fundamentado na responsabilidade civil por ilícito, tornando inútil a
discussão da natureza jurídica do "bug do milênio".

A questão que se coloca na responsabilidade civil por ato ilícito é a
incidência de excludentes de responsabilidade tais como caso fortuito,
força maior, culpa exclusiva de terceiros ou da própria vítima.

Especialmente a culpa exclusiva de terceiros e a culpa exclusiva da própria
vítima nos chama atenção.

De fato, hoje muitas operações são interligadas eletronicamente, com a
transferência de dados magneticamente.

Some-se a isso o fato a grande gama de hardware e software oferecidos no
mercado e podemos imaginar que poderemos ter a seguinte situação:

A empresa A disponibiliza a todos os seus clientes o seu sistema
operacional através de link telefônico. Através desse sistema faz-se troca
de informações ou alimenta-se diretamente algum importante banco de dados.
Independentemente do sistema da empresa A estar compliant com o ano 2000,
assim como todos os seus equipamentos, poderá ocorrer de todos ou alguns de
seus clientes não estarem complaint ou, ainda, a empresa de
telecomunicações estar em desacordo com as normas técnicas que definem a
compliance com o ano 2000 (e existem várias, cada uma editada por um órgão
técnico tal como o Information Technology Association of America (ITAA) e o
Institute of Eletrical and Eletronic Engineers (IEEE). Nestas hipóteses
poderá haver perda de dados em razão de estranhamento na interface entre os
equipamentos ou na leitura dos dados transmitidos.

Embora, no exemplo fique claro a culpa exclusiva de terceiro ou mesmo da
própria vítima (os clientes da empresa), na prática ficará a cargo de
perícia técnica minuciosa determinar a fonte do erro e, conseqüentemente,
do dano.


DA ADEQUAÇÃO DOS SISTEMAS ELETRÔNICOS DE INFORMAÇÕES AUTOMATIZADOS DAS
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS

A grande preocupação com o "Bug" do milênio, no Brasil, está concentrado no
sistema financeiro, de longe o setor mais informatizado.

Por conta disso o Banco Central do Brasil e o Conselho Monetário Nacional
determinaram, através da Resolução nº 2453, que as instituições
financeiras, as demais instituições autorizadas a funcional pelo Banco
Central do Brasil e as administradoras de consórcio providenciassem, até
31.12.98, a adequação de seus sistemas de informação eletrônicos
automatizados.

A Resolução determinava, ainda, que aquelas instituições deveriam abordar,
em tópico específico do relatório de administração de publicação semestral,
as medidas adotadas para o ajustamento de seus sistemas e o andamento dos
trabalhos correspondentes, bem como a obrigação de, nos relatórios de
auditoria de dezembro de 1997, junho de 1998 e dezembro de 1998, elaborados
na forma da Resolução 2.267, de 29.3.96 e da Circular 2.676, de 10.4.96,
auditor independente deveria, adicionalmente, emitir parecer sobre o
andamento daqueles trabalhos de adequação.

A Circular 2803, de 04.2.98 e a Circular 2806, de 18.2.98, ambas do Banco
Central, estabeleceram procedimentos complementares com vistas a adequação
dos sistemas de informação das instituições financeiras ao processamento de
datas posteriores ao ano de 1999.

As Cartas-Circulares 2792, 2805 e 2818, de 18/3, 16/7 e 9/10 de 98,
respectivamente, instituíram um questionário que deveria ser respondido
pelas instituições financeiras para o acompanhamento da adequação daqueles
sistemas eletrônicos.

Finalmente, as seguradoras também foram contempladas com a Circular SUSEP
034, de 29.4.98 que estabeleceu procedimentos complementares com vistas à
adequação dos seus sistemas eletrônicos de informação ao processamento de
datas posteriores ao ano de 1999.

A despeito da existência destas normas específicas, o setor já estava
investindo pesado na adequação para o ano 2000. Tanto é assim que em teste
que coordenado pela Febraban e que contou com a participação do Banco
Central, da Tecban (administradora dos caixas eletrônicos 24 horas), da
Credicard, da Central de Liquidação e Custódia de Títulos privados (Cetip),
da Associação Nacional dos Bancos de Investimentos (Andid) e ainda da
Câmara de Compensação do Banco do Brasil, que juntos representam mais de
80% dos ativos bancários brasileiros, realizados entre 22 e 31 de março,
não houve nenhuma ocorrência de interrupção do processamento das
transações[12].


CONCLUSÃO

Assim, ao contrário das previsões mais catastróficas e alarmistas, o que se
configura é uma situação de pouco risco de danos em razão do "evento 2000".

Todavia, são esperadas muitas demandas judiciais, principalmente aquelas de
caráter eminentemente especulativo, estimuladas, inclusive, em grande parte
pela ação movida por um grande time de São Paulo contra a empresa de
telecomunicações responsável pelo sistema de PABX do clube. Na referida
ação, em que se requeria a adequação do sistema telefônico sem ônus para o
Clube, houve acordo, afastando a análise do mérito da questão da existência
ou não do vício e a conseqüente responsabilização do fornecedor.

A maior arma das empresas que tenham investido na adequação de seus
sistemas e produtos, contra as demandas especulativas é a informação
abundante e transparente ao seu cliente e a documentação de todos os
procedimentos adotados para aquela adequação.


JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA

Superior Tribunal de Justiça - REsp 114473/RJ (9600744920) - decisão: por
unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento - data da decisão:
24/03/1997 - órgão julgador: quarta turma - relator: ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira
e m e n t a
Direito do consumidor. Ação de preceito cominatório. Substituição de
mobiliário entregue com defeito. vicio aparente. Bem durável. Ocorrência de
decadência. Prazo de noventa dias. Art. 26, II., da lei 8.078/1990.
Doutrina. Precedente da turma. Recurso provido.
I - Existindo vício aparente, de fácil constatação no produto, não ha que
se falar em prescrição qüinqüenal, mas, sim, em decadência do direito do
consumidor de reclamar pela desconformidade do pactuado, incidindo o art.
26 do código de defesa do consumidor.
II. - O art. 27 do mesmo diploma legal cuida somente das hipóteses em que
estão presentes vícios de qualidade do produto por insegurança, ou seja,
casos em que produto traz um vicio intrínseco que potencializa um acidente
de consumo, sujeitando-se o consumidor a um perigo iminente.
III - Entende-se por produtos não-duráveis aqueles que se exaurem no
primeiro uso ou logo após sua aquisição, enquanto que os duráveis,
definidos por exclusão, seriam aqueles de vida útil não-efêmera.


Superior Tribunal de Justiça - acórdão: REsp 100710/SP (9600431183) -
decisão: por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento - data
da decisão: 25/11/1996 - órgão julgador: quarta turma relator: ministro Ruy
Rosado de Aguiar
e m e n t a
Código de defesa do consumidor. Responsabilidade pelo fato do produto.
Prescrição. A ação de indenização por fato do produto prescreve em cinco
anos (arts. 12 e 27 do CDC), não se aplicando a hipótese as disposições
sobre vicio do produto (arts. 18, 20 e 26 do CDC). Recurso conhecido e
provido.
Superior Tribunal de Justiça - acórdão: REsp 4968/PR (9000089468) -
decisão: por unanimidade, não conhecer do recurso - data da decisão:
14/05/1991 - órgão julgador: quarta turma - relator: ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira
e m e n t a
Direito civil. compra e venda. vicio redibitório em uma das peças. Exegese
dos artigos. 1101, 1102, 1104 e 1138 do código civil. Incidência do ultimo.
defesa do consumidor. Recurso não conhecido.
I - Para a defesa do seu direito, a lei confere, ao adquirente da coisa
portadora de vicio redibitório ações para rejeitar aquela, redibindo o
contrato, ou para reclamar abatimento do preço.
II. - Em se tratando de aquisição de peças em conjunto, não optando pelo
abatimento do preço e nem aceitando a substituição da coisa danificada por
outra idêntica, sujeita-se o consumidor a norma do art. 1138 do código
civil, segundo a qual ''o defeito oculto de uma não autoriza a rejeição de
todas''.
III - A defesa do consumidor, hoje elevada a patamar constitucional, deve
merecer do julgador exegese sistêmica, pena de ofensa ao ordenamento
jurídico.

Prescrição - Inocorrência - Venda de veículo - Bem durável e de vício
oculto - Prazo que caduca em 90 dias ou a contar do momento em que foram
verificados os defeitos - Representante da fornecedora, ademais, que
afirmou garantir os veículos vendidos por 60 dias - Recurso parcialmente
provido para outro fim.
(Tribunal de Justiça de São Paulo - relator: Cunha Cintra - apelação cível
n. 216.144-1 - São Paulo - 29.09.94)

Decadência - Inocorrência - Ação objetivando substituição de bem adquirido
contendo vício oculto - Contagem a partir do momento em que ficar
evidenciado o defeito - Inteligência do § 3º do artigo 26 da lei n.
8.078/90 - Recurso não provido.
(Tribunal de Justiça de São Paulo - agravo de instrumento n. 238.874-1 -
São Paulo - relator: Orlando Pistoresi - CCIV 4 - V. u. - 22.12.94)

Indenização - Perdas e danos - Comprovação dos fatos alegados na inicial,
em cumprimento ao disposto no artigo 333, i, do código de processo civil -
Prazo decadencial, no caso, de 90 dias, a teor do artigo 26, § 3º, da lei
n. 8.078/90, a partir da data em que evidenciado o defeito, antes oculto,
para a devida reclamação - Prova pericial, esclarecendo que o veículo não
foi climatizado para as condições nacionais, pelo que bem reconhecida a
culpa da ré pelos prejuízos sofridos pelo autor - Indenização devida -
Apelação não
provida.
(Tribunal de Justiça de São Paulo - apelação cível n. 13.461-4 - São Paulo
- 8ª câmara de férias "b" de direito privado - relator: Antonio Manssur -
18.09.96 - v. u.)
Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo - processo: 00385982-2/00 -
descrição: apelação cível - origem: São Paulo - órgão: 2 a. câmara -
julgamento: 20/04/1988 - relator: Jacobina Rabello - decisão: unanime -
publicação: MF 114/35
e m e n t a
Compra e venda - Computador e acessórios - Pretensão do comprador a
rescisão ao fundamento de que o aparelho não satisfazia as suas
necessidades - Inexecução ou defeito oculto não comprovado - Desacolhimento
- Recurso desprovido, alterado o dispositivo de improcedência para
carência.
Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo - processo: 00392957-0/00 -
descrição: apelação cível - origem: Campinas - órgão: 4 a. câmara -
julgamento: 03/08/1988 - relator: rel. Amauri Ielo - decisão: unanime -
publicação: jta 114/24
e m e n t a
Vicio redibitório - Conceito - Distinção do erro essencial - Necessidade da
existência de defeito grave, oculto e imputável ao alienante do bem -
Configuração que gera resolução do contrato, não a anulação do ato jurídico
- Anulatória improcedente - Sentença mantida.
No mesmo sentido: ac 424.237-7 - rel. Walter Guilherme - mf 614/131
Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo - processo: 00429028-3/00 -
proc. princ.: 8 - descrição: apelação cível - origem: Guarujá - órgão: 7 a.
câmara - julgamento: 08/11/1990 - relator: rel. Silvio Venosa - decisão:
unanime - publicação: mf 634/88
e m e n t a
Responsabilidade civil - Compra e venda - Bem móvel (embarcação) - Alegação
de vicio oculto após dois anos de uso - Descabimento uma vez decorrido o
prazo legal para reclamação - Decadência configurada - Indenizatória
improcedente - Recurso desprovido.
no mesmo sentido: ac 433.096-5 - rel. Alberto Tedesco - mf 1023/174
Tribunal de Justiça do Paraná - acórdão: 11707 - descrição: apelação cível
- relator: des. Oto Sponholz - comarca: Maringá - 4ª vara cível - órgão
julgador: primeira câmara cível - publicação: 18/09/1995 -
Decisão: acordam os desembargadores do tribunal de justiça do estado do
Paraná, aglutinados em sua primeira câmara cível, por unanimidade de votos,
em negar provimento a apelação.
Indenizatória - Serviços prestados que não atendem as normas de qualidade -
Risco aos usuários - Defeitos ocultos - Vícios redibitórios - Prazo
decadencial repelido - Procedência da ação - Apelação desprovida.
(1)- Já se decidiu por inúmeras vezes inclusive no supremo tribunal
federal, que o termo inicial do prazo para ação não será sempre o da
tradição, mas o da experimentação, da transmissão, ou revelação do vicio,
quando efetivamente houve a impossibilidade do conhecimento do defeito
oculto dentro do exíguo prazo legal. se o fabricante ou o vendedor deu
garantia, e a partir do termino desta que começara a fluir o prazo para
intentar ação.
(2)- Restando comprovado que o trabalho não atendeu os padrões normais de
qualidade, contendo vícios incógnitos que, quando constatados, tornaram a
coisa tão imprópria ao uso de forma a colocar em risco os usuários,
legitima a pretensão econômica reparatória. apelação desprovida. decisão:
unanime
ÍNDICE ANALÍTICO

O QUE É O CHAMADO "BUG DO MILÊNIO"? 1

O problema do ano 2000 1

O problema do ano bissexto 2

QUAL AS CONSEQÜÊNCIAS POSSÍVEIS EM RAZÃO DO "BUG DO MILÊNIO" 2

QUAL A NATUREZA DO "BUG DO MILÊNIO"? 3

Vício ou defeito? 3

O Vício Redibitório no Código Civil brasileiro 4

O vício do produto ou do serviço na regulamentação da
Lei. 8.078 de 1990 8

A natureza do "bug" do milênio 10

RESPONSABILIDADE PELO VÍCIO DO PRODUTO OU DO SERVIÇO - Responsabilidade
Contratual 11

Sob a égide do Código Civil 11

Sob a égide do Código de Defesa do Consumidor 11

Das garantias aos usuários de programa de computador
16

DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL 16

Requisitos da responsabilidade civil aquiliana 16

DA ADEQUAÇÃO DOS SISTEMAS ELETRÔNICOS DE INFORMAÇÕES AUTOMATIZADOS DAS
INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS 18

CONCLUSÃO 19

JURISPRUDÊNCIA SELECIONADA 19



Frederico Favacho é advogado do Banco Itaú S.A., mestrando em Filosofia do
Direito e professor assistente na cadeira de Direito Civil na Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo

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[1] Código Brasileiro de defesa do Consumidor, Rio de Janeiro, Forense
Universitária, 1991, pág. 12
[2](Tratado teórico e prático dos contratos, São Paulo, Saraiva, 1993, vol.
I, p. 115
[3]Instituições de direito civil, 10ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1995,
vol. III, pág. 75
[4] Curso de Direito Civil - Direito das obrigações, 2ª parte, 11ª ed., São
Paulo, Saraiva, 1976, pág. 54
[5] Direito Civil, 14ªed., São Paulo, Saraiva, 1985, vol. III, pág. 112
[6] Teoria dos vícios redibitórios, São Paulo, ed. RT, 1965
[7] cf. PIRES DA CRUZ, Emidio apud Otto de Souza Lima
[8] cf. BENJAMIN, Antonio Herman Vasconcelos O conceito jurídico de
consumidor, RT 628/67
[9] cf. DONATO, Maria Antonieta Zanardo Proteção ao consumidor - Conceito e
extensão, São Paulo, Ed. RT, 1994, pág. 254
[10] cf. QUEIROZ, Odete Novais Carneiro op. Cit. Pág. 94
[11] cf. NERY JR., Nelson Código Brasileiro de Defesa do Consumidor,
comentários ao art. 46
[12] Gazeta Mercantil de 30 de abril de 99
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