Bento Rodrigues: trajetória e tragédia de um distrito do ouro

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BENTO RODRIGUES: TRAJETÓRIA E TRAGÉDIA DE UM DISTRITO DO OURO José Eduardo de Oliveira*1

RESUMO Este artigo procura mostrar quando, porque e quem fundou o povoado de Bento Rodrigues no município de Mariana. E qual foi a sua trajetória, na visão dos viajantes que passaram por lá durante o século XIX, enquanto ex-distrito do ouro, desde a sua fundação até a sua total ruína pelo rompimento da barragem de lama de rejeitos da mineradora Samarco em 5 de novembro de 2015. Palavras-chave: Bento Rodrigues; Mariana; Barragem; Samarco

“... e outros vários, que estão descavando os montes, minando penhascos e cortejando o coração da terra por haver os seus haveres.” Bento Fernandes Furtado - 1750 *1 Licenciado em História pelo Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto, atualmente Professor de História na Rede Municipal de Ensino de Patos de Minas, e-mail: [email protected]

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INTRODUÇÃO O dia 5 de novembro de 2015, uma quinta-feira, será um daqueles dias que nenhum mineiro esquecerá, principalmente aqueles que moravam no subdistrito de Mariana, Bento Rodrigues. No mesmo dia à noite as mídias já divulgavam a catástrofe que se abatera sobre aquela localidade. As informações eram as mais díspares. Uns falavam que a cidade de Mariana havia sido engolida pela lama de uma barragem, outros falavam em um lugar chamado Bento Rodrigues, mas que ninguém sabia direito onde era. Outros alardeavam que foi em Samarco, ou Camargos ou ainda Santa Rita Durão. Outros diziam que centenas de pessoas teriam sido levadas devido ao rompimento de uma barragem de uma mineradora em Paracatu. Alguns afirmavam que foram duas barragens, Fundão e Santarém que se romperam devido a um abalo sísmico na região. No dia seguinte, ou melhor no decorrer do dia seguinte os fatos foram sendo esclarecidos. Ou quase. Primeiro, o mais importante, que o número de vítimas, felizmente foi bem menor, mas ninguém, nem mesmo a Samarco, empresa mineradora que explora as jazidas de ferro da região desde 1977, e nem a prefeitura de Mariana sabiam ao certo. E que o lugar mais afetado e praticamente “varrido do mapa” pela lama de rejeitos da mina foi mesmo, Bento Rodrigues, o subdistrito do distrito de Santa Rita Durão do Município de Mariana-MG. E que o Paracatu das notícias, também muito afetado pela lama é Paracatu de Baixo, também um povoado do distrito de Monsenhor Horta no município de Mariana. As imagens são inacreditáveis, quase tudo foi destruído, mas os moradores de Bento Rodrigues que sobreviveram, só não perderam a vida, mas terão de reconstruí-la em todas as dimensões humanas possíveis. Jamais saberei o que eles viveram e vivem. E viverão... As imagens nos remeteram a outras como às das enchentes que praticamente destruíram a cidade goiana da poetisa Cora Coralina, Goiás Velho em 2001 e a cidade paulista de São Luiz de Paraitinga em 2010, cidade fundada por bandeirantes taubateanos. E a outras, talvez as que trouxeram a lembrança de consequências muito maiores e terrificante, a do tsunami que aconteceu no Japão no dia 11 de março de 2011, ceifando milhares de vidas e afetando inúmeras pessoas e cidades. Entretanto, foram sinistros naturais e felizmente a

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cidade goiana e paulista e as do Japão já estão reconstruídas e voltaram quase que totalmente à normalidade. Mas, a tragédia que se abateu sobre Bento Rodrigues, de forma avassaladora sobre homens, animais, vegetação e coisas, continuaria como a lava de um vulcão, primeiro pelo caminho outrora límpido do Rio Gualaxo do Norte, depois pelo Rio do Carmo rumo ao Rio Doce de que é tributário. Agora as vítimas não seriam afetadas diretamente, mas indiretamente rumo ao Oceano Atlântico, inundando de lama todas as povoações, vilas e cidades da bacia do Rio Doce, na maior catástrofe ambiental de nossa história. E agora mais do que nunca, um temor ronda toda região, infectada desde o século XVII, pela cobiça dos mineradores: as outras barragens bufam! Entretanto, a verdadeira dimensão desse cataclismo não natural não pode ser mensurada ainda. Nem é essa minha pretensão.

Bento Rodrigues – antes e depois de 5/112 2

Disponível em < http://www.otempo.com.br/cmlink/hotsites/mar-de-lama/veja-as-imagens-de-sat%C3%A9litedo-antes-e-depois-de-bento-rodrigues-1.1163164> Acesso em 11 de novembro de 2015.

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A QUESTÃO BENTO RODRIGUES A ideia, aliás não muito pensada, de escrever estas palavras surgiu de uma ignorância. Eu não sabia, ou havia me esquecido onde ficava Bento Rodrigues. Foi esse não saber onde ficava é que me levou a indagar que lugar é esse? Quando e como ele surgiu? Quem o fundou? Que capelas eram aquelas que não eram tombadas? Na verdade o problema começou no mesmo dia 5 quando alguns amigos e amigas me telefonaram, perguntando se eu estava acompanhando as notícias do rompimento das barragens. Já que estes amigos e amigas sabem do apreço que eu tenho por Mariana, Ouro Preto, Congonhas enfim, todas as cidades históricas mineiras do setecentos, incluindo ai a velha Paracatu. Além de ter morado em Mariana e Ouro Preto (1982-1986), quase todos os anos tenho retornado a estas cidades onde visito os mesmos lugares, as mesmas capelas, os mesmo museus, os mesmos casarios, as mesmas brumas, as mesmas paisagens modorrentas e inesquecíveis...os mesmos bares. Eu, depois de acompanhar algumas notícias pude constatar que não era nem a cidade de Mariana, nem Ouro Preto e nem Paracatu. E que provavelmente, no início dos anos oitenta eu tenha passado em Bento Rodrigues ou muito próximo dali quando estava na universidade fui em algumas mineradoras, “deixar meu currículo”, para ver se conseguia um emprego para ajudar no meu sustento, lembro-me de ter ido pelo menos em Timbopeba (nome muito sugestivo). Até hoje ainda não fui chamado, ainda bem! Também quando fui de Mariana a Catas Altas com o meu professor de História da Arte, do Instituto de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Federal de Ouro Preto, José Arnaldo Coêlho de Aguiar Lima (1956-2013), onde ele iria realizar algumas pesquisas nas capelas do lugar, principalmente na Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Nós saímos no sábado de manhã e embarcamos em um ônibus até não sei em que povoado e depois fizemos baldeação e embarcamos em um outro ônibus muito mais velho que o anterior até que chegamos a Catas Altas. Antes, os ônibus, cada um deles, passaram em duas ou três povoações onde desembarcavam e embarcavam passageiros. Acho que estava tão embevecido com a paisagem agreste e natural daquelas brenhas que não me interessei em saber daquelas humildes e insignicantes habitações humanas diante de uma natureza tão forte e sublime. Sempre que escrevo sobre estas vilas mineiras - que após a auri sacra fames (“a maldita fome de ouro”) foram esquecidas pelos caminhos, nos morros e nas grotas e que com o tempo a natureza devorou e apagou inclemente, ou então, deixou uma ou duas capelas, 4

geralmente uma dos brancos outra dos negros, como aconteceu em Desemboque (MG), e outras cidades fantasmas, apenas para mostrar que ali, mesmo com a presença de Deus, os homens foram vencidos pela natureza - , recordo-me e escrevo um trecho do livro “Fronteira” de Cornélio Penna: As montanhas correm, agora, lá fora, umas atrás das outras, hostis e espectrais, desertas de vontades novas que as humanizem, esquecidas já dos antigos homens lendários que as povoaram e dominaram. Carregam nos seus dorsos poderosos as pequenas cidades decadentes, como uma doença aviltante e tenaz, que se aninhou para sempre em suas dobras. Não podendo matá-las de todo ou arrancá-las de si e vencer, elas resignam-se e as ocultam com sua vegetação escura e densa, que lhes serve de coberta, e resguardam o seu sonho imperial de ferro e ouro.3

DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: O MÉTODO E AS FONTES Entretanto Bento Rodrigues desventuradamente não nasceu nos dorsos poderosos de uma montanha, mas no rico vale do que seria chamado mais tarde Rio Gualaxo do Norte. E isso ajudaria em sua desgraça. Essa desventura traria ouro, decadência e depois esquecimento. E quatrocentos anos depois a tragédia. Vou tentar contar essa História de Bento Rodrigues, numa mistura de barroco/mosaico. Já me falaram que eu escrevo por curvas e contracurvas mas ao mesmo tempo juntando as peças como num mosaico, só que não juntarei as peças, farei apenas um esboço tênue, mas fornecerei as peças, aliás as pedrinhas coloridas, algumas ainda possuem ouro, prata, topázio, esmeralda e ferro. E sangue! Antes, uma ou duas advertências. Primeiro: não escrevo isso para ninguém especificamente, exceto para um ou dois amigos e amigas, por isso escreverei, apesar que respeitando a História, sem muita reverência. Segundo, como já disse, este alfarrábio nasceu de uma ignorância e como li alhures, a coruja de Atenas só voa quando se faz escuro, de minha ignorância talvez brote algum conhecimento. E já começou a brotar, sobretudo pelo meu método e minhas fontes. O meu método de trabalho são as horas de folgas que são poucas, as aulas para quem não quer e o cotidiano enfadonho tomam muito tempo precioso de quem precisa vencer a imensa e interminável noite da ignorância. As fontes que me valerei de forma inusitada serão somente as que possuo neste amontoados de livros - portanto nada 3

PENNA, sd. p. 14

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inédito, apenas fontes secundárias -, que é a minha biblioteca e uma ou outra pesquisa na rede, a tal de internet. E olha que fiquei até um pouco perplexo de saber que eu tinha mais referências que eu mesmo imaginava ter, ainda que fragmentadas (pedras do mosaico que alguém mais sério e gabaritado poderá concluir seguindo cautelosamente esta rude picada) sobre Bento Rodrigues. Também, advirto desde já, que muitas obras citadas não foram lidas na íntegra, mas uma leitura tipo faisqueira dentro do Ribeirão do Carmo, tentando garimpar apenas a pepita graúda chamada Bento Rodrigues. Mas aí ocorreu outro problema. Como eu disporia das informações sobre Bento Rodrigues que eu garimpava nos livros? Como isso iria para o papel? Escreveria uma história linear? Faria um romance histórico? Uma epopeia? Um samba do bandeirante doido? Nada disso! As informações aparecem em livros dos séculos XIX, XX e XXI, entretanto elas pertencem, sobretudo aos séculos XVII e XVIII, além do XIX. Então pensei no seguinte, vou citar a fonte, de acordo com a data ou a possível data do documento original. Inicialmente, farei um pequeno texto/questionamento e depois, é muito mais trabalhoso mas é muito menos trabalhoso mentalmente, transcreverei – ipsis litteris - das fontes as referências ou quando Bento Rodrigues que às vezes aparece como “Bento Roiz” é mencionado.

DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: PONTO DE PARTIDA De onde começar? Qual o ponto de partida para esta pequena jornada entre o presente e o passado de Bento Rodrigues? Estas foram as primeiras indagações e logo me recordei do vade-mécum da História de Minas, o incansável Waldemar de Almeida Barbosa (1907-1999), principalmente o seu imprescindível, “Dicionário histórico-geográfico de Minas Gerais”, onde todas as localidades mineiras foram contempladas de alguma forma e em um verbete conciso, mas bastante elucidativo assim foi descrito o arraial: BENTO RODRIGUES - Famoso arraial, centro de mineração, surgido na época do bandeirismo, no termo de Ribeirão do Carmo. ´Com a mesma emulação, fez sua tropa o Pe. João de Faria Fialho e, em breve tempo, descobriu o ribeirão de seu nome, porém, como os que tinham mais armas e

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mais séquito eram sempre nestes descobrimentos os mais aquinhoados, determinaram-se os mal contentes a formarem novas bandeiras. Uma destas descobriu e socavou o ribeirão que se chamou Bento Rodrigues, nome do cabo, de tanta grandeza, que tiraram nele bateia de 200 e 300 oitavas, sendo a pinta geral de duas e três oitavas e tanta a gente que concorreu, que; no ano de 1697, valeu o alqueire e milho sessenta e quatro oitavas e o mais na proporção` (Notícia Práticas que dá ao Revmo. Pe. Diogo Soares o Mestre de Campo José Rebelo Perdigão, sobre os primeiros descobrimentos das Minas Gerais do Ouro, in ´Vila Rica do Ouro Preto`, Augusto de Lima Júnior, pág. 50). A capela de S. Bento deve ter sido erigida em 1718; é o que se deduz de um documento publicado pelo Cônego Trindade. Num depoimento de 1743, declarou uma testemunha: ´vi, haverá 25 anos, começar as obras da capela, com licença, que estava em mãos do defunto João Ribeiro da Silva`4. Num recenseamento verificado em 1831, o ´distrito de paz de Bento Rodrigues` apresentava 318 livres, 136 cativos, num total de 454 habitantes e 91 fogos (Avulsos, A.P.M). Em 1838, a lei nº 102, 6 de abril, suprimiu o distrito, cujo território ficou incorporado ao de Mariana Por um pedido de auxílio dirigido à Assembleia Provincial, em 1853, verifica-se que havia ruído a capela de S. Bento, o povo construíra outra que, na época, estava já com dois altares prontos (Avulsos, A.P.M.). A lei nº 1.477, de 9 de julho de 1868, elevou Bento Rodrigues a distrito de paz. Esta lei, entretanto, foi revogada pela de nº 1.858, de 12 de outubro de 1871; assim, continuava Bento Rodrigues como simples povoado do município de Mariana. Em 1880, a lei de 30 de novembro transferiu a sede da freguesia de Camargos para o arraial de Bento Rodrigues. Hoje [1971], continua na situação de povoado, no município de Mariana.5

Incialmente, pensei em cancelar o meu projeto de desvelar Bento Rodrigues, o velho Barbosa havia dito tudo: o arraial nasceu em fins do século XVII por obra do bandeirante Bento Rodrigues, foi centro de mineração, foi famoso, deu muito ouro, tinha capela, foi distrito, deixou de ser e voltou até hoje à condição de povoado. Um povoado despovoado hoje (novembro de 2015) Fui buscar em outra fonte, mais breve em sua descrição, mas não menos exata, Joaquim Ribeiro Costa (1892-1984) e a sua “Toponímia de Minas Gerais”: Bento Rodrigues - Dist. do mun. de Mariana supr. por lei nº 102 de 6-IV1838, terr, incorp. ao dist. de Camargos. Novamente cr. por lei nº 21.477 de 9-VII-1868, revog. por lei nº 1.858 de 12-X-1871. Foi para aí transf. a sede da paróq. de Camargos por lei nº 2.706 de 30-XI-1880. É dist. de Santa Rita Durão.6

A citação do célebre pesquisador, Cônego Raimundo Trindade (1883-192) foi a seguinte: “Bento Rodrigues. Capela filial de Camargos. Fundada em 1718 aproximadamente. Nos autos de uma justificação, requerida pelos moradores de Bento Rodrigues, em 1743, certa testemunha depôs: ´vi, haverá vinte e cincos anos, começar as obras da capela com licença que estava em mãos do defunto João Ribeiro da Silva.” TRINDADE, 1945, P. 56 5 BARBOSA, 1971, P. 69-70 6 COSTA, 1997, P. 117 4

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As informações batem, inclusive atualizando a situação atual de Bento Rodrigues pertencer ao distrito de Santa Rita Durão. Mas resolvi continuar, não seria derrotado por aquela lama mineral inclemente nem pela poeira do esquecimento. Que teria havido entre a descoberta do ouro e a decadência do distrito até a sua derrocada final em escombros?

DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: A TRAJETÓRIA As primeiras notícias que temos, ou melhor, que eu tenho em minha biblioteca, sobre Bento Rodrigues, datam de fins do século XVII, mais precisamente do ano de 1697, a segunda notícia do ano de 1700 e a terceira de 1711, portanto as três praticamente contemporâneas umas das outras e do próprio Bento Rodrigues7. Apesar do território das Minas já estar sendo devassado por bandeiras desde fins do século XVI, foi na última década do seiscentos, seguindo as picadas de Fernão Dias é que os bandeirantes e sertanistas, em sua maioria paulistas tarimbados na lida de prear gentios (índios), se transformaram doravante em ávidos buscadores de ouro, que foi encontrado em profusão. Não ficarei aqui querendo mostrar quem descobriu o primeiro ouro na região e em que lugar isso aconteceu, pois mesmo os relatos coevos divergem e convergem. Ademais, como escreveu Charles R. Boxer: A data e o lugar exatos da primeira descoberta realmente rica provavelmente jamais serão conhecidos. As narrativas tradicionais variam, e a correspondência oficial dos governadores do Rio de Janeiro e da Bahia só reflete os achados dos dez primeiros anos, ainda assim tardia e impropriamente. Coligindo as narrativas contraditórias e fragmentárias que nos vieram ter às mãos, pareceria que o ouro foi encontrado quase simultaneamente em regiões diversas da zona que hoje é Minas Gerais, e por pessoas diferentes ou diferentes grupos de paulistas, nos anos entre 1693 e 1695.8

Entretanto, para situar os primeiros descobertos que foram contemporâneos de Bento Rodrigues nesta situação e de acordo com “as notícias dos primeiros descobridores da

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Ao correr os olhos por estas três fontes não tem como perceber como elas são parecidas, fazendo aventar as seguintes hipóteses: 1) as três se basearam numa mesma fonte escrita; 2) as três se basearam em um mesmo ou nos mesmos relatos orais; 3) os três autores das fontes colheram estas informações de textos diferentes escritos por pessoas diferentes mas que estiveram na região e a última, um escreveu e os outros dois e os seguintes se basearam nele... 8 BOXER, 2000, P. 61

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primeiras minas de ouro”, os precursores foram os paulistas de Taubaté e de São Paulo, resumidamente: A partir de 1693, Antônio Rodrigues Arzão, descobriu o primeiro ouro no Sertão da Casa da Casca. Depois em busca deste ouro vieram Bartolomeu Bueno de Siqueira, Miguel de Almeida e Antônio de Almeida. Nas idas e vindas pelo sertão encontravam-se com o Coronel Salvador Fernandes Furtado de Mendonça e depois seu filho, Bento Fernandes Furtado de Mendonça, além de Garcia Rodrigues Velho, e o Capitão Manoel Garcia Velho, Carlos Pedroso da Silveira, que acabaram descobrindo ouro em Itaberaba. Também Miguel Garcia, Ribeirão do Carmo e Gualaxo do Sul. Na região de Ouro Preto Antônio Dias e Padre João de Faria Fialho e muitos e muitos outros, como Francisco da Silva Bueno, Paschoal da Silva, José de Camargo Pimentel, na região de Camargos. Além de Capitão Salvador de Faria Albernaz, descobridor dos Córregos Passa Dez e Inficionado. E Domingos Borges em Catas Altas, seguido de Antônio Bueno desbravou Catas-Altas, Bromado e Santa Bárbara. Enquanto Camargo explorava o Ribeiro, a quem dera o nome, Bento Rodrigues, seguindo a mesma cadeia de montes da parte de Noroeste, fez outro notável descobrimento a 3 quarto de légua daquele, denominando se por isso Descoberto e Povoação de Bento Rodrigues. Dessa forma, foram povoados assim as Minas de Itaberaba, Miguel Garcia, Ouro Preto, Ribeirão do Carmo, Rio da Velhas (Manuel Borba Gato), Sabará, Caeté, Camargos, Bento Rodrigues, Inficionado [atual distrito de Mariana, Santa Rita Durão], Piracicaba, Catas Altas, Bromado [Brumal], Ribeirão de Santa Bárbara, Serro do Frio, Sumidouro, Guarapiranga, etc.9

Estes homens, ávidos de ouro, cabedais e mercês, hoje considerados genocidas desalmados e exterminadores da fauna e da flora, naquela época e nos tempos seguintes foram considerados, homens indômitos, destemidos, uma verdadeira “raça de gigantes”, como escreveu alhures o viajante francês Auguste de Saint-Hilaire. Dentre estes homens, o que interessa aqui é Bento Rodrigues, o homem e o lugar. Aliás de tão parcas informações e referências, sobretudo o homem, que provavelmente teria a mesma pureza e a mesma jaça de seus contemporâneos e conterrâneos. Para onde ele foi e onde ele se encontra naquele quase ínvio sertão que é o passado? A primeira notícia ou informação, sobre Bento Rodrigues, como já disse, data de fins do século XVII, mais precisamente do ano de 1697. Trata-se do documento “Notícia – 3ª Prática – Que dá ao R. P. Diogo Soares o Mestre de Campo José Rebello Perdigão, sobre os primeiros descobrimentos das Minas Gerais do Ouro”, datada de 2 de janeiro de 1733, que faz parte de uma série de “Notícias” elaboradas por pessoas que residiam em Minas desde os primeiros tempos, para os cartógrafos 9

Revista do Arquivo Público Mineiro, 1899, p. 83-98. (Grifo meu)

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jesuítas Diogo Soares e Domingos Capassi, os “padres matemáticos” que viajaram no final de 1732, esta foi “assinada pelo mestre-de-campo José Rebello Perdigão, que era secretário do governador Artur de Sá e Menezes10, também companheiro da viagem que este fez às Minas, em 1700, e, à época da passagem dos padres, já tinha se instalado como minerador na região do Ribeirão do Carmo” 11: Depois deste primeiro descobrimento [Itaberaba] se animou a empreender segundo um Miguel Garcia, descobrindo na foz da Serra da Itatiaia um ribeirão a que deu então o nome, e se chama agora o Gualaxo do Sul; mas como neste descobrimento recusaram os paulistas, ou naturais de S. Paulo, a dar partilha nas lavras aos de Taubaté, desconfiados estes lançaram sua Bandeira, e por cabo dela a um Manoel Garcia, e com tanta felicidade que em breve tempo descobriram o celebrado e rico Ouro Preto. Com esta notícia chegou de Povoado tanta gente, que apenas se repartiram três braças de terra a cada um dos mineiros por cuja causa lançou nova Bandeira um Antônio Dias, e correndo a mesma serra descobriu o ribeiro que hoje chamam do mesmo nome, que com a continuação e disposição que lhe deram, é agora uma continuada rua, e forma a rica Vila de Ouro Preto. Com a mesma emulação fez sua tropa o Pe. João de Faria, e em breve tempo descobriu o Ribeiro de seu nome: porém como os que tinham mais armas, e mais séquito eram sempre nestes descobrimentos os mais bem aquinhoados, determinaram os mal contentes formarem novas Bandeiras uma destas descobriu e socavou o Ribeiro que chamam Bento Roiz [Bento Rodrigues], nome do cabo, de tanta grandeza, que tiraram nele algumas bateadas de duzentas e trezentas oitavas: sendo a pinta geral de duas, e três oitavas; e foi tanta a gente, que concorreu, que no ano de 1697, valeu o alqueire de milho sessenta e quatro oitavas, e o mais à proporção.12

O segundo documento que faz referência a Bento Rodrigues na data de 1700, que é de suma importância para história dos primórdios das Minas, são as “Notícias dos primeiros descobridores das primeiras minas do ouro pertencentes a estas Minas Gerais, pessoas mais assinaladas nestes empregos e dos mais memoráveis casos acontecidos desde os seus princípios”, foi escrito perto de 1750, cuja autoria é atribuída sem contestação a Bento Fernandes Furtado, bandeirante e também filho do sertanista ou bandeirante, coronel Salvador Fernandes Furtado de Mendonça, um dos primeiros descobridores e povoadores do Ribeirão do Carmo, atual Mariana (ca. 1701).

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Governou a Capitania do Rio de Janeiro cuja jurisdição abrangia os territórios das futuras capitanias de São Paulo e Minas Gerais, de abril de 1697 a junho de 1702. BARBOSA, 1979, P. 599. 11 RENGER, 2007, P. 118-9 12 TAUNAY, 1981, P. 173 (grifo meu). Esta mesma “Notícia” foi publicada também na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. 1908, p. 277-87 e um excerto em LIMA JUNIOR, 1957, p. 47-53 – (grifos meu)

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Estas “Notícias...”, fazem parte de um conjunto de documentos dos séculos XVII e XVIII, coligidos por Caetano da Costa Matoso, no período em que foi Ouvidor de Vila Rica (1749-1752), conhecido como Códice Costa Matoso. Nele, o nome Bento Rodrigues aparece em duas curtas citações. Sendo a primeira, bastante esclarecedora, ainda que parcialmente sobre Bento Rodrigues e refere-se à descoberta e ao fundador e à fundação da povoação no ano de 1700: No mesmo ano de 1700, Tomás Lopes de Camargo, parente contíguo do alcaide-mor José de Camargo Pimentel, descobriu ouro em o morro de Vila Rica, que ao depois senhoreou a ambição do mestre-de-campo Pascoal da Silva, cujo nome ficou suposto naquele; e a este exemplo se foi estendendo o povo por ele, e até hoje está povoado e tem dado consideráveis // milhões de cabedal e muitas capelas fundadas nele. Seguindo o mesmo morro, à margem pela parte oriental, mais chegado, porém, à serra, caminhou Bento Rodrigues, taubateano, e descobriu o lugar também hoje chamado Bento Rodrigues, havido de seu próprio descobridor, distante do Ouro Preto quatro para cinco léguas, que deu grosso cabedal, e ainda hoje está dando, com povoação de uma famosa capela, continuando seus haveres pela mesma serra, onde hoje há várias lavras, como são as do coronel João Rodrigues Fraga, o Capitão João Favacho, transferido no capitão Caetano Ferreira Fialho por venda que lhe fez por 50 mil cruzados, e outros vários, que estão descavando os montes, minando penhascos e cortejando o coração da terra por haver os seus haveres.13

Na segunda citação, no mesmo “Códice”, a referência a Bento Rodrigues aparece em outro documento, “Notícias do descobrimento das minas de ouro preto e dos governos políticos nelas havidos.”, também de cerca de 1750, escrito por um forasteiro que esteve em Minas, e segundo ele, “Eu fiz quatro viagens a estas Minas, em que gastei alguns três anos pela dificuldade do caminho, e vim a ficar cá em 1702...”14. Nele também foram arrolados os principais locais de novas descobertas auríferas e os seus descobridores: E logo se descobriu o ribeiro de Antônio Pereira Dias, filho de Parati, e o Brumado do Sumidouro, por João Pedroso, paulista; (...) este Itacolomi ou Gualaxo, por João de Melo, paulista; o ribeirão do Carmo, por João Lopes de Lima, paulista; São Bartolomeu, por Dionísio da Costa, de Santos; Ouro Preto, não sei quem foi; Antônio Dias, por um Antônio Dias; Bento Rodrigues, um taubateano do mesmo nome; o Inficionado [atual distrito de Mariana, Santa Rita Durão], Sebastião de Siqueira e o coronel João da

Códice Costa Matoso, 1999, p. 176-7 (grifo meu). Estas mesmas “Notícias”, já foram transcritas de forma resumida na Revista do Arquivo Público Mineiro, 1899, Págs. 83-98; e na íntegra em TAUNAY, 1981, Págs. 23-62. Este também, será um dos documentos mais citados, não só sobre Bento Rodrigues mas sobre todos as descobertas de minas de ouro na primeira metade do setecentos nesta região. 14 Idem, p. 246 13

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Veiga. E se foram seguindo Sabarabuçu, que [é] hoje o Sabará e todos os mais...15

Sobre estes dois documentos, conjectura-se que ambos autores, José Rebello Perdigão e Bento Fernandes Furtado, se não conviveram ou conheceram Bento Rodrigues, tinham dele uma memória muito recente, já que foram de alguma forma contemporâneos e conterrâneos, sendo que o primeiro em seu relato, refere-se a Bento Rodrigues como “cabo, de tanta grandeza” e o segundo, afirma que ele era "taubateano”. A terceira fonte sobre Bento Rodrigues é talvez uma das mais interessantes das três, primeiro porque traz mais informações sobre a qualidade do ouro de sua mina e mais um dado sobre o seu suposto passado, e segundo, por se tratar de um livro, portanto uma obra impressa no início do século XVIII em plena “corrida do ouro” das gerais e a formação da Capitania, que agora se transformaria no centro das atenções dos mineiros, brasileiros, portugueses e outras nações europeias. A obra, “Cultura e opulência do Brasil”, de autoria de André João Antonil foi publicada em Lisboa no ano de 1711. De acordo com José Honório Rodrigues, ele foi um padre jesuíta italiano que morou e morreu no Brasil (1649-1716), cujo verdadeiro nome seria, João Antônio Andreoni, e o seu livro foi publicado em 1711, e trazia “indicação sobre os melhores roteiros para se chegar às minas...”. “Mal impresso, com todas as licenças da censura, foi a obra destruída por ordem régia, sobrevivendo poucos exemplares, sete ao que se sabe.” (RODRIGUES, 1979, p. 393). Não tendo ido às Minas, Antonil não dispunha de informação tão à mão, e esta é a razão por que ela ocupa apenas um quarto da obra. A redação baseiase em informação oral dada por pessoas que foram às capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo, ou às próprias Minas, e faz supor que vários capítulos não são de sua redação. (...) houve três etapas na elaboração do livro: 1) entre 1693 e 1698 a redação da parte açucareira; 2) entre 1704 e 1707 ele atualiza a obra dando os preços correntes; 3) entre 1707 e o fim do ano de 1709 ele redige a segunda, terceira [das minas] e quarta partes.16

Antonil, começa o seu célebre e muito citado relato sobre as primeiras descobertas de ouro em Minas, por obra de um mulato, que fazia parte do séquito de uma bandeira de paulistas:

15 16

Idem, p. 245 (grifo meu) RODRIGUES, 1979, P. 401-2

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Das minas do ouro, que chamam gerais e dos descobridores delas. Há poucos anos que se começaram a descobrir as minas gerais dos Cataguás, governando o Rio de Janeiro Artur de Sá17; e o primeiro descobridor dizem que foi um mulato que tinha estado nas minas de Paranaguá e Curitiba. Este, indo ao sertão com uns paulistas a buscar índios, e chegando ao cerro Tripuí desceu abaixo com uma gamela para tirar água do ribeiro que hoje chamam do Ouro Preto, e, metendo a gamela na ribanceira para tomar água, e roçando-a pela margem do rio, viu depois que havia nela granitos da cor do aço, sem saber o que eram, (...); e fazendo-se exame deles, se achou que era ouro finíssimo.18

E na sequência, como nos dois relatos anteriores, os diversos bandeirantes paulistas, inclusive Bento Rodrigues, foram descobrindo outras minas: Em distância de meia légua do ribeiro de Ouro Preto, achou-se outra mina, que se chama a do ribeiro de Antônio Dias; e daí a outra meia légua, a do ribeiro do Padre João de Faria; e, junto desta, pouco mais de uma légua, a do ribeiro do Bueno e a de Bento Rodrigues. E, daí a três dias de caminho moderado até o jantar, a do ribeiro de Nossa Senhora do Carmo, descoberta por João Lopes de Lima, além de outra, que chama a do ribeiro Ibupiranga. E todas estas tomaram o nome dos seus descobridores, que todos foram paulistas.19

Excerto fac-símile do livro de Antonil de 1711

No capítulo “Do rendimento dos ribeiros e de diversas qualidades de ouro que deles se tira.” Antonil nos traz informações bastante interessantes sobre os rendimentos e a qualidade do ouro retirado da mina de Bento Rodrigues:

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Como vimos em nota supra, Artur de Sá governou entre 1697 e 1702, portanto para ele foi neste período que foram descoberta estas minas na região. 18 ANTONIL, 1982, P. 164 19 Idem, p. 164

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Das Minas Gerais dos Cataguás as melhores e de maior rendimento foram, até agora, a do ribeiro do Ouro Preto, a do ribeirão de Nossa Senhora do Carmo e a do ribeiro de Bento Rodrigues, do qual, em pouco mais de cinco braças de terra, se tiraram cinco arrobas de ouro. (...)

Excerto fac-símile do livro de Antonil de 1711 Chamam os paulistas ribeiro de bom rendimento o que dá em cada bateada duas oitavas de ouro. Porém, assim como há bateadas de meia oitava e de meia pataca, assim há também bateadas de três, quatro, cinco, oito, dez, quinze, vinte e trinta oitavas e mais, e isto não poucas vezes sucedeu na do ribeirão, na do Ouro Preto, na de Bento Rodrigues e na do rio das Velhas. (...) O ouro do ribeiro de Bento Rodrigues, posto que seja mais grosso e palpável, e bem amarelo, contudo não tem a perfeição do ouro preto e do ouro do ribeirão, mas, quando muito, chega a vinte quilates. O ouro do ribeirão do Campo, e do ribeirão de Nossa Senhora do Monteserrate, é grosso, e muito amarelo, e tem vinte e um quilates e meio. O ouro do rio das Velhas é finíssimo e chega a vinte e dous quilates.20

A última citação de Antonil sobre Bento Rodrigues, não deixa de ser interessante, mas criam um novo problema. A traçar o “Roteiro do caminho da vila de São Paulo para as minas gerais e para o rio das Velhas”, ele nos diz que “Gastam comumente os paulistas, desde a vila de São Paulo até as minas gerais dos Cataguás, pelo menos dous meses..”21 Aí cita, uma série de localidades, primeiro paulistas e depois mineiras, povoados, vilas tais como, Nossa Senhora da Penha, a aldeia de Itaquequecetuba, a vila de Moji, as

20

Idem. Sobre estes pesos, medidas e a qualidade do ouro: 1 arroba = 14,7kg; 1 onça = 28,6875g, 1 oitava = 3,586g (8 oitavas é igual a 1 onça); um braça = 2,20 m; o quilate mede sua pureza, sendo que o mais puro metal chega a 24 quilates e bateada é cada vez que a bateia é mergulhada no aluvião e junto com a lama vem o precioso metal. 21 Idem, p. 181

14

Laranjeiras, a vila de Jacareí, vila de Taubaté, Pindamonhangaba, na freguesia de Nossa Senhora da Conceição, a vila de Guaratinguetá ainda no lado paulista: De Guaratinguetá até o porto de Guaipacaré, aonde ficam as roças de Bento Rodrigues, dous dias até o jantar. Destas roças até o pé da serra afamada de Amantiqueira, pelas cinco serras muito altas, que parecem os primeiros muros que o ouro tem no caminho para que não cheguem lá os mineiros, gastam-se três dias até o jantar.22

Excerto fac-símile do livro de Antonil de 1711 Esta foi a parte mais intrigante, “De Guaratinguetá até o porto de Guaipacaré, aonde ficam as roças de Bento Rodrigues.” Teria Bento Rodrigues ter sido roceiro antes de ser bandeirante?

DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: BIOGRAFIA NÃO AUTORIZADA E INCOMPLETA O que temos até agora sobre o homem Bento Rodrigues? O mestre-de-campo José Rebello Perdigão, nos informa que no ano de 1697, Bento Rodrigues, cabo, ou seja, um suboficial, de tanta grandeza, separou-se de uma bandeira e descobriu um ribeirão muito rico, onde cada bateada trazia de duzentas a trezentas oitavas, muito diferente das outras minas onde as bateadas eram somente de duas ou três oitavas, inflacionando inclusive os preços dos gêneros alimentícios como o milho.23

22 23

Idem, p. 182 TAUNAY, 1981, P. 173

15

Já Bento Fernandes Furtado, nos relata que foi no ano de 1700, quando inúmeros bandeirantes descobriam ouro na região de Ouro Preto, o bandeirante taubateano, Bento Rodrigues, descobriu um lugar, que hoje leva o seu nome, muito rico em ouro e onde foi construída uma famosa capela. 24 O jesuíta Antonil, fixa sem falar um data específica, que a exploração da mina de Bento Rodrigues teve início como as demais no governo de Artur de Sá, portanto, entre 1697, data de Perdigão e 1702, um pouco depois da data de Fernandes Furtado. E de certa forma também corrobora com mais precisão a riqueza da mina de Bento Rodrigues, especificando o peso da quantidade de ouro que vinha em cada bateia, apesar de mostrar também que o ouro daquele ribeiro não tinha um teor muito alto. E com a informação de que no caminho, ou melhor, no roteiro para as minas, tinha uma localidade denominada “roças de Bento Rodrigues”, irá nos fazer crer que Bento Rodrigues, antes de ser bandeirante, era roceiro, agricultor e fazendeiro, como aliás, muitos bandeirantes, como por exemplo, o mais lendário de todos, Fernão Dias Paes, apesar dele não ser citado nestes três documentos pesquisados. 25 Continuando com a minha pesquisa, verifiquei que Taunay, em sua “História das Bandeiras Paulistas”, menciona que “as roças de Bento Rodrigues”, seria a atual cidade de Lorena em São Paulo. E buscando mais informações sobre Lorena, descobri que o Bento Rodrigues das roças, seria outro: Bento Rodrigues Caldeira, fazendeiro de grande cabedal e um dos fundadores de Lorena que aí morreu abastado em 1712.26 Entretanto, segundo Basílio de Magalhães: “Diogo de Vasconcelos assevera que aquele bandeirante [Bento Rodrigues], estabelecido em Guaipacaré (atual Lorena, a qual também se chamou, por aquele tempo, `Roças de Bento Rodrigues´), subira com Artur de Sá para as Minas em 1700”.27 A citação completa de Diogo de Vasconcelos é:

24

Códice Costa Matoso, 1999, p. 176-7 ANTONIL, 1982, P. 164, 166 e 182. 26 TAUNAY, 1951, P. 316, T. II; Disponível em: Acesso em 25 nov. 2015 27 MAGALHÃES, 1978, P. 138 25

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Uma légua pequena além dos Camargos, Bento Rodrigues, que de sua roça do Guaipacaré, perto de Guaratinguetá, havia subido com Artur de Sá, achou o ribeiro, a que deu seu nome, e de onde em cinco braças de extensão tirou cinco arrobas de ouro, caso que deu lugar à invasão dos flibusteiros em tal desordem, que desse arraial fizeram o mais barulhento lugar da antiguidade (1702)28. No “Dicionário de Bandeirantes e Sertanistas do Brasil”29, de Francisco de Assis Carvalho Franco, Bento Rodrigues aparece como um paulista que foi um dos que destruiu Vila Rica no Paraguai na luta contra os jesuítas entre 1631-2. Se for o mesmo que esteve nas Minas em torno de 1700, ele já seria no mínimo octogenário... O prenome Bento foi muito comum no Brasil setecentista e oitocentista e o sobrenome Roiz ou Rodrigues também, mas Bento Rodrigues encontrei poucos. Outro que vi citado foi no livro, “A cana-de-açúcar em Minas Gerais”, de Miguel Costa Filho, em uma demanda judicial. O fato aconteceu no Arraial de Caeté, em 1704, quando um tropeiro, Diogo Corrêa, tinha sido acusado de transportar açúcar e aguardente por estrada proibida, e o meirinho que o autuou foi um de nome Bento Rodrigues. O réu foi absolvido e só.30 Assim, o mistério sobre onde e quando Bento Rodrigues, o homem, nasceu, viveu e morreu, permanece, até que pesquisadores mais experientes, encontre em algum livro de registro de batismos e óbitos de paróquias paulistas e mineiras a verdadeira história deste intrépido bandeirante taubateano descobridor de ouro que fundou esse trágico distrito aurífero de Bento Rodrigues.

28

VASCONCELOS, 1974, P. 181 FRANCO, 1989, P. 342 30 COSTA FILHO, 1963, P. 60-1 29

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DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: NO MEIO DA ESTRADA REAL TINHA UM DISTRITO DO OURO

Mapa da Estrada Real em detalhe a região de Bento Rodrigues e o roteiro dos viajantes.

Atualmente, Bento Rodrigues, fazia parte da chamada Estrada Real, um circuito/roteiro turístico que tem a chancela do Sistema FIEMG, criado em 1999, com cerca de 1600 quilômetros de extensão.. A Estrada Real é a maior rota turística do país, passando por Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Hoje, ela resgata as tradições do percurso valorizando a identidade e as belezas da região. O roteiro segue basicamente os antigos caminhos oficiais de transporte de mercadorias, escravos, ouro e diamantes e que serviam de ligação entre as minas e o litoral e que surgiram em fins do século XVII, que inclusive foram citados por Antonil e continuaram sendo utilizados até os dias de hoje. São quatro roteiros, o que era conhecido como o “Caminho do Ouro ou Caminho Velho”, ligando Ouro Preto a Paraty; “O caminho novo” 18

ligando Minas diretamente ao Rio de Janeiro; o “Caminho Sabarabuçu”, ligando Ouro Preto a Sabará. E por último e que nos interessa de fato é o “Caminho dos Diamantes”, que liga Ouro Preto a Diamantina, principalmente o trecho que vai de Mariana, passando por Camargos até Bento Rodrigues.31 Durante todo o século XVIII e boa parte do XIX, este caminho foi utilizado inicialmente por bandeirantes, militares, comboio de escravos, transportes de mercadorias, ouro, diamantes e por tropeiros em geral, depois por viajantes nacionais e estrangeiros e outras personalidades, inclusive pela comitiva do Imperador D. Pedro II que também foi um dos seus mais ilustres peregrinos, passando aí em 1881. Depois de Bento Rodrigues, passando pelo distrito, é claro, para se chegar até Diamantina, chegavam-se, dentre outras localidades, a Santa Rita Durão (antiga Inficionado), Catas Altas, Santa Bárbara, Barão de Cocais, Caraça e Serro. Do século XVIII, um dos mapas mais antigos que mostram a região onde se localiza Bento Rodrigues é o mapa de cerca de 1735, elaborado pelos “padres matemáticos” que nos referimos antes, cujos cartógrafos seriam os jesuítas, o Padre Diogo Soares e Domingos Capassi. Apesar de não nominar o arraial de Bento Rodrigues, ele aparece entre Camargos e Inficionado (atual Santa Rita Durão)32:

31 32

Disponível em: Acesso em: 01 dez .2015 RENGER, 2007, P. 120-2

19

Mapa de Diogo Soares e Domingos Capassi (ca. 1735) em detalhe a região de Bento Rodrigues e o roteiro da antiga Estrada Real onde Bento Rodrigues aparece às margens do ribeiro do mesmo nome que deságua no Rio Gualaxo do Norte, hoje, o “rio da lama da Samarco”

O mapa seguinte, onde aparece nitidamente o distrito de Bento Rodrigues na “estrada real”, entre Camargos e Inficionado é o mapa “Carta Geográfica do Termo de Villa Rica”, datada de 1766, atribuído ao poeta Claudio Manuel da Costa, por Augusto de Lima Junior:33

33

LIMA JUNIOR, 1942, P. 94-5

20

Carta Geográfica do Termo de Villa Rica, 1766, de Claudio Manuel da Costa – além de mostrar a região de Bento Rodrigues (Bento Roiz) e a antiga Estrada Real, apresenta uma imprecisão, o Rio Gualaxo do Norte deságua no Gualaxo do Sul e não no Rio Doce.

Outro mapa que é bastante utilizado por pesquisadores dos caminhos e lugares antigos e que aparece como anexo no livro de José Joaquim da Rocha, “Geografia Histórica da Capitania de Minas Gerais” escrito em 1780, é o “Mappa da Comarca de Villa Rica”, datado de 177934:

Mapa da Comarca de Villa Rica, de 1779, de José Joaquim da Rocha, onde são mostradas além de Bento Rodrigues as localidades por onde a antiga Estrada Real passava.

34

ROCHA, 1995

21

DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: OS RELATOS E OS MAPAS DOS VIAJANTES ESTRANGEIROS A partir do início do século XIX, mesmo o Brasil ainda vivendo dentro do estatuto colonial, um fato histórico de grande relevância iria trazer para o País e a Capitania de Minas uma novidade até então praticamente inconcebível nos quadros do antigo sistema colonial português: a visita, porque não dizer a invasão de viajantes estrangeiros que iriam, como novos bandeirantes, devassar novamente o território das Minas, só que agora quase exangues do ouro aluvional e dos diamantes. Bento Rodrigues iria recebe-los às vezes como uma manchinha em seus mapas, outras vezes como uma simples nota, ou uma incômoda passagem obrigatória, mas estaria ali, como havia escrito Cornélio Penna, firme, com “o seu sonho imperial de ferro e ouro” esperando o que o destino algum dia lhe provesse com alguma coisa melhor que ouro! O fato histórico que mudaria doravante o destino do Brasil, ainda que de forma lenta, foi a fuga da família real para o Brasil e o seu estabelecimento no rio de Janeiro em 1808 e “a abertura dos portos às nações amigas”. Com esta canetada em 28 de janeiro de 1808, de fato o pacto colonial fora rompido e o que se pretendia era isso mesmo, ainda que de forma restrita, preferencialmente para os ingleses, no Brasil pela primeira vez, “São abolidas, umas atrás da outra, as velhas engrenagens da administração colonial, e substituídas por outras já de uma nação soberana”35.” E não só mercadorias e capitais circulariam livremente em todo o território, mas também homens e ideias – desde que tivessem autorização, por suposto. Alguns destes novos “emboabas” que vieram d´além mar, vieram de vários países e foram movidos por interesses diversos, mas todos possuíam um em comum, a curiosidade, curiosidade principalmente, pela região menos conhecida que eram as Minas Gerais, e uns lugarzinhos que tinham certos nomes como Vila Rica, Distrito Diamantino, mina de Gongo Soco, Ouro Fino, Ouro Preto, Ouro Branco... Dentre eles vieram comerciantes, naturalistas - não nos esqueçamos, alguns deles foram contemporâneos de Charles Darwin (1809-1882), que se não esteve em Minas, pelo menos esteve no Brasil e não gostou muito -, cartógrafos, mineralogistas, engenheiros, artistas ou aventureiros simplesmente, como Richard Burton. Outros possivelmente, vieram apenas espionar, pois muitos fizeram o trajeto da Estrada Real, passando por Bento Rodrigues onde os caminhos e descaminhos ainda levavam ao ouro e ao diamante mais ao norte. E todos 35

PRADO JUNIOR, 1983, P. 47

22

escreveram uma ou inúmeras obras, como Auguste de Saint-Hilaire e Eschwege, sobre aquela exótica e misteriosa paragem tão movediça, com uma flora e uma fauna tão exuberante, onde ainda tinham índios, escravos, riquezas e paradoxalmente, talvez por isso mesmo, muita pobreza e ignorância. Primeiro vieram os ingleses, é claro. JOHN MAWE O primeiro viajante estrangeiro a visitar Minas, foi o comerciante inglês John Mawe (1764-1829)36. Mawe, chegou ao Brasil em 1807 e no dia 17 de agosto de 1809, com o destino e mente fixos nas minas de diamantes do Serro do Frio, foi o primeiro inglês de forma consentida a fazer aquela viagem, parte com sua comitiva para Minas, seguindo o roteiro do “Caminho Novo”. Depois de passar alguns dias em Vila Rica (Ouro Preto), atravessou Mariana e seguiu viagem, rumo ao Tijuco (atual Diamantina) pelo “Caminho dos Diamantes”. Em 1812, ele publicaria o seu livro na Inglaterra, “Viagem ao interior do Brasil”, onde registraria sua lacônica impressão sobre Bento Rodrigues: Descansei em Camargo, pequena aldeia, e passei em frente a uma bela vivenda situada perto do córrego do mesmo nome, onde há uma lavagem de ouro que ocupa duzentos negros e que dizem ser riquíssima. Uma légua além está Bento Rodrigues, lugar pobre, de pouca importância; às seis da tarde, entrei em Inficcionado [atual distrito de Mariana, Santa Rita Durão], grande aldeia, com população de mil e quinhentos habitantes37. Mawe, retornou pelo mesmo caminho, e desta vez foi mais lacônico ainda: “Viajei, em seguida, por uma terra aurífera, atravessei a aldeia de Santa Bárbara e cheguei a Catas Altas, donde fui à Vila Rica, não observando nada digno de nota”38. John Mawe voltou para a Inglaterra em 1811 e em seu livro publicado em 1812, consta do “Itinerário do Autor” da viagem que fez às Minas Gerais, nele o “lugar pobre” Bento Rodrigues, não aparece:

36

Apenas por curiosidade, o segundo viajante estrangeiro a visitar o Brasil, foi também um inglês, John Luccock, permanecendo aqui de 1808 a 1818. Apesar de ter ido a Ouro Preto e Mariana, não esteve na região de Bento Rodrigues, em 1820 publicou o livro “Notas sobre o Rio de Janeiro e partes meridionais do Brasil”. 37 MAWE, 1978, P. 143 (grifo meu) 38 Idem, P. 178

23

Mawe, em seu itinerário de 1812, não identifica Bento Rodrigues, mas pelo “Caminho dos Diamantes” e outros, procura identificar os lugares onde estão localizadas as “gold mines” (minas de ouro)

WILHELM LUDWIG VON ESCHWEGE O segundo viajante que passou por Bento Rodrigues foi o “alemão”, Wilhelm Ludwig von Eschwege (1755-1855), conhecido como Barão de Eschwege, era engenheiro, geólogo, mineralogista dentre outras coisas. Permaneceu no Brasil de 1810 a 1821 e escreveu cerca de 23 trabalhos sobre o Brasil. Citarei duas de suas obras, “Pluto brasiliensis”, publicada em 1833, que mencionarei primeiro, por que foi traduzida primeiro e “Jornal do Brasil”, publicada em 1818. Veio para o Brasil a convite do futuro imperador D. João VI (1767-1826), que já o conhecia por seus serviços mineralógicos no Reino, para no Brasil estudar a situação das riquezas minerais do Brasil (diga-se de Minas Gerais), além de melhorar suas explorações, técnicas e sua legislação, enfim, Eschwege, seria e foi neste período de dez anos o geólogo/mineralogista/industrial e legislador-real das riquezas minerais. 24

Chegou em Minas em 1811 e percorreu praticamente todo a região, inclusive esteve na região da Galena, bem no oeste de Minas, onde foi mal sucedido em uma extração de chumbo e prata. Seu livro, “Pluto Brasiliensis” (Riquezas do Brasil), foi dividido em dois volumes. No primeiro, o arraial de Bento Rodrigues apenas aparece no mapa “Parte da Nova Carta da Capitania de Minas Gerais, levantada por W. L. von Eschwege”39.

W. L. von Eschwege em seu mapa “Parte da Nova Carta da Capitania de Minas Gerais”, ele identifica claramente Bento Rodrigues no “Caminho dos Diamantes” que ele iria percorrer em 1811.

No segundo volume, a partir de 1811, Eschwege realiza uma série de viagens pela região de Ouro Preto e Mariana e daí, pelo “Caminho dos Diamantes”, passando por Bento Rodrigues:

39

ESCHWEGE, 1979, P. 34, V. 1

25

Na saída da cidade de Mariana, começam o itabirito e o xisto argiloso, (...) Na região se encontra Camargos, outrora rica em ouro, mas onde, atualmente, só seis lavras estão sendo exploradas, ocupando apenas sessenta e oito escravos e noventa e cinco faiscadores, livres e escravos, que dali conseguem o necessário para a sua subsistência. (...) À esquerda da estrada, na direção da Serra do Caraça, acompanha-se a linha de cumeada da serra, (...) Junto de Bento Rodrigues, alcança-se o Rio Gualaxo, que corre à esquerda da Serra de Antônio Pereira e se reúne ao Ribeiro do Carmo, depois de um percurso de dez a quatorze léguas. Esse rio é muito rico em ouro e, ainda em 1812, nele existia um importante serviço, de propriedade do Capitão-mor de Mariana. O proprietário fizera um cerco e esgotara as águas mais profundas por meio de um rosário. (...) De Bento Rodrigues atinge-se a crista da serra, constituída de itacolomito de aspecto singularmente uniforme, a qua1 é o divisor de água dos Rios Gualaxo e Piracicaba. Este tem suas últimas nascentes em Inficionado e recebe, depois do percurso de algumas léguas, o Rio Santa Bárbara40. Em páginas seguintes, Eschwege nos descreve o estado de penúria de Bento Rodrigues e das outras minas que ele foi contratado para salvar: Comece-se por Vila Rica, percorra-se a estrada e visitem-se os sítios mais importantes de outras regiões! Por toda parte se verão somente casas miseráveis e em ruínas, e mesmo ruas inteiras, que atestam uma prosperidade e uma população que não existem mais. Vila Rica perdeu, desde aquele tempo, mais de oito mil mineiros. Camargo, Bento Rodrigues, Inficionado [atual distrito de Mariana, Santa Rita Durão], Catas Altas, Brumado, Itambé, Morro do Pilar, Conceição, Congonhas do Serro, Paraúna, Congonhas do Campo, Sabará, Pitangui e Paracatu falam bastante, pois a maioria da população caiu na pobreza e os serviços de mineração, outrora importantes, estão agora no abandono41.

No livro “Jornal do Brasil - 1811-1817”, aparece o mesmo trecho citado no “Pluto Brasiliense”, mas como disse supra, o “Jornal” foi publicado mais de dez anos antes, mas só recentemente traduzido no Brasil: Deve-se iniciar a viagem por Vila Rica, seguindo a estrada para o Serro do Frio, visitando os povoados mais notáveis, onde se veem casas miseráveis e até ruas inteiras em ruínas que atestam a antiga prosperidade e a grande população. Desde então, Vila Rica e Mariana perderam mais de 8 mil mineiros. Os lugarejos de Camargos, Bento Rodrigues, Inficionado, Catas Altas, Brumado, Itambé, Morro do Pilar, Conceição [do Mato Dentro], Congonhas do Serro, Paraúna, Congonhas do Campo, Sabará, Pitangui e Idem, p. 12 – (grifo meu) – Digressão difícil não se lembrar que foi nestes rios e ribeiros, neste mesmo cenário, outrora ricos mananciais de ouro que teve início a tragédia de 5 de novembro de 2015... 41 ESCHWEGE, 1979, P. 155-6, V. 2 40

26

Paracatu são testemunhas, se não do despovoamento e da pobreza, pelo menos das Grandes atividades da antiga mineração, que ora se encontram totalmente abandonadas42.

AUGUSTE DE SAINT-HILAIRE Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853), foi um viajante francês que ficou no Brasil de 1816 a 1822. Aqui percorreu os estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, São Paulo, dentre outros. E foi por assim dizer, um naturalista completo. Além de estudar, descrever e catalogar a fauna, a flora, os acidentes geográficos e o reino mineral, Saint-Hilaire, nos seus inúmeros livros, não se descuidou das obras humanas, onde fez o mesmo com a agricultura, pecuárias, “as belas artes”, as instituições e a sociedade mineira (uma mistura espessa e difusa de índios, escravos e livres), descrita como numa epopeia filmada e posta em exibição sem revisão técnica. No mesmo ano que chega ao Brasil, 1816, parte para Minas, onde viaja praticamente por todas as comarcas inclusive a recém criada Comarca de Paracatu que cobria o noroeste de Minas e o Triângulo Mineiro. Do Rio de Janeiro, pelo “Caminho Novo”, chega a Ouro Preto e Mariana, depois, pelo “Caminho dos Diamantes”, rumo a Catas Altas, passando por Bento Rodrigues: A região que atravessamos entre Mariana e a povoação de Camargos, em que fizemos alto, não apresenta nenhum vestígio de cultura. Camargos, sede de uma paróquia, está situada à margem de um regato em posição bastante triste, rodeada de morros desolados, esburacados pelos mineradores de ouro. Seus atuais habitantes são muito pobres; possuem muito poucos escravos para manter lavagens de certa importância, e suas casas estão mal conservadas. (...) A distância pouco considerável de Camargos, passamos por Bento Rodrigues, outra povoação situada à margem de um córrego, entre morros pouco elevados, e que apresenta aspecto bastante pitoresco com a presença de numerosas bananeiras plantadas pelos habitantes em torno de suas casas”. Além de Bento Rodrigues, avistamos repentinamente a Serra do Caraça, um dos pontos mais elevados da cadeia ocidental, e em breve chegamos a Inficionado [atual distrito de Mariana, Santa Rita Durão]. Essa povoação, situada a quatro léguas ao norte de Mariana, é considerável e bem edificada. É a sede de uma paróquia, e na localidade se contam três igrejas. Foi em Inficionado que nasceu o P. José da S. Rita Durão, o autor do poema intitulado Caramuru43.

42

ESCHWEGE, 2002, P. 266. Digressão: Eschwege, além das importantes obras escritas sobre o Brasil, deixou inúmeras inovações técnicas. Entretanto, descrente e como diríamos hoje, e estressado, pelo descaso do próprio governo que o contratara, em 1821 retorna para a Europa. 43 SAINT-HILAIRE, 1975, P. 87-8

27

SPIX E MARTIUS O Barão de Eschwege veio para o Brasil a convite de D. João VI, já os naturalistas austríacos, Johann Baptiste von Spix (1781-1826) e Carl Friedrich Phillipp von Martius (1794-1868), vieram como convidados na comitiva da princesa Dona Leopoldina (17971826), Arquiduquesa da Áustria, futura imperatriz, que havia se casado e que ao vir para o Brasil, em 1817, para assumir o seu lugar como esposa do futuro imperador, D. Pedro I (1798-1834), trouxe consigo cientistas, naturalistas e artistas de seu torrão natal. Spix e Martius, como ficaram conhecidos, sendo o primeiro zoólogo e o segundo médico e botânico, realizaram de 1817 a 1821 um verdadeiro périplo pelo Brasil. Do Rio de Janeiro, foram para São Paulo, depois Minas, depois praticamente todo o nordeste, encerrando suas viagens na Amazônia. Desta viagem surgiu o livro “Viagem pelo Brasil – 1817- 1820” publicado em três volumes em 1823, 1823 e 1823, acompanhado de um mapa de seu roteiro onde Bento Rodrigues aparece.

Detalhe da grande viagem de Spix e Martius de 1817 a 1821, passando por Bento Rodrigues

28

Chegaram em Minas em 1818, depois de passarem por várias cidades, chegam a Vila Rica (Ouro Preto), onde até se encontram com Eschwege, e seguem para Mariana e depois o “Caminho dos Diamantes”: A noroeste de Antônio Pereira instalou o Sr. von Eschwege uma pequena forja de ferro (...). O nosso amigo von Eschwege queixou-se, muitas vezes, das dificuldades que estorvam até hoje neste país todo estabelecimento fabril, citando como principal motivo a repugnância da classe pobre do povo em prender-se a uma ocupação fixa. Da fábrica de ferro, seguimos na direção N.E. para o Arraial de Bento Rodrigues, distante duas léguas e meia. A região é montanhosa, e a superfície do solo em grande parte coberta com a formação de minério de ferro contendo ouro, e dá indício da atividade dos faiscadores pelos numerosos fossos e trincheiras ali abertos. Muito singular nos pareceu o fato de se encontrar nesta aldeia, assim como em muitas outras, poucos vestígios de riqueza. As casas estão em ruínas, muito pobres no interior, e seus moradores têm aparência pobre. Tudo demonstra que a florescência deste distrito já passou e mal aparecem alguns restos da antiga opulência. (...) Junto ao sopé da Serra do Caraça (em Cata-Preta), visitamos ainda diversas minas, antigamente muito ricas, nas quais o metal é extraído moendo a pedra com pilões. É notável por seu colorido amareloacinzentado, e pode ser purificado, com fundição adequada, até 23 quilates. Ainda à tarde, seguimos para o Arraial de Bento Rodrigues, distante uma légua a sudoeste, e pernoitamos num rancho, de onde apreciamos mais uma vez o panorama da bela Serra do Caraça. O pouso estava repleto de mineiros das Minas Novas, que seguiam para o Rio de Janeiro, levando carga de algodão, e nos deram ensejo de apreciar o aspecto bem característico da vida das tropas em viagem. Na região de Bento Rodrigues, acha-se ouro por toda parte, na argila vermelha, que jaz por cima do xisto quartzítico. Como o modo de exploração dessas minas não divergia do que até aqui havíamos visto, não nos demoramos na estrada real, que leva à cidade de Mariana, distante três léguas ao su1 de Bento Rodrigues, para regressarmos a Vila Rica, onde com felicidade, chegamos de novo a 28 de abril [de 1818] 44.

JOHANN EMANUEL POHL O médico e botânico, natural de Kamnitz (Bohemia), Johann Emanuel Pohl (17821834), também veio como convidado da princesa Dona Leopoldina, em 1817. De suas viagens e permanência no Brasil de 1817 a 1821, resultou o livro, “Viagem no interior do Brasil”, em dois volumes publicados em 1832 e 1837, respectivamente. O trajeto da viagem de Pohl, também foi muito grande, do Rio de Janeiro, passou a Minas, depois Goiás, Mato Grosso, retorna a Minas, visitando portanto, todas as comarcas mineiras e o que foi mais interessante, em 1820, ao contrário dos viajantes que o precederam,

44

SPIX e MARTIUS, 1981, P. 247 e 250 (grifos meus)

29

ele faz a viagem partindo do Serro do Frio para Mariana, passando por Catas Altas, Inficionado, por Bento Rodrigues, Camargos e Mariana: Daí, tivemos de subir de novo a serra e, após cansativa marcha, chegamos à desejada ponte [no Rio Piracicaba], que realmente, era melhor passar, embora não de todo sem perigo. Além do rio, fica o Arraial de Inficionado, onde depois entramos. (...) Seguindo para o vale oposto, vimos a oeste, à pequena distância, a grande e bela fazenda pertencente ao Padre Domingos Fraga, situada numa elevação. Este fazendeiro é tido como uma das maiores fortunas do País. Vai-se ao Arraial de Bento Rodrigues por uma estrada, aliás, calçada, mas difícil de passar, de uns 300 passos, em declive. Este pequeno arraial de umas sessenta casas está edificado sobre terreno muito acidentado e possui duas pequenas igrejas e duas estalagens bastante medíocres, numa das quais tivemos hospedagem sofrível. Aqui foi uma das mais antigas explorações de ouro de toda a província e escondia grande riqueza em seu seio. Atualmente encontram-se neste arraial, como em Cocais, Catas Altas, Santa Bárbara e Inficionado, pequenos fornos de fundição de ferro. O Córrego Ouro Fino, que banha Bento Rodrigues e passa bem próximo, desemboca no Rio Gualaxo [do Norte], que desce da Serra de Antônio Pereira e corre para o Rio Camargo. O Gualaxo, que tem seis metros e meio de largura, foi outrora célebre pela sua enorme riqueza em ouro. Conta-se que não raro eram apanhadas numa bateia cerca de 540 gramas de ouro. (...) Em pouco, chegamos ao Arraial de Camargo, onde o Ribeirão Camargo forma uma admirável cachoeira de três braças de altura. O Arraial de Camargo é igualmente uma das mais antigas povoações da Capitania; foi fundado, em 1696, por Tomás Lopes Camargo, de quem proveio seu nome. Fica a uma légua de distância do Arraial de Bento Rodrigues e sempre foi considerado, depois de Vila Rica, como um dos lugares mais ricos em ouro. Considerado como povoação, é um dos piores lugares da região. Conta, no máximo, 60 casas mal construídas e muito mal conservadas, espalhadas numa rua torta, em terreno muito desigual. O melhor edifício de todo o lugar é a igreja, construída de pedra, situada numa elevação a que conduz uma larga escada, na qual se acha um grande cruzeiro de pedra-sabão, que aqui se extrai. (...) Chegamos então ao lado ocidental da Serra do Ouro Preto e, de uma estalagem meio decadente, desfrutamos pela primeira vez, da vista da aprazível Cidade de Mariana”45.

45

POHL, 1976, P. 382-4 - (grifos meus)

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ALEXANDER CALDCLEUGH O mineralogista e viajante inglês, Alexander Caldcleugh (1795-1858) chegou ao Brasil em 1819 e retornou para a Europa no ano de 1821. Em 1825, publica “Viagens na América do Sul”, diário onde relata suas viagens pelo “Brazil, Buenos Ayres, and Chile”, durantes os anos 1819-20-21. Em 1819 desembarca no Rio de Janeiro, depois de viajar por Buenos Aires e Chile, retorna à Capital em 1821 e daí viaja para Minas pelo “Caminho Novo”, passando pelas inúmeras cidades do roteiro até chegar a Vila Rica onde visita os arredores, inclusive Mariana, não pode se encontrar com o Bispo, que para sua “...infelicidade, estava fora, fazendo uma visita em sua diocese”46 Depois retorna a Vila Rica e inicia uma nova viagem, mas ao invés de seguir pelo “Caminho dos Diamantes”, segue pelo “Caminho do Sabarabuçu” rumo a Sabará. Depois como havia ocorrido com Pohl, retorna para Vila Rica pelo “Caminho dos Diamantes”, passando por Catas Altas, Água Quente, Inficionado, Bento Rodrigues, Camargos, Mariana, Vila Rica. Foi um dos mais econômicos comentários sobre Bento Rodrigues, mas...: Conseguimos sair de Inficionado às nove horas e seguimos por uma estrada muito boa, ocasionalmente através de matas mas geralmente sobre colinas relvadas, até Bento Rodrigues. No correr do dia encontramos com vários moradores de Minas Novas47

DOM FREI JOSÉ DA SANTÍSSIMA TRINDADE O bispo Dom Frei José da Santíssima Trindade (1762-1835), apesar de ser também estrangeiro, nascido em Portugal, não veio para o Brasil com a mesma finalidade dos outros “viajantes estrangeiros” e a sua missão não era propriamente de escrutinar a flora, a fauna e as riquezas minerais, mas pacificar o rebanho humano e salvar suas almas, que naquele lugar com tanta riqueza se não houvesse muita cautela e penitência elas estariam perdidas. E fica a pergunta: como estava Bento Rodrigues em termos espirituais quando os viajantes passaram? Seu governo episcopal, como sexto bispo da Diocese de Mariana, criada em 1745, foi de 1820 a 1835, ano de sua morte. Não computei o total dos dias e os quilômetros percorridos pelos viajantes, entretanto, pelos números de suas cinco visitas pastorais por 65 freguesias,

CALDCLEUGH, 2000, p. 125 – O bispo do Bispado de Mariana que estava ausente é Dom Frei José da Santíssima Trindade (bispo de 1820 a 1835), que citarei infra. 47 Idem, P. 153 – (grifo meu) 46

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posso assegurar que o Bispo superou praticamente a todos.

Foram 632 dias e 4.117

quilômetros percorridos de 1821 a 183548. Primeira visitação deste Bispado de Mariana pelo excelentíssimo e reverendíssimo senhor Dom Frei José da Santíssima Trindade no ano de mil oitocentos e vinte e um. Havendo Sua Excelência Reverendíssima chegado à presidência deste Bispado no dia oito de agosto do ano de mil oitocentos e vinte, depois de ter restabelecido o Seminário Episcopal de Nossa Senhora da Boa Morte (que se achava sem uso) a vinte e três de janeiro, saiu a dar princípio a sua visitação no dia três de julho do sobredito ano, começando pela freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Camargos, prosseguindo até Santo Antônio do Tijuco e acabando na freguesia de Antônio Pereira. (...) Freguesia de nossa senhora da Conceição de Camargos, a duas léguas de Mariana, e da corte 84. Esta freguesia, sendo das primeiras do termo de Mariana e muito extensa, hoje é das mais pequenas e mais pobres. Compreende oitocentas e três almas e cento e vinte e cinco fogos: o seu rendimento cobrável com a côngrua andará por 315$000. A igreja tem 5 altares de talha dourada muito antiga, proporcionados à pequena altura do edifício. Ainda se acha com bastante prata e uma grande custódia antiga, porém muito falta de ornamentos, tanto para o comum como para os festivos, e de roupa branca corresponde a sua pobreza, para cujo reparo deram duas casulas para as quatro cores, toalhas para os altares e cortinado pequeno para o sacrário, de esmolas que se pediram. A meia légua distante, tem a capela curada de Bento Rodrigues, [Capela de São Bento] é melhor arraial que o da matriz, e a poucos passos a do Rosário dos pretos, e ambas com pouca decência. A uma légua da mesma matriz, tem a capela chamada das Bicas, bem mal paramentada. Toda a freguesia compreenderá de duas a três léguas e é curada unicamente pelo pároco encomendado Joaquim Leandro [Joaquim Leandro de Azevedo] e o padre Luís Gonzaga, na capela de Bento Rodrigues. PROVIMENTO Dom Frei José da Santíssima Trindade etc. Fazemos saber que no dia 4 de julho do ano de 1821 visitamos a paroquial igreja de Nossa Senhora da Conceição de Camargos na presença do Reverendo Pároco o Padre Joaquim Leandro de Azevedo, clero, nobreza e povo, observando todo o Pontifical. Achamos uma pedra de ara quebrada, que profanamos para nunca jamais servir, assim como também os ornamentos pouco decentes e as paredes do templo e campas bastantemente arruinadas; apesar do zelo que observamos no reverendo pároco no começo da reparação do mesmo templo; é tanta a decadência do país, que não poderá concluir-se sem novo socorro. E porquanto não há fabriqueiro provido e, neste caso, sendo por direito administrador nato da fábrica o reverendo pároco, a este recomendamos que, sendo quase inútil o uso da mobília de prata, lâmpadas e varas de pálio, nas circunstâncias da última decadência do país, requeira ao meritíssimo desembargador provedor das capelas faculdade para poder vender toda a prata mencionada e, com o seu resultado, consertar os ornamentos e as campas da igreja e mais misteres, procedendo a uma exatíssima relação de receita e despesa para nos apresentar e ao referido desembargador provedor, na conformidade das respectivas inspeções indispensáveis, corroborando mais esta resolução o perigo evidente de roubo a que estão expostas as 48

TRINDADE, 1998, P. 43

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mesmas peças de prata, não só pelo ermo do lugar, como pela pouca segurança das portas e paredes do templo. Advertimos muito especialmente o asseio e conservação das alfaias e dos altares. Constou-nos também estar o ornamento branco da capela de São Bento, filial desta matriz, inteiramente dilacerado e incapaz de uso e, por isso, se deve fazer outro a expensas do rendimento da fábrica, o que muito recomendamos. Confiamos do reverendo pároco e de todo o povo sejam vigilantes no desempenho dos seus respectivos deveres, que desejamos frutificar com a santa benção que a todos lançamos no Senhor. Eu o cônego etc., que o escrevi de ordem de Sua Excelência Reverendíssima, que o assina49.

CHARLES JAMES FOX BUNBURY A obra do naturalista inglês, Charles James Fox Bunbury (1808-9-1866), ao contrário das dos outros viajantes, não teria sido publicada em livro por ele, e sim através da compra do manuscrito do autor pelo governo brasileiro, que seria traduzido e publicado primeiramente no número LX, dos Anais da Biblioteca Nacional (?), com o título de “Viagem de um naturalista inglês ao Rio de Janeiro e Minas Gerais (1833-1835)”. Charles Bunbury, praticamente, de início, faz o mesmo roteiro que o seu conterrâneo e antecessor Alexander Caldcleugh: Rio de Janeiro, Buenos Aires, Montevidéu, Rio de Janeiro, “Caminho Novo”...Ouro Preto, Mariana, Bento Rodrigues: Depois de passar cinco dias em Ouro Preto de lá saí, no dia 15 de junho [1834] e segui para Mariana, distante duas léguas. (...) Mariana contém uma grande quantidade de igrejas, algumas das quais não são feias e tem padres em abundância. É a capital eclesiástica de Minas Gerais, ao passo que Ouro Preto é a capital para fins militares e políticos. No dia seguinte, continuei a viagem para a aldeia de Bento Rodrigues, a princípio caminhando pelo vale pantanoso de um pequeno riacho que corre para o Carmo entre montanhas cobertas de mato de moderada altura; mas, dentro em pouco, a estrada, virando para a direita, sobe uma dessas colinas e continua durante muitas milhas sobre o terreno elevado. No vale e nas partes mais baixas das montanhas os rochedos são compostos de ardósia de ferro e mica, que onde quer que uma face nova apareça exposta brilha o sol como aço polido. Nas alturas o rochedo de quartzo aparece em grandes extensões. Muitas partes da região entre Mariana e Bento Rodrigues são cobertas de espessas florestas que, no entanto, não têm o exuberante desenvolvimento das matas da Serra do Mar, e contêm uma maior proporção de árvores decíduas, porém se assemelham mais com estes do que os pequenos bosques dos campos. Outras partes são desprovidas de árvores e cobertas do grande teto (samambaias) que já mencionei antes, ou de uma gramínea viscosa, capim-melado. Estas duas plantas (para empregar a expressão de Humboldt) são eminentemente sociais, espalhando-se por grandes trechos de terreno e dizem que só dão onde antigamente existiam florestas. Com efeito, não é sem probabilidade que toda essa região a leste da Serra do Caraça tenha sido outrora coberta de 49

Idem, P. 81-2 (grifos nossos)

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matas. Aquela maravilhosa cadeia de montanhas era um objeto muito notável visto da região alta onde viajávamos, subindo muito acima de todas as montanhas vizinhas com a sua crista íngreme e dentada. Quase todos os riachos dessa parte do pais trazem, para baixo, ouro e em todos os seus vales veem-se montes de pequenas pedras, restos das operações dos lavandeiros de ouro. Este é o meio mais empregado no Brasil para a procura do precioso metal, exigindo muito menos despesa e trabalho do que qualquer outro, mas é muito destrutivo e prejudicial ao país. Frequentemente quase todo o solo da superfície, ao longo do fundo de um vale que, se fosse cultivado, poderia produzir ricas colheitas, é inundado com essas operações, e nada fica senão montes de pedras soltas. As águas dos riachos auríferos são invariavelmente carregadas de ferro-ocre, a tal ponto que ficam grossas e opacas e quase da cor de ruibarbo. O termo Arraial, que propriamente dito significa um acampamento, é aplicado às aldeias desta parte do Brasil, que, ao tempo das primeiras explorações, eram, sem dúvida, realmente, acampamentos. O arraial de Bento Rodrigues, um miserável agrupamento de choupanas, é situado em terreno baixo e um tanto pantanoso, cercado de colinas lindamente matizadas de bosques, pastagens e rochedos, acima dos quais se eleva a Serra do Caraça com seus ásperos penhascos cinzentos. Imediatamente depois desta aldeia a estrada sobe uma colina íngreme, escabrosa, com pitorescos rochedos de ardósia de quartzo, que de repente se eleva no meio de espessas matas. A ardósia de quartzo é uma rocha que muito se presta a produzir efeitos pitorescos; pois devido à sua dureza desigual e estrutura laminada, se transforma pela ação do tempo numa grande variedade de formas angulosas e irregulares, e sua cor cinzenta ou esbranquiçada contrasta bem com o verde da folhagem. Inficionado, uma aldeia de aparência muito mais respeitável do que Bento Rodrigues e do qual dista pouco mais de uma légua, é situada ao pé da bela Serra do Caraça. Seu nome, que significa manchado ou infectado, dizem ter sido dado por causa da impureza do ouro obtido nas suas proximidades. Entre Inficionado e Catas Altas existe um grande outeiro de minério de terro, íngreme dos lados, mas estendendo-se no alto numa planície coberta de lindos bosques. A subida de Inficionado para este planalto e a descida do outro lado para a aldeia de Água Quente são muito íngremes e irregulares. De Agua Quente para a aldeia maior de Catas Altas o terreno é mais descoberto50.

GEORGE GARDNER O zoólogo e botânico inglês George Gardner (1812-1849), permaneceu cerca de 5 anos no Brasil e também fez uma jornada um pouco diferente dos últimos viajantes que foi descrita minunciosamente no livro “Viagem ao interior do Brasil”. Chegou ao Brasil em 1836 e depois de passar algum tempo no Rio de Janeiro, foi para a Bahia, de onde foi para Alagoas excursionando também pelo Rio São Francisco, a seguir, Ceará, Piauí, Mato Grosso, Goiás, onde depois pelo norte de Minas, em 1840, dirige-se para o Arraial do Tejuco. Assim de Diamantina ele fará seu retorno através do “Caminho dos Diamantes”, o mesmo percorrido cerca de vinte anos antes por Johann Emanuel Pohl e 50

BUNBURY, 1981, p. 68-9 (grifos meus)

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Alexander Caldcleugh: por Catas Altas, Inficionado, Bento Rodrigues, Camargos, São Caetano, Mariana e agora a cidade de Ouro Preto. Partindo de Catas Altas, a estrada toma uma direção sudeste ao longo do sopé da Serra do Caraça. Depois de viajar duas léguas, passamos pelo Arraial do Inficionado outra longa e estreita aldeia, mais ou menos do tamanho de Catas Altas e, como esta, em evidente estado de decadência. Uma légua adiante chegamos ao arraial de Bento Rodrigues, onde nos alojamos por essa noite no rancho público. Nesta jornada, o caminho, montanhoso e pedrento, estava longe de bom. Vi pouquíssimo terreno adequado a plantações; era em geral de natureza argilosa, misturado de grosso cascalho ferruginoso ou de detritos das rochas xistosas da Serra. Também este solo foi por toda a parte escavado à cata de ouro; mas, à exceção de pequena mina entre Inficionado e Bento Rodrigues, não vi lavras em extração em parte alguma. Á uma légua de Bento Rodrigues passamos pelo pequeno Arraial de Camargos, situado entre montanhas ao pé de um ribeiro. Estávamos apenas a três léguas do lugar de nosso destino, São Caetano, que eu ansiava por alcançar sem maior demora51.

RICHARD BURTON Sir Richard Francis Burton (1821-1890), não foi botânico, nem zoólogo, nem mineralogista, nem médico, nem engenheiro. Este inglês, sim foi um explorador das antigas, viajante de verdade e antes de viajar e percorrer o Brasil, como diplomata, estivera na Índia, como militar, na Arábia (foi um dos primeiros ocidentais a peregrinar por Meca), Egito e inúmeros lugares da África - onde junto com John Speke (1827-1864), descobriu as nascentes do Nilo -, Estados Unidos, Brasil e Paraguai, Uruguai, Argentina e Peru. Poliglota, tradutor e autor de vários livros. Sobre o Brasil, onde em 1867, percorreu mais de 2.000 quilômetros, escreveu “Explorarion of the highlands of the Brazil”, traduzido aqui em dois volumes: “Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho” e “Viagem de canoa de Sabará ao oceano Atlântico”, sobre sua viagem em praticamente todas vilas do ouro e depois de canoa até o oceano Atlântico descendo o Rio São Francisco, deixou um mapa de suas aventuras no Brasil. Burton, como seu conterrâneo, o inglês, Alexander Caldcleugh, também foi muito econômico em citar Bento Rodrigues e aliás como ele, passou ali, vindo do centro de Minas rumo a Mariana:

51

GARDNER, 1975, 226-7 (grifos meus)

35

No dia seguinte, - um décimo terceiro, deve ser devidamente lembrado – saímos de Inficionado já tarde. (...) Seguimos a estrada real, ou, como aqui se diz, a ´estrada carroçável`, para Mariana. (...) Depois de uma hora, apeamos no lugarejo chamado Bento Rodrigues, que fica entre a bifurcação do Rio Gualaxo, um ribeiro vítreo em um leito cor-de-rosa escuro, que contrasta, lindamente, com o viço da verdura em torno. O rio, que corre para leste, mesmo naquela estação tinha uma profundidade que chegava até a cilha dos animais; viam-se as ruinas de uma ponte e uma pinguela, que aqui representa a ponte suspensa do Peru, mostrava que, depois das chuvas, aquelas claras águas não podiam ser atravessadas a vau. Outra subida e outra descida conduziram-nos a uma Garganta do Diabo, um buraco escuro, de paredes altamente inclinadas e tendo no fundo uma torrente de montanha, atravessada por um simples arco. Mais ou menos ao meio dia, chegamos a Camargos, pequena aldeia, tendo abaixo um córrego que corre em areias vermelhas, e uma igreja realmente muito grande, erguendo-se em uma elevação, para rezar como um fariseu. Uma venda nos abrigou, a meio caminho; e algumas palavras de civilidade e notícias da guerra [do Paraguai, 1865-70] renderam laranjas; nossa única despesa pela distração foi de 3 ´pence`, preço de uma garrafa de cachaça. O Brasil, como a Rússia e outros países jovens, é um lugar em que a vida é muito barata para os que ali vivem, como dizem os anglo-indianos, ´à moda do País`, feijão, charque e cachaça. Por outro lado os artigos importados dobram de preço em comparação com os de Londres, e qualquer artigo fora do comum é caríssimo. Quem acha que não podemos gastar dinheiro aqui, ficaria admirado diante do preço da came de vaca e da cerveja, manteiga fresca e queijo inglês52.

Este mapa seria publicado em uma das edições do livro de Sir Richard Francis Burton. Sobre sua viagem ao Brasil, também percorre o “Caminho dos Diamantes”, passando por Bento Rodrigues e o “Caminho do Sabarabuçu”

52

BURTON, 1976, P. 269-70 (grifo meu)

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D. PEDRO II O último viajante de que trato aqui, foi realmente um viajante, mas não era estrangeiro, D. Pedro II (1825-1891), que foi imperador de 1840 a 1889, quando foi proclamada a República, provavelmente tenha viajado em termos de quilômetros, mais que todos esses viajantes juntos. No exterior esteve em Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Bélgica, Alemanha, Áustria, Itália, Egito, Creta, Suíça etc. No Brasil com exceção das atuais regiões centro-oeste e norte, percorreu todo o território e às vezes repetia os lugares (esteve em Minas em 1881, 85 e 89). E como a maioria de nossos governantes e governantas, ainda hoje, “Tinha vocação de andarilho e uma vocação insaciável de conhecer novos lugares e pessoas. (...) Escreveu diários de quase todas as viagens, pelo Brasil e pelo exterior.53” E graças a estes diários é que pude ter acesso à viagem que fez a Minas em 1881, “Diário da viagem do Imperador a Minas – 1881”, ele e a digníssima imperatriz Teresa Cristina (1822-1889). A viagem que durou de 26 de março a 30 de abril de 1881, foi feita de trem (até Barbacena), cavalos e bestas e liteira (Dona Teresa). As estradas, ou melhor, os caminhos em 1881 eram praticamente os mesmos, e a estrada de ferro que estava sendo construída os acompanhavam D. Pedro, primeiro o Caminho Novo, até Ouro Preto, depois o “Caminho do Sabarabuçu” (várias cidades) depois o “Caminho dos Diamantes” até Bento Rodrigues: Arraial do Inficionado depois de margear o ribeirão do mesmo nome, assim chamado por causa de bexigas que ai houve, ou de cobre de sua mineração que venderam com o ouro por este metal dizendo-o por isso inficionado. Para chegar ao arraial que é grande e tem 3 igrejas atravessa-se uma ponte comprida. (...) A serra do Caraça produz bela vista do Inficionado. Arraial de Bento Rodrigues pequeno mas com igreja. Tenho passado desde Catas-altas diversos ribeirões ou riachos que vão ter por fim a Sta. Bárbara e aumentar as águas do rio Doce. Arraia [sic] de Camargos bem situado com igreja. Sempre se tem visto a serra do Caraça54.

53 54

CARVALHO, 2007, P. 137 et passim VIANA, 1957, P. 99

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O RETRATO SEM PHOTOSHOP QUE OS VIAJANTES FIZERAM DE BENTO RODRIGUES Em síntese, qual foi a impressão e o que relataram os viajantes sobre Bento Rodrigues: para John Mawe, “Uma légua além está Bento Rodrigues, lugar pobre, de pouca importância”; Wilhelm Ludwig Von Eschwege, diagnosticou o óbvio, em Bento Rodrigues, e nos outros lugares da região, “a maioria da população caiu na pobreza e os serviços de mineração, outrora importantes, estão agora no abandono”. Já o francês, Auguste de SaintHilaire, ao dizer que “Bento Rodrigues, outra povoação situada à margem de um córrego, entre morros pouco elevados, e que apresenta aspecto bastante pitoresco com a presença de numerosas bananeiras plantadas pelos habitantes em torno de suas casas”, foi o único que não desdenhou o lugar; Entretanto, Johann Baptiste von Spix e Carl Friedrich Phillipp von Martius – Spix e Martius -, viram o arraial de Bento Rodrigues apenas como um rancho para pernoite de onde se tinha uma bela visão da Serra do Caraça; Johann Emanuel Pohl, achou as estradas do lugar horríveis e que “Este pequeno arraial de umas sessenta casas está edificado sobre terreno muito acidentado e possui duas pequenas igrejas e duas estalagens bastante medíocres, numa das quais tivemos hospedagem sofrível”; Alexander Caldcleugh, achou as estradas para o trajeto até Bento Rodrigues muito boas; O bispo Dom Frei José da Santíssima Trindade, em sua visita pastoral não gostou muito do que viu nas duas capelas de Bento Rodrigues, segundo ele, estavam “ambas com pouca decência” e que “também estar o ornamento branco da capela de São Bento, filial desta matriz, inteiramente dilacerado e incapaz de uso e, por isso, se deve fazer outro a expensas do rendimento da fábrica, o que muito recomendamos”; Charles James Fox Bunbury, foi mais incisivo, ao afirmar que e o arraial de Bento Rodrigues, não passava de “um miserável agrupamento de choupanas” e que Inficionado, uma aldeia de aparência muito mais respeitável do que Bento Rodrigues e do qual dista pouco mais de uma légua”; George Gardner, apenas pernoitou ali, num “rancho público” e que a mineração havia cessado. Francis Burton, que já havia conhecido metade do mundo, apenas apeou “ no lugarejo chamado Bento Rodrigues”; e o nosso ilustre compatriota, D. Pedro II, fez apenas uma pequena observação: “Arraial de Bento Rodrigues pequeno mas com igreja”.

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DA DECADÊNCIA E ESQUECIMENTO DE BENTO RODRIGUES: AS CAPELAS Até no dia 5 de novembro Bento Rodrigues possuía duas capelas católicas, a de São Bento e a de Nossa Senhora das Mercês e as primeiras notícias sobre estas capelas eram também muito imprecisas. As únicas certezas é que a Capela de São Bento tinha sido totalmente destruída pela lama de rejeitos da represa da Samarco e a das Mercês continuava intacta. O que a imprensa dizia: Fundado no século XVIII, o local é um dos arraiais mais antigos de Minas Gerais. De acordo com o coordenador da Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico, Marcos Paulo de Souza Miranda, a capelinha de São Bento, datada da época do surgimento do distrito, foi totalmente soterrada. (...) Infelizmente houve danos gravíssimos em decorrência do rompimento das barragens. A capelinha de São Bento do século XVIII é um dos mais antigos bens culturais. Está relacionada com a própria origem da comunidade que está hoje embaixo da lama”, disse.” (Thais Pimentel - Do G1 MG - 06/11/2015 – foto infra)

A Igreja de São Bento, padroeiro local (do fim do século 18 ou início do 19), a Escola Municipal Bento Rodrigues, o bar e restaurante da Sandra, o point onde até “o pessoal da Samarco almoçava”, segundo os moradores, a paisagem que remonta aos primórdios de Minas, embora com a descaracterização vinda com o tempo, tudo isso agora está sob um mar de lama. (...) Por exemplo, temos a informação de que foi soterrada uma igreja do século 19. Quanto vale essa igreja do ponto de vista imaterial para a comunidade? Também é um dano ao patrimônio cultural, simbólico. (...) Para contar a história, ficou a Igreja de Nossa Senhora das Mercês (Jornal Estado de Minas – 08/11/15).

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A imagem do padroeiro são Bento é, de longe, a peça que os moradores de Bento Rodrigues, subdistrito da mineira Mariana, mais estimam na capela homônima. O santo, outras 30 peças e a própria igreja foram engolidos pela onda de lama que invadiu o vilarejo na quinta passada. (...) De paredes brancas e portas e janelas azuis, a capela, que é do início do século 18, tem apenas pedaços do telhado despontando da lama. (...) A imagem desaparecida do padroeiro são Bento, com cerca de 60 cm, foi esculpida em madeira e folheada a ouro. Tão querida era, que devotos decidiram, 30 anos atrás, camuflá-la com uma tinta escura, conta o pároco Armando Godinho, 48. A ideia era ocultar o brilho do ouro para evitar roubo ou que o santo fosse levado para um museu ou igreja mais importante.” (Juliana Coissi 12/11/2015 -http://m.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/11/1705282-lama-debarragens-destroi-santo-folheado-a-ouro-e-igreja-do-seculo-18.shtml?mobile – foto infra)

No altar-mor barroco a imagem do padroeiro, São Bento, com alguns de seus principais atributos, “o báculo e ter a mão direita na posição de abençoar.” Os prédios não eram tombados pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), mas faziam parte do inventário municipal, onde são catalogados bens materiais de Mariana para posterior processo de acautelamento federal. A arquidiocese destaca que uma das principais perdas do patrimônio religioso aconteceu com o arruinamento da Igreja de São Bento, fundada no século 18. A igreja fazia parte do inventário histórico municipal desde o ano de 2004. Segundo a arquidiocese, a igreja ficou totalmente coberta pelos rejeitos das barragens da Samarco, restando apenas um pedaço do telhado à mostra. A edificação colonial da Igreja de São Bento, padroeiro de Bento Rodrigues, foi construída ao lado de um cemitério desativado. A fachada era simples, com duas janelas em madeira esculpida e pintada na cor azul, uma cruz latina em cima da cumeeira, um óculo centralizado, talhado em madeira e fechado com vidro. O piso da igreja era em ardósia na entrada e tabuado na área interna”. (Aliny Gama – 17/11/2015 – Disponível em http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimasnoticias/2015/11/17/quatro-igrejas-foram-destruidas-pelo-rompimento-debarragem-em-mariana-mg.htm )

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Diante de informações tão exíguas sobre as capelas decidi ver o que encontrava. Primeiramente pesquisei no site “Portal do Patrimônio Cultural”, que “...foi criado para reunir as numerosas e dispersas iniciativas de Inventário de Bens Culturais produzidas em Minas Gerais, disponibilizando-as aos pesquisadores da cultura mineira”55, nele aparece também este interessante mapa de Bento Rodrigues:

Neste portal, a Igreja São Bento56, localiza-se no povoado de Bento Rodrigues, distrito de Santa Rita Durão, município de Mariana e é propriedade da Arquidiocese de Mariana, Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. A localidade tem o seguinte histórico, elaborado por Cláudia Renata Vilela, estagiária de arquitetura em março de 2004:

55

Disponível em: Acesso em: 22 nov. 2015> Acesso em: 22 nov. 2015. 56 “São Bento (c.480-c.550) Nasceu na região da Úmbria italiana. Fundou o famoso Mosteiro do Monte Cassino, no sul de Roma, e foi autor da regra da Ordem Beneditina, que serviria de base para a vida monástica de todas as ordens ocidentais. É representado com o hábito negro da Ordem Beneditina e seus atributos são o corvo, o cálice com uma serpente, ou o livro da regra. Também pode segurar o báculo e ter a mão direita na posição de abençoar.” OLIVEIRA; CAMPOS, 2010, P. 149

41

Bento Rodrigues foi importante centro de mineração do século XVIII, surgindo com os primeiros mineradores da região. A primeira Igreja de São Bento foi provavelmente construída em 1718 e a atual, também antiga, foi construída no mesmo local, com um recuo maior.57” (Foto do Portal)

No portal assim o templo é descrito: Edificação colonial de volumetria térrea com partido arquitetônico profundo e afastamento em todo seu perímetro, sendo o afastamento posterior e lateral esquerdo parcialmente ocupado por cemitério desativado. É implantada em terreno plano que não possui fechamento. O acesso principal frontal e centralizado no mesmo nível da rua possui jardim gramado e arborização. Fachada principal simétrica composta pelo vão de acesso e por dois vãos rasgados por inteiro com guara-corpo de madeira, todos vedados por duas folhas de abrir de madeira almofada e com vergas alteadas e enquadramento em madeira. A cruz latina – símbolo do catolicismo – se localiza na cumeeira sobre a empena da fachada principal, como ornamento possui um óculo centralizado na empena com vedação de madeira e vidro e também escudo talhado em madeira sobre a porta. Piso de ardósia na entrada e internamente possui piso tabuado e forro de madeira. Estrutura autônoma de madeira com vedação em pau-a-pique revestida por reboco com pintura látex. Cobertura com duas águas e cumeeira perpendicular à rua e vedação de telhas cerâmicas curvas. Beiral coroado por guarda-pó e cachorrada em madeira58.

57 58

Idem Idem

42

No item intervenções, o Portal diz que: A primitiva Igreja de S. Bento foi demolida, seus altares foram levados para a Igreja das Mercês e uma nova ermida foi construída no estilo antigo mas com retábulos em madeira sem pintura. Atualmente o imóvel está em obras59.

A Igreja Nossa Senhora das Mercês60, também aparece assim identificada: localizase no povoado de Bento Rodrigues, distrito de Santa Rita Durão, município de Mariana e é propriedade da Arquidiocese de Mariana, Paróquia de Nossa Senhora da Conceição. A localidade tem o seguinte histórico, elaborado por Cláudia Renata Vilela, estagiária de arquitetura em março de 2004: Bento Rodrigues foi importante centro de mineração do século XVIII, surgindo com os primeiros mineradores da região. Segundo os moradores, a Igreja das Mercês guarda os altares de primitiva Igreja de São Bento61 (Foto do Portal).

59

Idem “Nossa Senhora das Mercês - Invocação surgida em Barcelona no século XII, fundada por São Pedro Nolasco, com a ajuda do dominicano São Raimundo Penaforte. Em Minas, a devoção surgiu em meados do século XVIII, ligada aos pretos alforriados e mulatos. A Virgem é representada de pé com os braços abertos, em sinal de proteção e acolhimento. Veste o hábito branco dos Mercedários, com túnica longa cintada por correia preta, escapulário longo e uma capa ampla que segura aberta pelas mãos. Pode vir acompanhada de figuras ajoelhadas representando os cativos.” OLIVEIRA; CAMPOS, 2010, P. 170-1 61 Disponível em:
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