AVALIAÇÃO DA MARCHA HUMANA EM TERRA E EM SIMULAÇÕES DE REDUÇÃO DA FORÇA GRAVITACIONAL

June 12, 2017 | Autor: Thais Russomano | Categoria: Weight Reduction, Body Weight
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AVALIAÇÃO DA MARCHA HUMANA EM TERRA E EM SIMULAÇÕES DE REDUÇÃO DA FORÇA GRAVITACIONAL. Roberta Leães1, Gustavo Dalmarco1, Thais Russomano1, Dario G de Azevedo1, Marcio Pinho1, Jonas Gurgel2 e Flávia Porto2. 1

Laboratório de Microgravidade/IPCT - PUCRS, Porto Alegre – RS; 2Núcleo de Pesquisa em Biomecânica Aeroespacial/Laboratório de Microgravidade/IPCT-PUCRS

Abstract: This study aims to evaluate physiological variables related to the human walking pattern during hypogravity simulation by means of a body suspension device. The walking pattern of a volunteer was used to validate the system during Mars and Moon gravitational force simulation. Eletrogoniometers for the left knee and ankle and a pair of foot switches for the anterior and posterior areas of both foot were used to analyze the walking pattern. Results showed that the variation of the angular movement was 50% and 45% greater for the knee and ankle, respectively, when data from Earth (1G) was compared with the ones found in Mars and Moon simulation. The weight reduction achieved by body suspension did not affect the walking pattern. This system might be applied during rehabilitation therapy through the adjustment of the counter-weight load according to patient physical condition to sustain his body weight during walking. Keywords: walking pattern; hypogravity simulation; reduced body weight; body suspension device. Introdução A fisioterapia tem utilizado mais freqüentemente a suspensão corporal como recurso terapêutico no tratamento de pacientes incapacitados funcionalmente de deambular. Além do propósito terapêutico, objetivou-se fazer desse sistema um instrumento avaliativo e de pesquisa. O desenvolvimento de um sistema de suspensão corporal mais especializado teve como propósito facilitar a marcha do indivíduo em função da redução do seu peso corporal. Além disso permite um maior controle das metas traçadas dentro de um plano de tratamento, por se trabalhar com variáveis quantitativas. Requer um menor espaço físico em função de se utilizar uma esteira elétrica como local onde o indivíduo irá caminhar. Com base no desenvolvimento neuroevolutivo, a marcha representa a última aquisição motora de uma criança dita saudável [1]. Por outro lado, as que nasceram com alterações patológicas em estruturas neurais poderão nunca atigir este estágio, ou ainda, pacientes com lesões a nível de SNC poderão também ter dificuldades a retornar a caminhar. Assim, o Sistema de suspensão corporal pode auxiliar muito no trabalho dos profissionais de reabilitação por transmitir ao paciente total segurança em relação ao temor da queda. Não apenas poderá ser utilizado na fisioterapia ISBN # XICBB'2005

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neurológica, mas também em áreas relacionadas à reabilitação da marcha, tais como orto-traumatológica, desportiva, dentre outras. Dentro do propósito do Laboratório de Microgravidade IPCT/PUCRS, o desenvolvimento de pesquisas voltadas para à exploração do homem a ambientes extraterrrestres, faz-se necessário simular as mais variadas alterações fisiológicas e biomecânicas que se dão no corpo de um indivíduo em redução de força gravitacional. Neste estudo, tratou-se de investigar as variáveis envolvidas nas informações referentes a possíveis alterações de padrões de marcha de um indivíduo em simulação de gravidade reduzida. Desta forma, a intenção do grupo foi a de associar esse propósito à simulação de ambientes extraterrestres, ou seja, de forças gravitacionais diferenciadas da enontrada na Terra. Assim, escolheu-se comparar a marcha humana em ambiente terrestre com marcha em ambiente Lunar e Marciano. Sabe-se que gravidade é a força de atração que existe entre todas as partículas com massa no universo. Desta forma, pode-se considerar a equação [F=m.a], onde F é a força gravitacional, m é a massa do corpo em questão e a é a aceleração gravitacional. Logo, a aceleração gravitacional terrestre é de aproximadamente 9.81 m/s2, de Marte é de 3.27m/s2 e da Lua, de 1.63 m/s2. Isso representa uma diminuição do peso corporal em cerca de 30% em solo Marciano e de 60% em solo Lunar. Para que fosse possível verificar alterações dos padrões de marcha de um indivíduo nas diferentes situações propostas de reduções de pesos corporais, adotou-se como parâmetros para análise de dados: Medida angular das articulações de joelho e tornozelo (eletrogoniômetria) e análise temporal das marchas de um indivíduo (foot switch). Materiais e Métodos Para a realização desse estudo, foi utilizado um equipamento para suspensão corporal (Figura 01), composto por uma estrutura piramidal de carbono de aço de 2000 mm de altura. As dimensões da base de suspensão são de 3000 mm por 2660 mm. O sistema de contrapesos consiste em 20 pesos de 5 kg, localizados opostamente à região onde o voluntário irá ser tracionado. O indivíduo utiliza um sistema de cintos (cadeirinha de Rapel) (Figura 02), ligados a uma estrutura metálica em formato de “T”, sendo este

conectado a um cabo de aço que é preso aos contrapesos a partir de um sistema de polias. O objetivo da escolha da adaptação do “T” foi de se proporcionar ao indivíduo suspenso uma posição corporal mais ereta, pois a fixação é feita em dois pontos de tração localizados próximos aos ombros. Anteriormente a essa adaptação, a tração do corpo do indivíduo se dava a partir de um único ponto (um elo próximo a região dorsal), logo o corpo tendia a uma flexão das colunas cervical e lombar.

Figura 03: Célula de carga. Os instrumentos utilizados para aferência de dados referentes à medida angular das articulações do joelho e tornozelo esquerdos foram dois eletrogoniômetros (Figura 04), desenvolvidos pelo grupo de pesquisadores do Núcleo de Pesquisa em Biomecânica Aeroespacial (NUBA)4, Laboratório de Microgravidade/ IPCT/ PUCRS. O eletrogoniômetro é baseado em um potenciômetro rotacional e permite a análise de dados em tempo real e com precisão aceitável [02].

Figura01: Sistema de Suspensão Corporal.

Figura 04: Eletrogoniômetro do Joelho.

Figura 02: Cinto de Suspensão. Foi utilizada uma célula de carga (Figura 03) tipo S da marca Kratos, com grau de proteção IP-65, com capacidade para 50Kg.

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O processo de coleta de dados se deu a partir de um conversor A/D (DataQ DI-194RS) com 10 bits de resolução para cada um dos eletrogoniômetros, um software de aquisição WinDaq e um computador Pentium II MMX 300 MHz. Para a calibração, cada eletrogoniômetro foi acoplado a um goniômetro manual. Os valores do eletrogoniômetro (Volts) foram previamente calibrados, numa angulação de 0° a 90° no goniômetro e, após, tratados estatisticamente em software. A função escolhida foi a de regressão linear. Como instrumento para análise de dados temporais da marcha, utilizou-se quatro foot switches (Figura 05), dispostos aos pares. O foot switch é um instrumento de avaliação de medidas baseadas em parâmetros temporais [3]. As regiões escolhidas são referentes ao terço-anterior e calcâneo (direito/esquerdo). Como funcionam como chaves elétricas, quando alguma das regiões do pé referidas estiver em contato com o solo, esta chave fecha um curto circuito, fornecendo um nível de tensão que é capturada pelo DATA Q e armazenadas para posterior processamento. Foi monitorado o tempo

de contato de cada foot switch, além do tempo da seqüência de sua ativação, ou seja, o tempo entre cada passo.

Figura 06: Angulação de Joelho.

Figura 05: Foot Switch.

A esteira elétrica usada é do modelo VITAMASTER 8704, 1.0 HPMOTOR. A velocidade pode atingir 8.0 km/h, 5.0 M. Para calibrar o velocímetro da esteira, utilizou-se um tacômetro digital PHOTO/CONTACT TACHOMETER, que possibilita a medição de equipamentos que variem de 0.05 à 1999.9 m/min. O objeto de estudo foi um individuo saudável do sexo feminino, 26 anos de idade. Foi testado com o objetivo da avaliação do funcionamento do Sistema de Suspensão corporal, bem como dos instrumentos utilizados para aferir as quantidades cinemáticas do movimento de marcha. Foram coletadas informações referentes a 5 min de coleta numa amostragem de 10 passos contínuos durante a caminhada na esteira, numa velocidade de 2,53 km/h. A instrumentação consistiu nas calibrações da célula de carga, dos eletrogoniômetros e dos foot switches. Para os eletrogoniômetros, as variáveis adotadas como parâmetros de avaliação foram a angulação máxima e angulação mínima das articulações de joelho e tornozelo, simulando o indivíduo caminhando em Marte e na Lua. As medições de angulação foram feitas pela angulação relativa, que é o ângulo da articulação formado entre os eixos longitudinais de segmentos corporais adjacentes [4]. Para o joelho, foi estipulada a angulação 0° para extensão e 90° para flexão (Figura 06). Para o tornozelo foi estipulado que, em posição neutra, ele estará em 90°, sendo que a angulação diminuirá (até 70°) na dorsiflexão e aumentará (até 120°) na flexão plantar (figura 07).

Figura 07: Angulação do tornozelo. A calibração da célula de carga foi realizada para ajustar o sistema de tração de peso em relação ao peso da voluntária. Foram utilizadas para a calibração cinco anilhas de diferentes massas, sendo as massas medidas previamente em uma balança de precisão. Os foot switches são sensores de contato, por isso não necessitam de calibração.

Resultados Os resultados dos eletrogoniômetros e foot switches apresentaram uma variação entre Terra, Marte e Lua proporcionais ao valor da simulação de redução de força gravitacional. Em Terra, a variação de movimento do joelho foi 50% e do tornozelo 45% maior do que nas gravidades simuladas de Marte e da Lua (Figura 08 e Quadro 01).

Figura 08: Valores dos Eletrogoniômetros. Quadro 01: Valores dos eletrogoniômetros. ELGO

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Terra Média ± DP

Marte Média ± DP

Lua Média ± DP

Joelho Max Joelho Min Tornozelo Max Tornozelo Min ∆ Joelho ∆ Tornozelo

62,6 ± 2,05 0,7 ± 3,59

55,9 ± 1,63 13,1 ± 2,65

55,6 ± 2,21 17,6 ± 4,69

119,9 ± 1,93

112,69±1,14

114,9 ± 2,01

74,3 ± 1,64

81,3 ± 2,68

87,42 ± 3,13

63,4 ± 5,15 45,6 ± 2,07

34,1 ± 1,98 28,2 ± 2

34,2 ± 5,87 24,7 ± 3,89

Quanto aos dados do foot switches, foram analisados os dados de terço anterior do pé direito/esquerdo (TAD /TAE) e calcâneo direito/esquerdo (CD/CE), além dos dados de tempo de contato de cada foot switch (TC) e o tempo da seqüência de sua ativação, ou seja, o tempo entre cada passo (TP). Com isso, foram feitas as relações TAE x TC, TAE x TP, CE x TP, CE x TC, TAD x TC, TAD x TP, CD x TC e CD x TP, nas condições de marcha na Terra, em Marte e na Lua. (Figura 09 e Tabela 02). Houve uma redução significativa no TC e TP do TAD e CD de cerca de 60% e 40% para Marte e Lua, respectivamente, quando comparados aos valores obtidos em Terra. O TC e TP do CE na simulação lunar não foram detectados, o que gerou um aumento do valor de TC e TP do TAE. Em relação à Terra, houve uma redução dos valores de TAE (TC = 20% e TP = 9%) e CE (TC = 40% e TP = 9%).

Conclusão

Figura 09: Valores dos Foot Switches. Tabela 02: Valores dos Foot Switches.

TAE –TC TAE – TP CE – TC CE – TP TAD –TC TAD - TP CD – TC CD – TP

Terra Média ± DP 0,89 ± 0,06 1,46 ± 0,088 0,40 ± 0,059 1,46 ± 0,036 1,14 ± 0,045 1,47 ± 0,06 0,52 ± 0,092 1,47 ± 0,088

Marte Média ± DP 0,71 ± 0,04 1,34 ± 0,046 0,22 ± 0,036 1,33 ± 0,044 0,70 ± 0,036 1,33 ± 0,066 0,33 ± 0,031 1,34 ± 0,063

Lua Média±DP 0,42 ± 0,038 1,37 ± 0,066 0 0 0,47 ± 0,056 1,21 ± 0,082 0,20 ± 0,064 1,21 ± 0,063

Discussão A variação da angulação de movimento de joelho ter sido 50% maior do que na gravidade reduzida simulada pode ser explicada pelo fato de que em Terra, ISBN # XICBB'2005

tem-se uma maior liberdade de movimento das articulações coxofemorais e das cinturas escapular e pélvica. O sistema de cintos (cadeirinha de Rapel), ao tracionar o indivíduo, tende a fazer uma sutil flexão de quadris e da coluna vertebral. Desta forma, o indivíduo caminhando em Terra, possibilita manter-se melhor numa postura ereta, pois permite a ação da musculatura anti-gravitária que atua constantemente para manter o centro de gravidade melhor distribuído. Além disso, o indivíduo estando com seu peso corporal integralmente sobre o solo, sofre uma força de reação das cargas do solo na locomoção que são resultantes às ações musculares e ao peso do corpo, transmitidos pelos pés. Logo, a força de reação do solo influencia o movimento do centro de massa do corpo [5]. A variação da angulação do tornozelo também foi menor nas marchas em gravidade reduzida devido à diminuição do peso corporal, conseqüentemente a força exercida no pé para a marcha é diminuída, o que reduz a flexão do tornozelo. Dentro da fase de apoio da marcha, os períodos Duplo Apoio Inicial até o final do Apoio Simples, demonstram o toque do calcâneo, bem como o pressionamento do terço anterior do mesmo [5]. Com base no padrão de marcha terrestre, avaliou-se a influência da diminuição do peso corporal nos dados obtidos pelos foot switches. O tempo de contato do pé no solo, tanto de terço anterior como de calcâneo, é menor em Marte e Lua, proporcionalmente ao valor da gravidade. Nota-se também que o calcâneo esquerdo não chega a tocar o solo durante a marcha simulada em solo lunar, e o calcâneo direito tem também o tempo de contato muito reduzido, sugerindo que em ambiente com redução de aproximadamente 60% da gravidade, como o lunar, o indivíduo altera seu padrão de marcha, passando do padrão terrestre de calcâneo – terço anterior para somente terço anterior, ou terço anterior – calcâneo.

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Apesar da redução da gravidade, o padrão da marcha manteve-se praticamente o mesmo, justificando o método adotado. Na simulação da gravidade lunar houve uma modificação no padrão cinemático de marcha, podendo então se utilizar essa medida como parâmetro inicial de medidas para tratamento de reabilitação. De acordo com a patologia existente, é possível determinar a forma mais correta de se utilizar esse sistema de suspensão corporal. Ou seja, se o paciente apresenta disisteria dolorosa da região plantar (neuropatia periférica que provoca dor a partir da estimulação tátil da região plantar, fazendo o indivíduo apresentar uma marcha semelhante à eqüina) [6], podese prescrever um tratamento com padrões de marcha estipulados nesta pesquisa. No início, seria adotada a redução do peso corporal da simulação lunar, passando, após, por Marte até chegar-se à gravidade terrestre. Isto seria possível porque a redução do peso corporal facilita

os movimentos, além de diminuir a sobrecarga articular e, conseqüentemente, as dores. Desta forma, é possível diminuir gradativamente os valores de contrapesos do sistema de suspensão corporal, à medida em que o paciente adquire confiança e condições de sustentar integralmente seu peso corporal durante a deambulação. A reabilitação de pacientes com alterações neuromotoras a partir do uso de sistemas de suspensão corporal associados à redução de peso tem se mostrado consideravelmente mais eficaz para o treinamento de habilidades motoras durante a marcha do que apenas a utilização da suspensão corporal [7]. Referências [1] BOBATH B. ”Atividade Postural Reflexa a Normal Causada por Lesões Cerebrais”. São Paulo, Ed. Manole, 1978. [2] GURGEL J, PORTO F, RUSSOMANO T, CASTRO L, BERTOGLIO R, SCHROEDER I.”Construção e Calibração de eletrogoniômetro de baixo custo, baseado em potenciômetro, para analise biomecânica do movimento humano”. Anais XXVII, Simpósio Internacional de Ciência espacial, pp256, São Paulo, 2004. [3] SCHNECK D, BRONZINO J. “Biomechanics principles and applications”, CRC. Press, 2003. [4] HALL S. Biomecânica Básica, pp. 266, Editora Guanabara Koogan S.A, Rio de Janeiro, 2000. [5] ROSE J, GAMBLE J. “Marcha Humana”, pp25, Editorial Premiere, 1998. [6] STOKES, M. “Neurologia para Fisioterapeutas”, Editorial Premier, São Paulo, 2000. [7] VISINTIN M, BARBEAU, H. '' A New Approach to Retrain Gait in Stroke Patients Through Body Weight Support and Treadmill Stimulation”. (Stroke, 1998; 29:1122 – 1128) .

e-mail dos autores: [email protected]; [email protected]; [email protected].

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