BRASIL E MÉXICO NO USO DA AMÉRICA LATINA PARA SUPERAÇÃO DA SEMIPERIFERIA: A REGIÃO COMO MEIO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE DEPARTAMENTO DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS

ROBERTO TELES LIMA BARROS

BRASIL E MÉXICO NO USO DA AMÉRICA LATINA PARA SUPERAÇÃO DA SEMIPERIFERIA: A REGIÃO COMO MEIO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL

São Cristóvão 2015

ROBERTO TELES LIMA BARROS

BRASIL E MÉXICO NO USO DA AMÉRICA LATINA PARA SUPERAÇÃO DA SEMIPERIFERIA: A REGIÃO COMO MEIO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a Universidade Federal de Sergipe como parte das exigências para a obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

Orientador: Prof. Dr. Lucas Miranda Pinheiro

São Cristóvão 2015

ROBERTO TELES LIMA BARROS

BRASIL E MÉXICO NO USO DA AMÉRICA LATINA PARA SUPERAÇÃO DA SEMIPERIFERIA: A REGIÃO COMO MEIO DE INSERÇÃO INTERNACIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado a Universidade Federal de Sergipe como parte das exigências para a obtenção do título de Bacharel em Relações Internacionais.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________ Orientador: Prof. Dr. Lucas Miranda Pinheiro Universidade Federal de Sergipe

______________________________________ Avaliador: Prof. Msc. Corival Alves do Carmo Sobrinho Universidade Federal de Sergipe

______________________________________ Avaliador Prof.ª Dr.ª Érica Cristina Alexandre Winand Universidade Federal de Sergipe

Aprovado em 13 de fevereiro de 2015.

AGRADECIMENTOS

Agradeço inicialmente a Deus por todas as graças alcançadas desde o dia de meu nascimento, sendo essa graduação mais uma das vitórias. Gostaria também de mostrar minha gratidão a meus pais, Roger e Nilde Barros, por não medirem esforços para que eu que tivesse a melhor educação e formação possível, sempre podendo contar com todo amor e carinho em qualquer uma de minhas decisões. Também importantes nessa jornada agradeço a meu querido irmão, Roger de Paula Lima Barros, meus tios Roberto Barros, Roberto Filho e Ricardo Teles, minhas tias Tergiane Barros, Rosângela Barros e Laíce Teles, minhas primas Alice e Andrea Giansante e Laís Machado e a meu primo Gustavo Machado. Aos amigos-irmãos, Augusto Machado, Lucas Menezes, Phillipe Mesquita, Hélio Carvalho, Victor Mota, Daniel Barros e Cristiano Guerra pelos momentos ébrios, debates acalorados e xingamentos trocados. Agradeço também a minhas três avós, Maria Darcy, Yeda e Maria Augusta, que me criaram como filhos e cujo carinho sempre estará sempre comigo. Agradeço aos meus dois honrados avôs Roberto da Costa Barros e Roberto de Paula Lima, pelo exemplo de vida, honra e dedicação à família e sociedade, se eu for 1/3 do que eles foram já estarei satisfeito com minha vida. Agradeço aos meus “pais” acadêmicos, Lucas Pinheiro e Érica Winand, pelo exemplo a ser seguido, pelo carinho, pelos conselhos, pelos momentos que tornaram possível o curso ser cada vez mais importante para mim. Um agradecimento especial a Flávia de Ávila, pelo apoio, pelos projetos conjuntos e pelo carinho. Assim, também aos professores Corival do Carmo e Júlio Rodríguez pela amizade, apoio e puxões de orelha dados durante o curso. Um abraço também para minhas meninas da FIES, em especial a Marília, Brenda, Leila, ítala e Lavínia pelas conversas, pela ajuda no trabalho e por todo carinho. Por fim, agradeço pelo amor de minha amada Joana, que me deu forças para seguir com meus sonhos e cujo destino me presentou por tê-la em minha vida. Também agradeço, e muito, a aqueles que enriqueceram a vida acadêmica e profissional durante este percurso. Inicialmente à AIESEC e meus antigos companheiros de ICX, pela experiência formidável de profissionalismo. Também agradeço ao projeto PIIC, do COPES da Universidade Federal de Sergipe, pela bolsa e pelo apoio à pesquisa que tive desde o primeiro semestre de curso, sem esse apoio, a experiência de pesquisar não teria sido tão completa. Agradeço aqui também, de maneira geral, ao Departamento de Relações Internacionais, cujos professores nos ensinaram a importância do ensino em nossas vidas e como a educação tem o

poder transformador em nossas vidas e na sociedade. Também merece a mais honrosa menção o COPEDE, cuja experiência tem traços nesse trabalho e cujos companheiros levarei para toda a vida. Agradeço à Federação das Indústrias do Estado de Sergipe, principalmente em nome a Rodrigo Rocha, pelo apoio e pela experiência de estágio, que foi de valor inestimável. E também agradeço a você que possa estar lendo esse texto que, por quaisquer que sejam os motivos, reconheço desde já como um privilégio ter você lendo algo que fiz.

As coisas que um dia imaginei como minhas maiores conquistas foram apenas um primeiro passo rumo a um futuro que apenas comecei a visualizar. (Jace Beleren, de Ravnica)

RESUMO: O trabalho disserta sobre as estratégias do Brasil e do México em sua política externa a fim de superar sua condição semiperiférica no sistema internacional e qual a importância dada à América Latina no alcance desse objetivo. Busca-se analisar, do período da Guerra Fria até a primeira década do século XXI, os projetos, os recursos e as condicionantes político-econômicas usados por esses países para a integração latino-americana e seus efeitos na política externa. Argumenta-se que, principalmente durante o pós Guerra Fria, o Brasil se torna mais assertivo enquanto ao uso da região (principalmente o Sul) para o alcance de seus objetivos, enquanto o México relega à região uma menor prioridade em sua política externa, alinhando-se às políticas da hegemonia regional, os Estados Unidos. Desse modo, tal comportamento divergente dos dois países perante a região aponta, por fim, duas resultantes distintas: uma maior participação do Brasil na concertação política internacional e regional e um aumento da dependência político-econômica do México à principal potência do sistema, os Estados Unidos. PALAVRAS-CHAVE:

MÉXICO,

BRASIL,

CELAC,

AMÉRICA

LATINA,

SEMIPERIFERIA, ESTADOS UNIDOS

RESUMEN: El trabajo habla sobre las estrategias de Brasil y México en suyas políticas exteriores, con el fin de superar su condición de semiperiferia en el sistema internacional y la importancia dada a América Latina para alcanzar ese objetivo. El objetivo es analizar, desde la Guerra Fría a la primera década de este siglo, los proyectos, los recursos y las condiciones políticas y económicas utilizadas por estos países para la integración latinoamericana y sus efectos en suyas políticas exteriores. Se argumenta que, sobre todo durante la post-Guerra Fría, Brasil se vuelve más firme con el uso de la región (especialmente del Sur) para el logro de sus objetivos, mientras que México relega la región de menor prioridad en su política exterior, alineandose a la política de la hegemonía regional, los Estados Unidos. Por lo tanto, tal comportamiento divergente de los dos países ante de la región señala, por último, dos resultados diferentes: una mayor participación de Brasil en la concertación política internacional y regional y el aumento de la dependencia política y económica de México a la pontencia principal del sistema, los Estados Unidos. . PALABRAS-CLAVE: MÉXICO, BRASIL, SEMIPERIFERIA, ESTADOS UNIDOS

CELAC,

AMÉRICA

LATINA,

SUMÁRIO

1 – INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 8 2- BRASIL NA AMÉRICA DO SUL NO SÉCULO XXI ................................................................ 13 2.1- O PERÍODO DA GUERRA FRIA- ENTRE O ALINHAMENTO E A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE............................................................................................................................. 13 2.2- O PERÍODO MILITAR E O FIM DA GUERRA FRIA ........................................................... 15 2.3- PERÍODO DE TRANSIÇÃO, A DÉCADA DE 1990 E INÍCIO DO SÉCULO XXI .............. 17 2.4- BALANÇA COMERCIAL EM PERSPECTIVA ..................................................................... 27 3- MÉXICO: A POLÍTICA DO PESO DA BALANÇA NO JOGO DO EQUILIBRISTA ......... 30 3.1- ACOMODAMENTO ECONÔMICO COM O NORTE: A POLÍTICA MEXICANA DOS ANOS 90 ........................................................................................................................................... 34 3.2- MUDANÇA DE RUMOS: O MULTILATERALISMO LIBERAL ......................................... 36 3.3- BALANÇA COMERCIAL EM PERSPECTIVA: O TLCANDEPENDÊNCIA. ..................... 41 4- A CELAC: O ENCONTRO DE POLÍTICAS EXTERNAS NOS CENÁRIOS LATINOAMERICANOS ................................................................................................................................... 45 4.1- CELAC: A CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO CONJUNTA MÉXICO-BRASILVENEZUELA ................................................................................................................................... 46 4.2- COMPOSIÇÃO, OBJETIVOS E ALCANCE DA CELAC ...................................................... 47 4.3- O PERIGO AO LADO: A PRESENÇA MILITAR ESTADUNIDENSE NOS PAÍSES DA CELAC.............................................................................................................................................. 51 5- CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................. 58 ANEXOS .............................................................................................................................................. 62

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1 – INTRODUÇÃO A disputa interestatal pelo maior espaço de poder e de ampliação do domínio de seu capital é uma característica indissociável do sistema internacional. A partir dessa disputa, os Estados buscam melhor posicionamento na hierarquia internacional, a fim de garantir a sua segurança e seu desenvolvimento. Os diferentes graus de hierarquia determinam a posição do Estado na divisão internacional do trabalho, tanto quanto sua possibilidade de ação no sistema e sua autonomia para expansão de seu capital (WALLERSTEIN, 2006). No topo dessa hierarquia estão os Estados centrais, que abrigam as firmas que detêm o maior número de fator de capital além de possuírem maior parte da mais-valia do sistema e ganhos nas trocas desiguais. A relação entre os Estados do Centro é mantida como uma questão dúbia: ao mesmo tempo em que são competidoras (rivais) para a acumulação de capital, conquista de mercado e de hegemonia-mundo, os mesmos são parceiros no interesse de manutenção da ordem para a manutenção de seus status-quo no Sistema. Os Estados garantem seus posicionamentos com a prática da ingerência, guerra, submissão econômica a partir de esquemas de dependência econômica para os Estados Periféricos e preponderância nas Organizações que criam para a manutenção do ordenamento internacional (idem). Os Estados Periféricos mantêm-se no outro extremo da hierarquia internacional, estando na base da divisão do trabalho internacional. São os que contêm menor desenvolvimento no espaço da disputa intercapitalista, sendo fornecedores de bens primários para os países centrais e/ou base produtiva para as instituições capitalista destes. Também contêm uma soberania precária, podendo sofrer interferências ou ingerências de acordo com os interesses dos Estados de maior posição na hierarquia internacional. Os Estados Periféricos buscam o fortalecimento de suas próprias capacidades para diminuírem seu processo de dependência e buscar maior autonomia no meio internacional (idem). Entre esses Estados na hierarquia internacional estão os Estados Semiperiféricos, que gozam de maiores capacidades, instrumentos e autonomia (e soberania) que os Estados Periféricos, mas ainda assim não participam do rol dos Estados Centrais, ainda mantendo relativa dependência destes. Dependendo das capacidades desses Estados, eles variam em seus objetivos: alguns, mais ambiciosos e capacitados, buscam a ampliação de seu poder efetivo e elevação na hierarquia internacional; outros, com menores capacidades, apenas lutam para não ampliarem sua periferização. Nesse contexto, os Estados em tal posicionamento hierárquico são rivais e constituem de meios para que se melhorem sua inserção no sistema internacional, sendo alvos das disputas, por exemplo, investimentos e espaço nos meios de concertação política

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internacionais. Em consonância com Fiori (2009), a disputa interestatal combinada com a disputa intercapitalista esteve presente na ascensão dos países preponderantes no Centro e em suas resultantes no sistema internacional. Após a Segunda Guerra, os Estados Unidos aparecem como o grande país Central na esfera capitalista. Nesse momento, o mundo encontra-se na disputa e na divisão política da bipolaridade, caracterizada bela busca hegemônica disputada entre Estados Unidos e União Soviética. Durante esse período, os Estados Unidos auxiliam países asiáticos e europeus economicamente e com alianças militares, a fim de manter seus interesses geopolíticos e de contenção de um avanço do domínio soviético. O período perdura por quase 40 anos e, com a eventual queda do bloco soviético nos anos de 1990, os Estados Unidos despontam como o maior polo de poder do sistema internacional, com uma maior preponderância econômica e militar perante os demais Estados. Entretanto, a Guerra Fria não apenas ficou representada pela bipolaridade de duas superpotências e seus direcionamentos políticos e econômicos. Nos países periféricos, a partir dos movimentos de independência das colônias europeias, iniciou-se um movimento de contestação à ordem que prevalecia até então, o Movimento do Terceiro Mundo. Em oposição ao Primeiro Mundo capitalista e o Segundo Mundo de alternativa comunista, o Terceiro Mundo pregava a maior participação dos países nas organizações internacionais, o não-alinhamento, a autodeterminação dos povos e o respeito à soberania dos países. Esse movimento chamava para a mudança do debate Leste (Comunista) x Oeste (Capitalista) para o debate Norte (Centro) x Sul (Periferia), denunciando as desigualdades do sistema internacional. O Terceiro-Mundismo ganhou maior força durante os anos 70, devido ao processo de arrefecimento das disputas entre Estados Unidos e URSS, além da mobilização de capitais para os países periféricos devido às crises sistêmicas nos países centrais. Entretanto, os países do terceiro-mundo sofreram um choque econômico com as diversas crises sistêmicas ocorridas durante a Guerra Fria, devido à crise dos preços das commodities energéticas e financeiras vinculadas a quebra do padrão ouro-dólar, com o aumento dos juros e das dívidas. Também somou-se a isso o desmembramento da União Soviética, afirmando a predominância ideológica do capitalismo neoliberal. Particularmente interessante para a nossa análise foi o que ocorreu na América Latina durante esse período. Os Estados Unidos, assim, lançaram um corolário a ser seguido pelas economias, principalmente latino-americanas, para se adequarem à ordem neoliberal. Esse documente ficou conhecido como Consenso de Washington, de 1989. O Consenso, segundo Coronado (2005), preconizava 10 pontos: a) disciplina orçamentária; b) mudanças nas

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prioridades de gasto público (de áreas menos produtivas para infraestrutura e educação); c) Reforma fiscal ampla; d) Liberalização financeira, especialmente nas taxas de juros; e) Busca e manutenção de câmbios competitivos; f) Liberalização comercial; g) Abertura para a entrada de investimento estrangeiro indireto direto (IED); i) Privatizações; j)Desregulação do sistema financeiro; l) Garantia dos direitos de propriedade. Os Estados latino-americanos, em geral, reformaram suas instituições políticas e econômicas de acordo com o modelo dado pelo Consenso, na busca de garantir maior confiança do mercado financeiro internacional e resolver as crises de endividamento. A adequação não foi uniforme, tendo alguns países aderido integralmente esse modelo de diminuição estatal e outros modificando de maneira gradual e seletiva. O nível de vinculação dependia do nível de periferização do país e do interesse das elites políticas e econômicas. Assim, o período de transição para o século XXI indicou modificações sistêmicas importantes para principalmente a América Latina. O sistema apresentou crises econômicas e políticas profundas, principalmente nos Estados Centrais, modificando parcialmente a geometria do poder. Nesse sentido, os ataques aos Estados Unidos em 2001 e a crise financeira de 2008 nos Estados Centrais demonstra a inconsistência do sistema e uma relativa queda da hegemonia estadunidense. Assim, ganham nesse período destaque, principalmente pelo desempenho econômico e aumento no acúmulo de capitais, os países do Sul emergente e seus principais representantes, as semiperiferias. Nesse sentido também aumenta de importância para essas semiperiferias o uso de seu entorno geográfico imediato (regiões) como polo de irradiação e ampliação de seu capital político e financeiro e também seus interesses na reforma das Organizações Internacionais, denunciando, assim como o passado terceiro-mundista, as assimetrias do sistema e a necessidade de maior participação dos outros Estados. A partir dessa introdução apresentada, nosso texto analisará e comparará o caso das duas maiores economias latino-americanas, Brasil e México, os direcionamentos de suas políticas externas, para melhor entender como essas duas semiperiferias buscam se inserir no sistema internacional e qual o papel da região Latino-Americana para esses objetivos. É importante tomar como ponto de partida as mudanças e continuidades que esses países tiveram em suas políticas externas durante os três períodos de análise (Guerra Fria, Pós-Guerra Fria, século XXI) para melhor compreender seus posicionamentos no sistema e poder traçar perspectivas de suas estratégias de inserção. Nesse sentido, o primeiro capítulo versará sobre o Brasil e seus direcionamentos. Buscará compreender como o país no período variou de seu posicionamento em relação aos Estados Unidos, entre o alinhamento e a afirmação por autonomia, e por que o país saiu de um

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processo tímido de integração com a América Latina na Guerra Fria, para no início do século XXI impulsionar projetos comuns com os países da região. Ao fim, será realizado um balanço de sua economia atualmente, para confirmar se as escolhas modificaram suas capacidades, o efeito de suas alianças e influencia e foi influenciado por seus objetivos sistêmicos. No segundo capítulo será traçado panorama similar, entretanto, em relação ao México, sempre que seja pertinente realizando comparações com o caso brasileiro. Buscará, portanto, analisar as continuidades e mudanças da política externa mexicana perante os Estados Unidos, da busca pela autonomia política, principalmente nos meios multilaterais, durante a Guerra Fria, para o alinhamento profundo à política estadunidense no período posterior. Também será foco da análise a política mexicana perante a América Latina, que durante a Guerra Fria foi ativa e durante o pós-Guerra Fria sofreu uma progressiva perda de prioridade para o seu projeto de desenvolvimento. A última sessão do capítulo terá como enfoque, assim, como o primeiro, um balanço da economia mexicana, analisando as consequências de suas escolhas na política externa em busca de se inserir melhor no sistema. O terceiro capítulo buscará analisar como funciona o bloco de integração LatinoAmericana que comumente foi criado por México e Brasil, com também participação efetiva da Venezuela, no século XXI: a Comunidade de Estados Latino-Americanos (CELAC). Serão versados elementos atinentes a seus objetivos, seu histórico, suas motivações, a influência desses três países em seus direcionamentos e como ele coopera para a inserção de México e Brasil na América Latina e no sistema Internacional. Também serão apresentados indicativos de análise acerca de seus limites e como essa confluência pode, ou não, levar a projetos mais amplos. Ao fim, serão encaminhadas considerações finais sobre tais discussões, discutindo de forma breve como os dois países tem se utilizado de suas conexões a fim de melhorar seu posicionamento no sistema internacional, sobretudo no contexto hemisférico ou subregional; que importância os dois países têm para a região latino-americana e vice-versa e se as medidas tomadas foram fortuitas para o alcance de seus interesses em plano sistêmico. Para auxílio nas nossas considerações finais tomaremos em conta os comparativos utilizados por Mace, Belanger e Therien (apud González, 2008) para avaliar o regionalismo de um país nas Américas. Esses meios comparativos são: a) peso demográfico; b) tamanho da economia (PIB); c) nível de desenvolvimento (PIB per capta); d) poder de mercado (participação no comércio inter-regional); e) poder militar (gasto militar) e; prestígio diplomático (participação em missões e em organismos comuns). Em todos esses pontos, o Brasil atualmente possui vantagem em relação ao México com a América Latina. Demonstrando, no caso do Brasil, qual

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semiperiferia tem o interesse de entrar no rol dos países centrais, e, no caso do México, qual intenta não acentuar sua situação periférica.

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2- BRASIL NA AMÉRICA DO SUL NO SÉCULO XXI O presente capítulo procurará abarcar a política externa Brasileira com enfoque na percepção da importância da América Latina para o desenvolvimento nacional do país. Inicialmente será tratado a política externa brasileira durante a Guerra Fria, análise que será necessária devido a suas variantes e construção de objetivos ligados ao hemisfério americano. Durante esse período, a política externa brasileira oscila entre o americanismo e o universalismo1, e daremos destaques à importância, ou não, que a região latino-americana teve durante tal período. Depois será construída uma explanação sobre a transição do modelo desenvolvimentista brasileiro e sua adequação ao neoliberalismo, pormenorizando também suas diretrizes centrais e a importância hemisférica para o alcance de tais objetivos. Por fim, será analisada a política externa do século XXI e seu maior destaque ao sul americanismo e a busca pela construção da liderança regional. Esses pontos traçados serão importantes para um comparativo mais efetivo com o México, também foco de análise do trabalho, e sua relação com a América Latina e, também, com os Estados Unidos. O objetivo é mostrar como a importância da região para o Brasil veio, principalmente, na transição do século XX e XXI e como ele se utiliza de seus acordos regionais para sua maior projeção de poder, sem necessariamente oferecer contrapartidas para o desenvolvimento de seus parceiros.

2.1- O PERÍODO DA GUERRA FRIA- ENTRE O ALINHAMENTO E A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE O período imediato ao pós-Segunda Guerra é marcado pelo alinhamento brasileiro à política externa estadunidense. Esse alinhamento não será apenas brasileiro mas de toda América Latina, principalmente por conta da divisão bipolar em que o mundo se instaurara e da discrepância de poder entre os países latino-americanos e os Estados Unidos. Esse alinhamento buscava medidas de auxílio econômico para superar o subdesenvolvimento e auxílio político a partir da superpotência capitalista (BUENO; CERVO, 2008).

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Rafael Duarte Villa (2005) afirma que, desde a gestão do Barão do Rio Branco até o Governo Collor, a Política Externa Brasileira oscila entre dois paradigmas centrais: o americanismo e o globalismo. O Americanismo se caracteriza por perceber que uma política externa com eixo nos Estados Unidos possa trazer maiores vantagens e poder de negociação no cenário internacional para o Brasil. O Globalismo (ou universalismo), por sua vez, entende que para o Brasil ter um maior poder de barganha no cenário internacional, e até com os próprios Estados Unidos, é preciso diversificar suas relações exteriores.

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Esse período foi marcado justamente pelo alinhamento brasileiro aos Estados Unidos no campo político econômico, quase que irrestritamente2. No campo político hemisférico, o Brasil entrou nos programas de segurança coletiva, o que incluía o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca, que permitia a ingerência nos Estados americanos caso alguma ameaça, considerada comum, ocorresse3. O país também entrou na Organização dos Estados Americanos (OEA), cuja atuação no futuro dependerá de acordo com o direcionamento da política externa do governo, variando, como sempre, entre a submissão ou o enfrentamento jurídico aos Estados Unidos4. No campo econômico, buscou-se uma maior abertura econômica como atração de capitais. Para isso, buscou uma comissão conjunta com os Estados Unidos, formando a missão Abbink no período Dutra; a Comissão Mista Brasil-EUA, no período Vargas5 e; a Operação Pan-Americana (OPA) no período JK. Principalmente no período Vargas e JK, o Brasil buscou o auxílio dos Estados Unidos afirmando que o subdesenvolvimento propiciava a insurgências e revoluções e que a ajuda econômica devida dos Estados Unidos poderia evitar tais situações. Os financiamentos viriam perlo auxílio do EXIMBANK estadunidense e do BID e do BIRD, tendo como contraproposta a compra de matérias de origem norte-americana para os projetos de infraestrutura, envolvendo portos, hidrelétricas e refinarias6. O Brasil, nesse momento, apenas irá buscar a aproximação direta com a América Latina no período JK. A fim de garantir uma reserva de mercado para suas exportações, o Brasil assina com a Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (ALALC), com a busca de criar-se um mercado preferencial e política econômica de substituição de exportações em relação a mercadorias de países não-membros. Esse foi o primeiro passo do Brasil no pós-Guerra para uma integração latino-americana sem estar alinhado a algum projeto estadunidense, o que demonstra a uma relativa negligência brasileira para a região durante o período.

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Oswaldo Aranha, seguindo as ordens do Executivo, votou contra a entrada da China maoísta na ONU, pois, segundo Bueno e Cervo (2008), o direcionamento do governo brasileiro para a política externa nas Nações Unidas era seguir todos os votos estadunidenses. 3 O TIAR permitia que qualquer país pudesse receber uma intervenção militar, principalmente dos Estados Unidos, caso isso se interpretasse como uma ameaça. O México foi contra o acordo, apesar de no fim tê-lo assinado (ZICCARDI, 2011). 4 Durante a Guerra Fria, o México usava a OEA e outros foros multilaterais para a tentativa de contrabalancear o poder norte-americano. Para o Brasil, variava do direcionamento político que o Executivo possuía. 5 No âmbito interno, durante o governo Varga, implementou-se leis nacionalistas que provocaram um certo afastamento em relação aos EUA. A criação da Petrobrás e sua consequente lei de monopólio do petróleo nacional, e a lei de Regulamentação de Investimentos fizeram com que os EUA vissem com maus olhos tais leis, principalmente a dos Investimentos que limitavam as remessas de lucros estrangeiros. 6 Incluindo o projeto da hidrelétrica do São Francisco.

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Após o período JK, o Brasil passa por uma mudança estrutural em seu direcionamento de política externa. Durante os períodos Jânio Quadros (1961) e João Goulart (1961-64), o Brasil passa pelo período da Política Externa Independente (PEI). A PEI é baseada em preceitos terceiro-mundista, de revisão do quadro do mainstream bipolar da Guerra. Baseando-se nos princípios universalistas da política externa e na busca de uma política externa pragmática, o Brasil nesse período buscará acordos com países do Leste, com a Europa e com a África, a fim de transformar os novos laços políticos e econômicos da política externa como plataforma para o desenvolvimento. Assim, a principal característica da PEI era o abandono do conflito Leste x Oeste e sim o debate Norte (desenvolvido) x Sul (em vias de desenvolvimento). Na América Latina, a PEI teve como maior exemplo de divergência com os Estados Unidos na crise cubana. Após a Crise dos Mísseis, o Brasil passou a defender a soberania cubana e buscava a resolução do conflito a partir da mediação e negociação via OEA, e não pela invasão militar que os EUA buscavam. O México, nesse período, atuou em conjunto com o Brasil, tanto em tal resolução anti-ingerência, quanto na abstinência na votação, em 1962, da expulsão de Cuba da OEA. A PEI ainda, internacionalmente, apoiava os princípios de autodeterminação dos povos, defendendo os processos de independência africanos. O Brasil buscava, assim, maior aproximação com a África, a fim de ser parceiro estratégico desses parceiros. Tais direcionamentos da PEI, na busca de maior inserção internacional do Brasil e de diversificação estarão presentes no período militar e, posteriormente, com grande enfoque no período Lula, a partir do que será da política da não-indiferença.

2.2- O PERÍODO MILITAR E O FIM DA GUERRA FRIA A ditadura militar do Brasil em seu período de governo (1964-1985) utilizou-se de diretrizes nacionalistas e com uma maior assertividade da ampliação do papel do Brasil no cenário internacional. Apesar de que no primeiro governo militar de Castello Branco (19641967) o Brasil praticou um alinhamento com os Estados Unidos7, aplicando uma “correção de rumos” em relação às diretrizes da PEI, as características da política externa do governo militar mostraram-se afirmativas, principalmente durante o período Médici (1969-1973), em relação à expansão internacional brasileira. Nesse período, o Brasil apoiou-se no debate Norte-Sul, buscando ampliar as suas relações com o Sul global, mas também tentando a transferência

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Nesse momento, o Brasil rompe com a PEI,apoiando os EUA nas sanções econômicas a Cuba pela OEA.

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tecnológica com a Alemanha em matéria nuclear e com um aumento da pauta exportadora para a Ásia. Esse movimento buscava diminuir a dependência brasileira da economia estadunidense, tanto econômica, quanto energética8 e estratégica, ampliando suas margens para o desenvolvimento. Na América Latina, o Brasil envolve-se em projetos mais amplos de cooperação energética e econômica. Na questão energética, realiza o acordo tripartite com Argentina e Paraguai para a construção da hidrelétrica de Itaipu, além da negociação de compra de gás boliviana. No âmbito econômico, o país integra o Sistema Econômico Latino-Americano (SELA), em conjunto com outros países latino-americanos, incluindo o México. Durante esse período, o Brasil apresentou um grande crescimento econômico, alcançando a marcado de 2 dígitos percentuais ano, o que ficou conhecido como “Milagre Brasileiro”. Entretanto, as benesses econômicas do milagre se esgotam, devido às crises sistêmicas do petróleo e do aumento dos juros das dívidas dos países latino-americanos, incluindo do Brasil. Essa situação afeta principalmente o último governo militar, de João B. Figueiredo e o governo de transição de José Sarney. Esses governos contaram com tentativas de planos econômicos para o findar a crise, entretanto, não foram efetivos no combate à inflação e à dívida. Apesar desse cenário, a América Latina nos anos 80 buscou mais um impulso integracionista. O Brasil foi signatário da Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), participou do Grupo de Apoio do Grupo de Contadora o formulou o Pacto Amazônico com seus países vizinhos. O principal fruto desse período foi o tratado assinado em 1986, pelo então presidente José Sarney e o seu argentino Raúl Alfosin, criando a “Comissão de Execução do Programa de Integração Brasileiro-Argentino”. Esse acordo propunha um grau de cooperação que embarcava os âmbitos comerciais, políticos, culturais, tecnológicos e jurídicos. A importância da Comissão foi que ela possibilitou seu alargamento de cooperação para outros países da região, integrando posteriormente o Paraguai e o Uruguai, ou seja, era a fase embrionária do que viria a ser o MERCOSUL. Mesmo com essas novas tentativas, as economias latino-americanas permaneceram na draga econômica, mantendo déficits na balança de pagamentos e necessitando cada vez mais de empréstimos. Essa crise afetou as oportunidades de investimento e financiamento dos países, impossibilitando a viabilização de projetos mais amplos de diversificação da pauta comercial.

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O Brasil nesse período não assinou o Tratado de Não Proliferação de Armas Atômicas (TNP). A justificativa é que o acordo limitava a soberania nacional para o desenvolvimento de tecnologia nuclear.

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Esse período também coincide com o fim da Guerra Fria, com a ascensão da unipolaridade capitalista no globo, marcada pelo neoliberalismo.

2.3- PERÍODO DE TRANSIÇÃO, A DÉCADA DE 1990 E INÍCIO DO SÉCULO XXI Com o fim do discurso terceiro-mundista e as políticas desenvolvimentistas do fim da Guerra Fria, os países do Sul tiveram de repensar seus direcionamentos e suas capacidades diante de um novo modelo imposto pelo capitalismo vigente. No Brasil, o período era marcado por mudanças políticas, com a redemocratização. O Governo Collor (1990-92) foi o responsável inicialmente por adequar a Política Externa Brasileira a esse desafio com a crise do paradigma globalista, presente desde os anos 1970 na diplomacia brasileira, e inserir adequadamente o país em um sistema internacional que condicionava pela globalização financeira e abertura de mercado (VILLA; VIANNA, 2008, p. 78; SARAIVA, 2013, p. 65). Para essa “atualização” da política externa, o Governo Collor decidiu voltar aos preceitos americanistas, baseando-se no que se pregava no Consenso de Washington. Com tal política, o governo buscava pleitear uma melhor imagem no cenário internacional, acesso a tecnologias e melhores condições de renegociar a dívida externa. Acreditava-se que, para alcançar tais objetivos, o Brasil teria de reconhecer o esgotamento do modelo desenvolvimentista de crescimento endógeno e liberar o acesso a sua economia, além da criação de uma agenda internacional que não gerasse indisposições com os Estados Unidos, agora única superpotência do sistema (VILLA, 2005, P.13). Entretanto, essa visão de cessão de parte da soberania nacional, além da possível perda do incremento industrial de décadas de políticas desenvolvimentistas por conta de uma liberalização focada nos Estados Unidos, contou com fortes críticas de setores burocráticos e industriais (CARMO, 2013, p. 140; VILLA; VIANNA, 2008, p. 79). Com o fim do período Collor (1992), a partir do processo de impeachment pelo qual passou o então presidente, assume interinamente Itamar Franco, delineando uma volta parcial aos ideais globalistas da Política Externa Brasileira, mas adequando ao mainstream da política daquele momento: a globalização. O direcionamento e objetivos desenvolvidos no governo Itamar Franco para o desenvolvimento do país foram seguidos também pelos governos seguintes, diferenciando o modo de realização a partir das características de seus governos, no caso o Fernando Henrique Cardoso (1994-2002) e o Lula (2002-2010). Em linhas gerais, essa Política Externa se caracterizava: a) pela construção de uma identidade continental, focando na integração regional para melhor inserção internacional; b)

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tornar a médio prazo o país em um global trader e, a longo prazo, em um global player. Para o logro desses objetivos, traçaram-se inicialmente três meios: 1) buscar uma participação mais ativa do Brasil nos organismos multilaterais, intentando nisso o objetivo final do assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas; 2) a construção de agenda positiva com os Estados Unidos só que, entretanto, mantendo autonomia de seus interesses e; 3) priorizar a integração regional na América do Sul como entorno estratégico. Essas diretrizes receberam os nomes de autonomia pela participação, durante o Governo Fernando Henrique, e autonomia pela afirmação9, durante o período Lula, cujas diferenças estavam nos meios utilizados para o alcance dos objetivos: o primeiro primordialmente pela via multilateral, o segundo pela cooperação Sul-Sul (ALMEIDA, 2004, p. 5; VILLA; VIANNA, 2008, p. 80-81; SARAIVA, 2013; SPEKTOR, 2011; SORJ; FAUSTO, 2011). O período Fernando Henrique foi marcado pelo movimento da política externa de inserir o Brasil ativamente nos principais foros de discussão e fazer com que o país assumisse maiores responsabilidades e representatividade nos foros multilaterais e regionais10. A adequação para a nova realidade do sistema internacional teve já de início a assinatura brasileira do Tratado de Não Proliferação de Armas Atômicas (TNP), acordo que o Brasil havia se negado a assinar desde a década de 70. Esse movimento mostrou a vontade do governo em demonstrar maior respeitabilidade com as normas e práticas dos regimes internacionais de segurança. Também passou-se, pela política externa brasileira, a preterir um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, participação ativa no GATT (posteriormente Organização Mundial do Comércio, OMC11), além de buscar boas relações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) a fim de renegociar termos da dívida externa. No plano regional, o Brasil neste período optou pelo fortalecimento de suas relações com seu entorno geográfico imediato e acelerar os processos de integração, de maneira que 9

Miriam Gomes Saraiva (2013) considera que, em meio à crise do direcionamento da política externa Brasileira no início dos anos 90, no Itamaraty ficou dividido em dois vieses de pensamento que divergiam sobre as estratégias de crescimento econômico e inserção política do país. Essas correntes eram a institucionalista pragmática e a autonomista. A primeira é caracterizada por ser a favor de uma liberalização condicionada, que não afete prejudicialmente os interesses dos setores produtivos; no campo político, define como importante o apoio do Brasil aos regimes internacionais vigentes, vendo a adequação do país a essas normas como favorável para o desenvolvimento econômico. Já os autonomistas são adeptos de perspectivas desenvolvimentistas no âmbito econômico e definem a integração como um instrumento de acesso a mercados externos e como canal de projeção para a internacionalização das empresas brasileiras. Segundo a autora, a predominância de cada uma dessas correntes na pasta do Itamaraty durante o governo é que deu a tônica da política externa. Assim, predominou a visão institucionalista pragmática no governo Fernando Henrique e a autonomista durante o governo Lula. 10 Apesar da colocação acima, trabalhada pelos autores Villa e Almeida, Amado Cervo discorda dessa posição, afirmando retrocessos na política do governo do período (cf. CERVO, BUENO, 2008). 11 Vale ressaltar a vitória dentro dessa instituição durante seu governo no painel da EMBRAER contra a canadense Bombardier, quando se tratando do uso de práticas indevidas de comércio (cf. VILLA, 2005).

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estes serviriam para assegurar uma margem de manobra para as adequações sistêmicas do período. O parceiro estratégico para tal empreitada era precisamente a Argentina, cujos tratados desde a década de 80 culminaram na criação do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), adicionando-se ao tratado o Paraguai e Uruguai, durante o período Itamar Franco. O aprofundamento das relações exteriores com esses países, principalmente o vizinho portenho, fez parte da estratégia de círculos concêntricos, aplicada neste caso por Rafael Villa (2005): “círculos” de poder e influência que irradiariam a inserção internacional brasileira a partir de um núcleo duro (que seria o MERCOSUL), o qual o Brasil usaria tais relações para barganhar mais poder e melhor posicionamento no sistema internacional. A afirmação do MERCOSUL, foi de fato um marco importante para o que viria a ser posteriormente um concerto político subcontinental. Entretanto, não possuía a intenção, inicialmente, de ser um bloco de discussão e coordenação política da região, mas sim, um meio no qual os países fundadores, principalmente Brasil e Argentina, responderiam às mudanças estruturais do sistema internacional no período pós-Guerra Fria. Uma problemática que se tornou presente para tal processo de regionalização também eram as dificuldades econômicas que os países da região estavam passando, reformando suas economias em direção ao liberalismo que exigiam os mercados internacionais12. Outro fator que dificultou uma maior aproximação foram os atritos que o governo brasileiro teve com a Argentina durante o governo Menem13, por conta dos afastamentos deste dos processos de integração econômica regional e busca pelo respaldo econômico junto aos Estados Unidos como maneira mais eficaz para lidar com as crises do período14. No segundo mandato do governo Fernando Henrique buscou-se ampliar as relações com países do subcontinente, na tentativa também de diluir a necessidade de coordenação com a Argentina para políticas regionais e aumentar a margem de manobra do país. Assim, no ano 2000, o governo organizou a primeira reunião de chefes-de-Estado da América do Sul tendo como principal fruto da reunião a criação da Iniciativa para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA), cujo principal objetivo era o fomento da integração física do

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Essas crises derivaram-se do aumento das dívidas nas décadas anterior, além da dificuldade de manter a balança comercial superavitária e a solução ao incremento para o desenvolvimento nacional. Aplicaram-se também crises na década de 90 nos mercados da América Latina, a partir do Efeito Tequila no México e da crise nos mercados asiáticos (CASTRO, 2014). 13 Apesar das divergências, o MERCOSUL durante o período Menem ampliou-se, conjuntamente com o apoio do Brasil, aderindo ao bloco como membros observadores o Chile e Bolívia. 14 O problema mais claro deu-se quando o Ministro da Fazenda argentino, Domingo Cavallo, declarou em Davos uma reforma econômica no país que faria uma política cambial de paridade ao dólar (conhecida como dolarização). Em Brasília, esse gesto sem nenhum aviso prévio e coordenação conjunta na seara do MERCOSUL foi encarada como uma “traição” por parte do governo argentino (SPEKTOR, 2011).

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subcontinente e criação de obras de infraestrutura que viabilizassem e facilitassem o escoamento dos produtos dos países da região para o resto do mundo. O financiamento desse projeto era o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial, Fondo Financiero para el Desarrollo de la Cuenca del Plata (FONPLATA) e, posteriormente, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) por via bilateral (CARMO, 2013; SANTOS, 2013; ALMEIDA, 2004). A partir da progressão da integração econômica e coordenação política no bloco, o país trataria suas posições em temas que envolvessem negócios com os países da região e potências extra-regionais, como a proposta da Área de Livre-Comércio das Américas (ALCA) e o Tratado MERCOSUL-União Europeia (SPEKTOR, 2011). No caso particular da ALCA, o projeto fora idealizado pelos Estados Unidos para a adequação do continente americano a sua agenda de liberalização econômica, havendo discordância por governo brasileiro perante cláusulas do acordo que poderiam causar distorções no comércio do continente, possibilitando uma maior periferização do hemisfério americano em relação aos EUA. O posicionamento do Brasil, ressaltava os pontos eram considerados prejudiciais aos interesses nacionais15, como a falta de contrapartidas para a abertura do comercial no setor industrial, garantias para transferência de tecnologia e desacordo nas cláusulas de direito de propriedade intelectual, principalmente por uma abertura de um país do Centro em sua região de principal interesse econômico. Esse posicionamento brasileiro encontrou voz com Hugo Chávez, presidente da Venezuela, que, em 1999, discursava de forma mais branda quanto ao projeto e, após a tentativa de golpe no seu governo em 200216, passou a denunciar as propostas “imperialistas” do governo estadunidense e radicalizando seu discurso anti-hegemônico. Assim, o período Fernando Henrique Cardoso ficou marcado pelo posicionamento brasileiro crítico quando afetavam o interesse nacional e uma maior aproximação e liderança com os processos de integração na América do Sul, vista como elemento central para o desenvolvimento do país17. Também buscou-se um melhor posicionamento como player no

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O México representava neste período uma expansão dos interesses estadunidense de maneira mais agressiva para a América do Sul e também uma possível fonte de avanço de recorrentes crises para o Sul do continente americano. Desse modo, no final dos anos 90, o Brasil em discursos diplomáticos buscou se livrar do rótulo de “América Latina” para o rótulo de “América do Sul”, excluindo o México desse processo e posicionando-se contra a ALCA, que esse país apoiava. Assim, como declarou Rubens Barbosa, então embaixador do Brasil em Washington: “(O) México não faz parte da América do Sul e, portanto, não pode ser parte de qualquer iniciativa do Brasil em relação ao subcontinente” (BARBOSA apud SPEKTOR, 2011). 16 A aproximação foi realizada nas relações Brasil-Venezuela durante o período Fernando Henrique, ao assumir papel ativo na estabilização da Venezuela após a tentativa de golpe em 2002 (cf. VILLA, VIANNA, 2008). 17 “Está madura a ideia de que o Brasil assuma, na América do Sul, um papel de liderança, o que já vem fazendo informalmente. (...) América do Sul é nossa vizinhança e onde ocorrerá a expansão capitalista das empresas brasileiras. Devemos ocupar esse espaço antes que outros o façam”. (BARBOSA apud SPEKTOR,2011)

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cenário internacional, participando ativamente na OMC e na ONU. Entretanto, comercialmente, o Brasil se alinha mais aos países do Norte que do Sul, na busca de maior inserção no mercado internacional (SARAIVA, 2013; VILLA, 2005; ALMEIDA, 2004). Ao usar o termo autonomia pela afirmação (posteriormente, o chanceler Celso Amorim (2011) usará, para a mesma caracterização da política externa, o termo de não indiferença), Rafael Duarte Villa (2005) caracterizou-o a partir do posicionamento assertivo do governo Lula para afirmar os interesses nacionais e soberanos do Brasil no cenário internacional, ou seja, o superar sua condição periférica e queria tornar-se parte dos centrais. Essencialmente, os objetivos do período Lula na Política Externa Brasileira mantinham os mesmos objetivos traçados pelos seus antecessores (Itamar e FHC). O que se modificou foi o modo com que ele buscou ascender o Brasil como país central no sistema internacional, assemelhando-se à prática da PEI e do período do pragmatismo da política externa do período militar, ampliando as relações com os países periféricos para maior expansão competitiva no sistema capitalista e da política internacional. A Política Externa do governo Lula buscou fortalecer as relações com o Sul emergente. Enquanto este não deu destaque a esses países em suas políticas, o Governo Lula 18 começou um movimento denominado autonomia pela diversificação (VIGEVANI, 2011). Essa autonomia seria um aumento do número de parcerias comerciais e políticas que o Brasil teria com o Sul. Esse redirecionamento, principalmente político, permitiu ao Brasil participar de diversos fóruns com outros países emergentes, destacando-se o IBAS (Índia, Brasil e África do Sul) e os BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) 19. Importante fator dessas associações a esses fóruns é o caráter menos vinculativo e de coordenação e consulta mútua para temas de interesses comuns entre esses países, principalmente em temas como desenvolvimento e cooperação (FLEMES, 2013). No âmbito multilateral, o período Lula manteve um discurso a partir das reformas das instituições de governança internacional. O Brasil permaneceu com seu interesse no assento permanente no CSNU, contando agora com o apoio da Alemanha, Índia e Japão, também

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É representativo o quadro de que, em menos de 2 anos de governo, o presidente Lula visitou mais países que o presidente Fernando Henrique em oito anos de mandato, principalmente para África e Ásia (cf. ALMEIDA, 2004). 19 Esse direcionamento brasileiro para a África e para a Ásia lembra a mesma aproximação realizada no período do terceiro-mundismo e da PEI. As semelhanças se caracterizam pela busca de espaços políticos e econômicos nos dois continentes, efetivando, principalmente, laços econômicos profundos com a principal economia asiática do momento: na década de 70 o Japão, na era Lula, a China.

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candidatos à vaga, para que se modifique e “democratize” a gestão da ONU 20. Outra participação importante do Brasil no período foi sua liderança perante a rodada de Cancun e Doha da OMC, buscando denunciar o protecionismo, práticas de dumping e os subsídios dos países industrializados centrais em relação aos produtos agrícolas. Esse papel ativo na OMC também rendeu vitória que o país obteve no painel contra os Estados Unidos devido aos subsídios que esse pagava aos produtores agrícolas. Nesse mesmo âmbito econômico, outro papel de destaque foi a formação do G20, fórum de consulta econômica com países emergentes, para a discussão e resolução de problemas relativos a más práticas de comércio, câmbio e governança do sistema financeiro21 (VILLA; VIANNA, 2008; SARAIVA, 2013). Apesar da intensa busca pelo destaque internacional nas relações Sul-Sul e nos foros multilaterais, o Brasil no governo Lula passa a enxergar a região sul-americana como prioridade de sua política externa, sendo basilar para sua inserção internacional 22. Assim, como afirma o chanceler do governo Lula, Celso Amorim (2003): No Governo Lula a América do Sul será nossa prioridade. O relacionamento com a Argentina é o pilar da construção do MERCOSUL, cuja vitalidade e dinamismo cuidaremos de resgatar. Reforçaremos as dimensões política e social do MERCOSUL, sem perder de vista a necessidade de enfrentar as dificuldades da agenda econômico-comercial, de acordo com um cronograma preciso. (...) Fundamental para a recuperação do MERCOSUL é a revitalização do Fórum Econômico-Social. (...) A formação de um espaço econômico unificado, com base no livrecomércio e em projetos de infraestrutura, terá repercussões positivas tanto internamente quanto no relacionamento da região com o resto do mundo. Vários de nossos vizinhos vivem situações difíceis ou mesmo de crise. (...) Respeitamos zelosamente o princípio da não intervenção, da mesma forma que velaremos para que seja respeitado por outros. Mas não nos furtaremos a dar nossa contribuição para a solução de situações conflituosas, desde que convidados e quando considerarmos que poderemos ter um papel útil, tendo em conta o primado da democracia e da constitucionalidade.

Assim, o papel do MERCOSUL não seria apenas para uma integração de caráter econômico-comercial, teria uma função mais profunda de coordenação política e de maior acesso à participação social. Essa mudança do conceito do MERCOSUL, principalmente para um enfoque mais político, possibilitou sua ampliação, com a adesão da Venezuela como 20

Apesar do pleito para a modificação do CSNU e acesso a uma cadeira permanente, o Brasil foi criticado pela Argentina e pelo México ao se colocar como representante da América Latina em caso de uma reforma aprovada (MALAMUD, 2013). 21 O G20 é muito importante para esse processo de dinamização do diálogo entre semiperiferia e centro do sistema internacional. O organismo ganha maior destaque após a crise de 2008, na qual o antigo agrupamento de economias centrais, o G7, passam por dificuldades financeiras e buscam o auxílio das semiperiferias para a solução da crise. Com maior protagonismo e sepultando o G8, o G20 busca, principalmente, a reforma das instituições formadas em Bretton Woods no pós Segunda Guerra e manutenção dos preços das commodities, a fim de não haver o exacerbado desequilíbrios nos termos de troca (COOPER, 2013). 22 Inversamente do governo mexicano de Vicent Fox (2000-2006), cujo direcionamento da Política Externa foi o alinhamento à política estadunidense no âmbito hemisférico, relacionando-se com a América Latina via OEA ou acordos bilaterais, provocando um afastamento com a região. Esse período será melhor trabalhado no Capítulo 2.

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membro associado em 2003, além de se tornar um foro privilegiado para a concertação política entre os países vizinhos e também poder negociar com outros blocos regionais sul-americanos, como a Comunidade Andina de Nações, a CAN. Os diálogos mais aprofundados com os países sul-americanos foram possibilitados pela maior similaridade na agenda dos governos, principalmente em âmbito regional. A “nova esquerda latino-americana”, ou seja, com o surgimento de governos de centro e esquerda sulamericanos na entrada do século XXI23, caracterizavam-se por seus posicionamentos pósneoliberais, como maior defesa de um Estado mais regulador, a defesa multidimensional da soberania, uma integração autônoma frente às potências mundiais e ênfases em políticas contra a desigualdade (ALEJO, CORONADO, 2013, p. 190). Parte dessa aproximação também foi devido à habilidade brasileira de aproveitar o vácuo de poder deixado pelos Estados Unidos na região após os atentados do 11 de Setembro de 2001.Esse fato fez com que a política externa americana entrasse na era da Guerra ao Terror, relegando a América do Sul em uma segunda classe de prioridades. Esse vácuo ficou ainda mais claro após a inviabilidade da ALCA24 e do fracasso do golpe na Venezuela. A partir de então, os Estados Unidos passaram a se preocupar mais com suas políticas bilaterais e pontuais com os países do que uma agenda determinada para a região, como acordos de livre-comércio com Chile e Colômbia e eventuais impasses com o discurso anti-hegemônico chavista25. Um dos principais projetos criado com os países sul-americanos foi a União das Nações Sul-Americanas (UNASUL), organismo de concertação política de países soberanos da América do Sul, que abrange variados temas comuns como meio ambiente, recursos energéticos e hídricos, segurança e defesa e desenvolvimento regional. Tendo início com a formação da Comunidade Sul-Americana de Nações (CASA), em 2004, com membros do MERCOSUL e da CAN, sua constituição foi aceita em Brasília em 2008 na terceira cúpula deste bloco. A UNASUL constitui um avanço importante das relações sul-americanas já que envolveu tanto a aglutinação da IIRSA, quanto criou um banco de fomento próprio, o Banco do Sul, e um mecanismo de consulta para assuntos de defesa, o Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS), que busca o diálogo, a cooperação e a coordenação de informações, planejamentos e 23

Presença desses governos na Argentina, Venezuela, Bolívia, Equador, Uruguai, Paraguai e Chile. Após o governo Fernando Henrique, no início do período Lula, o Brasil tentou reformular os termos da ALCA, propondo um tratado por adesão seletiva aos termos de acordo com os interesses de cada país. O projeto ficou conhecido como “ALCA light”. Entretanto, o projeto em si já não era prioridade do governo brasileiro naquele momento, o que tornou o processo travado até o fim das negociações em 2005, em Mar del Plata. 25 Exemplo desses impasses foi o veto pelos da compra de caças brasileiros pelo governo Venezuelano, no qual o Brasil teve de intervir politicamente para que houvesse continuidade nas negociações. Outro caso que ganhou relevância foi a comparação que Chávez fez do então presidente estadunidense, George W. Bush, relacionando-o ao demônio na Assembleia Geral das Nações Unidas. 24

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desenvolvimento conjunto em matérias de política de segurança e defesa, cujo objetivo é a diminuição da percepção de ameaça entre os membros, minando antigas rivalidades 26 (FUCCILLE, REZENDE, 2013; SANAHUJA, 2013). Um dos instrumentos bastante utilizados na era Lula para a integração regional foram os financiamentos brasileiros para obras de integração e infraestrutura em âmbito regional, possibilitando uma maior expansão do capital brasileiro. Focando no setor de infraestrutura e de construção civil, além de utilizar os créditos do BNDES, o capital brasileiro passou a ser presente em diversas obras pela América do Sul e Latina. Apesar dos financiamentos27 serem realizados como dita cooperação, eles se assemelham com os aportes financeiros que o Brasil recebia dos Estados Unidos na era democrática de Vargas. Assim, esses valores são direcionados como empréstimos com a condicionante de que, para a recepção dos mesmos, há de comprar de produtos de empresas brasileiras, mesma condicionante que os EUA usaram para o Brasil naquele período. Mesmo com o relativo sucesso de tal expansão do capitalismo brasileiro, levantam-se dúvidas sobre as verdadeiras nos países da região quanto as intenções brasileiras no processo de integração regional, que podem demonstrar um processo de periferização da vizinhança em relação à sua economia. Esse processo de empréstimos via BNDES tem sido considerado, por países como Equador e Bolívia28, como meio para um subimperialismo brasileiro, em alusão ao imperialismo americano. O caso do Equador em 2008 é emblemático, quando este país embargou os bens da construtora Odebrecht, responsável pela construção da hidrelétrica de San Francisco, por conta de problemas no funcionamento da mesma, fazendo com que a empresa retirasse suas operações no país e denunciando os empréstimos do BNDES do valor de US$

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Esses conflitos envolviam a recorrente crise entre Colômbia, Equador e Venezuela em relação às Forças Armadas Revolucionárias Colombianas, as FARC. A problemática consistia na constante quebra de soberania por parte do exército colombiano ao invadir o território dos outros dois países em busca dos membros das FARC. Tal situação impulsionou a criação do CDS, para uma concertação conjunta sobre o tema. Ver: 27 Como exemplo dessas obras, vale citar: a) ampliação dos gasodutos Transportadora de Gás do Norte/do Sul e as Hidrelétricas de Chiuido e Los Blancos na Argentina (US$ 2,8 bilhões); b) ampliação do metrô e renovação da frota de transporte público de Santiago no Chile (US$ 473,4 bilhões); c) aeroporto de Tena e Usina Hidrelétrica San Francisco no Equador; d) Siderúrgica Nacional e Usina Hidrelétrica de La Vueltosa na Venezuela; e) recuperação de vias de rodovias no Paraguai e; f) reforma no porto de Mariel em Cuba (US$ 682 milhões) (cf. SANTOS, 2013). 28 Casos de contestação à presença financeira e empresarial do Brasil também tiveram eco no Peru, com a construtora OAS. A contenda foi diante de irregularidades trabalhistas realizadas pela empresa brasileira na construção de hidrelétricas, além da acusação de invasão de territórios indígenas e mata nativa. Em relação à Bolívia, acusou-se uma construtora brasileira na construção de uma hidrelétrica em seu território devido invasão de território indígena para a obra, causados por falta de estudos socioambientais para a execução do projeto. O resultado foram as suspensões das atividades e do empréstimo à empresa pelo BNDES no valor de US$ 332 milhões. Ver: http://goo.gl/GGrVIR.

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243 milhões. A resolução do caso só veio em 2010, com a volta das atividades da empresa brasileira no Equador e readequação do empréstimo (cf. Santos, 2013). No caso boliviano, em 2006, o país andino decidiu nacionalizar sua produção de gás natural, estatizando os postos da Petrobras no país. Essa problemática levou aos questionamentos das ações do Brasil, que tinha duas posições a tomar: ou iria de encontro à decisão boliviana e os direitos da exploração de gás, ou reconhecer que o bem é soberano do território boliviano e buscar uma saída branda pra o imbróglio. O país optou pela segunda decisão, tentando não criar maiores ruídos com os países da região29. Ao final do segundo mandato de seu governo, Lula endossa a proposta mexicana, lançada por Felipe Calderón no encontro do Grupo do Rio na Costa do Sauipe, a criação de uma organização latino-americana com todos os países da região, incluindo Cuba. Essa instituição era a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), a primeira organização de que engloba todo hemisfério e não conta com a presença nem influência dos Estados Unidos nem do Canadá. Para o Brasil, a organização significa um instrumento para a ampliação de seu poder regional e alcançar as áreas centrais e caribenhas da América. A CELAC trata, desse modo, sobre temas amplos de cooperação e desenvolvimento no âmbito hemisférico, funcionando também como um sistema de cooperação político e de busca por uma política autônoma e conjunta da região30. O governo sucessor ao Lula, o período de Dilma Rousseff, é recente e ainda está em andamento com o andar de suas políticas, o que dificulta uma análise mais precisa sobre os direcionamentos realizados até agora. Entretanto, é possível analisar alguns fatos na condução do governo durante o período 2011-2013, fazendo um balanço dos primeiros anos em sua política para a América Latina. Na América do Sul e Latina, o Brasil passou por momentos de questionamentos por parte de seus vizinhos e parceiros. O primeiro processo que levanta dúvidas sobre a percepção de que a parceria com o país é fundamental para a região foi a criação em 2011 da Aliança do Pacífico. Este bloco econômico marca a volta do modelo de integração baseado nos preceitos neoliberais, ao buscar a liberalização total dos fatores de produção, bens e do mercado financeiro entre seus membros, não tendo, em sua formação, o interesse de se integrar no aspecto político. A Aliança foi criada por México, Chile, Peru e Colômbia, países que já tinham tratados bilaterais entre si e com os Estados Unidos e que institucionalizaram a liberalização entre suas economias.

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O Ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, lamentou o posicionamento venezuelano sobre o caso, acusando as posições brasileiras como subimperialistas e defendendo abertamente a decisão da Bolívia. 30 Sobre a CELAC, sua criação e diretrizes, será melhor trabalhado no capítulo 3.

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Segundo Nolte e Wehler (2013), a criação do bloco representa para os países de economia mais liberal da região sul-americana (Chile, Colômbia e Peru) um contrapeso para a influência brasileira no subcontinente. Desse modo, a criação de uma nova proposta de integração, a partir de um viés econômico-liberal, fora do modelo de instituições com viés mais político e da influência do Brasil, mostra a busca desses países da região de aumentarem sua margem de manobra na região e de busca de opções de associações econômicas. Para o Brasil, o projeto representa a volta do debate da agenda neoliberal de Tratados de Livre-Comércio, ainda com a presença de uma potência externa, o México, que é muito próximo dos Estados Unidos, podendo representar um novo interesse deste país na agenda econômica na região e, assim, trazer um processo reverso ao de integração política que marcou a região no século XXI, além de significar mais uma concorrência pelos mercados da região. Para Fiori (2013), a Aliança representa o Cisma do Pacífico na região sul-americana. Não apenas aos países do Pacífico retesaram questionamentos à política brasileira na região sul-americana. A crise paraguaia de 2012 representou um sinal do desgaste das relações brasileiras com os países membros de seu principal bloco de integração, o MERCORSUL. O Paraguai em 2012 passou por um processo conturbado de impeachment do então presidente Fernando Lugo, cuja decisão rápida do Congresso em retirar-lhe o cargo foi estranhamento rápido para os padrões normais do procedimento. Essa retirada forçada pelos políticos de oposição do Paraguai frente ao presidente Lugo teve uma interpretação como golpe à democracia daquele país, quebrando, assim, os princípios da Cláusula Democrática do MERCOSUL e da UNASUL. Assim, o Brasil mobilizou-se e coordenou a suspensão do país guarani do bloco mercosulino e da UNASUL, isolando o Paraguai politicamente até houvesse uma nova eleição e fosse reestruturado o processo democrático. O país interpretou essa posição brasileira como imperialista e como um golpe para que a Venezuela pudesse entrar como membro permanente no MERCOSUL31 (OBSERVATÓRIO DE POLÍTICA EXTERIOR PARAGUAYA, 2013). A crise é resolvida um ano depois, com a eleição e posse de Horacio Cartes na presidência paraguaia, marcando a volta do país nas instituições sul-americanas. Nota-se, portanto, claramente como a percepção brasileira de que a região sul-americana é importante para sua inserção internacional e desenvolvimento passa tanto pelo apoio na criação de instituições, mas também, pela desconfiança das intenções brasileiras. Entretanto, os

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Apenas a falta de votação do Paraguai no seu Congresso impossibilitava a entrada da Venezuela no bloco. Como todos os outros membros do MERCOSUL já haviam aceitando a entrada da Venezuela, a suspensão paraguaia fez com que automaticamente o país caribenho ingressasse no bloco mercosulino. Ver: http://goo.gl/9s0Vkn.

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seus parceiros nos mais diversos projetos regionais não percebem claramente como essa ascensão brasileira poderia ajuda-los e até como isso serviria para seus próprios interesses. As dificuldades permanecem e uma mudança de postura do Brasil para com a região não parece clara e nem aparece no hall dos interesses e, quando olha-se a perda de participação relativa da região na economia brasileira, percebe-se o agravamento das possibilidades de consolidação de uma liderança plena e engajamento. 2.4- BALANÇA COMERCIAL EM PERSPECTIVA Para se ter uma análise em perspectiva do papel da América do Sul na Política Externa Brasileira é necessário compreender as mudanças econômicas na qual o país passou pelos últimos 10 anos. O Brasil apresentou um crescimento médio anual do PIB de 3 % ao ano, tendo um pico de 7,5% em 2010, passando de décima terceira maior economia do mundo para, a partir do ano de 2010, oscilar entre a sétima e a sexta posição. Parte dessa melhora no posicionamento deve-se à crise financeira de 2008 que afetou os países centrais, principalmente europeus e norte-americanos. Em valor absoluto, o Brasil passou de, em 2003, um PIB de US$ 1,3 trilhão para, em 2013, chegar a US$ 2,4 trilhões, um aumento em 3 vezes da economia. Parte importante dessa evolução foi a aliança comercial intensa com a China. O país asiático deixou de figurar como o 3º país da pauta de exportação para ser o primeiro país dessa importância, substituindo a posição que os Estados Unidos ocupavam, tendo esse decaído sua relevância quase que pela metade no passar de 7 anos (2006-2013), de 18%de participação nas exportações para 10,3%. Outro ponto que as tabelas 1 e 2 (tabelas e imagens dos capítulos nos anexos), apontam é que, apesar da maior aproximação política com a região sul-americana, os países da região mantiveram ou decaíram em seus percentuais relativos na pauta de exportação, mesmo com um significativo avanço nos valores absolutos das transações. Apesar do aumento significativo de seu PIB e de suas relações comerciais, não foi devido a um aumento de relevância de sua pauta industrial e produtiva, e sim do aumento de produção e venda de suas commodities e bens primários, como mostram as imagens 1 e 2. Tal evolução também pode ser vista no aumento da produtividade do setor agrícola e posicionamento do país no comércio de bens agrícolas32. Essa elevação também está presente na exportação de minério de ferro e aço, principalmente para o mercado chinês. Esse aumento 32

Como demonstra Benachenhou (2013), a produtividade no setor de cerais do período de 1993 e 2013 aumentou em 152% com o um aumento 25% das áreas de cultivo. Esse avanço representou ao Brasil ocupar a primeira posição em produção e exportação em café e e açúcar, além de primeiro lugar nas exportações de etanol, carne bovina, tabaco e aves e ocupar o segundo lugar na produção e exportação de soja, em 2013.

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da pauta exportadora junto com o crescimento do preço das commodities internacionais no período favoreceram o aumento da reserva nacional em moeda estrangeira que passou de US$ 49.254 milhões em 2003 para US$ 374.051 milhões33. Ao se tratar do comércio com a América do Sul e Latina, o panorama brasileiro é reverso. Essas regiões apresentam o maior número de absorção dos manufaturados e semimanufaturados brasileiros, servindo para o escoamento de sua produção industrial, como demonstram as figuras 3 e 4. Além de na participação de importação a região Latina como um todo aparecer em terceiro lugar enquanto nas exportações aparecem em segundo, o tipo de compra brasileiro mostra como o país periferiza essa pauta, cujas compras se baseiam em 62% de bens primários e energéticos. Assim, como indica Carmo (2013), a pauta brasileira passa por um processo agudo de reprimarização. Nesse sentido, o processo intensifica a periferização do Brasil no sistema internacional, além de evidenciar suas condições de semiperiferia e ainda distante das características dos países centrais. Ou seja, um país com uma economia de tamanho destacável nos números absolutos mas com características periféricas, pautando principalmente suas exportações em bens de baixa intensidade de capital. Mesmo com a mudança da Guerra Fria e dos contextos de transição do século XX e XXI, o Brasil ainda mantém sua intenção de ser um player global. Como buscou-se demonstrar, a América do Sul foi parte preponderante desse processo, principalmente na coordenação política regional além de ser uma região importante para a expansão capitalista brasileira. Aliás, atrelar a América Latina, e no caso mais recente a do Sul, ao escoamento de bens brasileiros está presente desde JK. A grande problemática está na falta de complementaridade e participação brasileira nesses mercados, principalmente como comprador. Em geral o país mantém uma balança superavitária com a região, tornando custosa a relação com o Brasil para os outros países. Além disso, os problemas do financiamento do BNDES e a desconfiança em relação à política externa ainda são impeditivos para uma percepção mais favorável do Brasil na região. Entretanto, mesmo com as desconfianças regionais, o Brasil conseguiu posições nos foros internacionais de relativa importância nos últimos governos, cumprindo parte de suas ambições semiperiféricas de maior participação nos foros de decisão34. Deveu-se a isso também sua maior inserção com os países emergentes do Sul global, principalmente à China, cuja a parceria estratégica merece ressalvas. Pois, apesar da China ser responsável por parte do 33 34

Banco Central (2014). Ver: http://goo.gl/U6qfsq. O Brasil conseguiu eleger o diplomata Roberto Azevêdo como diretor da OMC.

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crescimento econômico do país e ter aumentado significantemente os rendimentos da balança comercial, a relação reprimarizou a pauta exportadora brasileira, possibilitando uma maior periferização da pauta, significando também um processo de desindustrialização da mesma. Por esse motivo, o aprofundamento das relações brasileiras com a América do Sul e Latina serem necessárias. A região é a que mais absorve os manufaturados brasileiros e financiamentos. Uma integração maior da malha produtiva e de fortalecimento das instituições financeiras regionais, como o Banco do Sul, podem, como afirma Carmo (2013), mudar o panorama que o Brasil tem tido em sua dependência por commodities. E é nessa expansão pelo comércio e complementaridade na América Latina e do Sul que o Brasil poderá ter o desafio de superar a presença chinesa na região e o avanço do México, que também busca o aprofundamento e diversificação de mercado pela região.

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3- MÉXICO: A POLÍTICA DO PESO DA BALANÇA NO JOGO DO EQUILIBRISTA Para se entender a política externa mexicana para a América Latina do século XXI, é importante se ter em mente a evolução dos direcionamentos que essas políticas tiveram durante e após a Guerra Fria. Nesses períodos o México variou entre a luta pela autonomia de sua política externa, tentando maior desvinculação aos Estados Unidos (Guerra Fria) e aprofundamento nas relações com a América Latina e; um alinhamento estratégico no pósGuerra Fria à política externa estadunidense, aprofundando essa relação no século XXI. Essa mudança de diretrizes na política externa enfatiza a característica dual que o México em sua geografia e geopolítica, principalmente no período atual: culturalmente identificado com a América Latina, geograficamente pertencente à América do Norte, ou seja, vizinho dos Estados Unidos. Esse posicionamento fez com que o México, ao longo do século XX, realiza-se uma política a qual Guadalupe González (2008) chamada de política do “equilibrista”. Essa política baseia-se em dar um maior enfoque diplomático à América Latina nos campos políticos e econômicos, principalmente por vias multilaterais, a vim de fazer um contrapeso às políticas hegemônicas dos Estado Unidos. Nesse sentido, a autora define quatro fases da política externa mexicana nessa triangulação México-América Latina-Estudos: a) a política do Contrapeso Defensivo (1945-1970); b) Contrapeso Ativo e (tentativa de) liderança regional (1970-1990); c) Mediador e ponte entre Estados Unidos e América Latina (1990- 2001) e; d) Multilateralismo liberal (2001- até os presentes dias). A política do Contrapeso Defensivo buscava utilizar dos meios multilaterais para segurar, na medida do possível, possíveis políticas hegemônicas e de ingerência dos Estados Unidos, principalmente em seu país e na região latino-americana. Assim, o México utiliza-se de artifícios juridicistas para poder conter a projeção demasiada dos Estados Unidos na região, como no caso da criação da Organização dos Estados Americanos (OEA), em 1948, ao propor que as votações fossem decididas a partir de dois terços dos votos a favor do assunto tratado, também proibindo a presença do poder de veto para qualquer nação integrante. Essas medidas serviam para que o país pudesse se coordenar politicamente com os outros Estados da região se unissem contra qualquer medida unilateral estadunidense no bojo da instituição (ZICCARDI, 2011). Entretanto, o México atuou criticamente diante de outro projeto da política estadunidense para a região latino-americana: o Tratado de Interamericano de Aliança Recíproca (TIAR), em

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1947. O tratado buscava formar um arranjo de segurança e defesa coletiva nas Américas, considerando que qualquer risco a segurança ou ameaça a um país americano de caráter externo seria encarado como uma ameaça a todos. O México tratou com observância o conteúdo do acordo (apesar de tê-lo assinado), considerando-o como um possível meio de dar legitimidade a uma ação de invasão pelos Estados Unidos ao território de um país latino-americano. Por causa de tal motivo, o México durante o período defendeu a posição de que o direito de decidir sobre intervenções militares era de caráter do CSNU, com preeminência sobre um arranjo regional. A vigência do TIAR feria claramente os direcionamentos de política externa mexicana, baseados na não-intervenção armada e no princípio da não interferência35 (idem). Papel importante para a política mexicana durante esse período foi o seu apoio à causa cubana. O apoio baseava-se no sentido jurídico e nos seus princípios de política externa. Com isso, quando houve a revolução na ilha caribenha, liderada por Castro e Guevara, o México realizou esforços para o não isolamento do país dos foros multilaterais e de concertação política regionais. Entretanto, os esforços para manter o país ainda na OEA não foram fortuitos. Ao se deflagrar a crise dos mísseis, o México passou a busca liderança na formação de acordos sobre a matéria nuclear, e formalizou o Tratado para a Proibição das Armas Nucleares na América Latina e Caribe, conhecido como Tratado de Tlatelolco (1967). O objetivo mexicano era evitar motivos para uma política mais assertiva dos Estados Unidos na região, além de garantir uma zona de paz, livre do perigo nuclear e da corrida armamentista. No campo econômico, o México tentou possibilitar a integração econômica com a América Latina, via a Associação Latino-Americana de Livre Comércio, em 1960. O projeto baseava-se nas recomendações da Comissão Econômica para a América Latina, e baseava-se no direcionamento de uma política econômica de substituição de importações e industrialização. Nisso, o México buscava mercados alternativos para suas exportações, devido às políticas protecionistas dos países do centro, além de buscar não se isolar dos países 36 (GONZÁLEZ, 2008). Ao fim, o projeto mostrou-se infortuno, devido a prioridades comerciais distintas de seus membros e problemas de complementaridade.

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O México baseia-se em três principais doutrinas para o direcionamento de sua política externa: a) Doutrina Carranza, estabelecida em 1918 na administração de Vicenzo Carranza, que afirma a igualdade jurídica internacional aos Estados e desaprova toda forma de intervenção aos assuntos internos de um país; b) A Doutrina Estrada. Estabelecida durante os anos 30 do século XX, o qual garante que o rompimento ou manutenção das relações diplomáticas com um país que acabou de trocar de governo de forma não democrática (golpe ou revolução) a partir dos interesses mexicanos, entretanto, reconhecendo de imediato o novo representante do Estados (LEVY, 2009). 36 O Tratado de Montevideo de 1960, constituinte da ALALC, teve como membros iniciais Argentina, Brasil, Chile, Peru, Uruguai, Paraguai e México. Este insistiu para que, apesar da descontinuidade geográfica, o tratado passasse de, inicialmente, um projeto “sul-americana” no nome para “latino-americana” (ZICCARDI, 2011).

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A partir dos anos 70, a política externa mexicana passou pela estratégia de Contrapeso Ativo e liderança regional na América Latina. Esse novo direcionamento deveu-se a crises internas e sistêmicas, e pautava-se na busca de novos parceiros e projetos. O país passava pelo esgotamento do modelo de substituição de importações, além de que, o aumento das políticas protecionistas dos Estados Unidos devido às crises do petróleo e do dólar fizeram com que as elites mexicanas se convencessem da necessidade de diversificar os parceiros comerciais, já que um tratamento especial vindo do vizinho do norte não era viável no momento. Outro fator importante era a ideia do Terceiro Mundismo e políticas independentes, ocorridos pelos processos de independência e deténte da Guerra Fria. Durante o governo Echeverría Álvarez (1970-1976), o país passou a defender o pluralismo ideológico, a reforma do ordenamento econômico internacional e suas instituições, o não alinhamento e a ampliação do multilateralismo. Na política latino-americana, o México buscou novos processos de integração econômica, criando, assim, o Sistema Econômico Latino-Americano (SELA), como um sistema de consultas e articulação de programas econômicos conjuntos. Para além do teor economicista, o México também apoiou governos progressistas na região, como o de Salvador Allende no Chile. Com a deflagração do golpe de 1973 no Chile, o país mexicano rompe relações diplomáticas com o governo do Chile de Pinochet, condenando o processo de tomada de poder. Essa busca pela diversificação, no fim, não resultou em grandes resultados, mantendo ainda os déficits na balança comercial e o endividamento externo, necessitando que os governos seguintes buscassem novas alternativas (LEVY, 2009, ZICCARDI, 2011, GONZALEZ, 2008). No período López Portillo (1976-1982), o país aliviou-se um pouco na situação econômica devido ao aumento dos preços internacionais do petróleo, facilitando a possibilidade de poder criar um novo processo diversificador. O ativismo terceiro-mundista mexicano passou a ser mais focado centrado nas coordenações com a América Central e Caribe e com outros países emergente. Com isso, o México busca ampliar sua influência política em seu entorno geográfico imediato. Nisso, o país se pôs ativamente como mediador no conflito entre El Salvador e Nicarágua, mediando o conflito, além de participar também conversações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba em 1982. No âmbito econômico, o México iniciou um processo de cooperação com os países mesoamericanos e caribenhos, com o Acordo de San José. Este acordo, assinado em conjunto também com a Venezuela, fazia com que esses países produtores de petróleo vendessem o mineral a um preço preferencial, alimentando energicamente a região.

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Novamente, o período de benesses econômicas advindas do petróleo não durou e o México entrou em recessão nos anos 80. Durante o governo de De la Madrid (1982-1988), o México desiste das estratégias de diversificação de parceiros e se volta ao que era o início das políticas neoliberais. A escolha da estratégia mexicana nesse período foi de uma política externa de dois níveis: uma aproximação econômica com o hemisfério norte e coordenação política com o Sul. Essa variação mostra a transição do modelo do Contrapeso ativo para o de mediação do trinômio relacional México-América Latina- Estados Unidos. Nesse período, o país buscou maior credibilidade nas instituições financeiras internacionais, aderindo, em 1986, ao Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT, em inglês), com o intuito de abrir o comércio e reduzir as restrições legais para investimentos externos. Na política para a América Latina desse período, o México ainda manteve sua independência, buscando proximidade com os países da região em termos diplomáticos e por temas ligados à segurança regional. Com o lema “assuntos da América Latina são latinos”, o México integra o Grupo de Contadora em 1983, conjuntamente com Colômbia, Venezuela e Panamá a fim de resolver os problemas armados na Nicarágua e na América Latina. A resolução diplomática foi realizada e, com o sucesso ao conter uma possível intervenção armada estadunidense, o Grupo foi ampliado, passando a contar com Brasil, Argentina, Peru e Uruguai, formando o Grupo dos Oito, que posteriormente daria origem ao Grupo do Rio37. Como mecanismo de consulta e coordenação de segurança conjunta, o México buscava conter os transbordamentos de conflitos e instabilidade na região, a fim de não chegarem em suas fronteiras, trazendo problemas como tráfico de armas e refugiados. Com o fim da Guerra Fria e intensificação do paradigma neoliberal nas Américas, o México vai passar por um profundo redirecionamento econômico, estatal e político. Essas mudanças se mostrarão claras na vinculação automáticas às políticas econômicas preconizadas pelo Consenso de Washington e de um abandono do ativismo na formação de blocos e processos de integração plenamente latino-americanos. Essa transformação causa efeitos na política externa mexicana no século XXI, e sobre isso se pautará a próxima sessão.

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Posteriormente, o Grupo do Rio cederá suas funções e atribuições à CELAC, que será melhor trabalhada no capítulo 3.

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3.1- ACOMODAMENTO ECONÔMICO COM O NORTE: A POLÍTICA MEXICANA DOS ANOS 90 A década de 1990 foi o período de busca dos países da América Latina para a adequação à globalização e à hegemonia estadunidense no pós-Guerra Fria. O México, no período, buscou manter a mesma estratégia do período De La Madrid, com uma política externa de duas velocidades: no âmbito econômico um alinhamento aos Estados Unidos e no âmbito político manter sua margem de independência e autonomia. Essas foram as características do período de acomodamento da política externa mexicana. O período se inicia com o governo de Carlos Salinas (1988-1994), com propostas de modernização e reaparelhamento estatal. Esse programa de readequação se tornou ainda mais vigente com a assinatura do Tratado de Livre-Comércio da América do Norte (TLCAN), em 1994. O tratado modificou as bases econômicas mexicanas, transformando o país numa plataforma de exportação para os Estados Unidos e Canadá. Acreditava-se que uma adequação à economia norte-americana o México poderia figurar entre os países do primeiro mundo, e sua ubiquação geográfica próxima aos Estados Unidos traria vantagens nesse processo38. Dentro dos termos do TLCAN, encontrava-se a abertura irrestrita do comércio entre os países do bloco, evolução gradual de livre acesso a bens de capital e mobilidade de pessoas e cláusulas de proteção aos investimentos. Essas cláusulas, como coloca Marcelo Santos (2008):

(...) Estabeleceram normas sobre os investimentos externos dos três países, que conferiram direitos, garantias, e vantagens importantes para o trânsito desses investidores dentro da área do livrecomércio. (...) As disposições do capítulo 11 vão além dessa questão, na medida em que concedem aos investidores estrangeiros determinados privilégios que sobrepõem e anulam as legislações nacionais, prevendo inclusive punições a qualquer tipo de intervenção jurídica ou política nacional que lese a livre ação desses investidores. O artigo 1110, por exemplo, obriga os Estados-membros a indenizarem investidores estrangeiros em situações nas quais as decisões soberanas das autoridades nacionais sejam consideradas ‘equivalentes a uma expropriação’ (SANTOS, 2008, p. 149)39.

A entrada no México em tal esquema de integração econômica e reformas em seus modelos macroeconômicos buscavam alcançar um modelo econômico baseada na baixa inflação, baixo gastos públicos e exportador. Para tal, na altura da assinatura do contrato, o Como disse o presidente Salinas (apud SANTOS, 2008, p. 147) na época: “Com o tratado de livre-comércio com os Estados Unidos e o Canadá estaremos nos globalizando e isto é a chave para o ingresso do México no primeiro mundo”. 39 Santos (2008), ainda aponta casos em que empresas utilizaram dessa cláusula contratual para ganhar dinheiro. Os casos citados são os das empresas norte-americanas Metalclad Coporation e Ethyl Corporation. Na primeira o México teve de pagar US$ 16 milhões em indenizando e para a segunda US$ 13 milhões. Outras empresas estadunidenses e canadenses, principalmente médias, se valeram do capítulo 11 do TLCAN para ganhar dinheiro encima do Estado mexicano (cf. SANTOS, 2008, pg. 149-150) 38

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governo mexicano para abaixar a inflação e cortar gastos, vendeu seus bancos de desenvolvimento públicos para investidores externos e aumentou a taxa de juros, além de buscar uma indexação de sua moeda ao dólar. A tentativa desses enxugamentos e de política monetária para atrair investimentos e ganhar melhor imagem internacional, não deu certo. Com a paridade do peso ao dólar, houve uma imensa fuga de capitais do México, gerando no país uma crise que foi chamada de efeito “Tequila”. Essa crise afetou os vários Estados da América Latina, principalmente os mesoamericanos. A crise, curiosamente, ocorreu Dezembro, sendo o acordo assinado em Janeiro de 1994 (CASTRO, 2014, p.337). No âmbito da política externa para a América Latina, o governo Salinas continuou com a posição crítica a propostas de intervenção nos assuntos internos, principalmente às propostas lançadas na OEA, como o Protocolo de Washington (1992) e Compromisso de Santiago (1991). Entretanto, o México fez parte ativamente de blocos de concertação com os países latinoamericanos, fortalecendo o Grupo do Rio, com sua ampliação e maior diálogo para tratar de temas como narcotráfico, conter políticas hegemônicas estadunidenses e como plataforma para o diálogo com o resto do mundo (ZICCARDI, 2011, p. 76; GONZÁLEZ, 2008, p.132). Apesar da tradição anti-intervenção, o México, na transição do governo Salinas para Zedillo, o país passou por uma grave crise também no âmbito da segurança estatal. Ao momento da assinatura do TLCAN, um grupo insurgente de origem indigenista chamado Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) declarou guerra ao México, em protesto à ratificação do tratado, que anulava o artigo 27 da Constituição Mexicana que dava o direito a terras de plantio aos povos originários. Esse conflito, iniciado em Chiapas, acabou levanto à morte dois políticos do Partido Revolucionário Institucional (PRI). Em meio a esses conflitos, o governo Salinas cedeu à pressão internacional e permitiu a entrada de visitantes externos para avaliar o processor de eleições daquele ano, envolvendo observadores dos Estado Unidos e Organizações Não-Governamentais, caracterizando um movimento de abertura política do México. O período Zedillo de León (1994-2000) foi marcado pelos ajustes necessários após os ocorridos no final do governo antecessor. O governo teve de se equilibrar internamente pelo aumento dos conflitos com o EZLN e com o aumento da dívida e dos resultados do efeito tequila. Por conta da frágil estabilidade da segurança nacional, o México cedeu à pressão internacional e iniciou movimento de implementação de políticas vinculadas à promoção da democracia e dos direitos humanos. Marco dessa política foi a aceitação da jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Essa promoção dos direitos humanos levou a um afastamento diplomático entre México e Cuba, diferentemente dos períodos anteriores. O

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governo Zedillo teceu críticas às práticas dos direitos humanos na ilha caribenha, o que gerou atritos com o governo Castro. No âmbito econômico, o México buscou na América Latina a possibilidade de diversificação nas parcerias comerciais como saída para sua crise. Essa tentativa deu-se do apoio ao projeto dos Estados Unidos chamado Área de Livre-Comércio das Américas (ALCA), tentando colocar-se como mediador nas negociações entre os países latinos e os Estados Unidos. O problema foi a reticência do Brasil ao projeto, que não concordava com a adesão imediata dos termos de liberalização comercial principalmente no que se daria aos bens manufaturados, postergando os avanços das negociações. Para além das negociações multilaterais de comércio, o México também utilizou de um poder de negociação importante, costurando acordos bilaterais com vários países da América Latina e com blocos de integração (incluindo extra-regionais como a União Europeia), totalizando no período 12 tratados assinados e melhoras nas tarifas de comércio com 32 países (hoje 42) (ZICCARDI, 2011; GONZÁLEZ, 2008; CASTRO, 2014).

3.2- MUDANÇA DE RUMOS: O MULTILATERALISMO LIBERAL Após o período Zedillo, o México passa por uma forte reformulação de sua política externa. O país passa a atuar em 4 principais eixos de ação, os quais dão principalmente prioridade para o primeiro. Para Coronado (2005), esses eixos são: 1) os de primeira ordem, que envolvem os blocos e arranjos políticos realizados com os Estados Unidos; b) os de segunda ordem que envolvem os processos de livre-comércio com a região Atlântica Norte, envolvendo União Europeia e Caribe; c) os de terceira ordem que são os tratados de vínculo econômico com os países asiáticos e os acordos de livre-comércio no âmbito bilateral para o pacífico e; d) os de quarta ordem de importância que envolvem os tratados com os países latino-americanos e o Plano Panamá-Puebla. Esses eixos indicam o abandono da política externa mexicana em relação à América Latina, enaltecendo as políticas Norte-Sul. A política mexicana participa de um grande revés e uma nova guinada em seu processo democrático: após 70 anos de governos do PRI, o candidato do Partido de Ação Nacional (PAN), Vincent Fox, é eleito presidente. O período Fox (2000-2006) começou com uma esperança renovada por mudança, principalmente por seu significado político. E, de fato foi uma mudança, ao menos na política externa: o governo neste período decidiu por aprofundar ainda mais as relações com os Estados Unidos, até nos pontos que não concordara historicamente como uma política de segurança conjunta.

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Essa aproximação constava com os ideários que permaneciam presentes desde os anos oitenta na elite mexicana: aproveitar a proximidade com os Estado Unidos para ganhar maior espaço no cenário internacional. Com isso, o Plano Nacional de Desenvolvimento para o sextênio Fox colocava como prioridades de sua Política Externa: a) Projetar uma nova imagem do México para a comunidade internacional; b) Priorizar as relações com os Estados Unidos; c) fortalecer a presença do país nos principais fóruns internacionais (LEVY, 2009, p. 123). Nesse sentido, o México abandonou suas doutrinas de não-intervenção e soberania Estatal e começou a criticar, de maneira mais intransigente, os países que não cumprissem com os padrões estadunidenses de democracia e direitos humanos. Essa diretriz provocou um distanciamento claro com Cuba, com Fox condenando as posições do país caribenho sobre tais questões e como o mesmo o governo Castro deveria se abrir. Na mesma medida, Cuba respondeu com carta de repúdio à diplomacia mexicana, quebrando o histórico de apoio mútuo dos governos. Na sua intenção de se aproximar dos Estados Unidos, o México ainda abriu mão de seu princípio de intervenção armada, assinando a Aliança para a Segurança e Prosperidade da América do Norte (ASPAN). Mesmo que tenho denunciado nesse período o TIAR e se posto contra a intervenção no Haiti, fazendo valer seus princípios de ser contrário à intervenção armada (ZICCARDI, 2011, p.79), o país aderindo à ASPAN permitiria uma ação militar em assuntos que fossem considerados ameaças à segurança de qualquer país norte-americano como de todos os assinantes, incluindo assim, os Estados Unidos. O Tratado ainda obrigava o abastecimento de combustíveis e de energia elétrica (LEVY, 2009; CORONADO, 2005) Como contrapartida dessa aproximação, Fox esperava abertura e revisão dos acordos no âmbito do TLCAN de livre trânsito de pessoas, regulamentando os imigrantes mexicanos nos EUA. Entretanto, toda essa intenção não se transformou em ação pois, justamente em 2001, houve os ataques terroristas em Nova York no mês de setembro. Assim, agenda norteamericana para a imigração retrocedeu, tornando as possibilidades de flexibilização ainda mais inexistentes. O “prêmio” que o México ganhou ao buscar resolver as questões de disparidades de migração no TLCAN, apoiando as políticas dos Estados Unidos no âmbito internacional, foi um muro de 200 quilômetros para a barragem de imigrantes mexicanos e mesoamericanos (LEVY, 2009). No âmbito da América Latina, o México priorizou ama agenda voltada para os âmbitos comerciais e bilaterais.

Foram realizados novos acordos bilaterais na região no âmbito

comercial, entretanto, nenhum envolvimento com a nova organização política que se consolidava na região principalmente no Sul do continente. Além dessa opção pelo afastamento,

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o México foi partícipe de divergência com os países latino americanos. Além do caso cubano, o país fez críticas ao Brasil na sua proposta de reforma do CSNU, indicando-se como representante latino-americano. Em retaliação, o México acabou sendo excluído da formação da CASA, isolando ainda mais o país nos novos foros de concertação política, que estavam por substituir as antigas instituições formadas por ele (Grupo do Rio e ALADI). Ainda no âmbito multilateral, o México lançou candidatura para a presidência da OEA, em 2005, o qual demonstrava a anos estar mais ativo. Tal ativismo não se converteu em votos, e a região preferiu o candidato chileno ao mexicano. Essa mudança qualitativa das relações do México com a América do Sul acabou constituindo o país agora como um ator extra regional (CORONADO, 2005; LEVY, 2009; GONZALEZ, 2008). Em relação à América Central, o México iniciou no período Fox o Projeto Panamá Puebla (PPP). O intuito do projeto, realizado também em conjunto com os Estados Unidos, era a criação de um corredor de desenvolvimento mesoamericano, buscando atrair investimentos para as áreas interioranas e diminuir as disparidades locais e regionais entre os Estados. Esse projeto faria com que os Estados da América Central adequassem sua economia e legislação de comércio e propriedade intelectual ao estilo do TLCAN, permitindo a ação de entes internacionais para a exploração de recursos nessas regiões. O intuito era que, com o desenvolvimento econômico nas regiões mais frágeis, se pudesse acelerar a qualidade de vida e integração econômica. Esse projeto contaria com os investimentos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Banco Mundial (BM). Para os que concordavam, o Plano traria estabilidade econômica, integração com o primeiro mundo e contenção de migrações para os Estados Unidos. Para os que não concordavam com o plano

O propósito dos EUA com o PPP é intervir no conflito político e social do México para impor e favorecer transnacionais do petróleo; facilitar a privatização dos terminais aéreos e portuários, a energia elétrica, a água, o gás e a PEMEX; proteger os proprietários de terras empenhados no desenvolvimento agroindustrial e, principalmente, apoderar-se sem restrições das enormes riquezas da biodiversidade (...) do Corredor biológico Mesoamericano (FAZIO, apud SANTOS, 2007, p. 156).

Por fim, o PPP não logrou êxito em suas alternativas apesar das intenções. O primeiro motivo é que o México não contava com dinheiro para financiar projetos de tais magnitudes. Soma-se a isso também a falta de prioridade que os Estados Unidos deram ao projeto, se envolvendo com os Estados mesoamericanos mais no âmbito bilateral do que pelo Projeto. Terceiro fator foram as insurgências do EZLN e dos riscos políticos que a região emanava, o

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que impossibilitou uma atração efetiva de investimentos e interessados (CORONADO, 2005; SANTOS, 2007). Após o período das “oportunidades desaproveitadas”, como classifica Levy (2009), o México passa a ser governado por outro presidente panista, Felipe Calderón (2006-2012). As diretrizes do governo Calderón foram as de: a) tornar a economia mexicana competitiva; b) democracia responsável e. c) igualdade de oportunidades. Nesses quesitos, o México passou a buscar novas oportunidades de negócios para suas exportações (novamente) para diminuir a sua dependência com os Estados Unidos. No âmbito da segurança, o México profundou ainda mais sua relação com o vizinho estadunidense, formalizando a Iniciativa Mérida. O projeto visava a consulta e transferência de informações e tecnologias para o combate ao narcotráfico e contrabando de armas. Nesse sentido, havia o entendimento do governo Calderón de ampliar o combate ao narcotráfico, e os Estados Unidos eram os parceiros escolhidos para essa empreitada, visto que esse é um inimigo comum. O problema é que é de caráter interno, cujo o acordo prevê o uso das Forças Armadas para o combate ao crime organizado das drogas. Essa decisão de “Guerra ao Tráfico” do período Calderón apenas aumentou os conflitos, ampliando o número de milícias e desvirtuando as atividades das Forças (O’Neil, 2012). No âmbito econômico, o México passou pelo impacto da crise internacional de 2008 de maneira prejudicial. Dependente do mercado norte-americano para as exportações, o México acabou sofrendo mais com a crise que afetou os mercados centrais do que os países emergentes que optaram pela diversificação de seus parceiros econômicos, como o Brasil. O resultado foi que, no período 2007-2008, o PIB mexicano decaiu 6,6%, apenas se recuperando dois anos depois. Esse choque na economia fez com que o México repensasse sobre seus direcionamentos de política comercial, buscando novas oportunidades em mercados que poderia competir. Assim, o México, novamente, busca a América Latina para a expansão de suas oportunidades de negócios. Com uma ação diplomática facilitada pelos acordos já vigentes entre as nações participantes, o país inicia com Chile, Peru e Colômbia a Aliança do Pacífico (AP). A AP é um projeto de liberalização econômica profunda entre esses Estados, que enseja a queda de tarifas alfandegárias, unificação do sistema financeiro e livre-circulação de bens e capital. Essa inciativa diferencia-se dos projetos que estavam em voga no Sul do continente desde o início do ´século, XXI, que tinham um cunho mais político. A AP é estritamente econômica, de vias liberalizantes e desreguladoras. A reação da sub-região sul-americana foi diversa. Enquanto Uruguai e Paraguai (além dos membros fundadores) aprovaram a iniciativa, pleiteando a inclusão como membros-observadores, o Brasil considerou uma busca do México

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contrabalancear o peso do da influência brasileira na região, além de acirrar a disputa intercapitalista entre estes Estados (NOLTE, 2014). Outra mudança após a crise foi a percepção do isolamento mexicano dos foros de concertação política na região latino-americana. Diferentemente de seus antecessores do século XXI, a política externa de Calderón buscou se livrar do isolamento político do México e inserirse mais diretamente nas decisões políticas regionais. Para tal, o governo mexicano lançou em 2010 na Cúpula de Cancun o projeto da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, a CELAC. A iniciativa foi recebida com bastante exaltação pelo governo venezuelano de Chávez, além de que o projeto também significava uma reaproximação do México com Cuba, ao envolver este país no processo de fundação. Um fator importante da criação da CELAC é que a ideia de criação foi mexicana, como reação a seu isolamento político na América Latina em detrimento do aumento do protagonismo brasileiro na região. Não houve influência estadunidense na conformação desse processo, os Estados Unidos que, aliás, não viam com bons olhos a ideia do México voltar a se aproximar com Cuba e Venezuela. Após o período Calderón, temos a volta do PRI ao poder com Enrique P. Nieto, cuja agenda política traz traços mais retrógrados. Em seu Plano de Desenvolvimento Nacional (2012-2018), as prioridades do México são as políticas econômicas em torno do TLCAN e do seu eixo pacífico. O posicionamento sobre a América Latina é quase nulo, tendo o termo apenas aparecido como base comparativa para dados, excetuando-se quando, novamente, afirma que o México pertence à região por conta dos laços históricos e culturais. Nieto iniciou seu governo propondo o Pacto para o México, um arranjo de coalizão com a oposição parlamentar para que se fossem aprovadas a medidas necessárias para uma reforma profunda na reforma para o desenvolvimento mexicano (CASTRO, 2014). O período de Nieto é recente e ainda está em curso. Pelo seu Plano, não se vê claras diretrizes de sua política para a América Latina, apenas um reforço de que a parceria com os Estados Unidos se mantém prioritária, ou seja, de primeira ordem. Nesse sentido, entende-se que a primeira grande medida do seu governo foi a privatização da exploração do petróleo mexicano, quebrando o monopólio da estatal petrolífera PEMEX40. Essa decisão foi tomada visando a maior produtividade do setor petrolífero mexicano, que vinha tendo quedas na produtividade, além de o Estado não ter recursos para alavancar o aumento da produção e extração (BENACHENHOU, 2013b). Assim, o México quebra o monopólio da extração de seu principal recurso energético, habilitando os investimentos externos, principalmente norte40

O monopólio era garantido pelo Artigo 28 da Constituição dos Estados Unidos do México, sendo modificado em dezembro de 2013. Ver: http://goo.gl/Fl2Mfe

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americanos, nesse setor. Os resultados, ainda prematuros, não dão clareza se a abertura foi benigna ou não, entretanto, no ano de abertura, 2013, o México cresceu apenas 1% em seu PIB, muito abaixo da média do período desde a entrada no TLCAN.

3.3- BALANÇA COMERCIAL EM PERSPECTIVA: O TLCANDEPENDÊNCIA. Para se ter uma melhor análise dos efeitos da política externa mexicana nos últimos 20 anos, é importante tomar em conta como isso moldou sua economia. O México hoje é a segunda maior economia da América Latina, com um PIB nominal de US$ 1,26 trilhões, atrás apenas do Brasil, que possui um PIB três vezes maior. O país também contou com um crescimento de médio de 2,4% nos últimos 20 anos, tendo uma queda abrupta em 2009 de 6,6%, contanto com um pico de crescimento no ano de 2006 de 5,1%. Também conta com uma reserva monetária de US$ 180, 2 bilhões. Como parte da estratégia de ganho de mercado a partir do livre-comércio, o México é um país cuja exportação conta como quase como 30% da participação no PIB, gerando aproximadamente US$ 380 bilhões. Entretanto, apesar de conter vários tratados e parcerias comerciais com diversos países no mundo, o México abre uma impressionante dependência do mercado norte-americano, sendo destino de quase 80% de suas exportações. É interessante notar, como mostra a tabela 3, que o Brasil, mesmo não tendo aderindo aos tratados da Aliança do Pacífico, mantém maior relevância na pauta de venda do México do que esses países. Também nota-se a baixa participação da região latino-americana na economia mexicana, contando apenas com pouco mais de 3% da pauta ao total dos principais países parceiros da região. É importante salientar que essa participação do México, principalmente no mercado estadunidense, é devido aos seus baixos preços. Nesse sentido, o México é o país com o menor custo de produção da OCDE e cujo salário no piso industrial em 20 anos aumentou apenas 40%41 (CASTRO, 2014; THE ECONOMIST, 2012). Soma-se a isso também a política de liberalização de taxas para importação e exportação com os países norte-americanos e uma política de baixos impostos. A problemática nesse tipo de política é a manutenção dos salários e queda no nível de distribuição da renda, o que enfraquece o mercado interno e deixa o México mais dependente em relação às intempéries externas. Por exemplo, diferentemente do Brasil

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No comparativo realizado com a China, o México cresceu em 40% seus salários na área industrial, enquanto a China aumentou em 400% essa taxa. O Brasil, em termos de salários aumentou cerca de 3,28 vezes no espaço de 10 anos (2003-2013),

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que, mesmo com (e também por causa de) seus altos impostos, conseguiu financiar um programa mais amplo de aquecimento de mercado interno e medidas anticíclicas durante a crise de 2008, além de contar com um banco estatal de desenvolvimento forte para bancar seus projetos de expansão capitalista. Já o México, enxugou os gastos e o aparelhamento financeiro do Estado, apostando nos baixos custos de produção para a competitividade. Ironicamente, o Brasil, mesmo com os altos custos, mantém uma maior competitividade que o México segundo os dados do Banco Mundial, como mostra a figura 542 (BENACHENHOU, 2013b; CASTANEDA, 2014; DURAN, 2012). Em relação à pauta de importação, o México apresenta uma maior diversidade de parceiros. A porcentagem da participação dos Estados Unidos diminui, em relação à pauta de exportação, sendo de quase 50%. Entretanto, o único país latino-americano que aparece entre os 10 mais importantes fornecedores é o Brasil, não estando, portanto, os países da Aliança nas principais opções de compra mexicanas. Outro fator pertinente na avaliação das importações mexicanas é a maior presença de países asiáticos, frutos das parcerias direcionadas ao mercado do pacífico, como a APEC, como mostra o a tabela 4. Ao se olhar adequadamente os produtos importados e exportados do México, vemos uma surpreendente semelhança na pauta. O México é um dos países que mais exporta na América Latina e um dos principais produtos de petróleo. Entretanto, também é um dos que mais importam esses mesmos produtos. O país compra de diversos fornecedores, principalmente norte-americanos e asiáticos, matéria-prima e peças para a montagem de seus produtos de valoragregado. A grande questão é que, devido ao baixo preço do mercado mexicano, esses produtos, quando finalizados, são exportados, sendo o México feito de plataforma de exportação. Conta também nisso que, as principais indústrias de telefonia e automóveis que atuam no país são de origem estadunidense e, com a facilitação do TLCAN, as remessas de lucros vão quase que sem taxação para o país de origem (BENACHENHOU, 2013b). As composições dos produtos nas pautas são representadas nas tabelas 4 e 5. A análise desses dados nos possibilita chegar à conclusão de que, apesar do México ter industrializado sua pauta de exportação e feito disso o modelo de sua economia, ele carece e resolução para uma melhoria real na economia Mexicana. Nesse sentido, o México é utilizado

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Segundo dados do World Bank, é importante notar como as políticas divergentes entre Brasil e México afetaram a distribuição do PIB. Em 2003 o Brasil contava com um PIB per capta de US$ 3,04 mil, enquanto o México contava com US$ 6,6 mil. Em 2013 os números se revertem, tendo o país sul-americano um PIB per capta de US$ 11,2 mil e o país norte/latino-americano US$ 10 mil. Essa mudança deve-se tanto ao aquecimento do mercado interno e medidas tomadas antes da crise (como diversificação de parceiros comerciais) como pós crise.

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pelas potências centrais como plataforma de exportação de seus produtos, retendo os lucros e impedindo um maior dinamismo econômico. Nota-se isso a parte das vendas quase unilaterais para os Estados Unidos, o que não representa, em contrapartida, uma reserva de mercado plena. Essa relação intercapitalista apenas periferiza mais o México e o distancia de um real desenvolvimento tecnológico. Essa acomodação ao capital internacional, principalmente norteamericano, repercute em suas leis e modelo de segurança para investimentos estrangeiros, conferindo-lhe uma nota A3 nos ratings financeiros43. Todavia, isso não garante de fato o retorno em investimento, tendo, por exemplo, o Brasil uma nota menor e sendo alvo de um volume maior de investimentos, o que demonstra na diferença de reserva monetária (DURAN, 2012). Além disso, tais políticas provocaram, apesar da expansão da exportação, uma balança comercial deficitária, na qual o México tende a equilibrar com empréstimos (idem). A alternativa de buscar novos mercados teria como alvo estratégico a América Latina, principalmente para o escoamento desses produtos industrializados. Entretanto, o distanciamento político com a região, principalmente com os países do Sul, e a insistência em firmar acordos multilaterais de comércio em conjunto com os Estados Unidos não confirmam essa possibilidade de mudança. No Plano de Desenvolvimento Regional do atual governo, o principal enfoque é o acordo transcontinental do Tratado Trans-pacífico (TTP), uma iniciativa estadunidense para a união dos mercados asiáticos e americanos a fim de conter o avanço comercial chinês, como alternativa da diversificação. Novamente, o México retoma como eixo de sua agenda internacional o panorama da liberalização econômica, com o direcionamento do seu vizinho do norte. O país já passou por esses caminhos várias vezes, como já mostrado no capítulo, e, por muitas vezes, ele se mostrou tortuoso. De fato, o aprendizado algo importante e, por vezes, escasso quando se trata da política externa de um país. Assim, no decorrer do período analisado, o México demonstrou um papel importante na integração latino-americana. Por mais que o presente governo não enseje uma maior inserção integracionista na região, é fato que o México tem peso político ao se tratar de políticas de cunho hemisférico. Durante a Guerra Fria, o México participou da criação dos principais meios de integração latino-americana. Desde a ALALC à ALADI, passando pela SELA, Pacto de San José e criação do grupo de Contadora, o México utilizava de seu protagonismo para uma política

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O México possui uma das maiores notas dos ratings financeiros da América Latina, pela agência de risco Moody’s. Apesar de obter uma economia mais dinâmica e com maiores investimentos estrangeiros, o Brasil possui nota Baa2. Ver: http://goo.gl/hehW4Q.

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assertiva na região, na busca de equilibrar o contrapeso hegemônico com os Estados Unidos. Essa busca pelo contrabalanceamento a nível institucional ocorreu tanto nos âmbitos puramente latino-americanos, como na crítica à postura estadunidense nos âmbitos pan-americanos (OEA e TIAR), assim como no âmbito bilateral, ao manter relacionamentos com Cuba, indo de encontro à política externa estadunidense. O pós-Guerra Fria marca essa mudança em respeito à América Latina, alinhando sua política externa à América do Norte. É importante destacar como esse afastamento do México para a América Latina encerra o ciclo de tentativas de integração hemisférica e passam à fragmentação da região em sub-regiões, mostrando diferenças cada vez mais claras de direcionamento entre o Sul e o Norte da região. O México só irá se aproximar da América Latina a partir de projetos financiados ou promovidos pelos Estados Unidos, que não lograrão êxito, como o Plano Panamá-Puebla e a ALCA, isolando-se cada vez mais das políticas de integração do continente e aumentando a dependência com os Estados Unidos. Entretanto, o México mostra-se novamente importante na criação de uma nova organização plenamente latino-americana. Na busca de quebrar seu isolamento político, principalmente com os países do Sul do continente americano, a CELAC n governo Calderón é a chave para a volta de um protagonismo mexicano nas políticas hemisféricas conjuntas. Apesar de Nieto se distanciar desse propósito, a América Latina mostra-se em definitiva importância para uma maior autonomia mexicana em relação aos Estados Unidos. A CELAC pode ser o meio preponderante para essa mudança de paradigma que criou no México, principalmente no século XXI. Cabe ao México decidir se pretende ser uma ferramenta do Norte ou um protagonista do Sul.

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4- A CELAC: O ENCONTRO DE POLÍTICAS EXTERNAS NOS CENÁRIOS LATINO-AMERICANOS Desde os movimentos de independência das Américas no século XIX, seus proeminentes líderes tiveram em conta o objetivo da união de suas nações numa Pátria Grande latino-americana. O sonho, perseguido por símbolos da libertação regional como San Martín e Simon Bolívar, instauraram a noção de um unionismo latino-americano, visando a um papel de ascendência conjunta de protagonismo frente ao cenário internacional e também na região. Essa busca pela autonomia e poder coletivo das nações latinas permaneceu presente no ideário coletivo dos países da região e ganhou novo fôlego com os recentes processos de integração da passagem do século XX para o início do XXI. Com a crise dos modelos de substituição de importação e predomínio dos modelos neoliberais no cenário do capitalismo latino-americano, o ideário da integração por si da América Latina é deixado de lado, passando suas sub-regiões maior pertinência no processo de resposta dos países ao cenário internacional. Nesse sentido, as maiores economias da região, Brasil e México, decidem por dar maior destaque à sua integração ao seu entorno geográfico imediato, reduzindo nesse período à sua política regional para, no caso deste, América do Norte e, no caso daquele, América do Sul. Já no século XXI, há revulsivas mudanças no cenário internacional que permitem a volta do ímpeto latino-americanista para conformação de uma política regional. Esse impulso é dado à queda relativa do poder da hegemonia estadunidense no mundo e à crise sistêmica iniciada em 2008 nos países centrais, fazendo com que mesmo aqueles países ainda vinculados em esquemas de integração Norte-Sul buscassem alternativas para suas políticas. Assim, o México, que desde a transição do século XX para o XXI vinha pondo a América Latina em segundo plano na sua política externa, iniciasse um projeto de coordenação política puramente latinoamericano. Esse projeto tomou forma e constitui o que hoje é a Comunidade dos Estados da América Latina e Caribe, a CELAC. Contando com o apoio dos principais governos sulamericanos e caribenho, respectivamente Brasil e Venezuela, o México criou uma instituição multilateral que prontamente quebrava seu isolamento político com a região, aprofundado na primeira metade da década dos anos 2000, e reativa o diálogo para um projeto de integração latino-americano, reunificando a região que politicamente encontrava-se fragmentada (BIZZORERO, 2011).

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Tendo em conta essa introdução à evolução histórica que criou a CELAC, as próximas partes do capítulo buscarão compreender as coordenações políticas e interesses que envolvem essa instituição. Primeiramente, será consideraremos o apoio dado pelo Brasil e a Venezuela para sua criação, em conjunto com o México. Após, tentaremos traçar um panorama dos diferentes projetos que a CELAC engloba, seus objetivos e o alcance que a instituição tem e pretende ter. Também serão também tomadas em conta influências externas dentro da região e como, em destaque a estadunidense, principalmente pela via militar. Ao fim, realizaremos um balanço medidas tomadas pela instituição em conjunto com o os desafios que podem ser um empecilho para que a CELAC se torne um instrumento legítimo da voz política latinoamericana.

4.1- CELAC: A CONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO CONJUNTA MÉXICOBRASIL-VENEZUELA44 Apesar da proposta da CELAC lançada pelo governo mexicano, no período Calderón (2006-2012), descritivamente em fevereiro de 2010, na II Cúpula da América Latina e o Caribe sobre Integração e Desenvolvimento (CALC) em Riviera Maya, no México, as conversações sobre a ideia de uma organização multilateral latino-americana é de dois anos antes. Em 2008, na I CALC, realizada na Costa do Sauipe, no Brasil, Calderón lança a ideia de criação de tal instituição intergovenamental. A realização da CALC, dentro das reuniões do Grupo do Rio, é simbólica pela volta do ativismo mexicano para um maior diálogo com a região latinoamericana, após o afastamento durante o governo anterior, de Vincent Fox (2000-2006). Como marco dessa maior reaproximação, foi a proposta do México de incorporar Cuba nas pautas de discursão do Grupo do Rio e da CALC, tentando reestabelecer uma boa relação diplomática, que teve atritos e se manteve em suspenso durante o governo Fox. Esse momento de reaproximação com o governo cubano e maior abertura ao diálogo para a criação de uma região integrada politicamente foi, a princípio, bem recebida pelos governos latino-americanos. O fato do interesse ter partido do México e não de um direcionamento estadunidense também pesou a essa empatia dos governos. Para o Brasil, tal proposta foi interpretada com boas expectativas e como uma possibilidade de avanço de seu capital político, buscando uma maior aproximação com os países

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No §7 da Declaração de Santiago da CELAC, os países-membros homenageiam os esforços de Felipe Calderón, Luis Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez pelos esforços dos presidentes para a criação da instituição. Apesar da Venezuela não ser o foco da análise do trabalho, é importante destacar sua importância para a formação da CELAC.

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caribenhos e mesoamericanos. Valendo-se de seu maior poder político e econômico, o Brasil poderia utilizar a organização como uma maneira de garantir apoio desses países para seus principais interesses na política internacional (como seu pleito para uma reforma no CSNU, como será visto mais adiante) e contrapeso à influência estadunidense na região, utilizando-se desse meio multilateral mais amplo para uma coordenação política coordenada (GUADERRAMA, 2012). Já a Venezuela encara a institucionalização da CELAC como uma maneira de promoção da proposta bolivariana para as Américas, cuja integração do subcontinente consta como objetivo de sua Constituição45, realizada no período Chávez (GUADERRAMA, 2012). Nesse sentido, a personalidade do presidente Chávez é crucial na formação e proposta da CELAC, implementando na sua formulação uma pauta que primordialmente se crie mecanismo de cooperação e solidariedade entre os Estados, como uma extensão da ALBA. A Venezuela enxerga na CELAC a possibilidade de ampliar para a América Latina uma política comum que se amparasse na base da manutenção da paz, da soberania, na busca conjunta para a redução das assimetrias regionais e sociais e, primordialmente, na distância da influência política dos Estados Unidos, e substituição de suas instituições hemisféricas46. Nesse sentido, do ensejo desses três países, coordenados com seus sócios (e com seus diferentes propósitos), nasceu a CELAC em 2010, na declaração conjunta da II CALC. As diretrizes para a conformação do bloco foram decididas em 2011, na III Cúpula da CALC, em Caracas, definindo os grupos de trabalhos e consultas para a preparação da I Cúpula da CELAC no Chile. Em Caracas, foi também decida a presidência pro-tempore do governo cubano para a instituição, um marco histórico desde a sua expulsão da OEA em 1962. Assim, a CELAC foi constituída e já partiu com um enorme desafio: acatar os mais diversos interesses e estratégias de integração e política externa dos 33 países da América Latina e Caribe, balanceando interesses neoliberais e da nova esquerda.

4.2- COMPOSIÇÃO, OBJETIVOS E ALCANCE DA CELAC A composição dos projetos de inserção internacional e regional que os Estados da CELAC estão inseridos são dos mais diversos e até contraditórios. Como caracteriza Alejo e

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Esse objetivo destaca-se no preâmbulo da Constituição da República Bolivariana da Venezuela. Ver: http://www.oas.org/dil/esp/Constitucion_Venezuela.pdf 46 Para Chávez (2011) “A OEA (Organização dos Estados Americanos) é o velho, é um espaço que foi manipulado pelos Estados Unidos desde sempre. (...) À medida que se passarem os anos, a CELAC vai deixar para trás a velha e desgastada OEA”. Ver: http://goo.gl/h6JQYL.

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Coronado (2013, p. 96), a CELAC concentra em si três principais eixos semiperiféricos, sendo eles: a) semiperiferia subordinada ao modelo neoliberal ortodoxo, encabeçada pelo México e suas aspirações geopolíticas de se converter em um pivô entre o Norte e o Sul, com a presença de países como Colômbia e Chile em suas iniciativas, principalmente pela Aliança do Pacífico; b) semiperiferia pós-neoliberal, com preponderância do Brasil e de suas aspirações de se converter em uma potência regional, com base na construção de relações Sul-Sul, com vínculos sub-regionais a partir dos acordos da UNASUL e do MERCOSUL e; c) semiperiferia contra hegemônica, liderada por Venezuela, cujas alianças com Cuba, Equador e Bolívia mantém no seu cerne a base das relações Sul-Sul, entretanto, com posicionamento de questionamento à hegemonia dos países centrais, principalmente a estadunidense, cujos países participam da Aliança Bolivariana. A Declaração de Santiago (2013), primeiro documento conjunto da CELAC, baseou-se nos princípios comuns a esses Estados integrantes, como o respeito à não-intervenção, à soberania e ao Estado de Direito no âmbito nacional e internacional. Além desses princípios mais abrangente (e vagos), o CELAC pregava a complementaridade dela com os arranjos políticos já existentes na região, não caracterizando um empecilho para a coordenação política em outros foros de interesse, como o México no TLCAN, o Brasil no MERCOSUL e a Venezuela na ALBA47, por exemplo. A busca pelo equilíbrio presente na Declaração, mostra uma suavização dos membros da ALBA em relação à dicotomia Norte-Sul. Nesse sentido, a declaração conjunta, no seu §32, afirma que o desenvolvimento deve vir mediante a cooperação Sul-Sul, sendo este um complemento e não uma substituta da cooperação Norte-Sul, uma suavização da ala mais revisionista do bloco. Apesar dessa suavização dos grupos mais incisivos de países no discurso conjunto, a CELAC também se caracteriza pela busca da autonomia e independência em suas resoluções. Reitera a rejeição de medidas unilaterais com efeitos extraterritoriais que sejam contrárias ao direito internacional; a proibição de ameaça e do uso da força; a avaliações, listas unilaterais e ilegítimas que países desenvolvidos realizam que afetem as políticas referidas ao terrorismo, narcotráfico e trato de pessoas48. Objetiva-se, também portanto, a criação de uma Zona de Paz na América do Sul, na base do multilateralismo, da diminuição da militarização regional e do

§12: “Entendemos que a CELAC estará fundamentada no diálogo permanente sem se sobrepor ou duplicar com outras experiências ou instituições regionais e sub-regionais, e estará fundada no princípio da complementaridade.” 48 Ver Declaração de Santiago da I Cúpula CELAC §6, §9 e §24. Acesso no site: http://www.minrel.gob.cl/minrel/site/artic/20130208/asocfile/20130208155151/declaracion_de_santiago___port ugu__s.pdf 47

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repúdio comum ao uso de armas de destruição em massa e de tecnologia nuclear para fins bélicos. O posicionamento comum perante a busca pela paz regional e o entendimento é importante ao tornar o bloco mais um foro de oportunidade consulta mútua, além de mostrar o interesse comum da autonomia política desses países perante o cenário internacional Esse posicionamento autonomista comum é presente na opinião do bloco sobre o embargo econômico a Cuba, realizado unilateralmente pelos Estados Unidos. No documento 3.10, da II Cúpula CELAC, realizada em Havana em 2014, a “Declaração Especial sobre a Necessidade de Pôr um Fim ao Embargo Econômico, Comercial e Financeiro imposto pelos Estados Unidos Contra Cuba”, os 33 países da instituição concordaram que tal medida unilateral estadunidense contra a ilha caribenha vai contra os princípios do Direito Internacional ao impor a países soberanos medidas que limitam eles a suas negociações e suas decisões sobre seus sistemas econômicos, políticos e sociais. Mesmo que o posicionamento da região sobre o assunto não seja novo49, um comunicado aberto como uma voz consensual latino-americana em peso apoiando a região, tem um peso na diplomacia mundial, com a coordenação em bloco para o apoio para a votação do tema na ONU. Ainda sobre a visão conjunta sobre interferências externas nas soberanias estatais, o caso Argentino sobre as Malvinas é de importante apreciação. As Ilhas Malvinas, Georgia do Sul e Sandwich do Sul são caso de disputa internacional entre Argentina e Inglaterra que teve um momento de conflito armado recente nos anos de 1980. O confronto que ficou conhecido como Guerra das Malvinas pôs em cheque a utilidade do TIAR, quando os Estados Unidos preferiram reconhecer as Malvinas como Falklands ao invés de apoiar a Argentina, como previra o Tratado. O posicionamento da nações latino-americanas foi dúbio. Por exemplo, enquanto o México condenou os ataques ingleses, o Brasil permaneceu-se neutro, afirmando que era apenas para os dois buscarem uma solução para o conflito. Desse modo, a CELAC herda o posicionamento do Grupo do Rio sobre o caso, que é misto das posições brasileiras e mexicanas: prevalece a denúncia da indevida presença inglesa na região, assim como declara, no documento 3.11 da II Cúpula CELAC, a “Declaração sobre a Questão das Ilhas Malvinas”, que as Malvinas e as outras ilhas acima citadas são Argentinas e que deve-se resolver esse acordo pacificamente, nas normas do direito internacional. A CELAC traz também características da integração pós-neoliberal, voltada também para uma coordenação de polítics conjuntas de desenvolvimento social e a presença do México nesse tipo de tratado, após os anos 2000, com enfoque mais político e social é um marco. A 49

Já fora votado 23 vezes na Assembleia Geral da ONU, sempre vetada pelos Estados Unidos, mesmo com a maioria absoluta dos países votando contra o embargo. Ver: http://goo.gl/tsyjNm.

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organização reconhece as desigualdades dentro da região e dos países do bloco, a CELAC tendo como objetivo acelerar os processos de melhora dos Índices de Desenvolvimento Humano, como saúde e educação, além da construção de políticas de proteção comuns aos povos originários e minorias étnicas50. Os países também assinaram em conjunto os direcionamentos para a melhoria da distribuição alimentícia da Food and Agricultura Organization (FAO), na qual os países da CELAC mantêm o compromisso de erradicação da fome. No campo da saúde, vale ressaltar o papel cubano no auxílio de envio de médicos para países que necessitam de mais pessoas qualificadas na saúde de forma urgente. As parcerias de Cuba no setor da saúde se dão em conjunto com os países da ALBA, além do próprio Brasil e do México e indicado para combate a doenças pelos Estados Unidos. A CELAC objetiva também a aproximação dos posicionamentos comuns nos foros multilaterais internacionais, nos assuntos em que for possível obter acordo. Esse posicionamento é interessante pois o bloco já faz parte nas negociações nas Nações Unidas, principalmente em termas sociais e de desenvolvimento. Uma posição comum de todos os membros, presente na Declaração de Santiago no §43, é que todos aprovam a reforma integral do Conselho de Segurança da ONU, como forma de maior democratização dos meios de governança global e de melhor manutenção da paz e da segurança internacional. Esse consenso é importante para o Brasil, já que o país almeja ser membro permanente, justificado pelo seu governo por conta de seu peso político e econômico, além da importância histórica nas Nações Unidas51 (ROUSSEFF apud POLITICA EXTERNA, 2014). Entretanto, nesse ponto nem todos da CELAC concordam, como Argentina e México que, em meados dos anos 2000, foram contra a candidatura do Brasil na reforma do CSNU, questionamento o legítimo direito do país em ser o representante latino (MALAMUD, 2012). Ao promover objetivos gerais, a CELAC consegue uma união de opiniões, já que todos querem maior espaço na política internacional, entretanto, quando se é para escolher um membro preponderante, nesse momento o interesse individual de cada Estado tem maior peso nas decisões. Apesar de um maior consenso nas matérias relacionadas a agentes externos da política externa, a CELAC tem poucas possibilidades de resolução em seu âmbito interno. Na Declaração de Santiago (2013), não há a criação de nenhum mecanismo de mediação ou de supra governabilidade que consiga julgar soluções de controvérsia. Notadamente, a coordenação política da CELAC mostra-se efetiva em posicionamentos amplos (e vagos) para

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Essas categorias étnicas estão identificadas nos §36 e §37, sendo este último condenando o uso do conhecimento original indígena por empresas que registram e patenteiam os direitos. 51 Ver: http://goo.gl/ckS2Oo.

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as questões de interesse comum e de defesa da região contra intempéries sistêmicas e atores externos. Todavia, nas querelas internas o sistema da CELAC mostra-se fragmentado e ineficaz, como ocorreu em sua primeira desavença interna. A problemática em questão foi a manobra política realizada pela oposição paraguaia contra o então governo Lugo, destituindo-o do poder por meio de um impeachment que levantou questionamentos quanto o processo democrático no Paraguai. Apesar de ser uma instituição com a previsibilidade de suspensão quando há quebra da cláusula democrática, a CELAC deveria ter tido um posicionamento claro ao ocorrido. Entretanto, as definições internas suscitaram no silêncio, devido à divergência da interpretação do caso entre Brasil e México. Para o Brasil e o posicionamento oficial do MERCOSUL e UNASUL, houve sim quebra da Cláusula Democrática, sendo o Paraguai suspenso dessas instituições. Todavia, para o México, houve uma transição institucional no caso, aceitando até o pedido paraguaio de entrada como membro-observador da Aliança do Pacífico, enquanto suspenso das instituições sul-americanas. A CELAC herda, assim, o legado do Grupo do Rio o legado de tratar entre os latinoamericanos os temas pertinentes à uma política comum ampla, desde temas sociais a problemas comuns de segurança e de posicionamento da região no sistema internacional, e da busca por autonomia em suas diretrizes. Para a relação CELAC-sistema, a organização consegue formar posicionamentos comuns a fim de ampliar a autonomia da América Latina e denunciar as assimétricas hemisféricas e sistêmicas. Entretanto, no contexto intra-bloco, há a problemática de lidar com as disputas internas, principalmente entre as semiperiferias, na projeção de poder e na defesa de seus interesses nacionais. Essa problemática se potencializa quando países do bloco firmam acordos de cunho militar com potências exógenas, que buscam uma penetração hegemônica na política hemisférica, mostrando o limite da CELAC para coadunar os interesses estratégicos dos países.

4.3- O PERIGO AO LADO: A PRESENÇA MILITAR ESTADUNIDENSE NOS PAÍSES DA CELAC Apesar dos parágrafos de condenação à presença externa e à política intervencionista dos países centrais, a CELAC possui em seu vasto território países com acordos profundos de segurança com a maior potência mundial: os Estados Unidos. É pertinente dizer que esses acordos, realizados de maneira bilateral ou em tratados mais profundos (como no caso do TLCAN), contam com apoio de membros de peso na instituição e cujos os interesses são

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amplos. Na maioria desses acordos, os Estados Unidos justificam a presença militar para o combate ao narcotráfico e ao crime organizado, cujos resultados são duvidáveis. O México, um dos principais criadores da CELAC, é signatário de dois tratados de segurança conjunta com seu vizinho do Norte. O primeiro tratado é o chamado ASPAN (Aliança para Segurança e Prosperidade da América do Norte), assinado durante o governo Fox, que o uso da força para a ameaça externa comum, sendo que a ameaça encarada por um país do TLCAN é vista como tal para os outros membros. Apesar da declaração de ser mais uma ação contra o narcotráfico, crime organizado e o terrorismo, a classificação vaga de “ameaça externa” não garante que tal não seja algum dos Estados latino-americanos (ALEJO, CORONADO, 2013). O México ainda aprofundou esse tratado bilateralmente com os Estados Unidos a Iniciativa Mérida, em 2010. Tal acordo fez parte das promessas de Calderón para a luta contra o tráfico de drogas, resultando no compartilhamento de informações de segurança e inteligência do México para os Estados Unidos. Assim, os EUA têm acesso a informação privilegiada mexicana, além de poder atuar com respaldo mexicano onde quer que esteja e seja o propenso inimigo. Não sem medida, esses planos vieram junto novos acordos de comércio entre os países. Além do México, a presença militar estadunidense também se alarga para o sul da região latino-americana através principalmente do Plano Colômbia. Iniciado em 1999, o Plano se apresentava como uma cooperação militar bilateral entre EUA e Colômbia no combate ao narcotráfico, mais especificamente às Forças Amadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Além de também firmar um acordo de livre-comércio e de auxílio econômico, o Plano Colômbia forneceu área para a construção de bases militares estadunidenses, cuja a mobilização e logística das tropas se tornaria mais ágil e eficiente. No fim, o Plano mostrou-se um insucesso no uso das Guerra às Drogas, criando mais problemas do que soluções. Além disso, a presença norte-americana levantou suspeitas de Venezuela e Brasil quanto as intenções dos Estados Unidos para com a região, tendo estes incrementado, desde então, seus ordenados em Defesa. No caso, do combate às FARC, o meio pela força mostrou-se débil, avançando a solução pela via da negociação. Curiosamente, às FARC desejaram sucesso na I Cúpula da CELAC, celebrando a organização como sinal de queda da hegemonia estadunidense, além de afirmar buscar esforços para as negociações de paz52. Além da manutenção de seus interesses e de acercamento da região, os Estados também agem de maneira unilateral a fim de manter sua presença hegemônica na região. A presença de

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Ver: http://goo.gl/nZzkSJ

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vários recursos naturais, como urânio, lítio, nióbio e petróleo, unido ao incremento militar que Brasil e Venezuela tem provido desde o início do século, fizeram com que os Estados Unidos ativassem a IV Frota Naval, que circunda, principalmente, a América do Sul, possuindo capacidade de locomoção. Essa ação militar estadunidense demonstra o maior interesse do país com a região, podendo sinalizar uma presença mais incisiva nos próximos anos (cf. KUHLMANN, OLIVEIRA, 2009). Por também tais motivos, os países da região sul-americano ampliaram seus mecanismos de consulta de Defesa, com o Conselho de Defesa Sul-Americano. A presença militar estadunidense é impressionante e, se não se encontra em algum país da região, os cercam com seus países limítrofes, como demonstra o Mapa no anexo, dificultando o processo de desmilitarização da região e de aumento da confiança mútua. Além disso, o uso do componente econômico e de promessas de acabar com problemas vinculados ao tráfico de drogas acaba por atrair políticos para tais acordos. Os resultados são comprovadamente negativos, em relação a tal vinculação militar, tem em vista o caso colombiano e mexicano. Neste, o Estado entrega jovens manifestantes na mão de grupos de crime organizados para punilos, além de fomentar a milícia armada53. No colombiano, o processo de militarização contra as FARC apenas prolongou o conflito que poderia ter se dado início pelo já demonstrado processo de negociações. Assim, nota-se que a presença militar estadunidense tem apenas um único objetivo: dissuadir e vigiar possíveis contestadores de sua hegemonia na região. Portanto, a CELAC abre um espaço para uma discussão ampla para os Estados LatinoAmericanos sobre seus direcionamentos políticos e o uso da coordenação entre si para uma maior inserção da região no sistema internacional. É importante o posicionamento da região em relação às mudanças sistêmicas nas instituições multilaterais internacionais, como a ONU e a defesa da soberania regional contra ingerência externa. O reconhecimento dos direitos legítimos de Cuba e Argentina em seus pleitos na ONU são representativos. Entretanto, como aponta Carlos Malamud (2012), o bloco carece de concordância perante temas internos. Essas divergências são caracterizadas principalmente pelos diferentes direcionamentos para inserção internacional dos países. Para o México, por exemplo, a inserção internacional é pautada a partir da ampliação de seus laços comerciais, sendo ele um pivô para as negociações entre o Norte e Sul; enquanto para o Brasil, os vínculos políticos ganham um maior peso, principalmente nas vias de cooperação Sul-Sul, para a promoção de seus interesses de maior participação nos centros de decisão internacionais. Isso se reflete no protagonismo difuso dessas semiperiferias que, apesar do discurso comum da CELAC sobre a reforma do

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Ver http://goo.gl/FYFci4.

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CSNU, não há concordância de quem seria o representante latino-americano caso houvesse a reforma. Outra problemática são as variações de prioridade que a CELAC te na política externa de seus principais países, principalmente após a saída dos presidentes fundadores do poder. Após a saída de Lula, o governo seguinte, de Rousseff, direciona o Brasil com o fortalecimento da presença brasileira na América do Sul, nas instituições multilaterais internacionais e de cooperação Sul-Sul. A CELAC passa a ser então um espaço para o diálogo, cuja prioridade é secundária. No México, após Felipe Calderón, Enrique Nieto volta com o direcionamento do governo Fox, priorizando agenda econômica com a região, principalmente o Pacífico, e o maior alinhamento com os EUA. Esse afastamento com a CELAC é claro, perante a ausência do nome da instituição no Plano Nacional de Desenvolvimento de 2012-2018. Assim, a CELAC corre o risco de se tornar, como afirma Sabatini (2014), um “multilateralismo sem significado”, devido ao vazio de seus objetivos e de seus principais atores buscarem maior inserção em outros arranjos políticos. Novamente, a América Latina passa por uma possível desilusão da impossibilidade de uma instituição hemisférica forte e integrada. Entretanto, a CELAC pode ganhar um novo papel no cenário regional em 2015, com a Cúpula China-CELAC, na busca da cooperação chinesa para o desenvolvimento hemisférico. A coordenação comum em busca de maior poder de barganha com os chineses pode dar maior destaque do bloco nas prioridades do Brasil e do México. Apesar de incerta, essa reunião poderá ser decisiva para a instituição.

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5- CONSIDERAÇÕES FINAIS Retomando as indicações comparativas utilizadas por Mace, Belanger e Therien (apud GONZÁLEZ, 2008) para avaliar o regionalismo de um país nas Américas, sendo estes: a) peso demográfico; b) tamanho da economia (PIB); c) nível de desenvolvimento (PIB per capta); d) poder de mercado (participação no comércio inter-regional); e) poder militar (gasto militar) e; prestígio diplomático (participação em missões e em organismos comuns); é possível notar ampla vantagem brasileira em relação ao México no que toca à inserção regional, a partir desses meios analisados. Se formos comparar dado a dado, o Brasil tem mais de 200 milhões de habitantes, enquanto o México tem cerca de 118 milhões de habitantes; apresenta, como já mostrado, um PIB per capta relativamente maior que o México, sendo o comparativo de US$ 11,2 mil/ano contra US$ 10 mil/ano, além do Brasil possuir um PIB maior que o mexicano; nos termos de poder de mercado para a região, o Brasil a América Latina aparece com 25 % de sua pauta de exportação e a região, para o México, não conta nem como 10 por cento de sua pauta total e; por fim, o Brasil apresentaria melhores relações diplomáticas diretas com os países latino-americanos, principalmente sul-americanos, por conta das instituições criadas no final do século XX e início do século XXI, incluindo-se nesse ensejo a UNASUL e MERCOSUL. Neste sentido, o Brasil logrou melhor atingir seus objetivos de ascensão na região latinoamericana que o México. Como já dito, o Brasil, mesmo com as dificuldades para a criação de uma liderança regional, é protagonista no Sul do hemisfério latino-americano, cerne de suas principais políticas regionais e centro de irradiação de seu poder. Como afirma Dilma em entrevista À revista Política Externa em 2014, o Brasil manterá a América do Sul como seu principal foco na política externa, tão bem quanto a cooperação com os países do Sul global, principalmente os BRICS. A América Latina, como um todo, não aparece nas prioridades do discurso que a presidenta apresenta, demonstrando que os esforços para a integração sul-americana se manterão e a projeção de poder brasileira, em direção ao norte do continente americano, principalmente via CELAC, fica em segundo plano.

O México, mesmo sempre se referindo à América Latina como ponto de partida cultural e indenitária, preferiu, a partir dos anos de 1990 e mais decididamente no início dos anos 2000, a associação econômica e o aprofundamento político com os Estados Unidos. Nota-se, portanto, que mesmo que a elite mexicana se reconheça latino-americana, ao menos no papel, como de importância para sua própria identidade, pragmaticamente prefere a integração com o Norte. Nas palavras do próprio Enrique P. Nieto à Foreign Affairs em 2014, seus objetivos principais na política externa não o Tratado Trans-Pacíficio e a Aliança do Pacífico. Nesse sentido, o

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México volta sua política econômica a dois movimentos de expansão de capital voltados para, principalmente o mercado asiático e dos países da bacia do Pacífico. Ou seja, o principal objetivo mexicano, para a região latino-americana, continua sendo a de sua expansão comercial e não de vinculação política. É importante dizer que, em pesquisa terminológica de seu Plano de Desenvolvimento Nacional 2012-2018, para a palavra América Latina apenas surgiu 17 vezes, sendo a maioria em dados comparativos (o México em comparação ao resto da região), e aparecendo duas vezes como destaque para a expansão comercial mexicana, principalmente os tratados com os países da bacia do pacífico na região. Ao ser procurada a palavra CELAC, não foi encontrada uma única referência, mostrando portanto certo descaso com a organização de cunho multilateral criada no governo anterior. Portanto, é possível concluir que a CELAC aparece como política de segundo plano dos atuais governos de Brasil e México. Se pode se dizer que o México e o Brasil tiveram em comum foi a coincidência de criarem e se afastarem ao mesmo da instituição. Para o Brasil, a instituição não agrega tanto à sua projeção de poder na região a priori, já que com os países da região sul-americana o Brasil já tem instituições mais consolidadas criadas, assumindo estas um caráter de maior supranacionalidade que a CELAC. Para o México, a negligência para com a instituição é ainda mais séria, pois o país retorna ao seu isolamento político com a região latino-americana, lembrando o que ocorreu durante o período Fox. O caso da CELAC é representativo ao “vaivém” dos impulsos integracionistas dos dois países para com os países da América Latina. Dependendo muito da visão do governo e pouco de uma estratégia de Estado, os dois países ao longo do período analisado tiveram momentos curiosamente distintos na análise temporal. Enquanto na Guerra Fria, o Brasil oscilava entre a aproximação com os países do Sul e com os Estados Unidos, o México priorizou uma tentativa de coordenar movimentos latino-americanistas a fim de criar um contrapeso efetivo à hegemonia estadunidense. Assim, o pós Guerra-Fria pode ser visto como um ponto de inflexão nesses direcionamentos. As políticas externas desses países mudam de maneira significativa: enquanto o México busca mais Estados Unidos, o Brasil busca se intensificar na América do Sul. E é essa maior mudança à importância regional que define esses resultados, mesmo que, para um projeto latino-americanista como um todo, o projeto da CELAC foi um marco único, entretanto, ainda pouco prioritário. Como conclusão do trabalho podemos considerar, por fim, que os dois países lograram resultados diferentes quanto aos seus objetivos. A principal diferença é que, em seu entorno geográfico imediato, o Brasil se comporta como Centro, protagonizando projetos comuns e utilizando da região para seus anseios internacionais, ao mesmo tempo em que provoca políticas

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de contrabalanceamento por partes de seus vizinhos, que desconfiam de uma propensa hegemonia brasileira. Já o México, em relação ao seu entorno, mantém uma relação periférica, em relação a sua dependência profunda ao TLCAN, mais especificamente com os Estados Unidos, não sendo protagonista em seus projetos regionais, como o falido Panamá-Puebla. Essa diferença de posicionamento em seu entorno mostra-se fundamental para se entender qual a semiperiferia que enseja o Centro do sistema, e a semiperiferia que luta para não ser uma periferia plena.

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ANEXOS

Tabela 2

Figura 1

Figura 3

Tabela 1

Figura 2

Figura 4

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Tabela 3

Tabela 5

Tabela 4

Tabela 6

Figura 5

MAPA 1

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