Associações comunitárias: Organização popular na Pedreira Prado Lopes

June 4, 2017 | Autor: O. Vignoli Neto | Categoria: Assessoria Jurídica Popular
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Associações comunitárias: Organização popular na Pedreira Prado Lopes Débora de Araújo Costa1 Orlando Vignoli Neto2 Stephanie Oliveira Bastos3

Resumo O presente trabalho tem por objetivo relatar a experiência organizativa da Assessoria Jurídica Universitária Popular da UFMG (AJUP/UFMG) na comunidade Pedreira Prado Lopes em Belo Horizonte. As assessorias jurídicas universitárias trabalham a partir do método de extensão popular, que tem por objetivo, a partir da inserção critica na realidade, organizar o povo para a transformação da realidade concreta. Assim, ferramentas de organização com legitimidade política e jurídica são essenciais nesse processo de transformação. Dessa forma, o presente artigo demonstra como foi o trabalho de extensão desenvolvido pela AJUP/UFMG para a criação da Associação dos Moradores da Pedreira Prado Lopes.

Palavras-chave: Associação, Pedreira Prado Lopes, AJUP/UFMG

1. Apresentação As assessorias jurídicas universitárias são coletivos de estudantes universitários, notadamente das Faculdades de Direito, que desenvolvem projetos de assessoria jurídica popular por meio da extensão universitária. De acordo com Ribas4, a assessoria jurídica popular: [...] consiste no trabalho desenvolvido por advogados populares, estudantes, educadores, militantes dos direitos humanos em geral, entre outros; de assistência, orientação jurídica e/ou educação popular com movimentos sociais, com o objetivo de viabilizar um diálogo sobre os principais problemas enfrentados pelo povo na busca pela realização de direitos fundamentais para uma vida com dignidade, seja por meio dos mecanismos oficiais, institucionais, jurídicos, extrajurídicos, políticos, seja por meio da conscientização. 1

Graduanda em Direito pela UFMG. Bolsista da Assessoria Jurídica Universitária da UFMG (AJUP/UFMG). 2 Graduando em Direito pela UFMG. Bolsista da Assessoria Jurídica Universitária da UFMG (AJUP/UFMG). 3 Graduanda em Direito pela UFMG. Extensionista pela Assessoria Jurídica Universitária da UFMG (AJUP/UFMG). 4 (RIBAS, 2012, p. 355)

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Os trabalhos desenvolvidos pelas assessorias jurídicas universitárias se inserem em outro marco teórico de extensão, diferente do modelo de extensão tradicional e assistencialista. A chamada extensão popular, que tem como principal teórico Paulo Freire, não é simples troca de saberes, mas produção conjunta do conhecimento. Entende-se que a atividade de extensão é educativa por excelência, e tem por objetivo articular ensino e pesquisa de maneira indissociável, viabilizando a relação transformadora entre a universidade e sociedade. Por isso, os projetos de extensão popular valem-se do referencial teórico da educação popular. No Brasil, o movimento de criação de assessorias jurídicas populares começou no final da década de 1980, no contexto de surgimento de novos atores sociais. Os novos movimentos sociais passaram a se organizar coletivamente pela conquista de direitos, como moradia, terra, e igualdade de gênero. Esta conjuntura foi responsável, juntamente com a expansão do estudo das teorias críticas do Direito nas universidades brasileiras e com o fomento a projetos de extensão, pela criação de uma nova forma de apoio aos movimentos populares: as assessorias jurídicas universitárias populares. A partir da experiência dos Encontros Nacionais de Estudante de Direito (ENED’s), estudantes da Faculdade de Direito e Ciências do Estado da UFMG tiveram contato com esse modelo de extensão. Assim, em razão da iniciativa desses estudantes, vinculados ao movimento estudantil da Faculdade, surgiu no ano de 2012 a Assessoria Jurídica Universitária Popular da UFMG (AJUP/UFMG). O programa se propõe a ser o que Campilongo 5 classifica como serviço legal inovador. Tem por características, portanto, o coletivo, a organização, a participação, o desencantamento, o extralegal, a explosão de litígios, o multiprofissionalismo, as demandas de impacto social, a ética comunitária e a justiça. Atualmente, a AJUP/UFMG desenvolve um projeto de associativismo 6 na comunidade Pedreira Prado Lopes, em Belo Horizonte. A comunidade, apesar de ser uma das mais antigas da cidade7, possui participação popular muito aquém do que se espera de um local que já foi um dos principais focos de organização política e cultural 5

(FURMANN, 2003, p. 60) Associativismo é a prática social da criação e gestão das associações, bem como a defesa dessa prática de associação enquanto processo de organização popular para alcançar determinados objetivos estratégicos. 7 O local onde se encontra hoje a Pedreira Prado Lopes teve as suas primeiras povoações entre 1900 e 1920. Informação disponível em: . Acesso em maio de 2014. 6

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da cidade. Dessa forma, o referido projeto tem por objetivo funcionar como grupo de apoio jurídico, trabalhando em conjunto com os movimentos sociais na tentativa de auxiliar os moradores no resgate dessa participação por meio da associação comunitária. 2. Teoria da ação dialógica As assessorias jurídicas universitárias trabalham necessariamente com dois eixos de atuação principais: a assessoria jurídica popular e a educação popular em direitos humanos. Em decorrência de seu caráter estudantil, a educação popular em direitos humanos assume nas assessorias universitárias um caráter transversal, que deve estar presente em todas as atividades do projeto para que se faça extensão popular. Até mesmo a assessoria jurídica, nos marcos da extensão popular, vale-se de um processo pedagógico para ambos os sujeitos, assessores e assessorados. Assim, o início do trabalho de assessoria deve sempre começar de maneira pedagógica desde o diagnóstico como durante toda a atuação, de acordo com o que Paulo Freire chama de teoria da ação dialógica. A teoria da ação dialógica, em oposição à teoria da ação antidialógica, é utilizada pela AJUP/UFMG e consiste no método de educação popular, pautado na comunicação, no diálogo, na construção compartilhada do conhecimento. Como ressalta Paulo Freire8, “solidarizar-se com os oprimidos, que é mais que prestar assistência a trinta ou a cem, mantendo-os atados, contudo, à mesma posição de dependência. A solidariedade, exigindo de quem se solidariza, que ‘assuma’ a situação com quem se solidarizou, é uma atitude radical”. Assim, tem como características a colaboração, a união, a organização e a síntese cultural. A grande tarefa dos oprimidos reside na possibilidade de libertar a si e aos opressores. Entretanto, os oprimidos, enquanto “hospedeiros” do próprio opressor, somente na medida em que se descobrirem enquanto tal é que poderão contribuir para o nascimento de sua práxis libertadora9. Posteriormente a esse momento de descoberta da condição de hospedeiro da opressão, há um processo de inserção crítica do oprimido na realidade, desvelando o mundo da opressão e suas contradições. Ele percebe que apenas ele tem essa condição de libertação, e naturalmente teme essa opção, pois essa superação não pode se dar de forma idealista, e se faz indispensável aos oprimidos a luta

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(FREIRE, 1987, p. 19) (FREIRE, 1987, p. 17)

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por sua libertação. E essa luta pela libertação só se dá na práxis, que é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo10. Dessa forma, descobrindo nitidamente o opressor, os oprimidos se engajam na luta organizada por sua libertação11. Essa libertação não pode ser feita de forma autônoma e individual, é conquistada coletivamente na lógica de que ninguém se liberta sozinho e ninguém liberta ninguém, os homens se libertam em comunhão. Portanto, percebe-se que a educação popular enquanto referencial teórico da extensão popular é muito mais do que simples educação das massas para que conheçam os seus direitos. É também educação para o exercício político da cidadania, que tem como pressuposto tático a organização popular para o alcance da estratégia, que é a transformação concreta da realidade. Compreendendo que a organização popular é necessária para a transformação da realidade, a AJUP/UFMG trabalha com a principal ferramenta de organização popular na comunidade, que é a associação de moradores. Desde o início da inserção do projeto na comunidade os estudantes extensionistas perceberam que a associação era um grande tema-gerador12. A associação era recorrentemente citada como protagonista em diversos processos de mobilização da comunidade para a conquista de direitos. Entretanto, depois de vários anos de funcionamento, ela ficou desativada, principalmente em razão da cooptação de suas lideranças pelo poder público. Portanto, o presente relato tem por objetivo demonstrar como a AJUP/UFMG, a partir da teoria da ação dialógica, funciona como grupo de apoio jurídico dos moradores na retomada da associação.

3. Associação dos Moradores da Pedreira Prado Lopes 3.1. União Prado Lopes

A União Prado Lopes, primeira associação comunitária da Pedreira Prado Lopes (PPL) que se tem registro, surgiu na década de setenta como instrumento de organização popular, com objetivo de apresentar as demandas da comunidade frente ao poder

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(FREIRE, 1987, p. 21) (FREIRE, 1987, p. 29) 12 (FREIRE, 1987, p. 57) 11

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publico. A associação se mostrou enquanto forte mecanismo de mobilização e reivindicação: A associação foi responsável pela participação da comunidade nos Orçamentos Participativos Municipais, o que garantiu à Pedreira em 1994, o Conjunto Habitacional (Araribá); em 1995, o Centro de Saúde; em 1996, a Escola Profissionalizante; em 1997, o Plano Global, e nos processos de 1998, 2000 e 2002, recursos para aplicação no mesmo13.

Fonte de grandes conquistas para a comunidade marcou a cultura política do local obtendo o respeito e admiração dos moradores, segundo relatos. Porem, com o decorrer dos anos foi perdendo sua legitimidade para com os associados e moradores. Irregular desde 1997, não convoca eleições e não registra atas. Seu trabalho não é divulgado e a lealdade das lideranças da associação passou a ser questionada pelos moradores, que não raramente acusavam-nas de cooptação por parte do poder publico. Apesar da ausência de provas, tal desconfiança era justificada pelos benefícios recebidos pela presidente da associação nas obras do Programa Vila Viva e sua proximidade com agentes políticos representantes do Município. Apesar do declínio de sua influência política permaneceu viva no consciente de grande parte dos moradores com os quais a AJUP UFMG realizou o trabalho extensionista, fazendo da associação de moradores lato sensu um tema-gerador com capacidade de mobilização popular.

3.2. Inserção da Assessoria Jurídica Popular da UFMG na comunidade Pedreira Prado Lopes

A Pedreira Prado Lopes se encontrava em um cenário de descrença na força de uma organização popular em torno de um instrumento político. Em meados de 2012, a AJUP/UFMG foi convidada pelo Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) para acompanhar a comunidade, com intuito de iniciar um processo de mobilização popular, diagnosticando em parceria com os moradores seus principais problemas, com o fim de solucioná-los por meio de sua organização. Nesse primeiro momento, a AJUP/UFMG ainda estava em um processo inicial de formulação de seus objetivos e metodologia. Por isso, apenas acompanhava as reuniões, para conhecer melhor a comunidade e a metodologia de trabalho do MTD, analisando a

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(LAGE, 2012, p. 26)

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possibilidade de adotar a PPL como locus de atuação, já que, até então, ainda não realizava o serviço de assessoria propriamente dito. A primeira reunião com presença dos membros da AJUP na Pedreira foi realizada em 12 de maio de 2012 junto com integrantes do Levante Popular da Juventude e do MTD - os dois movimentos sociais inseridos na PPL - além dos moradores da comunidade. Os principais problemas da Pedreira elencados neste primeiro encontro foram os decorrentes das obras do Programa Vila Viva, que resultaram em cooptação de lideranças, contratação de traficantes para intimidar os moradores, indenizações irrisórias, falta de planejamento/demora no término das obras e principalmente o acúmulo de lixo, que segundo os moradores deveria ser tratado como prioridade. Além disso, foi exposta a ausência de possibilidades de lazer para os jovens. Com as demandas da comunidade delimitadas, a AJUP/UFMG passou a atuar junto com os moradores e o MTD em reuniões semanais na PPL, em um processo horizontal de mobilização e organização. Após algumas reuniões, foi realizada uma assembleia na comunidade no dia 01 de junho de 2012, às 19h, com as seguintes pautas: Pauta 1 - Retirada do Lixo e entulho da PPL; Pauta 2 - Diálogo, informação e reassentamento das famílias; Pauta 3 - Conclusão das obras; Pauta 4 - Reformas nas infraestruturas construídas: Saneamento e Apartamentos; Pauta 5 - Espaços para a manifestação cultural. Como encaminhamento da assembleia, decidiu-se realizar um ato protagonizado pelos moradores, no qual seriam reivindicadas melhores condições de habitação na comunidade e a construção de um manifesto por parte da AJUP UFMG a ser endereçado à Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (URBEL) e à Prefeitura Municipal. O manifesto deveria conter elementos jurídicos que embasassem as melhorias pleiteadas pela comunidade. O ato foi realizado no dia 04 de julho de 2012, sendo percorrida parte da Av. Antônio Carlos, chegando à sede da URBEL, onde foi apresentado o manifesto escrito pela AJUP em parceria com o MTD e comunidade, segundo publicado pelo jornal Estado de Minas: Moradores da Pedreira Prado Lopes, Região Noroeste de Belo Horizonte, fazem um protesto na Avenida Antônio Carlos contra a demora no término das obras do Vila Viva e as condições de vida da comunidade. Na manhã desta quarta-feira, os participantes do protesto ocuparam uma faixa da avenida perto da Rua Formiga e há registro de retenção até o cruzamento

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com a Rua dos Operários, no Bairro Cachoeirinha. Militares do 34º Batalhão acompanham a ação. 14

Poucos dias após a realização do ato, a URBEL recolheu grande parte do lixo e dos entulhos da PPL, realizando uma limpeza nas ruas e avenidas da comunidade. Com vitórias concretas, os moradores começaram a perceber a importância de uma entidade que pudesse mobiliza-los e organiza-los, que fosse protagonizada por eles, de modo que os movimentos sociais e a assessoria jurídica não seriam suficientes nessa tarefa. A ideia da associação de bairro, apresentada e trabalhada ao longo dos primeiros encontros pelo MTD e AJUP/UFMG, combinadas com o saudosismo dos moradores à época da União Prado Lopes (UPL), fizeram dessa a pauta principal das reuniões que se seguiram. Já havendo uma associação, a UPL, e, constatada sua irregularidade, a AJUP se empenhou em estudar tais entraves burocráticos para uma possível reativação e em quais instancias políticas uma associação exercia influência, ao mesmo tempo em que trabalhava com os moradores seus princípios norteadores, como por exemplo, união e transparência. 3.3. Decisão dos moradores da criação de uma nova Associação Comunitária

A reativação da União Prado Lopes se mostrou inviável. Em um primeiro momento, foi entregue à atual presidente - que ocupa tal cargo há mais de 20 anos - um abaixo assinado por parte dos moradores solicitando a convocação de novas eleições para a associação. Na ausência de resposta, foi estudada a possibilidade de convocação de eleições legitimas pelos próprios moradores, porem, o Estatuto da UPL não delimitava quem eram os associados, deixando como conclusão que o corpo social era composto por todos os moradores da PPL. Dessa forma, não era possível estabelecer precisamente o quorum necessário para convocar a Assembleia. Ademais, o custo financeiro para regularização da UPL era muito superior ao valor de registro de uma nova associação. Diante desse quadro, a escolha foi pela criação de uma nova associação. Tomada a decisão, a AJUP/UFMG, enquanto eixo jurídico criou um Grupo de Trabalho (GT) para se encarregar especificamente dessa demanda, auxiliando em sua

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(SILVA apud LAGE, 2013, p. 34)

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criação desde a elaboração do estatuto até o seu registro. Inicialmente chamado de GT de Associação, o grupo de trabalho arquitetou um plano de atividades para acompanhamento das reuniões iniciais de elaboração de estatuto, com os seguintes eixos, de acordo com os capítulos gerais que um estatuto deve conter: 1. Da denominação, sede e fins; 2. Dos associados; 3. Da administração; 4. Do patrimônio; 5. Das disposições gerais. Concomitantemente, o GT estabeleceu um plano de estudos interno que contemplava os seguintes itens: 1. É possível duas associações funcionando ao mesmo tempo? Precedentes e implicações; 2. Como montar uma associação comunitária; 3. Organicidade mínima de uma associação; 4. Eleições; 5. Controle interno e externo; 6. Extinção; 7. Imunidades; 8. Regularizar uma associação inativa. Tendo como principio norteador de sua atuação a Educação Popular, que preza pelo conhecimento construído horizontalmente, o GT apresentou cada ponto do Estatuto aos moradores, construindo-o coletivamente de maneira tal que pudessem se ver representados por ele, opinando em seu texto e tendo pleno empoderamento sobre o instrumento. Coube à AJUP dar-lhe forma jurídica utilizando-se do conhecimento técnico acadêmico. Ademais, os extensionistas usaram como método a comparação entre estatutos já existentes de associações comunitárias e demais entidades representativas. Entre os resultados desse processo, os moradores optaram por um sistema de Coordenadoria ao invés de Presidencialismo. Entenderam ser esse modelo mais democrático e representativo, além de coibir possíveis tentativas de cooptação por parte do Poder Publico, como havia ocorrido com a UPL. Além disso, foi acrescido ao estatuto um artigo que prevê a perda do cargo ocupado na Diretoria pelo individuo que, após eleito pelo corpo social, se candidate a qualquer cargo eletivo ou de confiança nos poderes legislativo, executivo e judiciário. Destarte, a comunidade poderia se sentir segura em futuros processos eleitorais, pois saberia que seus representantes eleitos não poderiam usar da influencia da associação para beneficio próprio, sendo essa uma possibilidade razoável tendo em vista o histórico da comunidade. Durante as reuniões eram frequentes as falas que retomavam a União Prado Lopes. Os erros cometidos por ela eram sempre analisados pelos presentes, levantando métodos para não se repetirem na futura associação. Os moradores se mostraram empenhados e decididos em fazer do estatuto, outrora algo distante e alienante, um instrumento que estabelecesse os princípios da nova 8

associação, entre eles a representatividade, a legitimidade e a transparência, deixando claro o entendimento que tinham sobre o objetivo dela para com a comunidade. Ao longo do processo foi possível observar um dialogo entre o saber jurídico e o saber popular na construção de um conhecimento coletivo, expresso no Estatuto da Associação. O plano de estudos interno do GT tinha por objetivo elucidar os extensionistas sobre temas que perpassam a criação de uma nova associação. A AJUP/UFMG conta com membros em períodos iniciais do curso de Direito, assim, foi preciso um esforço por parte de seus integrantes no estudo independente da doutrina, havendo a ausência de um professor que pudesse orientar de fato. Como fontes de estudos foram usados o Código Civil de 2002, a Lei de Registros Públicos15, o Estatuto da OAB16, Lei de Assistência Judiciária17, Lei Estadual 19.414/2010, o Código Tributário Nacional18, junto com: Cartilha de Associação do Ministério Público, Cartilha de Comunidades Quilombolas, Manuais de Direito Civil, Manuais do Terceiro Setor, entre outros.

3.4. Eleições e Registro Ao se fundar uma associação geralmente é realizada uma assembleia conjunta de fundação, eleição e posse. Assim, na mesma assembleia de fundação é eleita uma chapa que irá compor o órgão executivo da associação e que toma posse naquele momento para dar execução aos seus objetivos. Isso se justifica em razão dos fundadores serem, por definição, os primeiros associados, de maneira que eles representam a integralidade do corpo social naquele primeiro momento. Portanto, possuem verdadeiro poder originário para fundar a associação aprovando os termos do estatuto em que será regida e os membros que comporão o órgão administrativo. Contudo, o projeto optou por uma alternativa um pouco diferente em um primeiro momento. Como a intenção da associação é ter legitimidade para representar grande parte da comunidade, seria necessário um processo que desse ampla divulgação à iniciativa de se criar uma nova associação. Em decorrência de outras experiências, era sabido pelos moradores e pelo projeto que o número de moradores que frequentavam as assembleias conseguia atingir um número máximo de cinquenta moradores presentes. 15

Lei nº 6.015/73 Lei nº 8.906/94 17 Lei nº 1.060/50 18 Lei nº5.172/66 16

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Portanto, ficaram acordado os moradores que seriam convocadas eleições, de caráter meramente pedagógico, para que um grande número de pessoas pudesse votar, legitimando a nova associação em detrimento da antiga. Essas eleições seriam igualmente importantes como demonstração de força frente ao poder público. Além disso, os moradores se interessariam mais em participar de uma entidade na qual elegeu sua diretoria, através do exercício simbólico do voto. Dessa forma, foram feitas várias mobilizações. Membros da assessoria jurídica se engajaram com os moradores na divulgação das eleições, percorrendo por toda a comunidade entregando panfletos de divulgação e também por megafone. Foram marcados três locais de votação no dia 31 de agosto de 2013, que ficaram abertos durante o dia até às 17:00 horas. Nesses pontos foram feitas urnas e cédulas improvisadas e foram cadastrados os nomes e endereços de todos os votantes. Ao final a comunidade conseguiu um número bem mais expressivo de participação, que girou em torno de 500 votos. Contudo, antes mesmo da associação ser registrada os moradores tiveram problemas com um dos coordenadores eleitos. A chapa que antes mesmo das eleições tivera atritos internos e se unira apenas para evitar um embate, quedou-se insustentável. Portanto, foi preciso que a chapa se reorganizasse, contando com a renúncia de alguns membros e entrada de novos. Após a sua reestruturação, em razão do desgaste de dois anos de mobilização, resolveu-se fazer a tradicional assembleia de fundação, eleição e posse. Atualmente, a chapa eleita está tentando arrecadar fundos para o registro no cartório.

4. Conclusão Portanto, pode-se dizer que decorre da própria opção por um modelo de serviço legal inovador que as assessorias jurídicas universitárias funcionem como suporte jurídico para a organização popular. O método de extensão popular pressupõe a organização para a transformação concreta da realidade. E o modelo de associação comunitária possui um respaldo político e jurídico de organização popular tanto em relação aos moradores de determinada comunidade quanto frente ao poder público.

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As associações comunitárias não têm a intenção de substituir o poder público na prestação de determinados serviços de utilidade pública, como ocorre nas chamadas “organizações do terceiro setor”. Também não têm a intenção de simplesmente representar os moradores frente ao poder público. Seus objetivos passam por instituir uma ferramenta de ampla participação que evidencie todas as contradições a qual a comunidade está submetida. Compreendendo essa importância é que a AJUP/UFMG assumiu essa tarefa como central em sua consolidação como grupo de apoio aos movimentos sociais. Assim, a partir do estudo detido tanto da teoria da ação dialógica, quanto dos mecanismos jurídicos para a criação da associação, é que foi possível instrumentalizar o verdadeiro anseio dos moradores em uma nova associação. Diferentemente da extensão tradicional, que apenas entregam um trabalho pronto e sem profundos debates com a comunidade.

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Acesso

em março de 2014.

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