Breve comentário sobre Arte e Sensibilidade no século XIX

August 26, 2017 | Autor: Vítor Vívolo | Categoria: Literatura, Artes, História Contemporânea (Século XIX e XX), Século XIX, Análise De Sensibilidade
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BREVE COMENTÁRIO SOBRE ARTE E SENSIBILIDADE NO SÉCULO XIX

“Tornar-se uma obra de arte é o objetivo da vida.” Oscar Wilde É realmente admirável observar a riqueza artística de um século que sozinho conseguiu contemplar admiráveis nomes como Baudelaire, Byron, Shelley, Poe, Wilde… Época esta tão marcada por um moralismo repressivo das decadentes sociedades de “corte” francesas e polidez rígida vitoriana. Não é à toa que a arte será justamente utilizada como uma válvula de escape: e seus integrantes serão os “marginalizados por opção”. O trivial, banal e corriqueiro da vida humana resolvem emergir nos ramos artísticos para que o diálogo com o arcaico e tradicional “ontem” seja rompido: os poetas, escritores e pintores tornam-se testemunhas da riqueza e da pobreza geradas pela maçante força do Capital. São os “mentirosos” diante das verdades estabelecidas. O escopo da vida dos miseráveis, o efeito embriagante das drogas e alcoolismo, colaboram para a abertura de novas dimensões além das zonas de conforto criadas pelos valores culturais sedimentados desde o século XVIII. A fragilidade do homem moderno produz novos herois, mas desta vez mundanos. Uma profusão de significados é engendrada pela relação entre a sociedade e a cidade: saboreia-se a existência a lentos e resistentes goles enquanto o tempo é radicalmente acelerado, perde-se a inocência e ingenuidade de outrora, o romantismo aos poucos apodrece para dar lugar ao decadentismo e ironia... Os filhos desse paradigma, os Modernistas, não eram meros pessimistas ou suicidas: a vida era uma promessa; a morte, um fato, uma certeza. Dentro desses limites, buscavam o extremo, despindo-se de doutrinas ou negociações hipócritas com a tediosa vida regrada. O movimento modernista estava associado à inovação e à surpresa: o que existe de mais profundo e, mesmo assim, negligenciado pela arte? Diante da feiúra do mundo, a sensibilidade é capaz de captar sinais de beleza na realidade das fábricas, indústrias, ciências e tecnologias. O

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UNIDADE I

História e Arte: cultura e sensibilidade

“progresso” cinzento era posto em batalha com as cores, as palavras e o teatro dos modernistas. Vejamos a ironia seca da barata de Kafka: a figura do pai, da geração passada, que construiu esse mundo antigo e tradicional. Vejamos a escrita desses autores como sua forma de suportar o peso do mundo. É difícil definir o modernismo ou as artes do período sem homogeneizar suas singularidades; mas podemos observar claramente traços como o experimentalismo dos dadaístas, a falta de limites impecável dos dândis, a eterna sede alimentada, a “heresia” provocada pelos grandes nomes que imediatamente pululam na memória ao pensarmos sobre tal tempo. Aliás, não é à toa que os monumentais renomes de Picasso, Renoir, Monet e todos os demais já aqui citados foram adventos do período. Esses “cânones modernos” foram construções sociais, culturais e mercantis da classe média emergente. Em irônicas condições, suas produções de resistência entraram na lógica do Mercado: eram os apadrinhados por uma burguesia e clientela almejando o status de “letrados” e “ilustrados”. Dentro de todas essas condições, a riqueza da “rua e seus detritos”, como diria Benjamin, trouxe o fascínio ainda vivo em relação a um período de cem anos capazes de virar de ponta-cabeça o pragmatismo vigente. Não existia mais espaço para o bucolismo e a fresca brisa do campo, mas ainda assim podia-se tragar a nuvem de fumaça densa do “progresso” com algum resquício de satisfação: foi ela que despertou os portadores dos pincéis e das penas do eterno sono de Endimião, aquele que pediu a Zeus para permanecer imortalmente belo mas dormente.

Referências Gay, Peter. Modernismo: o fascínio da heresia. De Baudelaire a Beckett e mais um pouco. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. Tadeu, Tomaz (org.); Balzac, Honoré de; Baudelaire, Charles; d’Aurevilly, Barbey. Manual do dândi: a vida com estilo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2009. Tzara, Tristan. Dada: alguns dibuos de Picabia, Cuadernos ínfimos. s/e, s/d. Williams, Chris (org). Companion to Nineteenth Century Britain. Londres: Blackwell Publishers, 2007. Ilustração de topo: Recorte de retrato de Charles Baudelaire, por Emile Deroy, 1844. 2

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