BRASIL: NAU DOS INSENSATOS

June 5, 2017 | Autor: Fernando Alcoforado | Categoria: Sociology, Economics, Social Sciences, Political Science
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BRASIL: NAU DOS INSENSATOS Fernando Alcoforado* Imagine a situação de um navio que poderíamos dar-lhe o nome de Brasil indo a pique sem que seus ocupantes percebam a catastrófica situação que lentamente se impõe. Esta imagem faz parte de uma alegoria medieval, renascentista, representada das mais distintas formas ao longo dos últimos quinhentos anos: A Nau dos insensatos. Não foram poucos os que (brilhantemente) trouxeram à luz todo o esplendor desta ideia. Imbuída de um senso de autocrítica, esta alegoria descreve o mundo e seus habitantes como uma nau cujos passageiros perturbados nem sabem nem se importam para onde estão indo. A alegoria expressa alguns séculos antes do Iluminismo que o mal social decorre da desrazão, do não pensar. A Nau dos insensatos é uma antiga alegoria que foi tratada pelo grande cineasta italiano Federico Fellini em seu filme O Navio. No filme E la nave va — batizado como O Navio, em português — de Fellini, a alta classe artística e social italiana embarca em uma viagem de despedida da cantora de ópera Edmea Tetua. Lá, em meio ao caos instaurado pelo ego, pela morte e pela nongrata presença de refugiados sérvios no navio, afloram as facetas mais obscuras e egoísta do ser humano. Ao reproduzir com magistral destreza os aspectos mais perturbadores da individualidade sobre o meio, Fellini expõe a cara mais pobre da existência humana. Grande parte dos elementos que compõem o filme O Navio, isto é, a Nau dos Insensatos se notam na realidade brasileira contemporânea. Não é preciso ser psicólogo para perceber que o individualismo, a avareza e a pobreza de espírito estão presentes nos gestos e no posicionamento crítico da classe política no Brasil. Todos nós estamos embarcados na mesma Nau chamada Brasil como os personagens de Fellini indo rumo ao desastre enfrentando as mais terríveis tempestades, ventos fortes, intempéries naturais e acidentes de percurso na economia e na política. Frequentemente justificamos a ausência de uma postura altruísta pelo simples fato de os demais ocupantes do navio também não se importarem conosco. E assim, sem se preocupar com o porvir, tocamos a Nau chamada Brasil para frente sem nos apercebermos que a água já está tocando a cintura e que já não há mais como voltar atrás. Pensar em uma alegoria concebida no período medieval, anterior a descoberta da América, em primeira instância poderia nos levar a crer que estamos tratando da representação de uma sociedade completamente distante. A má notícia é que grande parte dos elementos que compõem a Nau dos Insensatos estão presentes na realidade brasileira contemporânea. Em síntese, a Nau dos Insensatos é uma alegoria renascentista que representa a existência humana como um barco que conduz tolos (os governantes e toda a população brasileira) que não sabem de onde vem, para onde vão e não conseguem dar um mínimo de racionalidade a suas vidas. Esta é a situação vivida no momento no Brasil pelas forças que apoiam e se opõem ao governo Dilma Rousseff. Os governos do PT de Lula e Dilma Rousseff exerceram o poder político e fracassaram inteiramente inclusive no esforço de combater a desigualdade social mesmo com a adoção do programa de transferência de renda Bolsa Família. O fracasso dos governos do PT, sobretudo, o de Dilma Rousseff se manifesta no fato de cerca de 80% da população rejeitar seu governo e 70% desejar o impeachment. Estes números demonstram o arrependimento da maioria do eleitorado na eleição de Dilma Rousseff em 2014 para a presidência da República.

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Trata-se de grande insensatez, um governo que tem a rejeição da maioria da nação insistir em se manter no poder ao custo até mesmo de provocar uma convulsão social no Brasil. Vários discursos de setores do governo ameaçam o uso da violência se ocorrer o impeachment de Dilma Rousseff como foi o caso de Lula quando fez referência à utilização do “exército” de Stédile do MST, o do presidente da CUT Wagner Freitas que falou em pegar em armas para defender o governo e o de Stédile do MST que ameaçou parar o País se Dilma sofrer impeachment. Se os governos do PT não conseguiram realizar o que pretendiam nos 12 anos que governaram o Brasil, pergunta-se porque insistem em permanecer no governo a todo o custo tendo a rejeição da grande maioria da população, além de não contar com a necessária maioria parlamentar para governar? Não será nessas condições que o PT e seus aliados conseguirão realizar seus objetivos políticos. Trata-se, também, de uma imensa insensatez insistir na manutenção de Dilma Rousseff na presidência da República que, além de ter praticado crime de responsabilidade, razão pela qual sofre processo de impeachment, já demonstrou não possuir a necessária competência para comandar o País em busca de sua reconstrução econômica e social nem tem liderança capaz de aglutinar a maioria da nação em torno dela. Se, de um lado, a insensatez está presente nas hostes do falido governo Dilma Rousseff, o mesmo se aplica às forças políticas representadas no Congresso Nacional que a ele se opõem. Temos a insensatez no fato de termos no comando da Câmara dos Deputados e do Senado Federal dois investigados de corrupção pela Operação Lava Jato, termos parlamentares muitos dos quais investigados de corrupção e, também, com um número excessivo de partidos políticos que, com raríssimas exceções, não têm nenhum compromisso com o futuro da nação. Diante deste ambiente em que, de um lado, temos um governo que não reúne as condições para governar e, de outro, temos um sistema político apodrecido que não apresenta alternativas capazes de evitar o colapso econômico e político-institucional, isto é, evitar o afundamento da Nau chamada Brasil, o País poderá ser convulsionado por uma luta política de consequências imprevisíveis seja com a permanência, seja com o impeachment de Dilma Rousseff. Tanto permanência de Dilma Rousseff ou sua substituição em caso de impeachment por Michel Temer na presidência da República fará com que o Brasil seja levado a um estado de anarquia generalizada sem precedentes na história do Brasil porque ambos trarão insatisfação para amplos setores da população haja vista serem corresponsáveis pela hecatombe política, econômica e social que levou à falência os sistemas político e econômico do Brasil. Ambos os cenários acirrariam os conflitos entre os partidários e oponentes do lulopetismo que poderiam conduzir o País à guerra civil que seria deflagrada por uma das forças políticas em confronto que seja excluída do poder. Diante da impossibilidade de Dilma Rousseff e Michel Temer construir a paz social no Brasil seria necessário haver a renúncia de ambos, respectivamente à Presidência e Vice-Presidência da República para abrir caminho à constituição de um governo provisório de união nacional composto por respeitáveis figuras públicas aceitas por todas as forças políticas em confronto que teria a incumbência de convocar uma nova Assembleia Constituinte para reordenar a vida nacional, buscar o consenso do País na solução da crise econômica e social, evitar a escalada da violência no Brasil e realizar novas eleições gerais no País. Este seria, portanto, o caminho para evitar uma luta fratricida ou uma guerra civil no Brasil quando o dissenso inviabilizaria a construção de um novo pacto social. Se esta solução política não for adotada só haverá um desfecho 2

para o impasse institucional em que vive a nação brasileira que é a intervenção das Forças Armadas visando a manutenção da ordem constitucional para evitar a emergência de uma guerra civil no Brasil. *Fernando Alcoforado, 76, Sócio Benemérito da AEPET- Associação dos Engenheiros da Petrobras, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHCO Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012) e Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015). Possui blog na Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail: [email protected]

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