BNDES, INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS BRASILEIRAS E INTEGRAÇÃO REGIONAL

May 23, 2017 | Autor: L. Santos | Categoria: Regional Geography, Economic Geography
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A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO

BNDES, INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS BRASILEIRAS E INTEGRAÇÃO REGIONAL LEANDRO BRUNO SANTOS1 Resumo: O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) teve fundamental importância na organização do território e na consolidação do capitalismo industrial brasileiro. Recentemente, o banco passou a desempenhar um papel internacional importante, sobretudo na América Latina e na África, com apoio à realização de projetos de infraestrutura e à internacionalização produtiva de capitais brasileiros. Neste texto, o nosso principal objetivo é compreender a importância da linha de financiamento BNDES Exim Pós-Embarque no suporte à realização de obras de infraestrutura na América Latina e seus impactos territoriais (exportações de bens e serviços). Os procedimentos metodológicos consistiram no levantamento e leitura bibliográficos, compilação de dados secundários, sistematização e análise dos dados. Palavras-chave: BNDES; Internacionalização produtiva; Integração regional.

Abstract: The Brazilian Development Bank (BNDES) was important in the territory organization and the consolidation of the Brazilian industrial capitalism. Recently, the bank began to play an important international role, particularly in Latin America and Africa, with the financing of infrastructure projects and support to the Brazilian enterprises internationalization. This paper aims to understand the importance of the Bank’s credit product known as BNDES Exim Post-shipment in supporting the realization of infrastructure projects in Latin America and its territorial impacts (exports of goods and services). The methodological procedures consisted of bibliographic survey and reading, secondary data collection, data systematization and analysis. Keywords: BNDES; Productive internationalization; Regional integration.

1 – Introdução O BNDES foi criado em 1952 (lei n. 1628) com o propósito de financiar os projetos de desenvolvimento nacional. Durante mais de seis décadas, desempenhou diferentes papéis no desenvolvimento das forças produtivas. Recentemente, ocorreu reorientação de suas ações com aportes crescentes do tesouro nacional. O banco, com os aportes do tesouro, desembolsou mais de US$ 73,1 bilhões e tornou-se a principal agência de fomento no mundo, à frente do Banco Mundial (BM), Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Export-Import Bank (EXIMBANK). Atualmente, o banco é a principal fonte de financiamento de médio e longo prazos para as exportações brasileiras, por meio das linhas BNDES Exim - Préembarque (recursos para compra de insumos, contratação da mão de obra e produção de bens a serem exportados) e pós-embarque (apoio à comercialização do produto final) - e BNDES Finamex (Financiamento às Exportações de Máquinas e 1

Docente da Coordenadoria de Curso de Geografia da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Câmpus de Ourinhos. E-mail de contato: [email protected]

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Equipamentos). Este texto analisa o papel desempenhado pelo BNDES no processo de internacionalização das empresas multinacionais brasileiras, particularmente daquelas que atuam no segmento da construção civil. O principal objetivo é compreender a importância da linha de financiamento BNDES Exim Pós-Embarque no apoio à realização de obras de engenharia na América Latina e seus impactos territoriais (exportações de serviços e bens de capital).

Para

atingir

tal

objetivo,

adotamos

os

seguintes procedimentos:

levantamento e seleção bibliográficos; levantamento de dados e informações sobre obras de engenharia e exportações de bens e serviços de engenharia apoiadas pelo BNDES; sistematização análise dos dados. O texto está divido em 6 partes, contando com a introdução. Na sequência, abordamos o papel do BNDES na consolidação do capitalismo industrial brasileiro. Em seguida, analisamos a internacionalização de empresas brasileiras e as principais formas de atuação do banco. Na parte seguinte, avaliamos o papel do banco na exportação de bens e serviços de engenharia. Ao final, esboçamos as considerações finais e apresentamos as referências do trabalho.

2 – O BNDES e o desenvolvimento econômico brasileiro No segundo Governo Vargas (1951-1954), a fim de identificar os principais gargalos ao desenvolvimento econômico nacional, ocorreu a criação do Programa de Reaparelhamento Econômico, a fim de estudar as condições das infraestruturas e dos mecanismos de financiamento. Em função da demanda por grandes projetos e volumes expressivos de capitais, o governo brasileiro recorreu às instituições internacionais de financiamento. No bojo das negociações com EximBank e BM, surgiu a Comissão Mista Brasil Estados Unidos (CMBEU). A CMBEU propôs 41 projetos para a modernização da infraestrutura (transportes e geração de energia), para os quais os recursos privados eram insuficientes. O Plano para Reaparelhamento Econômico receberia apoio financeiro do EximBank e BM. Para levar a cabo os projetos, o governo aprovou no congresso os fundos domésticos para o investimento, a garantia do tesouro aos empréstimos

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estrangeiros às firmas privadas e a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), para coordenar os investimentos. O

BNDE

priorizou

o

reaparelhamento

de

setores

específicos

de

infraestruturas. Os investimentos foram distribuídos em transportes (68,3%), energia (19,5%), indústria (9,8%) e outros (2,7%). Embora tenha aumentado a concentração produtiva e a desigualdade, durante esse período houve a integração do território nacional e o espalhamento dos macrossistemas técnicos para as regiões, outrora excluídas de um projeto efetivo de desenvolvimento (SILVA JUNIOR, 2009). No governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961), o Plano de Metas norteou as ações do banco. As propostas realizadas pela comissão BNDE-CEPAL sob o governo de Vargas foram levadas a cabo visando à industrialização (TAVARES et al., 2010). O banco, responsável pela tomada de decisões de investimentos e escolha dos beneficiados, diminuiu os desembolsos às infraestruturas de transportes (68,3% para 7,5%) e aumentou à indústria de base (9,8% para 48,6%) e à energia (19,5% para 40,8%), respectivamente (SANTOS, 2013). Em 1964, sob o regime militar, ocorreu uma inflexão no BNDE, com a extinção do Fundo de Reaparelhamento Econômico (principal fonte de renda) e o estabelecimento de fundos diversos, visando aderir novas fontes de recursos. O banco ficou limitado a acompanhar o cumprimento dos projetos ainda vinculados ao Plano de Metas (TAVARES et al., 2010). Outra mudança importante foi a reorientação dos empréstimos com o aumento dos recursos destinados à iniciativa privada (17,3% a 66,0%) em detrimento das empresas estatais (82,7% a 44,0%). Com o I Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), entre 1972 e 1974, o BNDE passou por transformações (deixou de ser autarquia e se tornou empresa pública). A força da iniciativa privada na política nacional influiu na criação de instituições para apoiar o setor privado, principalmente via participação acionária e programas específicos (FARIAS, 2013). O sistema BNDE surge nesse contexto com a criação de subsidiárias - Financiamentos de Insumos Básicos S.A. (FIBASE), Mecânica Brasileira S.A. (EMBRAMEC) e Investimentos Brasileiros S.A. (IBRASA) com atuação no mercado de capitais para ampliar a capitalização das empresas.

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Entre os anos 1974 e 1979, coube ao BNDE a operacionalização do II PND, com o papel de fornecer crédito aos setores público e privado, construir a capacidade científica nacional, financiar o desenvolvimento tecnológico e estimular a intensificação das exportações de manufaturas nacionais (FARIAS, 2013, p. 123). O II PND foi o último grande esforço de modernização da estrutura industrial e esteve ancorado em volumosos recursos carreados à expansão da indústria de base e bens de capital, infraestrutura econômica (energia, transportes e comunicação). Em 1979, com o término do II PND, a inflação e o endividamento externo foram agravados pelo segundo choque do petróleo e pela escalada dos juros internacionais. O BNDE ajustou-se ao cenário de escassez de financiamento externo. Segundo Tavares et al. (2010, p. 196), “O Banco não seria mais um dos elementos financeiros na tarefa de planejar o desenvolvimento, mas passou a oscilar entre a função de gestor do mercado e seu papel histórico de fomento”. Nos anos 1980, O BNDE recebe o “S” com o Fundo de Investimento Social (FINSOCIAL), criado para promover o desenvolvimento social. As subsidiárias Fibase, Embramec e Ibrasa foram fundidas e deram origem à BNDESpar, com a intenção de apoiar as empresas privadas via participação acionária. O banco reprivatizou firmas em dificuldades incorporadas pelo BNDESPar e ampliou o percentual dos empréstimos às indústrias já apoiadas (celulose, metalurgia, química, equipamentos de comunicação e elétricos, equipamentos de transporte, têxteis). Apesar da falta de clareza quanto ao financiamento, priorizou o socorro das empresas em crise. O banco atuou em três frentes: 1) continuidade e término dos financiamentos do II PND; 2) crédito ao setor exportador para gerar excedentes comerciais; 3) adequação e ajuste fiscais aos setores público e privado, mediante programas de saneamento financeiro. O apoio às grandes obras cedeu espaço para investimentos nas cidades (metrôs) e na ampliação da malha rodoviária e avançou a prática do planejamento estratégico com cenários prospectivos2 (FARIAS, 2013). Sob os auspícios da modernização industrial e enxugamento do aparelho estatal, nos anos 1990, avançaram as privatizações ainda mais abrangentes e 2

O cenário “Integração Competitiva”, presente no Plano Estratégico de 1988-1990, menciona a inserção competitiva do Brasil na economia mundial, a superação dos pontos de estrangulamento, a participação do setor privado nos investimentos encampados pelo Estado, o fortalecimento financeiro e patrimonial do sistema BNDES etc.

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liberalizantes (DINIZ, 2004). Para gerenciar essa reforma foram criados o Programa Nacional de Desestatização (PND) e o Fundo Nacional de Desestatização (FND). O BNDES tornou-se o gestor do FND e ofereceu suporte técnico, administrativo, financeiro e material ao processo de privatização. Com o apoio do BNDES e dos fundos de pensão, responsáveis pela irrigação de fundos públicos, emergiu uma nova fase do capitalismo brasileiro, com a formação de conglomerados privados nacionais, cuja teia de relações societárias abrangeu das commodities aos serviços de utilidade pública (TAUTZ et al., 2010). O banco criou, ainda, linhas de financiamento, com cobertura de quase todos os setores, e apoiou as exportações, por meio do FINAMEX e da linha BNDES Exim. A partir de 2004, o banco mudou seu patamar de atuação e a escala de operação, por conta da injeção de expressivos recursos do tesouro nacional. O BNDES conheceu nova reorientação, pois passou a se dedicar ao fortalecimento internacional do capital privado brasileiro, porém, selecionou os setores já competitivos (construção civil, mineração e siderurgia, petróleo e gás, pecuária, celulose) e priorizou a América Latina (SOUZA, 2010). O padrão de acumulação, longe de ser alterado, foi aprofundado, com fortalecimento de conglomerados privados (nacionais e estrangeiros) via fundos públicos.

3 – Estado e internacionalização de empresas brasileiras A internacionalização produtiva das empresas brasileiras é um processo iniciado nos anos 1960 e, desde então, ocorreram diversos ciclos de Investimentos Estrangeiros Diretos (IED). O primeiro deles deu-se entre 1965 a 1976, com IED da ordem de US$ 260 milhões, sendo que a estatal Petrobrás respondeu pela maior parte. Quanto ao número de subsidiárias, os países latino-americanos foram os espaços privilegiados para a expansão das empresas. O Estado atuou diretamente com a estatal Petrobras, visando o abastecimento interno de petróleo e derivados. Entre os anos 1977 e 1982, ocorreu o segundo ciclo de internacionalização e o estoque de IED atingiu US$ 863 milhões, distribuídos desta maneira: finanças (45,2%), setor petrolífero (27,6%) e indústria (16%). Apesar da concentração nos países desenvolvidos, os IED direcionados à América Latina e a paraísos fiscais

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aumentaram de 10,5% para 22,6% e de 6,1% para 17,2%, respectivamente. O Estado usou estrategicamente a Petrobras, mas sua atuação mais relevante consistiu no aumento do número de agências de bancos públicos no exterior, a fim de obter recursos externos para empréstimos locais e rolagem da dívida pública e de apoiar o incremento das exportações brasileiras à América Latina (DIAS, 1994). Durante os anos 1983 e 1992, ocorreu o terceiro ciclo de IED, com um total de US$ 2,5 bilhões, distribuídos em finanças (37%), petróleo e telecomunicações (29,5%) e manufatura (10%). Esse ciclo foi marcado por participação de empresas com vendas abaixo de US$ 500 milhões, aumento do número de subsidiárias no exterior, forte direcionamento a países vizinhos e diversificação dos IED industriais. Por conta da crise econômica, o Estado estimulou as exportações por meio de isenções tributárias e de política cambial mais ativa (BONELLI; VEIGA; BRITO, 1997). Os bancos públicos (Banco do Brasil e Banespa) e privados (Banco Real) se internacionalizaram para apoiar a internacionalização das empresas brasileiras. O quarto ciclo de IED apresentou dois momentos distintos. Entre 1992 e 1995, IED ocorreu sob a forma de instalação de escritórios comerciais, assistência técnica e montagem de produtos (TAVARES, 2006). A partir de 1995, os IED aumentaram e foram direcionados, sobretudo, para facilitar as exportações. Estados Unidos (40.0%), Argentina (32.7), México (7.3%) Chile (3.6%) e Venezuela (3.6%) foram os principais receptores dos investimentos, pois eram os principais destinos das exportações de manufaturados. O Estado adotou políticas de estabilização e abertura econômicas que impeliram as empresas à reestruturação e à internacionalização. Foram criados alguns programas - FINAMEX, do BNDES, e o Programa de Financiamento às Exportações (PROEX), do Banco do Brasil - de apoio à exportação de bens duráveis e de capital e serviços de engenharia. No final da década, a PROEX passou a priorizar as pequenas e médias empresas e o financiamento das grandes empresas ficou a cargo do BNDES Exim (SENNES, 2007). Neste século, as empresas intensificaram seus investimentos e os estoques atingiram US$ 202,5 bilhões, sendo US$ 192,9 bilhões IED (participações acima de 10%) e US$ 9,6 bilhões empréstimos entre empresas. As linhas de crédito

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destinadas às exportações (BNDES Exim, Proex equalização, Proex financiamento etc.) continuam importantes à internacionalização, mas, a partir de 2002, o BNDES passou por reorientação, com a criação de linha de crédito específica, além de outras estratégias (subscrição de ações, apoio à concentração e centralização de capitais domésticos, criação de filiais no exterior etc.), para sustentar o alargamento dos circuitos espaciais de produção das empresas brasileiras (SANTOS, 2015). Os vários ciclos de IED apresentaram diferentes relações entre Estado e mercado. Até o início dos anos 1990, a atuação do Estado deu-se de forma direta Petrobras e bancos públicos - e indireta - isenções fiscais, financiamento às exportações (interrompida em meados dos anos 1980) e política cambial -. A partir de 1995, tivemos a retomada de linhas de financiamento específicas de apoio às exportações de bens e serviços. É apenas nos primeiros anos deste século que o Estado passou a atuar diretamente no fomento à realização de IED privados. Outra característica importante dos IED industriais brasileiros é a sua concentração nos países da América Latina, denotando que a dimensão regional e a proximidade geográfica exercem forte atração sobre os investimentos (IGLESIAS; VEIGA, 2002). Esses investimentos estiveram relacionados às proximidades social, econômica e cultural e às possibilidades de replicar capacidades tecnológicas e organizacionais desenvolvidas pelas empresas. Na próxima seção, aprofundamos a discussão do papel do Estado, por meio do BNDES, e da distribuição espacial dos investimentos tendo como foco o financiamento das obras de infraestrutura.

4 – O BNDES e a exportação de serviços de engenharia Até meados do século XX, as construtoras brasileiras apresentavam uma topologia espacial de atuação regional. É com o Plano de Metas e os PND I e II, marcados pela construção de macrossistemas sobre o território, que as construtoras aumentam sua musculatura, levando o ramo da construção civil a um processo de monopolização no final dos anos 1970. Para Sposito; Santos (2012), durante a fase de consolidação da industrialização por substituição das importações, as construtoras adquiriram capacidades tecnológica e administrativa que permitiram a obtenção e acúmulo de habilidades necessárias à construção de grandes obras.

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No

final

dos

anos

1960,

o

ramo

conheceu

um

movimento

de

internacionalização, com a construção de hidrelétrica na Bolívia (1969 a 1973) pela Mendes Júnior. A partir de 1975, a capacidade ociosa acima das possibilidades do mercado interno e a impossibilidade de o Estado realizar grandes obras impeliram ao fortalecimento do movimento de internacionalização, mediante expansão de novas empresas, como Camargo Corrêa e Odebrecht. Nos anos 1970, foram levados a cabo cinco projetos no exterior, sendo quatro na América Latina (Paraguai, Venezuela, Chile e Peru) e um na África (Mauritânia). Nos anos 1980, houve cinco incursões das construtoras no exterior. Novamente, predominou a inserção na América do Sul, seguida pela África e Europa (Portugal). Ao grupo das construtoras com presença internacional somou-se a Queiroz Galvão. Ao longo dos anos 1990, as construtoras brasileiras levaram a cabo mais de 30 obras no exterior, das quais 18 na América do Sul, quatro na América do Norte, África e Europa com três cada, duas no Caribe e uma no Oriente Médio. Nos anos 2000, foram realizadas 40 obras no exterior, sendo metade na América do Sul, 10 na África, Oriente Médio e Caribe com três cada, duas na América Central, América do Norte e Ásia com uma cada (SPOSITO; SANTOS, 2012). Três pontos caracterizam o alargamento dos circuitos espaciais de produção das construtoras. Primeiro, apesar da dispersão dos projetos, grande parte está na América do Sul e, em menor medida, na África. Segundo, embora todas as grandes empresas estejam no exterior, predominam (por número de projetos) Odebrecht e Camargo Corrêa, respectivamente. Terceiro, a pouca penetração das construtoras brasileiras nos mercados desenvolvidos decorre tanto do alto desenvolvimento das empresas nestes países e das barreiras de entrada (CAMPOS, 2009) como das capacidades tecnológicas adequadas aos países periféricos. O movimento de internacionalização das construtoras não se restringiu ao período ditatorial, ao contrário, continua sendo intenso até os dias atuais. Nos últimos anos, por meio da linha de financiamento BNDES Exim (pós-embarque), houve aumento dos empréstimos destinados às obras de infraestrutura (figura 01), que superaram por alguns anos as liberações de recursos voltados às exportações de bens de capital (por meio do FINAMEX).

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Figura 01 - Desembolsos BNDES Pós-embarque das exportações financiadas por categoria de uso, entre 2003 e 2014, em US$ milhões Fonte dos dados: BNDES (2015) – Acessado em junho de 2015. Organização: SANTOS (2015).

Os desembolsos com obras de infraestrutura saltaram de US$ 120,8 milhões, em 2003, para US$ 951,7 milhões, em 2014. No período, os desembolsos totais correspondentes às obras atingiram US$ 9,7 bilhões, sendo US$ 5,3 bilhões para a América Latina e US$ 3,4 bilhões à África. Até o ano de 2010, os desembolsos foram alocados à construção de infraestrutura interna de cada país, sem vinculação com as obras do projeto Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional SulAmericana (IIRSA) (KRAYCHETE; CRISTALDO, 2013). Nos últimos anos, rodovias atinentes à IIRSA foram apoiadas pelo BNDES no Peru e na Bolívia. Entre os anos 2007 e 2014, as exportações de bens e serviços de engenharia contaram com desembolsos de US$ 11,4 bilhões, sendo 3,5 bilhões a Angola, US$ 2,2 bilhões à Venezuela, US$ 1,9 bilhão à Argentina, US$ 1,5 bilhão à República Dominicana, US$ 847 milhões a Cuba e US$ 445 milhões a Moçambique. Na América Latina, os recursos estiveram concentrados nos principais parceiros comerciais do país (Argentina e Venezuela). As empresas beneficiadas foram Odebrecht (US$ 7,7 bilhões), Andrade Gutierrez (US$ 2,6 bilhões), Queiroz Galvão (US$ 389 milhões), OAS (US$ 354 milhões) e Camargo Corrêa (US$ 259 milhões). Todas as obras financiadas estão vinculadas a empresas brasileiras, que devem incorporar, no projeto, bens e serviços produzidos no país. Os investimentos da carteria pós-embarque foram distribuídos em energia, transporte terrestre, água e esgoto, edificações, portos e aeroportos (tabela 01).

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Tabela 01 - Projetos financiados pelo BNDES na América Latina (a partir de US$ 50 milhões), entre 2007 e 2014 Países Argentina

Projetos TGS – Gasoduto San Martin Albanesi – Gasodutos Segundo aqueduto para o interior do Chaco Bolívia Rodovia Potosí - Tupiza - Villazón Rodovia Pavimentación Potosí - Tarija Chile Ampliação Metro de Santiago Colômbia Ferrovia Del Carare Cuba Porto Mariel Expansão dos aeroportos Jose Marti, Santa Clara e Holguin Equador Hidrelétrica San Francisco Irrigação Manabi Hidrelétrica Manduriacu Irrigação Tabacundo Guatemala Reabilitação e ampliação da Rodovia Centro Americana Honduras Lotes I e II de corredor logístico Paraguai Rota 10 Peru Rodovia Interoceânica Sul República Dominicana Reconstrução da Estrada CIBAO Sur Construção do corredor ecológico Pontezuela Irrigação na Provincia de AZUA Corredor viário Norte-Sur Projeto Proposito Multiplo Grande Aqueduto Hermanas Mirabal Reconstrução da Rodovia El Rio Rodovia Bavaro-Uvero Alto-Miches-Sabana De La Mar Corredor Viário Duarte Construção da UHE Palomino Construção de aqueduto Central Hidrelétrica Pinalito Construção da UHE Las Placetas Construção de aqueduto Venezuela Hidroelétrica La Vueltosa Linha 4 Metro Caracas Linha 3 Metro Caracas Implantação de estaleiro Usina Siderúrgica Nacional Construção da linha II do Metrô de los Teques Linha V do metrô de Caracas Fonte dos dados: BNDES (2015) – Acessado em junho de 2015. Organização: SANTOS (2015).

Valor 200 279 165,0 67,2 89,9 208 650 682 150 242,9 113 90,2 64 280 145 77 420 200 200 71,9 114 249,5 50 50 185 101 50,6 50,3 88,1 61 72 121 107,5 78 637,9 865,4 527,8 219,3

República Dominicana, Venezuela e Equador são os principais destinos de empréstimos às obras superiores a US$ 50 milhões. As obras de infraestrutura logística e energética são predominantes, “consistentes com iniciativas públicas e com esforços para integração econômica” (CABRAL PINTO; ABREU, 2012, p. 305). Não é demais ressaltar que o aumento do emprego, da renda e da industrialização nesses países pode desencadear a exportação futura para outros ramos brasileiros.

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5 – Considerações finais O BNDES teve papel importante na constituição de racionalidade do capital e na organização do território nacional. Nas suas origens, promoveu a infraestrutura econômica indispensável ao aprofundamento das forças produtivas. Na fase da industrialização pesada, apoiou a consolidação da indústria de base. A partir dos anos 1980, redirecionou suas ações à iniciativa privada e à gestão do processo de privatização. Neste século, tornou-se protagonista na formação de campeões nacionais e na internacionalização produtiva. Entre os anos 2004 e 2014, os desembolsos do banco elevaram-se de R$ 39,8 para R$ 187,8 bilhões. Os projetos de longo prazo e grande porte abrangeram a maior parte dos empréstimos, seguidos pelos de menor porte, apoio à exportação e atuação no mercado de capitais. Os desembolsos à exportação de bens e serviços de engenharia aumentaram no período, para apoiar um ramo com histórica atuação internacional e responsável por 2% das exportações mundiais e 18% do mercado latino-americano3. O banco tem financiado em torno de 85% das exportações de bens e igual fração dos serviços realizados por construtoras brasileiras no exterior. Mais de 40% dos montantes financiados das obras correspondem à exportação de serviços de engenharia consultiva, mão de obra expatriada e bens brasileiros. Rodovias e linhas de transmissão exibem alto coeficiente de expatriados e os gasodutos são mais intensivos em insumos (tubos e máquinas) exportados. As exportações são maiores para algumas obras (gasodutos, hidrelétricas e saneamento) e para países da América do Sul - por conta da proximidade e da integração logística4. Last but not least, o banco tem desempenhado papel importante de apoio às estratégias de expansão das empresas brasileiras, sobretudo daquelas com atuação na construção civil, e das exportações de bens e serviços de engenharia. Embora os financiamentos a operações no exterior sejam inferiores a 20% dos desembolsos, cabe destacar que eles são decisivos para o alargamento dos circuitos espaciais de produção das empresas, sobretudo na América Latina, principal destino dos IED. 3

Disponível em: . Acesso em: 27 de junho 2014. 4 Ver: Cabral Pinto; Abreu (2012, p. 299-309).

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6 – Referências BONELLI, R.; VEIGA, P. M; BRITO, A. F. As políticas industrial e de comércio exterior no Brasil: rumos e indefinições. Texto para discussão IPE, n. 527, p. 1-72, 1997. CABRAL PINTO, M. A.; ABREU, M. P. L. Apoio às exportações de bens e serviços por firmas de engenharia de construção pesada brasileiras: panorama da experiência acumulada pelo BNDES entre 1998 e 2011. BNDES Setorial, n. 36, p. 289-318, 2012. CAMPOS, P. H. As origens da internacionalização das empresas de engenharia brasileiras. In. Companhia Justiça nos Trilhos et al. (Org.). Empresas transnacionais brasileiras na América Latina: um debate necessário. São Paulo: Expressão Popular, 2009, p. 103-114. DIAS, V. V. Las empresas brasileñas: internacionalización y ajuste a la globalización de los mercados. Brasília: Cepal, 1994. DINIZ, A. N. BNDES: de agente desenvolvimentista a gestor da privatização: 19522002. 133f. Dissertação (Mestrado em Economia), Instituto de Economia, Universidade Estadual de Campinas, 2004. FARIAS, H. C. O papel do BNDES na integração do território brasileiro. GEOUSPEspaço e Tempo, São Paulo, n.34, p. 119-133, 2013. IGLESIAS, R. M.; VEIGA, P. M. Promoção de exportações via internacionalização das firmas de capital brasileiro. Rio de Janeiro: FUNCEX/BNDES, 2002. KRAYCHETE, E. S.; CRISTALDO, R. C. The National Bank of Economic and Social Development on the Brazilian development strategies: from internal articulation to expansion to Latin America. Geopolitica(s), v. 4, n. 1, p. 63-85, 2013. SANTOS, L. B. Estado e internacionalização das empresas Multilatinas. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013. SANTOS, L. B. Políticas públicas e internacionalização de empresas brasileiras. Sociedade & natureza, v.27, n.1, p. 37-52, 2015. SENNES, R. O tema financiamento, seguro e garantias ao crédito para exportações: comentários sobre regulamentação no Brasil. Papéis legislativos, n.2, p.1-15, 2007. SILVA JUNIOR, G. O. BNDES: 50 anos de ordenamento do território brasileiro. In. SILVEIRA, M. R.; LAMOSO, L. P.; MOURÃO, P. F. C. (Org.). Questões nacionais e regionais do território brasileiro. São Paulo: Expressão Popular, 2009, p. 63-82. SOUZA, A. M. O expansionismo nos governos Lula e o BNDES. Meridiano 47, v. 47, p. 47-53, 2010. SPOSITO, E. S.; SANTOS, L. B. O Capitalismo industrial e as multinacionais brasileiras. São Paulo: Expressão Popular, 2012. TAUTZ, C. et al. O BNDES e a reorganização do capitalismo brasileiro: um debate necessário. In. Os anos Lula. Contribuições para um balanço crítico 2003-2010. Rio de Janeiro: Garamond, 2010, p. 249-286. TAVARES, M. C. et al. O papel do BNDE na industrialização do Brasil – Os anos dourados do desenvolvimentismo, 1952-1980. Memórias do desenvolvimento, n.4, p. 1-331, 2010. TAVARES, M. Investimento brasileiro no exterior: panorama e considerações sobre políticas públicas. Desarrollo productivo, Santiago, n. 172, 2006.

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