Brasão da Cidade de Abrantes

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Brasão da Cidade de Abrantes Félix Rodrigues Departamento de Ciências Agrárias Universidade dos Açores Nota- Este trabalho foi desenvolvido para as Comemorações do Ano Internacional da Astronomia, 2009. Agradece-se a colaboração da Câmara Municipal de Abrantes.

No trabalho aqui apresentado, centrar-me-ei praticamente em exclusivo nos significados ou possíveis significados astronómicos, ou na sua conceção mais medieval, nos significados astronómicos/astrológicos do brasão da Cidade de Abrantes. O brasão da cidade de Abrantes tem, sobre um fundo azul, uma estrela de oito raios de prata, em abismo, que simboliza a “Virgem Maria, comemorando, segundo consta da tradição oral, a edificação da Igreja de Santa Maria do Castelo sobre as ruínas da mesquita dos mouros" para outros autores a estrela significa a conquista de Abrantes aos Muçulmanos”. As quatro flores-de-lis em ouro, que se encontram nesse brasão, dispostas em cruz, eram o símbolo heráldico do primeiro alcaide-mor de Abrantes, D. Pedro Afonso, se bem que não há um consenso generalizado de que D. Pedro Afonso tenha sido o primeiro alcaide abrantino (ver figura 1).

Figura 1- Brasão atual da Cidade de Abrantes 1

Esse brasão também tem quatro corvos pretos virados para a estrela. Os corvos são alusivos a S. Vicente atestando assim ser este o santo, o patrono ou o orago da cidade. Esses oito corvos, na versão oficial, e por via da tradição, correspondem aos fiéis companheiros de S. Vicente, que evitaram que o seu corpo fosse devorado pelas feras. Não restam dúvidas que a estrela de oito pontas está associada a Maria Mãe de Jesus, e também na tradição oral à Igreja de Santa Maria do Castelo. Todavia, uma estrela de oito pontas também representa, na mística católica, o início da criação ou segundo outros autores, o nascimento de Cristo, como na Estrela de Belém que aparece em muitas das representações da Natividade que foram sendo criadas ao longo dos séculos. As representações mais antigas da Natividade tem uma estrela simples, de seis, sete ou oito pontas, como é o caso de algumas, do séc. IV, encontradas em sarcófagos no Vaticano, ou, do séc. VI, em mosaicos de Ravena. O capitel do séc. XII, de Gislebertus, da catedral de Autun em França, que se pode ver na imagem anterior, exibe uma estrela de oito pontas.

Figura 2- Capitel do século XII da Catedral de Autun, em França.

Repare-se que a estrela de oito pontas, já é usada simbolicamente em Abrantes pelo menos desde o século XIV, pois aparece no Selo do concelho abrantino, século XIIIXIV, brasão do Marquês de Abrantes, D. Luís de Lencastre e Távora é o que se

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apresenta na imagem seguinte, onde se observa à direita, claramente, uma estrela de oito pontas.

Figura 3- A imagem reproduzida da capa das Notas Históricas sobre a Fundação de Abrantes, de Eduardo Campos, 2ª edição, CMA, Abrantes 1984 (fotgrafia de PedroJota).

Recuando no tempo, também é sabido que a deusa babilónica Ishtar tinha uma ligação próxima com a Lua e com as suas fases. Esta tanto representava a vida e a fertilidade (lua cheia) como a destruição e a morte (lua nova). Na fase destruidora esta deusa era representada como uma estrela de oito pontas. A deusa Vénus, conhecida desde longa data como estrela da manhã, era representada na Babilónia, por uma estrela de oito pontas, confundindo-se por vezes com Ishtar. Os Templários, da Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão, apropriaram-se deste símbolo e outras referências pagãs e associaram-no à Virgem Maria, incorporando-o, até aos nossos dias, na mais diversa simbologia, como no símbolo da Virgem Maria que se diz estar no brasão de Abrantes. Para corroborar o que se afirma, veja-se por exemplo, na imagem seguinte, o selo do Irmão Robert de Retz, do século XIII, que também tem no seu emblema, uma estrela de oito pontas e a lua, numa incorporação nítida dos símbolos babilónicos de “Isthar junta com a Lua”. 3

Figura 4 -Selo descoberto no século XIX, na cidade de St. Père em Retz, costa oeste da França.

No quadro que se segue, de um pintor bizantino desconhecido de meados do século quinto, representa-se a Mãe de Deus (Nossa Senhora do Perpétuo Socorro), com um manto sobre a cabeça, no qual se encontra uma estrela de oito pontas (Vénus) simbolizando a estrela que nos guia no mar da vida até o porto da salvação.

Figura 5- Pintura Bizantina do século V. 4

A simbologia babilónica de Vénus e Lua, parece estar presente em muitas outras imagens de Nossa Senhora, como por exemplo na imagem de Nossa Senhora de Copacabana (Brasil), Nossa Senhora do Amparo (Brasil), Nossa Senhora de Guadalupe (México), Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora da Boa Viagem.

Figura 6- Nossa Senhora de Copacabana.

Figura 7 - Nossa Senhora do Amparo. 5

Figura 8 - Nossa Senhora de Gadalupe.

Figura 9- Nossa Senhora da Conceição. 6

Figura 10 -Nossa Senhora da Conceição onde a disposição das mãos faz uma estrela de oito pontas.

Figura 11- Nossa Senhora da Boa Viagem da freguesia das Calhetas, São Miguel, Açores. 7

Segundo a mitologia romana, Vénus era a deusa do amor e da beleza, com capacidades para influenciar os humores das pessoas. Dada a sua natureza maternal, esta deusa protegia os mortais e era, normalmente, portadora de paz e amor. Era mesmo considerada a “mãe do povo romano”. Parece ser nítida a associação, na religião católica, das qualidades de Vénus a Nossa Senhora, ganhando consistência essa hipótese porque a Igreja Católica nasceu durante o império romano, daí que nos pareça ser lícito que se tenha adaptado nesta nova teologia aos esquemas e práticas sociais já existentes. Tal incorporação cultural chega aos nossos dias, resultado da crença que o movimento dos astros influencia a nossa vida. Poucas dúvidas restam que a estrela de oito pontos no brasão da Cidade de Abrantes, está associada a “Maria Mãe de Deus” e que essa simbologia remonta pelo menos ao século XIII-XIV.

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